SUMÁRIO:
I. Nos termos da alínea e) do artigo 277.º do Código do Processo Civil (CPC), aplicável ex vi pela alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT, a instância extingue-se com a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide;
II. O evento que torna inútil a apreciação do mérito da causa verificou-se depois da constituição do Tribunal Arbitral;
III. A anulação que a Requerente visava com o processo arbitral encontra-se atingida, pelo que, não oferece dúvida que a Decisão Arbitral que normalmente seria proferida, conhecendo do mérito da pretensão deduzida, se afigura destituída de qualquer efeito útil, pelo que não se justifica a sua prolação.
DECISÃO ARBITRAL
A Árbitro Dra. Ana Luísa Ferreira Cabral Basto (árbitro singular), designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formar o Tribunal Arbitral Singular, constituído em 27 de julho de 2021, acorda no seguinte:
I. RELATÓRIO
O Organismo Investimento Imobiliário Fechado A..., antes denominado Fundo de Investimento Imobiliário Fechado A... (doravante designado por “Fundo”), com o número de identificação fiscal ..., aqui representado pela sua sociedade gestora B...‐ Sociedade Gestora de Organismos de Investimento Coletivo, S.A. (doravante designada por “Requerente”), com o número de identificação fiscal ..., com sede na Rua ..., n.º..., ..., ..., Edifício ..., ...‐... ..., veio deduzir pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto no artigo 10.º, n.os 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária ou “RJAT”), em conjugação com o artigo 99.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), em que a Requerida é a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante também designada por “AT”).
Constitui pretensão da Requerente a anulação dos atos tributários de liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”), n.os 2020 ... e 2021 ..., com referência aos períodos de imposto de outubro e novembro de 2020, dos quais resultou uma correção no montante de € 30.316,20, com as demais consequências legais, nomeadamente a restituição integral do imposto liquidado indevidamente, acrescido dos correspondentes juros indemnizatórios, ao abrigo do artigo 43.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária (“LGT”).
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi apresentado em 20 de maio de 2021, tendo sido aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD em 21 de maio de 2021 e seguiu a sua normal tramitação, nomeadamente com a notificação da AT, em 23 de maio de 2021.
A Requerente não procedeu à nomeação de Árbitro.
Assim, nos termos e para os efeitos do disposto do n.º 1 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, por decisão do Exmo. Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicada às partes, nos prazos legalmente previstos, foi designado Árbitro do Tribunal Arbitral singular a Exma. Dra. Ana Luísa Ferreira Cabral Basto, que comunicou, ao Conselho Deontológico e ao Centro de Arbitragem Administrativa a aceitação do encargo no prazo estipulado no artigo 4.º do Código Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa.
Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral Singular foi constituído em 27 de julho de 2021, seguindo-se os pertinentes trâmites legais.
Em síntese, os fundamentos apresentados pela Requerente para efeitos do pedido de pronúncia arbitral foram os seguintes:
a) O Fundo, representado pela Requerente, é um fundo de investimento imobiliário fechado e de subscrição particular, enquadrado, para efeitos de IVA, no regime normal mensal, qualificando, desde 21 de junho de 2002, como um sujeito passivo misto, que realiza operações que conferem o direito à dedução e operações que não conferem esse mesmo direito.
b) Na sequência das regularizações impostas aos Fundos, mediante o Ofício Circulado n.º 90005/2005, de 28 de julho, em matéria de registo e enquadramento em IVA, o Fundo terá sido oficiosamente enquadrado pela AT como um sujeito passivo isento, ao abrigo do artigo 9.º do Código do IVA, facto que despoletou erros no Portal das Finanças.
c) A AT não terá processado a declaração periódica de junho de 2018 e, consequentemente, reconhecido o crédito gerado naquele período tributável, o qual ascendia a € 30.316,20.
d) Por forma a ultrapassar o não processamento da declaração periódica de junho de 2018, a Requerente terá diligenciado, por recomendação da AT, a solicitação da alteração do cadastro, para sujeito passivo misto, com efeitos retroativos reportados a 21 de junho de 2002.
e) Porém, o problema manteve-se e a AT acabou por notificar o Fundo do ato tributário de liquidação de IVA n.º 2020..., referente ao período de outubro de 2020, emitido em 12 de dezembro de 2020, e do ato tributário de liquidação de IVA n.º 2021..., referente ao período de novembro de 2020, emitido em 22 de janeiro de 2021, os quais resultaram precisamente da correção correspondente ao crédito não processado pela AT, referente ao período tributável de junho de 2018, no valor de € 30.316,20.
f) O Fundo, sem prejuízo de ter procedido ao pagamento, integral e atempado, das referidas liquidações de IVA, veio, mediante o pedido de pronúncia arbitral alegar que “os actos de liquidação aqui impugnados padecem do vício de falta de fundamentação, nos termos do n.º 3 do artigo 268.º da CRP, da alínea c) do artigo 99.º do CPPT e do n.º 1 do artigo 77.º da LGT, pelo que são ilegais e devem ser prontamente anulados, com todos os efeitos legais” (cfr. artigo 41.º do pedido de pronúncia arbitral) e que “os referidos actos apenas resultam de um erro de processamento interno da AT” (cfr. artigo 42.º do pedido de pronúncia arbitral).
O Tribunal Arbitral, em 29 de julho de 2021, determinou a notificação da Requerida para exercício do contraditório e juntar cópia integral do processo administrativo.
Em 30 de setembro de 2021, a AT apresentou resposta, informando que “reviu a situação jurídico-tributária da Requerente e iniciou diligências que irão ter como consequência a anulação das liquidações controvertidas”, protestando juntar comprovativo da anulação das liquidações controvertidas a fim de poder ser julgada procedente a inutilidade superveniente da lide (cfr. pontos 3. e 5. da Resposta apresentada pela AT).
Posteriormente, através de requerimento apresentado em 9 de novembro de 2021, a AT juntou comprovativos da anulação da liquidação n.º 2020 ..., de outubro de 2020, a qual foi substituída pela liquidação n.º 2021..., e da anulação da liquidação n.º 2021..., a qual foi substituída pela liquidação n.º 2021..., de novembro de 2020.
O Tribunal Arbitral, de seguida, dispensou a reunião a que se refere o artigo 18.º do citado diploma, bem como a apresentação de alegações, por desnecessidade, indicando o dia 26 de janeiro de 2022 como data previsível para prolação da decisão, devendo até essa data a Requerente pagar a taxa arbitral subsequente, nos termos do n.º 3 do artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”) e comunicar o mesmo pagamento ao CAAD.
II. SANEAMENTO
O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a) e 11.º, n.º 1, todos do RJAT.
As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (cfr. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo de 90 dias previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT.
Não foram identificadas questões que obstem ao conhecimento do mérito.
III. FUNDAMENTAÇÃO
1. DE FACTO
Com relevo para a decisão, importa atender aos seguintes factos que se consideram provados:
A. A Requerente reportou, na declaração periódica de IVA de junho de 2018, um crédito no valor de € 30.316,20 (= campo 94 – campo 61).
B. A declaração periódica de IVA de junho de 2018 não foi processada pela AT, originando, para além do não reconhecimento do crédito respeitante ao referido período, os atos tributários de liquidação n.os 2020 ... e 2021 ..., com referência aos períodos de outubro e novembro de 2020, dos quais resultou uma correção no montante de € 30.316,20.
C. Inconformada, a Requerente apresentou junto do CAAD, em 20 de maio de 2021, o pedido arbitral que deu origem ao presente processo, visando a anulação dos atos tributários de IVA, na sua totalidade, bem como a condenação da AT “a reembolsar o Fundo do valor do imposto corrigido, no montante global de € 30.316,20, relativamente às liquidações sub judice, e, bem assim, (…) no pagamento de juros indemnizatórios, à taxa legal, até ao reembolso integral do montante referido”.
D. Após ter sido notificada para exercício do contraditório e juntar cópia integral do processo administrativo, em 30 de setembro de 2021, a AT apresentou resposta, informando que “reviu a situação jurídico-tributária da Requerente e iniciou diligências que irão ter como consequência a anulação das liquidações controvertidas”, protestando juntar comprovativo da anulação das liquidações controvertidas a fim de poder ser julgada procedente a inutilidade superveniente da lide (cfr. pontos 3. e 5. da Resposta apresentada pela AT).
E. Em 9 de novembro de 2021, a AT juntou comprovativos da anulação da liquidação n.º 2020..., de outubro de 2020, a qual foi substituída pela liquidação n.º 2021..., e da anulação da liquidação n.º 2021..., a qual foi substituída pela liquidação n.º 2021 ..., de novembro de 2020 e, bem assim, requereu a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide.
MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Em virtude da anulação administrativa dos atos pela Requerida, apenas subsiste como objeto da ação o pedido de restituição do IVA e os juros indemnizatórios, nada mais havendo a apreciar. A convicção do árbitro alicerçou-se na prova documental junta aos autos, não tendo sido identificados factos não provados com relevância para a decisão da causa.
2. DE DIREITO
A. ANULAÇÃO DOS ATOS TRIBUTÁRIOS IMPUGNADOS - IMPOSSIBILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
Os atos tributários sindicados, que constituem o objeto principal desta ação, foram anulados administrativamente.
Nestas circunstâncias, o pedido de anulação das liquidações de IVA ficou sem objeto, pois com a anulação administrativa, os respetivos efeitos jurídicos constitutivos são destruídos com eficácia retroativa, de acordo com o artigo 171.º, n.º 3 do Código do Procedimento Administrativo (“CPA”), verificando-se uma impossibilidade superveniente da lide. Como refere a Decisão Arbitral no processo n.º 31/2013-T, do CAAD, de 4 de novembro de 2013, “torna-se impossível juridicamente anular o que já não existe”.
Poderia suscitar-se a dúvida sobre a tempestividade da anulação administrativa, atendendo a que já havia decorrido o prazo de 30 dias, a contar do conhecimento do pedido de constituição
do Tribunal Arbitral, estabelecido no artigo 13.º, n.º 1 do RJAT para a AT proceder à “revogação, ratificação, reforma ou conversão do ato tributário cuja ilegalidade foi suscitada, praticando, quando necessário, ato tributário substitutivo”, estipulando o n.º 3 desta norma que, findo este prazo, “a administração tributária fica impossibilitada de praticar novo ato tributário relativamente ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação, a não ser com fundamento em factos novos”.
O preceito em apreço deve ser interpretado no sentido de que, uma vez transcorrido o mencionado prazo de 30 dias, a AT fica impedida de praticar um novo ato dispositivo que regule a relação jurídico-tributária, relativamente ao mesmo sujeito passivo, imposto e período de tributação, exceto com fundamento em factos novos. Porém, esta restrição não ocorre em caso
de simples anulação administrativa do ato impugnado, desacompanhada de nova regulação da
situação jurídica.
Neste sentido, acompanha-se a Decisão Arbitral no processo n.º 116/2021-T, do CAAD, de 13 de julho de 2021, de acordo com a qual:
“Nesta última hipótese, afigura-se não merecer tutela o princípio da estabilidade da instância subjacente às limitações legais à atuação administrativa no decurso de pendência jurisdicional, uma vez que a Parte vem, simplesmente, reconhecer que à outra assiste razão, com fundamento material na lei, e, nessa medida, permitir a resolução antecipada do litígio e consequente extinção da instância, com economia processual e de meios. Deixou de existir razão para a subsistência do litígio, pois, ainda que em momento superveniente, foi gerado consenso suportado na convergência das partes quanto ao regime legal aplicável.
Esta interpretação foi acolhida pelo Supremo Tribunal Administrativo em relação ao processo
de impugnação judicial, que é regido pelo artigo 112.º do CPPT, o qual estabelece uma disciplina similar à do artigo 13.º, n.ºs 1 e 3 do RJAT, este último aplicável à ação arbitral tributária. Constituindo o processo arbitral tributário um meio alternativo à impugnação judicial, é inegável a manifesta identidade de razões, a que acresce o facto de o CPA e as normas sobre organização e processo nos tribunais administrativos e tributários serem de aplicação subsidiária ao processo arbitral tributário, por remissão do artigo 29.º n. º1, alíneas c) e d) do RJAT.
Sobre a aplicação do regime do CPA à “revogação” de atos administrativos em matéria tributária preconiza o Supremo Tribunal Administrativo, no Acórdão proferido em 15 de março de 2017, no processo n.º 449/14, que:
«A possibilidade legal de revogação dos atos administrativos em matéria tributária está prevista no art. 79º da LGT (a revogação é um ato que faz cessar ou elimina os efeitos de um ato anterior, com fundamento na sua inconveniência ou invalidade, estando o respetivo regime previsto nos arts. 138° a 146° do CPA)
Todavia, não constando da LGT nem do CPPT norma definidora do prazo para tal revogação, é incontroverso que hão-de acolher-se as regras constantes dos arts. 136º e ss. do CPA, que diretamente regulam a revogação dos atos administrativos [sendo que o CPA constitui legislação complementar e subsidiária ao direito tributário – arts. 2º, al. c), da LGT e 2º, al. d), do CPPT (Cfr., por todos, o ac. desta Secção do STA, de 15/5/2013, proc. nº 0566/12; bem como Leite Campos, Benjamim Rodrigues e Jorge de Sousa, Lei Geral Tributária Anotada e comentada, 4ª ed., 2012, anotação 1 ao art. 79º, p. 724 e Lima Guerreiro, Lei Geral Tributária, anotada, Editora Rei dos Livros, pág. 350, nota 7.)]. […]»
No mesmo sentido da aplicabilidade do regime da invalidade administrativa aos atos em matéria tributária voltou o Supremo Tribunal Administrativo a pronunciar-se no Acórdão de 17 de dezembro de 2014, relativo ao processo n.º 454/14.
Por outro lado, o artigo 168.º, n.º 3 do CPA determina que a anulação de atos que tenham sido
objeto de impugnação jurisdicional, como é o caso, pode ter lugar até ao encerramento da
discussão.”
Em face do exposto, conclui-se que a anulação administrativa comunicada pela Requerida, em 9 de novembro de 2021, dá satisfação à pretensão anulatória dos atos tributários de IVA em crise, no valor de € 30.316,20, retirando à lide arbitral o seu objeto principal, pelo que, nesta parte, julga-se extinta a instância processual, com a absolvição da AT da instância, ao abrigo do disposto nos artigos 277.º, alínea e) e 611.º do CPC, aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1 alínea e) do RJAT.
B. DA RESTITUIÇÃO DO IMPOSTO PAGO INDEVIDAMENTE E DOS JUROS INDEMNIZATÓRIOS
Ocorrendo impossibilidade superveniente da lide, como se verifica nos presentes autos, se os atos anulatórios não se pronunciarem sobre os juros indemnizatórios, o Tribunal pode conhecer do pedido de juros indemnizatórios que haja sido oportunamente deduzido sobre esta matéria.
Este entendimento deriva de a eficácia retroativa da anulação dos atos de liquidação não ter a virtualidade de eliminar instantaneamente todos os efeitos lesivos que foram produzidos pelos atos tributários, durante o período de tempo que precedeu a anulação, designadamente no que se refere à privação dos meios financeiros utilizados para pagar a prestação tributária que, afinal, não era devida, por ilegal.
Pelo que se a remoção dos atos de liquidação (ou da parte inquinada) não for acompanhada da regulação da situação que existiria se não tivessem sido praticados, ou seja da atribuição de juros indemnizatórios (ou de indemnização por prestação de garantia se for o caso), então, nessa medida o processo pode prosseguir para acautelar a pretensão acessória suscitada pela emissão de tais atos ilegais que, apesar de anulados, existiram e produziram efeitos lesivos.
Importa assinalar que a posição adotada não é unânime, como se pode constatar das decisões arbitrais nos processos do CAAD n.ºs 215/2018-T, de 16 de novembro de 2018, 481/2018-T, de 7 de março de 2019. Porém, a posição maioritária vai no sentido que aqui se preconiza .
Segundo a jurisprudência constante do Supremo Tribunal Administrativo, não existindo pronúncia administrativa (decisão) sobre os juros indemnizatórios, não está integralmente regulada a relação tributária gerada pelo ato ilegal, nem satisfeita de forma integral a pretensão deduzida no processo, pelo que o Tribunal, tendo sido deduzido pedido nesse sentido, pode apreciar e, caso se verifiquem os respetivos pressupostos, condenar a AT ao pagamento de juros indemnizatórios, ou seja, nesta exata medida mantém-se a utilidade e interesse da pronúncia jurisdicional. A título de exemplo, referem-se os acórdãos daquele Supremo Tribunal nos processos n.os 574/14, de 7 de janeiro de 2016, e 1101/16, de 3 de maio de 2017.
Na situação concreta dos autos os atos de liquidação deram origem a um pagamento indevido de imposto – conforme resulta dos comprovativos de pagamento efetuados pela Requerente –, cujo reembolso é devido pela AT à Requerente.
Assim, estando demonstrado que a Requerente pagou o imposto impugnado, por força do disposto nos artigos 61.º do CPPT e 43.º da LGT, tem a Requerente direito aos juros indemnizatórios devidos, juros esses a serem contados desde a data do pagamento do imposto indevido (e correspondentemente anulado) até à data da emissão da respetiva nota de crédito, contando-se o prazo para esse pagamento do início do prazo para a execução espontânea da presente decisão (artigo 61.º, n.os 2 a 5 do CPPT), tudo à taxa apurada de harmonia com o disposto no n.º 4 do artigo 43.º da LGT.
I. RESPONSABILIDADE PARA EFEITOS DE CUSTAS
De acordo com o regime geral em matéria de custas, a impossibilidade ou inutilidade da lide é imputável à Requerida, que anulou o ato tributário ilegal após a apresentação do pedido de pronúncia arbitral pela Requerente, tendo a respetiva comunicação aos autos ocorrido após o decurso do prazo de 30 dias previsto no artigo 13.º, n.º 1 do RJAT, solução que se extrai do cotejo dos artigos 4.º, n.º 5 do RCPAT, 12.º, n.º 2 do RJAT, e 527.º e 536.º, n.º 3 do CPC, neste último caso por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
II. DECISÃO
Em face do exposto, o presente Tribunal Arbitral decide:
a) Julgar extinta a instância, por impossibilidade superveniente da lide;
b) Condenar a AT no reembolso dos valores pagos e no pagamento de juros indemnizatórios incidente sobre esses valores, nos termos do artigo 43.º da LGT;
c) Condenar a Requerida nas custas do processo, por ter dado azo à ação.
III. VALOR DA CAUSA
Fixa-se ao processo o valor de € 30.316,20, por ser aquele que corresponde aos atos tributários de liquidação de IVA cuja anulação se pretende, nos termos do disposto no artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1 alínea a) do RJAT, e do artigo 3.º, n, º 2, do RCPAT.
Assinala-se, como referido na decisão arbitral n.º 178/2019-T, de 20 de abril de 2020, que a determinação do valor da causa atende ao momento em que a ação é proposta (v. artigo 299.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT), sendo irrelevantes, como afirma JORGE LOPES DE SOUSA, “as modificações de valor que possam advir da revogação, ratificação, reforma ou conversão do ato tributário cuja ilegalidade foi suscitada ou de desistência ou redução de pedidos” – v. Guia da Arbitragem Tributária, Coord.: Nuno Villa-Lobos e Mónica Brito Vieira, 2013, Almedina, p. 153.
I. VALOR DAS CUSTAS
Pelas razões acima expostas, fixa-se as custas a cargo da Requerida no montante de € 1.836.00 nos termos da Tabela I do RCPAT, a cargo da Requerida, em cumprimento do disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e do disposto no artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.
Registe-se e notifique-se a presente decisão às partes.
Lisboa, 25 de janeiro de 2022
O árbitro,
Ana Luísa Ferreira Cabral Basto