Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 426/2021-T
Data da decisão: 2022-03-10  ISV  
Valor do pedido: € 559,83
Tema: ISV - Artigo 11º CISV; artigo 10º do RJAT; extemporaneidade do pedido arbitral
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SUMÁRIO:

 

I – a Requerente impugna no pedido arbitral não é o ato de indeferimento do pedido de revisão (como alega a AT) mas a liquidação de ISV, emitida e paga em 12-03-2019. em momento algum é mencionado o ato de indeferimento do pedido de revisão ou os seus fundamentos. Não é esse o ato impugnado no pedido arbitral, ao longo do qual não se vislumbra referência ao ato de indeferimento, nem se ataca a sua fundamentação. Outra conclusão resultaria em manifesta violação do princípio do dispositivo.

II – A impugnação da liquidação de ISV emitida e paga em 12-03-2019, por pedido arbitral apresentado em 08-07-2021 é extemporânea por caducidade do direito de ação.

II - Dispõe o artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, em conjugação com o n.º 2, do artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo, que a impugnação da liquidação de imposto deve ser apresentada no prazo de 90 dias a contar da data-limite de pagamento, ou seja, 13-06-2019.

 

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

I.               RELATÓRIO

 

No dia 08/07/2021, a…, NIF … com domicilio na …, …, …, Mindelo, doravante designada por Requerente, apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral singular, nos termos e ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), com as alterações  subsequentes, e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, e do disposto no artigo 99º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), para impugnação da liquidação de Imposto sobre Veículos (ISV), resultante da DAV 2019/...., emitida pela Alfândega de Braga. Peticiona a anulação parcial da liquidação de ISV, de forma a aplicar a redução prevista no artigo 11º do CISV à componente ambiental e condenada a AT a restituir o montante de imposto cobrado em excesso, acrescido de juros indemnizatórios à taxa legal.

 

O pedido arbitral, tem por objeto, concretamente, a impugnação da liquidação de ISV, promovida ao abrigo do artigo 11º do CISV, porquanto, entende a Requerente que este artigo viola o disposto no artigo 110º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) e, em virtude dessa desconformidade, alega a Requerente ter sido lesada em 559,83 (quinhentos e cinquenta e nove euros e oitenta e três cêntimos) de imposto pago em excesso.

 

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral, apresentado em 08/07/2021, foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e notificado à AT, em 09-07-2021. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, no dia 23/08/2021, designou a ora signatária como árbitro do Tribunal Arbitral singular, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

As partes foram notificadas dessa designação, que aceitaram. Em conformidade com o preceituado na alínea c), do n.º 1, do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral ficou constituído em 10/09/ 2021. Seguidamente, foi proferido despacho arbitral, notificado à Requerida, para apresentar a sua resposta, nos termos do disposto no artigo 17.º do RJAT.

 

A AT não apresentou resposta no prazo fixado, pelo que, no dia 27/10/2021, foi proferido o seguinte despacho arbitral:

 «Considerando os elementos constantes dos autos verifica-se que:

 

1. Em 08/07/2021 a Requerente apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral;

2. Em 23-07-2021 veio aos autos com requerimento alegando que por mero «lapso» juntou a petição errada, a qual não dizia respeito ao caso concreto da Requerente identificada no formulário de apresentação do pedido arbitral, nem conforme aos documentos juntos ao mesmo.

3. Nesta conformidade juntou, então, a petição correta, respeitante ao caso da Requerente.

4. Em 10-09-2021 foi constituído o presente tribunal arbitral e, nessa mesma data, foi a AT notificada para apresentar resposta, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 17º do RJAT.

5. A AT não apresentou resposta no prazo fixado.

Posto isto, impõe-se, assim, determinar a subsequente tramitação dos autos.

Para que não subsista qualquer dúvida sobre a regularização da instância, notifica-se a AT para no prazo de 10 dias, vir aos autos pronunciar-se sobre o teor do Requerimento apresentado pela Requerente para sanação do referido «lapso».

Termos em que, nos termos do disposto no artigo 16º, alíneas a), c) e f), com particular destaque para esta última que impõe a colaboração e boa-fé das partes e dos árbitros, ficam os autos a aguardar a pronúncia da AT.

Caso esta não se pronuncie, considerar-se-á sanado o «lapso», e definir-se-á a tramitação subsequente dos autos.»

 

 

Em 20-11-2021 foi proferido o seguinte despacho arbitral:

 

«I - A reunião do Tribunal com as partes (artigo 18º, do RJAT) À luz do disposto nos artigos 16º-c), do RJAT e do princípio da proibição da prática de atos inúteis, fica dispensada a reunião do Tribunal com as partes, considerando que (i)se trata, no caso, de processo não passível duma definição de trâmites processuais específicos, diferentes dos comummente seguidos pelo CAAD na generalidade dos processos arbitrais e (ii) não se revela necessário o aperfeiçoamento dos articulados.

II - Notificada para se pronunciar sobre o requerimento apresentado pela Requerente, alegando o lapso manifesto no articulado junto aos autos e a sua substituição pelo articulado correto, a AT nada disse pelo que se considera sanado o lapso.

III - Fixa-se o prazo simultâneo de 20 (vinte) dias [(artigos 29º, do RJAT, 91º-5 e 91º-A, do CPTA, versão republicada em anexo ao DL nº 214-G/2015, de 2-10)], para as partes apresentarem as suas alegações escritas.

IV – A decisão arbitral será proferida no prazo previsto no artigo 21º, nº1 sem prejuízo do previsto no nº 2 do mesmo dispositivo legal.

V – Taxa de arbitragem remanescente CAAD: a Requerente deverá dar oportuno cumprimento ao disposto no artigo 4º-3, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária [pagamento, antes da decisão e pela forma regulamentar, do remanescente da taxa arbitral].

Solicita-se às partes que disponibilizem os respetivos articulados em formato word.»

 

Em13-12-2021 a AT veio juntar aos autos o processo administrativo e em 14-12-2021 as suas alegações. Também na mesma data veio a Requerente apresentar as suas alegações.

 

 

II – A posição das partes e a questão a decidir

 

A posição da AT resulta evidenciada na liquidação de ISV, resultante da DAV, bem assim como da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa da liquidação, apresentado pela Requerente e que antecedeu a apresentação deste pedido arbitral.  Do indeferimento do pedido de revisão conclui-se, em síntese, que do ponto de vista da AT, esta limitou-se a aplicar a lei, não lhe cabendo outra função senão a de liquidar o imposto de acordo com as regras em vigor no ordenamento jurídico português. Não ignora a jurisprudência recente sobre a questão de direito em discussão, mas alega a AT que a sua obrigação de obediência à lei impõe, por obrigação de ofício, aplicar a lei em vigor ao tempo do facto tributário. Pugna pela extemporaneidade do pedido arbitral e, caso outro seja o entendimento deste tribunal, entende que o pedido deve improceder. Alega, por fim, que deve também improceder o pedido de juros indemnizatórios peticionados pela Requerente.

 

*

 

A Requerente formula o seu pedido, invocando, em síntese que importou um veículo automóvel de passageiros, em estado de usado, que introduziu em Portugal e que referido veículo tinha sido matriculado pela primeira vez no seu país de origem, tendo sido introduzido em Portugal em estado de uso. A Requerente cumpriu todas as suas obrigações legais, aduaneiras e tributárias devidas em Portugal. Sucedeu que a liquidação de ISV processada com base na DAV apresentada junto da Alfândega de Braga, não considerou qualquer desvalorização no cálculo do imposto no que se refere à componente ambiental. A Requerente pagou, por isso, imposto em excesso uma vez que se tivesse sido considerada a percentagem de desvalorização sobre a componente ambiental, o valor apurado teria sido inferior ao apurado, em 559,83.

O Imposto foi integralmente pago pela Requerente, porém esta não se conforma com os critérios subjacentes ao cálculo do valor de imposto. Considera, assim, que a liquidação de ISV é ilegal, por considerar que o artigo 11º do CISV não está em conformidade com o artigo 110º do TFUE. Invoca em reforço da sua posição a jurisprudência do TJUE, que por diversas vezes se pronunciou já sobre esta questão.

     

 

III – Saneamento do Processo

 

O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, do artigo 5.º e da alínea a), do n.º 2 do artigo 6.º, todos do RJAT.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, de acordo com o disposto nos artigos 4.º e 10.º do RJAT e no artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.

O processo é o próprio e as partes são legítimas, têm personalidade e capacidade jurídica e judiciária.

O processo não enferma de nulidades.

Nesta conformidade o Tribunal está em condições de conhecer do pedido.

Quanto à alegada extemporaneidade do pedido arbitral a decisão pressupõe que se apure previamente a matéria de facto relevante para aferir se o pedido terá sido ou não apresentado em prazo.

 

 

IV - Decisão sobre a matéria de facto

 

A)   Factos Provados:

 

Como matéria de facto relevante, o Tribunal arbitral dá por provados os seguintes factos:

 

a)     Em 28/02/2019 foi emitida a liquidação de ISV resultante da apresentação da Declaração Aduaneira de Veículos (DAV) nº 2019/...., para introdução no consumo em Portugal, do veículo automóvel ligeiro de passageiros, da marca …, modelo …, com a matrícula …-…-…, movido a combustível gasóleo, com o nº de motor … e cilindrada 1968 cc;

b)    Considerando o teor da DAV, resulta que este veículo foi introduzido no mercado português no estado de usado, com 150414Km percorridos;

c)     Tendo em consideração a data da primeira matrícula: 2014/09/02, no país de origem Alemanha, é considerado como um veículo com mais de 4 a 5 anos de uso, para efeitos dos escalões da Tabela D, prevista no nº 1, do artigo 11º do CISV ao qual corresponde uma percentagem de redução de 43%;

d)    O preço de aquisição pago no país de origem foi de, respetivamente, 15.000,00€

e)     No cumprimento das suas obrigações legais, designadamente tributárias foi notificado o Requerente da liquidação nº 2019/… relativo aos montantes de ISV liquidados pela Alfândega de Braga, com data-limite de pagamento em 12-03-2019;

f)     No Quadro R da referida DAV, verifica-se que o cálculo deste imposto foi efetuado pela Autoridade Tributária e Aduaneira – serviços aduaneiros, com recurso à aplicação da tabela referente aos veículos ligeiros de passageiros (Tabela A);

g)    No que diz respeito à componente cilindrada o valor de 4.358,08€ foi deduzido pela quantia correspondente a 43% do seu montante, ou seja, 1.873,97€, por força da redução resultante do número de anos do veículo, de acordo com as percentagens de redução constantes da tabela D, prevista no nº 1 do artigo 11º CISV aplicável aos veículos usados;

h)    Relativamente aos montantes respeitantes à parte do ISV incidente sobre a componente ambiental no referido veículo, não foi aplicada qualquer percentagem

de redução;

i)      Em 16/12/2020 foi apresentado pedido de revisão oficiosa efetuado pela Requerente junto da Alfândega de Braga em 16/12/2020, o qual veio a ser objeto de despacho de indeferimento, proferido pelo Senhor Diretor da Alfândega de Braga em 07/04/2021;

j)      Em 08-07-2021 a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral;

k)    Em 23-07-2021 a Requerente apresentou requerimento para substituição da petição inicial, já que por lapso juntou a petição inicial relativa a B… em vez da petição de A….

 

 

B)   FACTOS NÃO PROVADOS

 

       Com relevo para a decisão, não existem factos que devam considerar-se como não provados.

 

       C) FUNDAMENTAÇÃO DOS FACTOS PROVADOS

 

       Todos os factos provados têm suporte documental. Assim, os factos descritos nas alíneas a) a h) foram dados como provados com base na prova documental, junta pela Requerente em anexo ao pedido arbitral, bem assim como da prova documental constante do Processo Administrativo junto pela AT, que comprova a veracidade dos factos descritos pelo Requerente. O facto descrito na alínea i) resulta do processo administrativo junto pela AT. Os factos constantes das alíneas j) e k) resultam da informação constante do sistema de gestão processual do CAAD.

       Acresce ainda que não existe qualquer divergência entre as partes quanto aos factos, mas apenas quanto à questão de direito. Pelo que, os factos provados resultam também do reconhecimento da sua veracidade, considerando a posição assumida pelas partes nos respetivos articulados.

 

 

V – DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE DIREITO

 

A)   Da alegada extemporaneidade do pedido arbitral

 

       Assente a matéria de facto, importa delimitar a(s) questão(ões) de direito a decidir, sendo que no caso dos presentes autos, considerando os factos descritos, a causa de pedir e o pedido formulado, constata-se que a Requerente convoca o tribunal arbitral para decidir uma única questão de direito: saber se a liquidação do ISV padece de ilegalidade, por ter como base legal fundamentadora a norma do artigo 11.º do CISV, nos termos do qual não é considerada qualquer desvalorização sobre a componente ambiental.

       Porém, a Requerida AT coloca uma questão prévia, a saber: a extemporaneidade do pedido arbitral, já que, do seu ponto de vista a apresentação do pedido arbitral ocorreu depois de se verificar a caducidade do direito de ação. Importa, pois, conhecer em primeiro lugar desta questão.

       A Requerida considera que o pedido de pronúncia arbitral foi deduzido extemporaneamente, porquanto:

        «Em 09/07/2021 foi apresentado um pedido de pronúncia arbitral onde são identificados os elementos através dos quais a ação se identifica, como o sujeito, o pedido e a causa de pedir.

 

Em 23/07/2021, foi requerido ao tribunal arbitral “a junção aos autos da petição correta”, na qual são indicados outros elementos identificadores da ação, isto é, outros sujeito, pedido e causa de pedir, e que nada têm a ver com os constantes do pedido inicialmente apresentado.

Não havendo qualquer identidade entre as petições apresentadas em 09/07/2021 e em 23/07/2021, o que ocorreu não foi uma alteração ou modificação do pedido inicial, mas sim, a apresentação, ex novo, do pedido de pronúncia arbitral em 23/07/2021.

Ora, o pedido de pronúncia arbitral apresentado em 23/07/2021, vem interposto na sequência do despacho de indeferimento de pedido de revisão oficiosa da liquidação em crise, proferido pelo Diretor da Alfândega de Braga em 07/04/2021 e notificado à ora Requerente, por via postal registada, com aviso de receção, em 12/04/2021 (cfr. cópia do aviso de receção, constante do Processo Administrativo).

Nos termos do artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, em conjugação com o n.º 2 do artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, o prazo para apresentação do pedido de constituição do tribunal arbitral era de 90 dias, contados a partir da data da notificação daquele ato de indeferimento. Deste modo, sendo o prazo para dedução de pedido de constituição de tribunal arbitral um prazo contínuo, no presente caso, o mesmo, terminou em 12/07/2021. Ora, o pedido só foi apresentado em 23/07/2021, pelo que o mesmo é manifestamente extemporâneo, verificando-se, pois, a exceção de caducidade do direito de ação.»

 

       Na verdade, o pedido arbitral foi apresentado em 08-07-2021, como resulta do sistema de gestão processual do CAAD.

       Por outro lado, é certo que a petição inicial então junta aos autos pela Requerente não foi a correta, uma vez que, por lapso, juntou uma petição inicial relativa a um outro processo totalmente distinto. Porém, em 23-07-2021 a Requerente veio aos autos requerer a substituição da petição alegando que por lapso o ficheiro junto aos autos não foi o correto, e veio, então, apresentar a petição correta.

      Após constituição do Tribunal arbitral e fixado prazo para resposta da AT, a AT não se pronunciou. Assim, por despacho arbitral de 27-10-2021, o tribunal decidiu notificar a AT para que se pronunciasse sobre o requerimento apresentado pela Requerente em 23-07-2021 e a eventual regularização da instância. Assim, nos termos do disposto nas alíneas a), c) e f) do artigo 16º do RJAT, os autos ficaram a aguardar a pronúncia da AT e o Tribunal arbitral determinou que: «caso esta não se pronuncie, considerar-se-á sanado o «lapso», e definir-se-á a tramitação subsequente dos autos.»

       A AT, no prazo fixado nada disse, pelo que o Tribunal arbitral considerou a instância regularizada e o lapso sanado. Dito de outro modo, sanado o lapso, a data de apresentação do pedido arbitral é o da apresentação inicial verificada em 08-07-2021 e não a data do requerimento apresentado em 23-07-2021. Tanto mais que se tratou de lapso manifesto, pois os documentos juntos em anexo à PI foram os corretos, apenas a petição, cuja causa de pedir e pedido são em tudo idênticos aos dos presentes autos (impugnação de liquidação do ISV de carro importado) mas referente a outro sujeito passivo. Assim, tendo o Tribunal arbitral decidido como decidiu no supramencionado despacho arbitral, ficou sanado o lapso e a instância, a qual teve o seu início em 08-07-2021.

       Logo, não se verifica a extemporaneidade da apresentação do pedido arbitral pelo argumento alegado pela AT.

       Não obstante, a apresentação do pedido arbitral é extemporânea, por outra razão, uma vez que o ato que a Requerente impugna no pedido arbitral não é o ato de indeferimento do pedido de revisão (como alega a AT) mas a liquidação de ISV, emitida e paga em 12-03-2019.

       Vejamos melhor o pedido e a causa de pedir invocados pela Requerente no pedido arbitral, pois que, é por referência ao pedido formulado e à causa de pedir que o sustenta que este tribunal tem de decidir.

      

       Percorrendo o pedido arbitral constata-se que em momento algum é mencionado o ato de indeferimento do pedido de revisão ou os seus fundamentos. Não é esse o ato impugnado no pedido arbitral, ao longo do qual não se vislumbra referência ao ato de indeferimento, nem se ataca a sua fundamentação.

       Na verdade, toda a alegação da Requerente se reporta apenas e só à liquidação do ISV. A Requerente junta a decisão de indeferimento do pedido de revisão como documento nº4 em anexo ao pedido arbitral, mas em momento algum ataca os seus fundamentos. A explicação para esta opção da Requerente, embora estranha, parece ter como justificação o facto do pedido de revisão do ato de liquidação previamente apresentado ter sido extemporâneo, como resulta da parte inicial da decisão de indeferimento junta aos autos. Conclusão que resulta evidente ao analisar o conteúdo da decisão de indeferimento, a qual começa por invocar a extemporaneidade da apresentação do pedido de revisão. A este propósito, na decisão de indeferimento do pedido de revisão pode ler-se:

 

 

 

            Certo é que, concluindo que a Requerente deduziu o seu pedido arbitral para impugnação da liquidação de ISV, emitida e paga em 12-03-2019 e não do indeferimento do pedido de revisão, ao qual não faz referência e cujos fundamentos não impugnou, não resta dúvida sobre a extemporaneidade do pedido arbitral apresentado em 08-07-2021.

       Em suma, a Requerente não deduziu pedido arbitral para impugnação do ato de indeferimento do pedido de revisão e, por essa via, alcançar a impugnação da liquidação de ISV, porque se o fizesse teria de atacar os fundamentos do indeferimento, entre os quais, a sua extemporaneidade.

       Por isso, optou por apresentar o pedido arbitral para impugnação da liquidação de ISV, sendo que esta foi emitida e paga em 12-03-2019, ou seja, há mais de dois anos. Sendo assim, o prazo para apresentação de pedido arbitral há muito caducara.

       Dispõe o artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, em conjugação com o n.º 2, do artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo, que a impugnação da liquidação de imposto deve ser apresentada no prazo de 90 dias a contar da data-limite de pagamento, ou seja, 13-06-2019.

       Se a intenção da Requerente era atacar a decisão de indeferimento do pedido de revisão devia ter atacado os seus fundamentos, o que não sucedeu. Outra conclusão resultaria em manifesta violação do princípio do dispositivo.

 

*

            Por força do que vem exposto constata-se que o pedido arbitral é extemporâneo pela verificação da caducidade do direito de ação, a qual é de conhecimento oficioso, porque estabelecida em matéria que se encontra excluída da disponibilidade das partes, constitui uma exceção perentória, nos termos previstos no artigo 89º, nºs 1,2 e 4, alínea k) do CPTA, bem assim como dos artigos 576º, nº 3 e 579º do CPC, o que impede o conhecimento do mérito e conduz à absolvição do pedido.

 

 

V – DECISÃO

 

Termos em que decide este Tribunal Arbitral:

 

a)     Julgar o pedido arbitral extemporâneo e absolver a Requerida do pedido.

b)    Condenar a Requerente no pagamento das custas processuais.

 

 

IV.  VALOR DO PROCESSO

 

Fixa-se o valor da causa em 559,83€ (quinhentos e cinquenta e nove euros e oitenta e três cêntimos), nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT, aplicável por remissão das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

V.  CUSTAS

 

Ao abrigo do n.º 4 do artigo 22.º do RJAT e nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em 306,00(trezentos e seis euros), a cargo da parte vencida.

 

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 10/03/2022

 

O Tribunal Arbitral singular,

 

 

 

(Maria do Rosário Anjos)