Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 401/2021-T
Data da decisão: 2022-03-07  IRC  
Valor do pedido: € 41.992,75
Tema: IRC - Desreconhecimento de ativos fixos tangíveis. Artigos 31.º- B e 46.º e seguintes, ambos, do CIRC.
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Sumário

  1. - O desreconhecimento de ativos fixos tangíveis resultantes de reorganizações empresarias podem dar origem a transmissão desses ativos estando abrangida pelo regime previsto no artigo 46.º e seguintes do CIRC ou pelo regime previsto no artigo 31.º -B do CIRC.
  2. -. Ao abrigo do artigo 31.º- B do CIRC se houver uma perda no desreconhecimento dos ativos fixos tangíveis, a mesma só será dedutível fiscalmente se forem adotados os procedimentos previstos no n.º 3 do artigo 31.º-B do CIRC.
  3. – Não se conseguindo provar que na origem do destreconhecimento dos ativos fixos tangíveis esteve uma alienação dos mesmos, só haverá perda dedutível fiscalmente aceite se os procedimentos previstos no n.º 3 do artigo 31.º-B do CIRC foram cumpridos.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

1.Relatório

 

A..., S.A., doravante designada por A... (Requerente), pessoa coletiva n.º..., com sede na Rua ..., ...-... ..., matriculada na Conservatória do Registo Comercial de ... sob o n.º ..., veio ao abrigo do disposto no artigo 2.º n.º1 alínea a) , 5.º n.º2  alínea a) , 6.º n.º1 , 10.º n.º1 al a), todos, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (doravante “RJAT”) e do artigo 102.º n.º1 , alínea b) do CPPT, requerer a constituição de Tribunal Arbitral Singular, com vista  à anulação da liquidação  de IRC n.º 2021..., da demonstração de liquidação de juros n.º 2021... e da demonstração de acertos de contas n.º 2021... do ano de 2017.

A Requerente pede que lhe sejam pagos juros indemnizatórios à taxa legal a contar do pagamento do imposto pago em excesso até à restituição do mesmo, nos termos do artigo 43.º da Lei Geral Tributária.

 

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante também identificada por “AT” ou simplesmente “Administração Tributária”).

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 05-07-2021.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou o signatário como árbitro do tribunal singular, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 23-08-2021, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados das alíneas a) e) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral singular foi constituído em 10-09-2021.

A AT apresentou Resposta, tendo junto o processo administrativo, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral (doravante designado de PPA) e requerido a dispensa de produção de prova testemunhal e da reunião referida no artigo 18.º do RJAT.

Ao abrigo do disposto nas alíneas c) e e), ambas do artigo 16.º, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT) plasmado no Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20/1/2011 em vigor, foi designado o dia 15-12-2021 pelas 14h30m para a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, tendo sido notificadas as partes.

Em 15-12-2021, realizou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT em que foi produzida prova testemunhal e decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas simultâneas, tendo sido dado às partes um período de 15 dias.

As Partes apresentaram alegações escritas.

O Tribunal, em cumprimento do disposto no artigo 18.º n.º 2 do RJAT, decidiu que a decisão final seria proferida até ao fim do prazo fixado no artigo 21.º, n.º 1 do RJAT.

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado na alínea e) do n.º 1 do artigo 2.º, e do n.º 1 do artigo 10.º, ambos do RJAT e é competente.

As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigo 4.º e n.º 2 do artigo 10.º, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

O processo não enferma de nulidades.

 

2.Matéria de facto 

2.1.Factos provados 

 

Consideram-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão:

  

  1. A Requerente (A...) desenvolve a sua atividade no centro comercial ..., com localização em ..., que compreende um hipermercado, dividido em três áreas distintas de venda, um centro auto, um posto de abastecimento de combustíveis e uma galeria comercial. A atividade desenvolvida pela Requerente está integrada no setor do comércio a retalho em supermercados e hipermercados, com atividade económica principal CAE 47111. Também tem atividades secundárias identificáveis na pág. 3 do Relatório Final do RIT[1], cf. Doc. 4 anexo ao PPA.
  2. Um ato de liquidação adicional de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC) n.º 2021... de 2021-01-25, respeitante ao período de tributação de 2017 que deu origem à demonstração de acerto de contas n.º 2021 ... em que foi apurado um total a pagar de €15.821,02(quinze mil oitocentos vinte um euros e dois cêntimos) correspondendo a €14.539,92 (catorze mil quinhentos trinta nove euros e noventa dois cêntimos) de imposto e €1.281,10 (mil duzentos oitenta um euros e dez cêntimos ) de juros compensatórios, emitida na sequência de correções de natureza meramente aritmética realizadas pelos Serviços de Inspeção Tributária (SIT) da Direção de Finanças de Braga (DF Braga), cf. Docs. 1,2 e 3 anexos ao PPA.
  3. A B... S.A. (doravante designada por B..) com um número de pessoa coletiva: ... era uma sociedade comercial detida integralmente pela Requerente, cf. fls. 9 do Relatório e Contas da Requerente relativo a 2017 constante do Anexo 3 do ficheiro 401-2021-T_PA_Parte 8.pdf que faz parte do PA[2], foi incorporada pela Requerente através de uma operação de fusão retroativa a 1 de janeiro de 2017, tendo sido efetuado o registo da mesma na Conservatória do Registo Comercial em 21 de julho de 2017, cf. ponto III DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL OUTRAS INFORMAÇÕES ADCIONAIS fls. 5 do RIT constante no ficheiro 401-2021-T_PA_Parte 1.pdf que faz parte do PA. Por força da fusão, a totalidade de ativos não correntes – ativos fixos tangíveis e intangíveis - (na terminologia dos autos “Imobilizado”) foram transferidos da B... para a A... .
  4. No âmbito de uma ação inspetiva de natureza interna e de âmbito parcial em imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC) à Requerente, relativa ao ano de 2017, credenciada pela Ordem de Serviço Interna n.º OI2019..., foram efetuadas correções de natureza meramente aritmética no montante de uns €193.865,55 (cento noventa três mil oitocentos sessenta cinco euros cinquenta cinco cêntimos), cf. considerando 17 do PPA e fls. 1 e seguintes do RIT constante no ficheiro 401-2021-T_PA_Parte1.pdf que faz parte do PA. No âmbito da ação inspetiva, a Requerente exerceu o direito de audição conforme referido no ponto VIII. Direito de Audição do RIT cujo teor se dá por inteiramente reproduzido, cf. fls. 13 e seguintes do RIT constante no ficheiro 401-2021-T_PA_Parte1.pdf. 
  5. O montante de €193.865,55 (cento noventa três mil oitocentos sessenta cinco euros cinquenta cinco cêntimos) resulta da dedução de mais-valias contabilísticas no montante de €10.124,19 (dez mil cento e vinte e quatro euros e dezanove euros) no   C767 Q07 Mod.22 do ano de 2017 e da diferença negativa entre as mais-valias e as menos valias fiscais (ao abrigo do artigo 46.º do CIRC) no montante de €183.741,36 (cento oitenta três mil setecentos quarenta um euros trinta seis cêntimos no C769 Q07 Mod.22 do ano de 2017 que a Requerente declarou na sua declaração de rendimentos de IRC (Modelo 22) de 2017, cf. considerando 17 do PPA e considerando 4.4 da Resposta.
  6. O montante de mais-valias contabilísticas de €10.124,19 (dez mil cento e vinte e quatro euros e dezanove euros) é decomposto em 2 parcelas: €2.879,94 (dois mil oitocentos setenta nove euros e noventa quatro cêntimos) e de €7.244,25 (sete mil duzentos quarenta quatro euros vinte cinco cêntimos). Ao montante da mais-valia contabilística de €2.879,94 (dois mil oitocentos setenta nove euros e noventa quatro cêntimos) corresponde um valor de realização de €2.879,94 (dois mil oitocentos setenta nove euros e noventa quatro cêntimos), uma vez que os ativos transmitidos estão totalmente depreciados, relativo à transmissão de diversos bens pela sociedade B...[3] em 2017 a clientes concretos e identificados: C..., Lda; D... S.A., E..., S.A. e F..., cf. faturas constantes do Anexo 2 do Doc. 4 anexo ao PPA tituladas pela B..., e que não foi objeto de correção por parte da AT.
  7.  Ao montante da 2ª parcela de mais-valia contabilística - €7.244,25 (sete mil duzentos quarenta quatro euros vinte cinco cêntimos) - corresponde um valor total de realização de € 7.244,25 (sete mil duzentos quarenta quatro euros vinte cinco cêntimos) do conjunto de bens que foram transmitidos pela B..., conforme faturas de suporte constantes do Anexo 2 do Doc. 4 anexo ao PPA que abaixo se identifica:

Uma imagem com mesa

Descrição gerada automaticamente

  1. O valor total de realização - €7.244,25 (sete mil duzentos quarenta quatro euros vinte cinco cêntimos) - foi rateado pelos diversos ativos transmitidos sob a designação de resíduos e que está na origem do reconhecimento de uma diferença negativa entre as mais-valias e as menos valias fiscais (artigo 46.º do CIRC) no montante de €183.741,36. Quer o somatório dos 2 valores de realização - €2.879,94(dois mil oitocentos setenta nove euros noventa quatro cêntimos) e €7.244,25 (sete mil duzentos quarenta quatro euros vinte cinco cêntimos) - totalizando €10.124,19 (dez mil cento vinte quatro euros dezanove cêntimos), quer o montante total de mais-valias contabilísticas de €10.124,19[4] (dez mil cento vinte quatro euros dezanove cêntimos) quer o montante de €183.741,36 (cento oitenta três mil setecentos quarenta um euros trinta seis cêntimos), encontram-se declarados no Mapa Modelo 31 de Mais-Valias e Menos-Valias (doravante designado por modelo 31) da Requerente relativo a 2017 na página 44 de 44, cf. Anexo 1 do Doc. 4 anexo ao PPA. O Modelo 31 faz parte do Dossier Fiscal relativo a 2017 da Requerente. Os montantes de €7.244,25 e €183.741,36 constituem o objeto do presente PPA e que estão na origem dos atos administrativos referidos na alínea B supra.
  2. A Requerente entregou a Declaração Anual de Informação Empresarial Simplificada (IES) relativa ao ano de 2017 onde assinala que relativamente a ativos fixos tangíveis ocorreram alienações, quantificando as mesmas no campo 5633 (“Alienações”), mas não, de “Abates”, sendo prova disso a não existência de qualquer valor no campo 5634 (“Abates”), cf. Doc. 5 anexo ao PPA.   
  3.   Conforme referido na alínea C acima, a B... (subsidiária da Requerente que viria a ser incorporada integralmente por aquela por efeito duma operação de fusão retroativa a 1/1/2017 conforme registo na Conservatória do Registo Comercial, não contestado pela Requerida) transmitiu bens a terceiros designando os mesmos de resíduos, conforme provado na alínea G acima. A Requerente recebeu uma declaração da sociedade comercial G... a declarar que os bens elencados nas faturas n.º 72001173 e 72001174, de 8/6/2017 e 24/7/2017, respetivamente, foram adquiridos pela G..., retirados das instalações da B... e transportados para as suas (da G...) instalações. Declararam igualmente que do ponto de vista contabilístico, os mesmos foram relevados como mercadorias e que nenhum dos bens adquiridos se destinou a abate, conforme Doc. 6 anexo ao PPA.
  4.  A Requerente apresentou um artigo duma consultora da Ordem dos Contabilistas Certificados, de 19/7/2018, intitulado “O abate dos bens do ativo fixo tangível” segundo o qual:” se tal ativo for vendido para sucata, para reciclagem ou qualquer outra forma de reaproveitamento do bem ou dos seus componentes, já não estamos perante um abate, mas uma transmissão onerosa que é suportada pela fatura de venda”, cf. Doc. 7 anexo ao PPA e fls.432 do RIT constante no ficheiro 401-2021-T_PA_Parte1. Pdf. 
  5. Foi celebrado um contrato de cessão de exploração ao abrigo do qual a B... cedia a exploração do estabelecimento comercial que constitui o Centro Comercial ..., sito em ..., à A... com início em 1 de janeiro de 2012 e duração de 5 anos com terminus em 31 de dezembro de 2016, com renovação por iguais e sucessivos períodos de tempo (1 ano), desde 2012 a 2016, cf. fls. 158 e seguintes do ficheiro 401-2021-T_PA_Parte17.pdf que faz parte do PA.
  6. De acordo com o Relatório e Contas da Requerente aprovado pelos Órgãos Sociais da mesma relativo a 2017 (doravante designado por R&C 2017), cf. fls. 191 e seguintes constante do ficheiro 401-2021-T_PA_Parte 8. Pdf, na pág.5 do R&C 2017, na rúbrica “Atividades” é referido que [(…) no final de 2011, foram tomadas medidas com vista ao início, em 1 de janeiro de 2012, da exploração direta do centro comercial, sob a insígnia “...” , com localização em..., Braga, que compreende um hipermercado, dividido em três áreas distintas de vendas, um centro auto, um posto de abastecimento de combustíveis e ainda uma galeria comercial constituída por 36 lojas exploradas por outros lojistas através de contrato de cessão de exploração  celebrado com a subsidiária B... (…) Com a fusão integral em julho de 2017, com efeitos retroativos a 1 de janeiro de 2017, da B... na A... a configuração entidade detentora dos equipamentos vs.entidade exploradora dos mesmos desaparece]; na pág. 7 do R&C 2017 na rúbrica “Investimentos” refere-se que [Resultado do andamento do projeto de renovação/remodelação do Centro Comercial, de valor estimado de 2.250.000 mil euros, com conclusão prevista para o primeiro semestre de 2018, foram já realizados investimentos no valor de 1.218.058 mil euros. Em 2017, os investimentos realizados, estão relacionados com a renovação profunda da área de vendas do hipermercado, com a substituição de equipamentos cuja aquisição remonta à abertura da loja em 1997, nomeadamente sistema de frio, arcas, linha de caixa, balcões de atendimento e áreas técnicas de laboratório, no sentido de renovar a imagem da loja e proporcionar melhores condições aos clientes.(…) A Empresa registou o abate de ativo fixo tangível no montante de 2.530 687 euros, resultante essencialmente da remodelação efetuada na loja.] e na pág. 8 do R&C 2017 na rúbrica “Gastos Gerais de Exploração” é referido que: [“De forma a obter uma comparação apropriada entre exercícios, optou-se por fazer o comparativo com os valores de 2016 re-expressos, que serão na quase totalidade os das contas consolidadas de N-1, dado que a A... detinha a 100% a B... .(…) Assim, no exercício de 2017, os custos de estrutura, ascenderam a cerca de 3,57 milhões de euros, o que representou uma diminuição face ao período homólogo de 63%, no entanto, estão incluídos no exercício de 2016, na rubrica outros gastos o efeito do abate do goodwill e dos direitos de marca, que totalizaram 5.947.957 euros e na rúbrica depreciações/amortizações uma amortização extraordinária, no montante global de 314.616 euros, relacionada com os investimentos alvo do projeto de renovação/ remodelação do Centro Comercial.(…)As depreciações/amortizações, determinadas em regime de duodécimos, calculadas usando as taxas máximas, ascendem a cerca de 230 mil euros, menos 63,67 % face aos 635 mil euros do período homólogo. Fazendo a comparação da rubrica, excluído o efeito da amortização extraordinária em 2016 atras já referido, as depreciações/amortizações decresceram 28,05% face ao período homologo. Esta redução deveu-se em grande parte à amortização extraordinária efetuada em 2016 e a bens cujo período de vida útil chegou ao termo, encontram-se amortizados na totalidade.”. Diga-se que esta “amortização extraordinária” foi reconhecida nas contas da B... relativas ao ano de 2016, conforme é referido na página 6 de 29 no considerando 17 do PPA.  Devido à materialidade da “amortização extraordinária” reconhecida nas contas de 2016 a nível da B... e por questões de comparabilidade entre os anos de 2016 e 2017 (uma vez que a B... era detida a 100% pela A...) das contas consolidadas da A..., houve a necessidade de reexpressar as contas consolidadas da A... de 2016 (coluna 2016 Re-expresso) com o impacto da “amortização extraordinária” na rúbrica Depreciações/Amortizações reconhecida a nível das contas individuais da B... em 2016 , cf. pág. 8 do R&C 2017 na rúbrica “Gastos Gerais de Exploração” da Requerente, cf. fls.199 constante do ficheiro 401-2021-T_PA_Parte8.Pdf.
  7. A Requerente apresentou o Doc. 8 RETIFICAÇÃO DO RELATÓRIO DE GESTÃO DE 2017 anexo ao PPA onde se pode ler [No relatório de gestão e anexa de 2017 foi detetado um lapso de linguagem. Assim procede-se à retificação do mesmo e onde se lê ”abate”, na página 7, deve ler-se ”venda de bens às sociedades G... Lda e  H...Lda, de valor de aquisição no montante de 2.530.687 euros”. A presente retificação retroage os seus direitos a data de emissão documento originário] fundamentando a apresentação do documento com o facto de a Administradora única,  I... ter sido criada em França, sendo a sua língua-mãe o francês, e não dominar a língua portuguesa de forma fluente, cf. considerando 57 do PPA.
  8. A Requerente procedeu ao pagamento da liquidação de IRC de 2017 no montante de €16.005,82 (dezasseis mil cinco euros oitenta dois cêntimos), cf. Doc. 9 anexo ao PPA.

 

2.2.Factos dados como não provados

Com relevo para a decisão, a Requerente não provou que os bens (ativos fixos tangíveis) referidos na alínea G do ponto 2.1 Factos provados correspondem aos bens (ativo fixo tangível) declarados no modelo 31 relativo ao exercício de 2017 referido na alínea H do ponto 2.1 Factos provados.

 

2.3.Fundamentação da decisão da matéria de facto

 

Os factos que foram dados como provados e não provados tiveram por base os documentos juntos pela Requerente, no processo administrativo e testemunhal.

 

3.Matéria de direito

 

No âmbito de uma ação inspetiva de natureza interna e de âmbito parcial em sede de IRC, foram efetuadas correções de natureza meramente aritmética no montante de €193.865,55 (cento e noventa três mil oitocentos sessenta cinco euros e cinquenta cinco cêntimos) que dá origem a uma correção do lucro tributável em sede de IRC no mesmo montante e que em termos de IRC tenha um impacto de €40.711,65 (quarenta mil euros setecentos onze euros e sessenta cinco cêntimos) resultante do produto da correção de natureza meramente aritmética -€193.865,55 (cento noventa três mil oitocentos sessenta cinco euros cinquenta cinco cêntimos) -   multiplicado pela taxa nominal de IRC (21%), ao qual acrescem juros compensatórios de €1.281,10 (mil duzentos oitenta um euros dez cêntimos), dando origem a que o valor do PPA ascenda a €41.992,75 (quarenta um mil euros novecentos noventa dois euros setenta cinco cêntimos).

 

3.1.Posições das Partes

             

                    A Requerente, em defesa da procedência do pedido, alega em síntese que: 

 

  1. Passou por um processo de reestruturação que ficou concluído no ano de 2017, com a fusão por incorporação total, com efeitos retroativos a 1 de janeiro de 2017, da sua subsidiária B... (detida a 100%). Resultante desta operação de fusão, os ativos fixos tangíveis detidos a 31/12/2016 pela B... foram transferidos para a Requerente. Também integrado no processo de reestruturação levada a cabo pela Requerente em 2017, houve uma remodelação do hipermercado que a Requerente explorava com vista à sua modernização com o objetivo de melhorar o serviço a prestar aos clientes, o que implicou que muitos equipamentos fossem substituídos e efetuadas demolições a nível do hipermercado, uma vez que a maioria dos equipamentos datava da abertura de loja ocorrida em 1997. Os equipamentos estavam totalmente depreciados.  
  2. Em 2016, por motivos económicos e de gestão, a B... procedeu a uma amortização extraordinária no montante de 314.616 euros (trezentos catorze mil seiscentos e dezasseis euros) que foi acrescida ao resultado líquido da mesma no apuramento do lucro tributável na sua (da B...) declaração de rendimentos do exercício de 2016.
  3. Defende que o que ocorreu em 2017 como consequência da remodelação levada a cabo, foi uma venda de bens do ativo fixo tangível, dando origem ao reconhecimento de um valor de €10.124,19 (dez mil cento e vinte quatro euros e dezanove cêntimos) de mais-valias contabilísticas e a uma diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias fiscais no montante de €183.741,36 (cento oitenta três mil setecentos quarenta um euros trinta seis cêntimos), valores esses deduzidos no quadro 07 da declaração de rendimentos para efeitos de IRC (Modelo 22) do ano de 2017 para efeitos de apuramento do lucro tributável.
  4. Como prova de que efetuou uma venda de ativos fixos tangíveis, declarou a nível da IES não um abate (campo A5634), mas sim, uma venda no campo respetivo da IES - campo 5633. Defende que quer as declarações fiscais quer a contabilidade gozam da presunção prevista no artigo 75.º da Lei Geral Tributária.
  5. Em defesa do entendimento de que efetuou uma venda de bens resultantes da remodelação da sua loja (hipermercado) identifica como clientes/ destinatários da venda efetuada, as sociedades comerciais G... Lda e H..., Lda referindo que nas faturas a titular essas vendas aparece a descrição mencionada na alínea G do ponto 2.1 Factos provados, isto é, “recolha de sucata dia xxx Sucata de aço, Papel e cartão, Paletes”, e que não se pode concluir que os bens se destinaram a abate abrangido pelo artigo 31.º-B do CIRC, mas sim a venda e que uma das entidades acima referidas -G... - emitiu uma declaração a comprovar que tinha adquirido os bens elencados nas faturas n.º 72001173 e 72001174, de 8/6/2017 e 24/7/2017, respetivamente, e que do ponto de vista contabilístico os bens adquiridos iam ser reconhecidos como mercadorias. O valor de venda às duas entidades acima referidas –G... Lda e H..., Lda - ascendeu a €7.244,25 (sete mil duzentos e quarenta quatro euros e vinte cinco cêntimos) que correspondem à venda de 60 toneladas de resíduos, concluindo que houve um contrato de compra e venda.
  6. Igualmente identifica outras entidades que adquiriram bens identificáveis e concretos – sociedade C..., Lda, sociedade D... SA, sociedade E... e sociedade F...– conforme considerandos 47 a 49 do PPA e alínea F do ponto 2.1 Factos provados.
  7. Assim, o valor obtido de €10.124,19 (dez mil cento vinte quatro euros e dezanove cêntimos), a título de mais-valia contabilística resulta de uma venda de ativos fixos tangíveis e como tal deduziu corretamente no campo 767 do quadro 07 da modelo 22 do ano de 2017. O tratamento contabilístico e fiscal que foi dado - venda de bens do ativo fixo tangível- foi o correto porque os mesmos não se destinavam ao abate e o tratamento contabilístico e fiscal da venda e abate, é diferente.
  8. Em suporte da sua posição indica um artigo da Ordem dos Contabilistas Certificados, conforme considerando 54 do PPA.
  9. Refere igualmente que houve um lapso de linguagem no R&C 2017 que na versão original houve a referência a “abate”, lapso esse retificado posteriormente e que se deveu a que a Administradora na altura dos factos por não ter um domínio fluente da língua portuguesa não se apercebeu e daí a retificação “a posteriori” do lapso cometido. Para todos os efeitos, mesmo retificado, o R&C 2017 cumpre todos os requisitos legais.
  10.  Não aceita a posição da AT segundo a qual a Requerente procedeu em 2017 a uma “amortização extraordinária” fiscal dos seus ativos fixos tangíveis e que por isso não pode ser aceite uma dedução ao lucro tributável a título de menos-valia fiscal no montante de €183.741,36 (cento oitenta três mil setecentos quarenta um euros trinta seis cêntimos).
  11.  Adicionalmente defende que deve ser aceite a dedução da mais-valia contabilística no valor de €7.244,25(sete mil duzentos quarenta quatro euros e vinte cinco euros) porque se verificou uma venda de ativos fixos tangíveis.
  12.   A liquidação de IRC do ano de 2017 e as respetivas demonstrações de liquidação de juros e de acerto de contas, devem ser anuladas devido a erro de qualificação e excesso de quantificação.
  13. Defende igualmente que existe um erro de fundamentação por parte da AT, uma vez que do relatório de inspeção não constam as razões que permitam fundamentar as correções efetuadas por parte da AT; que a dedutibilidade fiscal da diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias fiscais apurada deve ser considerada no apuramento do lucro tributável e havendo mais-valias e menos-valias contabilísticas, as mesmas devem ser objeto de correção/ajustamento para efeitos de apuramento desse lucro tributável. Por outro lado, refere a existência de contabilidade organizada, que não foi questionada e posta em causa pela AT e por isso não houve recurso a métodos indiretos previstos na Lei Geral Tributária e que de acordo com o principio da tributação pelo lucro real com consagração constitucional, deve ser tido em conta o valor probatório da sua contabilidade, assim como dos elementos contabilísticos e a presunção da veracidade das suas declarações, uma vez que do relatório de inspeção não constam as razões que permitam fundamentar as correções efetuadas, conforme é referido nos pontos: III-DO VÍCIO DE FUNDAMENTAÇÃO - ARTIGO 99.º c) CPPT,  IV - DA DEDUTIBILIDADE DOS GASTOS E V – DA TRIBUTAÇÃO PELO LUCROREAL, cf. considerandos 68 a 135.
  14. Pugna pela anulação da liquidação de IRC do ano de 2017 n.º 2021..., a demonstração de liquidação de juros n.º 2021... e a demonstração de acerto de contas n.º 2021... do ano de 2017 e o pagamento de juros indemnizatórios ao abrigo do artigo 43.º da Lei Geral Tributária.  

 

             

 Por sua vez, a Requerida, a AT, defende, por impugnação, a improcedência do pedido da Requerente alegando que:

 

  1. No período de tributação de 2017, a Requerente na sua declaração de rendimentos - Modelo 22 - deduziu no quadro 07 no campo 767: Mais-valias contabilísticas, o montante de €10.124,19 (dez mil cento vinte quatro euros e dezanove cêntimos) e no campo 769: Diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias fiscais, o montante de €183.741,36 (cento oitenta três mil setecentos quarenta um euros trinta seis cêntimos), totalizando €193.865,55 (cento noventa três mil oitocentos sessenta cinco euros cinquenta cinco cêntimos).
  2. No decurso do procedimento inspetivo, cf. alínea E do ponto 2.1 Factos provados, constatou-se que os valores acima referidos dizem respeito a duas operações de desreconhecimento de ativos identificadas no ponto 4.5 da Resposta, a saber:
    1. Uma referente a bens em concreto e identificáveis: Equipamento Centro Auto; Amassadeira-Padaria; ... MT -... que corresponde a uma mais-valia contabilística de €2.879,94 (dois mil oitocentos setenta nove euros noventa quatro cêntimos) e que não foi objeto de correção por parte da AT; e
    2. Outra relativa a bens cujo valor de aquisição ascende a €2.487.329,17 (dois milhões quatrocentos oitenta sete mil trezentos vinte nove euros e dezassete cêntimos), que deu origem a que a A... deduzisse ao resultado líquido para efeitos de apuramento de resultado tributável de 2017 mais-valias contabilísticas no montante de €7.244,25 (sete mil duzentos quarenta quatro euros vinte cinco euros), e uma diferença negativa entre as mais-valias e menos-valias fiscais no montante de €183.741,36 (cento oitenta três mil setecentos quarenta um euros trinta seis cêntimos), não contendo nas faturas emitidas o descritivo  do bem alienado, quantidades e seu valor unitário de alienação e demais elementos que permitam identificar inequivocamente o ativo em causa; nas faturas emitidas aparece o descritivo de «recolha de sucata dia 06-06-2017 (sucata de aço)»; «recolha efetuada em 05/2017 (papel e cartão, sucata de ferro e paletes»; «recolha de sucata dia 21/7 (sucata de ferro)»; «recolhas efetuadas em 09/2017 (papel, cartão e sucata de ferro)» e titulam a alienação de 60 toneladas de resíduos (sucata de aço, sucata de ferro, papel, cartão paletes) inexistindo qualquer correspondência com os ativos fixos tangíveis desreconhecidos pela Requerente.
  3. Defende que se está perante uma situação de abate de bens do ativo, como reconhecido pela Requerente no seu R&C 2017, e que a mesma deveria cumprir com os procedimentos previstos no n.º 3 do artigo 31.º- B do Código de IRC (doravante designado por CIRC), o que não aconteceu e daí as correções fiscais dos montantes de €7.244,25 (sete mil duzentos quarenta quatro euros vinte cinco euros) a titulo de mais-valias contabilísticas e de €183.741,36 (cento oitenta três mil setecentos quarenta um euros trinta seis cêntimos). Relativamente à mais-valia contabilística de €2.879,94€ (dois mil oitocentos setenta nove euros noventa quatro cêntimos), a mesma não foi objeto de correção por parte da AT porque os elementos do ativo fixo tangível estavam corretamente identificados nas faturas de alienação.
  4.  Defende que as faturas emitidas pela Requerente às sociedades G... Lda e H..., Lda pelo valor total de €7.244,25 (sete mil duzentos quarenta quatro euros vinte cinco euros) que  segundo a Requerente correspondem a “bens resultantes da remodelação da sua loja” que serviram ao desreconhecimento de uma extensa lista de ativos fixos tangíveis cujo valor de aquisição totaliza €2.487.329,17 (dois milhões quatrocentos oitenta sete mil trezentos vinte nove euros dezassete cêntimos), apenas referem no seu descritivo «recolha de sucata dia 06-06-2017 (sucata de aço)»; «recolha efetuada em 05/2017 (papel e cartão, sucata de ferro e paletes»; «recolha de sucata dia 21/7 (sucata de ferro)»; «recolhas efetuadas em 09/2017 (papel, cartão e sucata de ferro)», não existindo a possibilidade de comprovação pela Requerente e de verificação pela AT, do concreto destino dos bens do ativo fixo tangível, uma vez que foram desreconhecidos do balanço e que estão na origem da correção controvertida.
  5. Defende que aparentemente e face ao alegado pela Requerente que aqueles bens do ativo fixo tangível cujo valor de aquisição totaliza €2.487.329,17 (dois milhões quatrocentos oitenta sete mil trezentos vinte nove euros dezassete cêntimos), foram objeto de desmantelamento, demolição, inutilização para venda às empresas supra (ponto 4) especializadas na recolha e reciclagem de resíduos, sob as mais diversas formas, sucata de aço, sucata de ferro, papel, cartão, paletes, pelo valor total de €7.244,25 (sete mil duzentos quarenta quatro euros vinte cinco euros) (G..., Lda e H..., Lda).
  6. Defende que o desmantelamento  e inutilização destes bens do ativo fixo tangível está sujeito ao cumprimento dos procedimentos previstos no n.º3 do artigo 31.º- B do CIRC, na falta dos quais, o que ocorreu nos presentes autos, implica que a perda apurada no desreconhecimento dos ativos fixos tangíveis não possa ser dedutível fiscalmente e que por isso não existe qualquer ilegalidade na correção efetuada, não havendo por isso qualquer erro de qualificação e excesso de quantificação, conforme defendido pela Requerente.
  7. Também é alegado o vício de falta de fundamentação imputado à liquidação adicional de IRC ora controvertida. Ora, a Requerida nos considerandos 16 a 32 da Resposta através de disposições legais, doutrina e jurisprudência, não concorda que tenha havido falta de fundamentação do ato liquidado, bem pelo contrário.
  8. A Requerente defende a dedutibilidade fiscal das perdas apuradas no desreconhecimento dos ativos fixos tangíveis ao abrigo da alínea l) do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC.
  9. Refere que as mais-valias e as menos-valias contabilísticas não relevam para efeitos fiscais dando sempre origem a correções no apuramento do lucro tributável. Para efeitos fiscais deve-se ter em conta as mais-valias e menos-valias fiscais previstas no artigo 46.º do CIRC. Ora, no caso em apreço não se está perante uma situação de mais-valias e menos-valias fiscais, previstas no artigo 46.º do CIRC, mas sim, de perdas na sequência de inutilização, desmantelamento, destruição, demolição de ativos fixos tangíveis prevista no n.º 3 do artigo 31.º - B do CIRC.
  10. Conclui que, no caso controvertido, a operação de desreconhecimento de uma extensa lista de ativos fixos tangíveis suportado por faturas emitidas pela Requerente que referem resíduos, não originaram uma diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias fiscais no montante de €183.741,36 (cento oitenta três mil setecentos quarenta um euros trinta seis cêntimos) nem uma mais-valia contabilística no montante de €7.244,25 (sete mil duzentos quarenta quatro euros vinte cinco cêntimos). A perda resultante do dereconhecimento dos ativos fixos tangíveis resultante de abate, para ser dedutível fiscalmente, deveria ter cumprido os procedimentos previstos no n.º 3 do artigo 31.º- B do CIRC, o que não aconteceu no caso controvertido.

 

3.2.A questão que é objeto do processo  

 

A questão principal que se discute no presente processo arbitral é saber se para efeitos de apuramento do lucro tributável da Requerente relativo a 2017, tendo em conta a factualidade descrita, o desreconhecimento de uma extensa lista de ativos fixos tangíveis tendo como suporte faturas que referem resíduos (sucata de aço, sucata de ferro, papel, cartão e paletes) se encontra abrangido pelo regime fiscal previsto no artigo 46.º e seguintes do CIRC dando origem a um saldo negativo de mais-valias fiscais e menos-valias fiscais porque estamos perante uma compra e venda de ativos fixos tangíveis ou se estamos em presença de abate de ativos contemplados no artigo 31.º - B do CIRC, em que da perda resultante do desreconhecimento dos ativos fixos tangíveis para ser dedutível fiscalmente, a Requerente tem que cumprir com os procedimentos previstos no n.º3 do artigo 31.º- B do CIRC?

 

3.3.Apreciação da questão colocada a título principal

 

 No caso controvertido, conforme ficou provado na alínea M) do ponto 2.1 Factos provados, conforme é referido no R&C 2017 ”Resultado do andamento do projeto de renovação/remodelação do Centro Comercial, de valor estimado de 2.250.000 mil euros, com conclusão prevista para o primeiro semestre de 2018, foram já realizados investimentos no valor de 1.218.058 mil euros. Em 2017, os investimentos realizados, estão relacionados com a renovação profunda da área de vendas do hipermercado, com a substituição de equipamentos cuja aquisição remonta à abertura da loja em 1997, nomeadamente sistema de frio, arcas, linha de caixa, balcões de atendimento e áreas técnicas de laboratório, no sentido de renovar a imagem da loja e proporcionar melhores condições aos clientes.(…)” , a Requerente teve que em 2017 efetuar profundas remodelações no seu hipermercado com vista à sua modernização para melhorar o serviço aos seus clientes o que significou substituição de equipamentos e demolições a nível do hipermercado, conforme é referido nos considerandos 25 e 26 do PPA.

Não há dúvida que a remodelação levada a cabo em 2017, do ponto de vista contabilístico levou a um desreconhecimento de ativos, principalmente, de ativos fixos tangíveis, o que não oferece dúvidas. A questão a que tem de se dar resposta, é se o desreconhecimento dos ativos contabilísticos, no caso controvertido, de ativos fixos tangíveis, para efeitos fiscais está abrangido pelos artigos 46.º e seguintes do CIRC ou pelo artigo 31.º-B do CIRC?

Para se responder à questão acima levantada não se pode deixar de ter em conta todo o material probatório carreado para os autos.

Ora vejamos

Verifica-se que existiram faturas emitidas pela Requerente, conforme alínea G  do ponto 2.1 Factos provados, com a descrição aí referida sob a designação genérica de “resíduos” que podem assumir diversas formas, isto é, sucata de aço, sucata de ferro, papel e cartão e que estão na origem do reconhecimento de uma mais-valia contabilística no montante de €7.244,25 (sete mil duzentos quarenta quatro euros vinte cinco euros), e de uma diferença negativa de mais-valias e menos-valias fiscais no montante de €183.741,36 (cento oitenta três mil setecentos quarenta um euros trinta seis cêntimos)  constituem o objeto do PPA. Por outro lado, como ficou provado, a Requerente apresenta o mapa oficial modelo 31 em que no mesmo declara a diferença negativa de mais-valias e menos-valias fiscais de €183.741,36 (cento oitenta três mil setecentos quarenta um euros e trinta seis cêntimos) e uma mais-valia contabilística total de €10.124,20 (dez mil cento vinte quatro euros e vinte cêntimos), montante no qual existe uma parcela de €7.244,25 (sete mil duzentos quarenta quatro euros vinte cinco euros) resultante da transmissão de ativos fixos tangíveis.

A questão que se levanta é de saber se as faturas mencionadas na alínea G do ponto 2.1 Factos provados correspondem aos ativos fixos tangíveis identificados no modelo 31 constante da alínea H do ponto 2.1 Factos provados. De acordo com o material carreado para os autos, a resposta é negativa. De facto, de acordo com o material probatório existente, a partir das faturas referidas na alínea G do ponto 2.1 Factos provados não se conseguem identificar quais os bens (ativos fixos tangíveis) que foram objeto de venda para sucata. Foram os identificados no modelo 31 referente ao apuramento de mais-valias e menos-valias fiscais? Não se sabe nem ficou provado, cf. ponto 2.2 Factos não provados.

Conforme alínea J do ponto 2.1 Factos provados, ficou provado que a Requerente recebeu uma declaração da sociedade G... a declarar que os bens elencados nas faturas que titulam a transmissão de bens para a sociedade G... foram retirados das instalações da Requerente, transportados para as instalações da G... e contabilizados como inventários com a natureza de mercadorias. Ora, assim sendo, a Requerente poderia ter obtido uma listagem da G...  com a descrição dos bens, respetivos valores e quantidades para se poder cruzar com a informação constante no modelo 31 apresentado pela Requerente. Repare-se que se as faturas referidas no ponto G do ponto 2.1 Factos provados tivessem a descrição apresentada e na mesma houvesse uma remissão para uma listagem, no limite, o modelo 31, aí já se sabia que os bens constantes da listagem “modelo 31” foram os bens vendidos pela Requerente sob a designação de resíduos que assumiram a forma de sucata (papel e aço), papel, cartão e paletes, mas, na realidade não foi isso que aconteceu.

Adicionalmente conforme referido acima, em 2017, a Requerente procedeu a profundas remodelações no seu hipermercado com vista à sua modernização para melhorar o serviço aos seus clientes o que significou substituição de equipamentos e demolições a nível do hipermercado, conforme é referido nos considerandos 25 e 26 do PPA. Este facto implicou o desreconhecimento desses ativos fixos tangíveis, e como não ficou provado quais desses bens foram vendidos como sucata, papel, cartão, paletes, os mesmos foram objeto de abate, não tendo cumprido o previsto no n.º3 do artigo 31.º- B do CIRC. Assim,  a perda daí resultante não pode ser considerada dedutível fiscalmente, e como tal as correções meramente aritméticas efetuadas no apuramento do lucro tributável de 2017 para efeitos de IRC, nos montantes de € €7.244,25 (sete mil duzentos quarenta quatro euros vinte cinco euros), e de €183.741,36 (cento oitenta três mil setecentos quarenta um euros trinta seis cêntimos) correspondente a uma diferença negativa de mais-valias e menos-valias fiscais, são legais e como tal, os atos administrativos referidos na alínea B  do ponto 2.1 Factos provados não violam a lei sendo por isso legais e devendo manter-se na ordem jurídica.

Quanto aos vícios arguidos pela Requerente, os mesmos improcedem, pelas razões expostas pela Requerida nos considerandos 16 a 42 da Resposta reiterados nas suas alegações escritas apresentadas.

 

Tendo em conta o exposto acima, improcede o PPA.    

 

4.Decisão 

 

Nestes termos este Tribunal decide:

  1. Julgar totalmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral, e, absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira do respetivo pedido.
  2. Condenar a Requerente nas custas do processo

 

 

 

5.Valor do processo

 

O Requerente indicou como valor da causa o montante de € 41.992,75 (quarenta um mil novecentos noventa dois euros e setenta cinco cêntimos)

O valor indicado pelo Requerente não foi impugnado e não considera o Tribunal existir fundamento para o alterar, pelo que, de harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e ainda 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se à presente causa o valor de €41.992,75 (quarenta um mil novecentos noventa dois euros e setenta cinco cêntimos).

 

6.Custas

             Nos termos dos art.s 12.º,n.º2 e 22.º, n.º 4, do RJAT, e da Tabela I, anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em €2.142,00 (dois mil cento e quarenta dois euros), a cargo da Requerente.

 

Notifique-se.

 

 Lisboa, 7 de março de 2022

 

O Árbitro Singular

 

 

 

Júlio Tormenta



[1] RIT-Relatório de Inspeção Tributária

[2] PA-Processo Administrativo

[3] Embora as faturas sejam emitidas pela B..., do ponto de vista jurídico-tributário em sede de IRC, deverão considerar-se na esfera da Requerente (A...) no ano de 2017, em virtude da existência de uma fusão retroativa do ponto de vista fiscal cujos efeitos retroagem a 1/1/2017, conforme projeto de fusão e respetivo registo na Conservatória Comercial foi efetuada em 21/7/2017, cf. a previsão legal dos n.ºs 11 e 12 do artigo 8.º do CIRC.

[4] Existe uma diferença de 1(um) cêntimo, a nível do saldo entre Mais-Valias e Menos-Valias contabilísticas e Valor de Realização, entre o Modelo 31 da Requerente que consta dos autos: €10.124,20 e o valor controvertido: € 10.124,19 relativo às duas naturezas referidas, saldo de Mais-Valias e Menos-Valias contabilísticas. O Tribunal considera irrelevante esta diferença de 1(um) cêntimo para a decisão a tomar adotando como valor de referência o de €10.124,19.