SUMÁRIO:
I - Para efeitos do artº 64º do CIRC, o sujeito passivo apenas se encontra na posição de adquirente do imóvel em um único momento, quando adquire o bem, pelo que, para a aplicação da alínea b) do n.º 3 do art.º 64.º do CIRC, o VPT é o que se encontrava definido à data dessa aquisição e que serviu (ou serviria) de base à respetiva liquidação do respetivo IMT;
II - Nas situações de rescisão de contrato de leasing, com a consequente retoma dos imóveis que constituem o seu objeto, em circunstância alguma se pode considerar estarmos perante uma transmissão, nem sequer na perspetiva contabilística, pelo que, também para efeitos do artº 64º do CIRC, o VPT da aquisição é o que serviu ou serviria de base à liquidação de IMT no momento dessa aquisição.
III - No caso de imóveis alienados na vigência do artº 64º do CIRC, mas que foram adquiridos anteriormente à sua entrada em vigor, não existe fundamento para o sujeito passivo proceder a qualquer ajustamento ao valor de aquisição destes imóveis porque os ajustamentos a efetuar nos termos da alínea b) do n.º 3 do art.º 64.º do CIRC, teriam que ter por base o VPT definitivo em vigor na data de aquisição e nunca o VPT definitivo em vigor na data da alienação.
DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros Prof. Doutor Victor Calvete (árbitro-presidente), o Dr. António Pragal Colaço e o Dr. José Ramos Alexandre (árbitros adjuntos), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:
A..., S.A. pessoa coletiva n.º..., com sede na Rua..., n.º ..., no Porto (...-...), apresentou pedido de constituição de Tribunal Arbitral ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º nº 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), e do artº 102º, nº 1, alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, visando a declaração de ilegalidade parcial do ato de liquidação de IRC, nº 2021..., e correspondente acerto de contas nº 2021... referentes ao exercício de 2017, que apurou um montante €367 434,90 a reembolsar.
I - RELATÓRIO
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral deu entrada no CAAD em 2021/07/29 e foi aceite em 2021/08/02, tendo a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) notificada para responder em 2021/08/06.
O Requerente prescindiu de nomear árbitro pelo que, ao abrigo do disposto do n.º 12 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do Tribunal Arbitral coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo legalmente previsto.
Notificadas as partes da nomeação em 2021/09/20, não manifestaram qualquer oposição à nomeação.
O Tribunal foi constituído em 2021/10/11, de conformidade com o previsto na alínea c) do nº 1 do artº 11º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT) constante do Decreto-Lei nº 20/2011, de 20 de janeiro, com as alterações subsequentes.
A entidade Requerida depois de notificada para o efeito, apresentou Resposta em 2021/11/17, na qual se defende por impugnação, juntando o Processo Administrativo em 2021/12/09.
Uma vez que não foi requerida a produção de qualquer prova adicional nem foram suscitadas exceções e porque o processo continha a documentação necessária, o Tribunal, por Despacho de 2021/01/12, dispensou a realização da reunião prevista no artº 18º do RJAT, convidando as partes a produzirem alegações escritas em 15 dias.
As Partes apresentaram alegações formais em que reiteraram os argumentos e fundamentação que já tinham invocado no requerimento de pedido de constituição do tribunal arbitral e na Resposta.
II - MATÉRIA DE FACTO
1 - Factos dados como provados
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O Requerente é uma instituição de crédito que se dedica principalmente à atividade de comércio bancário, sujeito à supervisão do Banco de Portugal de acordo com o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (“RGICSF”), previsto no Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro.
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Com referência ao exercício de 2017 foi objeto de exame à escrita daquele exercício, realizado pelos Serviços de Inspeção Tributária da Unidade dos Grandes Contribuintes, do qual resultaram diversas correções em sede de IRC e de Imposto do Selo (“IS”), conforme se constata do respetivo de relatório de Inspeção Tributária (RIT) junto aos autos.
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Das correções efetuadas no exame e constantes do Relatório final junto, que aqui se dá por reproduzido e com base no qual as partes assentam os fundamentos e os seus argumentos, relevam para o presente pedido de pronúncia arbitral unicamente as seguintes, no valor de €4 549 786,59:
Correção pelo adquirente do imóvel quando adota o VPT para a determinação do resultado tributário na respetiva transmissão (alínea b) do n.º 3 do art. 64.º do CIRC)
A - Imóveis adquiridos sob a forma de arrematação judicial €3.995.851,19 (pág. 30/118 do PA e Anexo 9 do Relatório)
B – Imóveis com não utilização do VPT definitivo nem do valor do ato à data de aquisição €299.803,55 (Pág. 34/118 e Anexo 10 do Relatório)
C - Imóveis adquiridos antes da vigência do art.º 64.º do CIRC €254.131,85 (pág. 35/118 e anexo XI do Relatório)
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O Requerente exerceu o direito de audição sobre o projeto de relatório de inspeção tributária, o que fez, por escrito, em 07.04.2019, conforme documentos incluídos no processo administrativo instrutor, tendo a AT mantido a sua posição conforme pág. 92 e seguintes do Relatório Final datado de 8/04/2021.
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Com base nas diversas correções enumeradas no relatório, nas quais se incluem aquelas cuja legalidade é sindicada neste processo arbitral, a AT efetuou a liquidação de IRC acima identificada, referente ao exercício de 2017, onde apurou, ainda assim, um reembolso de € 367 434,90 (doc. 1), face à Declaração de rendimentos apresentada pelo Requerente.
2 - Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto
Não existem outros factos com relevo para a decisão do mérito da causa que devam considerar-se como não provados.
Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos pela Requerente e dos que constam do processo administrativo.
O Tribunal não tem de se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes no que tange à matéria de facto, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).
Assim, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de direito (cfr. artigo 596.º, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
Tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, consideraram-se provados, com relevo para a decisão à luz do artigo 110º, nº 7, do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, os factos acima elencados.
Não se deram como provadas nem não provadas as alegações feitas pelas partes e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada.
III - DO PEDIDO - Posição das partes
Em defesa da ilegalidade da liquidação que invoca, decorrente do que entende serem as indevidas correções praticadas pelo Serviço de Inspeção, o Requerente alega, em resumo, o seguinte:
Por discordar das enunciadas correções no valor de €4 549 786,59, o que constitui o objeto do presente processo, apresenta agora pedido de pronúncia arbitral na parte respeitante às correções decorrentes do VPT que utilizou para a determinação do resultado tributário nas respetivas transmissões, em conformidade com a leitura que no seu entendimento deve ser feita do artº 64º do Código do IRC, no respeitante à matéria dada como provada.
Tendo em conta a diversidade de correções e dos tributos por ela envolvidos, o Requerente optou por deduzir impugnação judicial apenas quanto a algumas delas em sede de IRC e em todas as referentes ao Imposto de Selo, limitando o pedido de pronúncia arbitral apenas às correções atrás elencadas.
O Requerente diz não se conformar com essas correções, dado que as mesmas padecem de vício de violação de lei por errónea interpretação do disposto no artigo 64.º do Código do IRC.
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No que se refere aos casos em que os imóveis alienados e que foram adquiridos ao Estado, Regiões Autónomas ou Autarquias locais, mediante arrematação judicial ou administrativa, ou ainda adquiridos no âmbito de processos de insolvência ou processos especiais de revitalização sob controlo judicial, o valor que serviu de base à liquidação do IMT, conforme consta expressamente da redação do art.º 64.º do CIRC, não é o VPT definitivo, mas sim o preço constante do ato ou do contrato, conforme determina a regra 16.ª do n.º 4 do art.º 12.º do CIMT, o que a AT não aceitou e efetuou correções indevidas no montante de € 3.995.851,19.
Na verdade, a decisão da AT baseia-se no entendimento de que na ótica do alienante a que se refere a alínea b) do nº 3 do artº 64º do CIRC, o valor a considerar é o valor do contrato, pelo que aceitar o valor patrimonial tributário definitivo que constava na matriz (o que o Requerente considera como sendo o valor patrimonial definitivo) à data relevante está em contradição com a disposição do artº 64º do CIRC.
Na leitura do impugnante, só este procedimento se coaduna e exprime a vontade do legislador: a lei não consagra a adoção do valor patrimonial tributário definitivo à data da aquisição do imóvel. Tal exigência não se encontra expressamente prevista nem sequer é inferível da letra da lei.
A lei consagra expressamente, e tão só, a adoção do valor patrimonial tributário definitivo.
Acresce que quando o legislador tributário alude no artigo 64.º do Código do IRC ao conceito de valor patrimonial tributário definitivo, está a referir-se a um conceito perfeitamente identificado, isto é, pretende que seja considerado o valor definitivo resultante das novas regras objetivas de avaliação previstas no Código do IMI.
Na verdade, a remissão para esse conceito é perfeitamente identificável, desde logo, por força do elemento histórico de interpretação, uma vez que o referido artigo foi aditado ao Código do IRC pelo Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro, aquando da reforma da tributação do património.
Decorre do artº 64º do CIRC, aditado pelo DL 287/2003, de 12/11, que, para efeitos de apuramento do lucro tributável em IRC, deve o sujeito passivo considerar como valor relevante dos imóveis o respetivo valor patrimonial tributário definitivo, sempre que este seja superior ao valor do contrato.
Na verdade, se o VPT definitivo pode ou não servir para determinar o lucro fiscal do alienante, consoante este proceda à demonstração do preço efetivo de venda ou não o faça, já no que se refere ao adquirente, está sempre obrigado a considerar como valor de aquisição para efeitos fiscais o VPT definitivo….
… Sendo certo que o artigo 64.º do Código do IRC, não se refere ao valor tributável para efeitos de IMT nem às regras próprias deste imposto, ao contrário do que sucede, por exemplo, no caso no n.º 2 do artigo 46.º do Código do IRS, mas antes ao valor patrimonial tributário definitivo que serviu de base à liquidação daquele imposto, e tendo presente que, de acordo com o artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil, ex vi artigo 11.º, n.º 1, da LGT, na interpretação da lei deve o intérprete presumir que o legislador “ (...) soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”, é o conceito de valor patrimonial tributário definitivo que se impõe relevar, ou seja, o valor que resulta das novas regras de avaliação.
E tal conceito encontra-se definido no Código do IMI, não obstante ser utilizado pelo Código do IMT, assim como pelo Código do Imposto do Selo. De facto, e por forma a que não restem dúvidas, importa reiterar que, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 3 do artigo 64.º do Código do IRC, “O sujeito passivo adquirente adota o valor patrimonial tributário definitivo para a determinação de qualquer resultado tributável em IRC relativamente ao imóvel” (sublinhado nosso).
É inegável, pois, que a intenção do legislador foi a de que o adquirente adotasse na determinação do lucro tributável o valor patrimonial tributário definitivo do imóvel, que se encontra definido no Código do IMI.
A referência no n.º 2 do artigo 64.º do Código do IRC às “transmissões onerosas previstas no número anterior” não obsta a esta conclusão. Com efeito, não pode considerar-se que, por se referir às “transmissões onerosas previstas no número anterior”, se pretenderia com tal expressão, conjugada com a redação do n.º 1 do artigo 64.º do Código do IRC, relevar o valor tributável para efeitos de IMT.
Assim, urge concluir que a intenção legislativa, confirmada pela letra da lei, é indiscutivelmente a de que o que releva é o valor patrimonial tributário definitivo, ou seja, o VPT definitivo por natureza será o valor determinado pela última avaliação efetuada ao imóvel.
Face ao exposto, apenas a consideração, no apuramento do resultado fiscal, do VPT determinado pela última avaliação efetuada ao imóvel entrosa com a intenção de uniformização do sistema fiscal, assumida pelo legislador, “de modo que o valor tributável para efeitos da tributação das transmissões de imóveis seja, em regra, igualmente relevante para efeitos da determinação do lucro tributável.”
Em face do exposto impõe-se concluir que o artigo 64.º do Código do IRC, ao fazer referência ao valor patrimonial tributário definitivo e não ao valor tributável para efeitos de IMT, pretende que se releve o primeiro, cuja determinação se encontra regulada no Código do IMI.
Ora, tendo em conta que no caso concreto o valor patrimonial tributário definitivo dos imóveis identificados no PIRT era superior ao valor de aquisição constante dos respetivos atos de transmissão, ao relevar o primeiro para efeitos da determinação do lucro tributável, o Requerente agiu no estrito cumprimento dos n.ºs 2 e 3 do artigo 64.º do Código do IRC., atento o supra descrito, afigura-se ilegal a correção em presença, na parte relativa aos imóveis adquiridos por dação em pagamento ou arrematação judicial, pelo que deverá a mesma ser corrigida.
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Quanto aos imóveis que foram adquiridos por rescisão antecipada do respetivo contrato de locação financeira imobiliária e alienados a terceiros, o Requerente, na determinação do seu resultado fiscal, considerou como valor de aquisição dos referidos imóveis o valor das prestações vincendas que ficaram por liquidar na sequência da rescisão antecipada, comparando-o depois com o VPT aplicável à data da alienação ao terceiro adquirente, procedimento este que, no entendimento do Requerente traduz o princípio do primado da substância sobre a forma, que na situação em apreço se materializa na consideração como valor de aquisição o valor em dívida à data da rescisão antecipada dos contratos de leasing.
Por seu turno a AT não teve o mesmo entendimento e corrigiu o valor de €299 803,55 por considerar que o valor relevante é o do VPT reportado ao momento da aquisição dos imóveis para a efetivação de contrato de leasing e não o valor das rendas vincendas.
O Requerente refere que, “embora se repute como válida a afirmação de que os imóveis em causa nunca deixaram e ser propriedade do Requerente durante a vigência dos contratos de locação financeira, considera o Requerente que esta circunstância não é, ainda assim, suficiente para suportar a presente correção.
É que, com efeito, o artigo 64.º do Código do IRC não circunscreve os seus efeitos à aquisição da propriedade plena de imóveis. O referido artigo abrange na sua previsão quaisquer transmissões onerosas de direitos reais sobre bens imóveis.
Durante a vigência do contrato de locação financeira a propriedade do imóvel permanece na titularidade do locador.
Não obstante, pode considerar-se que o exercício do direito de propriedade por este se encontra onerado ou limitado em face da celebração daquele contrato.
Com efeito, sobre o locador recai a obrigação de permitir ao locatário o uso e fruição do imóvel, obrigação, que em nada diverge, em termos materiais, daquela que resulta para o proprietário da constituição de um direito de usufruto, de superfície, de servidão ou de habitação periódica
Esta circunstância é uma das que levam alguns Autores a afirmar que o locatário dispõe da "propriedade económica" do bem.
De facto, contabilisticamente tudo se passa como se o locatário fosse o proprietário do imóvel. É o locatário que regista o bem na sua contabilidade como ativo fixo tangível, procedendo ao reconhecimento dos gastos com depreciações e amortizações.
Na esfera do locador, o contrato é registado em rubricas de créditos.
Atenta a natureza aparentemente complexa e mista que se pode atribuir ao contrato de locação financeira e ao direito do locatário, o que importa averiguar no caso sub judice é se a resolução do contrato de locação financeira, através da qual o Requerente recupera a propriedade plena do imóvel, tem efeitos reais para efeitos do disposto no artigo 64.º do Código do IRC.
De facto, não sendo de desprezar as características daquele contrato e direito que, independentemente da natureza marcadamente obrigacional, os aproximam dos direitos reais, e reconhecendo-se que, do ponto de vista material, o direito de propriedade do locador se encontrava factualmente limitado por aquele contrato e direito, a resolução do contrato de locação financeira equivale à extinção do direito do locatário e à recuperação da propriedade plena pelo locador.
Trata-se de uma situação semelhante à da extinção de qualquer outro direito real, como por exemplo o direito de usufruto.
…
A recuperação da propriedade plena pelo locador em resultado da extinção do direito do locatário deve, assim, poder ser concebida como uma transmissão para efeitos do artigo 64.º do Código do IRC.
Deste modo, entende o Requerente dever concluir-se que a resolução do contrato de locação financeira equivale a uma transmissão onerosa de direitos reais sobre imóveis a favor do locador.
E se assim é, o valor do ato ou contrato para efeitos do artigo 64.º do Código do IRC só pode ser o valor pelo qual o locador readquire a plena propriedade do imóvel ao locatário, correspondente ao valor das rendas vincendas à data da resolução, e não ao valor de aquisição do imóvel.
Sem prejuízo do exposto, e sem conceder quanto ao que supra se aduziu, ainda que subsistissem dúvidas quanto ao valor do ato ou contrato a considerar para efeitos do artigo 64.º do Código do IRC, sempre se alcançaria idêntica conclusão quer por via do enquadramento contabilístico do negócio, quer por via da finalidade que subjaz ao mencionado artigo 64.º do Código do IRC.
Assim, a retoma do imóvel equivale contabilisticamente à sua aquisição, pelo que deve ser o valor do capital em dívida relevado como valor do ato ou do contrato para efeitos do artigo 64.º do Código do IRC.
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No que se reporta à correção de €254 131,85, o Requerente entende que a AT fez uma errada interpretação do artº 64º do CIRC.
Refere a AT que “(…) tendo em conta os pressupostos que de seguida se descrevem, o A... não poderia ter aproveitado a dedução prevista na alínea b) do n.º 3 do art.º 64.º do CIRC enquanto adquirente [porque] (…) na perspetiva do adquirente (neste caso o A...), o apuramento da dedução a efetuar nos termos da alínea b) do n.º 3 do art.º 64.º do CIRC afere-se no ano em que aliena os imóveis, neste caso em 2017 e reporta-se ao momento da aquisição (cfr. p. 34/86)”.
Alega o Requerente, por seu turno que “…não pode o Requerente concordar com tal argumentação porquanto, conforme se indicou supra em II. ii), se se entende que o artigo 64.º se aplica a imóveis adquiridos antes da sua entrada em vigor, então terá de ser aplicado na sua totalidade, e não apenas de forma parcial, porquanto tal norma impõe também um ajustamento ao adquirente.
Caso contrário, estaríamos perante uma aplicação a la carte do artigo 64.º do Código do IRC, visando angariar maior receita fiscal e em expressa contradição com a letra da lei,
Importando ainda atentar aos princípios da tributação das sociedades pelo lucro real vertido no artigo 104.º, n.º 2, da CRP e da igualdade contributiva consagrado nos artigos 13.º e 104.º, n.º 1 e n.º 2, ambos da CRP.
Efetivamente, aplicar tal presunção do artigo 64.º do Código do IRC somente quando tal aumenta o lucro tributável (no momento da alienação ou da saída), e não quando diminui o lucro tributável (no momento da aquisição ou da entrada), constitui uma diferenciação de aplicação normativa em prejuízo do contribuinte sem qualquer justificação plausível, com manifesta incoerência e desproporcionalidade incompatíveis com a natureza unitária exigível ao ordenamento jurídico de um Estado de Direito Democrático, como é o nosso, que encontra expressão no artigo 2º da CRP.
Razão pela qual, também em face do acima exposto se conclui pela ilegalidade da presente correção, a qual não deve ser efetuada.
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Em suma, perante os normativos transcritos e atendendo à teleologia subjacente, entende o Requerente que se impunha considerar, em todos os casos, o VPT definitivo atualizado, sendo parcialmente indevida a correção feita pelos serviços de inspeção tributária, no montante de € 4.549.786,59 (€ 3.995.851,19 + € 299.803,55 + € 254.131,85), que deverá por isso, ser anulada.
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Notificada do pedido de pronúncia arbitral, veio a AT, nomeadamente, defender o seguinte no sentido da improcedência do pedido arbitral:
Contrariamente ao entendimento perfilhado pelo Requerente, no sentido de que o VPT a considerar deve ser o definitivo à data da alienação, com base na interpretação do artigo 64.º do CIRC, e, ainda, na redação introduzida pelo Decreto-lei n.º 159/2009 ao n.º 3 do desse preceito legal, entende-se que:
a. O Requerente apenas se encontra na posição de adquirente do imóvel em um único momento, quando adquire o bem, logo, para a aplicação da alínea b) do n.º 3 do art.º 64.º do CIRC, o VPT definitivo é o que se encontrava definido à data dessa aquisição e que serviu (ou serviria) de base à respetiva liquidação do respetivo IMT;
b. O conceito de VPT, definido no art.º 7.º do CIMI, é determinado nos termos dos artigos nº 38.º a 46.º do CIMI, e torna-se definitivo com a respetiva notificação do resultado da avaliação final;
c. O VPT definitivo que se impõe aferir, é tão só o do momento em que se verifica a transmissão do direito real sobre bem imóvel que faz operar o art.º 64.º do CIRC, ou seja, é, no caso do sujeito passivo alienante o VPT definitivo verificado na alienação, e no caso do sujeito passivo adquirente (caso em discussão) o VPT definitivo que constava aquando da aquisição;
d. Sobre a obrigatoriedade de considerar o VPT definitivo, à luz da invocada nova redação da alínea b) do n.º 3 do art.º 64.º do CIRC, introduzida pelo D.L. n.º 159/2009, torna-se importante clarificar que a intenção do legislador foi exatamente de alcançar a neutralidade fiscal na tributação da transmissão do imóvel, na medida em que o alienante acresce ao lucro tributável a diferença positiva entre o VPT definitivo do imóvel e o valor do contrato, e, posteriormente, o adquirente, quando vender o imóvel, irá deduzir a mesma importância.
Pelo que, bem concluíram os SIT que «na perspetiva do adquirente, o momento a ter em conta, para efeitos de apuramento do VPT definitivo é o da aquisição do bem que, quando alienado, pode ou não resultar numa dedução no âmbito do apuramento do lucro tributável.
Não é correta a interpretação do Requerente no que respeita à aplicação da regra 16.ª do n.º 4 do art.º 12.º do CIRC, quando afirma que o VPT a considerar é o VPT definitivo, e que este valor, o qual decorre da última avaliação efetuada ao imóvel, não deve ser confundido com o valor tributável para efeitos de IMT, não se reporta ao momento da aquisição mas sim aquando da alienação, e, sempre que seja superior ao valor do contrato, é o que deve ser utilizado pelo adquirente para efeitos de apuramento do lucro tributável em IRC.
Deverá ressalvar-se que a razão da divergência entre o entendimento do Requerente e da AT se prende com o momento e com o conceito a atender para efeitos de determinação do VPT definitivo, sustentando a Requerente que é relevante a data da alienação, sendo que os SIT defendem que a data a considerar, quanto ao sujeito passivo adquirente, é a data da aquisição.
No que refere à correção de €3 995 851.19, o entendimento do Serviços de Inspeção Tributária é consentâneo com a melhor interpretação da lei porque “… em momento algum se disse que não é aquele o relevante. Contudo, sendo aquele o relevante,…, deve reportar ao momento da aquisição, pois se assim não fosse desvirtuaria a intenção legislativa de repercutir no lucro tributável os valores de mercado dos bens imóveis objeto de transmissão em conformidade com o que dispõe o n.º 1 do art.º 64.º do CIRC… É assim claro o n.º 1 do art.º 64.º quando determina que: “(…) devem adotar (…) valores normais de mercado que não podem ser inferiores aos valores patrimoniais definitivos que serviram de base à liquidação do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT) ou que serviriam no caso de não haver lugar à liquidação deste imposto.
E, atento ao disposto nos n.º 2 e n.º 3 do mesmo artigo, o ajustamento a efetuar pelo alienante, caso o VPT definitivo seja superior ao valor constante do contrato, deve corresponder exatamente aquele de que o adquirente aproveita no momento da transmissão do imóvel.
…
No que concerne ao caso concreto da aquisição por arrematação judicial, relembra-se: O n.º 1 do art.º 12.º do CIMT dispõe que “[o] IMT incidirá sobre o valor constante do ato ou do contrato ou sobre o valor patrimonial tributário dos imóveis, consoante o que for maior”.
No entanto, o n.º 4 do artigo 12.º do CIMT refere que, “o disposto nos números anteriores [incluindo, portanto, o disposto no n.º 1 do art.º 12.º do CIMT] entende-se, porém, sem prejuízo das seguintes regras:”
E a regra 5.ª do n.º 4 do art.º 12.º do CIMT dispõe que “nas transmissões por meio de dação de bens em pagamento, o imposto é calculado sobre o seu valor patrimonial tributário, ou sobre a importância da dívida que for paga com os bens transmitidos, se for superior”; determinando a regra 16.ª do mesmo número que “o valor dos bens adquiridos ao Estado, às Regiões Autónomas ou às autarquias locais, bem como o dos adquiridos mediante arrematação judicial ou administrativa, é o preço constante do ato ou do contrato”
Conjugando este normativo com o art.º 64.º do CIRC, conclui-se o que já havia sido entendimento em sede de projeto de relatório de inspeção e que a seguir se reitera:
Sempre que se estiver perante situações previstas no n.º 1 do artigo 64.º do Código do IRC, para efeitos da determinação do lucro tributável nos termos do presente Código, os valores normais de mercado não podem ser inferiores aos valores patrimoniais tributários que serviram de base à liquidação do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT) e quando estivermos perante imóveis adquiridos ao Estado, Regiões Autónomas ou Autarquias locais, ou mediante arrematação judicial ou administrativa, o valor que serviu de base à liquidação do IMT, conforme consta expressamente da redação do art.º 64.º do CIRC, não é o VPT definitivo, mas sim o valor constante do ato ou do contrato, conforme determina a regra 16.ª do n.º 4 do art.º 12.º do CIMT.
Quanto à correção no valor de €299 803,55 respeitante aos imóveis adquiridos por rescisão antecipada do respetivo contrato de locação financeira imobiliária e alienados a terceiros, entende “que o dissídio que está na origem da correção contestada decorre de diferentes entendimentos sobre a determinação do valor de aquisição de bens imóveis alienados na sequência de rescisão antecipada dos contratos de locação financeira.
«Acresce que, não se ignorando que, sob o ponto de vista contabilístico, durante a locação financeira o bem locado não pertence ao locador, mas antes ao locatário (princípio contabilístico da substância sobre a forma), na perspetiva fiscal – que é o que interessa nesta discussão – a transmissão onerosa e, consequentemente, a transferência jurídica da propriedade sobre o imóvel locado, ocorreu aquando da aquisição do imóvel, para posteriormente ser objeto de um contrato de locação financeira. Ou seja, o bem locado não deixa de ser propriedade jurídica do locador pelo facto de a fruição ter sido cedida a um terceiro (locatário) no âmbito de uma locação financeira, razão pela qual não se pode atender à afirmação do A... quando diz que na resolução do contrato de locação financeira recupera a propriedade plena do imóvel.»
Efetivamente, um imóvel locado nunca deixa de ser propriedade do Requerente durante a vigência dos contratos de locação financeira, portanto, a rescisão antecipada do contrato não é equiparável a uma aquisição para efeitos do IMT e igualmente para efeitos do artigo 64.º do Código do IRC, pese embora, do ponto de vista contabilístico, o bem imóvel seja reintegrado no ativo da locadora.
«Assim, ao contrário do que argumenta o banco, o valor de aquisição do bem não pode ser o valor das prestações vincendas que ficaram por liquidar na sequência da rescisão antecipada dos contratos, uma vez que esse não é o momento em que o locador adquire juridicamente a propriedade sobre o bem objeto de locação. Por conseguinte, também não tem lógica comparar esse valor com o VPT do imóvel (locado) na data da sua alienação a terceiro, devendo o valor de aquisição ser comparado com o VPT existente à data da aquisição do bem, uma vez que a transmissão do bem para o banco ocorreu nessa data.»
Quanto à correção referente à dedução relativa aos imóveis adquiridos em data anterior à vigência do art.º 64.º do CIRC, no valor de €254.131,85, entende a Requerida que: «…Relembre-se que a correção proposta no projeto de relatório de inspeção resultou do facto do A... ter efetuado ajustamentos enquanto adquirente relativamente a imóveis adquiridos antes de 2004-01-01, através dos quais deduziu a diferença entre o VPT definitivo, vigente à data de alienação, e o valor de aquisição constante da contabilidade
O art.º 64.º do CIRC aplica-se tanto aos alienantes como aos adquirentes de bens imóveis, nomeadamente a alínea a) e a alínea b) do n.º 3 daquele artigo, respetivamente.
Ainda que o período de tributação a considerar para efeitos de aplicação daquele preceito legal seja aquele em que ocorre a alienação, no caso o ano de 2017, há que ter em conta a perspetiva em análise
A correção aqui em apreço reporta-se à posição do Requerente enquanto adquirente dos bens imóveis cuja aquisição ocorreu em data anterior à vigência daquele normativo.
Assim, na perspetiva do adquirente, o apuramento da dedução a efetuar nos termos da alínea b) do n.º 3 do art.º 64.º do CIRC afere-se no ano em que aliena os imóveis, neste caso em 2017, e reporta-se ao momento da aquisição, resultando num ajustamento efetuado diretamente ao valor de aquisição.
Ou seja, a alínea b) do n.º 3 do art.º 64.º do CIRC tem como objetivo ajustar o valor de aquisição contabilizado na esfera do adquirente aos valores normais de mercado.
Caso o VPT definitivo seja superior ao valor constante do contrato à data de aquisição, a dedução de que o sujeito passivo adquirente (o Requerente) aproveita no momento da transmissão do imóvel (2017), deve corresponder exatamente ao acréscimo efetuado pelo sujeito passivo alienante no período de tributação em que vendeu os bens imóveis ao adquirente.
Ora, os sujeitos passivos que venderam os bens imóveis ao Requerente em data anterior à vigência do anterior art.º 64.º do CIRC (2004-01-01) não tiveram que promover qualquer acréscimo ao lucro tributável dos períodos de tributação em que ocorreram as alienações ou acionar qualquer mecanismo legal para o evitar, uma vez que não existia enquadramento legal que determinasse a correção ao lucro tributável da diferença positiva entre o VPT definitivo e o valor do ato ou contrato.
Assim sendo, tendo em consideração que a correção a efetuar pelo Requerente enquanto adquirente reporta-se ao momento da aquisição e que esta ocorreu em data anterior à vigência do art.º 64.º do CIRC, o Banco, para efeitos do disposto na alínea b) do n.º 3 do art.º 64.º do CIRC, não poderia ter deduzido qualquer importância ao lucro tributável de 2017, relativamente aos imóveis adquiridos em data anterior a 2004-01 01.
Neste sentido não existe qualquer fundamento para o Banco proceder a qualquer ajustamento ao valor de aquisição destes imóveis, até porque qualquer ajustamento a efetuar nos termos da alínea b) do n.º 3 do art.º 64.º do CIRC, teria que ter por base o VPT definitivo em vigor na data de aquisição e nunca o VPT definitivo em vigor na data da alienação.»
IV - SANEAMENTO
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O Tribunal é materialmente competente e foi regularmente constituído de acordo com os artº 2º, nº 1, alínea a), 5º e 6º, nº 2, alínea a), todos do RJAT.
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As partes têm personalidade jurídica, gozam de capacidade judiciária, são legítimas e estão devidamente representadas, nos termos do artº 4º e 10º do RJAT e artº 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de março.
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O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT.
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O processo não enferma de nulidades, pelo que não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.
V - MATÉRIA DE DIREITO
Constitui objeto do presente processo a pronúncia arbitral sobre uma parte da liquidação atrás devidamente identificada, devendo ser aferida a legalidade das correções efetuadas pela AT.
No essencial e tendo em conta a matéria de facto dada como provada, o requerente identifica três conjuntos de factos relativamente aos quais considera que com tais correções foi violado o disposto no artº 64º do Código do IRC.
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Correções decorrentes das transmissões de imóveis adquiridos sobre arrematação judicial
A primeira parcela das correções, no montante de €3 995 851,19, diz respeito a imóveis alienados que antes haviam sido adquiridos por dação em pagamento ou ao Estado, Regiões Autónomas ou Autarquias locais, mediante arrematação judicial ou administrativa, ou adquiridos no âmbito de processos de insolvência ou processos de revitalização sob controlo judicial.
Alega o Requerente que procedeu às correções ao valor de transmissão de direitos reais sobre bens imóveis na estrita observância do que dispõe a alínea b) do nº 3 artº 64º do CIRC para apuramento do resultado fiscal do exercício, considerando, como é seu entendimento, como valor de aquisição o VPT definitivo à data da alienação.
A AT, com uma leitura diferente sobre o que está disposto naquele artº 64º do CIRC, efetuou correções no citado montante defendendo que “Sempre que se estiver perante situações previstas no n.º 1 do artigo 64.º do Código do IRC, para efeitos da determinação do lucro tributável nos termos do presente Código, os valores normais de mercado não podem ser inferiores aos valores patrimoniais tributários que serviram de base à liquidação do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT) e quando estivermos perante imóveis adquiridos ao Estado, Regiões Autónomas ou Autarquias locais, ou mediante arrematação judicial ou administrativa, o valor que serviu de base à liquidação do IMT, conforme consta expressamente da redação do art.º 64.º do CIRC, não é o VPT definitivo, mas sim o valor constante do ato ou do contrato, conforme determina a regra 16.ª do n.º 4 do art.º 12.º do CIMT.».
Ou seja, enquanto o Requerente entende que o referencial de comparação como alienante, mesmo no caso das aquisições em dação em pagamento ou ao estado ou arrematação judicial, é o VPT definitivo que consta na matriz à data da alienação, a AT considera que esse referencial é antes o valor do contrato, como resulta do artº 64º, nº 3, alínea a) do CIRC dada a necessidade de conjugação desta norma com a regra constante na subalínea 16ª, do nº 4, do artº 12º do CIMT.
Esta matéria já se encontra tratada na jurisprudência, tanto judicial como arbitral, sem, contudo, o entendimento final ter reunido consenso[1], embora com tendência maioritária.
Vejamos.
Dispõe atualmente o artº 64º do CIRC o seguinte:
Artigo 64.º
Correções ao valor de transmissão de direitos reais sobre bens imóveis
1 — Os alienantes e adquirentes de direitos reais sobre bens imóveis devem adotar, para efeitos da determinação do lucro tributável nos termos do presente Código, valores normais de mercado que não podem ser inferiores aos valores patrimoniais tributários definitivos que serviram de base à liquidação do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT) ou que serviriam no caso de não haver lugar à liquidação deste imposto.
2 — Sempre que, nas transmissões onerosas previstas no número anterior, o valor constante do contrato seja inferior ao valor patrimonial tributário definitivo do imóvel, é este o valor a considerar pelo alienante e adquirente, para determinação do lucro tributável.
3 — Para aplicação do disposto no número anterior:
a) O sujeito passivo alienante deve efetuar uma correção, na declaração de rendimentos do período de tributação a que é imputável o rendimento obtido com a operação de transmissão, correspondente à diferença positiva entre o valor patrimonial tributário definitivo do imóvel e o valor constante do contrato;
b) O sujeito passivo adquirente adota o valor patrimonial tributário definitivo para a determinação de qualquer resultado tributável em IRC relativamente ao imóvel.
4 — …
5 — …
6 — …
Por seu turno o artº 12º do CIMT, na parte que interesse a este pedido arbitral, estabelece:
1 - O IMT incidirá sobre o valor constante do ato ou do contrato ou sobre o valor patrimonial tributário dos imóveis, consoante o que for maior.
2 - No caso de imóveis omissos na matriz ou nela inscritos sem valor patrimonial tributário, bem como de bens ou direitos não sujeitos a inscrição matricial, o valor patrimonial tributário é determinado nos termos do CIMI.
3 - Ao valor patrimonial tributário junta-se o valor declarado das partes integrantes, quando o mesmo não esteja incluído no referido valor patrimonial.
4 - O disposto nos números anteriores entende-se, porém, sem prejuízo das seguintes regras: (…)
…
16.ª O valor dos bens adquiridos ao Estado, às Regiões Autónomas ou às autarquias locais, bem como o dos adquiridos mediante arrematação judicial ou administrativa, é o preço constante do ato ou do contrato;
(…)
A violação da lei que o Requerente imputa à liquidação tem que ver com a divergência na interpretação do artº 64º do CIRC no que se refere unicamente à noção de valor patrimonial definitivo (VPT) a considerar nas correções decorrentes da determinação do seu nº 2 quando o sujeito passivo se encontra na posição de alienante.
Em geral, quando falamos de VPT definitivo, temos que pensar imediatamente nas regras do Código do IMI que é o diploma de referência no que respeita à determinação do valor dos imóveis para efeitos tributários, nomeadamente no artº 7º, deste diploma legal onde encontramos a definição legal de VPT.
Como ajuda a uma correta definição do conceito aqui em análise, há, primeiramente, que ter em conta que no quadro do novo sistema de avaliação patrimonial criado pelo Decreto-Lei n.º 287/2003 “definitivo” era uma mera contraposição aos VPT “transitórios” que antecediam a sua fixação.
A noção final de VPT resulta da consideração do disposto também nos art.º 38º a 46º e 76º do Código de IMI, ou seja, só depois de terem transitado em julgado as avaliações efetuadas nos termos do Código temos o VPT definitivo.
Todavia, diversos diplomas derrogam este conceito de VPT atentas as especificidades dos factos tributários que estejam em causa e consoante as finalidades da tributação em cada um dos impostos, e essa circunstância comprova-se desde logo por via do artº 12º do CIMT, para efeitos de liquidação de IMT, mas que também acontece, a nosso ver, no caso do artº 64º do CIRC em relação aos imóveis adquiridos por dação em pagamento ou ao Estado, Regiões Autónomas ou Autarquias locais, mediante arrematação judicial ou administrativa, ou adquiridos no âmbito de processos de insolvência ou processos de revitalização sob controlo judicial quando o respetivo valor de aquisição for inferior ao VPT.
Não encontramos nem letra nem na teleologia o artº 64º do CIRC fundamentação suficiente para concordar com a pretensão de que ele contém uma regra específica de determinação do valor patrimonial tributário definitivo diferente da regra do artº 12º do CIMT, para apuramento do valor tributável em sede de IRC, como defende o Requerente respaldado na decisão constante do Proc.º 105/2019-T, do CAAD.
Com efeito, dispõe o nº 2 do artº 64º do CIRC que para efeitos de determinação do lucro tributável nas transmissões onerosas de imóveis referidas no nº 1, sempre que o valor do contrato seja inferior ao VPT definitivo, então é esse o que deve ser considerado tanto para o adquirente como para o alienante.
Todavia, o sujeito passivo deve efetuar “uma correção correspondente à diferença positiva entre o valor patrimonial tributário definitivo do imóvel e o valor constante do contrato” que, por força do corpo no nº 2 deste artº 64º, terá que ser o valor que serviu ou serviria de base para a liquidação do IMT.
Então, nos termos da lei, qual é o valor patrimonial definitivo que deve servir de base à liquidação de IMT sempre a ela haja lugar?
Aqui, obviamente, rege a norma decorrente do artº 12º do CIMT que prevê na regra 16ª do nº 4 que para efeitos desse imposto (IMT) o valor a considerar nos casos de aquisição de imóveis por dação em pagamento ou ao Estado, Regiões Autónomas ou Autarquias locais, mediante arrematação judicial ou administrativa, ou adquiridos no âmbito de processos de insolvência ou processos de revitalização sob controlo judicial, é o valor do contrato, pelo que para efeitos do artº 64º do CIRC temos que aceitar como valor patrimonial definitivo o que serve ou serviria de base à liquidação de IMT na alienação destes imóveis.
E entende-se a derrogação da regra geral nestes casos, para efeitos de IMT, porque como decidiu o Ac. proferido no Proc.º 01508/12, de 05/11/2014, do STA, “as razões de perigo de evasão ou fraude fiscal no que respeita à declaração do valor real das transações não existirão, por regra em condições normais, quando o facto tributário sujeito a imposto for a aquisição de imóveis ou direitos sobre eles ao Estado, Regiões Autónomas e Autarquias Locais.” E, citando José Maria Fernandes Pires (Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Almedina, 2010, pág. 211/213), acrescentava: “pelas mesmas razões referidas, a Lei manda alargar a sua aplicação a outras aquisições sujeitas a imposto em que essas entidades intervenham. É o caso das arrematações judiciais ou administrativas de bens imóveis”. Referindo a norma que as transmissões em causa são as do número anterior e que o número anterior se refere ao valor tributário definitivo que serviu ou serviria de base à liquidação de IMT, então não restam dúvidas de que o CIRC não contém qualquer conceito de valor patrimonial tributários definitivo diferente daquele que serve de base à liquidação de IMT e que deve servir de base às correções do artº 64º.
Por outro lado, temos que ter em atenção o sentido da determinação do valor para efeito de IRC.
Se está em causa uma diferença (e, como se escrevia no Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 287/2003, é isso que está em causa: “os valores patrimoniais tributários que servirem de base à liquidação do IMT passam a constituir o valor mínimo para a determinação do lucro tributável”) não faz sentido o VPT ser o mesmo na data da aquisição e da alienação. O lucro tem de ser a diferença entre o preço de compra (antes) e o preço de venda (depois) – não pode ser determinado ao mesmo tempo. Se em vez de dois valores houver só um, não pode, por definição, haver lucro.
No fundo, acolhendo a pretensão do Requerente uma parte do seu ganho – a diferença entre o que pagou para adquirir os imóveis em hasta pública e a avaliação do VPT – não seria tributado. Na verdade, só seria tributada a diferença entre a avaliação do VPT (um valor atualizado) e o preço de venda que conseguisse por esses imóveis (algo mais do que o tal VPT).
Portanto, no respeitante aos imóveis adquiridos ao Estado, Regiões Autónomas ou Autarquias Locais ou mediante arrematação judicial ou administrativa, ou ainda adquiridos no âmbito de processos de insolvência ou processos especiais de revitalização sob controlo judicial, o valor que serviu de base à liquidação de IMT, conforme o citado artº 64º do CIRC, não é o VPT definitivo, mas sim o preço constante do ato ou contrato, conforme a norma que decorre da regra 16ª do nº 4 do artº 12º do CIMT.
E esta posição interpretativa tem também respaldo nas teses defendidas no Processo nº 1752/15.9BEPRT, de 15/06/2016 do TAF do Porto; no Proc.º 180/2015-T, de 17/11/2015, do CAAD; e no Proc.º 169/2018-T de 24/12/2018, do CAAD; Proc.º 1508/12, de 05/11/2012 e Proc.º 0816/08.08BECBR, de 21/11/2019, ambos do STA.
Improcede, pois, a pretensão do Requerente mantendo-se, quanto a esta parte, a liquidação impugnada por não enfermar de ilegalidade.
b) Correções decorrentes da não utilização do VPT definitivo nem do valor do ato à data de aquisição.
Vem ainda o requerente apontar uma outra ilegalidade à liquidação, alegando que no que “concerne os imóveis que foram adquiridos por rescisão antecipada do respetivo contrato de locação financeira imobiliária e alienados a terceiros, na determinação do seu resultado fiscal, o Requerente considerou como valor de aquisição dos referidos imóveis o valor das prestações vincendas que ficaram por liquidar na sequência da rescisão antecipada, comparando-o depois com o VPT aplicável à data da alienação ao terceiro adquirente, procedimento este que, no entendimento do Requerente traduz o princípio do primado da substância sobre a forma, que na situação em apreço se materializa na consideração como valor de aquisição o valor em dívida à data da rescisão antecipada dos contratos de leasing”.
A AT, por seu turno, não aceitando a operação realizado pelo Requerente, havia procedido à reversão da dedução correspondente, no montante de € 299.803,55, procedimento que o Requerente reputa de ilegal por violação do já citado artº 64º do CIRC.
Diz o querente, em sua defesa, “É que, com efeito, o artigo 64.º do Código do IRC não circunscreve os seus efeitos à aquisição da propriedade plena de imóveis. O referido artigo abrange na sua previsão quaisquer transmissões onerosas de direitos reais sobre bens imóveis.”
O Requerente defende, portanto, que o valor de aquisição dos imóveis recuperados por incumprimento em contratos de leasing, segundo o regime do artº 64º do CIRC, é o correspondente ao valor das prestações vincendas que ficaram por liquidar e que esse momento equivale a uma transmissão, isto porque “atenta a natureza aparentemente complexa e mista que se pode atribuir ao contrato de locação financeira e ao direito do locatário, o que importa averiguar no caso sub judice é se a resolução do contrato de locação financeira, através da qual o Requerente recupera a propriedade plena do imóvel, tem efeitos reais para efeitos do disposto no artigo 64.º do Código do IRC”.
“…De facto, não sendo de desprezar as características daquele contrato e direito que, independentemente da natureza marcadamente obrigacional, os aproximam dos direitos reais, e reconhecendo-se que, do ponto de vista material, o direito de propriedade do locador se encontrava factualmente limitado por aquele contrato e direito, a resolução do contrato de locação financeira equivale à extinção do direito do locatário e à recuperação da propriedade plena pelo locador”.
“Trata-se de uma situação semelhante à da extinção de qualquer outro direito real, como por exemplo o direito de usufruto”.
Começando a análise por esta última afirmação, discorda-se da conclusão de que a consolidação que se verifica no usufruto corresponda, para efeitos fiscais, a uma transmissão.
Neste sentido, subscrevendo a tese que no entender do Tribunal mais se coaduna com a lei, ao contrário da posição do Requerente para efeitos do artº 64º do CIRC, a consolidação da propriedade com o usufruto não se configura como uma transmissão, uma vez que se considera “… que a extinção do usufruto por morte do usufrutuário não transforma o radiciário em adquirente porque o que se verifica é a expansão do direito à propriedade plena… O direito de propriedade encontra-se limitado enquanto dura o usufruto, mas que imediatamente se expande até à sua plenitude logo que ocorra a morte do usufrutuário”.
Nesta conformidade …“Não parece, pois, incoerente, inconsistente ou fora da realidade sugerir que, com a morte do usufrutuário, não se verifica a consolidação da propriedade com o usufruto, mas apenas a expansão daquela até ao limite das suas faculdades e que esta expansão não se configura, do ponto de vista legal, como um facto suscetível de ser objeto de “aquisição” pelo proprietário e que possa, consequentemente, ser objeto de incidência de imposto do selo” (como se decidiu no Procº 167/2021-T, de 29/11/202).
Face a tal posição, o argumentário do Requerente soçobra quando defende que a rescisão do contrato de leasing é equivalente a uma transmissão, aliás, como refere também a decisão proferida no Procº nº 1752/15.9BEPRT, de 15/06/2016 do TAF do Porto, atrás referido quando esclarece: “Daí que não se possa considerar, ao contrário do que defende o Impugnante, que o valor de aquisição do bem é o valor das prestações vincendas que ficaram por liquidar na sequência da rescisão antecipada dos contratos, pois que não é esse o momento em que o locador adquire juridicamente a propriedade sobre o bem locado”.
Assim sendo, como refere este aresto “…também não faz sentido comparar esse valor [o das prestações vincendas] com o VPT do imóvel (bem locado) na data da sua alienação a terceiro, devendo antes aquele valor de aquisição (apurado nos termos acima descritos) ser comparado com o VPT existente à data da aquisição do bem locado pelo Impugnante (pois que a transmissão do bem para o Impugnante ocorreu nessa data).
“Não se ignora que, de um ponto de vista puramente contabilístico, durante a locação financeira o bem locado não pertence ao locador, mas antes ao locatário (princípio da substância sobre a forma). No entanto, de um ponto de vista jurídico-fiscal – que é o que ora nos interessa – a transmissão onerosa e, consequentemente, a transferência jurídica da propriedade sobre o imóvel locado, ocorreu aquando da aquisição do imóvel pelo Impugnante, para posteriormente ser objeto de um contrato de locação financeira. Ou seja, o bem locado não deixa de ser da propriedade jurídica do locador pelo facto de o seu gozo ter sido cedido a um terceiro no âmbito de uma locação financeira. Por conseguinte, não é possível afirmar – como faz o Impugnante – que o bem locado “reentra” na esfera jurídica do locador aquando da rescisão antecipada daquele contrato”.
Concluindo, como o momento da aquisição se verifica quando o Banco adquire o bem imóvel objeto do contrato, os valores a considerar como sendo os valores patrimoniais tributários, dado os disposto no artº 64º do CIRC, são os correspondentes aos VPT que serviram ou serviriam de base à liquidação de IMT devido pelas respetivas aquisições, pelo que bem andou a AT em corrigir os valores de aquisição quando correspondente aos valores das prestações vincendas porque a isso se opõe uma mais adequada leitura do artº 64º.
De igual modo improcede o argumento de que “Sem prejuízo do exposto, …, ainda que subsistissem dúvidas quanto ao valor do ato ou contrato a considerar para efeitos do artigo 64.º do Código do IRC, sempre se alcançaria idêntica conclusão quer por via do enquadramento contabilístico do negócio, quer por via da finalidade que subjaz ao mencionado artigo 64.º do Código do IRC. …, A retoma do imóvel equivale contabilisticamente à sua aquisição, pelo que deve ser o valor do capital em dívida relevado como valor do ato ou do contrato para efeitos do artigo 64.º do Código do IRC”.
Já atrás deixámos dito que no entender do Tribunal, nas situações de rescisão de contrato de leasing, com a consequente retoma dos imóveis que constituem o seu objeto, em circunstância nenhuma se pode considerar estarmos perante uma transmissão, nem sequer na perspetiva contabilística como se entendeu também no citado processo do TAF do Porto.
Já no que refere à questão do que se considera ser o valor patrimonial definitivo, é aqui inteiramente aplicável o que ficou dito sobre as anteriores correções em contratos de aquisição de imóveis em processos judiciais, ou seja, o valor a considerar é como estabelece o nº 1 do artº 64º, o que serviu ou serviria de base à liquidação de IMT no momento da aquisição, porque no momento da rescisão do contrato, com a consequente consolidação do direito e propriedade, não há qualquer transmissão. A transmissão relevante dos contratos de leasing nestas circunstâncias é que ocorreu com a aquisição inicial do imóvel para o ceder mediante contrato ao locatário de tal contrato.
Entende-se, pois, que não existir qualquer violação do artº 64º do CIRC por parte da Autoridade Tributária e Aduaneira.
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Correções em caso de imóveis adquiridos antes da vigência do art.º 64.º do CIRC
Por último, no caso dos imóveis adquiridos antes da vigência do artigo 64.º do CIRC, o Requerente discorda também em absoluto das correções levadas a cabo pela AT no montante de € 254.131,85.
Entendeu a AT (cfr. p. 35/86) que “…o A... não poderia ter aproveitado a dedução prevista na alínea b) do n.º 3 do art.º 64.º do CIRC enquanto adquirente [porque] (…) na perspetiva do adquirente, o apuramento da dedução a efetuar nos termos da alínea b) do n.º 3 do art.º 64.º do CIRC afere-se no ano em que aliena os imóveis, neste caso em 2017 e reporta-se ao momento da aquisição”.
Refere-se este bloco aos casos em que os imóveis foram recuperados por rescisão antecipada do respetivo contrato de locação financeira imobiliária e alienados a terceiros, mas que foram adquiridos pelo Requerente antes da entrada em vigor do artº 64º do CIRC.
O que está aqui em causa é determinar qual o momento a que se atende na aplicação da alínea b) do nº 3 do artº 64º do CIRC no que se refere ao adquirente.
O artº 64º do CIRC faz questão de determinar no nº1 que as suas regras devem ser adotadas tanto ao alienante como ao adquirente dos direitos reais sobre imóveis.
Ou seja, até 2004 o CIRC não continha quaisquer regras sobre estas correções pelo que se põe a questão de saber se as mesmas podem ser aplicadas a aquisições anteriores em que a posterior transmissão ocorre já no âmbito da sua vigência, e se, como refere a AT, “não existe qualquer fundamento para o Banco proceder a qualquer ajustamento ao valor de aquisição destes imóveis, até porque qualquer ajustamento a efetuar nos termos da alínea b) do n.º 3 do art.º 64.º do CIRC, teria que ter por base o VPT definitivo em vigor na data de aquisição e nunca o VPT definitivo em vigor na data da alienação”, sendo que, antes da vigência do art.º 64.º do CIRC, não havia um patamar tido por objetivo que pudesse servir de limiar para esse efeito.
Contrariamente ao que acontecia no âmbito da redação do ex-artigo 58.º-A, o adquirente dos direitos reais sobre bens imóveis já não pode contabilizar os imóveis pelo valor patrimonial tributário (VPT) quando superior ao valor de aquisição, tendo de respeitar o conceito de custo de aquisição referido nos normativos contabilísticos. Portanto, como o imóvel já não pode ser contabilizado pelo VPT já não pode ser aceite o acréscimo de depreciações que resultavam dessa contabilização.
O que o Requerente pretende obter, no fundo, seria a retroação de um mecanismo para tempos em que ele não tinha equivalente, o que se afigura como não exequível.
Deste modo, considera-se que improcede a alegação do Requerente.
VI- DO DIREITO DO REQUERENTE A JUROS INDEMNIZATÓRIOS RESULTANTE DA ANULAÇÃO PARCIAL ORA DEVIDA DA LIQUIDAÇÃO
Finalmente o Tribunal considera que a liquidação de juros indemnizatórios só pode ter por base a existência do pagamento de um tributo indevido que tenha sido exigido (liquidado) por erro de facto ou de direito imputável aos Serviços, como expressamente estabelece o artº 43º da Lei Geral Tributária.
Não se constatando qualquer ilegalidade na liquidação impugnada não estão preenchidos os pressupostos para a existência de reembolso a que devam acrescer juros, como é óbvio.
Consequentemente fica prejudicada a apreciação desta questão por improcedência da questão principal da qual depende.
VII - DA DECISÃO
Termos em que se decide:
-
Julgar totalmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral de conformidade com o exposto e, em consequência, não anular a liquidação impugnada; pelo que,
-
Consequentemente, não pode proceder o pedido de pagamento de juros indemnizatórios.
-
Condenar o Requerente no pagamento das custas do processo.
VIII - VALOR DO PROCESSO
Considerando o estabelecido no art. 296.º, n.º 1, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 4.549.786,59 (quatro milhões, quinhentos e quarenta e nove mil, setecentos e oitenta e seis Euros e cinquenta e nove cêntimos).
IX - CUSTAS
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 57 222,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, cujo pagamento incumbe ao Requerente.
Lisboa, 26 de abril de 2022.
Tribunal Arbitral Coletivo
Árbitro Presidente
Victor Calvete
Árbitro Adjunto (com declaração de conformidade)
António Pragal Colaço
Árbitro Relator
José Ramos Alexandre
DECLARAÇÃO DE CONFORMIDADE
Estão em causa nos presentes autos arbitrais os seguintes actos:
Correção pelo adquirente do imóvel quando adota o VPT para a determinação do resultado tributário na respetiva transmissão (alínea b) do n.º 3 do art. 64.º do CIRC)
-
Imóveis adquiridos sob a forma de arrematação judicial €3.995.851,19 (pág. 30/118 do PA e Anexo 9 do Relatório);
-
Imóveis com não utilização do VPT definitivo nem do valor do ato ou contrato, à data de aquisição €299.803,55 (Pág. 34/118 e Anexo 10 do Relatório)
-
- Imóveis adquiridos antes da vigência do art.º 64.º do CIRC €254.131,85 (pág. 35/118 e anexo XI do Relatório)
Tudo totalizando a correcção ao lucro tributável no montante total de €4 549 786,59.
Respeita então o presente dissídio ao cálculo do lucro tributável em sede de IRC, na parte da componente de apuramento do mesmo face a operações de aquisição e alienação de imóveis.
Cremos desde logo que a natureza das operações em causa não são idênticas e por conseguinte poderão merecer tratamento diferenciado em termos de apuramento do lucro tributável.
A contabilidade tem vindo a assumir cada vez mais uma evolução decorrente da adoção das normas internacionais de contabilidade e interpretações conexas na União Europeia, nos termos do art.º 3.º do Regulamento (CE) n.º 1606/2002, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de julho, bem como da aprovação de normativos contabilísticos nacionais convergentes com aquele referencial, designadamente o Sistema de Normalização Contabilística.
A problemática da relação entre a contabilidade e a fiscalidade tem a sua génese na influência que uma pode exercer sobre a outra, designadamente no âmbito da definição dos modelos de normalização contabilística e de tributação sobre o rendimento ou a despesa. Ora, de uma forma geral, os sistemas contabilísticos e fiscais atualmente vigentes a nível mundial refletem, em maior ou menor medida, a consagração da autonomia entre a contabilidade e a fiscalidade, justificada pela disparidade de interesses e objetivos.[2]
O estabelecimento de uma política monetária “comum” veio limitar a capacidade dos Estados poderem intervir na economia com as clássicas políticas cambiais.
Em 13 de outubro de 1998, o Conselho do BCE adotou os elementos principais da sua estratégia de política monetária, nomeadamente: i) uma definição quantitativa da estabilidade dos preços, ii) um papel importante para o acompanhamento do crescimento do volume de moeda identificado por um agregado monetário e iii) uma avaliação abrangente das perspetivas de evolução dos preços.[3]
O BCE optou por uma estratégia monetária baseada em dois pilares (análise económica e análise monetária), cujos papéis respetivos foram, mais uma vez, claramente definidos por ocasião da revisão da estratégia monetária realizada em 8 de maio de 2003.
Em janeiro de 2020, o BCE anunciou que ia ser encetada a revisão da sua estratégia de política monetária. A revisão centrou-se na formulação quantitativa da estabilidade dos preços, no conjunto de instrumentos da política monetária, na estratégia assente em dois pilares e nas práticas de comunicação. Considerará igualmente em que medida aspetos como as alterações climáticas, a digitalização, a globalização, a estabilidade financeira e a interação entre a política orçamental e a política monetária se revestem de importância para o desempenho do mandato do BCE.
Esta evolução “temporal” veio limitar gradualmente a intervenção dos Estados membros na economia, o que não poderia deixar de os obrigar a lançarem mãos do único instrumento que lhes restava – o da política fiscal.
A situação de Portugal ainda é mais condicionada porquanto se encontra inserido na designada “zona euro”.
Como se sabe existem tipificadas condições para a integração na área do euro, os designados critérios de convergência.
A sua tipificação encontra-se no artigo 140.º, n.º 1, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.
Mesmo os Países que não pertencem à “zona euro”, podem entrar no MTC II.[4]
Caso venha a integrar, a sua moeda nacional está ligada ao euro a uma taxa central que é acordada com os Estados-Membros da área do euro, os países não pertencentes à área do euro que participam já no MTC II e o BCE, com a participação da Comissão. A moeda é então autorizada a flutuar dentro do limite normal de 15% acima ou abaixo dessa taxa de câmbio central acordada.
A participação no MTC II é facultativa, mas constitui uma etapa obrigatória para a integração na área do euro.
Desde 2018, os países que pretendem aderir ao MTC II devem também ter estabelecido uma cooperação estreita com o Mecanismo Único de Supervisão do Banco Central Europeu e ter cumprido determinados compromissos políticos.
É impossível perante todo este contexto e evolução temporal não deixar de interpretar o princípio da tributação real das empresas previsto no art.º 104.º, n.º 2 da CRP., segundo uma interpretação actualista e teleológica adaptada à realidade actual.
Esta interpretação permite que se criem fenómenos mais fortemente desvirtuadores do modelo parcial de dependência da fiscalidade à contabilidade e que tais modelos sejam perfeitamente consentâneos com este princípio constitucional.
Ideia diferente é apreciar os princípios da igualdade e da capacidade contributiva.
Na verdade, é a interpretação actual do princípio da tributação das empresas segundo o seu rendimento real que permite criar regimes que se afastam do cálculo do lucro/prejuízo contabilístico e criam um regime próprio de determinação do lucro/prejuízo fiscal, sem que exista alguma violação desse princípio constitucional. Situação diferente é esse regime “autónomo” fiscal não ser aplicado de forma igualitária, ou desvirtuando o princípio da capacidade contributiva.
O Decreto lei 287/2003, de 12 de Novembro, procedeu à designada reforma sobre o património, criando o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, o Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis e o Código do Imposto de Selo.
Este diploma deu execução à autorização legislativa concedida pela Lei n.º 26/2003, de 30 de Julho.
O art.º 71.º da mencionada Lei dispôs o seguinte:
Fica o Governo autorizado a alterar os Códigos do
IRS e do IRC, nos termos seguintes:
1) Estabelecer que em caso de transmissão onerosa de direitos reais sobre bens imóveis, sempre que o valor constante do contrato seja inferior ao valor definitivo que servir de base à liquidação do IMT, ou que serviria no caso de não haver lugar a essa liquidação, será este o valor a considerar para efeitos da determinação do rendimento tributável do IRS, sem prejuízo de a administração fiscal demonstrar que o valor da transmissão foi superior;
2) Estabelecer que o valor previsto no n.º 1 deverá
igualmente aplicar-se nos casos previstos no n.º 3 do artigo 3.º, nos n.ºs 2 e 6 do artigo 28.º e nos n.ºs 2 e 6 do artigo 31.º do Código do IRS;
3) Estabelecer que para efeitos do cálculo das mais-valias referidas na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º do Código do IRS serão utilizadas as quotas mínimas de amortização, calculadas sobre o valor definitivo, se superior, considerado para efeitos de liquidação do IMI;
4) Estabelecer que o IRC passe a incidir sobre os incrementos patrimoniais recebidos a título gratuito pelos respectivos sujeitos passivos, excluindo os que se destinem a financiar a realização dos seus fins estatutários nos termos do
n.º 3 do artigo 49.o do Código do IRC;
5) Estabelecer que, no caso de transmissão onerosa
de direitos reais sobre bens imóveis, devem ser adoptados, pelo alienante e pelo adquirente, para efeitos de determinação do rendimento tributável nos termos do Código do IRC, valores normais de mercado que não poderão ser inferiores aos valores patrimoniais que serviram de base à liquidação do IMT ou que serviriam no caso de não haver lugar a liquidação, sem prejuízo de a administração fiscal demonstrar que o preço efectivo da transmissão foi superior;
6) O contribuinte poderá demonstrar que o preço praticado foi inferior ao valor normal de mercado previsto no número anterior, requerendo a revisão do lucro tributável relativo aos imóveis transmitidos no exercício anterior, ao abrigo do disposto nos artigos 91.o e 92.o da Lei Geral Tributária, através de pedido apresentado em Janeiro de cada ano;
7) Para efeitos do disposto no número anterior, o contribuinte poderá, designadamente, demonstrar que os custos de construção foram inferiores aos previstos no CIMI, caso em que ao montante desses custos fixados pela comissão deverão acrescer os demais indicadores objectivos para determinação do valor patrimonial tributário previsto no mesmo Código;
8) Em caso de apresentação de pedido de revisão, a administração fiscal poderá aceder à informação bancária do contribuinte e dos respectivos administradores ou gerentes, referente ao exercício da transmissão e ao exercício anterior;
9) Estabelecer que, no caso dos incrementos patrimoniais a título gratuito a que se refere o n.º 4, se aplicam, para efeitos do rendimento tributável do IRC, as regras de determinação do valor tributável previstas no Código do Imposto do Selo e, na fase transitória em relação aos imóveis, o disposto nos artigos 73.º e seguintes da presente lei.
Daqui retira-se que em sede de IRS, se pretendia em caso de transmissão onerosa de direitos reais sobre bens imóveis, sempre que o valor constante do acto ou contrato seja inferior ao valor definitivo que servir de base à liquidação do IMT, ou que serviria no caso de não haver lugar a essa liquidação, fosse este o valor a considerar para efeitos da determinação do rendimento tributável do IRS, sem prejuízo de a administração fiscal demonstrar que o valor da transmissão foi superior. E porquê?
Pela singela razão de que conforme se lê no preâmbulo “com a fixação de um prazo máximo para promover a avaliação geral dos prédios urbanos e, enquanto essa avaliação não for efectuada, com as regras de actualização transitória dos seus valores patrimoniais tributários, com soluções diferenciadas para os que estão arrendados e para os que o não estão, com a determinação da avaliação dos prédios que entretanto forem transmitidos, a que se aplicará o novo mecanismo de avaliações constante do CIMI”.[5]
O mecanismo assim criado visava a actualização do VPT sempre que era realizada uma transmissão e como essa avaliação demoraria algum tempo após a “escritura, contrato particular” de transmissão, o valor relevante seria o da avaliação se superior ao do contrato, ou seja, o valor relevante para efeitos de IMT (VPT).
Quanto ao IRC dispunham os números 5 e 6 da autorização, que devem ser adoptados “…no caso de transmissão onerosa de direitos reais sobre bens imóveis, […]pelo alienante e pelo adquirente, para efeitos de determinação do rendimento tributável nos termos do Código do IRC, valores normais de mercado que não poderão ser inferiores aos valores patrimoniais que serviram de base à liquidação do IMT ou que serviriam no caso de não haver lugar a liquidação, sem prejuízo de a administração fiscal demonstrar que o preço efectivo da transmissão foi superior;”
Por sua vez numa concessão ao rendimento real, “O contribuinte poderá demonstrar que o preço praticado foi inferior ao valor normal de mercado previsto no número anterior, requerendo a revisão do lucro tributável relativo aos imóveis transmitidos no exercício anterior, ao abrigo do disposto nos artigos 91.º e 92.º da Lei Geral Tributária, através de pedido apresentado em Janeiro de cada ano;”
Mas que será este valor de mercado?
Em reacção ao sistema injusto e caduco que muitos apontaram ao regime de avaliação antes de 2003 – recorde-se que o Código das Avaliações previsto no Código da Contribuição Autárquica de 1990 nunca conheceu a luz do dia, defendeu-se que foram “Cinco os princípios fundamentais que sustentam a conceção do sistema de avaliações do Código do IMI”.[6]
-
O princípio da objectividade, da transparência e da uniformidade do sistema de avaliações prediais;
-
O princípio do valor de mercado;
-
O princípio da atualização permanente de valores patrimoniais;
-
O princípio da universalidade do valor patrimonial tributário;
-
O princípio do gradualismo e do pragmatismo;
Interessam-nos o 2.º e o 4º princípio em especial.
Era intenção da criação do novo sistema de avaliações que ao abandonar o potencial da geração de rendimento, o valor passasse a depender das características intrínsecas de cada prédio e do contexto urbano e económico do mesmo.
Dizia-se mesmo que o novo sistema de avaliação garantia a tributação dos prédios com base no seu valor real.[7]
Mas já se admitia que o valor de mercado dependia da vontade e das condições subjectivas e individuais dos intervenientes em cada operação, o que talvez seja mais fundamental que o valor de mercado. Aliás, também este muda com muita frequência em função de vários factores.
Talvez por todas estas limitações e características reais dos imóveis, o sistema não conseguiu tornar o VPT como o valor de mercado real de uma transacção.[8]
São conhecidos inúmeros casos públicos da desconformidade entre o VPT e o valor de mercado, o que indiciam que o sistema não resolveu muitos dos problemas e não se adaptou ao valor de mercado.
Foi com base num pressuposto afinal não verificado, que se tentou construir a universalidade do valor patrimonial tributário, ou seja, este será aplicável transversalmente a todos os impostos.
Este princípio salutar, mas algo ingénuo, teve consagração no diploma da reforma sobre o património de 2003, com a consagração no art.º 6.º da sua parte preambular que aditou dois artigos ao CIRC, o 58.º-A e o 129.º, que tiveram a seguinte redacção:
«Artigo 58.º-A
Correcções ao valor de transmissão de direitos reais sobre bens imóveis
1 - Os alienantes e adquirentes de direitos reais sobre bens imóveis devem adoptar, para efeitos da determinação do lucro tributável nos termos do presente Código, valores normais de mercado que não poderão ser inferiores aos valores patrimoniais tributários definitivos que serviram de base à liquidação do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT) ou que serviriam no caso de não haver lugar à liquidação deste imposto.
2 - Sempre que, nas transmissões onerosas previstas no número anterior, o valor constante do contrato seja inferior ao valor patrimonial tributário definitivo do imóvel, é este o valor a considerar pelo alienante e adquirente, para determinação do lucro tributável.
3 - Para aplicação do disposto no número anterior:
a) O sujeito passivo alienante deve efectuar uma correcção, na declaração de rendimentos do exercício a que é imputável o proveito obtido com a operação de transmissão, correspondente à diferença positiva entre o valor patrimonial tributário definitivo do imóvel e o valor constante do contrato;
b) O sujeito passivo adquirente, desde que registe contabilisticamente o imóvel pelo seu valor patrimonial tributário definitivo, deve tomar tal valor para a base de cálculo das reintegrações e para a determinação de qualquer resultado tributável em IRC relativamente ao mesmo imóvel.
4 - Se o valor patrimonial tributário definitivo do imóvel não estiver determinado até ao final do prazo estabelecido para a entrega da declaração do exercício a que respeita a transmissão, os sujeitos passivos devem entregar a declaração de substituição durante o mês de Janeiro do ano seguinte àquele em que os valores patrimoniais tributários se tornaram definitivos.
5 - Relativamente ao adquirente, o disposto no número anterior não é aplicável quando se trate de correcção ao valor das reintegrações do imóvel, caso em que as relativas a exercícios anteriores serão consideradas como custo do exercício em que o valor patrimonial tributário se tornar definitivo.
6 - O disposto no presente artigo não afasta a possibilidade de a Direcção-Geral dos Impostos proceder, nos termos previstos na lei, a correcções ao lucro tributável sempre que disponha de elementos que comprovem que o preço efectivamente praticado na transmissão foi superior ao valor considerado.
Artigo 129.º
Prova do preço efectivo na transmissão de imóveis
1 - O disposto no n.º 2 do artigo 58.º-A não é aplicável se o sujeito passivo fizer prova de que o preço efectivamente praticado nas transmissões de direitos reais sobre bens imóveis foi inferior ao valor patrimonial tributário que serviu de base à liquidação do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, o sujeito passivo pode, designadamente, demonstrar que os custos de construção foram inferiores aos fixados na portaria a que se refere o n.º 3 do artigo 62.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, caso em que ao montante dos custos de construção deverão acrescer os demais indicadores objectivos previstos no referido Código para determinação do valor patrimonial tributário.
3 - A prova referida no n.º 1 deve ser efectuada em procedimento instaurado mediante requerimento dirigido ao director de finanças competente e apresentado em Janeiro do ano seguinte àquele em que ocorreram as transmissões, caso o valor patrimonial tributário já se encontre definitivamente fixado, ou nos 30 dias posteriores à data em que a avaliação se tornou definitiva, nos restantes casos.
4 - O pedido referido no número anterior tem efeito suspensivo da liquidação, na parte correspondente ao valor do ajustamento previsto no n.º 2 do artigo 58.º-A, a qual, no caso de indeferimento total ou parcial do pedido, será da competência da Direcção-Geral dos Impostos.
5 - O procedimento previsto no n.º 3 rege-se pelo disposto nos artigos 91.º e 92.º da Lei Geral Tributária, com as necessárias adaptações, sendo igualmente aplicável o disposto no n.º 4 do artigo 86.º da mesma lei.
6 - Em caso de apresentação do pedido de demonstração previsto no presente artigo, a administração fiscal pode aceder à informação bancária do requerente e dos respectivos administradores ou gerentes referente ao exercício em que ocorreu a transmissão e ao exercício anterior.
7 - A impugnação judicial contra a liquidação do imposto relativo à transmissão de imóveis cujo lucro tributável tenha sido fixado nos termos do artigo 58.º-A, ou se não houver lugar a liquidação do lucro tributável previsto no mesmo preceito legal, depende de prévia apresentação do pedido previsto no presente artigo, não havendo lugar a reclamação graciosa.
8 - A impugnação do acto de fixação do valor patrimonial tributário, prevista no artigo 77.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis e no artigo 134.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, não tem efeito suspensivo quanto à liquidação do IRC nem suspende o prazo para dedução do pedido de demonstração previsto no presente artigo.»
O Decreto-lei n.º 159/2009, de 13 de Julho, procedeu à alteração do artigo 58.º-A, nos seguintes termos:
Artigo 58.º-A
[...]
1 - ..............................................
2 - ..............................................
3 - Para aplicação do disposto no número anterior:
a) ...............................................
b) O sujeito passivo adquirente adopta o valor patrimonial tributário definitivo para a determinação de qualquer resultado tributável em IRC relativamente ao imóvel.
4 - ..............................................
5 - No caso de existir uma diferença positiva entre o valor patrimonial tributário definitivo e o custo de aquisição ou de construção, o sujeito passivo adquirente deve comprovar no processo de documentação fiscal previsto no artigo 121.º, para efeitos do disposto na alínea b) do n.º 3, o tratamento contabilístico e fiscal dado ao imóvel.
6-...................[9]
Vejamos comparativamente o que mudou em 2009:
b) O sujeito passivo adquirente, desde que registe contabilisticamente o imóvel pelo seu valor patrimonial tributário definitivo, deve tomar tal valor para a base de cálculo das reintegrações e para a determinação de qualquer resultado tributável em IRC relativamente ao mesmo imóvel.
b) O sujeito passivo adquirente adopta o valor patrimonial tributário definitivo para a determinação de qualquer resultado tributável em IRC relativamente ao imóvel.
A redacção em termos semânticos e literais é diferente.
Na 1ª redacção, inculca a ideia que seria possível registar o imóvel na contabilidade sem ser pelo VPT definitivo. Na 2ª, parece passar a ser obrigatório.[10] Na 1ª, desde que o imóvel fosse registado pelo seu VPT definitivo as amortizações/reintegrações seriam efectuadas com base nesse VPT. Na 2ª, retirou-se a menção às amortizações/reintegrações, dando a ideia que as mesmas são efectuadas pelo valor do contrato, a não ser que se considere que as mesmas estão incluídas na determinação de qualquer resultado tributável, mas tal já assim estava redigido.
Cabe aqui desde logo mencionar que os imóveis podem ser inscritos contabilisticamente em contas do SNC diferentes – ou como Activo Fixo Tangível[11], ou como bem em Inventário.[12]
No âmbito do SNC, há que atender às normas contabilísticas e de relato financeiro (NCRF) n.º 7 - Ativos fixos tangíveis, n.º 11 - Propriedades de investimento e n.º 18 - Inventários, que estabelecem o tratamento contabilísticos dos imóveis, dentro da atividade das entidades.
Assim, pode ter tratamento diferenciado, porquanto as amortizações/reintegrações, são apenas aplicáveis aos bens do Activo Fixo Tangível.[13]
Acompanhemos de muito perto o Parecer Técnico da OCC, PT25632 – IRC: reinvestimento, de 30-10-2020.[14]
No caso da venda de um bem contabilizado em inventário,[15] após os respectivos lançamentos contabilísticos inerentes à venda, devem ser realizadas “correções fiscais a efetuar no quadro 07 da declaração modelo 22, pelas diferenças existentes entre o valor patrimonial tributário (VPT) e os valores de aquisição e venda dos imoveis.
O VPT definitivo dos imóveis determinado no momento da aquisição é relevante para a determinação de resultados tributáveis.”
Mas por estarmos apenas perante correcções fiscais, o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC) não exige qualquer obrigação de se registar esse VPT na contabilidade, devendo essa informação apenas constar no dossier fiscal.[16]
Na verdade, também a NCRF 18 não prevê como regra, a valorização de um inventário para um valor acima do referido custo de aquisição ou de construção, incluindo para o valor patrimonial tributário.
Assim, aquando da venda do imóvel para efeitos fiscais, na determinação do respetivo resultado tributável, como regra, há que ter em consideração o VPT definitivo determinado nesse momento da aquisição do imóvel, quando este for superior ao valor de aquisição (previsto no contrato de compra e venda), nos termos da alínea b) do n.º 3 do artigo 64.º do Código do IRC.
A entidade deve ainda ter em consideração o VPT definitivo determinado no momento da venda, quando este seja superior ao valor do contrato de venda, conforme previsto na alínea a) do n.º 3 (e n.º 4) do artigo 64.º do CIRC.
Assim, se o valor do contrato de venda do imóvel for inferior ao valor patrimonial tributário definitivo determinado por essa venda, a entidade vendedora deve acrescer no campo 745 do quadro 07 da modelo 22, a diferença positiva entre esse VPT atribuído pelas finanças e o valor do contrato de venda.
Como regra, se o valor de aquisição do imóvel, contabilizado nos termos da NCRF 18 - Inventários, for inferior ao valor patrimonial tributário definitivo determinado no momento da aquisição desse imóvel agora vendido, a entidade, enquanto adquirente, deve deduzir no campo 772 do quadro 07 da declaração modelo 22, a diferença positiva entre esse VPT definitivo e o custo de aquisição do imóvel.
Esta correção do valor de aquisição para o VPT definitivo determinado na data de aquisição apenas se aplica caso o imóvel tenha sido adquirido a partir de 1 de janeiro de 2004.
Se o imóvel foi adquirido antes de 1 de janeiro de 2004, não existindo a essa data, a determinação do valor patrimonial tributário para efeitos de IMI, o valor de aquisição para efeitos fiscais na determinação do resultado tributável em IRC por uma venda futura, deve ser o valor da escritura de aquisição do imóvel (que serviu de base para cálculo de SISA), acrescido dos respetivos encargos, incluindo impostos não reembolsáveis (SISA, imposto do selo).
No caso do VPT definitivo determinado no momento da venda, ou no momento da aquisição do imóvel, seja inferior ao valor de venda ou ao custo de aquisição, a entidade não deverá efetuar qualquer correção ao lucro tributável na modelo 22.
Aqui chegados e antes de abordarmos a aplicabilidade, ou não, da base de incidência do IMT ter resultado da aplicação da regra 16ª do n.º 4 do artigo 12.º do Código do IMT, ser, ou não relevante para efeitos de determinação do lucro tributável do IRC, cabe desde já elencar os factos referentes ao caso que se dirime no presente processo:
Estando de acordo que nos imóveis adquiridos antes de 1 de janeiro de 2004, não existindo a determinação do valor patrimonial tributário para efeitos de IMI, o valor de aquisição para efeitos fiscais na determinação do resultado tributável em IRC por uma venda futura deve ser o valor da escritura de aquisição do imóvel (que serviu de base para cálculo de SISA), acrescido dos respetivos encargos, incluindo impostos não reembolsáveis (SISA, imposto do selo) e tendo a Requerida fundamentado exactamente essa correcção em:
iii) …quanto aos imóveis adquiridos antes da vigência do art.º 64.º do CIRC, afirma-se que “(…) tendo em consideração que a correção a efetuar pelo A... enquanto adquirente reporta-se ao momento da aquisição e que as mesmas ocorreram em data anterior à vigência do art.º 64.º do CIRC, o A..., e para efeitos do disposto na alínea b) do n.º 3 do art.º 64.º do CIRC, não poderá deduzir qualquer importância ao lucro tributável de 2017, relativamente aos imóveis adquiridos em data anterior a 2004-01-01. (…) A dedução a reverter, associada a estes imóveis adquiridos antes de 2004-01-01, ascende a € 254.131,85 (…)”
(cfr. pp. 34/86 e 35/86 do PRIT)
Deve improceder o pedido do Requerente.
Devemos também desde já analisar a correcção efectuada no que concerne a:
ii) para os casos em que os imóveis foram adquiridos por rescisão antecipada do respetivo contrato de locação financeira imobiliária e alienados a terceiros, “o valor de aquisição dos bens imóveis a considerar deverá ser o valor da transmissão onerosa ocorrida no momento em que o banco efetuou a aquisição do imóvel e não o valor das rendas vincendas aquando da rescisão do contrato por parte do locatário. (…) Deste modo, a dedução relativa a estes imóveis, efetuada no campo 772, que totalizou a quantia de € 299.803,55, será revertida (…)” (cfr. pp. 33/86 e 34/86 do PRIT).
E porque a devemos analisar? Pela singela razão de que a ser aplicável ao caso dos autos a regra 16ª, do número 4 do artigo 12.º do CIMT no que concerne ao terceiro bloco dos autos, ou seja, aquisições efectuadas em insolvências, também poderá ser aplicado ao caso da locação financeira a regra 6ª, do número 4, do artigo 12.º do mesmo compêndio que reza:
6.ª Quando a transmissão se efectuar por meio de renúncia ou cedência, o imposto é calculado sobre o valor patrimonial tributário dos respectivos bens imóveis, ou incide sobre o valor constante do acto ou do contrato, se for superior;
A ser aplicada esta regra a reversão efectuada pela Requerida aparentemente estará certa. Mas não está!
O que esta regra manda aplicar é o VPT do imóvel mas ao tempo da transmissão. Mas situação diferente é saber se existiu transmissão na concepção fiscal.
Não nos podemos esquecer que o CIMT ficciona imensas figuras que não correspondem aos conceitos civilistas e que designa por transmissões.[17]
Como se pode observar do art.º 2.º, n.º 2 do CIMT, são tantas as figuras que diríamos mesmo a regra quase é excepção.
Desde a promessa de aquisição e de alienação com “traditio”, o arrendamento ou subarrendamento a longo prazo de 30 anos, ou com cláusula de transmissão depois de satisfeitas as rendas, a aquisição de partes sociais preenchidos certos requisitos, determinadas operações de unidades de participação, contrato promessa de aquisição, ou alienação, com cláusulas de cedência a terceiro, para pessoa a nomear, a cessão de posição contratual, a outorga de procuração irrevogável, são afinal a aplicação do princípio da substância económica dos factos.[18]
Em matéria de locação financeira encontramos a regra 14ª, do número 4, do art.º 12.º do CIMT, que nos diz:
14.ª O valor dos bens imóveis ou do direito de superfície constituído sobre os imóveis locados, adquiridos pelo locatário, através de contrato de compra e venda, no termo da vigência do contrato de locação financeira e nas condições nele estabelecidas, será o valor residual determinado ou determinável, nos termos do respectivo contrato;[19]
Mas esta norma nada nos menciona quanto ao incumprimento de um contrato de leasing.
Também não encontramos qualquer ficção jurídico-fiscal quando estamos perante uma situação de renúncia, ou de incumprimento de um contrato de locação financeira. Não existindo nenhuma ficção não podemos deixar então de aplicar o art.º 64.º, n.º 2 e 3 do CIRC. E a ser assim, crê-se, deverá ser aplicado o regime regra, incidência sobre o valor do contrato ou o VPT definitivo, consoante o que se afigure maior.
Neste conspecto, nem Requerente, nem Requerida têm razão. No entanto, como a Requerente optou por deduzir (considerar como não proveito), valores calculados com base nas rendas vincendas, a reversão encontra-se correcta. Podê-lo-ia ter feito com as diferenças, caso existissem, entre o VPT e o valor do contrato ao tempo da aquisição, mas não o tendo feito, “sibi imputet.”
Cabe então agora analisar qual deverá ser a relação entre o art.º 64.º do CIRC e a regra 16ª, do número 4 do artigo 12.º do CIMT no que concerne ao terceiro bloco dos autos:
Consideramos desde logo que uma venda no processo de insolência é uma venda efectuada em arrematação judicial, para efeitos da regra 16ª, do número 4 do art.º 12.º do CIMT.[20]
Mas a questão já não é tão líquida quanto à aplicabilidade da mesma regra para efeitos de correcções fiscais em sede de IRC.
Conforme se mencionou supra, o art.º 64.º do CIRC, diz-nos:
Artigo 64.º
Correcções ao valor de transmissão de direitos reais sobre bens imóveis
1 — Os alienantes e adquirentes de direitos reais sobre bens imóveis devem adoptar, para efeitos da determinação do lucro tributável nos termos do presente Código, valores normais de mercado que não podem ser inferiores aos valores patrimoniais tributários definitivos que serviram de base à liquidação do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT) ou que serviriam no caso de não haver lugar à liquidação deste imposto.
2 — Sempre que, nas transmissões onerosas previstas no número anterior, o valor constante do contrato seja inferior ao valor patrimonial tributário definitivo do imóvel, é este o valor a considerar pelo alienante e adquirente, para determinação do lucro tributável.
3 — Para aplicação do disposto no número anterior:
a) O sujeito passivo alienante deve efectuar uma correcção, na declaração de rendimentos do período de tributação a que é imputável o rendimento obtido com a operação de transmissão, correspondente à diferença positiva entre o valor patrimonial tributário definitivo do imóvel e o valor constante do contrato;
b) O sujeito passivo adquirente adopta o valor patrimonial tributário definitivo para a determinação de qualquer resultado tributável em IRC relativamente ao imóvel.
Há duas questões a considerar no âmbito do presente processo:
-
A comparação entre valores, no caso de ser aplicável o VPT, deve ser feita com o valor à data da alienação, ou à data da aquisição?
-
A não ser aplicável o VPT, o valor a ter em conta será o valor do contrato na aquisição?
-
Aquando da alienação far-se-ão, duas correcções – uma pela aquisição e outra pela alienação com base na diferença entre o valor do contrato e o valor do VPT no momento dessa alienação?
Parece evidente que a comparação a realizar entre o valor do contrato e o valor do VPT, no que respeita às correcções fiscais em matéria de aquisição, deve ser a do VPT definitivo ao tempo da aquisição e não da alienação e que a comparação a realizar entre o valor do contrato e o VPT definitivo, no que respeita às correcções fiscais em matéria de alienação, deve ser a do VPT definitivo ao tempo da alienação. É por essa razão que existem na Modelo 22 os campos 745, Diferença positiva entre o valor patrimonial tributário definitivo do imóvel e o valor constante do contrato, art.º 64.º, n.º 3 al. a) e campo 772 Correção pelo adquirente do imóvel quando adota o valor patrimonial tributário definitivo para a determinação do resultado tributável na respetiva transmissão, art.º 64.º, n.º 3, al. b)”.[21]
No caso dos autos o Requerente considerou como valor de aquisição o valor constante do título aquisitivo ou escritura de dação ou auto de adjudicação do imóvel, comparando-o com o VPT definitivo à data da alienação, o que a AT corrigiu no montante de € 3.995.851,19. Tanto basta para considerarmos improcedente o pedido de anulação deste montante.
Torna-se desnecessário analisar a aplicação da regra 16ª, do número 4 do artigo 12.º do CIMT, em derrogação do regime do art.º 64.º do CIRC.
Votamos assim a favor da total improcedência, mas por fundamentação diferente.
António Pragal Colaço
[1] Num sentido, o Acórdão nº Processo nº 1752/15.9BEPRT, de 15/06/2016 do TAF do Porto; Proc.º 180/2015-T, de 17/11/2015, do CAAD; Proc.º 169/2018-T de 24/12/2018, do CAAD. No outro sentido o Proc.º 105/2019-T, de 26/09/2019, do CAAD.
[2] Curiosamente, a este respeito FERNANDES FERREIRA (1997, pp. 83-84) sublinha que «Nem sempre tem existido convergência entre a contabilidade e a fiscalidade e muitos até afirmam não ser isso possível porque divergentes são os fins dos respetivos apuramentos. A nossa opinião hoje é diferente: entende-se que são motivos pragmáticos e não de ciência que provocaram as atuais divergências. A necessidade de acautelar a receita fiscal perante arbítrios do seu apuramento, quer por vícios, quer por desacertos de natureza conceptual na fixação das regras ou na interpretação dos textos legais e princípios técnicos adotados trouxe afastamentos e desfasamentos inconvenientes que devem ser combatidos. Se a fiscalidade pretende apurar e tributar o lucro real, esse é igualmente o objetivo da contabilidade. Se divergências existem é porque se carece de elaboração doutrinal suficiente e de sinceridade na prestação das contas, situação de transição que deve culminar no apuramento de um lucro fiscal cuja preocupação não seja reduzir o imposto, mas sim propiciar a verdade do lucro».
[3] Cfr. https://www.europarl.europa.eu/factsheets/pt/sheet/86/a-politica-monetaria-europeia
[4] MTC II — Mecanismo de Taxas de Câmbio da UE (Comissão Europeia);
[5] Artigo 73.º Lei 26/2003, de 30 de Julho,
Avaliação de prédios já inscritos na matriz
1 — Enquanto não se proceder a avaliação geral, os prédios urbanos já inscritos na matriz serão avaliados, nos termos do CIMI, aquando da primeira transmissão ocorrida após a sua entrada em vigor, sem prejuízo,
quanto a prédios arrendados, do disposto no artigo 75.º
2 — Será promovida uma avaliação geral dos prédios urbanos, no prazo máximo de 10 anos, após a entrada em vigor do CIMI.
3 — Quando se proceder a avaliação geral dos prédios urbanos e ou prédios rústicos, será afectada para despesas do serviço de avaliações uma verba a fixar e regulamentar por portaria do Ministro das Finanças, até 5% do IMI cobrado nos anos em que se realizarem aquelas avaliações.
[6] José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, 3ª Edição, 2016, p. 47;
[8] Em Dezembro de 2019 a Comissão Nacional de Avaliação de Prédios Urbanos (CNAPU) concluiu uma proposta de revisão dos coeficientes de localização, que servem de referência na determinação do Valor Patrimonial Tributário (VPT) dos imóveis e podem, por isso, influenciar o Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) a pagar pelos proprietários. Em Lisboa e Porto o imposto deveria aumentar. Por sua vez para várias zonas de concelhos situados na faixa litoral foi proposto um agravamento dos coeficientes de localização, sobretudo daqueles que se encontravam em valores intermédios. O sinal de que os coeficientes estavam desactualizados levou a esta proposta. No entanto, a pandemia acabou por não deixar a proposta avançar;
[9] O artigo 58.º-A do CIRC, foi renumerado para o art.º 64.º, por força do n.º 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de julho;
[10] Mas desapareceu a menção a “registo” e percebe-se porquê;
[11] Conforme a NCRF 7 baseada na IAS 16, são Activos Fixos Tangíveis os que a) Sejam detidos para uso na produção ou fornecimento de bens ou serviços, para arrendamento a outros, ou para fins administrativos; e b) Se espera sejam usados durante mais do que um período.”
[12] Conforme a NCRF 18, baseada na IAS 2, Inventários (existências): são activos:
(a) Detidos para venda no decurso ordinário da actividade empresarial;
(b) No processo de produção para tal venda; ou
(c) Na forma de materiais ou consumíveis a serem aplicados no processo de produção ou na prestação de serviços;
[13] O reinvestimento também não é aplicável aos bens de inventário;
[15] Os imóveis adquiridos devem ser reconhecidos pelo respetivo custo de aquisição, sejam classificados como inventário, ativo fixo tangível ou propriedade de investimento.
Nos termos do parágrafo 9 da NCRF 18, os inventários, incluindo imóveis para revenda, devem ser mensurados pelo custo ou valor realizável líquido, dos dois o mais baixo.
[16] Talvez esteja aqui a explicação para o desaparecimento da menção a “registo”, mencionada na nota 9) supra;
[17] Artigo 2.º
Incidência objectiva e territorial
1 - O IMT incide sobre as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direito, sobre bens imóveis situados no território nacional.
2 - Para efeitos do n.º 1, integram, ainda, o conceito de transmissão de bens imóveis:
a) As promessas de aquisição e de alienação, logo que verificada a tradição para o promitente adquirente, ou quando este esteja usufruindo os bens, excepto se se tratar de aquisição de habitação para residência própria e permanente do adquirente ou do seu agregado familiar e não ocorra qualquer das situações previstas no n.º 3;
b) O arrendamento com a cláusula de que os bens arrendados se tornam propriedade do arrendatário depois de satisfeitas todas as rendas acordadas;
c) Os arrendamentos ou subarrendamentos a longo prazo, considerando-se como tais os que devam durar mais de 30 anos, quer a duração seja estabelecida no início do contrato, quer resulte de prorrogação, durante a sua vigência, por acordo expresso dos interessados, e ainda que seja diferente o senhorio, a renda ou outras cláusulas contratuais;
d) A aquisição de partes sociais ou de quotas nas sociedades em nome coletivo, em comandita simples, por quotas ou anónimas, quando cumulativamente: (Redação da Lei nº 75-B/2020, de 31 de dezembro)
i) O valor do ativo da sociedade resulte, direta ou indiretamente, em mais de 50 % por bens imóveis situados em território nacional, atendendo ao valor de balanço ou, se superior, ao valor patrimonial tributário; (Redação da Lei nº 75-B/2020, de 31 de dezembro)
ii) Tais imóveis não se encontrem diretamente afetos a uma atividade de natureza agrícola, industrial ou comercial, excluindo a compra e venda de imóveis; (Redação da Lei nº 75-B/2020, de 31 de dezembro)
iii) Por aquela aquisição, por amortização ou quaisquer outros factos, algum dos sócios fique a dispor de, pelo menos, 75 % do capital social, ou o número de sócios se reduza a dois casados ou unidos de facto, devendo em qualquer dos casos as partes sociais ou quotas próprias detidas pela sociedade ser proporcionalmente imputadas aos sócios na proporção da respetiva participação no capital social; (Redação da Lei nº 75-B/2020, de 31 de dezembro)
e) A aquisição de unidades de participação em fundos de investimento imobiliário fechados de subscrição particular, independentemente da localização da sociedade gestora, bem como operações de resgate, aumento ou redução do capital ou outras, das quais resulte que um dos titulares ou dois titulares casados ou unidos de facto fiquem a dispor de, pelo menos, 75 % das unidades de participação representativas do património do fundo. (Aditada pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março)
3 - Considera-se que há também lugar a transmissão onerosa para efeitos do n.º 1 na outorga dos seguintes actos ou contratos:
a) Celebração de contrato-promessa de aquisição e alienação de bens imóveis em que seja clausulado no contrato ou posteriormente que o promitente adquirente pode ceder a sua posição contratual a terceiro;
b) Cessão da posição contratual no exercício do direito conferido por contrato-promessa referido na alínea anterior;
c) Outorga de procuração que confira poderes de alienação de bem imóvel ou de partes sociais ou unidades de participação a que se referem as alíneas d) e e) do n.º 2 em que, por renúncia ao direito de revogação ou cláusula de natureza semelhante, o representado deixe de poder revogar a procuração; (Redação da Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro)
d) Outorga de instrumento com substabelecimento de procuração com os poderes e efeitos previstos na alínea anterior;
e) Cedência de posição contratual ou ajuste de revenda, por parte do promitente adquirente num contrato-promessa de aquisição e alienação, vindo o contrato definitivo a ser celebrado entre o primitivo promitente alienante e o terceiro.
4 - O disposto na alínea e) do número anterior não é aplicável sempre que o contrato definitivo seja celebrado com terceiro nomeado ou com sociedade em fase de constituição no momento em que o contrato-promessa é celebrado e que venha a adquirir o imóvel, desde que o promitente adquirente seja titular do seu capital social.
5 - Em virtude do disposto no n.º 1, são também sujeitas ao IMT, designadamente:
a) A resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, do contrato de compra e venda ou troca de bens imóveis e as do respectivo contrato-promessa, quando, neste último caso, ocorrerem depois de passados 10 anos sobre a tradição ou posse;
b) As permutas, pela diferença declarada de valores ou pela diferença entre os valores patrimoniais tributários, consoante a que for maior;
c) O excesso da quota-parte que ao adquirente pertencer, nos bens imóveis, em acto de divisão ou partilhas, bem como a alienação da herança ou quinhão hereditário;
d) A venda ou cessão do direito a determinadas águas, ainda que sob a forma de autorização para as explorar ou para minar em terreno alheio;
e) As entradas dos sócios com bens imóveis para a realização do capital das sociedades comerciais ou civis sob a forma comercial ou das sociedades civis a que tenha sido legalmente reconhecida personalidade jurídica, as entregas de bens imóveis dos participantes no ato de subscrição de unidades de participação de fundos de investimento imobiliário fechados de subscrição particular e, bem assim, a adjudicação dos bens imóveis aos sócios na liquidação dessas sociedades e a adjudicação de bens imóveis como reembolso em espécie de unidades de participação decorrente da liquidação de fundos de investimento imobiliário fechados de subscrição particular; (Redação da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março)
f) As entradas dos sócios com bens imóveis para a realização do capital das restantes sociedades civis, na parte em que os outros sócios adquirirem comunhão, ou qualquer outro direito, nesses imóveis, bem como, nos mesmos termos, as cessões de partes sociais ou de quotas ou a admissão de novos sócios;
g) As transmissões de bens imóveis por fusão ou cisão das sociedades referidas na alínea e), ou por fusão de tais sociedades entre si ou com sociedade civil, bem como por fusão de fundos de investimento imobiliário fechados de subscrição particular;(Redação da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro)
h) As transmissões de benfeitorias e as aquisições de bens imóveis por acessão.
6 - O disposto na alínea c) do número anterior não é aplicável sempre que o excesso da quota-parte resultar de acto de partilha por efeito de dissolução do casamento que não tenha sido celebrado sob o regime de separação de bens. (Aditado pelo artigo 97.º da Lei 64-A/2008, de 31 de dezembro)
7 - O disposto na alínea d) do n.º 2 não é aplicável às sociedades previstas na alínea f) do artigo 4.º do Regime Jurídico do Registo Central do Beneficiário Efetivo, aprovado em anexo à Lei n.º 89/2017, de 21 de agosto. (Aditado pela Lei nº 75-B/2020, de 31 de dezembro)
[18] Lei Geral Tributária
Artigo 11.º
Interpretação e integração de lacunas
1 -…
2 -…
3 - Persistindo a dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender-se à substância económica dos factos tributários.
[19] A aplicação literal desta norma levou a situações aberrantes de inscrição do VPT nas matrizes do valor assim determinado – valor residual, o que é mais um exemplo da “enfermidade” do sistema;
[20] Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, Processo: 01508/12 de 05-11-2014, PEDRO DELGADO
Sumário:I-…
II - A ratio legis da norma constante da regra 16ª, do nº 4, do artº 12º do CIMT prende-se com a maior segurança da correspondência e conformidade do valor declarado ao valor real da transacção nas situações em que o acto da venda é realizado mediante a intervenção das autoridades judiciais e administrativas, admitindo-se que existirá sempre um controlo daquelas autoridades sobre o valor da alienação, apesar de a venda ser efectuada após negociação entre um negociador nomeado por aquele órgão e o comprador.
III - A venda de imóvel efectuada pelo administrador em processo judicial de falência e sob controlo judicial (arts. 158º e 161º do CIRE) integra o conceito de arrematação judicial para efeitos da regra 16ª, do n.º 4 do art.º 12º do CIMT.
[21] Por efeito das referidas regras das alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 64.º do Código do IRC, no caso em que haja lugar à ulterior transmissão de imóveis que tenham sido antes adquiridos, o sujeito passivo, na condição de alienante, acresce no campo 745 do quadro 07 a diferença positiva entre o valor patrimonial tributário do imóvel e o valor do contrato de venda, e, na condição de adquirente, deduz no campo 772 do quadro 07 a diferença positiva entre o valor patrimonial tributário do imóvel e o valor do contrato de compra;