Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 388/2021-T
Data da decisão: 2021-12-06  IRS  
Valor do pedido: € 22.248,03
Tema: IRS – Mais-Valias de não residentes – Discriminação negativa – Revogação parcial do ato.
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DECISÃO ARBITRAL

 

 

I – Relatório

 

  1. Do histórico dos factosIRS – Mais-Valias de não residentes – Revogação do ato – Extinção da instância
  1. A..., contribuinte n.º..., residente na ..., ... Paris, porteira, cujo seu Serviço de Finanças atual é o de Lisboa-..., vem requerer a constituição do tribunal arbitral, ao abrigo do disposto no artigo 99.º, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), e artigos 2.º, n.º 1, alínea a) , 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a), 10.0, n.ºs 1, alínea a), e 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), com fundamento na decisão de indeferimento de 22/04/2021 que foi proferida pelo Diretor da Direção de Finanças de Faro no âmbito do procedimento de reclamação graciosa n.º ...2020... referente ao processo n.º ...2021... (doc. 15), em que se discutiu a legalidade da liquidação de IRS n.º 2020..., relativa aos rendimentos da Autora de 2018 e da Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, mas relativa ao Serviço de Finanças de Tavira (doc. 4).

 

  1. No pedido de pronúncia arbitral é impugnada a legalidade dos atos tributários e requerida a sua ilegalidade e anulação, em razão de:

 

  1. Indeferimento parcial da reclamação graciosa supra referida, respeitante ao processo em epígrafe, e da
  2. Liquidação de IRS n.º 2020..., na importância de € 54.316,39, em que se incluem juros compensatórios no valor de € 1.346,73 (doc.s 15 e 4),

 

  1. Por violação dos artigos 35.º, n.º 1 da LGT, e 91.º e 130.º, n.º 1 do CIRS.

 

  1. Dos factos

 

  1. A Autora reside em França desde 1983 e já em 17.09.2018 tinha como morada de residência inscrita no Sistema de Gestão de Registo de Contribuintes, a ..., ... Paris – cf. decorre do Sistema de Gestão de Registo de Contribuintes, referido na p. 5 do doc. 15 adiante mencionado e junto.

 

  1. Em 30.05.2007 o Sr. B..., com o NIF ... e domicílio fiscal na Rua ..., nº..., ..., ..., ...-... Tavira, foi inscrito na Autoridade Tributária como representante legal fiscal em Portugal da Autora, com domicílio fiscal na Rua ..., ..., ..., ..., ...-... Tavira – cf. referido na p. 5 do doc. 15 adiante mencionado e junto.

 

  1. Por escritura pública de 20.07.2000, a Autora comprou a C... e D..., que lhe venderam, para habitação secundária, o imóvel correspondente à fração autónoma com a letra “B” referente ao rés-do-chão do prédio urbano sito na ..., ..., da freguesia de..., ...-..., Lisboa, descrito na ... Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o nº ... e inscrito na matriz predial urbana daquela Freguesia sob o artigo ... (anterior ...), com o valor patrimonial tributário do imóvel à data, de 116.961$00, correspondente a € 583,42, pelo valor ou preço, à data,  de (4.000.000$00) quatro milhões de escudos, correspondente a € 19.951,92 – cf. certidão de escritura pública e documento complementar que se junta como doc. 1, o qual se dá por integralmente reproduzido.

 

  1. Em 17.09.2018, a Autora vendeu o mesmo imóvel, acima descrito, a E..., pelo valor ou preço, que recebeu, de € 190.000,00 – cf. certidão de escritura pública que se junta como doc. 2, o qual se dá por integralmente reproduzido.

 

  1. Sucedeu, porém, que o Representante Fiscal Sr. B... não apresentou, em nome e por conta da Autora, até 30.06.2019, a declaração dos rendimentos da Requerente, para efeitos de IRS relativo ao ano de 2018 – cf. certidão de 23.09.2020 p. 15 ponto 1 que se junta como doc. 3, o qual se dá por integralmente reproduzido.

 

  1. Por essa razão, o Sr. B... foi notificado pelos serviços da Autoridade Tributária, em 26.09.2019, para cumprir com a obrigação em falta, no prazo de 30 dias – cf. certidão de 23.09.2020 p. 15 ponto 2 que se junta como doc. 3, o qual se dá por integralmente reproduzido.

 

  1. O Sr. B... também não cumpriu, novamente, essa obrigação – cf. certidão de 23.09.2020 p. 15 ponto 3 que se junta como doc. 3, o qual se dá por integralmente reproduzido.

 

  1. Por essa razão, em 17.02.2020 foi elaborada pelo Serviço de Finanças de Tavira a declaração oficiosa n.º..., com Anexo G (Mais-valias e outros incrementos patrimoniais), tendo por base a compra e venda mencionada do mencionado imóvel urbano, de 17.09.2018, considerando-se o valor patrimonial tributário do imóvel acima referido da Autora à data da sua aquisição (de € 583,42) e o respetivo valor de realização (de € 190.000,00) e computando-se juros compensatórios a favor do Estado entre 01.06.2019 e 17.02.2020, de acordo com a declaração mod. 11 de 2018-09-17 – cf. certidão de 23.09.2020 pp. 15 ponto 4 e 17-22 que se junta como doc. 3, o qual se dá por integralmente reproduzido.

 

  1. Seguiu-se a liquidação oficiosa de IRS com o n.º 2020..., efetuada em 2020-02-21, relativa à Autora, representada por B..., residente na R ..., n.º...–..., lugar de ... ... – Tavira, para o ano de 2018, no montante de € 54.316, 39, em que se incluem juros compensatórios de € 1.346,73, com data limite de pagamento em 2020-04-06 – cf. certidão de 23.09.2020 p. 15 ponto 5 que se junta como doc. 3, o qual se dá por integralmente reproduzido.

 

  1. Em 06.08.2020, F... enviou à Autora, para a sua morada em França acima referida, a liquidação oficiosa de IRS com o referido n.º 2020... de 21.02.2020 relativa ao ano de 2018 e acima referida, com um total de valor a pagar de € 54.316,39, correspondente à soma entre a aplicação direta da taxa de 28% ao rendimento coletável (de € 189.177,37) – que corresponderá à diferença entre o valor de realização e o valor patrimonial tributário do imóvel acima mencionado, à data da sua aquisição –, na importância de € 52.969,66, e juros compensatórios liquidados de € 1.346,73 – cf. comunicação de 06.08.2020 que se junta como doc. 4, o qual se dá por integralmente reproduzido.

 

  1. A referida liquidação havia sido enviada para o domicílio fiscal do Sr. B... acima referido, na qualidade de representante fiscal da Autora (cf. doc. 4).

 

  • No entanto, o Sr. B... veio a falecer em 17.02.2020 – cf. assento de óbito que se junta como doc. 6, o qual se dá por integralmente reproduzido, e referido na p. 5 do doc. 15 adiante mencionado e junto.

 

  1. A pedido feito pelo advogado da Autora em 21.09.2020, o Serviço de Finanças de Tavira emitiu e enviou para o filho do Representante Legal (entretanto falecido), F..., que recebeu em 28.09.2020, duas certidões com o seguinte teor, já acima mencionadas:

 

 

Certidão 1:

 

«1. Criação da divergência com o n.º..., em 2019-09-24, por falta de apresentação da declaração mod. 3 relativa ao exercício de 2018;

 

2. Notificação ao sujeito passivo para cumprir com a obrigação em falta no prazo de 30 dias através do ofício GIC-..., enviado para a morada do representante fiscal em 2019-09-26, com o registo dos CTT n.º RY...PT;

 

3. Expirado o prazo de notificação em 2019-10-28, sem a apresentação da declaração mod. 3 em falta;

 

4. Foi elaborada a declaração oficiosa n.º ...-2018-..., em 2020-02-17, com Anexo G (Mais-valias e outros incrementos patrimoniais), tendo este por base o valor patrimonial tributário do imóvel alienado à data da aquisição e o respetivo valor de realização, constante da declaração mod. 11 de 2018-09-17;

 

5. Liquidação oficiosa de IRS n.º 2020..., no referido valor de € 54.316,39, relativa ao exercício de 2018, com data limite de pagamento em 2020-04-06».

 

Certidão 2:

 

«Face aos elementos disponíveis no sistema informático da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), constata-se que em nome do(a) contribuinte A... com o número de identificação fiscal ..., consta(m) a(s) declaração(ões) modelo 3 de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares (IRS), discriminada(s) no quadro infra:

 

ANO

 

DATA

2018

 

2020-02-17

 

– cf. doc. 3 já acima referido».

 

 

  • Em função das mesmas, dos factos ora narrados e das informações disponíveis a eles inerentes, a Autora apresentou, em 30.09.2020, no Serviço de Finanças de Tavira, reclamação graciosa contra a liquidação referida, pedindo a sua anulação e, em resumo, com os seguintes fundamentos, tendo em conta os seguintes factos ou dados (atualizados em requerimento de 17.12.2020 e de acordo com os documentos juntos em 06.10.2020 – dois – 09.10.2020, 17.12.2020 e 15.02.2021):

 

  1. O valor da aquisição do imóvel foi de € 19.951,92 e deveria ter sido atualizado para € 28.132,21, por aplicação do coeficiente de desvalorização de 1,41, nos termos da Portaria n.º 317/2018, de 11 de dezembro, e dos artigos 46º, nº 1, e 50º, nº 1, do CIRS;

 

  1. Ao valor de aquisição assim determinado haveria que somar os seguintes encargos com a valorização do imóvel e das despesas suportadas pela Autora com a sua aquisição e alienação (ou que nele realizar as seguintes deduções), nos termos do artigo 51º, nº 1, alínea a), do CIRS:

 

(1º) - € 609,78, enquanto despesa paga pela Autora de emolumentos de registo e notariado necessários à aquisição do imóvel;

 

(2º) - € 45,00, enquanto despesa paga pela Autora decorrente do cancelamento da hipoteca necessária à aquisição e à posterior alienação do imóvel;

 

(3º) - € 3.432,27, enquanto encargo pago pela Autora com a aquisição de materiais aplicados em obras no imóvel, que o valorizaram e sem os quais essa valorização não teria acontecido;[1]

 

(4º) - € 11.685,00, enquanto despesa paga pela Autora de mediação imobiliária prestada na venda do imóvel necessária à sua alienação;

 

(5º) - € 233,00, enquanto despesa paga pela Autora com a emissão do certificado energético do imóvel necessário à sua alienação;

 

Num total de € 16.005,05;

 

  1. Apurando-se, assim, uma mais-valia imobiliária da Autora relativa ao ano de 2018 de € 145.862,74, corresponde a € 190.000,00 – (€ 28.132,21 + € 16.005,05);

 

  1. Porém, ao valor de € 145.862,74 haveria ainda que ser aplicado o disposto no artigo 43º, nº 2, alínea b) do CIRS, considerando-se então somente € 72.931,37 para efeitos de tributação;

 

  1. E seria sobre este valor de € 72.931,37 que se aplicaria a taxa especial autónoma de 28%, nos termos do artigo 72º, nº 1, alínea a), do CIRS;

 

  1. Perfazendo, assim, um valor de imposto devido pela Autora, por conta do ano fiscal de 2018, de valor não superior a € 20.420,78;

 

  1. Não tendo, por fim, a Autora que pagar os juros compensatórios liquidados, nos termos do artigo 35º, nºs 1 e 3, da LGT, ou, subsidiariamente, eles só deveriam ser contabilizados entre 01.07.2019 e 17.02.2020 (data da liquidação oficiosa);

 

– cf. cópias que se juntam como docs. 7 a 12, os quais se dão por integralmente reproduzidos.

 

o) Em 25.03.2021 foi elaborada pelo Diretor da Direção de Finanças de Faro, sobre informação dos serviços, proposta de decisão de deferimento parcial da reclamação graciosa à qual foi atribuído o nº ...2020... referente ao processo nº ...2021..., dando-se razão à Autora, exceto quanto:[2]

 

  1. ao valor da aquisição de materiais aplicados em obras no imóvel, na importância de € 3.432,27.

 

  1. à aplicação ao caso do disposto no artigo 43º, nº 2, alínea b) do CIRS e

 

  1. e ao não pagamento de juros compensatórios – cf. cópia que se junta como doc. 13, o qual se dá por integralmente reproduzido.

 

  • Da apreciação da reclamação graciosa consta que foram aceites os valores respeitantes às despesas inerentes à aquisição e alienação, cfr. Doc.s 6, 6, 25 e 26, anexos à RG, por devidamente comprovados, no montante de € 12.572,78.

 

  1. Donde, conforme é também referido na apreciação da reclamação graciosa, o ganho do sujeito passivo é constituído pela diferença entre o valor de realização e de aquisição, cfr. al. a) do n.º 4 do artigo 10.º do CIRS, acrescendo ao valor de aquisição as despesas e encargos previstos no art.º 51.º, n.º 1. alínea) do CIRS.

 

  1. E ainda que, quanto aos juros compensatórios, são devidos face ao disposto no art.º 35.º, n.º 1 e 6 da Lei Geral Tributária (LGT), por a declaração ter sido apresentada fora do prazo legal. No entanto, relativamente à sua contagem, é referido que, nos termos do art.º 35.º, nºos 3 e 7 da LGT, “irão ser contados desde o termo do prazo de apresentação da declaração, em 2019/07/01, até à data da correção da situação com a elaboração da declaração oficiosa pela AT.

 

  1. A Autora foi notificada desta proposta de decisão para audição prévia por correio registado de 07.04.2021 (cf. doc. 13).

 

  1. 18. Em 13.04.2021, a Autora exerceu o seu direito de audiência prévia, pedindo:

 

  1.  a realização de diligências complementares de prova para apuramento do valor de € 3.432,27 relativo a encargo com a aquisição de materiais aplicados em obras no imóvel,

 

  1. o não pagamento de juros compensatórios e

 

  1. aplicação ao caso do disposto no artigo 43º, nº 2, alínea b) do CIRS – cf. cópia que se junta como doc. 14, o qual se dá por integralmente reproduzido.

 

  1. Por decisão de 22.04.2021, sobre informação dos serviços, o Diretor da Direção de Finanças de Faro manteve o sentido daquela proposta de decisão de indeferimento parcial da reclamação graciosa quanto aos pontos referidos e deferindo-a no restante, com a elaboração de um documento de correção que procede à anulação (parcial) da liquidação reclamada e à emissão de uma nova liquidação (presume-se) na parte deferida – cf. cópia que se junta como doc. 15, o qual se dá por integralmente reproduzido e à emissão da liquidação oficiosa de IRS n.º 2021..., na importância de € 42.865,58, em que se incluem juros compensatórios de € 1.062,82.

 

  1. A Autora foi notificada dessa decisão por correio registado de 23.04.2021 (cf. doc. 15).

 

  1. Da decisão de 22.04.2021 do Diretor da Direção de Finanças de Faro decorre que:

 

  1. O valor da realização é de € 190.000,00;

 

  1. O valor da aquisição corrigido é de € 28.132,21;

 

  1. As despesas inerentes à aquisição e alineação a considerar são de € 12.572,78, i.e., os € 16.005,05 invocados, deduzidos dos € 3.432,27 enquanto encargo com aquisição de materiais;

 

  1. O ganho sujeito a IRS é constituído pela diferença entre o valor da realização e o valor da aquisição acrescido das despesas consideradas, i.e., € 190.000,00 – (€ 28.132,21 + € 12.572,78) = € 149.295,01;

 

  1. A este resultado não se aplica o disposto no artigo 43º, nº 2, alínea b) do CIRS;

 

  1. Àquele resultado é assim diretamente aplicada a taxa autónoma de 28%, sendo o imposto apurado de € 41.802,60, i.e., = € 149.295,01 x 28%;

 

  1. A Autora ainda deverá pagar os juros compensatórios liquidados entre 01.07.2019 e a data da correção da situação com a elaboração da declaração oficiosa pela Autoridade Tributária (17.02.2020).

 

 

  1. Desta decisão, a Autora não aceita (da parte indeferida) a

 

  1. não aplicação ao caso do disposto no artigo 43º, nº 2, alínea b) do CIRS (para, após a sua consideração, então sim ser aplicada a taxa autónoma de 28% prevista no artigo 72º, nº 1, alínea a), do CIRS à diferença entre o valor da realização e o valor da aquisição acrescido das despesas aceites) e

 

  1. o pagamento dos juros compensatórios liquidados.

 

  1. Por isso, impugna

 

  1. a decisão de indeferimento parcial da reclamação graciosa quanto aos pontos referidos no artigo anterior e

 

  1. na parte em que ainda se mantém o ato de liquidação n.º 2020..., de 21.02.2020[3]; e

 

  1. a questão das liquidações corretivas de IRS por parte da AT;

 

  1. E tudo isto constitui o atual objeto do presente processo arbitral.

 

zz) Segundo a Requerente, o imposto devido pela Requerente relativo ao ano de 2018, na opinião da mesma, decorrente de mais valias imobiliárias pelo ganho na alienação do imóvel descrito nos autos, é, no seu entender, de somente € 20.901,30, i.e., = [€ 190.000,00 – (€ 28.132,21 + € 12.572,78)] x 0,5 x 0,28, sem o pagamento de quaisquer juros compensatórios (de € 1.346,73).

 

Vejamos, então:

 

 

  1. Da revogação parcial, oficiosa, do ato tributário

 

 

  1. A Autoridade Tributária foi notificada em 13/09/2021, do Despacho arbitral, para apresentar Resposta, ao abrigo do artigo 17.º do Regime Jurídico da Arbitragem em matéria tributária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro,

 

  1. Esta entidade vem informar, em 21/09/2021, o Tribunal Arbitral que “por despacho de 2021-09-13 da Subdiretora-Geral do Rendimento, foi revogado parcialmente o ato objeto de impugnação, conforme consta da Informação n.º 403/2021 da DSIRS”, de 2021/07/29, que anexa.

 

  1. De realçar que a informação n.º 403/2021, de 29-07-2021, da Direção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (DIRS), que serve de suporte ao Despacho de concordância da Subdiretora Geral do Imposto sobre o Rendimento, refere expressamente, o seguinte:

 

  1. “Analisados os autos, verifica-se que a requerente vem alegar que o disposto no n.º 2 do artigo 43º do Código do IRS se aplica aos não residentes em Portugal, mas residentes num Estado Membro da União Europeia.

Quanto a esta matéria controvertida (aplicação do disposto no artigo 43º n.º 2 do Código do IRS a não residentes), a decisão deverá ser alterada.

Essa mudança não se deve a uma aplicação da legislação ao caso concreto diferente do que se estaria a fazer aos restantes contribuintes na mesma situação, mas sim a uma alteração do entendimento da Autoridade Tributária, por força do teor do Acórdão de uniformização de jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo (STA) de 09.12.2020, proferido no âmbito do processo n.º 75/20.6BALSB bem como da Decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), de 18.03.2021, proferida no âmbito do processo C-388/19 (Caso “MK”).

Face a essas decisões judiciais, e por as mesma virem contrariar o entendimento da Autoridade Tributária, o Senhor Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais (SEAAF) emitiu o Despacho n.º 177/2021 – XXII, de 2021JUN04, pelo qual foi determinado que nos procedimentos administrativos e nos processos judiciais pendentes é aplicável aos sujeitos passivos não residentes que optaram pelo regime geral a regra de limitação de tributação a 50% do saldo das mais-valias imobiliárias, mantendo a respetiva tributação pelo regime regra previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 72º do Código do IRS, ou seja, a tributação autónoma à taxa específica de 28%.

Quer isto dizer que se aplicam simultaneamente, no caso aqui em análise, e face a este novo entendimento, os artigos 43º n.º 2 e 72º n.º 1 al. a) do Código do IRS.

Pelo exposto, e quanto a esta matéria, deverá ser dado provimento ao pedido.

 

  1. Além desta questão, a requerente vem alegar que incumbia ao representante fiscal a entrega da declaração de rendimentos relativa ao ano fiscal de 2018. Relembre-se que no caso presente a liquidação teve origem na declaração oficiosa elaborada por falta de entrega da referida declaração pelo sujeito passivo.

Ou seja, entende a requerente que “A falta de cumprimento da obrigação acessória de apresentação da declaração de rendimentos foi uma falta do representante legal da Autora e não da própria Autora, porque a obrigação acessória declarativa era daquele e não desta.” (ponto 43º da petição).

Ora, permitimo-nos discordar deste entendimento, pelos fundamentos que se explanarão de seguida.

Consultadas as bases de dados relativas às declarações de IRS, constata-se que, com exceção do ano controvertido (2018), nunca foi entregue o Mod. 3 em nome da requerente.

Acresce que, consultada a escritura de venda do imóvel (melhor identificado nos autos), junta como documento n.º 2, verifica-se que quem esteve presente na outorga foi a requerente e o marido (e não o representante fiscal).

Quer isto dizer que, não obstante pertencer ao representante fiscal, em abstrato, o cumprimento das obrigações acessórias (onde se inclui a apresentação da declaração), no caso concreto o representante fiscal nomeado (melhor identificado nos autos) não teria forma de saber que, relativamente ao ano de 2018, teria de apresentar a declaração Mod. 3 (a menos que a aqui requerente o informasse desse facto).

Assim, a obrigação originária de apresentação da declaração, neste caso, era da requerente. E não pode a mesma alegar o desconhecimento da lei (por viver em França), face ao disposto no artigo 6º do Código Civil: “A ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas.”.

É certo que, posteriormente (já em fase de incumprimento da obrigação declarativa), foi o representante fiscal notificado para a apresentação da declaração. Mas aqui, e mais uma vez, o representante fiscal estaria dependente da entrega dos elementos por parte da requerente. Não se deve olvidar que o representante fiscal atua em nome e por conta do representado (neste caso, a requerente). Isso significa que o representante não terá qualquer capacidade decisória ao nível do cumprimento das obrigações tributárias.

No caso presente, face ao falecimento do representante fiscal, não é possível determinar se houve contacto do mesmo com a requerente, no sentido de lhe serem facultados os elementos a inscrever na Mod. 3.

Ou até, se esse contacto existiu e a requerente não forneceu os elementos, ou deu instruções ao requerente para não entregar a declaração.

Tendo em conta que o representante fiscal faleceu em 2020FEV17, estas são questões que ficarão por responder.

No entanto, não restarão dúvidas que a responsabilidade pela não entrega da declaração Mod. 3 é da aqui requerente.

Assim sendo, estabelece o n.º 1 do artigo 35º da Lei Geral Tributária (LGT) que “São devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária.”.

Por sua vez, o n.º 6 do mesmo artigo e diploma legal, prescreve que “Para efeitos do presente artigo, considera-se haver sempre retardamento da liquidação quando as declarações de imposto forem apresentadas fora dos prazos legais.”

Não estarão, assim, preenchidas as formalidades para a não contagem e cobrança de juros compensatórios.

 

 

lV - Conclusão.

Após apreciação do pedido de pronúncia arbitral, afigura-se-nos que deverá ser concedido provimento parcial ao solicitado.

 

V – Proposta de decisão.

Por tudo o exposto, propõe-se que seja alterada a liquidação n.º 2021..., referente ao IRS do ano fiscal de 2018[4].

Deve remeter-se esta informação à DSCJC (não se remetendo o processo administrativo porque, conforme referido no ponto III supra, foi solicitada a sua remessa diretamente para a DSCJC[5]).

É o que me cumpre informar.

À consideração Superior”.

 

  1. No Requerimento da Requerida dirigido a este Tribunal Arbitral, de 2021/09/21, é dado a conhecer todo o conteúdo da comunicação da AT, em que se inclui a Informação de suporte à decisão, referida nos pontos 6 e 7 da alínea a) no artigo I.

 

 

  1. Da constituição do Tribunal Arbitral e do Saneamento

 

  1. O pedido de pronúncia arbitral foi oportunamente apresentado e foi aceite pelo CAAD e de imediato notificado à Autoridade Tributária nos termos regulamentares.

 

  1. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem, designou como árbitro do Tribunal Arbitral Singular o signatário, que comunicou de imediato a aceitação do encargo.

 

  1. As partes foram oportuna e devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado, qualquer delas, vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

 

  1. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66.B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral singular ficou constituído em 21 de maio de 2021.

 

  1. Donde, o tribunal arbitral tenha sido regularmente constituído e, por consequência, é materialmente competente, face ao preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.

 

  1. Por sua vez, as Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas, conf. artigos, 4.º, 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e n.º 1.º da Portaria n.º 112.º-A/112-A/2011, de 22 de março.

 

  1. E não enfermando o processo de quaisquer nulidades ou exceções que tenham sido invocadas,

 

 

CABE-LHE APRECIAR E DECIDIR.

 

 

II.  Fundamentação 

 

 

Refere-se, desde já, que havia sido efetuada uma liquidação oficiosa inicial de IRS com o n.º 2020..., de 21.02.2020 relativa ao ano de 2018, com uma importância total a pagar de € 54.316,39.

 

Entretanto, tal como já referido nos factos, em consequência da decisão de deferimento parcial da reclamação graciosa à qual foi atribuído o nº ...2020... referente ao processo nº ...2021..., foi dada razão parcial à Autora, com exceção do seguinte:[6]

 

  1. do valor da aquisição de materiais aplicados em obras no imóvel, na importância de € 3.432,27.

 

  1. da não aplicação ao caso do disposto no artigo 43º, nº 2, alínea b) do CIRS e

 

  1. do não pagamento de juros compensatórios – cf. cópia que se junta como doc. 13, o qual se dá por integralmente reproduzido,

 

Daí uma nova liquidação oficiosa retificativa, em substituição da oficiosa inicial, com o n.º 2021..., de 19.06.2021, de que resultou a importância a pagar de IRS do ano de 2018, de € 42.865,58, em que se incluem juros compensatórios de € 1.062,82.

 

Em consequência, o pedido apresentado no CAAD tem por objeto o ato de liquidação antes referido.

 

Na sequência da petição arbitral apresentada pela Requerente A..., o Tribunal Arbitral foi constituído em 10 de setembro de 2021 e, por despacho de 10 do mesmo mês e ano foi determinada a notificação do dirigente máximo do serviço da Administração Tributária, ao abrigo e nos termos do artigo 17.º do RJAT, para, no prazo de 30 dias apresentar Resposta e juntar o respetivo processo administrativo.

 

Entretanto e dentro do prazo de resposta concedido e também dentro do prazo previsto no artigo 13.º, n.º 1 do RJAT, foi este Tribunal Arbitral notificado pela Autoridade Tributária de que “por despacho de 2021-09-13 da Subdiretora-Geral do Rendimento, foi revogado o ato objeto de impugnação, conforme consta da Informação n.º 403/2021 da DSIRS.

 

Desta informação se retira que o ato de liquidação de IRS com o n.º 2021..., respeitante a 2018, efetuada em 2021-06-19, que apresenta um valor de IRS a pagar de € 42.865,58, foi parcialmente revogado.

 

Constata-se, portanto, que a Autoridade Tributária (AT), face ao pedido constituição do Tribunal Arbitral e aos fundamentos nele aduzidos, decidiu reapreciar a liquidação de IRS em causa, n.º 2021..., respeitante ao ano de 2018, na importância de € 42.865,58.

 

Nessa reapreciação, que teve já em conta, parcialmente, os fundamentos da petição arbitral, a AT aceitou, face ao teor do Acórdão de uniformização de jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo (STA), de 2020.12.09, proferido no âmbito do processo n.º 75/20.6BALSB, bem como ao Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), de 2021.03.18, proferido no âmbito do processo C-388/19 (Caso “MK”), em que se decide que aos residentes na União Europeia seja aplicada à tributação autónoma das mais-valias de imóveis a limitação da tributação a 50%, aplicáveis a residentes, com aplicação do disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 72.º do CIRS, ou seja, a tributação autónoma à taxa de 28%, mas apenas sobre 50% das mais valias.

 

Quanto à restante matéria em causa, nada mais foi decidido, pelo que se mantém em litígio a seguinte matéria:

 

  1. A não consideração das despesas com a alegada beneficiação da habitação alienada;
  2. A questão dos juros compensatórios; e
  3. A questão do indeferimento parcial da reclamação graciosa e a liquidação corretiva

 

  1. Quanto ao referido em A. trata-se das faturas que se indicam a seguir, bem como as anomalias que se referem.

 

  1. As despesas com as alegadas obras de beneficiação no interior da habitação alienada, e dos respetivos materiais que terão sido aplicados, pretendem ter como suporte as Faturas e respetivos documentos seguintes:

 

Fatura n.º 18559, de 27.06.2008, no valor de € 7,80 (doc. 9)

Fatura n.º 11033, de 09.08.2008, no valor de € 129,79 (doc. 10)

Fatura n.º 11089, de16.08.2008, no valor de € 44,70 (doc. 11)

Fatura n.º 11124, de 23.08.2008, no valor de € 1.056,82 (doc. 12)

Fatura n.º 11162, de 29.08.2008, no valor de € 231,07 (doc. 13)

Fatura n.º 11191, de 09.09.2008, no valor de € 163,55 (doc. 14)

Fatura n.º 11285, de 18.09.2008, no valor de € 433,54 (doc. 15)

Fatura n.º 11286, de 18.09.2008, no valor de € 73,43 (doc. 16)

Fatura n.º 11287, de 18.09.2008, no valor de € 202,28 (doc. 17)

Fatura n.º 11288, de 18.09.2008, no valor de € 454,62 (doc. 18)

Fatura n.º 11347, de 26.09.2008, no valor de € 493,18 (doc. 19)

Fatura n.º 11468, de 10.10.2008, no valor de € 141,49 (doc. 20)

 

Tudo no total de € 3.432,27.

 

  1. Constata-se, no entanto, que as faturas supra referidas se encontram endereçadas a G..., com morada na ..., Rua n.º..., ... em Camarate, com menção do n.º fiscal de contribuinte n.º ... e que a empresa vendedora, a H..., L.da, refere como sede a Av. ...,  ..., ...-... ..., com o n.º fiscal de contribuinte ... .

 

  1. E o mais relevante é que não é mencionada nas referidas faturas a obra a que se destinam os materiais referidos,

 

  1. Nem consta do processo, quer administrativo, quer arbitral, qualquer faturação da Prestação de Serviços por parte de G... à Requerente, sendo juntos apenas comprovativos de dois depósitos de € 1.000,00 e € 2.400,00, respetivamente em 13.08.2009 e 25.09.2009, na conta de I..., alegadamente esposa de G..., a pedido deste, e entregue em numerário € 32,27, cfr. doc.s 21 e 22, cujo total corresponde apenas aos valores das faturas de materiais antes referenciadas, com as deficiências que a seguir se mencionam.

 

  1. Assim, constata-se que na Fatura n.º 11124, de 23.08.2008, (Doc. n.º 12), os valores das parcelas somam € 227,75 e o total ilíquido indicado é de € 1.056,82, com IVA e após desconto de € 129,85, sem qualquer explicação.

 

  1. E que também a Fatura n.º 11288, de 18.09.2008, (Doc. 18) apresenta uma única venda de € 3,44 e o total, com IVA e desconto de € 13,20, apresentando um total de € 454,62.

 

  1. O mesmo sucede na Fatura n.º 11347, de 26/09/2008, (Doc. 19) em que são faturados 2 sacos de cimento, um de 35 Kg. e outro de 25 Kg., no total de € 12,76, quando o total ilíquido com IVA é de 493,18. E mesmo que se considere que houve um lapso nos parciais indicados de € 7,26 e € 5,50, em vez de € 127,05 (35 Kg cimento X € 3,63) e de € 137,50 (25 Kg. cimento X € 5,50), a sua soma seria de € 264,55 e nunca de € 493,18 como é debitado.

 

As anomalias e omissões referidas só podem levar-nos à conclusão da falta de credibilidade da documentação junta para serem considerados encargos de beneficiação, para efeitos de cálculos das mais-valias devidas, para além da referida falta de documento da prestação de serviços e da indicação do destino dos materiais em causa.

 

  1. Relativamente à questão referida em B. respeitante aos juros compensatórios, importa referir o seguinte:

 

  1. A Requerente invoca o direito ao não pagamento de juros compensatórios, por a falta de entrega ou entrega tardia da declaração mod. 3 de IRS relativa ao ano de 2018 ser alegadamente da responsabilidade do seu Representante Legal, que não cumpriu com as obrigações que lhe incumbiam, ao aceitar a representação da Requerente.

 

  1. Antes de mais, segundo bem refere a AT, não foram entregues declarações de rendimentos mod. 3 em nome da Requerente, pela própria ou seu Representante, relativamente ao ano em causa de 2018.

 

  1. Aliás, conforme consta do processo, o representante fiscal foi devidamente notificado pela AT para apresentação da respetiva declaração. No entanto, ou porque não teria recebido os elementos da Requerente para o efeito, ou porque não estaria na posse dos necessários elementos, pois que, tratando-se de preenchimento do Anexo G, respeitante ao apuramento das mais ou menos-valias relativas à venda da habitação e respetivos valores de compra e venda e respetivos encargos dedutíveis, só a Requerente lhos poderia facultar, pelo que o Representante não terá podido cumprir, mesmo que assim o pretendesse.

 

  1. Por outro lado, sabe-se que o representante faleceu em 17.02.2020 e, por isso, não é hoje possível apurar o que se terá passado entre o Representante e o Representado.

 

  1. De qualquer forma, tendo os juros compensatórios a natureza de imposto, nos termos do n.º 8 do artigo 35.º da Lei Geral Tributária, sempre seriam, portanto, da responsabilidade da Requerente, que, se assim entendesse, se poderia ressarcir da respetiva importância, através de ação comum. Por outro lado, o Representante Fiscal em causa não é um gestor de bens ou direitos. Aliás, o Representante Fiscal, figura prevista no artigo 19.º, n.º 4 da Lei Geral Tributária, com a ressalva prevista no n.º 8 do mesmo artigo, relativamente aos residentes na União Europeia ou Espaço Económico Europeu, não é, à partida, um gestor de bens ou direitos do representado.

 

  1. Donde, reportando-nos à decisão de deferimento parcial da reclamação graciosa, em que se determina a elaboração de um documento de correção que procede à anulação (parcial) da liquidação reclamada e à emissão de uma nova liquidação – cf. cópia que se junta como doc. 15, e à emissão da liquidação oficiosa de IRS n.º 2021..., na importância de € 42.865,58, em que se incluem juros compensatórios de € 1.062,82, nada há a referir, nesta parte, quer se concorde inteiramente com a decisão ou não.

 

  1. Ou seja, naquela decisão da reclamação graciosa, se conclui que:

 

  1. O valor da realização é de € 190.000,00;

 

  1. O valor da aquisição corrigido é de € 28.132,21;

 

  1. As despesas inerentes à aquisição e alineação a considerar são de € 12.572,78, i.e., os € 16.005,05 invocados, deduzidos dos € 3.432,27 enquanto encargo com aquisição de materiais, por não considerados (como conclui agora este Tribunal);

 

  1. O ganho sujeito a IRS é constituído pela diferença entre o valor da realização e o valor da aquisição de € 19.951,92, corrido pelo coeficiente de desvalorização da moeda aplicável, de 1,41, do que resulta o valor de € 28.132,21, acrescido das despesas consideradas, ou seja, de € 12.572,78, conforme consta da alínea anterior (i.e., € 190.000,00 – (€ 28.132,21 + € 12.572,78) = € 149.295,01;

 

  1. Mais se referia na apreciação da reclamação graciosa, que a este resultado não se aplica o disposto no artigo 43º, nº 2, alínea b) do CIRS – e aqui é que a Direção de Finanças de Faro andou mal, - porquanto a Requerente tinha direito à aplicação dos 50% ao valor das mais-valias apurado, por se tratar de residente na EU, conforme decidido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), de 18.03.2021, proferida no âmbito do processo C-388/19 (Caso “MK”).

 

E, em consequência, aplicando somente a 50% àquele resultado de € 149.295,01, nos termos do artigo 43,º, n.º 2 do CIRS, ou seja, a € 74.647,51 a que deveria ser aplicada a taxa autónoma de 28%, nos termos do artigo 72.º, n.º 1 do CIRS, resultaria um imposto de € 20.901,30, acrescido dos respetivos juros compensatórios, por devidos, em consequência do comprovado atraso na liquidação do IRS, pela entrega fora do prazo legal da declaração de IRS do ano de 2018, como foi demonstrado nos autos;

 

Decai, portanto, a Requerente nos juros compensatórios por se mostrarem devidos e na parte das despesas de beneficiação não consideradas, pelos fundamentos já expressos, decaindo a Requerida, na apreciação da Reclamação Graciosa, na não aplicação dos 50%, a que se refere o artigo 43º, nº 2, alínea b) do CIRS, situação que veio a considerar-se a favor da Requerente na Informação já referida, por decisão da AT de 13.09.2021, três dias depois da constituição do Tribunal Arbitral.

 

  1. Finalmente, e no que se refere ao deferimento parcial da reclamação graciosa, conforme atrás se refere:

 

  1. Tal como consta do processo, o deferimento parcial da reclamação graciosa em razão de não lhe terem sido consideradas as faturas alegadamente respeitantes às despesas de beneficiação, por deficiência nalgumas delas, devidamente identificadas e por não se mostrar comprovado o destino dos materiais nelas mencionados, mostra-se correto.

Também ficou a dever-se ao facto de manter a exigência dos juros compensatórios em causa – o que está também legalmente correto, face ao disposto no artigo 35.º, n.os 1, 3 e 6 da LGT e à fundamentação antes expressa.

 

  1. Tudo o mais que era reclamado, com exceção da aplicação dos 50% a que se refere o artigo 43º, nº 2, alínea b) do CIRS, foi-lhe considerado.

 

  1. Donde resultou a revogação da liquidação, para corrigir as anomalias referidas, o que determinou a emissão de uma nova liquidação de IRS, já antes referida, com o n.º 2021..., de 19.06.2021, em substituição da liquidação n.º 2020..., de 21.02.2020, pelos fundamentos a seguir indicados.

 

Assim, quanto à aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 43.º do CIRS, aos residentes na União Europeia ou Espaço Económico Europeu, já a AT se havia pronunciado, conforme Despacho n.º 177/2021 – XXII, de 04.06.2021, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, o que determinou o Despacho de 13.09.2021, da Subdiretora-Geral da área do rendimento, que, por sua vez, revogou também o ato impugnado, entendendo-se – e bem – ser aplicado ao caso o disposto nos artigos 43.º, n,º 2 e 72.º, n.º1, alínea a) do CIRS.

Ocorreu, neste caso uma anulação administrativa, que teve lugar imediatamente a seguir à entrega da petição arbitral e, portanto, antes da discussão da causa.

 

Termos em que se profere a seguinte decisão

 

 

III – DECISÃO

 

 

  1. Obtém vencimento a Requerente quanto à inicial não aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 43.º do CIRS, às mais-valias imobiliárias apuradas, nas 1.ªas e 2.ª liquidações de IRS – o que foi mais tarde corrigido.

 

  1. Obtém vencimento a Requerente quanto às despesas inerentes à aquisição e alineação, consideradas na reclamação graciosa no valor de € 12.572,78.

 

  1. Não obtém vencimento a Requerente, nem inicialmente, nem agora, quanto à não exigência dos juros compensatórios, por devidos, conforme fundamentação antes expressa.

 

  1. Não tem obtém vencimento a Requerente quanto ao direito que a AT tem na revogação da liquidação, em que não lhe eram considerados os 50% sobre as mais-valias imobiliárias, também pela fundamentação expressa;

 

Termos em que se julga parcialmente procedente a Petição Arbitral da Requerente, nos termos e fundamentos antes expressos.

 

 

 

Valor da causa

           

A Requerente indicou como valor da causa o montante de € 22.248,03 (sete mil trezentos e setenta e dois euros e setenta e dois cêntimos), que não foi contestado pela Requerida e corresponde ao valor da liquidação a que se pretendia obstar, pelo que se fixa nesse montante o valor da mesma.

 

São devidos juros indemnizatórios sobre o valor indevidamente liquidado e pago, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 43.º do CIRS.

 

 

 

Custas

 

Nos termos dos artigos 12.º, n.º 2 e 24.º, n.º 4, do RJAT, 4.º, n.ºs 2 e 3 e 4.º, n.º 1, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem e Tabela I anexa a esse Regulamento, fixa-se o montante das custas em € 1.224,00, que fica a cargo da Requerida na proporção de 90,4% e, para a Requerente, na proporção de 9,6% , nos termos do artigo 536.º, n.º 3, segunda parte, do CPC, tendo em conta a não consideração dos juros compensatórios e as despesas inerentes às alegadas beneficiações.

 

            Notifique.

 

            Lisboa, 6 de dezembro de 2021

 

                       

                                                           O Árbitro do Tribunal Singular,

 

                                              

                                                           __________________________

                                                                (José Rodrigo de Castro)

 

 

 



[1] Em itálico pelo Tribunal.

[2] Em itálico pelo tribunal

[3] Note-se que esta liquidação foi substituída pela liquidação n.º 2012..., de 2021-06-16, na importância de € 42.865,58, em que se incluem €1.062,82 de juros compensatórios, e que deu azo ao despacho de revogação parcial pela AT, por despacho da Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, de 2021-09-13, conforme Requerimento da Requerida daquela data.

 

[4] Note-se que a liquidação de IRS aqui referida, com o n.º 2021..., efetuada em 2021-06-19, apresenta um valor de IRS a pagar de € 42.865,58, diferente do respeitante à liquidação oficiosa de IRS com o n.º 2020..., de 21.02.2020 relativa ao ano de 2018, com um total de valor a pagar de € 54.316,39. 

[5][5] Para envio para os autos.

[6] Em itálico pelo tribunal