Sumário
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A actividade de investigação na área da georreferenciação de dados e da construção de estratégias de desenvolvimento sustentável apoiadas em plataformas de gestão do conhecimento (designadamente de plataformas georreferenciadas) enquadra-se na subclasse CAE-REV3 – 72190.
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Os rendimentos com origem na actividade atrás referida, resultantes de um acto isolado, devem constar no Anexo B da declaração Modelo 3 do IRS com o código da tabela de actividades do artigo 151º do CIRS “1519 – outros prestadores de serviços” e consequentemente no campo 404 do quadro 4A do referido Anexo.
Decisão Arbitral
1. Relatório
A..., NF ... e B..., NF ..., ambos residentes na Rua..., n.º ..., ..., ...-... Lisboa, doravante referidos como «Requerentes», vieram, ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”) apresentar pedido de pronúncia arbitral (PPA) tendo em vista a anulação da “liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”) n.º 2021..., das liquidações de juros compensatórios n.ºs 2021... e 2021... e da correspondente demonstração de acerto de contas n.º 2021..., relativas ao exercício de 2019 e das quais resulta um montante de imposto a pagar de € 2.375,73”.
Terminam pedindo a “anulação da liquidação adicional de IRS em apreço e correspondentes liquidações de juros compensatórios”; e a condenação da “AT no pagamento aos Requerente de juros indemnizatórios por pagamento de prestação tributária indevida”.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante também identificada por “AT” ou simplesmente “Administração Tributária”).
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 16-09-2021.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular (TAS) o signatário desta decisão, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
As partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados das alíneas a) e) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral singular foi constituído em 28-12-2021.
A AT apresentou resposta em 31.01.2022 e não juntou na mesma data o PA, não tendo suscitado excepções nem questões prévias, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral. Convidada a juntar o PA, procedeu à sua apresentação em 09.02.2022.
Foi dispensada a reunião de partes do artigo 18º do RJAT.
Os Requerentes juntaram cópia do Modelo 3 do IRS, face ao convite do TAS, em 15.02.2022.
As partes apresentaram alegações escritas em 24.02.2022, mantendo o que já haviam referido em sede de PPA e de Resposta.
A dissonância entre a Requerente esposa e a Requerida consiste em apurar se:
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A actividade que esteve na génese da emissão do recibo por prestação de serviços, a título de “acto único”, deve considerar-se integrada, segundo a tabela de actividades do artigo 151º do CIRS, em “1320-Consultores” como defende a AT ou em “1519-Outros prestadores de serviços” como defendem os Requerentes.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado na alínea e) do n.º 1 do artigo 2.º, e do n.º 1 do artigo 10.º, ambos do RJAT.
As partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigo 4.º e n.º 2 do artigo 10.º, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades.
2. Matéria de facto
Consideram-se provados os seguintes factos, com relevo para a decisão:
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Durante o ano de 2019 a Requerente esposa, NF ... B..., auferiu rendimentos da categoria B no montante de € 11.220,00, tendo emitido Fatura-Recibo – Ato Isolado, com o nº 2, no montante de € 11.220,00, referente a “Prestação de Serviços de Consultoria”, tendo sido adquirente do serviço a C... LDA, com o NIPC ... – conforme artigo 7º do PPA, artigo 10º da Resposta da AT e documento nº 2 em anexo ao PPA;
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A prestação de serviços foi subcontratada à Requerente no âmbito do consórcio composto pela D..., SP, RL e a C..., Lda, constituído para a “Elaboração da Estratégia nacional para a Infraestrutura de dados espaciais e respetivo plano de ação para Moçambique” - conforme artigo 8º da PPA., Documento n.º 3, 4 e 5 em anexo ao PPA e não impugnação especificada apreciada nos termos do nº 7 do artigo 110º do CPPT;
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A Requerente esposa é Engenheira do Ambiente, com doutoramento na área de gestão de dados e tecnologias de informação, exercendo profissionalmente a atividade de investigadora na área da georreferenciação de dados e da construção de estratégias desenvolvimento sustentável apoiadas em plataformas de gestão de conhecimento (designadamente plataformas georreferenciadas), tendo inclusivamente diversas obras publicadas nas áreas de engenharia, infraestrutura de dados e georreferenciação – conforme artigo 9º do PPA, Documento n.º 4 em anexo ao PPA e não impugnação especificada apreciada nos termos do nº 7 do artigo 110º do CPPT .
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A Requerente B..., relativamente ao ano de 2019, submeteu declaração de substituição modelo 3 do IRS em 2020/09/02, tendo declarado o montante de € 11.220,00, valor do recibo de ato isolado emitido, no Anexo B, campo 404, quadro 4A e tendo inscrito no Quadro 3, campo 07 o Código de Tabela de Actividades do artigo 151º do CIRS “1519” – conforme artigos 1º e 2º da Resposta da AT e teor da Declaração Modelo 3 junta pelos Requerentes em 14.02.2021;
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Por ofício n.º ... de 2021/03/11, foram os Requerentes notificados para apresentarem uma declaração de substituição e incluírem o rendimento no montante de € 11.220,0, no campo 403 do Quadro 4 do Anexo B do Anexo B do Modelo 3 do IRS com a seguinte fundamentação: “O rendimento auferido em 2019 respeita a uma atividade enquadrada no código “CIRS 1320-Consultores” ou “CAE 70220 – Outras atividades de consultoria para os negócios e gestão”, com enquadramento na alínea b) do nº 1 do artº 3º do CIS, independentemente de a atividade estar com a classificação da tabela CAE ou de acordo com o códigos mencionados na tabela de atividades previstas no artº 151º do CIRS e aprovada pela Portaria nº 1011/2001 de 21 de agosto, deverá ser mencionado no campo 403 do quadro 4 do anexo B” - conforme artigos 10º a 12º do PPA e documento nº 6 em anexo ao PPA;
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Após o exercício do direito de audição dos Requerentes, por ofício n.º..., de 20/04/2021, foram notificados de que foi tornado definitivo o projecto de decisão anteriormente notificado por não terem sido “apresentados documentos que suportassem o alegado, nomeadamente o contrato da prestação de serviços” - conforme artigos 14º e 15º do PPA e documento nº 7 em anexo ao PPA;
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Na sequência do acima referido foram os Requerentes notificados em 06/05/2021 da liquidação de IRS n.º 2021..., das liquidações de juros compensatórios n.ºs 2021... e 2021... e da correspondente demonstração de acerto de contas n.º 2021..., relativas ao exercício de 2019 e das quais resultou um montante de imposto a pagar de € 2.375,73, montante que pagaram em data não apurada - conforme artigos 16º e 17º do PPA, documento nº 1 em anexo ao PPA e não impugnação especificada do facto alegado no artigo 17º do PPA apreciada nos termos do nº 7 do artigo 110º do CPPT .
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Em 15.09.2021 os Requerentes entregaram no CAAD o presente pedido de pronúncia arbitral – conforme registo no SGP do CAAD.
2.1. Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto
Os factos provados basearam-se nos documentos juntos pelas Partes e nos factos articulados que estão em conformidade, de forma expressa ou implícita, com os factos alegados por ambas. Por cada alínea dos factos provados, são indicados os documentos ou artigos das peças processuais que não mereceram dissentimento entre as partes e que foram considerados relevantes.
Não há outros factos relevantes para decisão da causa que não se tenham provado.
3. Matéria de direito
No momento da apresentação da declaração de inscrição no registo/início de actividade Modelo 1953 da INCM, relevante para efeitos de IRS, IRC e IVA, o sujeito passivo e a AT definem o enquadramento, no caso, em IRS, incluindo aí é definido o Código de actividade relevante para aplicação do CIRS, como resulta do quadro 7 da referida declaração.
Ou melhor, é o Serviço de Finanças receptor da declaração que tem competência para fixar o enquadramento aplicável, conforme resulta da literalidade do quadro 10 da declaração aqui em causa, de “uso exclusivo dos serviços”.
Sobre esta temática, referem as instruções de preenchimento da Declaração Modelo 1953 INCM, quanto ao seu quadro 10:
“Este quadro deverá ser obrigatoriamente pelo Serviço de Finanças, que nele indicará qual o enquadramento – regime de tributação – (campos 1 a 14, 23 e 18 a 21) resultante dos dados da declaração, bem como a data a partir da qual o mesmo produz efeitos (campo 15). Este enquadramento definido pelo Serviço de Finanças no momento da apresentação, vinculará os Serviços e o sujeito passivo quanto às obrigações estabelecidas para o respectivo regime de tributação nos CIVA, CIRS e CIRC. Por esta razão, todas as dúvidas devem ser completamente esclarecidas”.
Este momento não se verificou no caso aqui em discussão, porquanto, como resulta dos factos provados foi “emitido Fatura-Recibo – Ato Isolado, com o nº 2, no montante de € 11.220,00”, ou seja, a Requerente, NF ... B..., não está inscrita em termos de início da actividade, nem tal lhe é imposto legalmente, até porque a própria AT esgrime no processo esse desiderato.
Por isso, a dissonância quanto à fixação do Código da Actividade do artigo 151º do CIRS, relevante para efeitos de tributação em IRS, surge agora ao nível da liquidação, aliás porque está em causa, a tributação de um “acto isolado” e não o exercício de uma actividade, de forma continuada, pelo sujeito passivo.
Vejamos então.
Entende este Tribunal que a solução da dissonância pode encontrar-se com relativa facilidade no próprio elemento literal da lei, considerando que (1) a literalidade do Anexo I – Tabela de Actividades do artigo 151º do CIRS, aprovado pela Portaria nº 1011/2001, de 21 de Agosto, constitui uma norma que se integra na norma do artigo 151º do CIRS e que (2) as instruções de preenchimento das declarações fiscais constituem a aplicação geral e abstracta da leitura que a AT leva a efeito da lei fiscal.
Com efeito, o elemento literal da norma é sempre um elemento muito relevante, por ser delimitador da actividade interpretativa.
“Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. A letra é um elemento irremovível da interpretação, ou um “limite da busca do espírito”
“Uma interpretação que não se situe já no âmbito do sentido literal possível, já não é interpretação, mas modificação de sentido” (Larenz).
“(...) há-de ser um sentido (uma motivação, um conjunto de objectivos) que caiba razoavelmente no sentido literal da declaração do legislador. Sob pena de, se isto não acontecer, se estar a criar uma nova norma, em vez de interpretar uma norma já existente” (Hespanha).
Parece ser assertiva a afirmação de que todas as actividades que constam no Anexo I – Tabela de Actividades do artigo 151º do CIRS, aprovado pela Portaria nº 1011/2001, de 21 de Agosto, constam também da “Classificação das Actividades Económicas Portuguesas por Ramos de Actividade (CAE), do Instituto Nacional de Estatística (Decreto-Lei n.º 381/2007 14 de Novembro – CAE Rev3) que é naturalmente mais abrangente.
Assim, não contribui muito para a solução da dissonância aqui em causa, a letra, quer do corpo do artigo 151º do CIRS, quer do preâmbulo da Portaria nº 1011/2001 de 21 de Agosto, que referem que “as actividades exercidas pelos sujeitos passivos do IRS São classificadas, para efeitos deste imposto, de acordo com a Classificação das Actividades Económicas Portuguesas por Ramos de Actividade (CAE), do Instituto Nacional de Estatística, ou de acordo com os códigos mencionados em tabela de actividades aprovada por portaria do Ministro das Finanças”.
No entanto, o mesmo já não poderá afirmar-se da própria literalidade que o legislador utilizou na redacção do Anexo I – Tabela de Actividades do artigo 151º do CIRS, aprovado pela Portaria nº 1011/2001, de 21 de Agosto, e bem assim das instruções de preenchimento do Anexo B do Modelo 3 do IRS, como a seguir se vai tentar demonstrar, dando a entender claramente qual é a “voluntas legis”, na leitura que a AT faz da lei.
A dissonância entre os Requerentes e a AT tem a ver com o campo do quadro 4A do Anexo B da declaração Modelo 3 do IRS, onde os rendimentos devem ser inscritos:
A AT defende que devem ser inscritos no Campo 403 porque se trata de um rendimento de uma actividade profissional especificamente prevista na Tabela do artigo 151º do CIRS, e a Requerente entende que devem ser inscritos no campo 404 porque não se trata de um rendimento uma actividade profissional especificamente prevista na Tabela do artigo 151º do CIRS.
Há que considerar o que a AT refere nas instruções de preenchimento destes campos do quadro 4A do Anexo B do Modelo 3 do IRS:
“Campo 403 - Destina-se à indicação dos rendimentos auferidos no exercício, por conta própria, de qualquer atividade de prestação de serviços que tenha enquadramento na alínea b) do nº 1 do artigo 3º do Código do IRS, independentemente de a atividade exercida estar classificada de acordo com a Classificação Portuguesa de Atividades Económicas (CAE), do Instituto Nacional de Estatística, ou de acordo com os códigos na tabela de atividades prevista no artigo 151º do Código do IRS e aprovada pela Portaria nº 1011/2001 , de 21 de agosto, mas com exclusão da atividade com o código "1519 - Outros prestadores de serviços"
Campo 404 - Destina-se à indicação das demais prestações de serviços não incluídas nos campos 403 e 415 a 417.”
Os pontos 13 e 15 do Anexo I – Tabela de Actividades do artigo 151º do CIRS, aprovado pela Portaria nº 1011/2001, de 21 de Agosto, têm a seguinte redacção:
“13 - Outras pessoas exercendo profissões liberais, técnicos e assimilados:
1310 Administradores de bens;
1311 Ajudantes familiares;
1312 Amas;
1313 Analistas de sistemas;
1314 Arqueólogos;
1315 Assistentes sociais;
1316 Astrólogos;
1317 Parapsicólogos;
1318 Biólogos;
1319 Comissionistas;
1320 Consultores;
1321 Dactilógrafos;
1322 Decoradores;
1323 Desportistas;
1324 Engomadores;
1325 Esteticistas, manicuras e pedicuras;
1326 Guias-intérpretes;
1327 Jornalistas e repórteres;
1328 Louvados;
1329 Massagistas;
1330 Mediadores imobiliários;
1331 Peritos-avaliadores;
1332 Programadores informáticos;
1333 Publicitários;
1334 Tradutores.
14 - ...
15 - Outras actividades exclusivamente de prestação de serviços:
1519 Outros prestadores de serviços”
Por outro lado, o artigo 3º nº 1 alínea b), nº 2 alínea i) e nº 3 do CIRS, referem o seguinte:
“1 - Consideram-se rendimentos empresariais e profissionais:
a) ...;
b) Os auferidos no exercício, por conta própria, de qualquer atividade de prestação de serviços, incluindo as de carácter científico, artístico ou técnico, qualquer que seja a sua natureza, ainda que conexa com atividades mencionadas na alínea anterior;
c) ....
2 - Consideram-se ainda rendimentos desta categoria:
a) ...;
b) ...;
c) ...;
d) ...;
e) ...;
f) ...;
g) ...;
h) ...;
i) Os provenientes da prática de atos isolados referentes a atividade abrangida na alínea b) do n.º 1.
3 - Para efeitos do disposto nas alíneas h) e i) do número anterior, consideram-se rendimentos provenientes de atos isolados os que não resultem de uma prática previsível ou reiterada.”
As instruções de preenchimento de modelos de declarações fiscais correspondem à leitura e aplicação uniforme da lei, de forma geral e abstracta, que a AT leva a efeito no cumprimento das suas funções.
Ora, como acabámos de ver, é a própria AT que expressa que no campo 404 do quadro 4A do Anexo B do Modelo 3 do IRS, apenas há que declarar “os rendimentos auferidos no exercício, por conta própria, de qualquer atividade de prestação de serviços que tenha enquadramento na alínea b) do nº 1 do artigo 3º do Código do IRS”.
O enquadramento dos atos isolados, entendidos como rendimentos que não resultem de uma prática previsível ou reiterada, consta da alínea i) do nº 2 e nº 3 do artigo 3º do CIRS. E daí que a AT refira nas referidas instruções de preenchimento: “mas com exclusão da atividade com o código "1519 - Outros prestadores de serviços". Campo 404 - Destina-se à indicação das demais prestações de serviços não incluídas nos campos 403...”
Ao lermos o Anexo I – Tabela de Actividades do artigo 151º do CIRS, aprovado pela Portaria nº 1011/2001, de 21 de Agosto, verificamos que o ponto 13 (onde consta “1320 Consultores”), refere “Outras pessoas exercendo profissões liberais, técnicos e assimilados”, dando a ideia de que se trata de actividades cujos rendimentos resultam “de uma prática previsível ou reiterada” fazendo ligação com as actividades a que alude o artigo 3º nº 1 alínea b) do CIRS.
Pelo que o enquadramento dos rendimentos resultantes de atos isolados, entendidos como rendimentos que não resultam de uma prática previsível ou reiterada, a que se alude na alínea i) do nº 2 e no nº 3 do artigo 3º do CIRS, só pode ser levado a efeito na lista do Anexo I – Tabela de Actividades do artigo 151º do CIRS, aprovado pela Portaria nº 1011/2001, de 21 de Agosto, com a designação residual “1519 - Outras actividades exclusivamente de prestação de serviços: 1519 Outros prestadores de serviços”.
Mesmo que assim não fosse, provou-se o que consta da alínea C) dos factos assentes: “a Requerente esposa é Engenheira do Ambiente, com doutoramento na área de gestão de dados e tecnologias de informação, exercendo profissionalmente a atividade de investigadora na área da georreferenciação de dados e da construção de estratégias desenvolvimento sustentável apoiadas em plataformas de gestão de conhecimento (designadamente plataformas georreferenciadas), tendo inclusivamente diversas obras publicadas nas áreas de engenharia, infraestrutura de dados e georreferenciação”.
Ou seja, uma actividade que tem cabimento na Classe “7219 OUTRA INVESTIGAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DAS CIÊNCIAS FÍSICAS E NATURAIS – Subclasse 72190, que segundo o CAE Rev3 “compreende as actividades no campo das ciências físicas e naturais (física, medicina, astronomia, ciências da terra, química, agricultura, etc.) no domínio dos três tipos de investigação e desenvolvimento (investigação fundamental, investigação aplicada e desenvolvimento experimental), disciplinar ou multidisciplinar. Não inclui: · Investigação e desenvolvimento em biotecnologia (72110)”.
Procede, pois, o PPA, uma vez que os Requerentes colocaram correctamente o código “1519” da Lista que consta do Anexo I - Tabela de Actividades do artigo 151º do CIRS, aprovado pela Portaria nº 1011/2001, de 21 de Agosto, no Anexo B do Modelo 3 da declaração de IRS do ano de 2019 e consequentemente colocaram os rendimentos no campo 404 do quadro 4A do Anexo B do Modelo 3 do IRS.
4. Direito a juros indemnizatórios.
No que concerne a juros indemnizatórios, de harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação, vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».
Embora o artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».
O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do artigo 61.º, n.º 4 do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».
Assim, o n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.
O regime substantivo do direito a juros indemnizatórios é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece o seguinte:
Artigo 43.º
Pagamento indevido da prestação tributária
1 - São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
2 - Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar de a liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.
3 - São também devidos juros indemnizatórios nas seguintes circunstâncias:
a) Quando não seja cumprido o prazo legal de restituição oficiosa dos tributos;
b) Em caso de anulação do acto tributário por iniciativa da administração tributária, a partir do 30.º dia posterior à decisão, sem que tenha sido processada a nota de crédito;
c) Quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária.
d) Em caso de decisão judicial transitada em julgado que declare ou julgue a inconstitucionalidade ou ilegalidade da norma legislativa ou regulamentar em que se fundou a liquidação da prestação tributária e que determine a respetiva devolução. (Aditada pela Lei n.º 9/2019, de 1 de fevereiro)
4 - A taxa dos juros indemnizatórios é igual à taxa dos juros compensatórios.
5 - No período que decorre entre a data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado e a data da emissão da nota de crédito, relativamente ao imposto que deveria ter sido restituído por decisão judicial transitada em julgado, são devidos juros de mora a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas. (Aditado pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro)
Revertendo o que se referiu para o caso concreto deste processo, verifica-se que se provou o seguinte:
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Durante o ano de 2019 a Requerente esposa, NF ... B..., auferiu rendimentos da categoria B no montante de € 11.220,00, tendo emitido Fatura-Recibo – Ato Isolado, com o nº 2, no montante de € 11.220,00, referente a “Prestação de Serviços de Consultoria” – alínea A) dos factos assentes.
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Em consonância com a indicação constante na factura-recibo emitido pela Requerente, a AT por ofício n.º ... de 2021/03/11, notificou os Requerentes para apresentarem uma declaração de substituição e incluírem o rendimento no montante de € 11.220,0, no campo 403 do Quadro 4 do Anexo B do Anexo B do Modelo 3 do IRS com a seguinte fundamentação: “O rendimento auferido em 2019 respeita a uma atividade enquadrada no código “CIRS 1320-Consultores” ou “CAE 70220 – Outras atividades de consultoria para os negócios e gestão” – Alínea E) dos factos assentes.
À primeira vista dir-se-ia que a AT agiu partindo da indicação que constava na factura/recibo escrita pelo próprio sujeito passivo onde expressou “prestação de serviços de consultoria”, pelo que não se lhe poderia imputar qualquer “erro dos serviços” a que alude a lei.
No entanto, como acima se referiu, da leitura das próprias instruções de preenchimento do Quadro 4A, campos 403 e 404, do Anexo B da Declaração de Modelo 3 do IRS, resulta claro que a Requerente esposa agiu em conformidade com as mesmas.
Adicionalmente, acrescente-se que, verdadeiramente, o fundamento da liquidação adicional parece ser o que está expresso na alínea F) dos factos assentes: “não foram apresentados documentos que suportassem o alegado, nomeadamente o contrato da prestação de serviços”, uma vez que o referido em E) dos factos provados tem característica mais expositiva, deixando a impressão de que, no âmbito do poder do inquisitório e dever de recíproca colaboração, o convite ao sujeito passivo para a sua apresentação, poderia resolver o dissídio.
Será, pois, de aplicar a norma do nº 2 do artigo 43º da LGT “considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar de a liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas”.
Os juros indemnizatórios são devidos desde a data em que ocorreu o pagamento (alínea G) dos factos assentes), nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1 e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, 61.º, n.º 5, do CPPT, 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril, à taxa legal supletiva.
5. Decisão
Nestes termos decide este Tribunal Arbitral:
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Julgar procedente o PPA e anular os actos de liquidação de IRS n.º 2021 ..., das liquidações de juros compensatórios n.ºs 2021... e 2021 ... e da correspondente demonstração de acerto de contas n.º 2021 ..., relativas ao exercício de 2019 e das quais resultou um montante de imposto a pagar de € 2.375,73;
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Julgar procedente o PPA na parte do pedido de condenação da AT no pagamento dos juros indemnizatórios.
6. Valor do processo
De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 1, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 2 375,73.
7. Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 612,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida, por ter decaído na totalidade (artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC e 122.º, n.º 2, do CPPT).
Lisboa, 06 de Março de 2022
Tribunal Arbitral Singular,
Augusto Vieira