Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 422/2021-T
Data da decisão: 2022-02-28  ISV  
Valor do pedido: € 13.910,08
Tema: ISV – Admissão de veículo automóvel usado de outro Estado Membro da EU – Incidência sobre a componente ambiental
*Decisão arbitral anulada no segmento recorrido por acórdão do STA de 29 de setembro de 2022, recurso n.º 51/22.4BALSB que decide em substituição.
Versão em PDF

 

SUMÁRIO:

A actual legislação portuguesa vertida no artigo 11º do Código de Imposto sobre Veículos não está em conformidade com o direito comunitário, designadamente, com o disposto no artigo nº 110° do Tratado de Funcionamento da União Europeia (aplicável por força do artigo 8°, nº 4 da Constituição da República), ao não considerar aplicável a redução de ISV à componente ambiental, permitindo que o imposto calculado ultrapasse o montante de ISV contido no valor residual de veículos usados similares nacionais.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

1 – RELATÓRIO

A. - PARTES

A..., LDA., a seguir designada por Requerente, com o NIPC...,  e sede na ..., nº ..., ...-...,  ..., veio requerer em 7 de Julho de 2021 a constituição do tribunal arbitral singular em matéria tributária, ao abrigo do prescrito no art. 2°, nº 1, alínea a) do Decreto - Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico de Arbitragem Tributária - RJAT) e nos arts. 1°, alínea a) e 2° da Portaria nº 112 - A/2011, de 22 de Março, com a finalidade de ser dirimido o litígio que a opõe à Autoridade Tributária e Aduaneira, que doravante será designada por Requerida, tendo junto documentos em 09/07/2021.

 

B. - CONSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Requerente e à Requerida Autoridade Tributária e Aduaneira em 08/07/2021, Requerida esta que designou juristas para a representar por despacho comunicado em 22/07/2021, tendo o Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designado o signatário como árbitro do Tribunal Arbitral Singular, ao abrigo do disposto no art. 6°, nº 1, do RJAT, em 23/08/2021, encargo este que foi aceite, nos termos legalmente estabelecidos.

 Em 23/08/2021, as Partes foram notificadas dessa designação, nos termos das disposições combinadas do art. 11°, nº 1, alínea b) do RJAT e dos artigos 6° e 7° do Código Deontológico, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro.

 Nestas circunstâncias, o Tribunal foi constituído em 10/09/2021, nos termos do preceituado na alínea c), do nº 1, do art. 11° do Decreto-Lei nº 10/2011, o que foi notificado às Partes nessa data.

C. – PRETENSÃO

A Requerente pretende que o Tribunal Arbitral proceda à anulação parcial de 43 liquidações de ISV, que identifica, no valor total de 13.910,08 euros, nos termos descritos no Pedido de Pronúncia Arbitral, e, em consequência,

Determine a restituição daquela quantia, que resultou de indevidas liquidações e foi paga pela Requerente, acrescida de juros indemnizatórios, calculados à taxa legal em vigor à data do pagamento, desde a data de pagamento até à sua efectiva restituição.

 D. - TRAMITAÇÃO DO PROCESSO

Após a comunicação da data da constituição do Tribunal Arbitral, em 10/09/2021, seguiram-se:

- Em 10/09/2021 - Foi notificada a Requerida para, nos termos dos nºs 1 e 2 do 17º do RJAT, apresentar Resposta no prazo de 30 dias e, querendo, solicitar produção de prova adicional e juntar o processo administrativo.

- Em 24/01/2022 – A Requerida juntou o processo administrativo.

- Em 28/01/2022 – A Requerente apresentou um requerimento a declarar nada ter a opor quanto à correcção das liquidações de ISV e ao reembolso com fundamento no art. 78º da LGT, ao qual a Requerida, que foi notificada, não respondeu.

- Em 09/02/2022 - O Tribunal exarou um despacho arbitral, que foi notificado às Partes, do seguinte teor:

 - Verificando-se que a Requerida, notificada para os efeitos do art. 17º do RJAT, não deu resposta, limitando-se a juntar o processo administrativo, e que não se pronunciou sobre a requerimento do SP de 28/01/2022 e, não se justificando a reunião a que alude o art. 18º do RJAT, seguem os autos para decisão arbitral, a qual será proferida previsivelmente no dia 28 de Fevereiro de 2022, devendo, até lá, mostrar-se paga a taxa de arbitragem subsequente.

- Em 28/02/2022 - Prolação da decisão arbitral.

 

E. - PRETENSÃO DA REQUERENTE E SEUS FUNDAMENTOS

A fundamentar o Pedido de Pronúncia Arbitral, a Requerente alegou, em síntese, o seguinte:

 

- A Requerente é uma sociedade comercial que se dedica à comercialização de veículos automóveis usados.

 

- No decurso da sua atividade profissional introduziu em Portugal, 43 veículos automóveis de passageiros, usados, cujas marcas, modelos, países de origem, números de matrícula e identificação dos DAVs, datas em que foram matriculados pela primeira vez nos seus países de origem, número de quilómetros percorridos antes da entrada em território nacional se encontram transcritos adiante, nos nº 2, 3 e 4 dos Factos Provados.

 

- No cumprimento das suas obrigações legais, designadamente tributárias, foi notificada a Requerente das liquidações, respetivamente, nº 2017/..., 2017/...; 2017/...; 2017/...; 2017/...; 2017/...; 2017/...; 2017/...; 2017/...; 2017/...; 2017/...; 2017/...; 2017/11/09; 2017/...; 2018/...; 2017/...; 2018/...; 2018/...; 2018/...; 2018/...; 2018/...; 2019/...; 2019/...; 2019/...; 2019/...; 2019/...; 2019/...; 2019/...; 2019/...; 2019/...; 2019/...; 2020/...; 2019/...; 2019/...; 2020/...; 2019/...; 2020/...; 2020/...; 2020/...; 2020/...; 2020/...; 2020/... e 2020/..., relativo aos montantes de ISV liquidados pela Alfândega de Braga.

 

- Os seus valores totais, discriminação por veículo, parte relativa à componente cilindrada e parte relativa à componente ambiental estão transcritos adiante nos nºs. 6, 7 e 8  dos Factos Provados.

 

- A redução na componente cilindrada resulta do número de anos do veículo, de acordo com as percentagens de redução constantes da tabela D previstas no nº 1 do art.. 11º CISV aplicável aos veículos usados.

 

- Aos montantes respeitantes à parte do ISV incidente sobre a componente ambiental nos 43 veículos, não foi aplicada qualquer percentagem de redução.

 

- A Requerente procedeu ao pagamento dos impostos liquidados, sem o que não poderia legalizar os veículos para poderem circular em Portugal,

 

- Considera que as referidas  liquidações efetuadas do ISV estão feridas de um vício de ilegalidade, no que diz respeito ao cálculo da componente ambiental, por não ter sido considerada qualquer percentagem de redução do imposto relativamente à antiguidade do veículo relativamente à componente ambiental, por violação ao art. 110º TFUE.

 

Isto porque a norma jurídica que esteve na base daquela liquidação – o art. 11º do CISV – viola o art. 110º TFUE, conforme foi já declarado por acórdão transitado em julgado do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE)

 

- Efetivamente, o imposto sobre veículos, criado em 2007, através da Lei 22-A/2007, tem por incidência, entre outros factos tributários, a admissão de veículos tributáveis, por oposição aos veículos que pelas suas características são isentos, em território nacional provenientes de outro Estado-Membro da União Europeia.

 

- O cálculo do ISV incide sobre a cilindrada dos veículos e as suas emissões de CO2, ou seja, a componente cilindrada e a componente ambiental.

 

- De acordo com a redação inicial do art. 11º do CISV, no caso de admissão de veículos usados, aplicava-se no cálculo do imposto uma percentagem de redução conforme o número de anos do veículo, equiparável à desvalorização comercial média dos veículos usados comercializados no mercado nacional

 

- Essa desvalorização era crescente, tendo o seu início após o primeiro ano de uso e o seu termo no final do quinto anos de uso, sendo que, após o quinto ano de uso, a percentagem de redução se mantinha inalterada.

 

- O legislador nacional considerou, à data da criação do ISV, que os veículos usados admitidos em Portugal, provenientes de outros Estados-Membros, apenas se desvalorizavam, relativamente aos veículos novos, após um ano de uso e que a partir do quinto ano não sofriam mais nenhuma desvalorização.

 

- Efetivamente, a Tabela D do art. 11º do CISV, na sua redação inicial previa para os veículos com 1 a 2 anos, uma desvalorização de 20%; de mais de 2 a 3 anos -28%; mais de 3 a 4 anos – 35%; mais de 4 a 5 anos – 43% e mais de 5 anos – 52%.

 

- Desde a entrada em vigor deste art. 11º e da tabela anexa, que os importadores de automóveis usados admitidos em Portugal originários de outro Estado-membro, reclamaram junto das entidades competentes pelo facto desta tabela de reduções discriminar negativamente os veículos admitidos em Portugal vindos do estrangeiro relativamente aos veículos usados transacionados em Portugal.

 

- É sabido que qualquer veículo novo, independentemente das suas características, designadamente marca, modelo e cilindrada, se desvaloriza logo que é posto em circulação.

 

- Pelo que, considerar-se um veículo proveniente de um Estado-Membro só sofria uma desvalorização ao fim de um ano de uso, não respeitava a realidade do mercado automóvel e penalizava injustificadamente os veículos usados importados.

 

- O mesmo se diga, relativamente aos veículos com mais de cinco anos de uso, pois é sabido que um veículo com mais de cinco anos continua a desvalorizar-se nos anos seguintes.

 

- Sendo que a desvalorização de um veículo com 6, 7 ou 10 anos de uso, é necessariamente superior à de um veículo com 5 anos.

 

- Acresce ainda que na redação inicial do art. 11º, esta redução apenas se aplicava à componente cilindrada dos veículos e não à componente ambiental (CO2), provocando, também por este motivo; um critério desigual no cálculo do ISV relativamente a veículos usados matriculados em Portugal e aos veículos admitidos em Portugal, matriculados noutros Estados-Membros.

 

- Já que, relativamente aos veículos originariamente matriculados em Portugal, a desvalorização incidia sobre as duas componentes

 

- Perante esta opção do legislador, os importadores desses veículos, à data representados pela Associação Portuguesa de Importações de Veículos, reagiram junto de várias instâncias públicas, designadamente a Provedoria de Justiça e a Comissão Europeia, no sentido de serem eliminados os tratamentos desiguais e discriminatórios dados aos veículos usados admitidos em Portugal, relativamente aos veículos usados matriculados e comercializados em Portugal.

 

- E determinavam que um veículo usado proveniente de outro Estado-Membro pagasse mais ISV relativamente aos veículos idênticos matriculados em Portugal.

 

- O que se traduzia numa violação clara do disposto no art. 110º do TFUE.

 

- Fruto destas reclamações, a Comissão Europeias instaurou o processo por infração em 2009 contra a República Portuguesa, com base no facto de não se tida em conta a depreciação dos veículos para efeitos do cálculo da componente ambiental do ISV.

 

- Esse processo foi encerrado após uma alteração ao Código do ISV, introduzida pela Lei nº 55-A/2010, de 31-12, que aprovou o Orçamento do Estado para 2011.

 

- Refere, de seguida, o historial legislativo e jurisprudencial da questão relativa à aplicação à componente ambiental das deduções aplicadas à componente cilindrada, resultantes do número de anos de uso dos veículos objecto das liquidações.

 

- Concluindo que a norma actualmente em vigor, que foi aplicada nas liquidações do ISV sob a presente impugnação, está ferida de ilegalidade, por contrariar o art. 110º do TFUE.

 

- Diz, ainda, se subsistirem dúvidas sobre a interpretação e aplicação do disposto no art. 110º TFUE, deve este Tribunal Arbitral proceder ao reenvio prejudicial desta questão ao Tribunal de Justiça para a interpretação da mesma à luz do Tratado.

 

- A Requerente, refere que, em 01/01/2021, requereu junto da Alfandega de Braga, ao abrigo do disposto no art. 78º da LGT, a revisão oficiosa da liquidação do referido imposto liquidado referente aos 43 veículos acima identificados, dando origem ao processo de Revisão Oficiosa, a que foi atribuído o nº ...2021..., tendo sido notificado para audição prévia no dia 08/04/2021, tendo o Requerente apresentado a sua audição prévia.

 

- Tal pedido de revisão foi indeferido, por despacho proferido pelo Diretor da Alfandega de Braga, notificado à impugnante em 21/04/2021.

 

- Conforme é pacífico na jurisprudência (cfr. Acs. do STA de 11/05/2005, proc. 0319/05, de 17/05/2006; proc. nº 016/06 de 10/07/2013, publicado em 26/05/2014; proc. 390/13-30), a revisão do ato tributário, previsto no referido art. 78º da LGT, pode efetuar-se a pedido do contribuinte, respeitando-se assim os princípios constitucionais da legalidade, justiça, igualdade e imparcialidade (art. 266º nº 2 da Constituição da República Portuguesa)

 

- Ora, efetuado este pedido de revisão e tendo o mesmo sido indeferido, está a Requerente em tempo de, nos termos do art. 97, 99º e 102º do CPPT, impugnar esta liquidação.

 

- Verificados os cálculos do ISV temos que relativamente à componente cilindrada, o ISV foi liquidado pelo valor global, com as respetivas reduções, acima transcritas

 

Enquanto, na componente ambiental, foi liquidado por, respetivamente, 1.850,04€; 578,52€; 1.284,92€; 578,52€; 578,52€; 790,44€; 1.143,64€; 233,90€; 1.284,92€; 790,44€; 578,52€; 192,08€; 931,72€; 366,60€; 342,93€; 578,52€; 1.087,07€; 88,55€; 67,33€; 1.158,60€; 585,75€; 236,93€; 2.018,13€; 321,73€; 872,21€; 194,53€; 1.087,07€; 117,92€; 1.373,55€; 130,93€; 585,73€; 1.158,69€; 585,73€; 1.445,17€; 2.113,25€; 147,16€; 321,73€; 1.230,31€; 874,33€; 173,33€; 132,72€; 1.460,94€ e 173,54€, sem qualquer redução.

 

- Quando deveria ter sido também aplicada à componente ambiental as reduções, que totalizam o valor de 13.910,08€, baixando dessa forma o valor relativo a esta componente ambiental para o valor global, dos 43 veículos, de 17.936,97€, e o respetivo ISV global para o valor de 75.008,86€.

 

- Devendo ser restituído à Requerente o montante global, referente aos 43 veículos, de 13.910,08€ pago a mais, acrescido de juros indemnizatórios devidos, nos termos do art. 43º da LGT.

 

- No que diz respeito ao pagamento de juros indemnizatórios, de acordo com o disposto no nº 5, do artigo 24.º do RJAT “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”, daqui resultando que uma decisão arbitral não se limita, apenas, à apreciação da legalidade do ato tributário.

 

- De igual modo, de acordo com o disposto no artigo 24º, nº 1, alínea b) do RJAT, deverá ser entendido que o pedido de juros indemnizatórios é uma pretensão relativa a atos tributários (v.g. de liquidação), que visa explicitar/concretizar o conteúdo do dever de “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”.

 

- Como refere Jorge Lopes de Sousa “insere-se nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD a fixação dos efeitos da decisão arbitral que podem ser definidos em processo de impugnação judicial, designadamente, a anulação dos atos cuja declaração de ilegalidade é pedida, a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento de juros indemnizatórios (…)”.

 

- Assim, nos processos arbitrais tributários pode haver lugar ao pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do disposto nos artigos 43º, nºs 1 e 2, e 100º da LGT, quando se determine que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

 

- Nestes termos, o direito a juros indemnizatórios dependerá sempre da verificação de um erro imputável aos serviços da Autoridade Tributária, do qual tenha resultado um pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

 

- Na sequência da ilegalidade parcial do ato de liquidação de ISV, e nos termos do disposto na alínea b), do nº 1, do artigo 24º do RJAT (em conformidade com o que aí se estabelece), “a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”.

 

- Pelo que terá de haver lugar ao reembolso parcial do montante pago pelo Requerente, relativo ao ISV, na parte em que a liquidação se deve considerar anulada, como forma de se alcançar a reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade.

 

- Assim, face ao estabelecido no artigo 61º do CPPT, estando preenchidos os requisitos do direito a juros indemnizatórios, o Requerente terá direito a juros indemnizatórios, à taxa legal, calculados sobre a quantia de ISV paga indevidamente, os quais serão contados de acordo com o disposto no nº 3 do artigo 61º do CPPT, ou seja, desde a data do pagamento do imposto indevido até à data da emissão da respetiva nota de crédito.

 

- Conclui, pedindo que o PPA seja julgado provado e procedente e em consequência:

a) – ser anulada parcialmente a liquidação de ISV de forma a aplicar-se a redução prevista no art. 11º  do CISV à componente ambiental;

b) - ser a liquidação de ISV retificada, devendo ser a Autoridade Tributária condenada a restituir o montante de €13.910,08€ cobrado em excesso;

c) – serem pagos os juros indemnizatórios à taxa legal em vigor à data do pagamento, desde a data do pagamento do imposto até à efetiva restituição;

d) – ser a Requerida condenada no pagamento de custas.

 

F- A Requerida não apresentou Resposta 

G. - QUESTÕES A DECIDIR

Face às posições assumidas pelas Partes conforme os argumentos apresentados, são as seguintes questões que cabe apreciar e decidir:

       1 -Questão Principal - Saber se a liquidação do Imposto Sobre Veículos realizada, nos termos do art. 11º do respectivo Código, sem que seja tido em conta, no cálculo do imposto, qualquer dedução relativa à componente ambiental, padece, ou não, de ilegalidade determinante da sua anulação.

      2 - Juros indemnizatórios - Existência, ou não, do direito a juros indemnizatórios, ao abrigo do art. 4º da LGT, no caso de ser parcialmente anulada a liquidação e determinado o reembolso da importância peticionada, que teria sido indevidamente paga, e a partir de que momento.

       3 - Em qualquer caso, responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais.

 

H. - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS

O Tribunal Arbitral está regularmente constituído e é material competente, de acordo com o disposto na alínea a), do nº 1, do art. 2º do RJAT (Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro).

 As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se regularmente representadas, nos termos dos arts. 4º e 10º, nº 2 do RJAT e art. 1º da Portaria nº 112/2011, de 22 de Março

  O processo não enferma de vícios que afectem a sua validade.

 

I. - MATÉRIA DE FACTO

 

I. 1 - FACTOS PROVADOS

 Com relevância para a apreciação das questões suscitadas, o Tribunal dá como provados os seguintes factos:

1 - A Requerente é uma sociedade comercial que se dedica à comercialização de veículos automóveis usados.

 

2 - No decurso da sua atividade profissional introduziu em Portugal, os seguintes veículos automóveis de passageiros, usados, provenientes de outros Estados Membros da EU:

- Marca ..., modelo ..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2017/...;

- Marca..., modelo..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., 2017/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., 2017/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula..., DAV nº 2017/...;

- Marca ..., modelo..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2017/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2017/...;

- Marca ..., modelo..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2017/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Espanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., 2017/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na França, a quem foi atribuída a matrícula ..., 2017/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na França, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2017/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Bélgica, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2017/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2017/...;

- Marca..., modelo ..., com origem na Bélgica, a quem foi atribuída a matrícula..., DAV nº 2017/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2017/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na França, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2017/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2017/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2018/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na França, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2018/...;

- Marca..., modelo ..., com origem na França, a quem foi atribuída a matrícula..., DAV nº 2018/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na França, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2018/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2018/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Espanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2018/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2018/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Bélgica, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2018/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Bélgica, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2018/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2019/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Bélgica, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2019/...;

- Marca..., modelo ... com origem na Bélgica, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2019/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2019/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na França, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2019/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2019/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na França, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2019/...;

- Marca ..., modelo..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2019/...;

- Marca ..., modelo..., com origem na Bélgica, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2019/...;

- Marca ..., modelo..., com origem na França, a quem foi atribuída a matrícula..., DAV nº 2019/...;

- Marca ..., Modelo ..., com origem na França, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2019/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Espanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2019/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na França, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2019/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula..., DAV nº 2020/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2020/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem nos Países Baixos, a quem foi atribuída a matrícula..., DAV nº 2020/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2020/...;

- Marca..., modelo..., com origem na Alemanha, a quem foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2020/...;

- Marca ..., modelo ..., com origem em Espanha, a que foi atribuída a matrícula ..., DAV nº 2020/...;

 

3 - Os referidos veículos tinham sido matriculados pela primeira vez nos seus países de origem, em: 2013/10/31; 2012/07/31; 2014/01/16; 2013/01/24; 2012/06/28; 2013/04/02; 2012/08/02; 2015/06/30; 2013/08/29; 2013/02/06; 2013/08/09; 2014/04/09; 2014/12/08; 2015/04/15; 2014/01/31; 2012/05/24; 2014/11/19; 2012/09/28; 2014/09/05; 2012/06/13; 2014/05/01; 2014/07/30; 2015/12/08; 2013/01/04; 2016/06/24; 2015/05/05; 2014/05/20; 2015/05/18; 2014/12/19; 2014/05/05; 2014/05/22; 2016/11/14; 2014/04/25; 2015/08/21; 2014/09/30; 2014/12/29; 2014/11/28; 2015/02/03; 2015/06/05; 2012/11/22; 2014/03/06; 2012/05/23 e 2015/09/25 respetivamente.

 

4 - E tinham, antes da sua entrada em território nacional, percorrido, respetivamente, 81809; 32449; 67290; 59467; 106375; 51242; 100290; 51269; 49540; 124160; 61168; 66939; 93959; 44073; 69134; 84802; 31585; 98399; 103922; 152400; 150328; 112540; 142758; 119633; 138134; 57089; 102043; 57450; 74556; 104608; 130936; 86701; 109505; 100609; 94299; 75573; 40764; 58175; 121609; 107545; 115292; 115292 e 146671 quilómetros.

 

5 – Após o cumprimento das suas obrigações legais, designadamente tributárias, foi notificada a Requerente das liquidações, respetivamente, nº 2017/...; 2017/...; 2017/...; 2017/...; 2017/...; 2017/...; 2017...; 2017/...; 2017/...; 2017/...; 2017/...; 2017/...; 2017...; 2017/...; 2018/...; 2017/...; 2018/...; 2018/...; 2018/...; 2018/...; 2018/...; 2019/...; 2019/...; 2019/...; 2019/...; 2019/...; 2019/...; 2019/...; 2019/...; 2019/...; 2019/...; 2020/...; 2019/...; 2019/...; 2020/...; 2019/...; 2020/...; 2020/...; 2020/...; 2020/...; 2020/...; 2020/... e 2020/...,  relativo aos montantes de ISV liquidados pela Alfândega de Braga

 

6 – A Requerida efectuou o cálculo do ISV com recurso à aplicação da tabela referente aos veículos ligeiros de passageiros (Tabela A) pelo valor total de, respetivamente:

- pelo veículo ..., liquidado em 3/3/2017 no valor de 5.211,45€;

- pelo veículo..., liquidado em 22/3/2017 no valor de 1.975,29€;

- pelo veículo..., liquidado em 22/3/2017 no valor de 2.434,27€;

- pelo veículo..., liquidado em 21/4/2017 no valor de 1.975,29€;

- pelo veículo..., liquidado em 17/5/2017 no valor de 1.975,29€;

- pelo veículo..., liquidado em 4/7/2017 no valor de 1.993,25€;

- pelo veículo..., liquidado em 4/8/2017 no valor de  2.205,17€;

- pelo veículo..., liquidado em 16/8/2017 no valor de 1.506,02€;

- pelo veículo..., liquidado em 2/8/2017 no valor de 2.433,37€;

- pelo veículo..., liquidado em 4/8/2017 no valor de 1.993,25€;

- pelo veículo..., liquidado em 26/9/2017 no valor de 1.867,20€;

- pelo veículo..., liquidado em 6/12/2017 no valor de 1.784,89€;

- pelo veículo..., liquidado em 9/11/2017 no valor de 2.477,75€;

- pelo veículo..., liquidado em 22/11/2017 no valor de 1.994,41€;

- pelo veículo..., liquidado em 20/3/2018 no valor de 1.364,75€;

- pelo veículo..., liquidado em 6/12/2017 no valor de 1.754,75€;

- pelo veículo..., liquidado em 9/1/2018 no valor de 4.495,40€;

- pelo veículo..., liquidado em 1/2/2018 no valor de 949,01€;

- pelo veículo..., liquidado em 23/2/2018 no valor de 1.232,56€;

- pelo veículo..., liquidado em 2/8/2018 no valor de 1.776,37€;

- pelo veículo..., liquidado em 4/7/2018 no valor de 2.002,68€;

- pelo veículo..., liquidado em 11/2/2019 no valor de 1.258,75€;

- pelo veículo..., liquidado em 18/1/2019 no valor de 4.939,68€;

- pelo veículo..., liquidado em 22/1/2019 no valor de 1.239,17€;

- pelo veículo..., liquidado em 7/3/2019 no valor de 2.162,93€;

- pelo veículo..., liquidado em 7/3/2019 no valor de 1.685,37€;

- pelo veículo..., liquidado em 3/4/2019 no valor de 4.075,91€;

- pelo veículo..., liquidado em 22/8/2019 no valor de 949,38€;

- pelo veículo..., liquidado em 12/8/2019 no valor de 3.857,66€;

- pelo veículo..., liquidado em 31/5/2019 no valor de 1.324,15€;

- pelo veículo..., liquidado em 13/9/2019 no valor de 1.686,66€;

- pelo veículo..., liquidado em 26/2/2020 no valor de 2.774,51€;

- pelo veículo..., liquidado em 30/9/2019 no valor de 1.446,21€;

- pelo veículo..., liquidado em 18/10/2019 no valor de 2.862,12€;

- pelo veículo..., liquidado em 03/2/2020 no valor de 4.279,71€;

- pelo veículo..., liquidado em 30/10/2019 no valor de 216,43€;

- pelo veículo..., liquidado em 27/01/2020 no valor de 1.182,21€;

- pelo veículo..., liquidado em 05/03/2020 no valor de 2.090,79€;

- pelo veículo..., liquidado em 31/7/2020 no valor de 1.740,77€;

- pelo veículo..., liquidado em 03/2/2020 no valor de 689,19€;

- pelo veículo..., liquidado em 29/6/2020 no valor de 720,64€;

- pelo veículo..., liquidado em 29/6/2020 no valor de 2.211,25€;

- pelo veículo...,  liquidado em 27/10/2020 o ISV no valor de 1.281,38€;

 

7 - Do valor total do imposto, respetivamente:

- 5.170.02€ são relativos à componente cilindrada e 1.850,04€ são relativos à componente ambiental;

- 2.450,47€ são relativos à componente cilindrada e 578.52€ são relativos à componente ambiental;

- 1.766,84€ são relativos à componente cilindrada e 1.284,92€ são relativos à componente ambiental;

- 2.450,47€ são relativos à componente cilindrada e 578,52€ são relativos à componente ambiental;

- 2.450,47€ são relativos à componente cilindrada e 578,52€ são relativos à componente ambiental;

- 4.441,48€ são relativos à componente cilindrada e 790,44€ são relativos à componente ambiental;

- 4.441,48€ são relativos à componente cilindrada e 1.143,64€ são relativos à componente ambiental;

- 1.766,84€ são relativos à componente cilindrada e 233,90€ são relativos à componente ambiental;

- 1.766,84€ são relativos à componente cilindrada e 1.284,92€ são relativos à componente ambiental;

- 4.441,48€ são relativos à componente cilindrada e 790,44€ são relativos à componente ambiental;

- 2.260,85€ são relativos à componente cilindrada e 578,52€ são relativos à componente ambiental;

- 2.450,47€ são relativos à componente cilindrada e 192,08€ são relativos à componente ambiental;

- 4.441,48€ são relativos à componente cilindrada e 931,72€ são relativos à componente ambiental;

- 2.260,85€ são relativos à componente cilindrada e 366,60€ são relativos à componente ambiental;

- 1.792,66€ são relativos à componente cilindrada e 342,93€ são relativos à componente ambiental;

- 2.450,47€ são relativos à componente cilindrada e 578,52€ são relativos à componente ambiental;

- 5.243,58€ são relativos à componente cilindrada e 1.087,07€ são relativos à componente ambiental;

- 1.792,66€ são relativos à componente cilindrada e 88,55€ são relativos à componente ambiental;

- 1.792,66€ são relativos à componente cilindrada e 67,33€ são relativos à componente ambiental;

- 4.504,82€ são relativos à componente cilindrada e 1.158,66€ são relativos à componente ambiental;

- 2.485,88€ são relativos à componente cilindrada e 585,75€ são relativos à componente ambiental;

- 1.792,66€ são relativos à componente cilindrada e 236,93€ são relativos à componente ambiental;

- 4.494,70€ são relativos à componente cilindrada e 2.018,13€ são relativos à componente ambiental;

- 2.293,60€ são relativos à componente cilindrada e 321,73€ são relativos à componente ambiental;

- 1.792,66€ são relativos à componente cilindrada e 872,21€ são relativos à componente ambiental;

- 2.293,60€ são relativos à componente cilindrada e 194,53€ são relativos à componente ambiental;

- 5.243.58€ são relativos à componente cilindrada e 1.087,07€ são relativos à componente ambiental;

- 1.458,70€ são relativos à componente cilindrada e 117,92€ são relativos à componente ambiental;

- 4.358.08€ são relativos à componente cilindrada e 1.373,55€ são relativos à componente ambiental;

- 2.485,88€ são relativos à componente cilindrada e 130,93€ são relativos à componente ambiental;

- 2.293,60€ são relativos à componente cilindrada e 585,73€ são relativos à componente ambiental;

- 2.485,88€ são relativos à componente cilindrada e 1.158,69€ são relativos à componente ambiental;

- 1.792,66€ são relativos à componente cilindrada e 585,73€ são relativos à componente ambiental;

- 2.485,88€ são relativos à componente cilindrada e 1.445,17€ são relativos à componente ambiental;

- 4.494,70€ são relativos à componente cilindrada e 2.113,25€ são relativos à componente ambiental;

- 121,52€ são relativos à componente cilindrada e 147,16€ são relativos à componente ambiental;

- 1.792,66€ são relativos à componente cilindrada e 321,73€ são relativos à componente ambiental;

- 1.792,66€ são relativos à componente cilindrada e 1.230,31€ são relativos à componente ambiental;

- 1.805,08€ são relativos à componente cilindrada e 874,33€ são relativos à componente ambiental;

- 1.473,88€ são relativos à componente cilindrada e 173,33€ são relativos à componente ambiental;

- 1.469,80€ são relativos à componente cilindrada e 132,72€ são relativos à componente ambiental;

- 2.501,04€ são relativos à componente cilindrada e 1.460,94€ são relativos à componente ambiental;

- 2.308,00€ são relativos à componente cilindrada e 173,54€ são relativos à componente ambiental.

 

8 - No que diz respeito à componente cilindrada, respetivamente:

- o valor de 5.170,02€ foi deduzido pela quantia correspondente a 35% do seu montante, ou seja, 1.809,51€;

- o valor de 2.450,47€ foi deduzido pela quantia correspondente a 43% do seu montante, ou seja, 1.053,70€;

- o valor de 1.766,84€ foi deduzido pela quantia correspondente a 35% do seu montante, ou seja, 618,39€;

- o valor de 2.450,47€ foi deduzido pela quantia correspondente a 43% do seu montante, ou seja, 1.053,70€;

- o valor de 2.450,47€ foi deduzido pela quantia correspondente a 43% do seu montante, ou seja, 1.053,70€;

- o valor de 4.441,48€ foi deduzido pela quantia correspondente a 43% do seu montante, ou seja, 1.145,90€;

- o valor de 4.441,48€ foi deduzido pela quantia correspondente a 43% do seu montante, ou seja, 1.145,90€;

- o valor de 1.766,84€ foi deduzido pela quantia correspondente a 28% do seu montante, ou seja, 494,72€;

- o valor de 1.766,84€ foi deduzido pela quantia correspondente a 35% do seu montante, ou seja, 618,39€;

- o valor de 4.441,48€ foi deduzido pela quantia correspondente a 43% do seu montante, ou seja, 1.145,90€;

- o valor de 2.260,85€ foi deduzido pela quantia correspondente a 43% do seu montante, ou seja, 972,17€;

- o valor de 2.450,47€ foi deduzido pela quantia correspondente a 35% do seu montante, ou seja, 857,66€;

- o valor de 4.441,48€ foi deduzido pela quantia correspondente a 28% do seu montante, ou seja, 746,17€;

- o valor de 2.260,85€ foi deduzido pela quantia correspondente a 28% do seu montante, ou seja, 633,04€;

- o valor de 1.792,66€ foi deduzido pela quantia correspondente a 43% do seu montante, ou seja, 770,84€;

- o valor de 2.450,47€ foi deduzido pela quantia correspondente a 52% do seu montante, ou seja, 1.274,24€;

- o valor de 5.243,58€ foi deduzido pela quantia correspondente a 35% do seu montante, ou seja, 1.835,25€;

- o valor de 1.792,66€ foi deduzido pela quantia correspondente a 52% do seu montante, ou seja, 932,18€;

- o valor de 1.792,66€ foi deduzido pela quantia correspondente a 35% do seu montante, ou seja, 627,43€;

- o valor de 4.504,82€ foi deduzido pela quantia correspondente a 60% do seu montante, ou seja, 1.621,73€;

- o valor de 2.485,88€ foi deduzido pela quantia correspondente a 43% do seu montante, ou seja, 1.068,93€;

- o valor de 1.792,66€ foi deduzido pela quantia correspondente a 43% do seu montante, ou seja, 770,84€;

- o valor de 4.494,70€ foi deduzido pela quantia correspondente a 35% do seu montante, ou seja, 1.573,15€;

- o valor de 2.293,60€ foi deduzido pela quantia correspondente a 60% do seu montante, ou seja, 1.376€;

- o valor de 1.792,66€ foi deduzido pela quantia correspondente a 28% do seu montante, ou seja, 501,94€;

- o valor de 2.293,60€ foi deduzido pela quantia correspondente a 35% do seu montante, ou seja, 802,76€;

- o valor de 5.243,58€ foi deduzido pela quantia correspondente a 43% do seu montante, ou seja, 2.254,74€;

- o valor de 1.458,70€ foi deduzido pela quantia correspondente a 43% do seu montante, ou seja, 627,24€;

- o valor de 4.358,08€ foi deduzido pela quantia correspondente a 43% do seu montante, ou seja, 1.873,97€;

- o valor de 2.485,88€ foi deduzido pela quantia correspondente a 52% do seu montante, ou seja, 1.292,66€;

- o valor de 2.293,60€ foi deduzido pela quantia correspondente a 52% do seu montante, ou seja, 1.192,67€;

- o valor de 2.485,88€ foi deduzido pela quantia correspondente a 35% do seu montante, ou seja, 870,06€;

- o valor de 1.792,66€ foi deduzido pela quantia correspondente a 52% do seu montante, ou seja, 932,18€;

- o valor de 2.485,88€ foi deduzido pela quantia correspondente a 43% do seu montante, ou seja, 1.068,93€;

- o valor de 4.494,70€ foi deduzido pela quantia correspondente a 52% do seu montante, ou seja, 2.337,24€;

- o valor de 121,52€ foi deduzido pela quantia correspondente a 43% do seu montante, ou seja, 52,25€;

- o valor de 1.792,66€ foi deduzido pela quantia correspondente a 52% do seu montante, ou seja, 932,18€;

- o valor de 1.792,66€ foi deduzido pela quantia correspondente a 52% do seu montante, ou seja, 932,18€;

- o valor de 1.792,66€ foi deduzido pela quantia correspondente a 52% do seu montante, ou seja, 932,18€;

- o valor de 1.805,08€ foi deduzido pela quantia correspondente a 52% do seu montante, ou seja, 938,64€;

- o valor de 1.473,88€ foi deduzido pela quantia correspondente a 65% do seu montante, ou seja, 958,02€;

- o valor de 1.469,80€ foi deduzido pela quantia correspondente a 60% do seu montante, ou seja, 881,88€;

- o valor de 2.501,04€ foi deduzido pela quantia correspondente a 70% do seu montante, ou seja, 1.750,73€;

- o valor de 2.308,00€ foi deduzido pela quantia correspondente a 52% do seu montante, ou seja, 1.200,16€.

 

9 – A Requerida aplicou a redução resultante do número de anos do veículo, de acordo com as percentagens de redução constantes da tabela D prevista no nº 1 do art. 11º CISV aplicável aos veículos usados.

 

10 – A Requerida não aplicou qualquer percentagem de redução relativamente aos montantes respeitantes à parte do ISV incidente sobre a componente ambiental, representando o montante total de 13.910,08 euros

 

11 – A Requerente procedeu ao pagamento dos ISV liquidados.

 

12 – A Requerente, em 01/01/2021, requereu junto da Alfandega de Braga, ao abrigo do art. 78º da LGT, a revisão oficiosa das liquidações de ISV referentes aos 43 referidos veículos, dando origem ao processo de Reclamação Oficiosa nº ...2021..., tendo sido notificado para audição prévia, no dia 08/04/2021, e efectuada a sua apresentação.

 

13 – O pedido de Revisão Oficiosa foi indeferido por despacho notificado  à Requerente em 21/04/2021.

 

14 - Em 07/07/2021, a Requerente entregou no CAAD o pedido de pronúncia arbitral

 

I.- 2 - FUNDAMENTAÇÃO DOS FACTOS PROVADOS

            Os factos dados como provados estão baseados nos documentos indicados relativamente a cada um deles, e nos elementos factuais carreados para o processo pelas Partes, na medida em que a sua adesão à realidade não foi questionada.

 

 J. - MATÉRIA DE DIREITO

Fixada a matéria de facto, procede-se, de seguida, à sua subsunção jurídica e à determinação do Direito a aplicar, tendo em conta as questões a decidir que foram enunciadas.

A orientação arrogada pela Requerente e a sua fundamentação estão expostas, em síntese, ou com parcial transcrição, em E. do Relatório desta Decisão.

O presente pedido de pronúncia arbitral tem como fundamento a ilegalidade do art. 11º do Código do Imposto sobre Veículos, relevante na liquidação impugnada, por violar o disposto no art. 110º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

A questão em apreço consiste em saber se as liquidações de ISV relativas às viaturas identificadas nos autos padecem, ou não, de ilegalidade parcial, como pretende a Requerente, ou, ao invés, os actos de liquidação deste tributo deverão ser mantidos na sua íntegra, não enfermando de qualquer ilegalidade.

Sobre a matéria, sumariamente, entende a Requerente que o normativo em apreço, aplicável aos veículos portadores de matrículas comunitárias, de modo a contemplar no cálculo do imposto a desvalorização comercial média no mercado nacional das viaturas usadas, prevê uma redução percentual pelo número de anos de uso, considerada apenas na componente cilindrada, deixando de lado a componente ambiental, o que se vai traduzir numa tributação superior à que é aplicada aos usados similares no mercado nacionais.

 Ora, a questão em apreço já foi apreciada em diversas decisões arbitrais proferidas pelo CAAD, nomeadamente as relativas aos processos nºs. 572/2018-T, 346/2019-T, 348/2019-T, 350/2019-T, 459/2019-T, 466/2019-T, 498/2019-T, 833/2019-T, 75/2020 e aos 297/2020-T , 588/2020-T, 397/2021-T, estas três últimas proferidas pelo signatário, enquanto juiz singular, e que seguiremos, nas quais foram tomadas  decisões anulatórias com fundamento na incompatibilidade do disposto no art. 11º do CISV com a disposição do art. 110º do TFUE, segundo a qual "nenhum Estado-Membro fará incidir, direta ou indiretamente, sobre os produtos dos outros Estados-Membros imposições internas, qualquer que seja a sua natureza, superiores às que incidam, direta ou indiretamente, sobre produtos nacionais similares."

Ora, no presente caso concreto coloca-se questão análoga, conforme resulta do supra exposto, acompanhando nós a argumentação na formulação do juízo de desconformidade dos critérios adoptados com o disposto no art. 110º do TFUE, uma vez que o cálculo do imposto não leva inteiramente em linha de conta a depreciação do veículo, acabando por se verificar que a admissão de um veículo de outro Estado Membro esteja sujeita a uma carga tributária superior à que se se encontra incorporada e depreciada no valor dos veículos usados anteriormente matriculados no território nacional.

  Assim sendo, pode dizer-se que a lei portuguesa está a fazer incidir sobre este "produto" dos Estados-Membros uma imposição interna superior à que incide directa ou indirectamente, sobre os veículos usados nacionais, em clara violação do prescrito no art. 110º do TFUE.

Vejamos, então, quais as razões e fundamentos para se chegar a esta conclusão, aliás, vertidos nas decisões do CAAD que se deixaram identificadas e as quais estamos a acompanhar.

De acordo com o disposto no Código do ISV, estão sujeitos a este imposto, no seu regime regra, nomeadamente, "os veículos automóveis ligeiros de passageiros, (art. 2º, nº 1, alínea a), sendo "sujeitos passivos do imposto os operadores registados, os operadores reconhecidos e os particulares que procedam à introdução no consumo dos veículos tributáveis, considerando-se como tais as pessoas em nome de quem seja emitida a declaração aduaneira de veículos" (art. 3º, nº 1 ).

O artigo 5º do Código do ISV, diz que constitui facto gerador do imposto o fabrico, montagem, admissão ou importação dos veículos tributáveis em território nacional, que estejam obrigados à matrícula em Portugal", sendo que, para este efeito, de acordo com o nº 3 alínea a) do mesmo artigo, entende-se por admissão, a entrada de um veículo originário ou em livre prática noutro Estado-Membro da União Europeia em território nacional".

No que diz respeito à exigibilidade do imposto, de acordo com o disposto no artigo 6º, nº 1, alínea b, "o imposto torna-se exigível no momento da introdução no consumo, considerando-se esta verificada no momento da apresentação da declaração aduaneira de veículos pelos particulares", sendo que" a taxa de imposto a aplicar é a que estiver em vigor no momento em que este se torna exigível" (nº 3).

Quanto à introdução no consumo, estabelece o artigo 17º, nº 1 do referido Código que "a introdução no consumo e a liquidação do imposto são tituladas pela declaração aduaneira de veículos (DAV)", sendo que nos termos do nº 3, "para efeitos de matrícula, os veículos automóveis ligeiros ficam sujeitos ao processamento da DAV".

De acordo com o disposto no artigo 20º, nº 1 do Código do ISV, "os particulares e os sujeitos passivos que não se encontrem constituídos como operadores registados ou operadores reconhecidos estão obrigados à apresentação da DAV" nos prazos aí previstos, sendo que, nos termos do seu nº 2, se enumeram os documentos que a devem acompanhar.

 As taxas a aplicar para efeito de cálculo do ISV não incidem sobre o valor do automóvel mas têm por base os centímetros cúbicos por cilindrada (cm3) (componente cilindrada) e os gramas de C02 por quilómetro (componente ambiental), sendo que foram estruturadas em taxa normal, taxa intermediária e taxa reduzida e taxa para veículos usados, nos termos do disposto nos artigos 7º a 11º do Código do ISV.

Assim, no que diz respeito à tributação do ISV, as taxas aplicáveis têm por base tributável uma componente cilindrada e uma componente ambiental, sendo que a primeira componente prevê uma taxa a aplicar consoante a cilindrada e o tipo de veículo e a segunda componente estabelece uma discriminação positiva entre os veículos a gasolina e os veículos a gasóleo, prevendo uma tributação progressiva em função do nível de C02 g/km.

O cálculo do ISV devido por veículos usados portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados membros da União Europeia, o artigo 11º, nºs 1 e 2 do Código do ISV dispõe que "o imposto incidente sobre veículos portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados membros da União Europeia é objecto de liquidação provisória nos termos das regras do presente Código, com excepção da componente cilindrada à qual são aplicadas as percentagens de redução previstas na tabela D ao imposto resultante da tabela respectiva, as quais estão associadas à desvalorização comercial média dos veículos no mercado nacional".

Os nºs 3 e 4 do referido artigo 11º do Código do ISV referem que "sem prejuízo da liquidação provisória efectuada, sempre que o sujeito passivo entenda que o montante do imposto apurado nos termos do nº 1 excede o imposto calculado por aplicação da fórmula aí indicada, pode requerer ao director da alfândega, mediante o pagamento prévio de taxa que a mesma seja aplicada à tributação do veículo, tendo em vista a liquidação definitiva do imposto, sob pena de se presumir" que o sujeito passivo aceita como definitiva a liquidação do imposto feita por aplicação da tabela constante do nº 1 ".

Nos termos da decisão arbitral do processo nº 572/2018-T, que também acompanhámos nas nossas decisões anteriores, em sede de ISV, existe um longo percurso no que diz respeito às questões que a Comissão Europeia tem levantado ao Estado Português em matéria de legalidade das normas nacionais, nomeadamente, quanto à carga fiscal incidente sobre os veículos usados.

A legalidade foi questionada pela Comissão Europeia, ainda no âmbito do Imposto Automóvel, "porquanto esta entendia que as normas portuguesas então vigentes não observavam o disposto no artigo 95º do Tratado de Roma e, sendo necessário que Portugal perdesse o seu carácter proteccionista, era imprescindível que o montante de imposto fosse idêntico ao remanescente do imposto incorporado no preço dos veículos usados similares, comercializados no mercado português, remanescente esse a calcular a partir da percentagem da depreciação do valor desses veículos".

O Acórdão do TJCE (de 22/02/01) denominado "Gomes Valente", proferido a título prejudicial, veio criar as condições para se romper, a nível nacional, com o quadro clássico de tributação dos veículos usados, assente exclusivamente em reduções fixas em função do número de anos de uso.

"Neste âmbito (conforme se extrai daquela decisão), embora tenha sido referido que a aplicação de uma tabela de taxas para os veículos usados fundada num critério de depreciação único não seria contrário ao referido artigo 95º do Tratado de Roma, foi sublinhado que era importante que fossem tomados em conta outros factores de depreciação que não apenas a antiguidade, de forma a garantir que a referida tabela reflectisse de modo mais preciso a depreciação real dos veículos e permitisse alcançar de uma forma mais fácil o objectivo da tributação dos veículos usados, de modo a que, em nenhum caso, esta pudesse ser superior ao montante da taxa residual incorporada no valor dos veículos usados já matriculados em território nacional".

Conforme resulta daquela decisão do CAAD "esta jurisprudência veio a ser reforçada com o Acórdão do TJCE nº 101/00, proferido em 19 de Setembro de 2002 num processo que então envolveu o Governo Finlandês e Antti Sillin, no qual foi considerado que o artigo referido artigo 95º, primeiro parágrafo do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 90º, primeiro parágrafo) permitia a um EM aplicar aos veículos usados importados de outro EM um sistema de tributação em que o valor tributável é determinado por referência ao valor aduaneiro definido, mas obsta a que o valor tributável varie em função da fase de comercialização quando daí possa resultar, pelo menos, em determinados casos, que o montante do imposto que incide sobre um veículo usado importado exceda o montante do imposto residual incorporado no valor de um veículo usado similar já matriculado no território nacional".

Acrescentando que "na sequência do designado Acórdão "Gomes Valente", a jurisprudência tem entendido que para que um sistema de tributação dos veículos usados seja compatível com o disposto no Tratado é necessário que se adapte ou um modelo de tributação baseado na avaliação de cada veículo ou um modelo de tributação baseado em tabelas fixas que exclua todo e qualquer efeito discriminatório".

O actual artigo 110º do TFUE opõe-se a que um EM aplique aos veículos usados importados de outro EM um sistema de tributação em que o imposto que incide sobre esses veículos não atenda à depreciação real do veículo e não permita garantir sempre que o montante do imposto que fixa não excede o montante do imposto residual incorporado no valor de um veículo usado similar já matriculado no território nacional.

"Quando um EM aplica aos veículos usados importados de outros Estados membros um sistema de tributação em que a depreciação real dos veículos é definida de modo geral e abstracto com base em critérios determinados pelo direito nacional, o disposto no Tratado exige que esse sistema de tributação seja organizado de forma a excluir todo e qualquer efeito discriminatório", como se extrai da decisão que temos vindo a seguir.

 Em 2006, no âmbito do sistema de tributação Húngaro, no Acórdão do T JUE de 5 de Outubro de 2006 (C-290/05), no caso Nádasdi, foi analisada pela primeira vez a questão ambiental face aos impostos automóveis aplicáveis dentro do espaço da União Europeia. Refere aquela decisão que "o sistema fiscal Húngaro ignorava a desvalorização do veículo e tratava de forma igualitária todos os veículos que tivessem a mesma motorização e comportamento ambiental".

Contudo, o referido Acórdão veio declarar que "o artigo 90º, primeiro parágrafo, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a um imposto como o instituído pela lei relativa ao imposto automóvel, na medida - em que seja cobrado sobre os veículos usados quando da sua primeira colocação em circulação no território de um Estado-Membro e - em que o seu montante, exclusivamente determinado em função das características técnicas dos veículos (tipo de motor, cilindrada) e da sua classificação ambiental, seja calculado sem ter em conta a depreciação dos membros, de tal forma que, quando se aplique a veículos usados importados de outros Estados Membros, ultrapasse o montante do referido imposto contido no valor residual de veículos usados similares que já foram registados no Estado-Membro de importação.

Não é relevante proceder a uma comparação com os veículos usados postos em circulação no Estado-Membro em questão antes da introdução desse imposto", com resulta da decisão do CAAD a que aderimos. "Adicionalmente (acrescenta esta decisão), considerou-se que os Estados Membros (EM) têm liberdade para seleccionar os critérios a utilizar no cálculo do imposto e estabelecer um sistema de tributação diferenciado para certos produtos, em função de critérios objectivos aplicados, sendo que tais diferenciações só serão consideradas compatíveis com o direito da UE se, por um lado, prosseguirem objectivos compatíveis, também eles, com as exigências do Tratado e do direito derivado e, se por outro, as formas que vierem a revestir sejam molde a evitar qualquer forma de discriminação, directa ou indirecta, das "importações" provenientes dos outros EM, ou de protecção em favor de produções nacionais concorrentes".

Assim, em termos gerais, é possível concluir que "no âmbito de um regime fiscal relativo à tributação automóvel, critérios como o tipo de motor, a cilindrada e uma classificação assente em factores ambientais constituem critérios objectivos que possam ser utilizados no sistema de tributação, da sua utilização não poderá resultar discriminação e o imposto que vier a ser apurado não poderá onerar mais os produtos provenientes de outros EM do que os produtos nacionais similares, implicando que a cobrança por um EM de um imposto sobre os veículos usados provenientes de outro EM é contrária ao artigo 110º do TFUE quando o montante do imposto, calculado sem tomar em conta a depreciação real do veículo, exceda o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis usados, semelhantes, já matriculados no território nacional".

 Mais acrescentando que "em 2009, interpretando o mesmo artigo 110º do TFUE, o TJUE, no Acórdão de 19 de Março de 2009 (que opôs a Comissão Europeia à Finlândia), considerou que este artigo visa garantir a perfeita neutralidade das imposições internas no que se refere à concorrência entre produtos que já se encontrem no mercado nacional e produtos importados, de um modo que não pode, em caso algum, ter efeitos discriminatórios".

 No que a Portugal diz respeito, "nos termos do disposto no artigo 8º da Constituição da República Portuguesa (CRP), o direito internacional prevalece sobre o direito interno português e é directamente aplicável em território nacional, sem desenvolver qualquer fundamentação, fez eco uma comunicação da Comissão Europeia em que se informava que esta tinha encetado, no TJUE, um processo contra Portugal, no sentido de defender que era censurável o artigo 11º do Código do ISV não contabilizasse no cálculo do ISV incidente sobre veículos usados nenhuma desvalorização até o veículo ter mais de um ano de tempo de uso, nem é considerada nenhuma diminuição do valor real para os veículos com mais de cinco anos de utilização, processo que culminou com a prolação do Acórdão do TJUE (C-200/15), de 16/06/2016, acima já referido".

 Com efeito, em matéria de direito internacional, o artigo 8º, nº 4 da CRP estabelece que "as disposições dos tratados que regem a UE e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de Direito democrático". A Decisão Arbitral nº 577/2016-T, de 1 de Junho de 2017, refere, neste âmbito que "apesar de só os Estados-Membros terem competência em matéria de impostos directos, o Tribunal de Justiça (T J) tem sustentado, através das suas decisões, que esses Estados devem exercer essa competência em conformidade com o direito da União Europeia.

Evitando assim, violações das cinco liberdades económicas fundamentais, designadamente a livre circulação de mercadorias (artigos 28º e seguintes do TFUE).

Ora, é precisamente através da protecção de cada uma destas liberdades, directamente aplicáveis, que ocorre uma verdadeira harmonização pela via jurisprudencial que se traduz na obrigatoriedade de as legislações nacionais se conformarem a cada uma dessas liberdades.

O direito português consagra uma cláusula de recepção automática plena do direito convencional internacional, cumpridas as formalidades de aprovação, ratificação e publicação.

Daqui decorre que “os tratados são fonte imediata de direitos e obrigações para os seus destinatários podendo ser invocados perante os tribunais".

Enfatizando que "os tratados são superiores hierarquicamente relativamente à lei ordinária”.

Esta superioridade decorre não só dos artigos 26º e 27º da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, mas igualmente do artigo 8º nºs 1 e 2 da CRP.

Apresenta-se, pois, como claro que, para que a Convenção vigore na ordem interna, é necessário que a lei ordinária posterior a não possa revogar.

Ou seja, o direito internacional convencional não pode ser afastado por leis ordinárias, surgindo como superior àquelas, sejam essas leis subsequentes, as quais serão materialmente inconstitucionais se o contrariarem; sejam anteriores, as quais terão de ser suspensas se forem conflituantes com esse direito convencional internacional, só retomando a vigência no caso de suspensão ou cessação da convenção internacional que estiver em causa."

O artigo 110º do TFUE (na esteira do artigo 90º do Tratado de Roma), preceitua que "nenhum EM fará incidir, directa ou indirectamente, sobre os produtos dos outros Estados Membros imposições internas, qualquer que seja a sua natureza, superiores às que incidam, directa ou indirectamente sobre produtos nacionais similares".

Nos terrmos da decisão, cuja fundamentação temos vindo a perfilhar, acrescenta-se que "sobre a interpretação deste artigo face aos direitos nacionais já o TJUE se pronunciou por diversas vezes precisando o seu alcance dado que a admissão nos mercados nacionais de veículos automóveis portadores de placa de matrícula definitiva de outros Estados Membros, isto é de veículos usados, rege-se exclusivamente pelo direito nacional, não podendo, todavia, tal direito contrariar os princípios em que se alicerça o funcionamento da EU".

"Por isso, dentro da liberdade conformadora que o legislador nacional dispõe para modelar o imposto de forma a proceder à sua cobrança de forma exequível e eficaz, é necessário ter em conta, para além da opinião da Comissão Europeia, enquanto entidade a que cabe zelar pelo respeito pelo Tratado, a jurisprudência comunitária que se vai produzindo.

E tanto assim é que o Estado Português, interpelado pela Comissão Europeia em 2009/201, quanto à forma como eram tributados os veículos usados admitidos em Portugal provenientes da UE (porque contrária ao previsto no referido e citado artigo 110° do TFUE), se viu forçado a alterar a legislação em vigor em matéria de ISV, em concreto o artigo 11º, nº 1 do Código do ISV (naquela data vigente), através da Lei nº 55-A/2010, de 31 de Dezembro (Lei do OE para 2011), no sentido de: O imposto incidente sobre veículos portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados Membros da União Europeia é objecto de liquidação provisória, com base na aplicação das percentagens de redução previstas na tabela D ao imposto resultante da tabela respectiva, as quais estão associadas à desvalorização social média dos veículos no mercado nacional, calculada com referência à desvalorização comercial média corrigida do respectivo custo de impacte ambiental.

Contudo, como refere a aludida decisão, não foi comtemplada, com a referida alteração legislativa, a questão da desvalorização dos veículos usados, oriundos de outro EM, com menos de um ano e mais de cinco, surge então o já citado Acórdão do TJUE nº C-200/15, de 16 de Junho de 2016, visando directamente a legislação nacional, consubstanciada no artigo 11º do Código do ISV (na redacção em vigor até 2016), nos termos do qual se veio considerar que "a República Portuguesa ao aplicar, para efeitos da determinação do valor tributável dos veículos usados provenientes de outro EM, introduzidos no território nacional, um sistema relativo ao cálculo da desvalorização dos veículos que não tem em conta a sua desvalorização antes de atingirem um ano, nem a desvalorização que seja superior a 52% no caso de veículos com mais de cinco anos, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 110º do TFUE".

E assim, o legislador nacional foi forçado a alterar o referido artigo 11º do Código do ISV, no sentido de nele incluir a desvalorização referida no ponto anterior, através da Lei nº 42/2016, de 28 de Dezembro, mas excluindo de novo da redacção do artigo a questão da desvalorização incidente sobre a componente ambiental do ISV.

Nesta conformidade, os actuais contornos da legislação nacional ignoram, no artigo 11º, nº 1 Tabela D, o previsto no artigo 110º do TFUE e a posição que o TJUE tem assumido (e que já assumia face ao disposto no artigo 90º do Tratado de Roma) de que este artigo visa garantir a perfeita neutralidade das imposições internas no que se refere à concorrência entre produtos que já se encontrem no mercado nacional e produtos importados, de modo que não pode, em caso algum, ter efeitos discriminatórios".

A situação descrita levou a Comissão Europeia a dar início a um procedimento contra Portugal, "por este EM não ter em conta a componente ambiental no cálculo do ISV aplicável aos veículos usados "importados" de outros EM, gerando efeitos discriminatórios nestas viaturas face às viaturas usadas adquiridas em território nacional".

Assim, de acordo com o artigo 4º do TFUE, as competências que não sejam atribuídas à União nos Tratados pertencem aos Estados- Membros" (nº 1), sendo que "os Estados Membros tomam todas as medidas gerais ou específicas adequadas para garantir a execução das obrigações decorrentes dos Tratados ou resultantes dos actos das instituições da União" (nº 4).

Nos termos do disposto no artigo 17º, nº 1 do TFUE, "a Comissão promove o interesse geral da União e toma as iniciativas adequadas para esse efeito.

A Comissão vela pela aplicação dos Tratados, bem como das medidas adaptadas pelas instituições por força destes. Controla a aplicação do direito da União, sob fiscalização do Tribunal de Justiça da União Europeia".

Por sua vez, de acordo com o artigo 258° do TFUE, "se a Comissão considerar que um Estado-Membro não cumpriu qualquer das obrigações que lhe incumbem por força dos Tratados, formulará um parecer fundamentado sobre o assunto, após ter dado a esse Estado oportunidade de apresentar as suas observações.

Se o Estado em causa não proceder em conformidade com este parecer no prazo fixado pela Comissão, esta pode recorrer ao Tribunal de Justiça da União Europeia".

Assim sendo,  " se uma eventual  infracção à legislação europeia for identificada pela Comissão ou denunciada por queixa, esta última tenta resolver o problema que lhe está subjacente através do diálogo com o EM em causa, com o objectivo de encontrar uma solução rápida que esteja em conformidade com a legislação da UE e evitar assim o recurso a um processo formal por infracção.

No caso de o EM não concordar com a Comissão ou não tomar medidas para rectificar a eventual violação da legislação da UE, a Comissão pode abrir um processo formal por infracção, sendo que este processo compreende várias etapas.

Neste âmbito, a Comissão Europeia convida, através de notificação por carta, as autoridades nacionais do EM a pronunciarem-se sobre o problema de incumprimento identificado, no prazo máximo de dois meses, sendo que, em caso de ausência de resposta ou de resposta não satisfatória, a Comissão indicará as razões por que considera que o EM violou a legislação da EU e as autoridades nacionais dispõem de um prazo máximo de dois meses para dar cumprimento à legislação europeia".

Não obstante, em caso de ausência de resposta ou resposta não satisfatória, a Comissão pode pedir ao TJUE que abra um procedimento contencioso ao EM incumpridor, decidindo o TJUE, em média, no prazo de dois anos, sobre a existêncía, de uma infracção à legislação europeia".

 No âmbito dos presentes autos, e de acordo com a factualidade dada como provada, Portugal não tem em conta nenhuma redução sobre a componente ambiental do ISV no cálculo do imposto incidente sobre veículos usados "importados" de outros EM, à revelia do disposto no artigo 110º do TFUE, Portugal deixou de considerar as percentagens de redução de ISV relativas à depreciação das viaturas no que diz respeito à componente ambiental.

Por seu turno o Acórdão do TJUE (C-200/15), de 16/06/2016, como se extrai da mencionada decisão arbitral, refere que "este artigo (110º do TFUE) é violado sempre que a imposição que incide sobre o artigo importado e a que incide sobre o produto nacional similar são calculados de forma diferente e segundo modalidades diferentes que conduzam a uma imposição superior do produto importado", sendo que "um Estado-Membro não pode cobrar um imposto sobre os veículos usados importados, calculado com base num valor superior ao valor real do veículo, tendo como efeito uma tributação mais onerosa destes relativamente à dos veículos usados similares, disponíveis no mercado nacional".

 Assim sendo, o Tribunal Arbitral não tem dúvidas em concluir que o artigo 11º do Código do ISV está em desconformidade com o disposto no artigo 110º do TFUE, uma vez que calcula o imposto sobre veículos usados provenientes de outro Estado Membro da EU, sem tomar em linha de conta a sua depreciação, permitindo que o imposto calculado seja superior ao montante residual de veículos usados nacionais.

Aliás, recentemente, o TJUE, no Acórdão proferido em 02/09/2021, no Processo nº C-169/20, veio confirmar o aludido, ao decidir que Portugal ao não desvalorizar a componente ambiental no cálculo do valor aplicável aos veículos usados postos em circulação no território português e adquiridos noutro estado-membro, no âmbito do cálculo do ISV, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do art. 110º do TFUE

Termos em que se determina a anulação parcial dos actos tributários de liquidação de Imposto sobre Veículos objecto do pedido, uma vez que padecem de ilegalidade na parte em que não consideraram aplicável a redução de ISV relativa à componente ambiental.

Quanto aos juros indemnizatórios:

Esta matéria está regulada no art. 24.º do RJAT, o qual expressamente determina no seu n.º 1, alínea b) que a decisão arbitral obriga a Administração Tributária, nos casos aí consignados, a “Restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessárias para o efeito”, e preceitua, ainda, no seu n.º 5, que “É devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza nos termos previstos na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”.

 Também o art. 100.º da LGT, cuja aplicação é autorizada pelo disposto no art. 29.º, n.º 1, al. a), do RJAT, preceitua de modo idêntico, no sentido da imediata reconstituição da legalidade, compreendendo a mesma o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso.

 Por seu lado, o art. 43.º, n.º 1, da LGT condiciona o direito a juros indemnizatórios aos casos em que “houve erro imputável aos serviços de que resulta pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.

 Nesta conformidade, coloca-se a questão de saber se se pode considerar ter havido, ou não, um erro imputável aos serviços na situação vertente.

 Ora, conforme se referiu anteriormente, as liquidações em apreço são ilegais por erro na aplicação do direito aos factos, cometido pelos serviços da Requerida, de que resultou pagamento em excesso.

 Assim, dúvidas não há que está preenchido o requisito estabelecido no art. 43.º, n.º 1, da LGT, ou seja, a ilegalidade das liquidações resultou de um erro cometido pelos serviços tributários, condição para serem exigíveis juros indemnizatórios.

Tem, assim, a Requerente direito não só ao reembolso das quantias pagas em excesso, mas também a receber juros indemnizatórios sobre as mesmas, nos termos das disposições combinadas dos arts. 24.º, n.º 1, al. b), do RJAT, 100.º e 43.º, n.º 1, ambos da LGT, à taxa resultante do n.º 4 do art. 43.º da LGT, desde as datas dos pagamentos até à efectiva restituição.

 

L.-DECISÃO

Atento o exposto, o Tribunal Arbitral decide:

Julgar procedente o pedido de anulação parcial das liquidações de ISV identificadas nos autos, no montante total de 13.910,08 euros, e, consequentemente, condenar a Requerida a restituir à Requerente esta quantia, com juros indemnizatórios, nos termos supra expostos e,

Condenar a Requerida a pagar as custas do presente processo (art. 527º, nºs. 1 e 2 do Código do Processo Civil, ex vi art. 29º, nº 1, alínea e) do RJAT).

Valor do processo: Em conformidade com o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC (ex. 315°, nº 2) e 97º -A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de 13.910,08 euros. 

Custas: De harmonia com o nº 4 do art. 22º do RJAT, fixa-se o montante das custas em 918,00 euros, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

Notifique-se.

Lisboa, 28 de Fevereiro de 2022

 

O Árbitro

(José Nunes Barata)

 

(Redacção pela ortografia antiga)