Sumário:
I – Sendo peticionada a ilegalidade do ato de autoliquidação constante da declaração de rendimentos apresentada pelo sujeito passivo é a este que incumbe o ónus da prova dos factos constitutivos do seu direito;
II – Estando em causa um conjunto de ativos de natureza heterogénea e que abrangem uma multiplicidade de marcas comerciais, que não foram objeto de desagregação, a demonstração da vida útil finita, para efeito de amortização, terá de ser efetuada em relação a cada um dos diversos ativos que estão em causa.
DECISÃO ARBITRAL
Acordam em tribunal arbitral
I – Relatório
1. A..., S.A., com sede na Rua ..., n.º..., ..., Amadora, pessoa coletiva n.º..., vem requerer a constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, para apreciar a legalidade do ato de autoliquidação de IRC n.º 2017.., referente ao exercício de 2016, em que se apurou um montante a reembolsar de € 120.523,28, e, bem assim, do despacho de indeferimento da reclamação graciosa contra ele deduzido, mantido pelo despacho de indeferimento de recurso hierárquico, requerendo ainda o reembolso do imposto indevidamente pago acrescido de juros indemnizatórios.
Fundamenta o pedido nos seguintes termos.
Na Declaração Periódica de Rendimentos Modelo 22 individual, para o exercício de 2016, a B..., Lda. (B...), que integrava o grupo de sociedades em que a Requerente é dominante, acresceu, no Quadro 07, Campo 719, referente a “Perdas por imparidade de ativos não correntes e depreciações e amortizações, não aceites como gastos”, o montante de € 1.064.203,79, de que resultou o apuramento de lucro tributável no montante de € 1.799.914,30.
No entanto, no preenchimento da declaração, a Requerente limitou-se a seguir o erróneo entendimento adotado pela Autoridade Tributária em relatórios de ações de inspeção tributária que incidiram sobre a sua situação tributária, com referência a anteriores exercícios fiscais, que se centra na caracterização da marca C... como um ativo intangível sem vida útil definida.
A Requerente é a sociedade dominante de um grupo que opera no sector farmacêutico, que produz e comercializa produtos nesta área, detendo ainda várias marcas que operam no sector dos cuidados de saúde em geral, entre as quais se inclui a marca C...”, sendo que os ativos que se incluem nessa marca assumem diversa natureza.
A atividade da Requerente insere-se num sector de mercado muito competitivo, com uma grande quantidade e variedade de oferta, e que se caracteriza por um grande investimento ao nível da inovação tecnológica e do marketing e publicidade, para obter vantagens comerciais face aos concorrentes.
Assim, a “marca” tem um período de vida útil limitado aos próprios constrangimentos da inovação tecnológica e científica, bem como ao ciclo de renovação dos seus produtos, os quais, decorrido um determinado período de tempo, se encontrarão obsoletos.
Tanto que, tendo inicialmente a Requerente previsto uma vida útil dos ativos “C...” em 6 anos, prazo durante o qual o ativo geraria os respetivos “influxos de caixa líquidos”, veio a rever esse prazo, em 2013, para 10 anos, com base em critérios que permitem definir a vida útil de um ativo.
Tratando-se de um produto que se inclui num sector marcadamente atingido por uma necessidade de constante evolução, constitui um ativo intangível com duração finita e limitada e sujeito a deperecimento, na medida em que se encontra condicionado por diversos fatores que definem a vida útil de um ativo, nomeadamente a obsolescência técnica, tecnológica e comercial, estabilidade do sector em que o ativo opera, concorrência, nível de dispêndio de manutenção exigido para obter os benefícios económicos futuros esperados dos ativos e dependência dos métodos e know-how adquiridos.
Ao sustentar, no âmbito dos procedimentos inspetivos, que a aquisição da marca “C...” “consubstancia um ativo intangível sem vida útil definida”, a Autoridade Tributária incorre em vício de violação de lei.
A Requerente invoca ainda o vício de falta de fundamentação em relação às decisões de indeferimento da reclamação graciosa e do recurso hierárquico, no ponto em que aí se conclui que as correções não são de ordem contabilística, mas de natureza fiscal, o que está em contradição com as conclusões do relatório de inspeção, evidenciando uma fundamentação incongruente. A que acresce o facto de, nesses procedimentos, a Administração não ter tomado em consideração os novos elementos factuais e jurídicos apresentados pela Requerente em sede de exercício do direito de audiência prévia.
Imputa ainda a esses atos de segundo e terceiro grau o vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, ao considerarem que a marca “C...” não poderia ter sido contabilizada como um ativo intangível com vida útil definida.
A Autoridade Tributária, na sua resposta, alega, em síntese, o seguinte.
A Requerente continua a defender que todos os ativos identificados como “Marca C...” têm uma vida útil finita de 10 anos e são amortizáveis no seu todo, entendimento com o qual não se pode concordar atento os fundamentos explanados na decisão do recurso hierárquico, a que há ainda a acrescentar o seguinte.
As depreciações e amortizações que estão na origem do pedido arbitral respeitam a ativos intangíveis designados por ativos “C...”, adquiridos pela Requerente à D..., S.A., por €15.600.000,00, no âmbito de um Acordo celebrado, em 23-12-2009 (“Asset Purchase Agreement”), que abrangiam as seguintes componentes: (a) Manufacturing technology and know-how” relativo à formulação dos produtos, métodos de produção e tecnologia utilizada; (b) Registrations” dos produtos e autorizações de comercialização; (c) Trademarks” compreendendo a marca “C...” e os registos actualizados; (d) Marketing and promotional documents”, incluindo a lista de clientes, os planos de marketing e promoção, manuais de formação da força de vendas e outros existentes à data da transação.
No entanto, tanto a Requerente como a sociedade B... procederam à contabilização dos ativos adquiridos à D..., como se tratasse de um único ativo, sem qualificar cada uma das componentes acima listadas, como ativos identificáveis, passíveis de gerar benefícios económicos de forma separada e sem que tivesse uma desagregação.
Por outro lado, os gastos com depreciações/amortizações da Marca “C...” não concorrem para a formação do lucro tributável fiscalmente, de acordo com o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 34.º do CIRC conjugado com o artigo 16.º do Decreto-Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, pelo que, à luz desses dispositivos, importaria averiguar da utilização dos ativos intangíveis em causa por um período limitado de tempo ou da verificação de deperecimento efetivo devidamente comprovado.
No domínio da depreciação e amortização dos ativos intangíveis, a Norma Contabilística de Relato Financeiro (NCRF) n.º 6 indica que os fatores essenciais suscetíveis de influenciar a determinação da vida útil de ativos intangíveis revestem uma dupla natureza: (i) contratuais ou legais, que se prendem com a duração do período de controlo sobre os ativos ou com os limites legais aplicáveis à sua utilização; e (ii) económicos, que determinam o período durante o qual os benefícios económicos podem afluir à entidade que detém os ativos, que naturalmente são influenciados pelo obsolescência, condições do mercado dos produtos e da atuação da concorrência.
No que se refere aos ativos “C...”, verifica-se que os fatores contratuais ou legais não têm relevância, pois, o Asset Purchase Agreement não contém cláusulas de restrição temporal de utilização dos ativos transferidos. No que respeita aos fatores económicos, que podem contribuir para a determinação de um período de duração limitada ou indefinida, a Requerente aponta justificações que não permitem, de modo sustentado e quantificado, a fixação de um período de utilização esperada de cinco, dez ou vinte anos, não se descortinando os critérios objetivos e subjetivos que foram utilizados para estabelecer a duração da vida útil destes ativos intangíveis, assim se compreendendo que a duração da vida útil da Marca/Direitos “C...” tenha sido inicialmente fixada em 6 anos, depois revista, em 2013, para 10 anos, e ampliada, em 2014, para 14 anos.
É de concluir que o ativo intangível “C...” não cumpre um dos requisitos exigidos pela alínea b) do n.º 2 do artigo 16.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, que se prende com a definição de um período limitado de tempo para a sua utilização e também não tendo sido demonstrado que esteja sujeito a um deperecimento efetivo, os gastos contabilizados a título de amortizações da Marca não são aceites fiscalmente como dedutíveis em face do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 34.º do Código do IRC.
A Autoridade Tributária transcreve ainda a fundamentação jurídica do acórdão proferido no Processo n.º 670/2017-T, em que se refere, além do mais, que, pretendendo a Requerente pôr em causa a legalidade da autoliquidação de IRC é a ela que incumbe o ónus da prova dos factos idóneos que demonstrem que a marca C... constitui um ativo intangível com duração finita e limitada e sujeito a amortizações que poderão ser reconhecidas como custo fiscalmente relevante, tendo o tribunal concluído pela insuficiência dos elementos apresentados pela Requerente para esse efeito.
Conclui no sentido da improcedência do pedido arbitral.
2. No seguimento do processo, por despacho de 15 de Junho de 2021, o tribunal, considerando não haver oposição das partes, admitiu o aproveitamento da prova produzida nos Processos n.º 670/2017-T e 543/2017-T, ao abrigo do disposto no artigo 421.º, n.º 1, do CPC, como foi requerido, e determinou o prosseguimento do processo para a apresentação de alegações escritas, por prazo sucessivo de dez dias, para que as partes possam pronunciar-se, designadamente, sobre a prova produzida nesses processos.
Em alegações, as partes procuraram fixar os factos que devem ser tidos como assentes e, no mais, mantiveram as suas anteriores posições.
3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nos termos regulamentares.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
As partes foram oportuna e devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.° e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 3 de Maio de 2021.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
O processo não enferma de nulidades e não foram invocadas exceções.
Cabe apreciar e decidir.
II - Fundamentação
Matéria de facto
4. Os factos relevantes para a decisão da causa que são tidos como assentes são os seguintes.
1- A Requerente era, no exercício de 2016, a sociedade dominante de um grupo de sociedades que opera no sector farmacêutico, produzindo e comercializando produtos nesta área e detendo várias marcas que operam no sector dos cuidados de saúde em geral;
2- À data dos factos, a Requerente estava enquadrada no regime especial de tributação dos grupos de sociedades;
3- Em 23-12-2009, foi celebrado entre a Requerente e a D... S.A. o Assent Purchase Agreement, cuja cópia consta do documento n.º 4 junto com o pedido e aqui se dá como reproduzido;
4- Através do referido contrato, a Requerente adquiriu à D... S.A., pelo valor de €15.600.000,00, a marca C..., integrando os seguintes ativos:
• Manufacturing technology and know-how: compreendendo todo o know-how relativo à formulação dos produtos, controlo de qualidade, acondicionamento, fórmulas, registo de reclamações, avaliações, processos, tecnologia utilizada;
• Registos: compreendendo os dossiers de registo dos produtos e autorizações de comercialização;
• Marcas Comerciais: compreendendo a marca C..., mas também as marcas ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e os registos actualizados;
• Marketing and promotional documents, compreendendo a lista de clientes, os planos de marketing e promoção, manuais de formação da força de vendas, existentes à data da transacção.
5- No contrato, não foi feita qualquer referência à data limite ou restrição de utilização exclusiva da marca.
6- Através do Assent Purchase Agreement, D..., S.A. comprometeu-se a diligenciar no sentido de garantir, sem qualquer custo acrescido, a cedência de posição em todos os contratos de distribuição que havia celebrado, bem como os contratos de fornecimento ao Grupo E... e Grupo F... e ainda, no âmbito dos contratos de fornecimento e de fabrico celebrados com os Laboratórios G..., H... I... .
7- Em 18-09-2010, a B..., Lda., sociedade pertencente ao grupo da Requerente, adquiriu a esta a marca “C...” e os ativos acima referidos, através de um aumento de capital subscrito pela sócia A..., S.A., realizado mediante entrada em espécie, tendo sido atribuído a este ativo intangível o valor líquido de €14.518.555,43.
8- A Requerente notificou a autoridade da concorrência desta operação.
9- Tanto a Requerente como, posteriormente, a B..., Lda. procederam à amortização do ativo intangível considerando, primeiro, que o ativo tinha uma vida útil de 6 anos e, posteriormente, com base numa vida útil de 10 anos.
10- Ambas procederam à contabilização de tais ativos como um todo, ou seja, como se se tratasse de um único ativo sem qualificar cada uma das componentes como ativos identificáveis, passíveis de gerar benefícios económicos de forma separada e inscreveram-nos nos mapas de depreciações e amortizações sob designação “Marca/Direitos”.
11- O período de vida útil do ativo foi determinando considerando os seguintes critérios:
i. Ciclos de vida típicos dos ativos;
ii. Obsolescência técnica, tecnológica e comercial;
iii. Concorrência;
iv. Nível de dispêndio de manutenção exigido para obter os benefícios económicos futuros esperados dos ativos.
12- As amortizações dos ativos C... foram calculadas com base no método das quotas constantes contabilizadas como gastos do exercício desde o período de tributação de 2010.
13- Na ausência de investimento por parte da Requerente, pelo menos parte dos ativos adquiridos tornar-se-iam técnica, tecnológica e comercialmente obsoletos no período de vida estimado pela Requerente.
14- A marca C... e os seus produtos incluem-se num sector marcadamente atingido por uma necessidade de constante evolução, no qual, quase diariamente são lançados novos produtos, com novas propriedades e com uma maior abrangência de utilização.
15- Em 2014, foi publicado o Regulamento EU n.º 358-2014 da Comissão, de 9 de Abril de 2014, que proibiu o uso de uma matéria prima denominada “...” a partir de 16 de Outubro de 2014 e escoamento até 15 de Julho de 2015, o que obrigou à reformulação dos produtos “... Emulsão Corporal” e “... Gel de Banho”.
16- Ainda em 2014, foram publicados dois novos Regulamentos (Regulamento EU n.ºs 1003/2014 e 2004/2014 da Comissão, de 18 de setembro) sobre as alterações aos anexos das substâncias permitidas nos cosméticos, suas concentrações e condições.
17- No âmbito dos referidos regulamentos, passou a ser proibido o uso de “Propilparabeno” e “Butilparabeno”, entre outros, em produtos não enxaguados, concebidos para aplicação na zona coberta pelas fraldas em crianças de idade inferior a três anos o que levou à necessidade de reformulação do “... Derma creme muda de fraldas”.
18- O mercado no qual se inserem os produtos associados à marca C... é bastante competitivo, existindo outros produtos e marcas no mercado com elevados níveis de promoção, o que conduz à necessidade constante de investir na tecnologia e imagem associada a cada um dos produtos.
19- Os produtos associados à marca C... foram objeto de várias actualizações e modificações ao longo do tempo, quer por requisitos regulamentares, quer por força da própria concorrência, sendo que alguns foram descontinuados.
20- A Requerente juntou ao processo pareceres sobre o tratamento contabilístico dos ativos C... subscritos pela J... e K..., que constituem os documentos n.ºs 8 e 9 juntos ao pedido.
21- Por requerimento de 12-11-2020, a Requerente juntou ao processo um dossier com diversos anexos, identificado no pedido arbitral como Documento n.º 26, contendo documentação de suporte à aquisição dos ativos, um estudo de desvalorização dos ativos, FAQ 30 da Comissão de Normalização Contabilística, artigos de opinião e um relatório sobre a vida útil da marca C....
22- Os Serviços de Inspeção Tributária nas ações de inspeção a empresas do grupo a que pertence a Requerente, corrigiram valores às rubricas de depreciações e amortizações do ativo intangível C..., nos exercícios de 2010 a 2013.
23- Na Declaração periódica de rendimentos Modelo 22 individual, para o exercício de 2016, a B... acresceu, no Quadro 07, Campo 719, referente a “Perdas por imparidade de ativos não correntes e depreciações e amortizações, não aceites como gastos”, o montante de € 1.064.203,79, de que resultou o apuramento de lucro tributável no montante de € 1.799.914,30.
24- Em consequência, na Declaração periódica de rendimentos Modelo 22 do Grupo, a Requerente apurou um valor a reembolsar de € 120.523,28.
25- A Declaração periódica de rendimentos originou o ato tributário de liquidação n.º 2017..., que constitui o ato tributário impugnado.
X) O acréscimo no Quadro 07, Campo 719, no montante de € 1.064.203,79, foi efetuado na sequência de procedimentos de inspeção, relativos aos exercícios de 2010 a 2013, em que a Autoridade Tributária desconsiderou como custo para efeitos fiscais as amortizações declaradas com a aquisição da marca C....
Y) Em 28-05-2019, a Requerente apresentou reclamação graciosa contra o ato de liquidação de IRC n.º 2017... .
Z) Para efeito do exercício do direito de audição, em 22-11-2019, a Requerente foi notificada do projeto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa que constitui o documento n.º 28 junto ao pedido, que aqui se dá como reproduzido.
AA) Em 10-12-2019, a Requerente exerceu o direito de audição conforme o documento n.º 29 junto ao pedido, que aqui se dá como reproduzido.
BB) A reclamação graciosa foi indeferida por despacho do Diretor de Finanças Adjunto de 27-01-2020 e notificado por ofício do dia imediato.
CC) A informação dos serviços em que se baseou o indeferimento da reclamação graciosa, na parte que releva, é do seguinte teor:
IV - ANÁLISE DO PEDIDO E PARECER
Analisados os documentos juntos do processo, os Relatórios de Inspeção Tributária (RIT) relativos aos exercícios de 2010 a 2013 da sua dominada e os elementos constantes da base de dados do sistema informático, conclui-se o seguinte:
1. A Reclamante exerce desde 2008, a atividade principal de fabricação de medicamentos, e atividades secundárias de comércio por grosso não especializado e comércio por grosso de produtos farmacêuticos, com os CAE 21201, 46900 e 46460, respetivamente.
2. A empresa era, no período de 2016, a sociedade dominante do grupo de sociedades tributadas de acordo com o Regime Especial de Tributação de Grupos de Sociedades (RETGS), art.º 69.º do CIRC, cujo perímetro integrava, entre outras, a sociedade “B..., Lda.”, NIPC... (doravante designada por B...).
3. Assim, e nos termos do art.º 70.º do CIRC, o lucro tributável do Grupo é apurado pela sociedade dominante através da soma algébrica dos lucros tributáveis e dos prejuízos fiscais apurados nas declarações periódicas individuais das sociedades que compõem o Grupo.
4. A Reclamante, apresenta reclamação contra a autoliquidação vertida da declaração de rendimento em sede de IRC - Modelo 22, n.º..., em virtude da mesma, ter refletido na sua matéria coletável o resultado líquido da sua dominada B... (n.º...).
5. Segundo a empresa, a declaração Modelo 22 do exercício de 2016 da sua dominada, em situação de “Doc. não liquidável”, foi preenchida com base nas instruções vertidas nos processos de inspeção aos exercícios de 2010 a 2013, isto é. foi acrescido no Quadro 07, Campo 719, o montante de 1.064.203,79€, referente à amortização/depreciação do ativo intangível marca “C...”, sendo a matéria tributária a incluir na matéria tributável do grupo.
6. Assim sendo, as correções efetuadas ao prejuízo/lucro tributável de qualquer uma das empresas do grupo, têm reflexos na declaração de rendimentos Modelo 22 entregues pela empresa dominante em nome do grupo.
7. Ora, nas ações de inspeção realizadas a empresa do grupo – B..., Ol2014..., Ol2014... e Ol2014..., relativas aos exercícios de 2011, 2012 e 2013, respetivamente, os serviços inspetivos consideraram que os gastos contabilizados a título de amortizações/depreciações do ativo intangível designado por Marca "C...", não seriam aceites fiscalmente de acordo com o disposto na al. a) do n.º 1 do art.º 34.º do CIRC conjugado com o art.º 16.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro.
8. A Reclamante vem referir que discorda de tal correção, pelo que apresenta a presente reclamação, onde se baseia o seu diferendo com a AT ao não considerar como custo fiscal as referidas depreciações/amortizações, que se resume nos seguintes pontos, remetendo cópia dos processes arbitrais na qual estava em causa a apreciação da legalidade da liquidação oficiosa promovida pela AT, na sequência de correções operadas em sede de inspeção tributária:
• O facto de os serviços de inspeção não terem aceitado fiscalmente como gastos do exercício as amortizações referentes ao ativo intangível Marca "C...", nos termos da al. a) do n.º 1 do art.º 34 do CIRC e do art.º 16.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, por considerar que no contrato de aquisição da marca não prevê a vida útil e a Reclamante se basear na sua experiência, no conhecimento do mercado dos produtos da referida marca, nos seus ciclos de renovação e na evolução tecnológica e científica necessária a tais produtos, para determinar a sua vida útil. No entanto, em momento algum, em sede de processos de inspeção, ousou concretizar como chegou inicialmente aos 6 anos e ao facto, de posteriormente, ter alterado a vida útil da marca para 10 anos.
• Perante tal situação os serviços inspetivos, acresceram ao lucro tributável das empresas supramencionadas, as correções referentes às amortizações não aceites fiscalmente, nos termos da al. a) do art.º 34.º do CIRC, dado que não foi provado, pela Reclamante, que o ativo intangível Marca "C...'' tem uma vida útil finita ou limitada (legislação em vigor a data dos factos):
i) Não foi provado que há limite previsível para um período esperado que o ativo Marca "C..." gere influxos de caixa líquidos, pelo que de acordo com o §88 da Norma Contabilística de Relato Financeiro (NCRF) - 6 (redação à data dos factos), estamos em presença de um ativo intangível com uma vida útil indefinida, isto é, estamos perante uma impossibilidade de prever o momento a partir do qual a marca deixa de gerar influxos financeiros;
ii) No §89 da norma contabilística mencionada na alínea anterior, expressa que um ativo intangível com vida útil indefinida não é amortizável;
iii) No art.º 16.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, expressa na al. b) do seu n.º 2 que os ativos intangíveis "marcas", para serem amortizados, a sua utilização tem que ser reconhecida por um período limitado de tempo.
iv) Os dois pareceres na tentativa de justificarem a vida útil atribuída ao ativo intangível Marca "C...": um da "J...", de 09/06/2015, sobre o tratamento contabilístico a executar sobre o referido ativo, onde está expresso que a contabilização elaborada pela Reclamante está de acordo com os princípios emanados pela NCRF, o qual ressalva, que não foram analisados os impactos fiscais e legais da referida contabilização: - o outro da "K...", de 15/06/2015, que defende que o ativo Marca "C..." é um ativo intangível com vida útil definida ou finita de 6 anos, com base na "Autorização de Introdução no Mercado" (AIM) que é em média de 5 anos, com base no Know-how necessário para funcionar com o reator de cremes, adquirido pela Reclamante, cuja vida útil é de 8 anos e pelo elevado consumo de recursos financeiros em despesas de inovação e de promoção e marketing devido a oscilação dos mercados.
9. Pela análise dos factos expostos no ponto anterior, verificamos que a Reclamante vem nestes autos alegar que nos termos das normas contabilísticas emanadas pela NCRF 6, mesmo que muito subjetivamente, adotou primeiramente um período de vida útil para o ativo intangível Marca "C..." de 6 anos e retificou-a posteriormente para 10 anos e assume que têm reflexos nas depreciações e amortizações aceites fiscalmente.
10. Contudo, a questão passa pelos serviços de inspeção que levou as correções em sede das empresas do grupo supra identificadas, não são de ordem contabilística, mas apenas se cingem à área fiscal, ou seja, preconizados nos acréscimos ao Quadro 07 das Modelos 22, na esfera individual de cada uma das empresas supra indicadas e nos exercícios respetivos.
11. Ora, o procedimento de inspeção tributária visa a observação das realidades tributárias, a verificação do cumprimento das obrigações tributárias e a prevenção das infrações tributárias, podendo englobar um ou mais períodos de tributação, segundo o disposto no n.º 1 do art.º 2.º e n.º 3 do art.º 14, ambos do RCPITA.
12. Ou seja, os procedimentos inspetivos estão relacionados especificamente a um fim, a um âmbito, a uma extensão, sendo o contribuinte informado aquando do seu início e do seu termo.
13. Pelo que, o que está em causa no presente procedimento administrativo, é a apreciação da legalidade do ato de liquidação praticado pela própria Reclamante e não o resultado dos procedimentos inspetivos.
14. Com efeito, vem a empresa referir que considera na Mod. 22 como sendo gasto não fiscal a quantia de 1.064.203,79 €, motivada pelas decisões aferidas no procedimento inspetivo, e relacionados com os exercícios de 2010 a 2013.
15. Analisada a questão, e reconhecendo que se trata de gastos com depreciação/amortização de um ativo intangível, a legislação em vigor a data dos factos, menciona o seguinte:
16. De acordo com a NCRF 6, prevista no Aviso n.º 8256/2015, de 20 de julho, os ativos intangíveis devem ser classificados como ativos intangíveis com vida útil finita ou como ativos intangíveis com vida útil indefinida, consoante a empresa consiga, ou não, determinar a sua vida útil;
17. O §86 da referida norma, estabelece que um ativo intangível tem uma vida útil indefinida quando, com base numa análise de todos os fatores relevantes, não houver limite previsível para o período durante o qual se espera que o ativo gere influxos de caixa líquidos para a entidade;
18. Os ativos intangíveis com vida útil finita devem ser amortizados durante a sua vida útil e os de vida útil indefinida num período máximo de 10 anos, e em ambas as situações, sujeitos a testes de imparidade, nos termos do §87, §105 e §107 da NCRF 6.
19. Quanto à legislação fiscal e com a publicação do art.º 45.º-A do CIRC, foi introduzido um regime de dedutibilidade do valor de aquisição dos ativos intangíveis, nos termos do qual aquele valor é considerado como gasto fiscal, em partes iguais, durante os primeiros 20 períodos de tributação após o seu reconhecimento inicial, e o art.º 16.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, menciona que os ativos intangíveis são amortizáveis quando sujeitos a deperecimento, designadamente por terem uma vigência temporal limitada.
Fase ao exposto,
E atendendo a que não foram apresentados elementos que possibilitem a determinação da respetiva vida útil de cada ativo intangível, não se mostrando deste modo cumprido o disposto no art.º 74.º da LGT quanto à junção de elementos de prova, sou de opinião que deverá a presente reclamação ser indeferida na sua totalidade.
Acrescenta-se ainda que, por se não se verificarem in casu os pressupostos do n.º 1 do art.º 43.º da LGT, não assiste à Reclamante o direito a juros indemnizatórios.
V - CONCLUSÃO
Nestes termos, pelo exposto propõe-se o INDEFERIMENTO da presente reclamação, de acordo com os fundamentos da presente informação, notificando-se a Reclamante para, querendo, exercer o direito de audição prévia, consignado na participação da formação da decisão, a que se refere a al. b), do n.º 1, do art.º 60.º da Lei Geral Tributária.
DD) Na sequência do exercício do direito de audição prévia, foi mantida a decisão de indeferimento da reclamação por se ter entendido que a Reclamante não apresentou elementos suficientes e suscetíveis de alterar o sentido do projeto de decisão.
EE) Em 28-02-2020, a Requerente apresentou recurso hierárquico da decisão de indeferimento da reclamação graciosa.
FF) O recurso hierárquico foi indeferido por despacho da Subdiretora-Geral, de 26-06-2020, praticado ao abrigo de subdelegação de competências.
GG) A informação dos serviços em que se baseou o indeferimento do recurso hierárquico, na parte que releva, é do seguinte teor:
IV.3. – Parecer
No seguimento dos elementos que integram os autos e dos fundamentos apresentados pela Recorrente "A..., SA" em sede de recurso hierárquico, cabe decidir.
Quanto ao vício de falta de fundamentação
31. A Recorrente imputa à decisão proferida em sede de reclamação graciosa ao vício de falta de fundamentação.
32. Sucede, porém, que no seguimento de diversa [jurisprudência, a fundamentação constitui um conceito relativo, e implica necessariamente que a fundamentação tenha de ser apreciada em concreto.
33. A este propósito refere o acórdão do STA de 30.12.2012 proferido no Processo 03896/10 que:
“... conforme é jurisprudência uniforme e constante a fundamentação é um conceito relativo que varia em função do tipo concreto de cada ato e das circunstâncias concretas em que é praticado .... É contextual a fundamentação quando se integra no próprio ato e dela é contemporânea... A fundamentação é clara quando tais razões permitem compreender sem incertezas ou perplexidades qual foi o «iter» cognoscitivo - valorativo da decisão sendo congruente quando a decisão surge como conclusão lógica necessária de tais razões... Quanto à fundamentação de direito, tem sido entendimento do STA que na fundamentação de direito dos atos administrativos não se exige a referência expressa aos preceitos legais, bastando a referência aos princípios jurídicos pertinentes, ao regime legal aplicável ou a um quadro normativo determinado... Diga-se ainda que a fundamentação dos atos serve fins de inteligibilidade e de esclarecimento, devendo mostrar o «iter» cognoscitivo e valorativo que conduziu a instituição, sendo que, na perspetiva do visado, o que lhe interessa é conhecer os antecedentes da consequência decisória - mesmo que mal extraída - para, assim esclarecido, seguidamente optar entre acatá-la ou impugná-la."
34. Aliás, ainda a este propósito, refere o n.º 1 do artigo 77° da Lei Geral Tributária (LGT) que:
"A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária".
35. De referir ainda que em matéria tributária, o direito à fundamentação do ato tributário, constitui uma garantia específica dos contribuintes, com assento constitucional (artigo 268°, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa), que visa responder às necessidades do seu esclarecimento, procurando-se informar do itinerário cognoscitivo e valorativo do ato por forma a permitir conhecer as razões de facto e de direito que determinam a sua prática e por que motivo se decidiu num sentido e não noutro.
36. Ora, no presente caso, a posição de indeferimento da pretensão do sujeito passivo, consta das informações elaboradas pela Divisão de Justiça Administrativa da Direção de Finanças de Lisboa, nas quais se encontra devidamente explicitado o que motivou a não aceitação como gasto fiscalmente dedutível das reintegrações e amortizações praticadas em relação ao ativo intangível constituído pela "Marca C...", bem como, o quadro legal que sustenta a posição assumida pela Administração Tributária.
37. Assim, a Recorrente ficou em condições de conhecer as suas motivações, como, aliás, o demonstra aquando do exercício do seu direito de audição em sede de procedimento gracioso, e da apresentação do presente recurso hierárquico.
38. Com efeito, a suficiência da fundamentação revela-se só por si no facto de o direito de defesa ter podido ser plenamente exercido, nos termos fixados na lei.
Ainda, e em particular, vem a Recorrente invocar a falta de fundamentação, alegando que:
39. A Autoridade Tributária limita-se a tecer considerações sobre a marca "C...", ignorando a totalidade das realidades transmitidas no mesmo contrato.
40. Ora, conforme se pode concluir da leitura do projeto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa e da decisão final, as divergências entre a Recorrente e a Administração Tributária têm por base o contrato de "Assent Purchase Agreement" assinado entre a Recorrente e a empresa "D..., SA", e o valor total do mesmo de 16.200.000,00€.
41. Aliás da leitura da fundamentação utilizada, pode-se depreender que a utilização da expressão - marca C...- visou apenas abreviar a forma de mencionar todas as realidades associadas a marca e transmitidas juntamente com ela como um todo.
42. Aliás, é a própria Recorrente que nos Mapas de Amortização e Reintegrações designa o ativo intangível aqui em causa por "MARCA/DIREITOS C..." _
43. De realçar ainda, que o próprio contrato refere apenas um valor global para todas as realidades transacionadas, sendo impossível de individualizar qualquer valor.
Quanto ao acréscimo das amortizações praticadas
44. No caso em concreto, a B... pretende a correção da sua autoliquidação referente ao período de 2016, no sentido de que seja fiscalmente dedutível as amortizações/depreciações praticadas sobre o ativo intangível "Marca C..." no valor de 1.064.203,79€, valor que, embora discordando, acresceu no quadro 07 para efeitos de cálculo do seu lucro tributável.
45. As referidas amortizações/depreciações referem-se ao seguinte grupo de ativos, adquiridos pela Recorrente, em 23.12.2009, pelo valor de €15.600.000,00 e mais tarde transmitidos a B..., na sequência da subscrição de um aumento de capital em espécie:
"Manufacturing technology and know-how": compreendendo todo o know-how relativo à formulação dos produtos, controlo de qualidade, acondicionamento, fórmulas, registo de reclamações, avaliações, processos, tecnologia utilizada;
"Registrations": compreendendo os dossiers de registo dos produtos e autorizações de comercialização;
"Trademarks": compreendendo a marca "C...", mas também as marcas "...", "...", "...", "...", "...", "...", "...", "...", "...", "...", "...", "...", "..."; "...", "...", "...", "...", "...", "...", "...", e os registos atualizados;
"Marketing and promotional documents": compreendendo a lista de clientes, os planos de marketing e promoção, manuais de formação da força de vendas, existentes à data da transação.
A cedência de posição contratual em todos os contratos de distribuição que a alienante dos ativos havia celebrado, incluindo contratos de fornecimento ao Grupo E... e Grupo F...;
A cedência de posição contratual da alienante dos ativos no âmbito dos contratos de fornecimento e de fabrico celebrados com os G..., H... e I... .
46. Como se vê, o ativo em questão compreende realidades muito diversas como sejam, para além de várias marcas comerciais, propriamente ditas, técnicas e conhecimentos de manufatura e fabrico, registos dos produtos e autorizações de comercialização, lista de clientes, planos de marketing e promoção, manuais de formação da forca de vendas, e cedências de várias posições contratuais em contratos de distribuição e fornecimento.
47. Com efeito, a Recorrente mistura 21 marcas, igualizando-as para efeitos de vida útil, e não apurando qualquer distinção entre as mesmas, pelo que não se compreendendo, se, e porquê, deverão as mesmas ser objeto do mesmo tratamento ao nível dos pressupostos e condições da sua amortização para efeitos fiscais.
48. Por outro lado, e um pouco em consequência da abordagem adotada, a argumentação da Recorrente relativamente ao cumprimento dos pressupostos da respetiva amortização fiscal pelas marcas comerciais em questão, reconduzem-se a circunstâncias genéricas, aplicáveis, por natureza, à generalidade das marcas comerciais.
49. Ora, conforme é consabido, as marcas comerciais, não obstante os fatores indicados pela Recorrente, como sejam a necessidade de investimentos ao nível do mercado e da tecnologia são, por princípio, ativos sem uma duração definida.
50. Note-se que a circunstância de a marca comercial, enquanto ativo intangível, ter vida útil indefinida, não impede que esta possa sofrer perdas de valor, mas o tratamento contabilístico destas perdas não se enquadra pela consideração de uma vida útil finita e pelo consequente registo de amortizações, mas pelo registo de perdas de imparidade em ativos intangíveis.
51. No que se refere aos restantes elementos integrantes do ativo C..., acima discriminados, designadamente as técnicas e conhecimentos de manufatura e fabrico os registos dos produtos e autorizações de comercialização, as listas de clientes, os planos de marketing e promoção, os manuais de formação da força de vendas, e as cedências de várias posições contratuais em contratos de distribuição e fornecimento, crê-se, que pelo menos alguns desses ativos terão, efetivamente e por natureza, um período de duração finito.
52. Contudo, é impossível verificar se, e em que medida, os referidos fatores se aplicam a cada um dos diversos tipos de ativos que estão em causa.
53. Sendo que, foi a própria Recorrente que apela de "Marca/Direitos C..." todo o conjunto de ativos, optando por amortizar tudo a uma taxa média, primeiro considerando que o ativo tem uma vida útil de 6 anos, e posteriormente com base numa vida útil de 10 anos, sem que se descortine qualquer fundamento material e legal que valide tal opção.
54. De referir que, decorre dos termos do próprio contrato que a "Marca C..." foi adquirida com todos os direitos e restrições e, por todo o tempo de duração, pelo que não é possível determinar de forma fiável e comprovada o período de tempo pelo qual o produto comercializado sob a "Marca C..." irá produzir benefícios económicos futuros.
55. Dispõe o artigo 16° do Decreto Regulamentar n° 25/2009, de 14 de setembro, que: "1 - Os ativos intangíveis são amortizáveis quando sujeitos a deperecimento, -designadamente por terem uma vigência temporal limitada.
2 - São amortizáveis os seguintes ativos intangíveis:
a) Despesas com projetos de desenvolvimento;
b) Elementos da propriedade industrial, tais como patentes, marcas, alvarás, processos de produção, modelos ou outros direitos assimilados, adquiridos a título oneroso e cuja utilização exclusiva seja reconhecida por um período limitado de tempo.
3 - Exceto em caso de deperecimento efetivo devidamente comprovado, reconhecido pela Direcção-Geral dos Impostos, não são amortizáveis:
a) Trespasses;
b) Elementos mencionados na alínea b) do número anterior quando não se verifiquem as condições aí referidas."
56. Assim, temos que para efeitos fiscais, e nos termos da alínea b) do n.º 2 do art.º 16° do DR 25/2009, são amortizáveis os elementos da propriedade industrial, tais como patentes, marcas, alvarás, processos de produção, modelos ou outros direitos assimilados, adquiridos a título oneroso e cuja utilização exclusiva seja reconhecida por um período limitado de tempo.
57. No caso concreto, o ativo intangível em causa não cumpre as condições ali referidas uma vez que estamos perante ativo intangível - Marca C...- adquirida a titulo oneroso, mas cuja utilização exclusiva não foi reconhecida por um período limitado de tempo, pelo que, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo, tal ativo apenas será amortizável em caso de deperecimento efetivo devidamente comprovado, reconhecido pela AT.
58. Vem ainda, a Requerente invocar que, "ainda que se entenda que o ativo intangível sub judice não tem vigência temporal limitada, não deixava o mesmo de ser amortizado e relevado para efeitos fiscais, desde que se entenda que os ativos em questão estão sujeitos a deperecimento."
59. Justifica a Requerente a existência deste deperecimento com a necessidade de realizar constantes e novos investimentos na manutenção ou melhoria dos recursos inerentes, devido aos constrangimentos da inovação tecnológica e científica, a fim de impedir que o ativo se torne obsoleto.
60. Ora, importa referir que os argumentos invocados pela Requerente, de necessidade de constantes investimentos a fim de que o ativo não perca valor, assentam em previsões e estudos que poderão facilmente alterar-se, face a variações no mercado em que a marca se insere, pelo que tal não garante que ao longo dos próximos anos exista um deperecimento efetivo daquele ativo.
61. Aliás, a própria Recorrente reconhece que a "Marca C... " está no mercado nacional desde 1950, e naturalmente, desde essa data sujeita a necessidade de constantes investimentos, tendo em vista manter a posição no mercado.
62. Pelo que, não estando, nos termos do n.º 3 do art.º 16.º do DR 25/2009, comprovado esse deperecimento, as amortizações praticadas sobre o ativo em causa não poderão ser aceites fiscalmente nos termos da alínea a) do n° 1 do artigo 34° do CIRC.
63. Ainda, e em consonância com a legislação fiscal, o Sistema de Normalização contabilística refere na NCRF 6, parágrafo 87 que:
"Um ativo intangível deve ser visto pela entidade como tendo uma vida útil indefinida quando, com base numa análise de todos os fatores relevantes, não houver limite previsível para o período durante o qual se espera que o ativo gere influxos de caixa líquidos para a entidade."
64. E no seu parágrafo 88 que:
“A contabilização de um ativo intangível baseia-se na sua vida útil. Um ativo intangível com uma vida útil finita é amortizado, e um ativo intangível com uma vida útil indefinida não o é".
65. Podemos, pois, com toda a clareza, concluir que a "Marca C..." trata-se de um Ativo Fixo Intangível cuja vida útil é indefinida, em face do que não é amortizável.
Continuando,
66. Vem a Recorrente apresentar um dossier que elaborou no seguimento de uma recolha exaustiva de diversos elementos e estudos, com vista a demonstrar que os ativos em apreço têm uma vida útil finita, sendo o respetivo período de utilização estimado de 10 anos – Acervo documental que juntou aos autos como Doc. 6, constituído por uma PEN com 2046 folhas.
67. Contudo, a abordagem adotada pela Recorrente continua a referir uma taxa média de amortização com base numa vida útil de 10 anos, considerando que alguns dos ativos têm uma vida útil de 8 anos, outros de 5 a 10 anos, e ainda outros de 8 a 16 anos.
68. Ou seja, apesar dos estudos (quer elaborados internamente pela equipa técnica e comercial, quer por outras entidades externas), a Recorrente continua a tratar o conjunto de ativos que compõem a "Marca C..." como um todo, insistindo na vida útil finita de todas as componentes do ativo, reconhecendo no parágrafo 55° da petição que não é possível determinar um número de anos de vida útil de cada uma das componentes do ativo.
69. Ora, é consabido que, não obstante a necessidade de investimentos ao nível da tecnologia e de licenças de mercado, as marcas são, por princípio, ativos sem duração de vida definida.
70. Aliás, a referida tendência para a duração indefinida das marcas não colide com a normal e natural, ao longo do tempo, descontinuação de (linhas) de produtos abrangidos pela mesma marca comercial, bem como o lançamento de novas (linhas) de produtos abrangidos por tal marca, em virtude de alterações regulamentares ou das condições do mercado, que não afetarão o uso e a intenção do uso por período indeterminado da marca, mas, antes, o período de uso de itens associados como técnicas e conhecimentos de manufatura e fabrico, os registos dos produtos e autorizações de comercialização, as listas de clientes, os planos de marketing e promoção, os manuais de formação da força de vendas, e as cedências de várias posições contratuais em contratos de distribuição e fornecimento .
71. De acrescentar, que a circunstância de a marca comercial, enquanto ativo intangível, ter vida útil indefinida, não impede que este possa sofrer perdas de valor.
72. Em face de todo o exposto, o valor considerado como gasto não é aceite fiscalmente, pelo que se encontra corretamente acrescido no quadro 07 da declaração de rendimentos Modelo 22 da B..., devendo manter-se na ordem jurídica a autoliquidação do Grupo aqui contestada.
73. Ainda, e por último, é de referir que os pareceres técnicos emitidos pela "J..., Lda" e pela "K... - SROC, SA", e juntos ao processo pela Recorrente, são exatamente isso "Pareceres Técnicos" emitidos per entidades independentes que, no presente caso, foram instrumentos auxiliares que vêm confirmar a tomada de decisão da Recorrente quanto à contabilização do referido ativo intangível, mas, cujo teor a Administração Tributária não tem qualquer obrigação de se pronunciar.
VI - Proposta de Decisão
Tendo em conta o exposto nos pontos anteriores, será de indeferir o presente recurso (remete-se para a leitura da Decisão proferida no Processo CAAD 670/2017-T referente à mesma entidade, mas ao período de 2014, que tem por referência os mesmos factos e o mesmo enquadramento legal).
HH) O pedido arbitral deu entrada em 10-11-2020.
Factos não provados
Não existem factos não provados que relevem para a decisão da causa.
O tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base nos documentos juntos à petição e constantes do processo administrativo apresentado pela Autoridade Tributária, com a sua resposta, e os depoimentos produzidos nos Processos n.º 543/2017 e 670/2017, por efeito do aproveitamento da prova nos termos do artigo 421.º, n.º 1, do CPC.
Matéria de direito
Delimitação do objeto do processo
5. No pedido arbitral, a Requerente dedica um capítulo à ilegalidade das decisões de indeferimento da reclamação graciosa e do recurso hierárquico (artigos 376.º e segs.), em que invoca o vício de falta de fundamentação e o vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, e mesmo num momento precedente, em que se refere ao procedimento gracioso, imputa igualmente à decisão de indeferimento da reclamação graciosa o mesmo vício de falta de fundamentação (artigos 200.º e 201.º).
Importa referir, a este propósito, que o âmbito de competência dos tribunais arbitrais, na arbitragem tributária, é definido por referência à declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte ou pagamento por conta ou à declaração de legalidade de atos de fixação da matéria tributável que não dê origem a liquidação (artigo 2.º, n.º 1, do RJAT).
Os procedimentos de impugnação administrativa que tenham sido precedentemente deduzidos, como seja a reclamação graciosa ou o recurso hierárquico, constituindo uma garantia procedimental do contribuinte, correspondem a procedimentos de segundo ou de terceiro grau, permitindo que a Administração possa ainda tomar uma posição definitiva sobre a questão antes de o interessado poder suscitar um litígio judicial. E nesse sentido, o efeito útil e relevante do indeferimento da impugnação administrativa traduz-se na manutenção na ordem jurídica do ato tributário de liquidação.
Tendo sido deduzido um pedido de constituição de tribunal arbitral para a apreciação da legalidade de um ato de autoliquidação, o objeto do processo é esse próprio ato tributário (neste sentido, o acórdão do STA de 18 de Maio de 2011, Processo n.º 0156/11, e, na doutrina, cfr. SERENA CABRITA NETO/CARLA CASTELO TRINDADE, Contencioso Tributário, vol II, Coimbra, 2017, pág. 434).
E, nestes termos, os vícios próprios da decisão de reclamação graciosa ou da decisão de recurso hierárquico, enquanto procedimentos de segundo e de terceiro grau, não são, em si, arbitráveis, na medida em que escapam ao âmbito material da arbitragem tributária. Sendo que tais decisões apenas são susceptíveis de serem anuladas como mera consequência da declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação, que constitui o objeto imediato do pedido arbitral.
Não há, assim, que tomar conhecimento dos apontados vícios de falta de fundamentação e o vício de violação de lei que são imputados às decisões de indeferimento da reclamação graciosa e do recurso hierárquico, pelo que o tribunal apenas apreciará o vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, que, da petição inicial considerada no seu conjunto, se depreende ser atribuível ao ato tributário de autoliquidação.
Questão de fundo
6. Na declaração periódica de rendimentos Modelo 22 individual, para o exercício de 2016, a B... não deduziu o custo referente a depreciações e amortizações do ativo intangível Marca C..., por ter atendido às correções tributárias efetuadas no âmbito de procedimentos inspetivos que incidiram sobre os exercícios de 2010, 2011, 2012 e 2013.
A Administração Tributária fundou a sua posição, nesses procedimentos, na circunstância de o ativo em causa não se encontrar sujeito a deperecimento nem condicionado por uma vigência temporal limitada. Partindo dessa qualificação, a Administração concluiu que não há lugar à amortização do custo para efeitos fiscais, dando aplicação ao disposto no artigo 34.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRC e no artigo 16.º, n.º 1, do Regime das Depreciações e Amortizações para efeito do IRC, bem como à Norma Contabilística do Relato Financeiro (NCRF) 6.
A Requerente contesta este entendimento, por considerar, em suma, que os ativos em questão - e não apenas o ativo marca “C...” - perdem valor e têm uma vida útil finita, a qual foi determinada pela Requerente com base numa estimativa que tomou em atenção o critério concorrencial, tecnológico, ciclo de vida dos produtos e investimento significativo para manutenção do valor dos ativos, concluindo tratar-se de ativos sujeitos a deperecimento e susceptíveis de amortização.
É esta a questão que cabe dilucidar.
À data da aquisição dos ativos, dispunha o artigo 34.º, n.º 1, alínea a), do CIRC, sob a epígrafe “Depreciações e amortizações não dedutíveis para efeitos fiscais”, que “não são aceites como gastos: a) as depreciações e amortizações de elementos do ativo não sujeitos a deperecimento”.
O desenvolvimento do regime de depreciações e amortizações foi remetido para o Decreto-Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de Setembro, havendo a considerar, em especial, o disposto no artigo 16.º desse diploma, que, na parte que releva, tem a seguinte redação:
Artigo 16.º
Ativos intangíveis
1 - Os ativos intangíveis são amortizáveis quando sujeitos a deperecimento, designadamente por terem uma vigência temporal limitada.
2 - São amortizáveis os seguintes ativos intangíveis:
a) (…)
b) Elementos da propriedade industrial, tais como patentes, marcas, alvarás, processos de produção, modelos ou outros direitos assimilados, adquiridos a título oneroso e cuja utilização exclusiva seja reconhecida por um período limitado de tempo.
3 - Exceto em caso de deperecimento efetivo devidamente comprovado, reconhecido pela Direcção-Geral dos Impostos, não são amortizáveis:
a) (…)
b) Elementos mencionados na alínea b) do número anterior quando não se verifiquem as condições aí referidas.
A reforma do Código do IRC, aprovada pela Lei n.º 2/2014, de 16 de Janeiro, com efeitos a partir de 1 de Janeiro, alterou entretanto o artigo 29.º desse diploma, que a passou a dispor que “são aceites com gastos as depreciações e amortizações de elementos do ativo sujeitos a deperecimento, considerando-se como tais: a) os ativos fixos tangíveis, os ativos intangíveis; b) os ativos biológicos que não sejam consumíveis e as propriedades de investimento contabilizados ao custo de aquisição”. (n.º 1). Ainda segundo o n.º 2, “consideram-se sujeitos a deperecimento os ativos que, com caráter sistemático, sofram perdas de valor resultantes da sua utilização ou do decurso do tempo”.
A reforma do Código do IRC aditou ainda o artigo 45.º-A, epigrafado como “Ativos intangíveis, propriedades de investimento e ativos biológicos não consumíveis”, que, no que mais interessa, tem a seguinte redação:
1 - É aceite como gasto fiscal, em partes iguais, durante os primeiros 20 períodos de tributação após o reconhecimento inicial, o custo de aquisição dos seguintes ativos intangíveis quando reconhecidos autonomamente, nos termos da normalização contabilística, nas contas individuais do sujeito passivo:
a) Elementos da propriedade industrial tais como marcas, alvarás, processos de produção, modelos ou outros direitos assimilados, adquiridos a título oneroso e que não tenham vigência temporal limitada;
(…)
Por efeito desta nova disposição, o legislador passou a considerar que os ativos intangíveis adquiridos são depreciáveis quando não tenham uma vigência temporal limitada, caso em que a amortização será efetuada por um período de 20 anos, distinguindo-se dos ativos com vigência temporal limitada em que a amortização será efetuada de acordo com a respetiva vigência temporal.
No Relatório da Comissão de Reforma do Código do IRC, esta opção legislativa é explicada nos seguintes termos:
“(…) no caso dos subsídios que respeitem a ativos intangíveis sem vida útil definida, visto que estes não são amortizáveis, a Comissão de Reforma propõe a atribuição de efeitos fiscais à despesa realizada, como se de uma amortização se tratasse, optando, no entanto, por um período objetivo de 20 anos, para imputação dos gastos resultantes da utilização deste tipo de ativos. (…) O regime cuja introdução ora se propõe pretende conferir um tratamento fiscal competitivo e ambicioso aos ativos intangíveis sem período de vida útil definido. (…) Assim, e muito embora se tratem de ativos que – justamente por não terem o seu período de vida útil definido –, não estão sujeitos a depreciação, a Comissão considerou vantajoso que a lei fiscal reconheça a possibilidade de o seu custo de aquisição ser dedutível, em partes iguais, ao longo de vinte períodos de tributação.”
Os ativos intangíveis passam assim a ser amortizáveis, também do ponto de vista fiscal, mesmo os que têm uma vida útil indefinida.
No entanto, sendo o novo regime aplicável aos ativos intangíveis adquiridos após 1 de Janeiro de 2014, a questão em presença terá de ser analisada à luz do disposto no artigo 34.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRC e do Decreto-Regulamentar n.º 25/2009, tendo em atenção que, na situação do caso, a aquisição ocorreu em 2009 (alínea B) da matéria de facto).
E, face aos termos em que a questão vem suscitada no processo, o que cabe averiguar é se se encontra provado que os ativos C... têm uma vida útil definida, a que a Requerente atribuiu inicialmente um limite de seis anos, que foi mais tarde revisto para dez anos.
Interessa começar por precisar, tal como se assinalou no acórdão proferido no Processo n.º 670/2017-T, que se pronunciou sobre idêntica questão mas com referência ao exercício de 2014, que não estão em causa, no presente caso, correções do lucro tributável operadas em sede de inspeção tributária, mas antes a apreciação da legalidade do ato de autoliquidação praticado pela Requerente, que foi objeto de reclamação graciosa e de recurso hierárquico, o que tem consequências no plano do ónus da prova.
Com efeito, tendo em conta o critério que resulta do disposto no artigo 74.º, n.º 1, da LGT, pelo qual o “ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária e dos contribuinte recai sobre quem os invoque”, cabe distinguir entre a situação em que está em causa a apreciação da legalidade de um ato de liquidação oficiosa, praticado pela Autoridade Tributária, corrigindo liquidação anterior baseada na declaração do contribuinte, e aquela outra em que é a Requerente que se apresenta em juízo a peticionar a ilegalidade da liquidação operada com base na sua própria declaração.
Enquanto no primeiro caso, é à Administração que incumbe o ónus da prova dos pressupostos legais da correção que operou, no segundo caso, é ao contribuinte que assiste o ónus da prova da ilegalidade do ato cuja anulação pretende.
Face à pretensão deduzida pela Requerente, coloca-se, por conseguinte, a questão de saber se se demonstram factos idóneos no sentido de concluir que a marca C... e os ativos a ela associados deverão ser considerados um ativo intangível com duração finita e limitada e, portanto, sujeitos a amortizações que poderão ser reconhecidas como custo fiscalmente relevante, e ainda se os prazos de amortização deverão ser os indicados pela Requerente.
O citado acórdão tirado no Processo n.º 670/2017 considerou que a Requerente não demonstrou, com fiabilidade, qual a vida útil de cada um dos ativos intangíveis adquiridos, partindo, para assim concluir, das seguintes ordens de considerações.
A Requerente igualiza as 21 marcas que compõem os ativos, não se apurando qualquer distinção entre as mesmas e não se compreendendo por que razão deverão ser objeto do mesmo tratamento ao nível dos pressupostos e condições da sua amortização fiscal.
Por outro lado, a argumentação da Requerente reconduz-se a circunstâncias genéricas, aplicáveis ao conjunto das marcas comerciais.
As marcas comerciais, não obstante os fatores indicados pela Requerente, como sejam a necessidade de investimentos ao nível do mercado e da tecnologia, são, em princípio, ativos sem uma duração definida, o que não impede que estes possam sofrer perdas de valor, no entanto, o tratamento contabilístico destas perdas não se enquadra pela consideração de uma vida útil finita e o pelo consequente registo de amortizações, mas pelo registo de perdas de imparidade (parágrafo 107 da NCRF6).
Relativamente aos restantes elementos integrantes do ativo C..., designadamente as técnicas e conhecimentos de manufatura e fabrico, os registos dos produtos e autorizações de comercialização, as listas de clientes, os planos de marketing e promoção, os manuais de formação da força de vendas, e as cedências de posições contratuais em contratos de distribuição e fornecimento, é de admitir que, pelo menos, alguns desses ativos terão por natureza um período de duração finito.
Assim, as técnicas e conhecimentos de manufatura e fabrico, os registos dos produtos e autorizações de comercialização, os planos de marketing e promoção e os manuais de formação da força de vendas, e os contratos de distribuição e fornecimento não serão, em princípio, utilizáveis indefinidamente, sobretudo tendo em conta que a maior parte dos produtos que estão em causa se destinam a uma faixa de mercado transitória.
Todavia, estamos perante ativos de natureza heterogénea, relativamente aos quais não foram coligidos elementos suficientes que permitam concluir que, para todos e cada um deles, é adequado o prazo de amortização que a Requerente ora pretende fazer valer.
O pedido arbitral foi, em consequência, julgado improcedente.
No presente processo, a Requerente pretende que todos os elementos que serviram de base à determinação do período de vida útil de 10 anos do conjunto dos ativos se encontram evidenciados no dossier que constitui o documento n.º 26 do pedido arbitral, que fazem prova inequívoca de que todos os ativos se encontram sujeitos a deperecimento e são suscetíveis de serem amortizados.
O dossier integra diversos estudos sobre os critérios para a determinação da vida útil dos ativos que se encontram sintetizados em termos conclusivos no relatório “Ativos C... Vida útil”, que constitui o anexo 11 do documento n.º 26, e cujos considerandos se encontram amplamente reproduzidos nas alegações escritas da Requerente.
Para além de considerações gerais sobre as normas contabilísticas aplicáveis e o quadro legal vigente e os conceitos de vida útil e de deperecimento, o documento aborda os diversos fatores que relevam para uma estimativa da vida útil remanescente de uma marca e acaba por concluir que o acervo de ativos adquiridos pela Requerente, e depois transferidos para a B..., tem uma vida finita e determinável na medida em que se encontra condicionado pela correlação entre o sucesso comercial das vendas e o nível de investimento em marketing e pelas limitações temporais que influenciam os registos e autorizações de comercialização e o know e tecnologia utilizada no fabrico dos produtos.
Não parece, em todo o caso, que os elementos fornecidos através dos estudos e relatórios que constam do documento n.º 26, assentes em considerações de natureza conceptual e meros juízos de valor quanto ao carácter finito da vida útil dos ativos possam pôr em causa a validade do entendimento expresso no acórdão proferido no Processo n.º 670/2017.
Importa ter presente que a Requerente optou, à data da transação, por registar a aquisição como um único ativo ou um conjunto de ativos, não obstante assumirem diferente natureza e compreenderem diversas marcas comerciais, o que poderá justificar-se no plano da gestão empresarial pelo grau de interdependência entre os diferentes ativos adquiridos. Por outro lado, como se depreende do anexo 3 do documento n.º 26, a Requerente, e posteriormente a B..., efectuou as amortizações através do método de quotas constantes a uma taxa média.
Não tendo havido lugar a uma desagregação de ativos, de modo a que estes pudessem ser qualificados como ativos identificáveis e passíveis de gerar benefícios económicos de forma separada, não é possível verificar se todos os fatores que foram considerados pelo sujeito passivo para efeito de estimar a vida útil se aplicam a cada um dos diversos dos ativos que estão em causa, tendo em conta que se trata de ativos de natureza heterogénea e que abrangem uma multiplicidade de marcas comerciais.
Não se encontrando cabalmente demonstrada a vida útil finita do conjunto de ativos a considerar para efeito de amortização.
O pedido arbitral mostra-se ser, por isso, improcedente.
Reembolso do imposto indevidamente pago e juros indemnizatórios
7. Sendo de julgar improcedente o pedido principal de declaração de ilegalidade do ato tributário de autoliquidação e das decisões de indeferimento da reclamação graciosa e do recurso hierárquico, fica necessariamente prejudicado o pedido de reembolso do imposto indevidamente pago e do pagamento de juros indemnizatórios.
III – Decisão
Termos em que se decide julgar improcedente o pedido arbitral e manter o ato tributário de autoliquidação de IRC n.º 2017..., e, bem assim, as decisões de indeferimento da reclamação graciosa e do recurso hierárquico.
Valor da causa
A Requerente indicou como valor da causa o montante de € 248.443,29, que não foi contestado pela Requerida e corresponde ao valor da liquidação a que se pretendia obstar, pelo que se fixa nesse montante o valor da causa.
Custas
Nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 24.º, n.º 4, do RJAT, e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e Tabela I anexa a esse Regulamento, fixa-se o montante das custas em € 4.284,00, que fica a cargo da Requerente.
Notifique.
Lisboa, 8 de Outubro de 2021,
O Presidente do Tribunal Arbitral
Carlos Fernandes Cadilha
O Árbitro vogal
Luís Baptista
O Árbitro vogal
Rui Ferreira Rodrigues