Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 649/2020-T
Data da decisão: 2022-03-14  IRC  
Valor do pedido: € 2.595.414,91
Tema: IRC - Caso decidido/resolvido. Provisões não dedutíveis. Periodização Económica. Arts. 18.º e 39.º CIRC. Princípio da Justiça.
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SUMÁRIO:

 

I – A inimpugnabilidade de correções dos prejuízos fiscais, já consolidadas na ordem jurídica, resultantes de atos tributários respeitantes a outros anos que não o do ano diretamente impugnado na presente ação, constitui uma exceção dilatória inominada – exceção de caso decidido/caso resolvido – que obsta ao conhecimento do pedido da Requerente e que importa a absolvição da Requerida da instância na parte correspondente.

II – Verificando-se a caducidade do direito à substituição, por via declarativa, da autoliquidação (inicial) do sujeito passivo, e não tendo a mesma sido reclamada, manteve-se como único “ato declarativo definitório” da situação tributária, para o período de 2017, a autoliquidação apresentada em 28 de junho de 2018, pelo que a liquidação adicional reportou-se necessariamente, e bem, a esta “primeira” autoliquidação.

III – Não tendo o ato de liquidação adicional impugnado nos autos corrigido os valores declarados pelo sujeito passivo na Modelo 22 de IRC a título de mais-valias, tal ato não pode ser invalidado por uma ilegalidade respeitante ao “erróneo” apuramento dessas mais-valias, pois trata-se de matéria sobre a qual tal ato não se pronunciou, nem constitui seu fundamento ou originou qualquer modificação da matéria coletável declarada pela Requerente.

IV – A provisão constituída em 2017, para fazer face ao risco de pagamento de uma penalidade por incumprimento do “Contrato de Revitalização e Modernização Empresarial” não se enquadra como respeitando a “encargos com processos judiciais em curso”.

V – No âmbito de um contencioso de mera legalidade como é o arbitral, não pode o Tribunal anular, por ilegalidade, um ato tributário que não se pronuncia, nem efetua correções sobre a dedutibilidade de gastos respeitantes, quer ao período de tributação controvertido, quer a outros períodos de tributação.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

Os árbitros Alexandra Coelho Martins (presidente), José Alberto Pinheiro Pinto e Francisco Melo, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formarem o Tribunal Arbitral Coletivo, constituído em 3 de maio de 2021, acordam no seguinte:

 

 

I.       Relatório

 

A..., Lda., doravante designada por “Requerente”, pessoa coletiva número ..., com sede na Avenida ..., n.º ..., ..., ...-... Lisboa, veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral e deduzir pedido de pronúncia arbitral ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1, alínea a), ambos do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro; do artigo 95.º, n.ºs 1 e 2 da Lei Geral Tributária (“LGT”); e do artigo 99.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), na redação vigente.

 

A Requerente pretende a declaração de ilegalidade, e consequente anulação, do ato de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) emitido sob o n.º 2020 ..., que resultou no valor global a pagar de € 2.595.414,91 (incluindo juros compensatórios de € 167.935,79 e juros de mora de € 1,20), em relação ao período de tributação de 2017, bem como do ato decisório de segundo grau que indeferiu a Reclamação Graciosa deduzida contra este ato tributário, com fundamento em vício de forma e diversos erros sobre os pressupostos de facto e de direito. Neste âmbito, peticiona ainda o reembolso dos montantes pagos, acrescidos de juros indemnizatórios nos termos do artigo 43.º da LGT.

 

É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante também identificada por “AT”.

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD em 19 de novembro de 2020 e, de seguida, notificado à AT.

 

Nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 5.º, na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação vigente, o Exmo. Presidente do Conselho Deontológico designou os árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo.

 

Em 11 de janeiro de 2021, as Partes foram notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados das alíneas a) e e) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

 

Com a aprovação da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, foram suspensos os prazos procedimentais e processuais, no âmbito das medidas da pandemia Covid 19. Esta suspensão cessou com a entrada em vigor da Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril, prosseguindo a tramitação processual a partir de 6 de abril de 2021.

 

O Tribunal Arbitral Coletivo foi constituído em 3 de maio de 2021.

 

            Em 7 de julho de 2021, a Requerida apresentou Resposta, na qual se defendeu por exceção e por impugnação, concluindo pela procedência das exceções e, caso assim não se entenda, pela improcedência da ação, com as legais consequências, tendo junto o processo administrativo (“PA”).

 

A Requerente foi notificada para exercer o contraditório sobre a matéria de exceção constante da Resposta, o que fez em 16 de julho de 2021. 

 

O Tribunal Arbitral agendou a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, a qual foi objeto de remarcação sucessiva por impedimento da Requerida e de uma testemunha, tendo-se realizado em 13 de dezembro de 2021. Foram inquiridas quatro testemunhas, três indicadas pela Requerente e uma indicada pela Requerida. O Tribunal informou as Partes de que a matéria de exceção seria conhecida a final, prorrogou o prazo da decisão e notificou Requerente e Requerida para, de modo simultâneo, apresentarem alegações escritas no prazo de 10 dias. Foi advertida a Requerente da necessidade de pagamento da taxa arbitral subsequente até essa data (v. ata que se dá por reproduzida e gravação áudio disponível no SGP do CAAD).

 

Em 7 de janeiro de 2022, Requerente e Requerida apresentaram as suas alegações e reiteraram o anteriormente alegado.

 

Por despachos de 25 de outubro de 2021, de 13 de dezembro de 2021 e de 28 de fevereiro de 2022 foi prorrogado o prazo para prolação da decisão, ao abrigo do artigo 21.º, n.º 2 do RJAT, derivado da tramitação processual, da interposição de períodos de férias judiciais e da situação pandémica.

 

 

II.      Questões a Apreciar

 

A título prévio importa decidir as questões prévias suscitadas pela Requerida, em relação:

 

  1. À incompetência do Tribunal Arbitral para se pronunciar sobre a reforma/conversão do ato ao abrigo do direito administrativo;
  2. Ao caso decidido formado sobre as correções aos prejuízos fiscais dos anos 2015 e 2016, que se repercutem no ajustamento dos prejuízos fiscais do período de 2017 objeto da presente ação; e
  3. À incompetência material para proferir uma condenação da AT ao reporte dos referidos prejuízos ou o reconhecimento do direito aos mesmos.

 

Sobre o mérito, os problemas colocados a este Tribunal Arbitral respeitam aos seguintes vícios alegados pela Requerente:

  1. Ilegalidade formal do ato tributário de liquidação, por se reportar a uma autoliquidação que já havia sido substituída por outra, por via declarativa, não tendo a Requerida tomado em consideração a autoliquidação corrigida previamente à emissão daquele ato, com violação do princípio da legalidade administrativa e da boa fé (artigos 79.º, n.º 1 da LGT, 148.º e 164.º do Código do Procedimento Administrativo (“CPA”) e 266.º da Constituição;
  2. Erro no cálculo da mais-valia fiscal na transmissão de imóvel, por considerar que o valor de realização a considerar deve ser de € 10.000.000,00 e não o preço de € 22.000.000,00 ou, a título subsidiário, que o valor de € 12.000.000,00 destinado à B... para desoneração do bem imóvel transacionado deve ser qualificado como encargo inerente à alienação (artigo 46.º, n.ºs 1, 2 e 3 alínea g) do Código do IRC), sob pena de inconstitucionalidade por violação do princípio de tributação das empresas fundamentalmente segundo o seu rendimento real (artigos 3.º, n.º 2 do Código do IRC e 104.º, n.º 2 da Constituição) e do princípio da capacidade contributiva (artigos 13.º, 103.º, n.º 3 interpretados em concordância com os artigos 9.º, alínea d), 81.º, alínea b) e 266.º, n.º 2, todos da Constituição);
  3. Erro de direito por não enquadramento da provisão no valor de € 273.000,00, constituída na perspetiva da negociação de uma situação contratual com o C..., no disposto no artigo 39.º, n.º 1, alínea a) do Código do IRC ou, tendo em conta que no ano seguinte, 2018, a Requerente pagou efetivamente o valor de € 210.000,00 ao C..., pelo menos a consideração deste último como fiscalmente dedutível no período de 2017, ao abrigo do princípio da justiça (artigos 266.º, n.º 2 da Constituição e 55.º da LGT), que tempera o princípio da especialização (artigo 18.º do Código do IRC) dos exercícios, quando o erro não resulte de omissões voluntárias ou intencionais com vista a operar transferências de resultados entre exercícios, como invoca a Requerente;
  4. Não aceitação da dedução de prejuízos fiscais transitados de exercícios anteriores – 2015 e 2016 – que foram objeto de correção pela Requerida, não contestada pela Requerente, reportada a esses períodos de tributação;
  5. A título subsidiário, a desconsideração como gasto, em 2017, ao abrigo do artigo 23.º, n.º 1 e n.º 2, alínea c) do Código do IRC:
  • dos juros e outros encargos financeiros pagos à B..., quando da alienação do imóvel e com parte do produto da mesma, no montante de € 1.150.310,24, que não concorreram para o apuramento do lucro tributável de 2017, nem de anos anteriores; e
  • dos pagamentos na importância de € 2.168.663,86 efetuados em 2107 na qualidade de garante da D..., dado o incumprimento desta;
  1. Violação do princípio da capacidade contributiva no caso de não ser atendida a posição da Requerente em relação às questões identificadas nas alíneas b) a c) precedentes (artigos 13.º, 103.º, n.º 3 da Constituição).

 

* * *

 

Tendo sido suscitadas diversas exceções pela Requerida, cujo conhecimento reveste caráter prioritário, as mesmas são de seguida apreciadas, logo após a fixação da matéria de facto.

 

 

III.    Fundamentação de Facto

 

  1. Factos Provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão:

 

  1. A..., Lda., aqui Requerente, é uma sociedade que exerce atividade no setor têxtil de lanifícios, de tecelagem e fiação, estando enquadrada no regime geral de IRC – cf. Relatório de Inspeção Tributária (“RIT”) junto pela Requerente como Documento 3.
  2. No início dos anos 50 do século XX, a Requerente instalou uma unidade fabril em terreno, do qual era proprietária, localizado na zona ... de Lisboa, freguesia de ..., na Avenida ..., n.º ... e ..., tornejando para a Av. ... (imóvel que, mais tarde, em 2017, veio a ser alienado) – cf. Documento 4 e RIT.
  3. Tendo em vista superar as consequências da crise da indústria têxtil e a concorrência dos mercados asiáticos que afetaram a sua situação financeira, a Requerente candidatou-se ao sistema de incentivos ..., gerido pelo C... (“C...”), celebrando, em 6 de dezembro de 2000, na sequência da aprovação da sua candidatura pelo C..., um “Contrato de Revitalização e Modernização Empresarial”, no qual foram partes – cf. Documento 5 e depoimento das testemunhas E... e F...:
    1. O C...;
    2. O G..., SGPS, S.A., adiante referido por “G...”, participado pelo C...;
    3. A sociedade D..., S.A., adiante referida por “D...”, com capital maioritariamente detido pela Requerente e em parte minoritária pelo G..., cuja entrada de capital foi qualificada como “capital de risco”; e
    4. A Requerente.
  4. Neste Contrato, o G... assumiu o compromisso de investir na D... a quantia global de 375.000.000$00 (equivalente a € 1.870.492,11), sendo uma parte, de 200.000.000$00, em capital social, e outra parte, de 175.000.000$00, em empréstimo (suprimento), prevendo-se em caso de incumprimento dos objetivos e obrigações imputável à sociedade D... a restituição, por parte desta entidade, das referidas importâncias no prazo máximo de 120 dias a contar da notificação da rescisão – cf. Documento 5.
  5. De acordo com os objetivos traçados no Contrato, o financiamento estava associado à execução de um projeto de consolidação financeira e de restruturação empresarial que passava:
    1. Pela deslocalização da unidade industrial da Requerente de Lisboa (do imóvel identificado no ponto B) para as instalações industriais da H..., S.A., em Castanheira de Pêra, com a simultânea transferência da atividade industrial da Requerente para ser desenvolvida sob a firma e orientação da D...; e
    2. Pelo desenvolvimento da atividade industrial, com a assunção do cumprimento, por parte da D..., de determinados indicadores financeiros e da manutenção de 110 postos de trabalho,

       – cf. Documento 5 e depoimento das testemunhas E... e F....

  1. O sócio gerente da Requerente, I..., era também administrador da D..., tendo assinado nessa dupla qualidade (de representante de ambas as entidades) o referido Contrato com o C... e o G... . J..., também gerente/administrador de ambas as entidades, assinou o mencionado Contrato apenas em representação da Requerente – cf. Documentos 5, 6, 7 e RIT.
  2. Com esta operação, o imóvel que era detido pela Requerente em Lisboa, referido no ponto B supra, ficou disponível para a realização de uma operação imobiliária – cf. depoimento das testemunhas E... e F....
  3. Em 19 de outubro de 2007, a B... prestou à Requerente uma garantia bancária de € 750.000,00, até 31 de dezembro de 2009, tendo como beneficiário o G... . Este montante foi reduzido para € 609.864,68 e o prazo prorrogado por 12 meses em 11 de janeiro de 2010. O prazo foi sendo sucessivamente prorrogado até 31 de dezembro de 2012 – cf. Documentos 7 e 10.
  4. Em 25 de outubro de 2007, a Requerente contraiu dois empréstimos junto da B... – cf. Documentos 7 e 10:
    1. um no valor de € 7.000.000,00, sob a forma de abertura de crédito, para liquidação de passivo bancário, para emprestar à sociedade participada D..., e para apoiar outras necessidades financeiras. Em contrapartida, a Requerente comprometeu-se a pagar juros até à taxa anual de 11,45%, acrescido de uma sobretaxa até 4% ao ano em caso de mora;
    2. outro, no valor de € 2.000.000,00, conjuntamente com a D..., com juros fixados à taxa Euribor a três meses, acrescida de um spread de 1%, com cláusula de capitalização de juros e agravamento da taxa de juro em caso de mora.
  5. Em 16 de junho de 2010, a Requerente interveio como garante em contrato de mútuo celebrado pela D..., no valor de € 625.000,00 – cf. Documento 10.
  6. Em 18 de junho de 2010, a Requerente contraiu novo empréstimo junto da B..., no valor de € 1.500.000,00, para apoio à tesouraria e liquidação de responsabilidades junto da própria B..., vencendo juros à taxa Euribor a três meses, acrescida de um spread de 3%, acrescida de uma sobretaxa até 4% ao ano em caso de mora – cf. Documentos 7 e 10.
  7. Em 15 de dezembro de 2011, a Requerente subscreveu uma livrança emitida à B..., no valor de € 35.000,00 com vencimento em 28 de janeiro de 2012 – cf. Documentos 7 e 10.
  8. Como garantia das obrigações emergentes destes contratos, foram constituídas três hipotecas sobre o imóvel que a Requerente detinha em Lisboa – cf. Documentos 7 e 10.
  9. As obrigações relativas aos empréstimos e livrança acabados de referir (pontos I a L) não foram pontualmente satisfeitos pela Requerente, originando a aplicação de taxas de juro agravadas e comissões. Os financiamentos ainda se encontravam em vigor em 2017 – cf. Documentos 7 e 10.
  10. Em 2012, o Tribunal Judicial de … decretou a insolvência da D..., determinando a citação dos 5 maiores credores da insolvente e os credores institucionais ao abrigo do artigo 37.º do CIRE. Foi também nomeado um administrador judicial – cf. Documento 6.
  11. A Requerente esteve sem atividade, pelo menos desde 2012, tendo-a reiniciado em novembro de 2016 – cf. Documento 7 e RIT.
  12. A Requerente não assegurou as suas obrigações contabilísticas desde 2006 até 2012, tendo, no final de 2012, contratado um contabilista que começou a assegurar o respetivo cumprimento – cf. depoimento da testemunha K... .
  13. Por sentença de 1 de fevereiro de 2016, do Tribunal da Comarca de Lisboa, 1.ª Secção Comércio, foi decretada a insolvência da Requerente, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa revogado esta decisão, por acórdão datado de 14 de julho de 2016, entendendo que o valor do imóvel detido pela Requerente era suficiente para satisfazer a dívida à B..., não se verificando uma situação de impossibilidade de cumprir as obrigações vencidas – cf. Documento 8.
  14. Durante cerca de 6 meses do ano 2016, correspondentes ao período em que a Requerente foi decretada insolvente, os seus gerentes tiveram de entregar diversos livros e registos sociais e os elementos da sua contabilidade ao administrador da insolvência – cf. Documentos 7 e 8.
  15. Em 16 de novembro de 2017, a Requerente alienou o imóvel identificado no ponto B pelo preço declarado de € 22.000.000,00 – cf. Documento 10.
  16. No período de 2017, a Requerente constituiu uma provisão para “contratos onerosos – C...” no montante de € 273.341,20, para fazer face ao valor do pagamento que estava a ser negociado pelo incumprimento, por parte da D... (declarada insolvente em 2012), do “Contrato de Revitalização e Modernização Empresarial” celebrado em 2000, entre a Requerente, o C..., o G... e a D..., correspondente a cerca de 20% a 30% do valor em dívida da D... ao G... – cf. RIT, depoimentos das testemunhas E..., F... e K... .
  17. O valor a pagar ao G... do C... acabou por ser definitivamente fixado em 21 de setembro de 2018, com a celebração de um acordo de resolução entre o G..., a Requerente e os seus dois gerentes, em que foi considerada regularizada a situação contratual devedora ao G..., mediante o pagamento a este, pela Requerente, de € 210.000,00 – cf. Documento 9.
  18. Em 28 de junho de 2018, a Requerente apresentou a Declaração Mod. C de IRC do período de tributação de 2017, na qual reportou uma mais-valia contabilística, derivada da venda do imóvel identificado no ponto B, no valor de € 21.541.237,74, deduzida no campo 767 do Quadro 07. Em relação à mais-valia fiscal de € 21.339.382,35, visto que o sujeito passivo pretendia reinvestir o montante de € 7.000.000,00, foi acrescido o valor de € 14.549.578,87 no campo 739 do Quadro 07 e € 3.394.901,74 no campo 740 do mesmo Quadro 07 – cf. Documento 11.
  19. Nesta Declaração Mod. C referente a 2017, a Requerente declarou prejuízos fiscais dedutíveis de € 11.676.643,31 e um lucro tributável de € 17.338.737,68, apurando-se uma matéria coletável no valor de € 5.662.094,37 – cf. Documento 11.
  20. Através da Ordem de Serviço n.º OI2019..., foi a atividade da Requerente objeto de um procedimento de inspeção tributária, com início em 25 de novembro de 2019, que abrangeu o período de tributação de 2017 – cf. RIT.
  21. O procedimento teve por objeto avaliar a situação tributária do sujeito passivo, face ao resultado fiscal declarado, com incidência na rúbrica de imparidades e proceder à retificação dos prejuízos deduzidos ao Lucro Tributável face às correções propostas em anos anteriores – 2015 e 2016 – cf. RIT.
  22. A Requerente foi notificada do Projeto de Relatório de Inspeção Tributária, que propôs o ajustamento à matéria coletável de € 11.561.264,32 de prejuízos fiscais indevidamente deduzidos em resultado das correções de anos anteriores (2015 e 2016), bem como de € 273.341,20, relativamente à constituição, no exercício de 2017, de uma provisão para contratos onerosos (C...), e de € 184.701,29 de gastos de exercícios anteriores não acrescidos. A Requerente exerceu por escrito, o respetivo direito de audição prévia aceitando e regularizando esta última correção (€ 184.701,29), que não faz parte do objeto desta ação – cf. RIT.
  23. As restantes correções projetadas mantiveram-se, tendo a Requerente sido notificada do RIT definitivo, que, com relevância para os autos, enuncia os seguintes fundamentos:

[…]

II.4.3. Considerações Diversas

II.4.3.1.1 Venda de imóvel

O sujeito passivo era proprietário de um prédio urbano, propriedade total sem andares nem divisões, onde funcionava a fábrica onde era exercida a actividade, situado na freguesia de ..., na Av. ..., Nº ... e ... , tornejando para a Av. ... Nºs ..., ... e ..., com o artigo matricial nº ... .

Este prédio foi vendido no ano de 2017 à entidade “L..., SA” contribuinte nº ..., pelo preço de € 22.000.000,00, sendo o seu VPT à data de € 7.129.493,73.

Trata-se de um imóvel muito antigo, segundo a escritura de compra e venda que nos foi apresentada o terreno onde foi implementada a fábrica foi arrematado na Câmara Municipal de ... em 1948 tendo sido efetuada a respetiva escritura apenas em 1963 pelo valor de 1.228.921,00 escudos. No entanto, e segundo nos informaram, a fábrica terá começado a funcionar no ano de 1952.

Relativamente à mais-valia contabilística apurada na venda do imóvel no montante de € 21.541.237,74, foi deduzida na linha 767 - Mais - valias contabilísticas, do Q. 07 da Mod. 22 de 2017.

No tocante à mais-valia fiscal no montante de € 21.339.382,351 visto o sujeito passivo pretender re[in]vestir o montante de 7.000.000,00, foi acrescido o valor de € 14.549.578,87, na linha 739 e € 3.394.901,74 na linha 740 do Q. 07.

II.4.3.1.2  Fornecimentos e Serviços Externos

Durante o período de 2017 o sujeito passivo contabilizou como gastos nas várias subcontas da rúbrica de Fornecimentos e Serviços Externos o montante de € 2.563.354,90.

Da análise efectuada conclui-se que parte destes gastos é justificada de imediato pela contabilização (conta 622491) dos honorários cobrados pela sociedade “M..., Lda” referentes à intermediação na venda do imóvel (Fábrica) à “L..., SA” no montante de € 1.071.576,00 (Ft. nº. .../2017(FA) de 16-11-2017)). Nesta conta também foram contabilizados gastos referentes a honorários de advogados referentes a serviços relacionados com a venda do imóvel e com o processo “B...”.

II.4.3.1.3 Provisões

Na demonstração de resultados do período de 2017 consta na rúbrica de provisões o valor negativo de € 2.203.769,93. Este montante resulta da contabilização de uma provisão para fazer face a uma possível penalidade pelo incumprimento do contrato com o C... no montante de € 273.341,20, e a uma reversão no montante de € 2.477.111,13, de uma provisão de € 3.946.150,48 constituída em anos anteriores para fazer face aos juros devidos à B..., tendo sido pago apenas € 1.469.039,71.

Tendo em conta que no âmbito do procedimento inspectivo ao período de 2016, a provisão constituída no montante de € 3.946,150,48 não foi aceite em termos fiscais por contrariar o disposto na alínea a) do nº 1 e do nº 2 do artigo 39º do CIRC, conjugado com o n.º 1 dos artigos 18º e 23.º do CIRC, o sujeito passivo na declaração Mod. 22 de substituição de 2017 em 10/12/2019 (ID ...-...-...), mencionou na linha 764 - Reversão de provisões tributadas (artºs 19º , nº 4 e 39º nº 4) a dedução ao quadro 07, no montante de € 2.477.111,13.

III.   Descrição dos Factos e Fundamentos das Correções Meramente Aritméticas

III.1 Prejuízos fiscais deduzidos indevidamente

Na declaração Mod. 22 de IRC do período de 2017 (ID ...-...-...) entregue inicialmente pelo sujeito passivo em 28-06-2018, foi declarado um Lucro Tributável no montante de € 17.338.737,68, tendo sido deduzidos prejuízos fiscais no montante de € 11.676.643,31, apurando-se uma matéria coletável no valor de € 5.662.094,37.

Na declaração Mod. 22 de IRC de substituição do período de 2017 (ID ...-...-...) entregue pelo sujeito passivo em 10-12-2019 (e que se encontra no estado “Doc. Não Liquidável”), foi declarado um Lucro Tributável no montante de € 15.046.327,84, tendo sido deduzidos prejuízos fiscais no montante de € 10.532.429,49, apurando-se uma matéria coletável no valor de € 4.513.898,35. Os prejuízos fiscais deduzidos têm origem nos prejuízos fiscais declarados nos períodos de 2014, 2015 e 2016.

No âmbito dos procedimentos inspetivos efetuados aos períodos de 2015 (OI2018...) e 2016 (OI2018...), foram efetuadas correções relativas a imparidades e provisões não aceites fiscalmente com impacto no apuramento dos prejuízos fiscais declarados. Como se verifica no quadro abaixo, os prejuízos declarados nos anos de 2015 e 2016 nos montantes de € 1.200.902,99 e € 10.469.907,51, respetivamente, foram corrigidos para prejuízos fiscais nos montantes totais de € 52.681,67 em 2015 e € 56.864,41 cm 2016.

Controlo dos prejuízos dedutíveis

 

2014

2015

2016

2017

Prejuízo para efeitos fiscais declarado

5.832,91

1.200.902,99

10.469.907,51

 

Prejuízo corrigido pela AT

0,00

52.681,67

56.864,41

 

Dedução de prejuízos (a)

0,00

0,00

0,00

11.676.643,31

Prejuízos que podia deduzir (b)

 

 

 

115.378,99

Prejuízos deduzidos indevidamente (a)– (b)

 

 

 

11.561.264,32

Deste modo, os prejuízos fiscais deduzidos na primeira declaração Mod. 22 de IRC de 2017 entregue pelo sujeito passivo foram de montante superior aos prejuízos fiscais que poderia deduzir, dado que só podia deduzir o somatório dos prejuízos do ano de 2014 e dos anos de 2015 e 2016 corrigidos pela Autoridade Tributária, no montante de € 115.378,99, como consta do print que se apresenta em seguida, o que significa que o sujeito passivo deduziu prejuízos indevidamente no montante de € 11.561.264,32 […]

Do exposto, conclui-se que o sujeito passivo deduziu indevidamente ao lucro tributável do período de 2017 prejuízos fiscais no montante de € 11.561.264,32, nos termos da alínea a), do n.º 1 do artigo 15.º e do artigo 52.º do CIRC, pelo que tal valor será desconsiderado no apuramento da matéria tributável desse período.

III.2 Provisões para contratos onerosos – C...

No período de 2017 o sujeito passivo constituiu uma provisão para contratos onerosos – “C...” no montante de € 273.341,20, (débito da conta “67.6 – Provisões do período –Contratos onerosos – C...” e crédito da conta “29.6 – Provisões – Contratos onerosos”) […]. Segundo justificação apresentada, tal provisão foi constituída para fazer face a uma eventual penalização por incumprimento de um contrato celebrado com o C... .

Esta provisão constituída pelo sujeito passivo não é aceite fiscalmente, pois a mesma não tem acolhimento no seio da legislação fiscal (nomeadamente, sem previsão legal nos termos do artigo 39.º do CIRC), além de que, segundo consta de correspondência trocada em 2015, quem outorgou tal contrato com o C... foi a sociedade “D..., SA” e não o sujeito passivo em análise.

Tal provisão no montante de € 273.341,20, deveria ter sido acrescida ao Quadro 07 da declaração de rendimentos Modelo 22 do IRC do período de 2017, o que não aconteceu, pelo que se procederá à sua correção fiscal.

[…]

IX. Direito de Audição – Fundamentação

O sujeito passivo foi notificado, conforme ofício nº DF... ... de 22-01-2020, do Projeto de Relatório da Inspeção Tributária, resultante do procedimento inspetivo ao exercício de 2017  […] para, no prazo de 15 dias, caso quisesse, exercer o direito de audição.

No dia 10-02-2020 (Entrada Geral no 2020...) o contribuinte veio a materializar o exercício do direito de audição, enviando petição para o efeito […] Da argumentação aduzida, maioritariamente já manifestada no âmbito do exercício do direito de audição relativo aos procedimentos inspetivos efetuados aos exercícios de 2015 (OI2018...) e 2016 (OI2018...) e que não pode ser dissociada das correções meramente aritméticas aí efetuadas e do seu impacto nos ajustamentos aos prejuízos fiscais deduzidos pelo contribuinte no período de 2017, cumpre proceder, em síntese, ao seu enquadramento e análise.

Na parte introdutória da petição, o sujeito passivo começa por referir que relativamente às correções propostas à matéria coletável de IRC do período de 2017, “(...) a aludida correção peca pelo excesso (...)”. Refere ainda que “(…) verifica-se neste caso a excessivamente rígida aplicação do princípio da especialização de exercícios, sem qualquer consideração com o princípio da solidariedade entre exercícios que com ele se deve obrigatoriamente articular (...)”. Reafirma também que “(...) os custos de exercícios anteriores reconhecidos no período em análise devem ser aceites para efeitos de determinação do resultado tributável, já que a sua não relevação no exercício a que dizem respeito teve lugar em virtude de omissões involuntárias ou não intencionais, que se devem a situações externas e não imputáveis à Requerente e que nem ela, nem os seus gerentes ou qualquer outra pessoa poderiam controlar.”. Invoca diversos acórdãos e decisões emanados dos tribunais judiciais e do CAAD para sustentar que “0 princípio da especialização ou autonomia dos exercícios (...) sofre as excepções, previstas na lei, quais sejam: - nos casos em que haja imprevisibilidade ou manifesto desconhecimento (...) nas situações em que a administração fiscal não teve qualquer prejuízo com o erro praticado pelo contribuinte e quando esse erro não resultar de omissões voluntárias ou intencionais, com vista a onerar as transferências de resultados entre exercícios”.

Ainda assim, convém salientar que toda a argumentação apresentada na petição para contrariar as correções propostas por estes serviços, vem maioritariamente sustentada no facto de que a violação do princípio da especialização económica dos exercícios derivou de omissões involuntárias ou não intencionais devido a situações externas à requerente […], relacionadas com a inibição da prática de atos de gestão pelos responsáveis da empresa após a sentença de insolvência da “D..., SA” (onde também acumulavam as funções de administração desta sociedade) ocorrida em 26/04/2012, bem como na declaração de insolvência temporária (de 04/02/2016 a 15/07/2016) imposta à Requerente por ação interposta pela “B...”.

No entanto, tal argumentação não pode colher aceitação, porquanto:

(a) O impedimento da prática de atos de gestão por parte dos gerentes da Requerente por insolvência culposa, relacionada com o processo n.º 107/12.1TBFVN-E, apenas ocorreu a partir da sentença de incidente de qualificação de insolvência - apenso E, que transitou em julgado em 24/02/2015, pelo que à data de 26/04/2012 (data em que ocorreu a sentença de insolvência decretada à sociedade “D..., SA”), não se verificava qualquer inibição, como pretendem demonstrar e sustentar ao longo da sua lógica argumentativa, conforme foi comprovado e fundamentado no relatório relativo aos procedimentos inspetivos efetuados aos exercícios de 2015 (OI2018...) e 2016 (OI2018...), notificado ao sujeito passivo, e para o qual se remete;

(b) Verifica-se também por consulta às aplicações informáticas da AT, que nas declarações modelo 22 do IRC e nas declarações de Informação Empresarial Simplificada (IES) relativas aos períodos de 2012 a 2017, que foram entregues pela requerente, consta mencionado o NIF […] pertencente ao sócio gerente Sr. I..., na qualidade de representante legal da sociedade;

(c) Ao contrário do que afirma a Requerente […] de que “(...) apesar de o risco de incobrabilidade das imparidades reconhecidas em 2016 relativas à D... ter-se verificado  em 2012, com a sua declaração de insolvência, a verdade é que essa omissão não se deveu a omissões voluntárias ou Intencionais, mas antes a situações externas à Requerente e que nem ela, nem os seus gerentes ou qualquer outra pessoa puderam controlar.”, no âmbito do relatório de inspeção aos procedimentos inspetivos efetuados aos exercícios de 2015 (OI2018...) e 2016 (OI2018...), ficou demonstrado que;

(c1) o não cumprimento da aplicação do princípio da especialização económica dos exercícios relativamente ao reconhecimento das imparidades de Outros Devedores (suprimentos) e às provisões para processos judiciais em curso, não resultou de quaisquer omissões involuntárias derivadas de situações externas, mas sim da vontade da requerente e dos seus gerentes, na medida em que não cumpriram com os requisitos legais, quer contabilísticos quer fiscais;

(c2) relativamente ao registo contabilístico e fiscal das imparidades de Outros Devedores (suprimentos à “D..., SA”), a Requerente tinha conhecimento do risco de incobrabilidade dos seus créditos no ano de 2009, pois os seus sócios gerentes/ administradores (comuns às duas empresas) tinham conhecimento das dificuldades financeiras que a “D..., SA” estava a atravessar, conforme também se depreende da resposta do sujeito passivo à notificação efectuada pela Autoridade Tributária, que se transcreve: “(…) Os negócios não estavam a correr bem, ao ponto de em Dezembro de 2009 se tentar um outro contrato de consolidação financeira e reestruturação Empresarial, envolvendo 0 N..., SGPS, SA., A O..., Lda. e as D..., entre outras(...)”, acrescendo a esta circunstância a posterior sentença de insolvência ocorrida em 30/04/2012, conforme referido;

(c3) no tocante ao registo contabilístico e fiscal das provisões para processos judiciais em curso, e atendendo a que tais provisões não resultam de qualquer processo judicial em concreto, não estando a sua assunção dependente de decisão judicial, mas sim do reconhecimento de juros de empréstimos, circunstância que devia ter ocorrido a partir do final de 2007, pois tais empréstimos foram contraídos em 25-10-2007 (€ 7.000.000,00) e em 18-06-2010 (€ 1.500.000,00);

(c4) relativamente ao erro praticado (não cumprimento do princípio da especialização económica dos exercícios a partir de 2007), verifica-se que o mesmo possibilitou a transferência de resultados negativos para exercícios seguintes (2015/2016) permitindo que tais prejuízos pudessem ser deduzidos no período de 2017 (no momento da venda do imóvel). A contabilização das imparidades e provisões nos períodos de 2015 e 2016, originaram prejuízos fiscais nos valores de € 1.200.902,99 e € 10.469.907,51, respetivamente, totalizando um montante global de prejuízos de €11.670.810,50. No período de 2017 o sujeito passivo declarou um lucro tributável no montante de €17.338.737.68, resultante da mais-valia obtida na venda do imóvel (fábrica), ao qual deduziu prejuízos fiscais no montante €11.676.643,31 dos quais €11.670.810,50 tiveram origem nestas imparidades e provisões, contribuindo assim para a obtenção de uma matéria coletável apenas no montante de 5.662.094,37.

(c5) concluindo-se assim, que a Requerente tinha conhecimento, pelo menos desde 2009, do risco de incobrabilidade associado aos créditos concedidos à “D..., SA”, bem como, desde 2007, da necessidade de proceder ao registo dos juros a pagar pelos empréstimos contraídos à “B...”, não existindo qualquer inibição de proceder aos respetivos reconhecimentos contabilísticos e fiscais, pois tal só se verificou a partir do ano de 2015, contrariamente à fundamentação utilizada, de que tais omissões não foram voluntárias ou intencionais. Como também deveria ter conhecimento que com a expectativa da venda do imóvel (ocorrida em 2017), apuraria uma matéria tributável de IRC de valor considerável se não registasse tais imparidades e provisões em 2015 e 2016, para que pudessem ser deduzidas através da utilização de prejuízos fiscais, em 2017. De igual modo, verifica-se que a contabilização das imparidades e provisões objeto de correção foram efetuadas nos exercícios de 2015 e 2016, períodos esses, onde de facto se verificava a inibição dos gerentes da sociedade de praticarem quaisquer atos de gestão, contrariamente ao que tentaram demonstrar ao longo de toda a petição, com o intuito de justificar a não aplicabilidade do princípio da especialização dos exercícios no reconhecimento das imparidades e provisões em questão, por situações externas, que os responsáveis da empresa não podiam controlar.

Sintetizada a argumentação “conceptual” (também já elencada pela Requerente no âmbito do exercício do direito de audição prévia dos procedimentos OI2018... e OI2018...), e os motivos para a sua não aceitação por parte destes Serviços de Inspeção, debrucemo-nos então, sobre outros factos invocados no articulado da petição.

No Capítulo I — Dos Factos, a requerente começa por discorrer sobre o enquadramento histórico da empresa desde a sua constituição até à data, embora os factos aí relatados nada acrescentem à justificação dos factos tributários em análise e que originaram as correções propostas.

[…], pronuncia-se sobre os efeitos da declaração de insolvência da “D..., SA” na Requerente, mencionando que os seus 2 sócios gerentes também eram os administradores da primeira à data dos factos, e que ficaram inibidos do exercício do comércio e de ocupar ativamente cargos sociais durante três anos e dois anos e três meses, respetivamente. Refere ainda que os sócios gerentes da Requerente ficaram “(…) física e juridicamente impedidos de relevar nas contas os movimentos contabilísticos relacionados com a insolvência da sociedade D..., (…)”, pelo  que, “(...) apesar de o risco de incobrabilidade das imparidades reconhecidas em 2016 relativas à D... ter-se verificado em 2012, com a sua declaração de insolvência, a verdade é que essa omissão não se deveu a omissões voluntárias ou Intencionais, mas antes a situações externas à Requerente e que nem ela, nem os seus gerentes ou qualquer outra pessoa puderam controlar.”

Conforme já anteriormente ficou demonstrado, o impedimento da prática de atos de gestão por parte dos gerentes da Requerente por insolvência culposa, apenas ocorreu a partir de 24/02/2015, não se verificando qualquer inibição dessa natureza entre a data (26/04/2012) em que ocorreu a sentença de insolvência decretada à sociedade “D..., SA” e aquela data, pelo que não poderemos considerar e validar tais argumentos, por alterarem a verdade material dos factos e acontecimentos. Acresce referir que os gerentes continuaram a praticar atos de gestão, desde logo através da entrega das declarações fiscais obrigatórias (p. ex., Mod. 22 e IES).

Atente-se também à factualidade dada como provada na sentença de insolvência da sociedade “D..., SA” donde se retira a seguinte transcrição:

“«Desde o ano de 2005 que a actividade da insolvente é deficitária»; A situação de endividamento da sociedade (por conta do aumento do passivo junto a terceiros) ocorre, pelo menos, desde 2007; «conforme relatório sobre a contabilidade da insolvente «a sociedade estaria, eventualmente, há muito insolvente. Face ao montante do passivo deve, assim, ser questionado o dever de apresentação à insolvência já que encontra-se a sociedade desde os três últimos anos, face aos elementos recolhidos, numa situação de incapacidade para satisfazer os seus compromissos, situação amenizada desde o exercício de 2010, através da venda de imobilizado (...) E não se diga que os administradores não sabiam da situação.”.

Dado que os administradores, Srs. I... e J..., também eram gerentes da Requerente, mais uma vez fica demonstrado o seu conhecimento relativamente ao risco de incobrabilidade dos créditos sobre a sociedade “D..., SA”.

Sobre as correcções meramente aritméticas propostas no ponto III.1 deste Relatório, no montante total de € 11.561.264,32, relativas a ajustamentos de prejuízos, deduzidos indevidamente ao lucro tributável do período de 2017, a Requerente menciona […] que não podem deixar de ser reconhecidos como dedutíveis, os montantes de €5.832 91 (prejuízo fiscal declarado de 2014), de €52.681 67 (prejuízo fiscal de 2015 corrigido pela AT), de €4.004.850 78 (componente do prejuízo fiscal declarado em 2016 e correspondente à perda de imparidade registada pelos suprimentos à D..., SA) e ainda de €3.946.150 84 (componente do prejuízo fiscal declarado em 2016 e correspondente à provisão constituída relativa a processo judicial em curso – reclamação de créditos apresentada pela B...), tudo num montante total de €8.009.516,10.

Face à argumentação apresentada, relativamente às componentes do prejuízo fiscal declarado de 2016 acima referidas (€4.004.850,78 e €3.946.150,84) cumpre esclarecer que tais questões já foram apreciadas e discutidas no âmbito do Relatório de Inspeção relativos aos procedimentos inspetivos efetuados aos exercícios de 2015 (OI2018...) e 2016 (OI2018...). De igual modo, o motivo desta correção/ajustamento respeita exclusivamente ao corte do reporte dos prejuízos fiscais deduzidos, que deriva da não aceitação para efeitos fiscais desses gastos no âmbito dos procedimentos inspetivos anteriormente referidos, não podendo ser suscitada novamente a sua discussão no âmbito deste procedimento Inspetivo ao período de 2017, havendo meios legais próprios para tal.

Sobre as correcções meramente aritméticas propostas no ponto III.2 deste Relatório, no montante total de €273.341,20, relativas à constituição em 2017 de uma “provisão para contratos onerosos — C...” para fazer face a uma eventual penalização por incumprimento de um contrato celebrado com o C..., a Requerente invoca […] que haveria em anos anteriores, um impedimento para o reconhecimento contabilístico de tais gastos, derivado da inibição da prática de atos de gestão por parte dos gerentes da Requerente por insolvência culposa.

Conforme já foi demonstrado anteriormente, o impedimento da prática de atos de gestão por parte dos gerentes da Requerente por insolvência culposa, relacionada com o processo n.º 107/12.1TBFVN-E, apenas ocorreu a partir da sentença de incidente de qualificação de insolvência – apenso E, que transitou em julgado em 24/02/2015, pelo que à data de 26/04/2012 (data em que ocorreu a sentença de insolvência decretada à sociedade “D..., SA”), não se verificava qualquer inibição para a prática de atos de gestão por parte dos gerentes da Requerente.

Por outro lado, esta provisão constituída pelo sujeito passivo não é aceite fiscalmente, pois a mesma não tem acolhimento no seio da legislação fiscal (nomeadamente, sem previsão legal nos termos do artigo 39.º do CIRC), além de que, segundo consta de correspondência trocada em 2015, quem outorgou tal contrato com o C... foi a sociedade “D..., SA” e não o sujeito passivo em análise, devendo ter sido acrescida ao Quadro 07 da declaração de rendimentos Modelo 22 do IRC do período de 2017, o que não aconteceu.

No Capítulo II — Do Direito, a requerente invoca um conjunto de princípios gerais e legais, designadamente, o princípio reforçado da legalidade tributária, o princípio da legalidade tributária como interesse público a prosseguir pela administração, o dever público de investigação com vista à descoberta da verdade material e o princípio da dependência parcial da contabilidade, sem nada referir quanto ao caso em concreto, visando entroncar a sua fundamentação no princípio da especialização dos exercícios, de modo a sustentar que a violação de tal princípio derivou de omissões involuntárias ou não intencionais devido a situações externas à requerente, relacionadas com a inibição da prática de atos de gestão pelos responsáveis da empresa, conforme já anteriormente referido e cujos factos e pressupostos subjacentes apresentados foram devidamente refutados.

[…] a Requerente debruça-se sobre o enquadramento da aplicabilidade do princípio da especialização dos exercícios e da solidariedade dos exercícios, citando, entre outros, um entendimento interno da extinta Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, vertido no Ofício Circular C-1/84, de 18 de junho (anterior à vigência do CIRC / SNC), que refere “(...) apenas não são de aceitar os custos e proveitos de exercícios anteriores para efeitos de determinação do resultado  tributável do exercício em que foram contabilizados nos casos em que os mesmos são resultantes de omissões voluntárias e intencionais. (…)” e procurando associá-lo ao princípio da justiça stricto sensu ou material, consagrado no n.º 2 do artigo 266.º da CRP e no artigo 55.º da LGT, que deve pautar a atividade da Administração Tributária. Reitera que a devida articulação e ponderação do interesse público com o princípio da justiça “(...) tem levado a nossa jurisprudência a aceitar a derrogação do princípio da especialização dos exercícios sempre que tal não resulte de omissões voluntárias por parte do sujeito passivo, como é o caso." e que “(…) nos casos em que a violação do principio da especialização dos exercícios decorra de erro ou omissão involuntária do sujeito passivo, os atos tributários que vierem a ser aplicados em desrespeito do princípio da justiça deverão ser anulados por vício de lei e violação do princípio da justiça.”.

Face ao arguido no articulado anterior, verifica-se que a Requerente procura reforçar a tese de que a violação do princípio da especialização dos exercícios, derivou de omissões involuntárias ou não intencionais devido a situações externas à requerente, relacionadas com a inibição da prática de atos de gestão pelos responsáveis da empresa nos períodos de 2012 e seguintes, circunstância já apreciada e devidamente refutada, no âmbito dos procedimentos inspetivos efetuados ao exercício de 2015 (OI2018...) e 2016 (OI2018...).

Não deve, pois, a Requerente invocar a aplicabilidade do principio da justiça para legitimar a derrogação do principio da especialização dos exercícios aos casos que originaram correções meramente aritméticas aos períodos de 2015, 2016 e 2017 (imparidades e provisões que deveriam ser reconhecidas em períodos anteriores), uma vez que ficou demonstrado que os fundamentos onde se pretende sustentar, decorrem de omissões voluntárias, atendendo aos factos conhecidos à data. Por outro lado, a consideração dos gastos nos exercícios de 2015 e 2016, permitiram o apuramento de prejuízos fiscais em exercícios recentes, com a atenuação significativa na tributação do período de 2017, que coincidiu com a venda do principal activo da empresa, o que compara com uma situação substancialmente diferente, no caso de apuramento de prejuízos nos anos em que os gastos deveriam ter sido reconhecidos, uma vez que resultaria na impossibilidade de dedução em 2017 por motivo de caducidade dos mesmos.

Face ao exposto, e efetuada uma análise pormenorizada de toda a argumentação e elementos apresentados pelo sujeito passivo na petição que materializou o direito de audição prévia, verifica-se que tais factos não alteram a fundamentação e as correções propostas e mencionadas no Projeto de Relatório já notificado ao sujeito passivo, nomeadamente porque não ficou demonstrado que a não contabilização dos gastos nos períodos em que deveriam ter lugar, se tratou de omissões involuntárias ou não intencionais, nem se pode invocar o afastamento do princípio da especialização dos exercícios conforme resulta da legislação mencionada, dado que os factos não eram imprevisíveis ou manifestamente desconhecidos naquela data, verificando-se ainda não ser irrelevante do ponto de vista fiscal a assunção de tais gastos no exercício a que respeitam ou no exercício a que o contribuinte decidiu imputá-los. A dedução de prejuízos fiscais está legalmente limitada no tempo (artigo 52.º do CIRC) e o apuramento do resultado tributável de cada exercício deve respeitar o princípio da especialização dos exercícios (artigo 18.º do CIRC), daí resultando necessariamente a manutenção das correções propostas.” – cf. RIT.

  1. Em 10 de dezembro de 2019, a Requerente submeteu uma declaração de substituição relativa ao IRC de 2017, com o código de verificação ..., procedendo à reversão parcial da provisão não aceite pela AT em 2016, no valor de € 3.946.150,48, relativa a juros estimados em dívida à B... . Neste âmbito, por ter sido realizado, em 2017, o pagamento desses juros no montante de € 1.469.039,71, a Requerente reverteu a diferença de € 2.477.111,13 (= € 3.946.150,48 - € 1.469.039,71). Ao valor da reversão de € 2.477.111,13 subtraiu ainda a provisão constituída para fazer face ao pagamento ao C..., de € 273.341,20, resultando no valor negativo de € 2.203.769,93, e no apuramento de uma matéria coletável de € 4.513.898,35 que a AT não tomou em consideração no apuramento da liquidação a que se refere o ponto seguinte, encontrando-se a declaração de substituição no estado “Doc. Não liquidável” – cf. Documento 12. 

 

 

  1. Em 19 de março de 2020, a Requerente foi notificada da liquidação de IRC n.º 2020 ..., datada de 12 de março de 2020, referente ao período de tributação de 2017, que resultou no valor global a pagar de € 2.595.414,91, incluindo juros compensatórios de € 167.935,79 (liquidação de juros n.ºs 2020 ...) e juros de mora de € 1,20 (liquidação de juros n.º 2020 ...), conforme demonstração de acerto de contas n.º 2020 ..., com data limite de pagamento de 4 de maio de 2020 – cf. Documento 1.
  2. Em discordância com a liquidação de IRC e de juros compensatórios e de mora vertentes, a Requerente apresentou, em 2 de junho de 2020, reclamação graciosa que foi indeferida, por despacho de 25 de agosto de 2020 do Diretor adjunto da Direção de Finanças de ..., o qual foi notificado por ofício de 26 de agosto – cf. Documento 2.
  3. Nos fundamentos de indeferimento da reclamação graciosa relevou-se que a declaração de substituição do período de 2017 apresentada em 10 de dezembro de 2019 ficou no estado não liquidável, em virtude de o resultado fiscal dessa declaração ser mais favorável ao contribuinte e, de acordo com a regra especial prevista no artigo 122.º, n.º 2 do Código do IRC, “A autoliquidação de que tenha resultado imposto superior ao devido ou prejuízo fiscal inferior ao efectivo pode ser corrigida por meio de declaração de substituição a apresentar no prazo de um ano a contar do termo do prazo legal”. Ou seja, para que produzisse efeitos devia ter sido submetida e entregue até 31 de maio de 2019 – cf. Documento 2.
  4. Mantendo a discordância em relação aos atos tributários de liquidação de IRC e juros compensatórios referentes ao período de 2017, a Requerente apresentou no CAAD, em 18 de novembro de 2020, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral que deu origem ao presente processo – cf. registo de entrada do ppa no SGP do CAAD.  

 

 

 

  1. Motivação da Decisão da Matéria de Facto

 

Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT, não tendo o Tribunal de se pronunciar sobre todas as alegações das Partes.

 

Não se deram como provadas nem não provadas as alegações feitas pelas Partes e apresentadas como factos, consistentes em meros juízos conclusivos, insuscetíveis de prova e cuja validade terá de ser aferida em relação à concreta matéria de facto consolidada.

 

No que se refere aos factos provados, a convicção dos árbitros fundou-se, essencialmente, na análise crítica da prova documental junta aos autos, tendo em conta as posições assumidas pelas Partes em relação aos factos essenciais, e no depoimento das testemunhas inquiridas, E..., F... e K..., indicadas pela Requerente, e P..., indicada pela Requerida, que relataram os factos que eram do seu conhecimento direto, aparentando depor com objetividade e isenção.

 

  1. Factos não Provados

 

Não se provou que os gerentes da Requerente tenham estado inibidos de exercer as funções de gerência desta e de ocupar ativamente os cargos sociais (artigo 32 do ppa), nem que a Requerente ou os seus gerentes não recebiam, desde 2012, qualquer indicação por parte da B..., quanto aos juros vencidos e devidos (artigos 41, 44 e 45 do ppa). A informação sobre os juros – taxas aplicáveis, spreads e sobretaxa em caso de incumprimento – constava dos contratos outorgados pela Requerente, seja como mutuária, co-contratante ou simplesmente garante, pelo que aquela não a pode ignorar.

 

Acresce assinalar, a este respeito, que do depoimento do contabilista certificado da Requerente, ressalta que era solicitada informação ao gerente I... . Porém, quando esta não lhe era facultada, não significa que o gerente não estivesse na posse dessa informação. Nomeadamente, quanto à insolvência da D... e créditos reconhecidos não tinha razão para ignorá-la, pois além de ser representante da Requerente, que era credora daquela, também foi administrador da D... .

 

De igual modo, não se provou que o preço de venda do imóvel tenha sido € 10.000.000,00 e que os € 12.000.000,00 adicionais fossem apenas imputáveis a uma cessão de créditos (artigo 48 do ppa). A escritura de compra e venda é clara na afirmação do preço de venda do imóvel: € 22.000.000,00. Em termos de fluxo de caixa, a Requerente não recebeu integralmente este valor, mas apenas € 10.000.000,00, porque o remanescente, de € 12.000.000,00 foi afeto à B... para extinção das dívidas/passivo acumulado da Requerente junto daquela, por forma a possibilitar o distrate das hipotecas. O facto de uma parte do produto da venda do imóvel estar destinada a esse fim, não significa que o preço ficasse subtraído dessa quantia. Pelo contrário, é o preço de € 22.000.000,00 que permite que a Requerente, depois de eliminar o seu passivo com a B..., ainda possa ficar com o valor remanescente de € 10.000.000,00.

 

Também não é de acolher que a Requerente ignorasse a informação sobre encargos resultantes das operações bancárias contratadas pela D..., pois teve intervenção nesses contratos celebrados com a B..., como co-contratante ou como garante (v. pontos I a L da matéria de facto assente), além de que os seus gerentes só a partir de 24 de fevereiro de 2015 sofreram limitações no acesso aos documentos, no âmbito da sentença de incidente de qualificação de insolvência – apenso E da D..., nos termos referidos no RIT.

 

Não ficou provado que a Requerente figure como garante da operação constante do “Contrato de Revitalização e Modernização Empresarial”, realizada com o apoio do C... (artigos 67, 183, 186 do ppa). A Requerente é interveniente deste Contrato, mas não assume a função de garante, sendo a D...  expressamente designada como responsável pela restituição das importâncias cedidas pelo Fundo.

 

Com relevo para a decisão, não existem outros factos alegados que devam considerar-se não provados.

 

 

IV. Saneamento – Questões Prévias

 

1.    (In)competência Material para Apreciar a (In)Validade da Reforma ou Conversão de Ato Administrativo

 

Segundo a Requerida, o conhecimento, por este Tribunal Arbitral, da ilegalidade formal do ato tributário invocada pela Requerente, extravasa as competências reservadas por lei aos Tribunais Arbitrais Tributários, de acordo com o disposto no artigo 2.º, n.º 1 do RJAT e no artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março (“Portaria de Vinculação”).

 

O citado artigo 2.º, n.º 1 do RJAT enuncia os critérios de repartição material da competência dos Tribunais Arbitrais nos seguintes moldes:

 

Artigo 2.º

Competência dos tribunais arbitrais e direito aplicável

1 – A competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões:

  1. A declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta;
  2. A declaração de ilegalidade de atos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de atos de determinação da matéria coletável e de atos de fixação de valores patrimoniais;
  3. (revogada).”

Prevê ainda o artigo 4.º, n.º 1 do RJAT que “[a] vinculação da administração tributária à jurisdição dos tribunais constituídos nos termos da presente lei depende de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, que estabelece, designadamente, o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos.”

 

Por fim, a Portaria de Vinculação vem confirmar a jurisdição dos Tribunais Arbitrais para a apreciação das “pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida referidas no n.º 1 do artigo 2.º do [RJAT]”, com algumas exceções, nomeadamente quanto aos “actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário”.

 

Interessa, a este respeito, compulsar o entendimento da Requerente, segundo o qual o ato tributário impugnado procede à reforma ou conversão de uma autoliquidação que, à data da emissão daquele, já tinha caducado por substituição por outra autoliquidação, submetida em 10 de dezembro de 2019. Assim, o poder de reforma ou conversão conferido à Requerida pelo artigo 79.º, n.º 1 da LGT enfermaria de ilegalidade, pois pressupunha a existência jurídica (na aceção de vigência) da autoliquidação sobre que incidiu e esta já tinha sido eliminada por uma autoliquidação substitutiva comprovadamente entregue.

 

Para a Requerida, não está incluída na competência dos Tribunais Arbitrais a apreciação de pretensões relativas à declaração de ilegalidade de atos administrativos, não se permitindo pronúncias de outra natureza, pelo que conclui que uma vez que a ilegalidade formal do ato de liquidação se baseia apenas no regime de invalidade do ato administrativo lato sensu este pedido está excluído do âmbito de competência do CAAD.

 

            Não assiste, porém, razão à Requerida. 

 

Desde logo, cumpre assinalar que o ato tributário não deixa de ser uma subespécie de ato administrativo, constituindo uma decisão tomada no exercício de poderes jurídico-administrativos, que visa produzir efeitos jurídicos externos numa situação individual e concreta (artigo 148.º do CPA, subsidiariamente aplicável em matéria tributária por remissão dos artigos 2.º, alínea c), da LGT; 2.º, alínea d), do CPPT; e 29.º, n.º 1, alínea d) do RJAT). A sua especificidade reside no facto de regular ou definir a relação obrigacional de que emerge a prestação tributária. Por outro lado, a lei não restringe a competência dos Tribunais Arbitrais a ilegalidades apenas previstas na legislação tributária. Quaisquer vícios do ato tributário que consubstanciem uma ofensa dos princípios ou outras normas jurídicas aplicáveis produzem a sua anulabilidade, nos moldes cominados no artigo 163.º do CPA, aplicável por remissão do RJAT. 

 

Por outro lado, é pacífico que os atos administrativos em matéria tributária que comportam a apreciação da legalidade do ato tributário, seguem a forma processual da impugnação judicial, da qual é decalcada a previsão da norma atributiva de competência arbitral (artigo 2.º do RJAT), como resulta da Lei de Autorização Legislativa que precedeu o Decreto-Lei que aprovou o RJAT e tem sido, de forma reiterada, preconizado pela jurisprudência arbitral. Isto, sem prejuízo de os atos administrativos em matéria tributária que não comportem a apreciação da legalidade do ato de liquidação não serem arbitráveis (a forma processual que lhes corresponde é a da ação administrativa, como se retira do disposto no artigo 97.º, n.º 1 do CPPT).

 

Neste sentido, acompanha-se a argumentação sufragada nas decisões dos processos arbitrais n.º 263/2018-T, de 25 de janeiro de 2019, e n.º 617/2015, de 22 de fevereiro de 2016, que reconhece incluirem-se “no âmbito da jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD todos os tipos de actos passíveis de serem impugnados através processo de impugnação judicial, abrangidos por aqueles n.ºs 1 e 2 [do artigo 102.º do CPPT], desde que tenham por objecto um acto de um dos tipos indicados naquele art. 2.º do RJAT. Aliás, esta interpretação no sentido da identidade dos campos de aplicação do processo de impugnação judicial e do processo arbitral é a que está em sintonia com a referida autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, concedida pelo art. 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, em que se revela a intenção de que o processo arbitral tributário constitua «um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária» (n.º 2).”

Na situação vertente, o ato impugnado é um ato de liquidação de IRC emitido pela Requerida, pelo que é inquestionável que estamos perante um ato tributário sindicável de acordo com o disposto no artigo 2.º do RJAT. Acresce que é invocada uma ilegalidade formal desse mesmo ato, assente não só no direito administrativo, mas também, de forma expressa, no artigo 79.º da LGT. Por fim, a pronúncia que é peticionada pela Requerente é a de anulação do ato tributário, que é própria de um processo de natureza impugnatória, como a ação arbitral.

 

À face do exposto, conclui-se pela improcedência da exceção de incompetência material suscitada pela Requerida relativa ao conhecimento do vício formal invocado pela Requerente, pelo que o Tribunal é competente em razão da matéria para conhecer da liquidação de IRC e dos correspondente juros compensatórios e de mora (com as legais consequências no ato de segundo grau que sobre a mesma recaiu), à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a) e 11.º, n.º 1, todos do RJAT.

 

2.    Caso Decidido ou Caso Resolvido – Inimpugnabilidade do Ato

 

O ato tributário objeto desta ação deriva de dois ajustamentos efetuados à matéria coletável declarada pela Requerente através da declaração Modelo 22 de IRC relativa ao período de 2017, submetida em 28 de junho de 2018. Um deles, no valor de € 11.561.264,32, respeita a prejuízos fiscais originados em 2015 e 2016 que transitaram, por reporte, para 2017, sendo neste ano utilizados por dedução ao lucro tributável declarado do período, no valor de € 17.338.737,68.

 

Sustenta a Requerida que o mencionado ajustamento constitui tão-só o reflexo de correções efetuadas pela AT no âmbito de procedimentos inspetivos que visaram os períodos de tributação de 2015 e 2016 e que se consolidaram por não terem sido contestadas pela Requerente.

 

Com efeito, nos períodos de 2015 e 2016 foram acrescidos à matéria coletável da Requerente os valores de € 1.148.221,32 e de € 10.413.043,10, respetivamente, por não ter sido aceite pela AT a dedução, para efeitos fiscais, de diversas imparidades e provisões. Os atos tributários em causa não foram objeto de impugnação contenciosa pela Requerente, pelo que, uma vez decorrido o prazo para o efeito, a definição jurídica deles derivada acabou por estabilizar, cristalizando os seus efeitos.

 

Efetivamente, afigura-se que a Requerida tem razão. A partir do momento em que os atos tributários e a definição jurídica neles contida não são passíveis de reapreciação por via administrativa ou contenciosa, tornam-se incontestáveis pelos sujeitos passivos, não podendo a Requerente pretender impedir a produção de efeitos do “caso decidido”, por via da discussão de tal matéria, a propósito da liquidação adicional efetuada ao exercício de 2017, quando, em relação aos períodos concretos a que efetivamente respeita – 2015 e 2016 – já não pode, em definitivo, ser apreciada e decidida.

 

É por esta razão que em caso de declaração de ilegalidade de uma norma regulamentar com força obrigatória geral, a lei prevê que esta não pode afetar “os casos julgados nem os atos administrativos que entretanto se tenham tornado inimpugnáveis”, como dispõe o artigo 76.º, n.º 4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (“CPTA”), numa clara manifestação desta conceção, de origem doutrinal e acolhida na jurisprudência, alicerçada no princípio da segurança jurídica[1]. De outra forma, as relações jurídicas, in casu as tributárias, ficariam num persistente estado de incerteza sobre a validade dos atos, incompatível com a necessária estabilização pelo decurso do tempo ínsita no conceito de Estado de Direito (v. artigo 2.º da Constituição).

 

Na situação vertente, a Requerente, ao contestar o ajustamento dos prejuízos de 2017 efetuado pela Requerida, na verdade, está a atacar os atos tributários que definiram a sua situação tributária em relação aos períodos anuais de 2015 e 2016 – em virtude de o referido ajustamento em 2017 se limitar a “executar” a definição jurídica estabelecida nesses atos que eliminaram, na sua quase totalidade, os prejuízos fiscais de 2015 e 2016 que a Requerente utilizou em 2017 e que, dada essa definição jurídica, deixaram de existir. E para tanto, a Requerente esgrime argumentos que respeitam às razões que determinaram o acréscimo à matéria coletável desses exercícios precedentes, como a não aceitação fiscal de certas imparidades e provisões. Matéria que o contribuinte não disputou em sede própria, que seria a da refutação desses atos tributários de 2015 e 2016.

 

Nestes termos, não são agora impugnáveis as correções, já consolidadas na ordem jurídica, resultantes de atos tributários respeitantes a outros anos que não o de 2017, que foi diretamente impugnado na presente ação, pelo que o Tribunal não pode destas conhecer, nem dos vícios que lhe são próprios, nomeadamente dos alegados erros nos pressupostos de facto e de direito invocados pela Requerente em relação às imparidades e provisões contabilizadas nos períodos de tributação de 2015 e 2016 e que conduziram ao acréscimo à matéria coletável destes anos e à consequente redução dos prejuízos fiscais reportáveis para anos futuros, na importância de € 11.561.264,32.

 

À face do exposto, julga-se procedente a exceção de caso decidido/caso resolvido geradora de inimpugnabilidade, relativamente às correções dos períodos de tributação de 2015 e 2016, corporizadas nos atos tributários praticados em relação a estes anos, não podendo, em consequência, este Tribunal conhecer de tal matéria no âmbito da apreciação do ato de liquidação referente ao período posterior, de 2017, em relação ao qual os prejuízos reportados de 2015 e 2016, têm de ter como pressuposto de facto os valores definitivos de € 52.681,67 e € 56.864,41, respetivamente, determinados pela AT e não oportunamente contestados pela Requerente (em vez dos prejuízos por esta declarados, antes das correções efetuadas pela AT, de € 1.200.902,99, para 2015, e de € 10.469.907,51, para 2016).

 

Estamos perante uma exceção dilatória prevista no artigo 89.º, n.ºs 2 e 4, alínea i) do CPTA, que obsta ao conhecimento do pedido da Requerente no que se refere ao ajustamento dos prejuízos fiscais procedente das correções à matéria coletável de exercícios anteriores, que importa a absolvição da Requerida da instância nessa parte, nos termos do disposto no artigo 278.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas c) e e) do RJAT.

 

Dada a procedência desta exceção, fica prejudicado o conhecimento da questão prévia de incompetência material para “condenar” a AT ao reconhecimento do direito ao reporte de prejuízos fiscais de anos anteriores.

 

3.         Outros Pressupostos Processuais

 

O Tribunal foi regularmente constituído e as partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigo 4.º e artigo 10.º, n.º 2 do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

 

A ação é tempestiva, tendo o pedido de pronúncia arbitral sido apresentado em 18 de novembro de 2020, no prazo de 90 dias previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT, a contar da notificação do indeferimento da reclamação graciosa, por ofício datado de 26 de agosto de 2020.

 

V.      Fundamentação de Mérito

 

1.         Da Ilegalidade Formal do Ato Tributário 

 

Alega a Requerente que o ato tributário de liquidação adicional em crise é ilegal porque opera a reforma ou conversão de uma autoliquidação efetuada em 28 de junho de 2018 (por entrega da Declaração Modelo 22 de IRC), a qual, à data da prolação do ato tributário, 12 de março de 2020, já havia sido substituída por outra, efetuada em 10 de dezembro de 2019, na sequência da apresentação nessa data de uma Declaração Modelo 22 de Substituição. Seria imprescindível, no entender da Requerente que o ato tributário tivesse por objeto o ato declarativo da relação jurídico-fiscal definitório da obrigação de IRC da Requerente referente ao período de 2017.

 

Resulta do probatório que, de facto, a Requerente submeteu em 10 de dezembro de 2019, por via eletrónica, uma declaração substitutiva da autoliquidação primeiramente apresentada referente ao período de tributação de 2017 aqui em causa, a que o sistema atribuiu um código de validação para emissão de comprovativo gerado informaticamente. O que, adiante-se, a Requerida não contesta.

 

Esta nova autoliquidação da Requerente apura uma matéria coletável inferior (€ 4.513.898,35) à que constava da autoliquidação inicial (€ 5.662.094,37), suscitando-se a questão essencial de saber se o ato declarativo definitório da Requerente para o período de 2017 era, à data da liquidação adicional, o da primeira autoliquidação (que o ato tributário corrige) ou o da autoliquidação substitutiva.

 

Tal questão é respondida de forma cristalina pela Requerida na fundamentação do despacho de indeferimento da Reclamação Graciosa, por apelo ao regime da “Declaração de substituição” estabelecido no artigo 122.º do Código do IRC, em particular no seu n.º 2, que dispõe: “A autoliquidação de que tenha resultado imposto superior ao devido ou prejuízo fiscal inferior ao efectivo pode ser corrigida por meio de declaração de substituição a apresentar no prazo de um ano a contar do termo do prazo legal.”

 

Conclui-se deste modo que quando a Requerente submeteu a declaração substitutiva tinha expirado o prazo de um ano legalmente concedido para o fazer. Acresce referir que este não era o único meio ao dispor da Requerente para reverter a liquidação inicial, uma vez que não concordava com a mesma. Com efeito, mesmo após o prazo de um ano, aquela podia ter lançado mão do procedimento de reclamação do ato de autoliquidação que pretendia alterar, para o que dispunha do prazo de dois anos, nos termos do disposto no artigo 131.º, n.º 1 do CPPT[2], não se verificando uma diminuição de garantias passível de comprometer o princípio de uma tutela efetiva.

 

Verificando-se a caducidade do direito à substituição, por via declarativa, da autoliquidação (inicial) do sujeito passivo, nos moldes acabados de enunciar, e não tendo a mesma sido reclamada, manteve-se como único “ato declarativo definitório” da situação tributária da Requerente, para o período de 2017, a autoliquidação apresentada em 28 de junho de 2018, pelo que a liquidação adicional reportou-se necessariamente, e bem, a esta “primeira” autoliquidação, corrigindo-a. Entendimento que não flui de qualquer atuação discricionária da Requerida, mas de estrita vinculação legal, ao abrigo do citado n.º 2 do artigo 122.º do Código do IRC.

 

A conclusão a que se chegou não é prejudicada pelo argumento da Requerente de que a Requerida recebeu a declaração de substituição e até emitiu um código de validação do comprovativo da entrega da declaração via internet, não tendo posteriormente notificado a Requerente da sua rejeição, pelo que esta não produziu efeitos (artigo 36.º, n.º 1 do CPPT).

 

Antes de mais, interessa notar que a obtenção do comprovativo de entrega de uma declaração ou de uma petição num órgão administrativo (por exemplo, num Serviço de Finanças) ou na secretaria de um Tribunal representa tão-só a confirmação de que o documento foi recebido e da data em que o foi. Não significa que o teor do documento ou a pretensão nele incluída tenham sido aceites como tal pelas autoridades. A comprovação de entrega de um documento não produz, per se, o deferimento da pretensão substantiva nele subjacente ou qualquer ato constitutivo de direitos na esfera do contribuinte[3].

 

No que tange à alegação da ausência de notificação de um “ato em sentido contrário ao comprovativo de submissão” da nova declaração (de substituição), importa salientar que este fundamento não é causa de invalidade do ato notificando, e situa-se no plano da sua produção de efeitos, o que significa que fica impedido o início da contagem dos prazos de caducidade para reagir contra os atos lesivos. Constitui jurisprudência constante dos nossos tribunais superiores que a notificação é um ato exterior e posterior ao ato notificando. A sua falta ou os vícios que afetem a notificação podem determinar a ineficácia do ato notificado, contudo, são insuscetíveis de produzir sua invalidade por não terem a ver com o próprio ato, nem com os seus pressupostos (v. neste sentido, a título ilustrativo, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 6 de abril de 2011, processo n.º 037/11, e de 21 de setembro de 2011, processo n.º 0753/11; e também o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 24 de novembro de 2016, processo n.º 09828/16). 

 

Assim, a decisão de não processamento da declaração de substituição, além de configurar um ato administrativo em matéria tributária de que este tribunal não poderia conhecer, pois, recorda-se, a sua competência está limitada à apreciação da legalidade de atos de liquidação e de fixação da matéria tributável, como a sua não notificação não consubstancia vício invalidante do ato notificando (i.e., do ato cuja notificação foi omitida), pelo que também não poderia conduzir a uma pronúncia anulatória constitutiva, como é próprio da ação arbitral tributária.

 

Nem da atuação da Requerida se identifica a quebra do princípio da boa fé e da proteção da confiança, ou se pode retirar que se encontre infirmada a presunção de boa fé (v. artigos 266.º, n.º 2 da Constituição, 10.º do CPA e 59.º, n.º 2 da LGT). Relembra-se, que para haver lugar à tutela jurídico-constitucional da confiança é necessário, de acordo com a jurisprudência constitucional[4], que se reúnam quatro requisitos essenciais: i) que o Estado (mormente o legislador) tenha adotado comportamentos passíveis de fundar nos particulares «expetativas» de continuidade; ii) tais expectativas devem ser legítimas, justificadas e fundadas em boas razões; iii) devem ter sido feitos planos tendo em conta a perspetiva de continuidade do «comportamento» estadual; e, por último, iv) não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação de expectativa.

            Condições que, à face do que foi supra exposto, não se encontram satisfeitas.

 

2.         Do Erro no Cálculo da Mais-Valia Fiscal

 

            Considera ainda a Requerente que o ato tributário de liquidação adicional é ilegal por erro nos pressupostos (erro de quantificação), seja porque o valor de realização se devia circunscrever a 10 milhões de euros, uma vez que a compradora pagou 12 milhões diretamente à entidade bancária para “adquirir” 2 hipotecas a favor desta, apesar de na escritura de venda do imóvel estar determinado o preço de 22 milhões de euros; seja porque, mesmo que assim não se entendesse, o valor de 12 milhões destinado à entidade bancária para liquidação do passivo da Requerente e desoneração do bem imóvel que lhe estava associado em garantia, e ora vendido, deveria ser qualificado como encargo inerente à alienação, sendo nesse caso dedutível à mais-valia (para o que invoca o artigo 46.º n.ºs 1, 2 e 3 do Código do IRC).

 

Antes de mais, é importante sublinhar que ao Tribunal cabe apreciar a legalidade do ato de liquidação, i.e., a sua compatibilidade com o direito, nos moldes em que o mesmo foi prolatado. Como é dito no acórdão relativo ao processo arbitral n.º 404/2020-T: “o processo arbitral é um meio contencioso de mera legalidade, em que aos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD foram atribuídos meros poderes de declaração de ilegalidade e consequente anulação de atos dos tipos indicados no artigo 2.º do RJAT.”

 

No caso concreto, o ato de liquidação materializa duas correções à matéria coletável declarada pela Requerente no período de 2017 às quais esta se opõe. Uma respeita ao ajustamento aos prejuízos fiscais respeitantes a anos anteriores (2015 e 2016) utilizados em 2017, por estes já não existirem na sequência das correções efetuadas àqueles anos, que se consolidaram. A outra prende-se com a constituição de uma provisão no valor de € 273.341,20, adiante analisada, que nada tem a ver com esta questão da mais-valia na tributação do imóvel alienado pela Requerente em 2017. 

 

 

 

            O erro na quantificação da mais-valia que a Requerente invoca, não é um erro atribuível ao ato de liquidação adicional objeto desta ação, pois esse ato não corrigiu os valores declarados pela Requerente nesta sede, mantendo-os tal qual haviam sido reportados na Modelo 22 de IRC, em 28 de junho de 2018.

 

            Assim, afigura-se que o que a Requerente pretende é questionar a sua própria autoliquidação e modificá-la. De notar que a pretendida alteração nem sequer foi vertida na Declaração de Substituição entregue fora de prazo (que, como acima dito, não foi processada ou tida em conta pela AT), cujos pontos de divergência em relação à primeira Declaração se referem a outras matérias (provisões/imparidades) e não ao cálculo da mais-valia imobiliária.

 

            O Tribunal tem de formular o juízo sobre a legalidade do ato sindicado conforme este foi praticado “estando impedido de valorar razões de facto e de direito que não constam dessa fundamentação” e não se constata que, na situação vertente, o ato tributário contenha qualquer correção das mais-valias declaradas pela Requerente ou do modo como o foram (v. acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 28 de outubro de 2020, processo n.º 02887/13.8BEPRT, e de 17 de fevereiro de 2021, processo n.º 02111/14.6BEPRT 0981/16). Não tendo sido corrigidas essas mais-valias, o ato tributário não pode ser invalidado por uma alegada ilegalidade que não lhe diz respeito e sobre a qual não se pronunciou. Pelo que, de igual modo, não lhe são atribuíveis interpretações eivadas de inconstitucionalidade do artigo 46.º do Código do IRC, pois esta norma e o regime das mais-valias não constituem fundamento das correções à matéria coletável de IRC (e ao próprio imposto) levadas a efeito.

 

            Por outro lado, se a pretensão visada pela Requerente não se reporta, em rigor, ao ato de liquidação adicional que lhe corrigiu a matéria coletável, mas à sua própria autoliquidação, que pretende, por esta via (do contencioso arbitral), modificar, como parece ser o caso, então esse ato não é diretamente impugnável e não pode ser conhecido por este Tribunal Arbitral (v. artigo 2.º, alínea a) da Portaria de Vinculação com remissão para o artigo 131.º do CPPT, em moldes similares aos previstos para a ação de impugnação judicial). Na hipótese de a referida pretensão ser configurável como o pedido de reconhecimento de um direito, também não é a ação arbitral o meio próprio.

            Por fim, sempre se dirá que a tese da Requerente de que o produto da venda do imóvel só devia ser parcialmente considerado como valor de realização, colide com a própria definição do preço da operação declarado na escritura de venda. A aplicação de uma parte significativa desse valor para saldar dívidas à instituição de crédito não afasta o critério do preço acordado entre as partes e definido para a transação e que foi de 22 milhões de euros, conforme expresso na escritura de venda do imóvel. Acresce que mesmo que se analisasse a questão sob a perspetiva da Requerente, esta não teria recebido apenas o valor líquido monetário de 10 milhões de euros, mas teria também registado uma diminuição do seu passivo em 12 milhões de euros, pelo que o valor/preço da operação e o benefício económico da mesma derivada para a esfera da Requerente, também nesta construção, perfaz 22 milhões de euros, 10 milhões em dinheiro e 12 milhões em redução de dívidas dessa importância.

 

            Nestes termos, improcede a arguição do vício de erro no cálculo da mais-valia fiscal.

 

3.         Provisão não Aceite Fiscalmente (€ 273.341,20)

 

Atento o modelo de dependência parcial da fiscalidade direta (relativa ao apuramento do lucro fiscal, para efeitos de IRC) da contabilidade[5], a noção de provisão é a que consta das normas contabilísticas, em concreto da NCRF[6] 21, Provisões, Passivos Contingentes e Ativos Contingentes.

 

Segundo o disposto nos §§ 10 e 11 da NCRF 21, as provisões caracterizam-se pela “existência de incerteza acerca da tempestividade ou da quantia dos dispêndios futuros necessários” para a liquidação de um dado passivo (§10). “[…] todas as provisões são contingentes porque são incertas na sua tempestividade ou quantia. Porém, nesta Norma o termo «contingente» é usado para passivos e ativos que não sejam reconhecidos porque a sua existência somente será confirmada pela ocorrência ou não de um ou mais eventos futuros incertos não totalmente sob o controlo da entidade (§11).

 

            As provisões reportam-se assim a situações que futuramente podem provocar gastos ou perdas de ordem diversa, todavia, incertas em relação ao “quando” e/ou ao respetivo “quantum”.

A dedutibilidade fiscal das provisões desvia-se, contudo, do parâmetro contabilístico, restringindo-se às situações contempladas no artigo 39.º do Código do IRC, que dispõe o seguinte:

Artigo 39.º

Provisões fiscalmente dedutíveis

1 – Podem ser deduzidas para efeitos fiscais as seguintes provisões:

  1. As que se destinem a fazer face a obrigações e encargos derivados de processos judiciais em curso por factos que determinariam a inclusão daqueles entre os gastos do período de tributação;
  2. As que se destinem a fazer face a encargos com garantias a clientes previstas em contratos de venda e de prestação de serviços;
  3. As provisões técnicas constituídas obrigatoriamente, por força de normas emanadas pelo Instituto de Seguros de Portugal, de carácter genérico e abstracto, pelas empresas de seguros sujeitas à sua supervisão e pelas sucursais em Portugal de empresas seguradoras com sede em outro Estado membro da União Europeia;
  4. As constituídas com o objetivo de fazer face aos encargos com a reparação dos danos de caráter ambiental dos locais afetos à exploração, sempre que tal seja obrigatório nos termos da legislação aplicável e após a cessação desta.

2 – […]”

 

Defende a Requerente que a provisão constituída em 2017, para fazer face ao risco de pagamento de uma penalidade por incumprimento do “Contrato de Revitalização e Modernização Empresarial” celebrado com a Requerente, a D..., o C... e o G..., é enquadrável na alínea a) do n.º 1 do artigo 39.º do Código do IRC, ou seja, respeita a obrigações e encargos derivados de processos judiciais em curso. Considera que assim é por:

  1. Estar em curso o processo de insolvência da D..., S.A.;
  2. Ter intervindo como garante no contrato celebrado entre a D... e o C...;
  3. Ter sido informalmente aceite em 2017 uma proposta de transação que extinguiria as obrigações assumidas do contrato com o C....

 

            Contudo, nenhum destes motivos corresponde à previsão de “encargos com processos judiciais em curso”, desde logo, porque o processo de insolvência não respeita à Requerente, mas a uma outra sociedade. Acresce salientar que o decretamento judicial da insolvência da D... remonta ao ano 2012 e não ao período de 2017. 

 

            Do adquirido processual não se identifica, nem foi alegado, qualquer processo judicial em curso, de que a Requerente seja parte, no qual se funde a provisão em apreço. Tão pouco se demonstrou que a Requerente seja garante no mencionado Contrato, que apenas estabelece ser a D... a responsável pela restituição das importâncias financiadas em caso de incumprimento.

 

            Deste modo, conclui-se, em sintonia com a Requerida, que a provisão cuja dedutibilidade fiscal foi desconsiderada não tem cabimento no disposto no artigo 39.º, n.º 1 do Código do IRC, pelo que, neste segmento, o ato tributário não enferma da ilegalidade que lhe foi imputada. De referir, por fim, que não tem aqui aplicação a aplicação da jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, abaixo analisada, sobre a superação do princípio da periodização económica (artigo 18.º, n.º 1 do Código do IRC) pelo princípio da justiça, uma vez que não está em causa o problema da temporalidade da constituição da provisão, mas a não aceitação da sua dedutibilidade fiscal, por não ter suporte na lei. Em qualquer caso, tendo o valor da penalidade a pagar ao C... sido acordada em 2018, por acordo escrito, pelo valor de € 210.000,00, a dedução fiscal deste valor (e não o da provisão de € 273.341,20) seria corretamente efetuada no exercício subsequente, de 2018, conquanto reunidos os demais pressupostos de consideração como gasto (reportamo-nos ao artigo 23.º do Código do IRC), pelo que a não aceitação da provisão em 2017 não se afigura geradora de injustiça.

 

4.         Necessária Consideração Fiscal de Gastos Considerados Efetivamente Incorridos pela Requerente

 

A Requerente invoca, subsidiariamente, a dedutibilidade dos gastos que considera efetivamente incorridos, respeitantes a outros períodos de tributação, em concreto a perda por imparidade registada quanto aos suprimentos prestados à D..., no valor de € 4.004.850,78, e a provisão constituída, de € 3.946.150,84 e relativa a juros constantes da reclamação de créditos apresentada pela B... no processo de insolvência da Requerente (ambas contabilizadas em 2016).

 

Trata-se de matéria respeitante a outros exercícios e não àquele sobre que versa o ato de tributação impugnado, exclusivamente referente ao período de 2017.

 

Mesmo que, por mera hipótese de raciocínio, assim não se entendesse, este argumento da Requerente coloca novamente o problema, apreciado na secção 2 supra[7] para a qual se remete. É que o ato tributário em discussão, que, reitera-se, se reporta ao período de tributação de 2017, não efetuou quaisquer correções em relação a estes gastos. Assim, no âmbito de um contencioso de mera legalidade como é o arbitral, não poderia este tribunal anular, por ilegalidade, um ato tributário que não se pronuncia, nem efetuar correções sobre a matéria em causa. Relembra-se que a liquidação de IRC se limita a dois fundamentos, a saber: ajustamento dos prejuízos fiscais utilizados que transitaram dos anos 2015 e 2016, na medida em que foram eliminados por atos tributários autónomos respeitantes a esses períodos (que se consolidaram, pois não foram impugnados pela Requerente), e a não aceitação de uma provisão de € 273.341,20, por falta de enquadramento no artigo 39.º do Código do IRC. 

 

Sobre o invocado princípio da justiça, que a Requerente entende ser de aplicar ao caso, afirmando que os erros não resultaram de omissões voluntárias e intencionais, com vista a operar transferências de resultados entre exercícios, com base na posição jurisprudencial do Supremo Tribunal Administrativo, convém ter em conta que não se afigura pertinente aos gastos em análise.

É verdade que, de acordo com a jurisprudência dos Tribunais Superiores, ocorrendo um desvio do princípio da periodização (v. artigo 18.º, n.º 1 do Código do IRC) o princípio da justiça constitui suporte legal para a dedução fiscal de gastos imputáveis a outros exercícios económicos, desde que se verifiquem determinadas circunstâncias, a saber, não tenha resultado de omissões voluntárias e intencionais, com vista a operar transferência de resultados entre exercícios, como é o caso em que está prestes a acabar ou iniciar um período de isenção, quando há interesse em reduzir prejuízos de determinado exercício ou retirar benefícios do seu reporte e quando se pretende reduzir o montante dos lucros tributários (v. acórdão daquele Supremo Tribunal, de 13 de novembro de 1996, processo n.º 020404[8]). E este Tribunal Arbitral também perfilha o entendimento descrito, no sentido de que a violação do princípio da periodização económica, nas referidas condições, é superável por parametrização do princípio da justiça.

 

Porém, este princípio aplica-se quando não houve reconhecimento dos gastos num dado ano, para permiti-lo num outro ano, ulterior. Ora, não é o que aqui está em causa. Aqui a Requerente reconheceu estes gastos na contabilidade em 2016, cuja dedução fiscal foi corrigida pela AT em relação a esse ano. E esta definição jurídico-tributária consolidou-se. O princípio da justiça não serve para afastar o caso decidido/caso resolvido referente a um determinado ano e alcançar uma outra definição material de uma relação/situação jurídica consolidada num ano ulterior.

 

E caso se aplicasse o princípio da justiça ao caso concreto, que não se aplica pelas razões expostas, sempre se dirá que os pressupostos que permitem a operatividade desse princípio aqui não se verificam.

 

 

 

A começar por não ser credível o argumento de que a Requerente não teve acesso à informação, dado que apenas durante um curto período em 2016, de aproximadamente 6 meses, esteve privada dos elementos contabilísticos, sendo que as imparidades relativas à D... ficaram evidentes em 2012 com a insolvência desta sociedade, cujo decretamento judicial era publicitado no Diário da República e que tinha os mesmos gerentes que a Requerente.

 

Quanto às importâncias de juros em dívida, os contratos de financiamento em que a Requerente era parte ou garante continham a indicação da taxa de juro (indexada a referenciais públicos) e ao agravamento das mesmas em caso de incumprimento, pelo que os juros vencidos podiam ser calculados ao longo dos anos. Mais ainda, não é despiciendo referir que a Requerente nem sequer assegurou as suas obrigações contabilísticas desde 2006 até ao final de 2012.

 

Parece assim ter existido uma clara escolha relativamente ao momento em que se decidiu reconhecer os gastos referidos. Ao contrário do que a Requerente afirma, era real a contingência de que o reconhecimento no exercício competente dos juros e imparidades distasse do período em que fossem realizadas operações geradoras de rendimentos, pelo que a sua contabilização tardia, com aproximação ao momento da venda do imóvel que gerou a mais-valia, permitiu impedir que os prejuízos caducassem. Não estamos perante situações apenas surgidas em 2012 com a insolvência da D..., estão também em causa juros vencidos relativos a contratos de financiamento que remontam aos anos 2007, 2009, 2010.

 

Nestes termos, não estão reunidas as condições de procedência deste pedido. 

 

A Requerente vem, por último, e também a título subsidiário, peticionar a dedução fiscal, como gastos e perdas, na sua totalidade, dos juros e acrescido que vieram a ser pagos em 2017 à B..., na importância de € 1.150.310,24, e dos pagamentos feitos, no valor de € 2.168.663,86 para saldar obrigações de terceiros (da D...), nas quais interveio na qualidade de garante, perfazendo o total de € 3.318.974,10.

À semelhança do que foi atrás enunciado, o ato tributário em discussão, não efetuou quaisquer correções em relação a estes gastos, pelo que o Tribunal Arbitral não pode anular o ato de liquidação por fundamentos e correções que não fazem parte do mesmo, para o que se remete para o já dito na secção 2 supra[9].

 

Obter dictum, o regime do acréscimo ou da periodização económica que rege a contabilidade e o IRC implica que na elaboração das demonstrações financeiras do sujeito passivo sejam considerados os efeitos das operações quando estas ocorram e não apenas quando se dá o correspondente pagamento ou recebimento. Assim, não seria o exercício de 2017 aquele em que seria de reconhecer os gastos derivados de responsabilidades vencidas ou surgidas em períodos antecedentes, sendo que não seria de aplicar o princípio da justiça, por não estarem verificadas as suas condições (não terem resultado de omissões voluntárias e intencionais, com vista a operar transferência de resultados entre exercícios), como resulta de forma contextual da matéria provada nos autos.

 

* * *

Por fim, importa referir que foram conhecidas e apreciadas as questões relevantes submetidas à apreciação deste Tribunal, não o tendo sido aquelas cuja decisão ficou prejudicada pela solução dada a outras, nos termos do disposto nos artigos 130.º e 608.º, n.º 2, do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, nomeadamente quanto à alegada ofensa aos princípios constitucionais, por respeitarem a matéria que não pode ser conhecida por este Tribunal Arbitral, seja por sobre a mesma se ter formado caso decidido, seja por respeitar a outros anos e a questões que não constituem fundamento do ato tributário impugnado, circunscrito ao IRC do período de 2017.

 

 

 

 

VI.     Decisão

 

À face do exposto, acordam os árbitros deste Tribunal Arbitral em:

  1. Julgar procedente a exceção de caso decidido, geradora de inimpugnabilidade, em relação ao ajustamento aos prejuízos fiscais de 2017, por se referir a correções à matéria coletável efetuadas por atos tributários reportados a anos anteriores e já consolidados;
  2. No remanescente, julgar a ação totalmente improcedente, com a consequente manutenção da liquidação de IRC e juros compensatórios e de mora impugnada e, bem assim, do ato decisório de segundo grau que sobre a mesma recaiu

tudo com as legais consequências.

 

 

VII.   Valor do Processo

 

            Fixa-se ao processo o valor de € 2.595.414,91, correspondente à liquidação de IRC e de juros compensatórios que a Requerente pretendeu anular, não impugnado pela Requerida – v. artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT, aplicável por remissão do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”).

 

 

VIII.  Custas

 

            Custas no montante de € 33.354,00, a suportar pela Requerente em razão do decaimento.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 14 de março de 2022

Os árbitros,

 

 

Alexandra Coelho Martins, Relatora

 

 

 

José Alberto Pinheiro Pinto

 

 

 

Francisco Melo

 

 

 



[1] V., a título ilustrativo, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 10 de setembro de 2008, processo n.º 0474/08 (“O conceito de conceito «caso decidido ou resolvido», como limite à impugnabilidade relativa de actos administrativos com fundamento em anulabilidade, é aplicável a quem tem legitimidade para os impugnar”); de 13 de janeiro de 1994, n.º 032425; e o Acórdão uniformizador de jurisprudência, de 12 de fevereiro de 1985, que veio dizer que tal como acontece com o caso julgado, também no caso decidido, os atos não contestados, se consideram com “carácter de incontestabilidade e estabilidade na ordem jurídica por razões de certeza e segurança”.

[2] Estamos perante um caso de reclamação prévia necessária que precede a abertura da subsequente via contenciosa.

[3] A menos que a lei estatua este efeito, o que não é o caso. 

[4] V. acórdão n.º 393/2016 do Tribunal Constitucional e jurisprudência aí citada.

[5] Como resulta do disposto no artigo 17.º do Código do IRC.

[6] Acrónimo de Norma Contabilística e de Relato Financeiro.

[7] Relativa à apreciação do alegado erro no cálculo da mais-valia fiscal.

[8] V. a título ilustrativo também os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo nos processos n.ºs 01648/02, de 2 de maio de 2003; 0807/07, de 2 de abril de 2008; 0291/08, de 25 de junho de 2008; 0716/13, de 14 de março de 2018. São também diversas as decisões arbitrais no mesmo sentido, indicando-se como exemplos as seguintes: n.º 588/2015-T, n.º 666/2018-T e n.º 697/2018-T.

[9] Relativa à apreciação do alegado erro no cálculo da mais-valia fiscal.