Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 758/2021-T
Data da decisão: 2022-04-11  IMT  
Valor do pedido: € 79.896,02
Tema: IMT – isenção de prédios para revenda; demolição de edifício
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SUMÁRIO: Preenche o disposto no nº 5 do art. 11º do CIMT (ser dado destino diferente ao prédio), determinando a caducidade do direito à isenção de IMT pela aquisição de prédios para revenda, a compra de um edifício, sua demolição e posterior venda do terreno para construção.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

 

A..., SA, NIPC..., com sede na ..., nº ..., ...-..., Porto, apresentou, nos termos legais, pedido de constituição de tribunal arbitral, sendo Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

I - RELATÓRIO

 

  1. O pedido

 

A Requerente pede a anulação da liquidação de IMT com o n.º ... (referente ao registo de declaração n.º 2021/...), no valor de € 79.896,02, sendo € 68.244,05 de imposto e € 11.651,97 de juros compensatórios.

 

B) Posição das partes

 

A Requerente entende, em suma, que tendo adquirido um imóvel (edifício industrial em ruínas), procedido à demolição do edificado e vendido o terreno dentro do prazo de três anos após a compra, mantem o direito à isenção prevista no artº 7º do CIMT (isenção pela aquisição de prédios para revenda), pelo que a liquidação impugnada é ilegal.

A Requerida entende que tal isenção caducou porque “ao prédio foi dado destino diferente” (art. 11º, n.º 5, do CIMT)

 

  1. Tramitação processual

 

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite em 22/11/2021.

 A Requerente não procedeu à indicação de árbitro, tendo a designação dos membros deste coletivo arbitral competido ao Conselho Deontológico do CAAD, a qual não mereceu oposição.

Os árbitros designados aceitaram tempestivamente as nomeações.

O tribunal arbitral ficou constituído em 28/01/2022.

Notificada para tal, a Requerida apresentou resposta e juntou o PA.

Por despacho arbitral de 19/03/2020, foi decidido prescindir, por falta de objeto, da realização da reunião a que se refere o art.º 18º do RJAT e não haver lugar à produção de alegações, por manifestamente desnecessárias. Nenhuma das partes se opôs a este despacho arbitral.

 

 

 

II - SANEAMENTO

 

O processo não enferma de nulidades ou irregularidades.

Não existem exceções de que cumpra conhecer.

 

III – PROVA

 

III.1 - Factos provados:

  1. A Requerente, que se dedica com habitualidade à compra de prédios para revenda, adquiriu, em 29-02-2016, o prédio urbano sito no lugar de ..., à Rua ..., freguesia de..., concelho de Santa Maria da Feira, inscrito na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo urbano n.º ..., constituído por edifício de rés-do-chão e primeiro andar, destinado a indústria.
  2. A Requerente declarou tratar-se de prédio destinado a revenda, pelo que, por força do disposto no nº 1 do artigo 7º do CIMT, tal aquisição ficou isenta de IMT.
  3. O prédio foi registado na contabilidade da Requerente como “existências”, mercadoria para venda, registo que se manteve até à sua alienação.
  4. A Requerente demoliu a construção, o que participou à AT requerendo a avaliação do terreno.
  5. O prédio tinha, na data de aquisição, um VPT de € 1.049.908,50 e ao terreno foi atribuído um VPT de € 401.130,00.
  6. Em 22/05/2017, a Requerente revendeu o prédio, como terreno para construção, por preço igual ao VPT.
  7. Em 08-09-2021, foi emitida a liquidação com o n.º ... (referente ao registo de declaração n.º 2021/...), no valor de € 79.896,02, sendo € 68.244,05, a título de imposto, e € 11.651,97, a título de juros compensatórios.
  8. A Requerente não efetuou o pagamento do imposto liquidado.

 

III.2 - Factos não provados

 

Não existem factos não provados relevantes para a decisão da causa.

 

Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos aos autos pela Requerente e constantes do processo administrativo, não existindo qualquer dissídio entre as partes a seu respeito.

 

IV- O DIREITO

 

Está em causa a aplicação do disposto no nº 5 do art. 11º do CIMT, segundo o qual a  aquisição a que se refere o artigo 7.º deixará de beneficiar de isenção logo que se verifique que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente 

 

É certo que se encontra hoje ultrapassado o entendimento de que tal isenção caducaria sempre que o prédio fosse vendido em estado físico diferente daquele em que foi adquirido. A jurisprudência mais recente (nomeadamente, o ac. do STA – Pleno - no proc. 01626/13, de 17-09-2014[1]) aceita que sejam operadas alterações físicas no prédio adquirido, nomeadamente obras de construção visando a obtenção da licença necessária à venda, de acordo com o destino previsto.

Daí a argumentação da Requerente no sentido de existir uma identidade de razão para se decidir no mesmo sentido: no caso, apenas teria sido seguido um percurso inverso (compra do imóvel em ruína, demolição e revenda), ou seja, tal como na situação apreciada pelo STA, “limitou-se a desenvolver e concluir a lógica do negócio, tendo transmitido o imóvel adquirido com esse fim”.

Reconhece-se o preenchimento de um outro requisito do direito à isenção, o de o prédio se manter, entre a compra e venda, registado como “existência para venda”, requisito, porém, que é autónomo relativamente à questão da transformação física do imóvel.

Pese embora esta flexibilidade jurisprudencial, “o que importa é que não haja uma metamorfose ou alteração substancial do bem adquirido para revenda” (citamos do referido acórdão).

 

O STA já se pronunciou, por várias vezes, sobre situações como a presente, numa linha de pensamento inalterada. Citamos, do referido ac. do STA (proc.
01626/13) - um acórdão para uniformização de jurisprudência, recorde-se :  E foi nesse contexto factual que o acórdão[2] reafirmou a jurisprudência que já se vinha firmando na Secção de Contencioso Tributário (nomeadamente no acórdão de 23/02/2000, no recurso nº 018135), no sentido de que, para os aludidos efeitos, só constitui destino diferente a «alteração substancial do prédio, nomeadamente a transformação de um terreno em prédio urbano, através da construção de um edifício posteriormente vendido ou da demolição de uma casa e seguinte venda do terreno para construção.

 

Na realidade, a Requerente adquiriu e vendeu realidades físicas e jurídicas bem diferenciadas: adquiriu um prédio urbano destinado a indústria, cujo traço físico mais marcante era, inquestionavelmente, o edificado (edifício de r/c e primeiro andar) e vendeu um terreno para construção, possivelmente apto a nele serem erigidas edificações destinadas a outros fins. O mesmo é dizer que há que concluir que a Requerente operou uma metamorfose ou alteração substancial do bem adquirido para revenda, o que implicou a caducidade da isenção de IMT de que gozara aquando da aquisição.

Mais,

A procedência do pedido levaria à obtenção de uma vantagem fiscal contrária à ratio da norma. A isenção prevista no art. 7º do CIMT visa evitar uma cumulação de imposto, o que se justifica pelo caráter transitório da titularidade do imóvel pelo revendedor e as razões a ela subjacentes. Em termos simples, a lei pretende que o imposto seja (apenas) aquele que seria cobrado caso a compra e venda tivesse ocorrido diretamente entre o primeiro alienante e o adquirente final. Ora, no caso, a primeira compra, efetuada pela Requerente, incidiu sobre um imóvel com o VPT de € 1.049.908,50; a segunda compra (revenda) sobre um imóvel com o VPT de € 401.130,00. Ou seja, havendo isenção de imposto na primeira transação, teríamos que o imposto cobrado resultaria, a final, menor do que o que seria devido caso não tivesse existido a “interposição” do revendedor, o que não seria, claramente, um resultado conforme à teleologia da lei.

 

V- Decisão arbitral

 

Termos em que se conclui pela total improcedência do pedido.

 

 

VALOR: 79.896,02 euros (valor da liquidação impugnada, incluindo juros compensatórios)

CUSTAS, que se fixam em € 2.448,00, pela Requerente, uma vez que foi total o seu decaimento.

 

 

 11 de abril de 2022

 

 

Os Árbitros

 

 

 

Rui Duarte Morais (presidente e relator)

 

 

 

António Alberto Franco

 

 


 João Menezes Leitão

 

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[1] No qual a Requerente, no essencial, se louva, embora olvidando parte do aí constante, como veremos.

[2] O aresto fundamento – ac. do STA – Pleno- de 26 de Janeiro de 2005, processo nº 0798/04.