DECISÃO ARBITRAL
Os Signatários, Dr. José Poças Falcão (árbitro presidente), Dra. Elisabete Louro Martins Cardoso e Dr. Olívio Mota Amador (árbitros vogais), foram designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o Tribunal Arbitral Coletivo, o qual foi constituído em 22 de junho de 2021.
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Relatório
1. A..., S.A., com sede na ..., nº ..., ...‑... ..., que se situa na área de competência geográfica do Serviço de Finanças de ...– ..., titular do Número de Identificação de Pessoa Coletiva ..., na qualidade de sociedade incorporante da B..., S.A., por fusão registada em julho de 2019, com data de produção de efeitos a 1 de janeiro de 2019 (doravante, Requerente), apresentou no dia 22 de março de 2021 pedido de pronúncia arbitral, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e dos artigos 10.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (doravante, RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante, Requerida).
No pedido de pronúncia arbitral (PPA), a Requerente pede:
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que seja declarada a ilegalidade da decisão de indeferimento da reclamação graciosa sub judice — decisão notificada por Ofício com o nº 2020..., datado de 15 de dezembro de 2020, do despacho de indeferimento da Reclamação Graciosa apresentada com vista à anulação da demonstração de liquidação de IVA nº 2019..., emitida em 22 de janeiro de 2019, no âmbito da qual a AT reembolsou a B... no valor de EUR 20.784,87, referente a uma parcela do IVA que foi objeto de um pedido de reembolso no montante total de EUR 415.108,40 — por vício de violação de lei e por erro nos pressupostos de facto e de Direito de que a mesma padece, com as demais consequências legais, nomeadamente,
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o reconhecimento do direito à dedução integral do IVA suportado pela B... e o consequente reembolso do imposto no valor de EUR 394.323,53, acrescido do pagamento de juros indemnizatórios calculados sobre o montante ainda não reembolsado à Requerente, nos termos da alínea a) do nº 3 do artigo 43º da LGT.
2. O pedido de pronúncia arbitral (PPA) foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD em 23 de março de 2021, e foi automaticamente notificado à Requerida.
3. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, em 31 de maio de 2021, ao abrigo do artigo 6.º, n.º 2, alínea a), do RJAT, o Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os Signatários como Árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo, tendo os Signatários comunicado a aceitação do encargo no prazo aplicável.
4. Em 31 de maio de 2021, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo as mesmas manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.
5. Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral Coletivo foi constituído em 22 de junho de 2021.
6. Em 1 de julho de 2021, o Tribunal Arbitral proferiu despacho arbitral ordenando a notificação da Requerida para apresentar Resposta, juntar cópia do Processo Administrativo, e solicitar, querendo, a produção de prova adicional. Deste despacho foi a Requerida notificada na mesma data.
7. A Requerida veio aos autos apresentar Resposta e juntar o processo administrativo em 20 de setembro de 2021 (tempestivamente).
8. Em 4 de outubro de 2021, foi proferido despacho arbitral com o seguinte teor:
“A Requerente deverá informar nos autos no prazo de 8 (oito) dias se, depois da apresentação da Resposta da parte contrária, mantém interesse na produção de prova testemunhal e, em caso afirmativo, indicar, como remissão para os articulados, os pontos de facto que considera essenciais e controvertidos”.
9. Em 12 de outubro de 2021, a Requerente veio aos autos manifestar o seu interesse na produção de prova testemunhal e veio indicar os pontos da matéria de facto alegada na PI sobre os quais as testemunhas irão prestar o respetivo depoimento.
10. Em 13 de outubro de 2021, foi proferido despacho arbitral (notificado em 14 de outubro de 2021) com o seguinte teor:
“I - Ponderando os teores do despacho de 4-10-2021 e do requerimento de 12-10-2021, o Tribunal deliberou agendar para o próximo dia 12-11-2021, com início pelas 14:30, as seguintes diligências:
a) Reunião com as partes, nos termos e para os fins previstos no artigo 18º, do RJAT e
b) Inquirição das testemunhas indicadas e a apresentar pela Requerente.
II - No prazo de 5 (cinco) dias devem as partes informar o CAAD se pretendem deslocar-se às instalações de Lisboa ou à Delegação no Porto (Rua da Constituição, 1293) e ainda se pretendem, fundadamente, participar on line nas diligências ora agendadas, via WEBEX e, neste caso, se as testemunhas serão apresentadas no CAAD em Lisboa ou no Porto, presumindo-se que tal apresentação ocorrerá em Lisboa se nada for dito em contrário dentro do sobredito prazo”.
11. Em 20 de outubro de 2021, a Requerente veio aos autos informar o Tribunal que, para efeitos da realização da reunião do artigo 18.º do RJAT, pretende deslocar-se à Delegação do CAAD no Porto e solicitou que as testemunhas arroladas fossem apresentadas no mesmo local. Na mesma data, o Tribunal proferiu despacho arbitral a determinar que os Serviços do CAAD deverão tomar em consideração o referido requerimento.
12. Em 12 de novembro de 2021, teve lugar na sede do CAAD em Lisboa a reunião do artigo 18.º do RJAT. Presidiu à reunião o Senhor Árbitro, Exmo. Juiz José Poças Falcão, e estiveram também presentes a Exma. Dra. Elisabete Louro Martins Cardoso e o Exmo. Dr. Olívio Mota Amador, na qualidade de árbitros, que participaram na reunião a partir da sede do CAAD em Lisboa, e via CISCO WEBEX MEETINGS. Os representantes do Requerente e da Requerida concordaram (i) com a realização desta diligência pelos meios de comunicação à distância disponibilizados pelo CAAD, via CISCO WEBEX MEETINGS e (ii) com a gravação desta diligência. Foram inquiridas as testemunhas arroladas pela Requerente, melhor identificadas na Ata da diligência.
O Tribunal:
(i) notificou o Requerente e a Requerida para, de modo simultâneo, apresentarem as alegações no prazo de 20 dias;
(ii) designou o dia 20-12-2021 para o efeito de prolação da decisão arbitral; e
(iii) advertiu a Requerente que até à data da prolação da decisão arbitral deverá proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente, nos termos do n.º 3 do artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, e comunicar o mesmo pagamento ao CAAD.
13. Em 2 de dezembro de 2021, a Requerente veio aos autos apresentar as suas alegações e, em 3 de dezembro de 2021, a Requerida veio aos autos apresentar também as suas alegações, nas quais suscitou a exceção de incompetência do Tribunal Arbitral.
14. Em 9 de dezembro de 2021, foi proferido despacho arbitral a conceder o prazo de cinco dias para o Requerente, querendo, se pronunciar sobre a exceção suscitada pela Requerida nas alegações e decidiu, em consequência, prorrogar, nos termos do artigo 21º-2, do RJAT, o prazo para a prolação e notificação da decisão arbitral final.
15. Em 14 de dezembro de 2021, o Requerente exerceu o contraditório relativamente à exceção suscitada pela Requerida.
16. No pedido de pronúncia arbitral, sumariamente, a Requerente defende a dedutibilidade do IVA incorrido pela Requerente na aquisição de serviços de consultoria, de assessoria jurídica, financeira, fiscal e bancária, no âmbito da reorganização da estrutura de financiamento das suas participadas, C... S.A. (“C...”), e D..., S.A. (“D...”), durante o período compreendido entre o primeiro trimestre de 2017 e o primeiro trimestre de 2018.
Entende a Requerente que uma vez que a B..., S.A. (“B...”) não só (i) tinha a intenção, objetivamente comprovada, de prestar serviços tributados em IVA às suas participadas, como (ii) tal intenção veio ulteriormente a materializar-se, após a fusão por incorporação da B... na ora Requerente; o imposto suportado pela B... nos serviços adquiridos no âmbito da reorganização operada é integralmente dedutível à luz da interpretação conferida pela jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”) às normas de cariz comunitário e nacional que disciplinam o direito à dedução deste imposto.
Entende assim a Requerente que:
“Com efeito, ao considerar que a atividade que a B... realizou consistiu na concessão de financiamento às participadas, que os serviços tributados em IVA que a B... tinha a intenção de realizar nunca se concretizaram e que a B... não pode deduzir o IVA suportado no âmbito daquela reorganização, a Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”) demonstra desconhecer por completo os efeitos jurídicos de uma operação de fusão, bem como os ensinamentos da abundante jurisprudência do TJUE e deste Tribunal Arbitral a respeito desta temática”.
“na situação em apreço, a B... tinha uma intenção objetivamente comprovada de prestar serviços tributados em IVA às suas participadas, incorreu em despesas relacionadas preparatórias com a reorganização das suas participadas e veio, efetivamente, a prestar serviços tributados em IVA a essas participadas já na esfera da Requerente”. “O facto de estarem em causa atos preparatórios incorridos com operações de reestruturação da estrutura de capitais das participadas não impede o direito à dedução, conforme parece querer fazer valer a AT”.
Para defender a sua posição, a Requerente baseia-se na doutrina administrativa transcrita em Informações Vinculativas e na jurisprudência (do CAAD e dos Tribunais Administrativos e Fiscais), a qual cita no PPA e nas Alegações finais.
17. Na sua Resposta, sumariamente, a Requerida alega que:
“quem estaria a prestar serviços de gestão às participadas da B... (C..., S.A. e D..., S.A) nos anos de 2016 e até 30 de junho de 2017 era a entidade E... SA, também pertencente ao grupo F... .
Posteriormente a 30-06-2017, data em que a E... SA foi incorporada pela A... SA, passou a ser esta entidade quem manteve a prestação de serviços de gestão às participadas da B... .
Nos artigos 88, 89, 118 e 119, defende novamente a Requerente que a aquisição de serviços de assessoria diretamente relacionados com a obtenção de um empréstimo obrigacionista para financiar a atividade das suas participadas são atos preparatórios de uma atividade que deveria ter sido tributada o que apenas não aconteceu em virtude de ter ocorrido a fusão em que a B... foi incorporada na A... SA.
os serviços de gestão já estavam a ser prestados às participadas da B..., por outra empresa do grupo e após a incorporação dessa empresa pela A..., SA, passou a ser esta a prestar os referidos serviços de gestão.
Assim desde 01-07-2017 que a prestação dos serviços de gestão às participadas da B... vinham sendo prestados pela A..., SA e após a incorporação da B... pela A... não houve qualquer alteração, mantendo-se a prestação desses serviços pela A..., SA.
Conclui-se, portanto, que não existe qualquer relação entre o IVA suportado a montante pela B... e os serviços prestados pela A..., SA após a fusão com aquela sociedade, pois, os valores de IVA deduzido referem-se a IVA suportado em gastos diretamente relacionados com a emissão do empréstimo obrigacionista utilizado, pela B..., na operação de financiamento às participadas e como tal, operação sujeita a IVA mas isenta nos termos do n.º 27 do artigo 9.º do CIVA, e em conformidade, não confere o direito à dedução do imposto suportado a montante.
Os serviços prestados pela A..., SA às participadas da B... já vinham sendo prestados antes da fusão, não tendo havido assim qualquer alteração.
De facto, não se trata sequer de bens ou serviços de utilização mista, o que levaria à utilização dos métodos (afetação real ou pro-rata) de repartição do IVA suportado entre o setor isento e não isento de IVA, pois o imposto em causa, respeita unicamente ao setor isento de IVA.
Não havendo lugar à prestação de serviços de gestão no período em que o IVA foi deduzido, também não poderia ser alegado que as operações financeiras (juros obtidos da concessão de empréstimos) eram meramente acessórias, pois, conforme consta do relatório da inspeção, nos anos de 2017, 2018 e 2019 até à data da cessação da atividade, os rendimentos da B... compreendiam, exclusivamente, os juros recebidos de empréstimos concedidos.
O alegado pela Requerente de que não fazia parte do objeto social, da B..., a operação de financiamento concretizada pelo que não poderia ser considerada como atividade principal não é razão para que assim seja, e em boa verdade foi essa a atividade quase exclusivamente exercida pela B... no período em que esteve em atividade.
Sem prescindir do atrás exposto, importa salientar que a B... em momento algum no procedimento demonstrou a existência de um nexo direto, causal e imediato entre as operações já suportadas a montante e a intenção concreta de essas operações virem a relevar numa atividade tributada para efeitos de IVA.
Dito de outra forma, cabia-lhe a demonstração com elementos objetivos de que as operações relacionadas com a aquisição daqueles serviços de assessoria serão canalizadas para operações tributadas, o que não aconteceu.
Pelo contrário, o que se verifica é que as aquisições de serviços estão exclusivamente relacionadas com a organização e montagem do empréstimo obrigacionista e que este não está diretamente relacionado com qualquer operação tributável, nem com qualquer atividade sujeita e tributada em concreto.
É jurisprudência assente que a concessão por uma holding de empréstimos remunerados às suas participadas, constitui uma atividade económica, efetuada por um sujeito passivo agindo nessa qualidade, na aceção dos artigos 2.º, n.º 1, e 9.º, n.º 1, da Diretiva IVA, contudo a referida operação está isenta de IVA nos termos do artigo 135.º, n.º 1, alínea b) e f) desta mesma Diretiva.
Existem inúmeros acórdãos todos eles reiterando o princípio de que quando os bens ou serviços adquiridos por um sujeito passivo são utilizados para os fins de operações isentas, não pode haver cobrança do imposto a jusante nem dedução deste a montante, veja-se a título de exemplo o Ac. TCAS, proc. 1218/09.6 BELRS, de 03-05-2018.
Dado que a Ancora suportou claramente gastos que têm uma relação direta com uma atividade que não é sujeita, mas sim isenta, nos termos do art.º 9.º n.º 27 do Código do IVA, não lhe assiste o direito à dedução desse imposto, na medida em que, a operação que aqui subjaz, beneficia exclusivamente de uma isenção incompleta.
O que se verifica é que as aquisições de serviços estão exclusivamente relacionadas com a organização e montagem do empréstimo obrigacionista e que este não está diretamente relacionado com qualquer operação tributável, nem com qualquer atividade sujeita e tributada em concreto”.
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Saneamento
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram‑se regularmente representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT, e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
O tribunal foi regularmente constituído e é competente, como melhor se verá infra, em IV/1, na apreciação da exceção de incompetência material suscitada pela AT.
O processo não enferma de nulidades.
Cumpre apreciar e decidir.
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Matéria de Facto
III.1 Factos Provados
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A B... era uma sociedade com sede e direção efetiva em território português, constituída em 25 de julho de 2014, com o capital social inicial no valor de EUR 50.000,00;
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O objeto da B... consistia na produção, distribuição e venda de energia elétrica com recurso a fontes eólicas, através da construção e exploração de parques eólicos e linhas de transporte de energia elétrica, bem como a realização de qualquer outra atividade relacionada com a utilização de fontes renováveis de energia eólica;
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A B... encontrava-se inscrita com a atividade principal de produção de eletricidade de origem eólica, geotérmica, solar e n.e. correspondente à Classificação de Atividade Económica (“CAE”) 35113-R3;
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Em sede de IVA, a B... encontrava-se enquadrada no regime normal de periodicidade trimestral;
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Em 27 de novembro de 2014, foi realizado um aumento de capital de € 200.000,00 na esfera da B..., no âmbito do qual um dos seus acionistas procedeu ao aumento da sua participação através da entrada em espécie das participações sociais detidas nas sociedades operacionais C... e D...;
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A C... era detentora dos parques eólicos de ..., ... e ... e a ... era detentora do parque eólico de ...;
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O relatório e contas da B... referente ao exercício de 2016 refere que:
“A sociedade B..., S.A., adiante designada por B..., foi constituída em 25 de julho de 2014 (…) com o objetivo de passar a deter a totalidade do capital social das sociedades C..., S.A. e D..., S.A.”;
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O mesmo relatório e contas refere que:
“Em 2016 a sociedade B..., através das suas participadas, continuou a promoção e desenvolvimento dos parques eólicos das participadas, tendo finalizado os trabalhos de construção e a fase de testes e ensaios do parque eólico de D.. e do parque eólico de C... (sub-parques de ..., ... e ...) e das respetivas linhas de interligação à rede” (in. Doc. 7);
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“Durante o ano de 2016 salienta-se a obtenção das licenças de exploração definitivas de todos os parques e sub-parques e respetivas linhas elétricas detidos pelas suas participadas, assim como a entrada em exploração dos mesmos” (in Doc. 7);
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“No ano de 2017 perspetiva-se a continuação da exploração do parque eólico de D... e dos sub-parques de ..., ... e ... do parque eólico C... dentro dos parâmetros de disponibilidade contratados com o prestador de serviços de operação e manutenção” (in Doc. 7);
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Em 29 de março de 2017, as partes sociais representativas da totalidade do capital social da B... foram adquiridas pela G..., S.A. (“G...”), tendo a B... passado a integrar o Grupo F...;
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Através da aquisição do Grupo H..., o Grupo F... procurou consolidar e dimensionar a sua posição no mercado em que atua;
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Adicionalmente, a aquisição do Grupo H... permitiu ao Grupo F... passar a contactar com uma tecnologia que já era utilizada pelo Grupo H... e que ainda não era utilizada pelo Grupo F...;
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No âmbito da sua política de aquisições, era e é normal o Grupo F... adquirir grupos de sociedades;
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A estrutura de detenção do Grupo F... caraterizava-se pelo facto de existirem sociedades que por sua vez detinham as sociedades operacionais detentoras dos parques eólicos e que lhes prestavam todos os serviços necessários ao seu funcionamento, nomeadamente, serviços técnicos, administrativos, de operação e manutenção, financeiros, de gestão;
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Esta estrutura de detenção justificava-se pela necessidade de isolar ativos que tinham diferentes procedimentos associados, isolar investimentos que tinham diferentes vidas úteis e mitigar riscos de contaminação do negócio, operativos e financeiros;
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A B... tinha a intenção de prestar serviços tributados em IVA às suas participadas — serviços administrativos, financeiros, de gestão, ambiental, informáticos, legais, entre outros —, a exemplo do que tipicamente sucedia no Grupo F..., no qual existiam sociedades que asseguravam a prestação dos serviços necessários às sociedades operacionais por aquelas participadas e que detinham os parques eólicos;
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A B... só não começou a prestar imediatamente serviços tributados em IVA às suas participadas após a sua aquisição pelo Grupo F... porque o Grupo F... decidiu operar uma reestruturação interna, tendo em vista a simplificação estrutural do Grupo através da fusão de diversas sociedades e da concentração da detenção das participações das sociedades operacionais na Requerente e o refinanciamento do Grupo;
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No contexto da sua integração no Grupo F..., a B... incorreu em despesas relacionadas com a aquisição de serviços de consultoria, assessoria jurídica, fiscal e bancária, tendo em vista a reorganização da estrutura de financiamento das participadas;
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Isto porque, a B... concluiu que, para maximizar a exploração dos parques eólicos das suas participadas, originadora de receita tributada em IVA, seria necessário proceder, previamente ao início da respetiva atividade (prestação de serviços tributados em IVA), à reestruturação dos serviços do grupo empresarial e à otimização dos níveis de endividamento e da estrutura de capitais, o que implicou, naturalmente, a reorganização da estrutura de financiamento das suas participadas;
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Entre o primeiro trimestre de 2017 e o primeiro trimestre de 2018, no âmbito da aquisição dos referidos serviços, a B... suportou o IVA correspondente, tendo efetuado um pedido de reembolso no valor de EUR 415.108,40, o qual se refere ao imposto incorrido no âmbito dos serviços de consultoria, assessoria jurídica, fiscal e bancária relativos à reorganização da estrutura de financiamento das participadas — as operações prévias de reestruturação do Grupo referenciadas configuraram atos preparatórios daquela que seria a atividade (tributada em sede de IVA) da B...;
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Na sequência do pedido de reembolso do IVA suportado pela B..., a referida sociedade foi alvo de um procedimento externo de inspeção, tendo por referência os exercícios de 2016, 2017 e o primeiro trimestre de 2018;
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Neste contexto, a B... foi notificada, através do Ofício nº 2018..., em 30 de novembro de 2018, do projeto de correções do relatório da inspeção, no âmbito do qual os SIT da Direção de Finanças do Porto propuseram o indeferimento parcial do pedido de reembolso do IVA suportado, no montante de €394.323,53;
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Em resultado da ação inspetiva efetuada à empresa “B..., SA.” ao abrigo da OI2018... e OI2018..., tendo como objetivo a análise de um pedido de reembolso do período 2018-03T, no montante de 415.108,40€, resultaram correções em sede de IVA no montante total de 394.323,53€, tendo o reembolso sido deferido parcialmente no montante de 20.784,87€;
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A correção proposta foi efetuada com os fundamentos vertidos no relatório de inspeção — para o qual se remete e que aqui se considera reproduzido para todos os efeitos — no qual a AT conclui que:
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o crédito de IVA e consequente pedido de reembolso deve-se essencialmente ao facto de o sujeito passivo ter procedido à dedução do IVA contido na aquisição de diversas prestações de serviço de consultoria e assessoria jurídica, fiscal e bancária, relacionados diretamente com a emissão de um empréstimo obrigacionista no valor de 200.000.000,00€, subscrito por um sindicato bancário (Banco I..., Banco J..., K..., L... e M...);
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A emissão do empréstimo obrigacionista teve como objetivo a reorganização do financiamento das participadas e em simultâneo a este empréstimo, os empréstimos bancários, contratados pelas participadas Parque Eólico C..., SA e Parque Eólico D..., SA em regime de Project Finance com um sindicato bancário liderado pelo I..., foram liquidados e os respetivos contratos de cobertura assumidos pela B...;
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A Ancora não realizou qualquer operação ativa tributável no decorrer do ano de 2017, 2018 e 2019, concretamente até 29-07-2019, data em que cessou atividade;
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Assim, as despesas, inerentes ao empréstimo obrigacionista e respetivo imposto deduzido, carreou numa acumulação de reportes sucessivos, originando o referido pedido de reembolso;
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Concluíram os SIT que:
(i) Tais operações, associadas ao empréstimo obrigacionista, revestem a natureza de isenções simples, incompleta, parcial, por se tratarem de isenções que não conferem direito à dedução do imposto suportado a montante, pelo que o sujeito passivo, não liquidando IVA sobre a operação isenta, não deduz o imposto que incorre nas aquisições destinadas à sua realização.
(ii) Trata-se de isenções de natureza objetiva, independentemente da qualificação jurídica do sujeito passivo que pratica tais atividades. (Cfr. art.º 9.º do Código do IVA) — tais operações financeiras, constam do art.º 9.º n.º 27 do Código do IVA tipificadas pela Diretiva IVA no art.º 135º, em capítulo dedicado às isenções em benefício de outras atividades. Os serviços financeiros, pela dificuldade em apurar o valor acrescentado demonstra-se particularmente complexa a aplicação do IVA, sendo um exemplo dos «hard tax items» estando por isso isentos de imposto no contexto do sistema europeu do IVA.
(iii) Por princípio é dedutível pelo sujeito passivo o imposto incorrido na aquisição de todos e quaisquer bens e serviços a outros sujeitos passivos, posto que estes sejam utilizados para os fins das suas operações tributadas. Esta referência a “operações tributadas” serve para demarcar que as operações ativas que beneficiem de isenções completas se mantêm intocado o direito à dedução
(iv) Ao contrário, quando estamos perante operações ativas que beneficiem de isenções simples, fica excluído por princípio o direito à dedução e o sujeito passivo passa a suportar na sua esfera o imposto incorrido nessas aquisições. Existem inúmeros acórdãos todos eles reiterando o princípio de que “quando os bens ou serviços adquiridos por um sujeito passivo são utilizados para os fins de operações isentas, não pode haver cobrança do imposto a jusante nem dedução deste a montante”.
(v) Dado que a Ancora suportou claramente gastos que têm uma relação direta com uma atividade que não é sujeita, mas sim isenta, nos termos do art.º 9.º n.º 27 do Código do IVA, não lhe assiste o direito à dedução desse imposto, na medida em que, a operação que aqui subjaz, beneficia exclusivamente de uma isenção incompleta;
(vi) Deste modo, o IVA suportado a montante, ou seja, o IVA faturado pelos fornecedores, e anterior à mecânica de dedução prevista no CIVA, é devido. Contudo, esse IVA não é dedutível, por não ter sido suportado no âmbito da aquisição de serviços utilizados, a jusante, para a transmissão de bens ou prestação de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas;
(vii) Tendo em conta os condicionalismos do direito à dedução previstos no art.º 20.º do CIVA, só poderá deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização das operações sujeitas a imposto e dele não isentas;
(viii) Atento o exposto não se aceitou a dedução do IVA, no montante de 394.323,53€, nos termos e com os fundamentos relatados, pelo que se propôs o deferimento parcial do reembolso, no montante de 20.784,87€.
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Em 14 de dezembro de 2018, a B... exerceu o seu direito de audição, demonstrando a total discordância com os argumentos da AT e com o referido projeto de indeferimento;
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No dia 14 de janeiro de 2019, a B... foi notificada do relatório final da ação de inspeção, através do Ofício nº 2019..., de 9 de janeiro de 2019, no qual a AT manteve a posição no sentido do indeferimento parcial do pedido de reembolso;
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Ulteriormente, a B... foi notificada da demonstração de liquidação de IVA nº 2019..., de 22 de janeiro de 2019, no âmbito da qual a AT, nos termos vertidos no RIT, reembolsou a B... somente no montante de € 20.784,87;
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Em 21 de maio de 2019, por não concordar com os fundamentos propugnados pela AT, a B... apresentou uma reclamação graciosa;
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No âmbito de uma operação de fusão, registada em julho de 2019, com data de produção de efeitos reportada a 1 de janeiro de 2019, a B... foi incorporada, mediante a transferência global do seu património, na A..., Requerente;
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Resulta do projeto de fusão registado que a aludida operação de fusão se enquadrou numa lógica de simplificação da estrutura societária do grupo, bem como numa lógica de racionalização de recursos, redução de gastos e maximização da eficácia da gestão, conduzindo à simplificação jurídica, fiscal, financeira, administrativa e funcional do Grupo F.../H..., permitindo reduzir os respetivos custos operacionais e obter poupanças decorrentes de uma gestão integrada, bem como uma abordagem ao mercado mais eficiente, ao mesmo tempo que possibilitou ao Grupo F.../H... centrar-se no desenvolvimento e aquisição de novos ativos, evitando e reduzindo o tempo dedicado a planear a estrutura financeira e operacional;
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A Requerente prestava serviços tributados em IVA antes da fusão por incorporação da B... e prestou serviços tributados em IVA após a fusão;
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Em 11 de novembro de 2020, a Requerente foi notificada do projeto de decisão emitido pela AT, no âmbito do qual esta propôs o indeferimento da reclamação graciosa, baseada nos argumentos vertidos no RIT;
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Em 21 de dezembro de 2020, a Requerente foi notificada da decisão final que confirmou o indeferimento da reclamação graciosa apresentada.
III.2 Factos não Provados
Não existe outra factualidade alegada que não tenha sido considerada provada e que seja relevante para a composição da lide.
III.3 Fundamentação da matéria de facto
Relativamente à matéria de facto, o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (conforme artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3, do Código de Processo Civil [CPC], aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).
Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de direito (conforme anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao atual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT). Os factos foram dados como provados com base (i) nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral e com o processo administrativo e (ii) nos depoimentos prestados pelas testemunhas, N... e O..., ambos trabalhadores da Requerente, que prestaram os seus depoimentos de forma clara e credível e revelaram conhecimento da matéria objeto dos presentes autos.
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DA APRECIAÇÃO JURÍDICA
1. Em primeiro lugar, há que apreciar e decidir a exceção, suscitada pela AT, sobre a incompetência material e consequente falta de jurisdição do Tribunal Arbitral para conhecer do pedido deduzido pela Requerente.
1.1. A AT veio defender nas alegações a incompetência, em razão da matéria, deste Tribunal Arbitral com os fundamentos seguintes:
a) Pese embora a questão da competência do tribunal seja de ordem pública e preceda qualquer outra, o pedido de restituição de IVA no pedido de pronuncia arbitral tem por objeto o ato de indeferimento do reembolso de IVA solicitado pela Requerente na declaração periódica de março de 2018, o qual está fora da competência do Tribunal Arbitral, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, do RJAT e do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, por não consubstanciar um ato tributário, i.e., um ato de liquidação, mas antes um ato em matéria fiscal que não comporta a apreciação de um ato de liquidação.
b) Donde o Tribunal Arbitral não tem competência para apreciar e decidir a questão de saber se o Requerente tem direito à restituição do IVA em virtude do indeferimento de um pedido de reembolso.
c) Tal situação impõe-se por força dos princípios constitucionais do Estado de direito e da separação dos poderes (cf. artigos 2.º e 111.º, ambos da CRP), bem como da legalidade (cf. artigos 3.º, n.º 2, e 266.º, n.º 2, ambos da CRP), como corolário do princípio da indisponibilidade dos créditos tributários ínsito no artigo 30.º, n.º 2, da LGT, que vinculam o legislador e toda a atividade da AT.
d) Sendo constitucionalmente vedada, por força dos princípios constitucionais do Estado de direito e da separação dos poderes (cf. artigos 2.º e 111.º, ambos da CRP), bem como do direito de acesso à justiça (artigo 20.º da CRP) e da legalidade (cf. artigos 3.º, n.º 2, 202.º e 203.º da CRP e ainda o artigo e 266.º, n.º 2, da CRP), como corolário do princípio da indisponibilidade dos créditos tributários ínsito no artigo 30.º, n.º 2, da LGT, a interpretação, ainda que extensiva, que amplie a vinculação da AT à tutela arbitral fixada legalmente, por tal pressupor, necessariamente, a consequente dilatação das situações em que esta obrigatoriamente se submete a tal regime, renunciando nessa medida ao recurso jurisdicional pleno (cf. artigos 25.º e 27.º da RJAT, que impõem uma restrição dos recursos da decisão arbitral).
e) Deste modo, verifica-se a existência de uma excepção dilatória, consubstanciada na incompetência material do tribunal arbitral, a qual obsta ao conhecimento do pedido, e, por isso, deve determinar a absolvição da entidade Requerida da instância, atento o disposto nos artigos 576.º, n.º 1 e 577.º, alínea a), do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
1.2. Relativamente á exceção suscitada pela AT, a Requerente exerceu o contraditório, nos seguintes termos:
a) Tal como foi invocado na petição inicial e nas alegações escritas, o ato de indeferimento da reclamação graciosa consubstancia o objeto imediato do presente pedido de pronúncia arbitral e a demonstração de liquidação de IVA configura o respetivo objeto mediato. Neste âmbito, o Requerente peticiona a declaração de ilegalidade da decisão de indeferimento da reclamação graciosa e a inerente anulação da demonstração de liquidação de IVA, com todas as legais consequências daí advenientes, nomeadamente, o reconhecimento do direito à dedução do IVA incorrido nos períodos compreendidos entre o primeiro trimestre de 2017 e o primeiro trimestre de 2018 e o consequente reembolso do imposto, sem prejuízo dos juros indemnizatórios que se mostrem devidos à taxa legal em vigor.
b) A ora Requerente em momento algum do presente processo arbitral invocou ou pretendeu que este Tribunal aferisse da legalidade ou da regularidade de qualquer procedimento de reembolso de IVA ou qualquer ato de indeferimento de reembolso proferido pela AT, conforme facilmente se conclui através da análise às peças processuais constantes dos presentes autos. Aliás, a própria AT, nas suas alegações, já havia reconhecido, que o objeto do pedido de pronuncia arbitral era o indeferimento da reclamação graciosa e da demonstração de liquidação de IVA.
c) Como a Requerente já deixou devidamente consignado nos artigos 1.º a 11.º do pedido de pronúncia arbitral, pese embora a alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT, que delimita o âmbito de competência do Tribunal Arbitral, se refira, apenas, à competência para a declaração de ilegalidade dos atos de liquidação, essa competência estende-se, inequivocamente, aos atos de segundo e terceiro grau em que seja apreciada a legalidade dos atos de liquidação, como é o caso dos atos de indeferimento de reclamações graciosas. Isto porque, a arbitragem em matéria tributária pretende consistir num meio alternativo à impugnação para resolução de litígios, como refere a autorização legislativa através da qual o Governo se baseou para aprovar o RJAT, e nos termos da qual o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária.
d) Por seu turno, estabelecem os artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 março, que a Direção-Geral dos Impostos – atualmente integrada na AT – se encontra vinculada à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, nomeadamente nos processos que tenham por objeto a apreciação das pretensões relativas a impostos e, in casu, a pretensão relativa à declaração de ilegalidade do despacho de indeferimento da reclamação graciosa acima melhor identificada.
e) Considerando o exposto, não pode senão concluir-se que o objeto do pedido de pronúncia arbitral formulado pela Requerente não é o ato de indeferimento parcial do pedido de reembolso do IVA, como vem extemporaneamente invocar a AT, mas antes o ato de indeferimento da reclamação graciosa (objeto imediato) e a demonstração de liquidação de IVA (objeto mediato), como igualmente já assumiu a AT. Termos em que se conclui que a exceção de incompetência material do Tribunal Arbitral, suscitada pela AT, deverá ser julgada improcedente, por intempestividade e, sobretudo, por total falta de fundamento e, até, de justificação razoável.
1.3. Cumpre apreciar.
Nos presentes autos arbitrais o pedido é formulado pela Requerente nos seguintes termos:
“(…) deve o presente pedido de constituição de Tribunal Arbitral e de pronúncia arbitral ser julgado procedente, sendo declarada a ilegalidade da decisão de indeferimento da reclamação graciosa sub judice, por vício de violação de lei e por erro nos pressupostos de facto e de Direito de que a mesma padece, com as demais consequências legais, nomeadamente o reconhecimento do direito à dedução integral do IVA suportado pela B... e o consequente reembolso do imposto no valor de EUR 394.323,53, acrescido do pagamento dos correspondentes juros indemnizatórios calculados sobre o montante ainda não reembolsado à Requerente, nos termos da alínea a) do nº 3 do artigo 43º da LGT.”
No pedido de pronuncia arbitral a Requerente esclarece que foi: “(…) notificada por Ofício com o nº 2020..., datado de 15 de dezembro de 2020(3), do despacho de indeferimento da Reclamação Graciosa apresentada(4) com vista à anulação da demonstração de liquidação de IVA(5) nº 2019... (...), emitida em 22 de janeiro de 2019, no âmbito da qual a AT(7) reembolsou a B... no valor de EUR 20.784,87, referente a uma parcela do IVA que foi objeto de um pedido de reembolso no montante total de EUR 415.108,40,(…)”
Efetivamente, resulta dos presentes autos que a AT procedeu à liquidação de IVA (vd., documento n.º 5 anexo ao pedido de pronuncia arbitral). Nestes termos, o que está em causa nos presentes autos é ainda a discussão de legalidade da liquidação de IVA n.º 2019..., de 22 de janeiro de 2019, sem prejuízo do efeito que uma decisão arbitral favorável às pretensões da Requerente possa ter relativamente ao reembolso do IVA.
A este respeito importa referir que, tal como foi salientado pela Decisão Arbitral proferida no processo n.º 660/2017-T, de 12 de março de 2019, “(…) em sede de IVA, a liquidação tem por base o sistema declarativo (autoliquidação), sendo um ato complexo só plenamente entendível se considerado em sentido amplo.” ou seja “só entendível tendo em conta o «mecanismo do crédito e o encadeamento da liquidação-dedução» que, como refere Sérgio Vasques, servem para «assegurar a neutralidade típica do IVA, prevenindo o efeito cumulativo e garantindo que o imposto é suportado em definitivo pelo consumidor final”. Acrescenta ainda a referida Decisão, com relevância para os presentes autos, que decorre, “(…) da estrutura do próprio CIVA, estarmos perante uma noção ampla de liquidação, a qual abrange as deduções e as regularizações de imposto (artigos 19.º a 26.º do CIVA), bem como liquidações administrativas decorrentes de atos de fiscalização e determinação oficiosa do imposto (Capítulo VI do CIVA).”
Assim, face aos elementos documentais disponíveis, foi efetivamente praticado um ato de liquidação, reconduzível à previsão do artigo 2.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, suscetível de ser apreciado pelo presente Tribunal na medida em que se enquadra, diretamente, no âmbito das suas competências.
O âmbito da jurisdição arbitral tributária está delimitado, primeiro, pelo disposto no artigo 2.º, n.º 1, do RJAT que enuncia os critérios de repartição material da competência, abrangendo a apreciação de pretensões que se dirijam à declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos.
Conforme tem salientado diversa jurisprudência arbitral (Cfr., processo n.º 238/2013-T), o processo arbitral tributário, desde a sua génese, teve como objetivo assumir-se como um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial, apesar de o RJAT ter concretizado a autorização legislativa constante do artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril, com um âmbito mais restrito do que o inicialmente previsto. Assim, assumindo-se a arbitragem tributária como uma alternativa à impugnação judicial, sobretudo quando o que está em causa é a ilegalidade de uma liquidação de IVA, considera este Tribunal não existir qualquer limitação da sua competência para decidir do presente processo.
Por fim, importa referir que a Requerente limitou-se a utilizar os meios procedimentais e processuais que a própria AT indicou na demonstração de liquidação de IVA nº 2019..., na qual menciona expressamente que «Da liquidação efectuada, poderá V. Exa. apresentar, no Serviço de Finanças competente, reclamação graciosa ou impugnação judicial nos termos dos artsºs 70 e 102º do CPPT».
Ora, tem entendido a jurisprudência que, quando um administrado seja induzido na utilização de um determinado meio processual por uma conduta da Administração, não poderá esta pretender obstar ao conhecimento do mérito do pedido, escudando-se na inadequação do meio processual cuja utilização ela própria indicou (Cfr. Acórdãos do STA da Secção do Contencioso Administrativo: processo n.º 23205, de 5 de maio de 1987; processo n.º 39578, de 24 de outubro de 1996; processo n.º 46544, de 31 de maio de 2005; Acórdão do STA da Secção do Contencioso Tributário, processo n.º 461/09, de 9 de setembro de 2009; CAAD, processo n.º 185/2014-T, de 24 de outubro de 2014; processo n.º 240/2016-T, de 6 de abril de 2017).
Atendendo ao exposto, este Tribunal entende que o CAAD tem competência para decidir o presente caso ao abrigo do disposto no artigo 2.º, n.º 1, do RJAT e, em consequência, a invocada exceção de incompetência deve ser considerada improcedente.
2. Não tendo procedido a exceção de incompetência material suscitada pela Requerida importa agora aferir da legitimidade da dedução do IVA suportado pela B... na aquisição de serviços de consultoria, assessoria jurídica, fiscal e bancária, tendo em vista a reorganização das suas participadas.
Dos presentes autos resultam que, em matéria de direito, estão em causa as questões do exercício do direito à dedução nos denominados atos preparatórios, bem como nas operações de aquisição de participações sociais no contexto de reorganização empresarial, nomeadamente na fusão por incorporação.
Na análise destas questões o Tribunal terá de atender às regras que regem o IVA de acordo com o Direito da União Europeia, com a respetiva transposição a nível interno e com a interpretação administrativa e judicial que sobre as mesmas tem vindo a ser levada a cabo, especialmente pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE).
A este respeito importa salientar que a jurisprudência do TJUE tem carácter vinculativo para os Tribunais nacionais, quando tem por objeto questões conexas com o Direito da União Europeia.
3. As principais questões de enquadramento jurídico, em termos de Direito da União Europeia e de jurisprudência do TJUE, serão tratadas pela ordem seguinte:
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A dedução do IVA nos atos preparatórios;
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O direito à dedução nas atividades preparatórias;
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O conceito de atividade económica e a sua relação com o direito à dedução relativo à aquisição de participações sociais;
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A dedução do IVA suportado no contexto de operações de fusão de sociedades.
Relativamente a estas quatro questões o presente Tribunal Arbitral subscreve a posição expressa na Decisão Arbitral proferida no processo n.º 404/2018-T, em 23 de abril de 2019.
3.1. A principal jurisprudência do TJUE relativa ao exercício do direito à dedução trata da dedução do IVA nos atos preparatórios, de acordo com a síntese apresentada na Decisão Arbitral n.º 404/2018-T, nos seguintes termos:
“De acordo com o TJUE, o direito à dedução previsto nos artigos 167.º e seguintes da Directiva IVA é parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado. Esse direito exerce-se imediatamente em relação à totalidade dos impostos que incidiram sobre as operações efectuadas a montante[1].
No que respeita à aludida configuração do direito à dedução como característica fundamental do sistema comum, garantindo a neutralidade do imposto, conforme se reconhece no Caso Rompelman[2] e no Caso Comissão/França[3], “[a]s características do imposto sobre o valor acrescentado... permitem inferir que o regime das deduções visa libertar inteiramente o empresário do ónus do IVA, devido ou pago, no âmbito de todas as suas actividades económicas. O sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado garante, por conseguinte, a perfeita neutralidade quanto à carga fiscal de todas as actividades económicas, quaisquer que sejam os fins ou os resultados dessas actividades, na condição de as referidas actividades estarem, elas próprias, sujeitas ao IVA.”[4]
Neste contexto, facilmente se compreende que as exclusões ao direito à dedução sejam de interpretação restrita, conforme se salienta no Caso Metropol[5]. E igualmente se compreende que o Tribunal se preocupe em garantir o carácter total e imediato do direito à dedução, interpretando este aspecto de uma forma ampla.
Assim, no referido Caso Comissão/França, salienta-se que “…na ausência de uma disposição que permita aos Estados-Membros limitarem o direito à dedução conferido aos sujeitos passivos, este direito deve ser exercido imediatamente em relação à totalidade do imposto que onerou as operações efectuadas a montante.”[6]
De acordo com o Tribunal, o conceito de bens e serviços utilizados para os fins das operações tributáveis deverá abranger todas as operações que condicionam o exercício da actividade do sujeito passivo, tais como os actos preparatórios, o marketing, as acções promocionais, etc., que se reflectem nos custos e permitem que a empresa se mantenha em posição concorrencial no mercado. Neste contexto, no Caso Intiem[7] o TJUE precisou que o mecanismo da dedução do IVA regulado pela Sexta Diretiva “deve ser aplicado de tal forma que o seu âmbito de aplicação corresponda, na medida do possível, ao âmbito das actividades profissionais do sujeito passivo”.
Veja-se ainda, nomeadamente, o Caso Lennartz[8], em conformidade com o qual se conclui que a utilização imediata dos bens para os fins das operações tributáveis não é um requisito para a aplicação das regras do direito à dedução e o Caso Rompelman, nos termos do qual se determina que o direito à dedução deve ser concedido relativamente a despesas de investimento realizadas antes de se saber se iriam ser exercidas operações tributáveis (no caso concreto tratava-se de um estudo sobre a rentabilidade).
Com efeito, tal como iremos verificar infra, o TJUE não exige que a actividade tenha já começado para se poder deduzir o IVA, podendo ser deduzido relativamente a actividades preparatórias. Por outro lado, de acordo com o entendimento do TJUE, posição que já foi, aliás, subscrita pela Administração Tributária[9], o direito à dedução, uma vez adquirido, subsiste mesmo que a actividade económica projectada não dê origem a operações tributáveis ou o sujeito passivo, por motivos alheios à sua vontade, não tenha podido utilizar os bens ou serviços que deram origem à dedução no âmbito de operações tributáveis[10].
Acresce que, segundo o Acórdão de 8 de Março de 1988, Intiem[11], o mecanismo da dedução do IVA regulado pela Sexta Directiva “deve ser aplicado de tal forma que o seu âmbito de aplicação corresponda, na medida do possível, ao âmbito das actividades profissionais do sujeito passivo”.
É ainda jurisprudência constante do Tribunal de Justiça da União Europeia que, sendo o direito à dedução um elemento fundamental do regime de IVA, só é possível limitar este direito nos casos expressamente previstos pela Directiva IVA e, ainda assim, com respeito pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade, não se podendo esvaziar o sistema comum do IVA do seu conteúdo.
Cite-se, a este propósito, o Caso Ampafrance, de acordo com o qual “60. Por outro lado, há que recordar que, para que um acto comunitário relativo ao sistema do IVA esteja em conformidade com o princípio da proporcionalidade, as disposições que ele contém devem ser necessárias para a realização do objectivo específico que ele prossegue e afectar o menos possível os objectivos e os princípios da Sexta Directiva.”[12]
Quanto aos direitos conferidos aos particulares pelas normas do direito à dedução citamos o Caso BP Soupergaz, em conformidade com o qual estas normas “33. … indicam, com precisão, as modalidades de determinação da matéria colectável e, respectivamente, as condições de aquisição e o âmbito do direito à dedução. Não deixam aos Estados-Membros nenhuma margem de apreciação quanto à sua aplicação. Deste modo, preenchem os critérios referidos e conferem, por isso, aos particulares direitos que estes podem invocar perante o juiz nacional para se oporem a uma regulamentação nacional incompatível com elas”. [13]
Note-se que igualmente a jurisprudência nacional se tem pautado pelos mesmos princípios que acabámos de citar quanto ao carácter abrangente do direito à dedução. Neste sentido veja-se, designadamente, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) de 8 de Julho de 2009 (ISABEL MARQUES DA SILVA)[14], no qual se salienta que “[o] direito à dedução do imposto suportado a montante, constitui característica fundamental do sistema comum do IVA, essencial para garantia da neutralidade do imposto e "peça-chave" do seu funcionamento.”
Ou seja, resulta claro que o direito à dedução do IVA é um direito fundamental que não pode ser limitado senão nos casos expressamente permitidos pelas normas de Direito da União Europeia ou pelos princípios gerais de direito aceites neste domínio, como o princípio do abuso de direito (tal como o TJUE tem vindo a salientar).
Sendo acto claro que o direito à dedução do IVA deve ser interpretado de forma lata e concedido desde logo, ainda que a actividade projectada não tenha sido iniciada pelo sujeito passivo, relativamente aos designados actos preparatórios, conclui-se, com o TJUE, que as Administrações Tributárias dos Estados membros deverão agir em conformidade com tal interpretação (princípio da conformidade do direito nacional com o direito europeu).”
3.2. Relativamente ao direito à dedução nas actividades preparatórias a citada Decisão Arbitral n.º 404/2018-T, cuja posição estamos a seguir, afirma:
“Particular relevância para o caso em apreço reveste a jurisprudência assente do TJUE no sentido de que, como referimos, não exige que a actividade tenha já começado para se poder deduzir o IVA, podendo ser deduzido relativamente a actividades preparatórias. Veja-se, a este propósito, nomeadamente, o Acórdão Rompelman[15].
Em conformidade com o n.° 23 do Acórdão, o TJUE concluiu que o princípio da neutralidade do IVA quanto à carga fiscal suportada pela empresa impõe que as primeiras despesas de investimento efectuadas tendo em vista a formação de uma empresa sejam consideradas actividades económicas, e seria contrário a esse princípio que as referidas actividades só tivessem início no momento em que, naquele caso concreto, um bem imóvel é efectivamente explorado, quer dizer, no momento em que surge o rendimento tributável. Como faz questão de notar, qualquer outra interpretação do artigo 4.° da Directiva oneraria o operador económico com a despesa do IVA no âmbito da sua actividade económica sem lhe dar a possibilidade de o deduzir, nos termos do artigo 17.°, e faria uma distinção arbitrária entre despesas de investimento efectuadas antes e durante a exploração efectiva de um bem imóvel.
Nos Casos Lennartz[16], Inzo[17], e Gabalfrisa[18] suscitaram-se questões análogas às do Caso Rompelman, designadamente o âmbito de aplicação do conceito de actividade económica e a inclusão dos actos preparatórios neste conceito, tendo o Tribunal confirmado esta jurisprudência.
O princípio da neutralidade do IVA, no que se refere à carga fiscal da empresa, exige, pois, que as despesas de investimento efectuadas para as necessidades e para os objectivos de uma empresa sejam consideradas actividades económicas que dão lugar a um direito a dedução imediata do IVA[19]. Nestes termos, um particular que adquire bens para os efeitos de uma actividade económica na acepção do artigo 9.°, n.° 1, segundo parágrafo, da Directiva IVA, age como sujeito passivo, mesmo que os bens não sejam imediatamente utilizados para essas actividades económicas[20].
Como o TJUE salientou na Caso Inzo e desenvolveu na sua jurisprudência posterior, na ausência de circunstâncias fraudulentas ou abusivas e sob reserva de eventuais regularizações em conformidade com as condições previstas na Directiva IVA, o direito à dedução, uma vez constituído, permanece adquirido[21].“
Neste contexto, o TJUE concluiu inequivocamente que um sujeito passivo, agindo nessa qualidade, que adquiriu um bem de investimento e o afectou ao património da empresa tem o direito de deduzir o IVA que onerou a aquisição desse bem no decurso do exercício fiscal em que o imposto se tornou exigível, independentemente do referido bem não ser imediatamente utilizado para fins profissionais. Em consequência, cabe ao tribunal nacional, por um lado, determinar se o sujeito passivo adquiriu o bem de investimento para os efeitos da sua atividade económica e, por outro, apreciar a eventual existência de uma prática fraudulenta. No caso de verificação de situações fraudulentas ou abusivas, o Fisco pode pedir, com efeitos retroativos, a restituição das quantias deduzidas, porque essas deduções foram concebidas com base em falsas declarações[22].
3.3. Importa agora analisar o conceito de atividade económica e a sua relação com o direito à dedução relativo à aquisição de participações sociais.
Neste ponto, o presente Tribunal continua a sufragar o entendimento constante da Decisão Arbitral n.º 404/2018-T.
As operações desenvolvidas por um sujeito passivo de IVA são classificadas, de acordo com a jurisprudência do TJUE, em:
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atividades não económicas, que deverão ficar à margem da Diretiva IVA, não conferindo direito à dedução;
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atividades económicas, que estão abrangidas no âmbito da Diretiva IVA, distinguindo-se estas em: atividades não sujeitas; atividades sujeitas e isentas; atividades sujeitas e não isentas (ou seja, atividades efetivamente tributadas).
Atendendo ao princípio da neutralidade que enforma o sistema comum do IVA, uma pessoa só deve suportar o IVA se este tiver incidido sobre os bens e serviços que utilizou para o consumo privado e não para as suas atividades profissionais tributáveis[23].
Assim, não é possível deduzir o IVA suportado a montante caso este respeite à atividade do sujeito passivo que não reveste a natureza de atividade económica na aceção da Diretiva IVA.
Para que o IVA possa ser dedutível, exige-se que se verifique uma relação direta e imediata entre as despesas suportadas e o exercício da atividade económica do sujeito passivo.
O TJUE tem delimitado, de forma cada vez mais abrangente, o conceito de “relação directa e imediata” entre os inputs que contêm IVA objeto de dedução e as operações tributadas do sujeito passivo, nomeadamente, no que se refere à gestão de participações sociais.
A jurisprudência do TJUE admite:
“(…) igualmente um direito a dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de um nexo directo e imediato entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, um nexo directo e imediato com o conjunto da actividade económica do sujeito passivo”[24].
Apesar de tudo, é necessário demonstrar inequivocamente que exista uma relação com a atividade económica do sujeito passivo. No Caso Gabalfrisa[25], o TJUE recorrendo a uma “linha jurisprudencial consolidada”, defendeu que, em respeito ao princípio da neutralidade do IVA relativamente ao encargo fiscal de uma empresa, as despesas de investimento efetuadas e necessárias à sua criação deverão ser qualificadas como atividade económica, não estando sequer a dedutibilidade do IVA condicionada à exploração efetiva por parte da empresa.
Nas conclusões do Caso I/S Fini y Skatteministeriet[26], os pagamentos que uma empresa tenha de efetuar durante o período de liquidação, após o encerramento da sua exploração efetiva, fazem parte do conceito de atividade económica, na medida em que o lapso de tempo seja o estritamente necessário para levar a bom termo a operação de liquidação e se acredite que não existe a intenção de atuar de forma fraudulenta ou abusiva. Consequentemente, não se poderá efetuar uma distinção arbitrária entre os gastos efetuados por uma empresa antes da sua exploração efetiva e durante esta, e os gastos incorridos para colocar fim à referida exploração.
O artigo 9.º, n.º 1, 2.º parágrafo, 2.ª parte, da Diretiva IVA, estabelece que na definição de sujeito passivo de IVA “(…) É em especial considerada actividade económica a exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com carácter de permanência”
Quanto ao tratamento a conceder à gestão (aquisição, detenção e alienação) de participações sociais para além do caso das holdings, no contexto das participações de uma sociedade-mãe em filiais ou associadas, decorre da jurisprudência do TJUE que as operações relativas às ações ou participações em sociedades são abrangidas pelo âmbito de aplicação do IVA quando efetuadas no quadro de uma atividade comercial de negociação de títulos ou quando constituem o prolongamento direto, permanente e necessário da atividade tributável[27].
A aquisição de participações sociais é uma operação passiva, logo para se aferir da dedutibilidade do IVA relativa às despesas associadas terá de se analisar em que medida aquela participação é detida e quais são as operações a jusante que decorreram daquelas despesas – serão ou não tais operações atividades económicas sujeitas e não isentas de IVA?
O TJUE no Caso SKF invocou o princípio da igualdade de tratamento e neutralidade fiscal e concluiu pela natureza económica das tomadas de participações acompanhadas com a interferência pela sociedade-mãe na gestão das participadas que deve ser estendida às situações de transmissão de participações que põem termo a essa interferência.
No quadro da transmissão de ações, considera o TJUE no Caso SKF que o direito à dedução do IVA pago a montante sobre prestações destinadas a realizar uma transmissão de ações é conferido, por força do artigo 168. ° da Diretiva IVA, se existir uma relação direta e imediata entre as despesas relacionadas com as prestações a montante e o conjunto das atividades económicas (tributadas) do sujeito passivo, as denominadas “despesas gerais”.
Naquele processo, a transmissão de ações em causa, realizada com vista à reestruturação de um grupo de sociedades pela sociedade-mãe, foi considerada uma operação de obtenção de receitas com carácter permanente de atividades que excedem o quadro da simples venda de ações. Esta operação apresentava um nexo direto com a organização da atividade industrial exercida pelo grupo e constitui assim o prolongamento direto, permanente e necessário da atividade tributável do sujeito passivo, pelo que aquela operação de venda de ações seria abrangida pelo âmbito de aplicação do IVA, suscetível de conferir direito à dedução do IVA dos respetivos inputs.
Em suma, o TJUE considera que estas prestações têm uma relação direta e imediata com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo, permitindo o direito à dedução da totalidade do IVA das referidas prestações.
Foi suscitada a questão de saber se os inputs associados à alienação de participações sociais poderão ser suscetíveis de permitir a dedução do IVA, por via da respetiva qualificação como despesas gerais da atividade, no caso daquela alienação não estar sujeita a IVA, situação mais frequente nas holdings, ou então, estar sujeita mas isenta, como acontece com a sociedade-mãe que gere um grupo de sociedades.
O TJUE, no Caso SKF, salienta o facto de se saber se a sociedade que é sujeito passivo do IVA está ou não envolvida na gestão das sociedades em que tiver ocorrido a tomada de participação, sociedades estas que desenvolvem atividades tributadas.
O TJUE considerou que recusar o direito à dedução de IVA pago a montante por despesas de consultoria ligadas a uma transmissão de ações isenta em razão da envolvência na gestão da sociedade cujas ações são cedidas e admitir este direito à dedução para tais despesas ligadas a uma transmissão que se situa fora do âmbito da aplicação do IVA pelo facto de constituírem despesas gerais do sujeito passivo, levaria a um tratamento fiscal diferente de operações objetivamente semelhantes, em violação do princípio da neutralidade fiscal.
No que toca à dedução do IVA, o TJUE já concluiu no Caso Kretztechnik [28] que numa emissão de ações (apesar de ser, por si só, uma operação que não é abrangida pelo âmbito de aplicação do IVA, dado não se qualificar como transmissão de bens ou prestação de serviços) efetuada num contexto de reforço de capital em proveito da atividade económica geral de uma sociedade, se considera que os custos das prestações adquiridas por uma sociedade fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos seus produtos.
Neste Caso o TJUE decidiu:
“O direito à dedução do IVA que incidiu sobre a aquisição de bens ou serviços a montante pressupõe que as despesas efectuadas com a sua aquisição tenham feito parte dos elementos constitutivos do preço das operações tributadas a jusante com direito à dedução (…).
Porém, admite-se igualmente o direito à dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de uma relação directa e imediata entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito à dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, uma relação directa e imediata com o conjunto da actividade económica do sujeito passivo.” (cfr. §§ 57 e 58)
“Por fim, importa lembrar que o direito à dedução é conferido relativamente ao IVA pago a montante pelas prestações realizadas no quadro de operações financeiras se o capital adquirido com estas últimas operações tiver sido afectado às actividades económicas do interessado. Por outro lado, as despesas relacionadas com as prestações a montante têm uma ligação directa e imediata com as actividades económicas do sujeito passivo nos casos em que são exclusivamente imputáveis a actividades económicas efectuadas a jusante e, portanto, são parte apenas dos elementos constitutivos do preço das operações abrangidas pelas referidas actividades (v. acórdão Securenta, já referido, n.os 28 e 29).
Decorre do que antecede que deve responder se à terceira questão que o direito à dedução do IVA pago a montante sobre prestações destinadas a realizar uma transmissão de acções é conferido, por força do artigo 17.°, n.os 1 e 2, da Sexta Directiva, na redacção resultante do seu artigo 28.° F, n.° 1, e do artigo 168.° da Directiva 2006/112, se existir uma relação directa e imediata entre as despesas relacionadas com as prestações a montante e o conjunto das actividades económicas do sujeito passivo.” (cfr. §§ 71 a 73)
O tratamento em sede de IVA da dedutibilidade dos inputs deverá ser o mesmo, seja numa holding mista, seja numa sociedade-mãe, seja ao nível da aquisição ou detenção, ou no plano da sua alienação. Efetivamente, tratar de forma diferente a dedutibilidade do IVA de inputs consoante a opção estratégia de organização empresarial ou um plano de negócios de expansão de uma atividade económica (constituição de uma filial ou a criação de uma mera sucursal, gestão direta de uma atividade tributada ou gestão indireta, mediante a intermediação de uma participação) conduziria a um tratamento discriminatório de situações objetivamente idênticas.
O TJUE no Caso Abbey salientou [29]:
“qualquer outra interpretação (…) seria contrária ao princípio que exige que o sistema do IVA seja de uma perfeita neutralidade quanto à carga fiscal de todas as actividades económicas da empresa, na condição de estas estarem elas próprias sujeitas ao IVA, e poria a cargo do operador económico o custo do IVA no âmbito da sua actividade económica sem lhe dar a possibilidade de o deduzir (ver neste sentido, acórdão Gabalfrisa (…). Assim, proceder-se-ia a uma distinção arbitrária entre, por um lado as despesas efectuadas para os fins de uma empresa antes da exploração efectiva desta e das efectuadas no decurso da referida exploração e, por outro lado, as despesas efectuadas para pôr termo a esta exploração. Os diversos serviços utilizados (…) para os fins da transferência duma universalidade de bens ou de parte dela mantêm portanto, em princípio, uma relação directa e imediata com o conjunto da actividade económica deste sujeito passivo.” (cfr. §§ 35 e 36)
Igualmente a jurisprudência do CAAD[30] têm-se pronunciado no sentido de existir cobertura legal para a dedução pelo contribuinte de todo o IVA suportado com serviços e bens adquiridos que tenham nexo direto e imediato com os serviços prestados às suas participadas com direito a dedução ou que, mesmo não tendo nexo direto e imediato com determinados serviços, o IVA suportado com custos que fazem parte das despesas gerais do contribuinte tenham nexo direto e imediato com o conjunto da sua atividade económica.
3.4. Por fim, cabe analisar a dedução do IVA suportado no contexto de operações de fusão de sociedades, de acordo com o entendimento sufragado na Decisão Arbitral proferida no processo n.º 404/2018-T.
Nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 3.º do CIVA (cuja base jurídica é o artigo 19.º da Diretiva IVA), as fusões estão abrangidas pela regra de não sujeição nos seguintes termos:
“Não são consideradas transmissões as cessões a título oneroso ou gratuito do estabelecimento comercial, da totalidade de um património ou de uma parte dele, que seja susceptível de constituir um ramo de actividade independente, quando, em qualquer dos casos, o adquirente seja, ou venha a ser, pelo facto da aquisição, um sujeito passivo do imposto de entre os referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º”
Considerando-se que a transmissão do estabelecimento constitui em si mesma uma atividade económica, mantêm-se o direito à dedução do IVA suportado a montante. Com efeito, embora a aquisição ou transmissão da totalidade de um património/fusão por incorporação configure uma operação não sujeita a IVA, nos termos do artigo 19.º da Diretiva IVA, considera-se que tal operação mantém uma relação direta e imediata com a atividade económica do sujeito passivo, assistindo-lhe, nomeadamente, o direito de deduzir o IVA incluído nas despesas suportadas para efeitos daquela operação, ainda que não haja lugar a liquidação de imposto ao abrigo daquele normativo.
Assim, desde que as sociedades envolvidas numa fusão por incorporação não tenham limitações no seu direito à dedução e que a sociedade incorporante não seja um sujeito passivo misto, realizando apenas operações tributadas que conferem direito à dedução o facto de não se liquidar IVA na transmissão não prejudica nem produz qualquer impacto no direito à dedução do IVA suportado a montante para efeitos dessa operação de transmissão de património.
O princípio de continuidade subjacente à operação de fusão implica que a sociedade resultante da fusão assume os direitos e obrigações das sociedades fundidas, incluindo os respeitantes a matérias fiscais. O STA tem afirmado esta posição em várias decisões[31], nos seguintes termos:
“independentemente da posição que se assuma acerca da natureza jurídica da fusão (…), a extinção da personalidade jurídica própria da sociedade incorporada por fusão não tem por efeito a extinção dos seus direitos e deveres, antes, por expressa disposição legal estes se “transmitem” para a sociedade incorporante, seja porque esta sucede aquela, em conformidade com a teoria da sucessão universal, seja porque as situações jurídicas de que era titular a sociedade incorporada permanecem inalteradas ao longo do processo de fusão para se reunirem numa nova entidade, em conformidade com a teoria do acto modificativo”. Neste sentido, conclui que, “ (…) por força da alínea a) do n.º 1 do artigo 112.º do CSC, para a sociedade incorporante “se transmitem” ou nela “se reúnem”, como efeito da inscrição da fusão no registo comercial, os direitos e obrigações da sociedade incorporada, não sendo as obrigações fiscais excepção a essa regra (…).”[32]
No que respeita especificamente ao IVA, a assunção pela sociedade resultante da fusão dos direitos e obrigações das sociedades fundidas implica passar a dar cumprimento às obrigações impostas pela legislação deste imposto pela atividade que desenvolve, ainda que tais obrigações respeitem a factos tributários ocorridos na esfera das sociedades fundidas antes da fusão, bem como responder pelas dívidas fiscais daquelas[33].
Como salienta Cidália Lança[34]:
“Na mesma ordem de ideias, entende-se que a sociedade resultante da fusão pode, nos termos previstos nos artigos 19.º e seguintes do CIVA, exercer o direito à dedução do imposto suportado para a realização de operações efectuadas pelas sociedades fundidas em data anterior à fusão, desde que tal direito não tenha já sido exercido na esfera destas últimas. Estarão nestas circunstâncias facturas cuja emissão possa ocorrer já após a fusão, mas também facturas com data anterior mas que sejam recepcionadas pela sociedade fundida após aquela data. O direito à dedução do IVA inserido em tais facturas deve ser exercido em declaração periódica apresentada pela sociedade resultante da fusão relativa ao período em que ocorreu a sua recepção ou a período posterior àquele. Importa referir que a circunstância de a factura estar emitida em nome de uma sociedade fundida não deve obstar ao exercício do direito à dedução pela sociedade resultante da fusão; tal é uma decorrência de nela terem sido incorporados os direitos das sociedades fundidas, mas também do efeito de neutralidade que está inerente à aplicação da regra de não sujeição a tais tipos de reestruturações empresariais”.
Nestes termos, o princípio da intransmissibilidade dos créditos de IVA não pode ter aplicação de forma absoluta no caso de fusão de sociedades, dado esta implicar necessariamente a transmissão dos direitos e obrigações das sociedades fundidas para a sociedade resultante da fusão[35]. Por isso, Cidália Lança na obra citada, conclui:
“Considera-se, assim, que, na sequência de uma fusão, é transmitido para a sociedade resultante da fusão o direito à dedução do IVA suportado em aquisições de bens e serviços adquiridos ainda pelas sociedades fundidas, relativamente a todas as facturas emitidas em data posterior à do registo da fusão, mas também as emitidas em data anterior cujo imposto não tenha sido deduzido, desde que observados os requisitos dos artigos 19.º e seguintes do Código do IVA e o prazo para o exercício do direito à dedução previsto no artigo 98.º, n.º 2 do Código do IVA.”
4. Dos factos provados nos presentes autos arbitrais (vd., n.º III.1 supra) e do enquadramento legal, exposto no n.º anterior, resultam três aspetos relevantes para aferir da legitimidade da pretensão da Requerente.
Primeiro, a B... incorreu em despesas relacionadas com a aquisição de serviços de consultadoria, assessoria jurídica, fiscal e bancária tendo em vista a reorganização da estrutura de financiamento das suas participadas.
A aquisição desses serviços tem uma relação direta e imediata com uma operação de financiamento, que consistiu num empréstimo obrigacionista no valor de 200.000.000,00€ subscrito por um sindicato bancário. Ora, esta operação de financiamento encontra-se diretamente relacionada com a atividade económica prosseguida pela B... . Por outro lado, a aquisição de serviços de consultadoria, assessoria jurídica, fiscal e bancária foi necessária para a obtenção do financiamento atribuído para efeitos da operação de reestruturação destinada a maximizar a sua eficiência e valor, fazendo parte integrante e essencial da atividade económica da empresa.
Assim, a B... incorreu em despesas relacionadas com atos preparatórias da reorganização das suas participadas devendo, por isso, ser reconhecido o seu direito à dedução do IVA incorrido no âmbito da referida reorganização.
Segundo, devido à aquisição das partes sociais representativas da totalidade do seu capital social a B... passou a integrar o Grupo F... e posteriormente foi incorporada mediante a transferência global do seu património na A..., ora Requerente.
No momento da aquisição dos serviços respeitantes à reorganização das suas participadas, a B... tinha a qualidade de sujeito passivo de IVA, e pretendia vir a prestar serviços tributados, em IVA, às suas participadas e só não começou a prestar os referidos serviços porque o Grupo F... decidiu operar uma reestruturação interna.
Terceiro, a atividade da B... não se extinguiu com a operação de fusão tendo a Requerente assumido os seus direitos e obrigações, incluindo os respeitantes a matérias fiscais, e continuado a prosseguir a respetiva atividade. Deste modo, a intenção da B... de prestar serviços tributados em IVA às participadas veio efetivamente a realizar-se, após a fusão, pela A... .
A Requerente configura-se, para efeitos de IVA, como um sujeito passivo com direito à dedução integral, e continua a atividade económica desenvolvida pela B..., sociedade incorporada. Em consequência, o IVA incidente sobre as aquisições de serviços da B... destinadas à reorganização da estrutura de financiamento das suas participadas deve ser diretamente deduzido na sua totalidade, conforme o enquadramento explicitado supra.
5. Nestes termos, a atuação da AT padeceu de ilegalidade por erro nos seus pressupostos de facto e de Direito devendo ser anulado o despacho proferido pelo Chefe de Divisão, ao abrigo de subdelegação de competências, da Direção de Finanças Porto, em 14 de dezembro de 2020, que indeferiu a reclamação graciosa no referente ao IVA dedutível no montante de € 394.323,53, com a consequente anulação da demonstração de liquidação de IVA n.º 2019... .
6. Por fim, cumpre apreciar se deve ser reconhecido à Requerente o direito a juros indemnizatórios, ao abrigo do artigo 43.º da LGT, relativamente ao IVA dedutível ainda não reembolsado à Requerente
Nos termos do n.º 1 do artigo 43.º da LGT, são devidos juros indemnizatórios "quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.” Conforme decorre do artigo 24.º, n.º 5, do RJAT, o direito aos mencionados juros pode também ser reconhecido no processo arbitral.
A condição necessária para a atribuição dos juros indemnizatórios consiste na demonstração da existência de erro sobre os pressupostos de facto ou de direito imputável aos serviços da Administração Fiscal.
No presente caso, conforme ficou demonstrado supra está preenchido o pressuposto do “erro imputável aos serviços”, referido no n.º 1 do artigo 43.º da LGT. Assim, o pedido de condenação da Requerida ao pagamento de juros indemnizatórios é considerado procedente por este Tribunal Arbitral.
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DECISÃO
Termos em que se decide:
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Julgar improcedente a excepção da incompetência material do Tribunal Arbitral, suscitada pela Requerida;
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Julgar procedente o pedido arbitral quanto à ilegalidade do despacho proferido pelo Chefe de Divisão, ao abrigo de subdelegação de competências, da Direção de Finanças Porto, em 14 de dezembro de 2020, de indeferimento da reclamação graciosa no referente ao IVA dedutível no montante de € 394.323,53, com a consequente anulação da demonstração de liquidação de IVA n.º 2019..., e demais consequências legais;
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Julgar procedente o pedido de juros indemnizatórios sobre a quantia a reembolsar de € 394.323,53 relativamente ao IVA dedutível;
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Condenar a Requerida no pagamento das custas do presente processo no montante abaixo indicado.
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VALOR DO PROCESSO
Em conformidade com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC, no artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT, e no artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, é fixado ao processo o valor de EUR 394.323,53 (trezentos e noventa e quatro mil, trezentos e vinte e três euros e cinquenta e três cêntimos).
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CUSTAS
O montante das custas, a cargo da Requerida é fixado em EUR 6.426,00 (seis mil quatrocentos e vinte e seis euros) nos termos do disposto no artigo 12.º, n.º 2, e no artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, e na Tabela I anexa do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária).
Notifique-se.
Lisboa, 23 de dezembro de 2021.
O Árbitro Presidente,
(Dr. José Poças Falcão)
O Árbitro Vogal,
(Dra. Elisabete Louro Martins Cardoso)
O Árbitro Vogal,
(Dr. Olívio Mota Amador)
[1] Vide, nomeadamente, Acórdãos de 6 de Julho de 1995, Caso BP Soupergaz, Proc.C-62/93, n.º 18, e de 21 de Março de 2000, Caso Gabalfrisa e o., Proc.s C-110/98 a C-147/98, n.º 43.
[2] Acórdão de 14 de Fevereiro de 1985, Caso Rompelman, Proc. 268/83.
[3] Acórdão de 21 de Setembro de 1988, Proc. 50/87, n.º 15.
[4] Sobre o princípio da neutralidade, vide ainda, designadamente, os Acórdãos de 29 de Fevereiro de 1996, Caso Inzo, Proc. C-110/94, e de 15 de Janeiro de 1998, Caso Ghent Coal, Proc. C-37/95.
[5] Acórdão de 8 de Janeiro de 2002, Caso Metropol, Proc. C-409/99.
[6] Acórdão de 21 de Setembro de 1988, já cit., n.º 16. Vide, nomeadamente, Acórdãos de 22 de Fevereiro de 2001, Caso Abbey National, Proc. C-408/98, n.º 24
[7] Acórdão de 8 de Março de 1988, Caso Intiem, Proc. C-165/86, n.º 14.
[8] Acórdão de 11 de Julho de 1991, Caso Lennartz, Proc. C-97/90.
[9] Veja-se no Proc. C503 2002012 (disponível no site da AT em Informações fiscais, Informações vinculativas, IVA), o despacho concordante do Director Geral dos Impostos de 9.6.2004, segundo o qual “Pelo facto de a sociedade não possuir património, não deverá ser posto em causa o direito à dedução, observados que sejam os requisitos previstos nos artigos 19.º a 25.º do CIVA. Refira-se que já foi anteriormente sancionado o entendimento, conforme despacho de 1987.09.16, do Subdirector-Geral do IVA, que ‘Na economia do IVA, o início de actividade coincide com a primeira operação que possa influenciar o activo ou passivo da empresa, ou com a primeira afectação de bens a fins empresariais’, pelo que o mesmo argumento deve valer na situação inversa. Qualquer outra interpretação afectaria a característica de neutralidade inerente à mecânica do IVA, na medida em que o sujeito passivo seria onerado com o imposto suportado a montante sem lhe ser dada a possibilidade de dedução daquele imposto”.
[10] Veja-se a este propósito, igualmente, o Acórdão Ghent Coal, de 15 de Janeiro de 1989, Proc. C-37/95, já cit..
[11] Acórdão de 8 de Março de 1988, Caso Intiem, Proc. 165/86, n.º 14.
[12] Acórdão de 19 de Setembro de 2000, Caso Ampafrance, Proc. 177/99.
[13] Acórdão de 6 de Julho de 1995, Caso BP Soupergaz, já cit. Em conformidade com a jurisprudência que o TJUE consagrou às medidas fiscais relativas a prevenir e a lutar contra a fraude, o princípio da proporcionalidade exige que o sujeito passivo possa, nomeadamente, demonstrar a inexistência de fraude ou de abuso.
[15] Acórdão de 14 de Fevereiro de 1985, Caso Rompelman, Proc.268/83, já cit..
[16] Acórdão de 11 de Julho de 1991, Proc. C-97/90.
[17] Acórdão de 29 de Fevereiro de 1996, Proc. C-110/94.
[18] Acórdão de 21 de Março de 2000, Proc.s apensos C-110/98 a C-147/98.
[19] V., neste sentido, Acórdãos, já referidos, Rompelman, n.° 22, e Puffer, n.° 47.
[20] V., neste sentido, Acórdão Lennartz, já referido, n.° 14.
[21] V., neste sentido, Acórdãos de 8 de Junho de 2000, Caso Breitsohl, Proc. C-400/98, n.° 41, e de 21 de Fevereiro de 2006, Caso Halifax e o., Proc. C-255/02, n.° 84.
[22] Acórdão de 8 de Junho de 2000, Caso Schloßstrasse, Proc. C-396/98, n.° 40.
[23] Conclusões do Advogado-geral Paolo Mengozzi, apresentadas em 22 de Dezembro de 2008 no Proc. C-515/07, tendo por base um reenvio prejudicial efectuado pelo Hoje Raad der Nederlanden (Países Baixos), onde se solicita que o TJUE se pronuncie sobre a questão de saber se o direito de deduzir o IVA pago a montante se aplica não apenas à aquisição de bens de investimento mas pode abranger a aquisição de outros bens e serviços utilizados quer para operações profissionais efectuadas a jusante quer para outros fins, nomeadamente, actividades de natureza não económica.
[24] Acórdão de 29 de Outubro de 2009, Caso SKF, Proc. C-29/08, n.° 58 e jurisprudência citada. A SKF, sociedade anónima, é a sociedade-mãe de um grupo industrial com actividades em vários países. Participa activamente na gestão das suas filiais e presta-lhes serviços remunerados, tais como a gestão, a administração e a política comercial. A SKF é sujeito passivo de IVA relativamente a estas prestações facturadas às filiais, tendo procedido, no âmbito de uma estratégia de reorganização do grupo, à alienação da totalidade das participações numa filial e a participação remanescente numa associada (26,5%), anteriormente detida em 100%, conseguindo por via de tal facto libertar meios financeiros que visaram financiar as restantes actividade do grupo. Face à informação prévia favorável à dedução do IVA pago a montante sobre serviços adquiridos no âmbito daquela transmissão (redacção de contratos, consultadoria jurídica especializada, serviços de avaliação de títulos e de assistência nas negociações).
[25] Acórdão de 21 de Março de 2000, Proc. C-110/98 a C-147/98, Caso Gabalfrisa.
[26] Acórdão de 3 de Março de 2005, Proc. C-32/03.
[27] Vide, designadamente, Acórdãos de 20 de Junho de 1996, Caso Wellcome Trust, Proc. C-155/94, já cit., n.° 35, e Caso Harnas & Helm, já cit., n.° 16 e jurisprudência aí mencionada.
[28] Neste sentido veja-se o n.ºs 36 e 37 do Acórdão de 26 de Maio de 2005, Caso Kretztechnik, Proc. C-465/03, e jurisprudência aí mencionada.
[29] Acórdão de 22 de Fevereiro de 2001, Proc. C-408/98.
[30] Vd., Processos n.º s 128/2012-T e 18/2013-T.
[31] Veja-se, nomeadamente, os Acórdãos de 16 de Setembro de 2009, processo 0372/09, e de 10 de Fevereiro de 2010, processo 0925/09, disponíveis no sitio web www.dgsi.pt .
[32] Conforme Acórdão de 16 de Setembro de 2009, já cit., e Acórdão de 23 de Setembro de 2009, processo 0370/09.
[33] Veja-se, designadamente, entre vários, o Acórdão de 10 de Fevereiro de 2010, processo 0925/09, no qual o STA se pronunciou no sentido de que a extinção da personalidade jurídica da sociedade incorporada por fusão não tem por efeito a extinção dos seus direitos e deveres, que se transmitem para a sociedade incorporante, pelo que pode a Administração Fiscal exigir a esta última o pagamento de uma dívida fiscal quando munida de título executivo em que figure como devedora a sociedade extinta.
[34] CIDÁLIA LANÇA, “O tratamento em IVA da fusão de sociedades”, in Fiscalidade, n.º 46, Abril-Junho de 2011, pp. 91-103.
[35] cfr. artigos 97.º e 112.º do Código das Sociedades Comerciais/CSC.