DECISÃO ARBITRAL
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Requerente
A Requerente é A… S.A., sociedade comercial com o NIF … e domicílio fiscal na Zona Industrial de …, …, …, … ….
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Requerida
Autoridade Tributária (doravante também apenas AT) representada pelo dr. … e pelo dr. … .
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Tramitação
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A Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral a 11 de dezembro de 2020 que foi aceite a 14 desse mesmo mês;
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O Tribunal foi constituído por despacho do Presidente do CAAD de 21 de maio de 2020;
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A Requerida apresentou a sua resposta em 21 de junho de 2020 e juntou o processo administrativo (PA);
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A inquirição da testemunha B… teve lugar no dia 24 de novembro de 2021.
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A Requerente apresentou alegações a 9 de dezembro de 2021
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A Requerida, devidamente notificada, não apresentou alegações
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Pedido
O pedido peticionado é a declaração de ilegalidade dos seguintes atos de liquidação oficiosa de retenções na fonte e respetivos juros compensatórios relativos ao seu rendimento:
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Liquidação n.º 2020 …, no valor de € 28.953,49, com data limite de pagamento em 14.09.2020, relativa ao período de 2017;
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Liquidação n.º 2020 …, no valor de € 40.846,51, com data limite de pagamento em 14.09.2020, relativa ao período de 2018.
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Condenação da Requerida ao pagamento de juros indemnizatórios contabilizados sobre o valor do imposto pago (€ 69.800,00), desde a data do respetivo pagamento (14.09.2020), por força da aplicação do art. 43º, n° 1 da LGT.
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Posição das Partes
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da Requerente
Alega a Requerente, em síntese, que
- No âmbito do seu direito de audição, exercido no processo de inspeção tributária, requereu que os Serviços de Inspeção Tributária procedessem a diligências complementares, designadamente, a notificação da Administração Fiscal Espanhola, nos termos previstos na Diretiva 2011/16/UE do Conselho de 15 de Fevereiro de 2011, para informar se a sociedade C…, SL UNIPERSONAL, com o número de identificação fiscal …, é uma entidade com residência fiscal em Espanha, sujeito passivo de imposto sobre o rendimento nesse país;
- Os Serviços de Inspeção Tributária não promoveram a diligência e não se pronunciaram no sentido de a deferir, ou indeferir, ou seja, inexiste, no caso, qualquer tomada de posição reveladora de um juízo de ponderação sobre a utilidade da realização da diligência requerida. Considera a Requerente que com esta atitude violou a Requerida o direito de audição de que gozam os contribuintes, consagrado no art.º 60.º n°1, da LGT, que constitui direito constitucional aplicado ao procedimento tributário, enquanto corolário do princípio da participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações da Administração Pública que lhe digam respeito, visando assegurar uma tutela preventiva contra qualquer lesão dos seus direitos ou interesses (art.267°, n°5, da CRP);
- A realização das diligências complementares é, ainda, exigida pelo disposto nos art.ºs 58.º da LGT e 6.º do RCPITA, que estabelecem que a AT deve, no procedimento, realizar todas as diligências necessárias à descoberta da verdade material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido.
- Mesmo que entendesse não dever efetuar a diligência requerida, a AT tinha o dever de pronunciar-se expressamente sobre o pedido da sua realização, fundamentando a sua decisão, em obediência ao princípio da legalidade previsto no 266.º, n.º 1, da CRP. Não o tendo feito, deve o despacho de reversão ter-se por insuficientemente fundamentado, o que conduz à anulação do ato.
- Acrescenta a Requerente que, assim sendo, do ponto de vista material, incumpriu a AT a formalidade inserta no n° 7 do art.º 60° da LGT que se revela essencial, o que inquina de forma irremediável o RIT, as correções nele efetuadas e as liquidações aqui impugnadas emitidas em sequência do Relatório. O art.º 6.º do RCPIT - que consagra o princípio da verdade material - não é uma norma meramente programática; é uma regra de conduta imperativa que deve nortear a Inspeção Tributária, o que não sucedeu no caso “sub judice”.
- a própria CDT Portugal/Espanha impõe às respetivas autoridade tributárias dos Estados contratantes a troca de informações necessárias para aplicação da disposições da CDT, ou das leis internas dos Estados contratantes relativas aos impostos abrangidos, com vista a que a sua aplicação não seja contrária às normas previstas na CDT. AT violou os referidos princípios do inquisitório e da verdade material.
- Nestes termos, o procedimento de inspeção tributária – e o respetivo RIT – padecem de vícios procedimentais, suscetíveis de conduzir à anulação da decisão de procedimento, em conformidade com o disposto no artigo 163.º, n.º 1 do CPA, por violação de princípios e formalidades absolutamente essenciais impostas pelo n.º 1 do art.º 266.º e n.º 5 do art.º 267.º da CRP; pelos artºs 55.º, 58.º e n.º 7 do art.º 60.º, todos, da LGT; artºs. 6.º e 60.º do RCPITA, o que inquina de forma irremediável as liquidações impugnadas, emitidas em sequência do RIT.
- Acerca da não retenção na fonte do IRC, defende a Requerente que o n.º 1 do artigo 98.º do CIRC estabelece que não existe obrigação de efetuar a retenção na fonte de IRC, no todo ou em parte, relativamente aos rendimentos referidos no n.º 1 do artigo 94º do CIRC quando, por força de uma convenção destinada a eliminar a dupla tributação ou de um outro acordo de direito internacional que vincule o Estado Português ou de legislação interna, a competência para a tributação dos rendimentos auferidos por uma entidade que não tenha a sede nem direção efetiva em território português e aí não possua estabelecimento estável, ao qual os mesmos sejam imputáveis, não seja atribuída ao Estado da fonte ou o seja apenas de forma limitada.
- O art.º 7.º da CDT Portugal/Espanha determina que os lucros das empresas domiciliadas em Espanha, que não detenham estabelecimento estável em Portugal, só podem ser ali tributados. Nesta medida, não poderá o Estado português tributar, na fonte, os rendimentos obtidos por uma empresa de Espanha, provenientes de prestações de serviços, no âmbito da relação comercial estabelecida com uma empresa sediada em Portugal.
- Para efeitos de aplicação da CDT Portugal/ Espanha, considera-se residente num dos Estados signatários qualquer pessoa que, por virtude da legislação vigente nesse Estado, está aí sujeita a tributação, devido quer ao seu domicílio, quer à sua residência, local de direção efetiva ou outro critério de natureza similar (art.º 4.º da CDT Portugal/ Espanha).
- No caso concreto, o próprio RIT reconhece expressamente que, quer a D…, quer a C… são entidades não residentes, com sede efetiva em Espanha, com NIF atribuído pelas Autoridades Tributárias espanholas, registadas nestes serviços para o exercício de atividades empresariais.
- No caso da D…, a sua qualidade está certificada por documento das autoridades espanholas com força legal.
- Em relação à C…, a AT, ao ter-lhe reconhecido o estatuto de sujeito passivo não residente sem estabelecimento estável, validou a situação tributária desta entidade, designadamente a sua domiciliação em Espanha e respetiva tributação de rendimentos neste Estado. Acresce ainda que, para além do admitido em sede de RIT, neste caso foi apresentado o Mod. 21-RFI, devidamente certificado, com validade para o ano fiscal de 2017, e que também demonstra que a beneficiária do rendimento era residente fiscal em Espanha, sujeito passivo de imposto.
- No caso da C…, ainda que assim se não entenda, a responsabilidade tem de ser imputada à Requerida, que não realizou as diligências que a ora Requerente lhe solicitou.
- A Requerente considera que o único pressuposto para que as regras desta CDT sejam acionadas assenta na prova da residência das entidades beneficiárias, que no caso foi feita. Os pressupostos da aplicação da CDT Portugal/ Espanha são os que constam do respetivo texto, não sendo legítimo à AT invocar normas tributárias internas para rejeitar a sua aplicação.
- Com efeito, a apresentação do Mod. 21-RFI é uma mera formalidade ad probationem e não ad substantiam, pelo que a prova da residência noutro Estado poderá ser efetuada por qualquer outro meio idóneo que não única e exclusivamente o sobredito formulário – neste sentido convoca o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 22.06.2011 (proc. n.º 0283/11).
- Por força do disposto no artigo 8.º da CRP as normas constantes de convenções internacionais validamente celebradas e regularmente ratificadas e aprovadas vigoram na ordem interna logo que publicadas, constituindo fonte imediata de direitos e obrigações para os seus destinatários. E a superioridade hierárquica dos tratados é proclamada pelos artigos 26.º e 27.º da Convenção de Viena, onde se dispõe que “nenhuma das partes contratantes pode invocar as disposições do seu direito interno para justificar o incumprimento de um tratado”.
- Em termos de hierarquia, a CDT Portugal/Espanha prevalece sobre uma lei ordinária, não podendo esta afastar ou revogar as disposições constantes naquela convenção, sob pena de inconstitucionalidade. Deste modo, as exigências do art.º 98.º do CIRC não se podem sobrepor à Convenção, outorgada entre ambos os países.
- Conclui a Requerente dizendo que esta posição defendida pela Requerida segue um sentido diametralmente oposto às decisões publicadas da nossa jurisprudência sobre a matéria. Para justificar esta asserção convoca os seguintes arestos: Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 14.12.2016 (proc. n.º 0141/14); Decisão Arbitral proferida pelo CAAD, de 27.10.2017 (proc. n.º 221/2017-T) e Decisão Arbitral proferida também pelo CAAD, de 04.12.2019 (proc. n.º 320/2018-T).
- Mais considera a Requerente, que pese embora possa ser entendido que não efetuou a prova da verificação dos pressupostos previstos na CDT Portugal/ Espanha, no prazo legalmente fixado e previsto no n.º 2 do art.º 98.º do CIRC, nem por isso fica obrigada a entregar a totalidade do imposto que a AT entende deveria ter sido deduzido. Isto porque conforme resulta expressamente do nº 6 da referida norma, a responsabilidade
pela entrega da totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos da lei, pode ser afastada sempre que o substituto tributário comprove a verificação dos pressupostos para a dispensa total ou parcial de retenção.
- A Requerente alega também que algumas das faturas pagas à D… referem-se a serviços prestados em Espanha (Valência, Alicante e Madrid). Ora, nos termos do n.º 2 do art.º 4.º do CIRC, as pessoas coletivas e outras entidades que não tenham sede, nem direção efetiva em território português ficam sujeitas a IRC apenas quanto aos rendimentos nele obtidos. Ora, ao abrigo da al. c) do n.º 3 da referida norma, os rendimentos ali elencados nos pontos 1 a 7, consideram-se obtidos em Portugal, quando o devedor tenha residência, sede ou direção efetiva em território português ou cujo pagamento seja imputável a um estabelecimento estável nele situado.
- A exceção a esta regra é a de que os rendimentos não se considerarão como obtidos em território português, quando os serviços de que derivam, apesar de utilizados em território português, sejam realizados integralmente fora dele desde que não respeitem a bens situados em território português, ou os serviços não estejam relacionados, com estudos, projetos, apoio técnico ou à gestão, serviços de contabilidade ou auditoria e serviços de consultoria, organização, investigação e desenvolvimento em qualquer domínio (cfr. n.º 4 do art. 4.º do CIRC) (neste sentido, a Decisão Arbitral do CAAD de 12.09.2014 (proc. n.º 418/2014-T).
- Ora, no caso concreto, os serviços prestados pela D…, titulados nas faturas em cima indicadas, não foram utilizados, nem realizados em Portugal, nem estão relacionados com estudos, projetos, apoio técnico ou à gestão, serviços de contabilidade ou auditoria e serviços de consultoria, organização, investigação e desenvolvimento em qualquer domínio. Logo, independentemente da questão da aplicação da CDT Portugal/ Espanha, as transferências efetuadas, em 2017, a favor da D…, para pagamento das faturas em cima indicadas, não poderão ser objeto de tributação em Portugal.
- Assim, as liquidações aqui discutidas estão feridas de ilegalidade, por erro nos pressupostos de facto e erro na aplicação do Direito, devendo, em consequência, ser anuladas e as respetivas quantias, indevidamente pagas, restituídas à Requerente.
- Em relação aos juros compensatórios, a Requerente alega que não foi previamente chamada a pronunciar-se sobre a formação do ato tributário, consubstanciado na liquidação aqui discutida, na parte dos juros compensatórios. Estes surgem, pela primeira vez, no ato decisório final materializado na liquidação, pelo que, também nesta parte, a liquidação padece de ilegalidade, por preterição da formalidade legal essencial prevista no artigo 60.º da LGT.
- No caso concreto da liquidação de juros compensatórios, não oferece dúvidas que a preterição do direito de audição é passível de influenciar a decisão final do procedimento, porquanto de acordo com o artigo 35.º da LGT, depende da imputação ao agente – a título de culpa – do retardamento da liquidação.
- Sobre os juros indemnizatórios, diz a Requerente que no caso da verificação da anulação da liquidação aqui discutida, deverá a AT ser condenada no pagamento à Requerente dos juros indemnizatórios, contabilizados sobre o valor das respetivas liquidações pagas (€ 69.800,00), desde a data do respetivo pagamento (14.09.2020), por força da aplicação do art. 43º, n° 1 da LGT.
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da Requerida
Defende a Requerida que:
- Para poder verificar-se a dispensa de retenção na fonte, de acordo com o disposto no art.º 98º do CIRC, o beneficiário tem de acionar a convenção existente entre Portugal e o seu país de residência.
A referida prova faz-se com a apresentação do formulário (modelo 21-RFI) que deve ser:
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Certificado pelas competentes autoridades do seu estado de residência, ou
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Acompanhado de documento emitido pelas autoridades competentes do respetivo Estado de residência, que ateste a sua residência para efeitos fiscais no período em causa e a sujeição a imposto sobre rendimento nesse Estado.
- Sempre que ocorra o ato de pagamento ou da colocação à disposição de rendimentos, devidos a sujeitos passivos não residentes em território português, as entidades devedoras são obrigadas a entregar uma declaração modelo 30 até ao segundo mês seguinte, obrigação a que se refere o n.º 7 do art.º 119º do CIRC, por remissão do art.º 128º, também do CIRC.
- No caso de a entidade beneficiária do rendimento não entregar o modelo 21-RFI, devidamente certificado pelo Estado de residência, até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto, resulta da lei (conjugação do disposto no n.º 1 do art.º 132º e do n.º 5 do art.º 98º, ambos do CIRC) que fica o substituto tributário obrigado a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido.
- Quando exista a obrigatoriedade de retenção na fonte, nomeadamente por não ter sido apresentado o formulário modelo 21-RFI certificado, em devido tempo, a entidade residente deve proceder à entrega do valor da retenção na fonte ao Estado Português até ao dia 20 do mês seguinte em que foram deduzidas, ou deviam ter sido, nos termos do art.º 94º, n.º 6 do CIRC.
- Entre Portugal e Espanha foi celebrada, em 26 de outubro de 1993, a Convenção para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento (CDT) que foi aprovada, para ratificação, pela Resolução da Assembleia da República n.º 6/95, de 29 de junho de 1994, e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 14/95, de 28 de janeiro (Diário da República n.º 24, 1.ª Série - A, de 28 de janeiro de 1995).
- Para acionar a referida CDT, os beneficiários do rendimento devem fazer prova perante a entidade que se encontra obrigada a efetuar a retenção na fonte, até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos das normas legais (cf. nº 2 do art.º 98º do CIRC).
- Relativamente aos juros compensatórios, os mesmos são devidos de acordo com o art.º 35º da LGT, que os prevê relativamente às importâncias não retidas ou, se retidas, não entregues no prazo legal.
Pagamentos à D… SL
- Da análise das faturas resulta que se referem à prestação de serviços de natureza empresarial (de consultoria, de apoio técnico e acompanhamento à gestão).
- Determina o n.º 7 da alínea c) do n.º 3 do artº 4º do CIRC, que se têm por obtidos em território português os rendimentos derivados de prestações de serviços realizados ou utilizados em território português, quando o seu devedor tenha residência em território português, com exceção dos rendimentos relativos a transportes, comunicações e atividades financeiras. No entanto, a retenção na fonte é excluída quando aqueles serviços, sendo realizados integralmente fora do território português, não respeitem a bens situados nesse território nem estejam relacionados com estudos, projectos, apoio técnico ou à gestão, serviços de contabilidade ou auditoria e serviços de consultoria, organização, investigação e desenvolvimento em qualquer domínio, conforme se dispõe na segunda parte do n.º 4 do art.º 4º do CIRC.
- Sempre que ocorra pagamento ou colocação à disposição de rendimentos a entidades não residentes é de entrega obrigatória uma declaração de modelo oficial (30), nos termos do n.º 7 do artº 119º do CIRS, por remissão para o art.º 128º do CIRC. A declaração é apresentada eletronicamente até ao final do segundo mês sobre o pagamento ou a colocação à disposição dos rendimentos.
- A Requerente cumpriu aqueles normativos e entregou a declaração modelo 30 (exercícios de 2017 e 2018), relativamente aos pagamentos feitos à D…. No entanto, não efetuou retenção na fonte do imposto devido, no momento do pagamento ou da colocação à disposição.
- A Requerente indicou na declaração modelo 30 que a retenção de imposto era nula em virtude de o regime daquela tributação ser feita nos termos de uma convenção para evitar a dupla tributação.
- Ora, de acordo com os n.ºs 1 e 2 do CIRC, aquele que paga só fica dispensado da retenção na fonte se o sujeito passivo (o não residente) apresentar o formulário modelo 21-RFI devidamente certificado.
- A Requerente, em sede de audição, requereu a realização de diligências de prova complementar pela AT, as esta defende-se dizendo que ´ónus da prova do direito a beneficiar de uma isenção fiscal incumbe a quem invoca o direito.
- Invoca a AT o dispositivo normativo contida no n.º 2 do art.º 98º do CIRC, do seguinte teor Nas situações referidas no número anterior, bem como nos n.ºs 12 e 16 do artigo 14.º, os beneficiários dos rendimentos devem fazer prova perante a entidade que se encontra obrigada a efetuar a retenção na fonte, até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos das normas legais aplicáveis: a) Da verificação dos pressupostos que resultem de convenção para evitar a dupla tributação ou de um outro acordo de direito internacional ou ainda da legislação interna aplicável, através da apresentação de formulário de modelo a aprovar por despacho do membro do Governo responsável pela área das finanças: 1) Certificado pelas autoridades competentes do respetivo Estado de residência; ou 2) Acompanhado de documento emitido pelas autoridades competentes do respetivo Estado de residência que ateste a sua residência para efeitos fiscais no período em causa e a sujeição a imposto sobre o rendimento nesse Estado;
- Esta prova é feita pela entrega pelo beneficiário efetivo do rendimento, Formulário 21-RFI, devidamente certificado pelas autoridades fiscais do estado de residência do beneficiário ou então na entrega do mesmo acompanhado por documento emitido pelas referidas autoridades fiscais que comprove a residência do beneficiário, para efeitos fiscais no período em causa e a sujeição a imposto sobre o rendimento nesse Estado. Não sendo efetuada a prova até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto, fica o substituto tributário obrigado a entregar a totalidade do imposto (nº 5 do art.º 98º do CIRC).
- Não obstante, o nº 6 do mesmo artigo estipula que a responsabilidade da entrega do imposto pelo substituto tributário pode ser afastada sempre que seja comprovado com os mencionados documentos a existência dos pressupostos para a dispensa total ou parcial de retenção, existindo, no entanto, uma responsabilidade contraordenacional.
- Caso exista a obrigação de efetuar a retenção na fonte, nomeadamente por não ter sido apresentado o formulário modelo 21-RFI certificado, em devido tempo, a entidade residente deve proceder à entrega do valor da retenção na fonte ao Estado português até ao dia 20 do mês seguinte, em que foram deduzidas, ou deviam ter sido, ao abrigo do disposto no artigo n.º 6 do artigo 94.º do CIRC.
Pagamentos A C…, S.L. UNIPERSONAL
- A C…, S.L. UNIPERSONAL é uma sociedade com sede em Espanha, onde se encontra registada no VIES. 47. Contudo, constataram os SIT que em 19-05-2015, aquela procedeu em território nacional, à sua inscrição como “contribuinte especial”, obtendo assim, a qualidade de sujeito passivo não residente sem estabelecimento estável, ao qual foi atribuído o número de identificação fiscal português nº …. Ora, para ativar este mecanismo é necessário cumprir com os requisitos enunciados no n.º 1 e n.º 2 do artigo 98.º do CIRC, ou seja, estar na posse de documento probatório – formulário modelo 21-RFI, devidamente certificado pelas entidades competentes do seu Estado de residência – Espanha ou o dito modelo acompanhado de documento emitido pelas autoridades competentes do respetivo Estado de residência que ateste a sua residência para efeitos fiscais no período em causa e a sujeição a imposto sobre o rendimento nesse Estado.
- Nessa sequência, em 10-03-2020, foi também solicitada à Requerente a apresentação do Mod. 21-RFI, e/ou outro documento, que permita verificar e validar, as condições da dispensa de retenção na fonte do imposto português. Em resposta foi apresentado pela Requerente o formulário, com data de certificação pelas autoridades Espanholas de 18.03.2016 (pág.48 e 49 do RIT). Em sede de direito de audição, veio a aqui Requerente alegar que o Mod. 21 RFI apresentado, devidamente certificado, com validade para o ano de 2017, demonstra que a beneficiária dos rendimentos é residente em Espanha e ai sujeita a imposto.
Outras alegações
- Para efeitos de dispensa de retenção na fonte, no âmbito da aplicação das CDT, à data do pagamento do rendimento, o formulário deve estar não só certificado, mas também vigente. Ora, a validade é de um ano a contar da data de certificação por parte da autoridade competente do Estado de residência da entidade beneficiária dos rendimentos, nos termos da alínea b) do n.º 3 do artigo 98.º do CIRC. Deste modo a validade havia expirado em 18.03.2017, tendo os pagamentos sido efetuados em outubro e novembro de 2017, o Mod. 21 RFI já não se encontrava válido.
- Na sequência da aprovação, por Despacho do Ministro de Estado e das Finanças, dos novos formulários Mod. 21, 22, 23 e 24 - RFI, para aplicação das Convenções para Evitar a Dupla Tributação Internacional, foi emitida a Circular n.º 5/2008, veiculando instruções administrativas sobre este procedimento bilateral, entre Portugal e Espanha, ratificando vários formulários nas línguas portuguesa e espanhola, bem como a respetiva entrada em vigor. Esta regulamentação complementar, designadamente no referente ao meio de prova, veio a ser posteriormente integrada no normativo nacional e está atualmente vigente na alínea a) do n.º 2 do artigo 98º do CIRC, sendo uma exigência que decorre da lei fiscal, em harmonia com a Convenção celebrada entre Portugal e Espanha.
- Deste modo, a pretender ativar o acordo bilateral, deve ser dado cumprimento ao artigo 98.º do Código do IRC, com especial enfoque exigências probatórias consignadas no seu n.º 2 e, dentro destas, a apresentação de «formulário de modelo a aprovar por despacho do membro do Governo responsável pela área das finanças» que, no caso concreto, é o MOD. 21-RFI, certificado pelas autoridades competentes do Estado de residência ou acompanhado de documento emitido por estas que ateste a residência fiscal no período em causa e a sujeição a imposto sobre o rendimento nesse Estado.
- Ainda que a prova dos pressupostos da não obrigação de efetuar a retenção na fonte se pode fazer por outro meio idóneo, e não apenas através da apresentação do formulário Mod. 21-RFI, a verdade é que o documento junto pela Requerente não permite atestar nada mais além da residência fiscal, ao contrário do que a própria Requerente defende. O que, para efeitos do exercício de subsunção ao preceito legal aplicável, é insuficiente.
- Face ao exposto, conclui-se que a Requerente não demonstrou, como lhe era imposto, estarem verificados os pressupostos da não obrigação de efetuar a retenção na fonte e a subsunção destes casos ao disposto nos artigos suprarreferidos, não estando, por isso, verificados os pressupostos da não obrigação de efetuar a retenção na fonte.
II – SANEAMENTO
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As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas (art.ºs 4º e 10º, n.º 2 do RJAT e 1º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
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O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente para conhecer o pedido (art.º 2º, n.º 1, a) do RJAT).
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O processo não enferma de nulidades;
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A Requerente não suscitou qualquer questão prévia que deva ser conhecida de início pelo Tribunal.
III – QUESTÕES DECIDENDAS
A questão a decidir nos autos tem a ver com a natureza jurídica do requisito exigido pela Administração Tributária de apresentação do formulário modelo 21-RFI para efeitos da inexigibilidade da retenção na fonte previstas no n.º1 do art.º 98º do Código do Imposto sobre as Pessoas Coletivas (CIRC).
IV - FUNDAMENTAÇÃO
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da Matéria de Facto
Com base nos documentos juntos pelas partes e no testemunho prestado neste Tribunal Arbitral, consideram-se provados os seguintes factos:
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A Requerente é uma sociedade comercial sob a forma de sociedade anónima.
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O objeto social da Requerente é “importação, exportação e comércio de representações e produtos para as empresas da área do comércio e serviços, prestação de serviços e assistência técnica. Transformação de todo o tipo de suportes, materiais de impressão e comunicação digital. Fabricação de componentes eletrónicas. Fabricação de lâmpadas elétricas e de outro equipamento de iluminação. Reparação e manutenção de equipamento elétrico. Aluguer de máquinas e equipamentos.”
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Em sede do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Coletivas, a Requerente enquadra-se no regime geral de tributação.
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A Requerente foi submetida a inspeção tributária efetuada em cumprimento das Ordens de Serviço n.ºs n.ºs OI2019…, para o período de tributação de 2016 e OI2019…, para o período de tributação de 2017, emitidas pelos Serviços de Inspeção Tributária.
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Na contabilidade da Requerente foram registados, para além do mais, os seguintes pagamentos efetuados em 2017: um total de €83.595,65 à sociedade D… SL e outro à sociedade C… SL UNIPERSONAL, de €23.630,04.
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No ano de 2018, a Requerente registou pagamentos, também à D… SL, do montante de €160.564,23.
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A Requerente não efetuou a retenção na fonte dos valores pagos àquelas entidades.
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A Requerente procedeu à entrega atempada das respetivas declarações de rendimentos relativos aos anos de incidência da ação inspetiva.
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A D…, SL é uma sociedade domiciliada em Espanha, com o número de identificação espanhol … e sede em Calle …, num. .., piso …, pta. …, 28001 Madrid.
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A D… está registada no sistema VIES, com o n.º …, desde 29.07.2016, com o código de atividade 6920 (atividades de contabilidade e auditoria, consultoria fiscal).
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Em relação à D…, a Requerente, em sede de audição prévia, juntou um documento emitido e certificado pela Autoridade Tributária espanhola (Agencia Estatal de Administración Tributaria), datado de 16.06.2020, denominado de “Certificado de Situación Censal”.
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Em relação aos exercícios de 2017 e 2018 a Requerente entregou a declaração oficial modelo 30 relativamente aos pagamentos que efetuou à D…, mas não procedeu à retenção do imposto na fonte em relação a esses pagamentos.
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A C…, S.L. UNIPERSONAL é uma sociedade domiciliada em Espanha, com o número de identificação espanhol … e sede na Avenida …, …, …, 36940 Pontevedra.
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A C…, S.L. está registada no sistema VIES, cuja atividade económica se desenvolve nas áreas de comércio por grosso de máquinas e equipamentos, comércio por grosso de máquinas e ferramentas.
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Relativamente à C… foi apresentado, junto da AT, o modelo 21-RFI, certificado pelas autoridades tributárias espanholas, em 18.03.2016.
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Esta sociedade procedeu ao seu registo em Portugal como “contribuinte especial”, na qualidade de sujeito passivo não residente e sem estabelecimento estável, ao qual foi atribuído o NIF ….
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Em 19 de setembro de 2020 a Requerente procedeu ao pagamento das liquidações, no montante de € 69.800,00.
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Do Direito
A questão a decidir foi já colocada por diversas vezes tanto nos Tribunais Administrativos, como nos Tribunais Arbitrais que funcionam no âmbito do CAAD.
Assim, o Supremo Tribunal Administrativo pronunciou-se, para além de outros, nos acórdãos: de 2016.12.13 proferido no processo n.º 0141/2014 e de 2011.06.22, proferido no processo n.º 0283/2011.
No CAAD, precederam esta decisão, a título de exemplo, as proferidas nos seguintes processos: n.º 221/20178-T, de 2017.10.27 e n.º 320/2018-T, de 2019.12.4.
Um mesmo facto tributário é suscetível de gerar obrigações tributárias em mais do que um país. Por essa razão têm sido celebradas entre Portugal e vários países convenções bilaterais para evitar a dupla tributação e ainda por essa razão estabelece o n.º 1 do art.º 98º do CIRC que não existe obrigação de efetuar a retenção na fonte de IRC, no todo ou em parte, consoante os casos, relativamente aos rendimentos referidos no n.º 1 do artigo 94º do CIRC quando, por força de uma convenção destinada a eliminar a dupla tributação ou de um outro acordo de direito internacional que vincule o Estado Português ou de legislação interna, a competência para a tributação dos rendimentos auferidos por uma entidade que não tenha a sede nem direção efetiva em território português e aí não possua estabelecimento estável, ao qual os mesmos sejam imputáveis, não seja atribuída ao Estado da fonte ou o seja apenas de forma limitada.
Em 1995 foi celebrada a Convenção entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento (CDT) aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 6/95 e ratificada pelo Decreto Presidencial n.º 14/95, de 28 de Janeiro.
Para efeitos de aplicação da CDT, considera-se no art.º 4º ser residente num Estado signatário qualquer pessoa que, por virtude da legislação vigente nesse Estado, está aí sujeita a tributação, devido quer ao seu domicílio, quer à sua residência, local de direção efetiva ou outro critério de natureza similar.
Como se afirma na Decisão do CAAD proferida a 4 de dezembro de 20199 no processo n.º 320/2018-T, que transcreve da Decisão do CAAD de 17 de outubro de 2017, no n.º 221/2017-T, As convenções para evitar a dupla tributação internacional celebradas por Portugal são fonte de direito fiscal. Assim define o artigo 8º da CRP.
Termos em que, são, pois, os requisitos estabelecidos no art.º 98º, n.º 1 do CIRC e na CDT os fundamentais para dispensar a exigibilidade da retenção na fonte dos pagamentos a entidades com residência, sede ou outro critério de natureza similar em Espanha.
A prova de que as entidades a quem a Requerente procedeu a pagamentos (D… e a C…) não são residentes em Portugal nem aqui possuem a sede nem direção efetiva nem estabelecimento estável, a que sejam imputáveis os rendimentos auferidos em território nacional está feita no RIT (pags 47 a 50). Com efeito, esta realidade é admitida pela AT, considerando unicamente que a mesma não está comprovada como entende que deve estar: através da apresentação de um formulário de modelo 21-RFI devidamente certificado pelas congéneres autoridades espanholas.
Afirma-se no RIT que perante a factualidade relatada, e estando em causa rendimentos obtidos por uma entidade não residente sem estabelecimento estável, só existe dispensa de retenção na fonte, nos termos do n.º 5 do artigo 98º do CIRC, caso a entidade beneficiária apresente o modelo 21-RFI válido, até ao prazo estabelecido para a entrega do imposto.
A introdução da exigência de apresentação do formulário modelo 21-RFI foi feita pelo despacho do Ministro das Finanças n.º 4743-A/2008, de 8 de fevereiro, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 37, de 21 de fevereiro de 2008 (depois sujeito à retificação 427-A/2008, de 25 de fevereiro publicada no Diário da República, 2.ª série, n.º 43, de 29 de fevereiro de 2008) cujo objetivo foi a aprovação dos formulários modelos 21-RFI a 24-RFI, destinados a permitir a aplicação dos benefícios previstos nas convenções para evitar a dupla tributação internacional celebradas por Portugal.
Posteriormente Portugal apercebeu-se de que nem todos os ordenamentos jurídicos dos vários países com os quais celebrara convenção para evitar a dupla tributação admitiam as exigências daqueles formulários, pelo que novo despacho do Ministro das Finanças foi aprovado, o n.º 22600, de 7 de Outubro de 2009.
No preâmbulo deste último despacho, o mesmo foi justificado do seguinte modo: Tendo em conta que as autoridades fiscais de alguns Estados contratantes das referidas convenções estão impossibilitadas, designadamente por imposição da sua legislação ordinária interna, a autenticar o quadro dos formulários mencionados que é destinado à certificação de residência fiscal ao abrigo do artigo 4.º das mesmas.
As exigências aparecidas depois da entrada em vigor das convenções para evitar a dupla tributação – que as não preveem – por despacho ministerial, são obviamente unilaterais e de força normativa muito inferior às disposições legais quer das convenções quer do próprio CIRC.
Como também se afirma na já citada Decisão do CAAD proferida no processo n.º 320/2018-T O princípio da hierarquia das fontes de direito fiscal assenta na não contradição entre normas do mesmo sistema, em que uma norma hierarquicamente superior prevalece, em caso de contradição, sobre a norma hierarquicamente inferior.
Nos presentes autos, repete-se, ficou provado que as duas entidades às quais a Requerente efetuou pagamentos sem que tivesse procedido às respetivas retenções na fonte têm as suas sedes e direções efetivas em Espanha. Isto mesmo foi dito pela Requerida no Relatório de Inspeção Tributária (RIT).
Assim, há que reconhecer que com esta prova encontram-se preenchidos os requisitos previstos no n.º 1 do art.º 98º do CIRC e na CDT.
Não é este, porém, como já se disse, o entendimento da AT, que considera que a prova tem de ser feita através da apresentação dos formulários modelo 21-RFI devidamente certificados.
Aqui chegados, encontramo-nos no cerne da questão, ou seja, o da natureza da prova exigida pelo despacho ministerial e contida nos formulários constitui um requisito essencial ou não? Ou, dito de outra forma: é um requisito ad substantiam ou ad probationem?
O Supremo Tribunal Administrativo, no sumário do seu acórdão de 14 de dezembro de 2016, proferido no processo n.º 141/14 afirma:
«I – Existindo convenção destinada a evitar a dupla tributação há, para efeitos de conhecer da dispensa de efectuar a retenção na fonte de IRC, que atender apenas aos pressupostos materiais convencionados.
II – As normas convencionais vinculam os Estados contratantes não podendo ser alteradas pela lei interna de um deles, dada a primazia do direito convencional sobre a lei interna.
III – Ainda que seja da competência de cada um dos Estados contratantes regular as normas procedimentais para efeitos da aplicação da convenção não pode aproveitar-se tal facto para em norma procedimental alterar os pressupostos materiais de aplicação da convenção sob pena de violação das normas convencionadas e do disposto no n.º 1 do artigo 1º da LGT.
IV – Resulta da interpretação dos artigos 103º da CRP e 90º do CIRC que os formulários exigidos como prova da dispensa da retenção na fonte de IRC dos rendimentos auferidos por entidades não residentes são meros documentos “ad probationem, pelo que podem ser apresentados “a posteriori” dentro dos prazos legalmente fixados, podendo ser substituídos nos termos do artigo 364º, n.º 2 do Código Civil.
E mais adiante, na fundamentação, pode ler-se no mesmo aresto, Entende-se que um documento é um documento ad substantiam quando o mesmo integra a própria formação do acto ou negócio jurídico que certifica de modo que esses negócio não se considera legalmente constituído sem que essa formalidade não se efective ou seja substituído por outro documento que não seja de força superior cfr artigo 364 do Código Civil.
Como ensina Mota Pinto in Teoria Geral 3ª edição pp 436 um documento é “ad probationem”, quando resultar da lei que a sua finalidade é apenas a de obter prova segura e não outras finalidades possíveis atinente ao acto ou negócio a que se refere “ do acto ou negócio.
Nesta concepção o documento ad substantiam é elemento constitutivo do acto que documenta.
No caso dos autos os formulários impostos por lei como meio de prova não podem considerar-se como constitutivos da obrigação tributária a que se referem ou seja da criação do imposto e dos benefícios fiscais “in casu” a dispensa da retenção na fonte.
Os requisitos constitutivos da criação dos impostos bem como dos benefícios fiscais depende exclusivamente da lei nos termos do disposto no artigo 103 da CRP que assim estatui: 2 “ Os impostos são criados por lei que determina a incidência a taxa e os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes”.
…
As Convenções sobre a dupla tributação são instrumentos legais que permitem perante à falta de harmonização legislativa fiscal internacional que os rendimentos obtidos num dos países convencionastes por cidadãos estrangeiros oriundos do país convencionado beneficiem de taxa de redução ou de outros benefícios fiscais relativamente aos impostos que discriminam.
E delas constam os pressupostos da sua aplicação. E embora seja certo que as convenções sobre a dupla tributação deixam à disposição dos estados contratantes a possibilidade de regularem as questões procedimentais como é o caso dos autos, há contudo que ter em consideração que a exigência da prova não pode de forma alguma contender com os elementos materiais que determinam a aplicação da convenção.
O que tornando lícito ao legislador nacional proceder a tal regulamentação para comprovação dos pressupostos dessa aplicação o inibe contudo de criar através do meio de prova utilizado mais um pressuposto dessa aplicação.
Como decorre do preceituado no artigo 1º nº 1 da LGT toda a regulação das normas tributárias tem de ter em consideração o disposto nas normas de direito internacional que vigoram na ordem interna.
Quanto deixamos transcrito do aresto do Supremo Tribunal Administrativo é suficiente para a compreensão da questão a decidir nos presentes autos. Como já se deixou expresso, a posição do STA tem sido seguida de forma unânime pela jurisprudência do CAAD, supra identificada.
Na já citada Decisão do CAAD proferida no processo n.º 320/2018-T diz-se o seguinte: O formulário 21-RFI é uma mera formalidade não exigida na Convenção para efeitos de dispensa ou não da retenção na fonte, pelo que a sua apresentação, mesmo tardia, não tem relevância quando está convencionado que será o Estado da residência… a tributar tais rendimentos.
Neste contexto, concordando este Tribunal Arbitral com a fundamentação das mencionadas decisões do Supremo Tribunal Administrativo e do CAAD e tendo sido provado nos autos, inclusive por admissão da Requerida, que as duas sociedades às quais a Requerente procedeu a pagamentos são entidades que pagam os seus impostos em Espanha, estão reunidos os requisitos essenciais para a dispensa da exigência de retenção na fonte por parte da entidade portuguesa que procedeu aos pagamentos às sociedades espanholas.
Torna-se desnecessária, consequentemente, a pronúncia do Tribunal sobre a restante argumentação apresentada pela Requerente.
Há ainda, porém, que decidir acerca do direito a juros indemnizatórios peticionados pela Requerente.
O direito a juros indemnizatórios encontra-se previsto no art.º 43º da Lei Geral Tributária. No caso dos autos o normativo aplicável é o contido na alínea d) do n,º 3 desse artigo, que lhe foi aditado pelo art.º 2º da Lei n.º 9/2019, de 1 de fevereiro. Segundo esta nova alínea, “Em caso de decisão judicial transitada em julgado que declare ou julgue a inconstitucionalidade ou ilegalidade da norma legislativa ou regulamentar em que se fundou a liquidação da prestação tributária e que determina a respetiva devolução”.
V – DECISÃO
Com esta fundamentação, decide o Tribunal julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e, em consequência,
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Determinar a anulação das liquidações com o n.º 2020 …, no valor de € 28.953,49, com data limite de pagamento em 14.09.2020, relativa ao período de 2017, bem como a liquidação n.º 2020 …, no valor de € 40.846,51, com data limite de pagamento em 14.09.2020, relativa ao período de 2018.
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Determinar a devolução à Requerente do imposto indevidamente pago;
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Reconhecer à Requerente o direito a juros indemnizatórios, nos termos da alínea d) do n.º 3 do art.º 43º da LGT
VI – VALOR
Fixa-se o valor do processo em €69.800 (sessenta e nove mil e oitocentos euros), nos termos do disposto no art.º 97º-A do CPPT, aplicável ex vi art.º 29º, n.º1, a) do RJAT e art.º 3º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
VII – CUSTAS
Custas pela Autoridade Tributária e Aduaneira, nos termos do n.º 4 do art.º 22º do RJAT.
Lisboa, 4 de janeiro de 2022
Os árbitros
Desembargador Manuel Luís Macaísta Malheiros, Presidente
Nos termos do art.º 15º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo Decreto-Lei n.º 20/2020, de 01 de maio, atesto o voto de conformidade dos Árbitros Vogais,
Professor Doutor Gustavo Gramaxo Rozeira
Dr. José Nunes Barata