DECISÃO ARBITRAL
Na sequência da apresentação de pedido de reforma da sentença, ao abrigo do disposto no n.º 2 do art.º 616.º do Código do Processo Civil aplicável ex vi da alínea e) do n.º 1 do art.º 29.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), por parte do Requerente e tendo bem presente os fundamentos nele aduzidos, vem o Tribunal Arbitral Singular decidir como segue:
I. DA TRAMITAÇÃO PROCESSUAL ANTECEDENTE AO PEDIDO DE REFORMA DA DECISÃO JÁ PROFERIDA E DA TEMPESTIVIDADE DA APRESENTAÇÃO DO PEDIDO DE REFORMA DA DECISÃO ARBITRAL:
1. No dia 8 de Setembro de 2021, o Tribunal Arbitral Singular proferiu decisão nos presentes autos, no sentido de declarar extinta a instância por desistência do Requerente; fixando o valor do processo em 2.460,59 € em conformidade com o disposto no art.º 97.º-A do CPPT, aplicável por remissão do art.º 3º do regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT); e ainda fixando o valor das Custas em 612,00 €, calculadas em conformidade com a Tabela I do regulamento de Custas dos Processos de Arbitragem Tributária em função do valor do pedido e não contraditado pela AT, a cargo do Requerente que deu causa à presente acção, nos termos do disposto nos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4 do RJAT e ainda art.º 4.º, n.º 5 do RCPAT e art.º 527, nºs 1 e 2 do CPC, ex vi do art.º 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
2. No dia 24.9.2021, o CAAD remeteu às partes, via CTT, a notificação da referida decisão arbitral.
3. Face ao disposto no n.º 1 do artigo 248.º do Código de Processo Civil (CPC) aplicável ex vi do artigo 29.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), as partes foram notificadas daquela decisão arbitral decisão no dia 27 de Setembro de 2021.
4. No dia 7 de Outubro de 2021, 19:14, a Requerente enviou e-mail a coberto do qual vinha o pedido de reforma da decisão arbitral, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 616.º do CPC aplicável ex vi do artigo 29.º do RJAT que ora se aprecia.
5. O requerimento que consubstanciava o pedido de reforma da decisão arbitral foi introduzido no SGP do CAAD em 8.10.2021.
6. Tendo em consideração, como visto, o envio da notificação da decisão arbitral às partes em 24 de Setembro de 2021; a sua notificação às partes em 27 de setembro de 2021; e o prazo de 10 dias para apresentação do pedido reforma da sentença, temos que o prazo para tal apresentação terminaria a 7 de Outubro de 2021.
7. Atendendo a que, como aduzido, o pedido de reforma da decisão arbitral foi enviado em 7.10.2021 (não obstante integrado no SGP do CAAD em 8.10.2021) dá-se tal pedido por tempestivo.
8. Desconhecendo o Tribunal Arbitral Singular se o Requerente interpôs recurso para o Tribunal Constitucional ou para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do disposto no artigo 25.º do RJAT, admite-se pedido de reforma apresentado ao abrigo do artigo 616.º do CPC.
9. O Requerente tem legitimidade ao abrigo do disposto no artigo 616.º do CPC aplicável ex vi do artigo 29.º do RJAT.
10. No dia 13 de Outubro de 2021, o Tribunal Arbitral Singular notificou a Requerida, por despacho, para se pronunciar sobre o pedido de reforma da sentença apresentado pelo Requerente. Diz aquele despacho: “Notifique-se a Requerida para se pronunciar sobre o pedido de reforma da decisão arbitral apresentado pelo Requerente por e-mail de 7.10.2021 (não obstante integrado no SGP do CAAD em 8.10.2021) em conformidade com o disposto na alínea a) do n.º 2 do art.º 616.º do CPC, aplicável ex vi da alínea e) do n.º 1 do art.º 29.º do RJAT. Prazo: 10 dias.
Lisboa, 12 de Julho de 2021.
O árbitro,
(...)”
11. A Requerida nada disse em resposta ao despacho de 13.10.2021.
12. Face ao acima exposto, cumpre decidir quanto ao pedido de reforma da decisão arbitral formulado pela Requerente, além do mais, porquanto, a alínea b) do n.º 2 do artigo 616.º do CPC estatui como segue: “Não cabendo recurso da decisão, é ainda lícito a qualquer das partes requerer a reforma da sentença quando, por manifesto lapso do juiz:
a) (…);
b) Constem do processo documentos ou outro meio de prova plena que, só por si, impliquem necessariamente decisão diversa da proferida.”
II. SÍNTESE DA FUNDAMENTAÇÃO ESGRIMIDA NO PEDIDO DE REFORMA DA DECISÃO ARBITRAL DE 8.9.2021:
13. Diz a dado passo o Requerente na petição que consubstanciou o pedido de reforma da decisão arbitral que ainda que não tivessem aplicação os n.ºs 1 e 2 do art.º 13º do RJAT (em virtude de a Requerida ter revogado o acto tributário aqui em causa depois de decorridos os 30 dias a contar do conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral) não pode deixar de se ter em conta o que o CPC dispõe sobre o tema.
14. Trazendo à discussão a alínea e) do art.º 277 do CPC e aduzindo no sentido de que a instância se extingue com a inutilidade superveniente da lide.
15. E diz mais o requerente: “(...) recebida a informação enviada pela Requerida no dia 2 de Julho de 2021, verificou-se precisamente uma situação de inutilidade superveniente da lide, já que o acto cuja revogação se pretendia deixou de existir na ordem jurídica.”
16. Aduzindo ainda com o disposto no n.º 3 do art.º 536.º do CPC, não deixou o Requerente de retirar a asserção de que “(...) sendo a inutilidade superveniente da lide imputável à Requerida, é a esta que cabe a responsabilidade sobre as custas.”
17. E não se detendo, diz o Requerente que “Não pode deixar de se considerar que a inutilidade superveniente da lide é da responsabilidade da Requerida, já que, não só não revogou o acto de liquidação dentro do prazo de que dispunha para o efeito, antes da constituição do Tribunal Arbitral, como veio revogá-lo posteriormente.” E ainda: “Revogado o acto de liquidação, é evidente que o Requerente já não mantinha interesse no prosseguimento do procedimento arbitral - mas tal não configura uma situação de desistência.” Prosseguindo: “Pelo contrário, essa falta de interesse resulta precisamente do facto de a Requerida ter revogado o acto de liquidação cuja anulação se pretendia, pelo que, repete-se, a responsabilidade pela inutilidade superveniente da lide é da Requerida, devendo, portanto, esta ser responsável pelo pagamento das custas.”
III. APRECIAÇÃO DO PEDIDO DE REFORMA DA DECISÃO ARBITRAL PROFERIDA EM 8.9.2021:
18. Face ao pedido formulado pela Requerente de reforma da decisão arbitral proferida em 8.9.2021 nos presentes autos, procedeu o Tribunal Arbitral Singular à reapreciação da decisão proferida levando em boa conta os argumentos aduzidos na petição que consubstanciou o pedido de reforma.
19. Sobejamente ponderados e levados na devida conta os esclarecimentos agora apresentados em sede de reforma da decisão arbitral, considera o presente tribunal, que a decisão poderia ter seguido outro sentido, afastando-se a desistência da instância por parte da Requerente e considerando-se como adequada a inutilidade superveniente da lide em resultado da revogação do acto objecto do pedido de pronúncia arbitral por parte da Requerida para além do prazo previsto no n.º 1 do art.º 13º do RJAT.
20. Pelo que entende o presente Tribunal ser de acompanhar a posição da Requerente no que diz respeito à existência no processo arbitral de documentos que, só por si, implicam necessariamente decisão diversa da proferida, afastando-se o sentido da decisão com base na desistência do pedido por parte do Requerente e considerando-se o sentido da decisão numa outra linha de argumentação, ou seja, a da inutilidade superveniente da lide, o que implica, inelutavelmente, a necessidade de reforma da sentença já proferida.
21. Assim sendo, procede a pretensão do Requerente no que respeita à reforma da decisão arbitral peticionada, alterando-se a decisão arbitral nos termos seguintes:
IV. DECISÃO REFORMADA:
DECISÃO ARBITRAL
I. RELATÓRIO:
1. A..., contribuinte fiscal n.º..., residente em ..., ..., ..., França, (doravante, Requerente), apresentou, em 30.4.2021, um pedido de pronúncia arbitral, invocando o disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 2.º e nos nº 1 do art.º 10º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, de ora em diante apenas designado por RJAT) em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante Requerida).
2. No pedido de pronúncia arbitral, a Requerente optou por não designar árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art.º 6º e alínea a) do n.º 1 do art.º 11º ambos do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou o signatário como árbitro que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
3. Em 16.6.2021, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, por aplicação conjugada da alínea a) e b) do n.º 1 do art.º 11º do RJAT e dos art.º 6º e 7º do Código Deontológico.
4. Em conformidade com o estatuído na alínea c) do n.º 1 do art.º 11º do RJAT, na redacção que lhe foi introduzida pelo art.º 228.º da lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Tribunal Arbitral Singular foi constituído em 6.7.2021 para apreciar e decidir o objecto do processo.
5. A pretensão objecto do pedido de pronúncia arbitral consiste na declaração de ilegalidade de parte da liquidação de IRS n.º 2020..., relativa ao ano de 2019 e que se cifrava em 4.862,73 €.
6. No dia 12.7.2021, o Tribunal Arbitral Singular proferiu despacho com o seguinte teor: “Nos termos do disposto nos nºs 1 e 2 do art.º 17.º do RJAT, notifique-se o dirigente máximo do serviço da Administração Tributária, para, no prazo de trinta dias, apresentar resposta e, caso queira, solicitar a produção de prova adicional, acrescentando-se que deve ser remetido ao Tribunal Arbitral cópia do processo administrativo dentro do prazo de apresentação da resposta, aplicando-se, na falta de remessa, o disposto no n.º 5 do art.º 110.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.”
7. A Requerida não contestou.
8. Por requerimento de 13.7.2021, o Requerente veio, por intermédio dos Ilustres mandatários constituídos nos autos, informar da decisão da Requerida de revogar in totum o acto tributário objecto de pedido de pronúncia arbitral e ainda informar que não mantém interesse no prosseguimento do procedimento, invocando o n.º 2 do art.º 13º do RJAT.
9. Os n.ºs 1 e 2 do art.º 13º do RJAT, dizem: “1 – Nos pedidos de pronúncia arbitral que tenham por objeto a apreciação da legalidade dos atos tributários previstos no artigo 2.º, o dirigente máximo do serviço da administração tributária pode, no prazo de 30 dias a contar do conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral, proceder à revogação, ratificação, reforma ou conversão do ato tributário cuja ilegalidade foi suscitada, praticando, quando necessário, ato tributário substitutivo, devendo notificar o presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) da sua decisão, iniciando-se então a contagem do prazo referido na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º. 2 – Quando o ato tributário objeto do pedido de pronúncia arbitral seja, nos termos do número anterior, total ou parcialmente, alterado ou substituído por outro, o dirigente máximo do serviço da administração tributária procede à notificação do sujeito passivo para, no prazo de 10 dias, se pronunciar, prosseguindo o procedimento relativamente a esse último ato se o sujeito passivo nada disser ou declarar que mantém o seu interesse.
10. Tal como resulta do acima explicitado, a Requerida (por manifesto lapsus scribendi na decisão reformada aludia-se aqui à Requerente quando queria aludir-se, obviamente e como muito bem se faz notar no pedido de reforma da decisão arbitral, à Requerida) não procedeu à revogação da liquidação de IRS sindicada no prazo previsto no n.º 1 do acima transcrito art.º 13º do RJAT.
11. Assim sendo, resulta meridianamente claro que o regime previsto naquele normativo não tem aqui aplicação.
12. Aliás, a sua eventual aplicabilidade obstaria a que o presente Tribunal Arbitral Singular houvesse sequer sido constituído.
13. Assim sendo, o Tribunal apreciou (na decisão reformada) a manifestação de desinteresse na continuação do processo não já em conformidade com o disposto no art.º 13º do RJAT, tal como se sugere no requerimento apresentado em 13.7.2021, mas antes ao abrigo das normas gerais que regulam a desistência da instância.
14. Sucede, porém que, trazidos novos dados à apreciação da questão decidenda com o pedido de reforma da decisão arbitral de 8.8.2021, o Tribunal Arbitral Singular concorda que tal manifestação de desinteresse apresentada pelo Requerente em 13.7.2021 não pode ser apreciada como desistência da instância.
15. Por via da revogação do acto tributário de liquidação cuja anulação se pretendia com a apresentação do PPA, estamos aqui no domínio das normas gerais que regulam a inutilidade superveniente da lide, na medida em que a Requerida no dia 2.7.2021 (ou seja, já depois de esgotado o prazo previsto no n.º 1 do art.º 13º do RJAT, donde, depois de decorridos os 30 dias a contar do conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral) revogou o acto tributário de liquidação objecto dos presentes autos arbitrais.
16. E fê-lo antes mesmo do Requerente haver apresentado o requerimento de 13.7.2021 onde informava o Tribunal Arbitral Singular de que não mantinha interesse no prosseguimento do procedimento arbitral em conformidade com o n.º 2 do art.º 13º do RJAT.
17. Inferindo-se daqui que no momento em que o Requerente informou o Tribunal Arbitral Singular de que não mantinha interesse no prosseguimento do procedimento já o acto tributário de liquidação do IRS de 2019 havia sido revogado pela Autoridade tributária e Aduaneira.
18. O art.º 277.º do CPC, sob a epígrafe “Causas de extinção da instância”, dispõe: “A instância extingue-se com: a) (...)
e) A impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide.”
19. Atenta a revogação do acto tributário de liquidação objecto do presente pedido de pronúncia arbitral em 2.7.2021, tornava-se inútil o prosseguimento da presente lide no que respeita à pretensão anulatória do acto tributário sindicado, atendendo a que no momento em que cumpria proferir decisão tal acto já não se mantinha na ordem jurídica tendo sido revogado antes pela Requerida.
20. Adequado se mostrando trazer aqui à colação a decisão arbitral tirada no Processo n.º 672/2018-T, consultável in
https://caad.org.pt/tributario/decisoes/view.php?l=MjAxOTA0MjIxMTIzMDEwLlA2NzJfMjAxOFQgLSAyMDE5LTAzLTI1IC0gSlVSSVNQUlVERU5DSUEgLnBkZg%3D%3D e onde a dado passo de diz: “(...) Com efeito, verifica-se a inutilidade superveniente da lide quando, por facto ocorrido na pendência da causa, a solução do litígio deixe de ter interesse e utilidade, o que justifica a extinção da instância (cfr. artigo 277.º, al. e), do Código de Processo Civil). Como referem LEBRE DE FREITAS, JOÃO REDINHA, RUI PINTO1, a inutilidade ou impossibilidade superveniente da lide “dá-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objeto do processo, ou se encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar – além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outro meio”. Assim, se, por virtude de factos novos ocorridos na pendência do processo, o escopo visado com a pretensão deduzida em juízo já foi atingido por outro meio, então a decisão a proferir não envolve efeito útil, pelo que ocorre, nesse âmbito, inutilidade superveniente da lide. Decorre da actuação administrativa dada como provada que a pretensão formulada pela Requerente, que tinha como finalidade a declaração de ilegalidade e anulação por este Tribunal do acto sindicado, ficou prejudicada porquanto a supressão desse acto e seus efeitos da ordem jurídica foi conseguida por outra via, depois de iniciada a instância. Na verdade, a prática posterior do acto expresso de revogação da liquidação impugnada (cfr. art.º 79.º, n.º 1 da LGT) implica que a instância atinente à apreciação da legalidade dessas liquidações se extingue por inutilidade superveniente da lide, dado que, por terem sido eliminados os seus efeitos pela revogação anulatória, perde utilidade a apreciação, em relação a tais liquidações, dos vícios alegados em ordem à sua invalidade, ficando sem objecto a pretensão impugnatória contra elas deduzida.”
21. A inutilidade superveniente da lide no que respeita ao pedido de anulação do acto tributário de liquidação de IRS de 2019 objeto da presente lide está, assim, incontornavelmente demonstrada nos presentes autos.
20. No que tange, agora, estritamente à questão da responsabilidade pelas custas, estatui o n.º 3 do art.º 536.º do CPC como segue: “Nos restantes casos de extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, a responsabilidade pelas custas fica a cargo do autor ou requerente, salvo se tal impossibilidade ou inutilidade for imputável ao réu ou requerido, caso em que é este o responsável pela totalidade das custas.”
21. Nessa conformidade, acompanhamos o Requerente quando diz no pedido de reforma da decisão arbitral que a inutilidade superveniente da lide é da responsabilidade da Requerida, na medida em que, não só não revogou o acto tributário de liquidação sindicado antes da constituição do tribunal arbitral e nos termos e em conformidade com o disposto no art.º 13º do RJAT; como só veio a revoga-lo posteriormente, no dia 2.7.2021, constituindo-se esta (a Requerida), portanto, como responsável pelo pagamento da totalidade das custas.
II. DECISÃO:
FACE AO EXPOSTO, O TRIBUNAL ARBITRAL SINGULAR DECIDE:
A) DECLARAR EXTINTA A INSTÂNCIA POR INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE;
B) FIXAR O VALOR DO PROCESSO EM 2.460,59 € EM CONFORMIDADE COM O DISPOSTO NO ART.º 97.º-A DO CPPT, APLICÁVEL POR REMISSÃO DO ART.º 3º DO REGULAMENTO DAS CUSTAS NOS PROCESSOS DE ARBITRAGEM TRIBUTÁRIA (RCPAT).
III. CUSTAS:
FIXO O VALOR DAS CUSTAS EM 612,00 €, CALCULADAS EM CONFORMIDADE COM A TABELA I DO REGULAMENTO DE CUSTAS DOS PROCESSOS DE ARBITRAGEM TRIBUTÁRIA EM FUNÇÃO DO VALOR DO PEDIDO E NÃO CONTRADITADO PELA AT, A CARGO DA REQUERIDA QUE DEU CAUSA À PRESENTE ACÇÃO NOS TERMOS ACIMA EXPOSTOS, EM CONFORMIDADE COM O DISPOSTO NOS ARTIGOS 12.º, N.º 2 E 22.º, N.º 4 DO RJAT E AINDA ART.º 4.º, N.º 5 DO RCPAT E ART.º 527, NºS 1 E 2 E ART.º 536, N.º 3 AMBOS DO CPC, EX VI DO ART.º 29.º, N.º 1, ALÍNEA E) DO RJAT.
NOTIFIQUE-SE.
Lisboa, 2 de Novembro de 2021.
A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia antiga.
O árbitro,
(Fernando Marques Simões)
DECISÃO ARBITRAL
SUMÁRIO:
1. Nos termos e em conformidade com o disposto no n.º 1 do art.º 286.º do CPC, por interpretação a contrario, a desistência da instância não depende da aceitação da Autoridade Tributária e Aduaneira, conquanto ela seja apresentada antes do oferecimento da contestação.
2. A pretensão de arquivamento do processo arbitral (ou do seu não prosseguimento), manifestada antes da apresentação da resposta da AT, é relevante como desistência da instância.
I. RELATÓRIO:
1. A..., contribuinte fiscal n.º..., residente em ..., ..., ..., França, (doravante, Requerente), apresentou, em 30.4.2021, um pedido de pronúncia arbitral, invocando o disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 2.º e nos nº 1 do art.º 10º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, de ora em diante apenas designado por RJAT) em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante Requerida).
2. No pedido de pronúncia arbitral, a Requerente optou por não designar árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art.º 6º e alínea a) do n.º 1 do art.º 11º ambos do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou o signatário como árbitro que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
3. Em 16.6.2021, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, por aplicação conjugada da alínea a) e b) do n.º 1 do art.º 11º do RJAT e dos art.º 6º e 7º do Código Deontológico.
4. Em conformidade com o estatuído na alínea c) do n.º 1 do art.º 11º do RJAT, na redacção que lhe foi introduzida pelo art.º 228.º da lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Tribunal Arbitral Singular foi constituído em 6.7.2021 para apreciar e decidir o objecto do processo.
5. A pretensão objecto do pedido de pronúncia arbitral consiste na declaração de ilegalidade de parte da liquidação de IRS n.º 2020..., relativa ao ano de 2019 e que se cifrava em 4.862,73 €.
6. No dia 12.7.2021, o Tribunal Arbitral Singular proferiu despacho com o seguinte teor: “Nos termos do disposto nos nºs 1 e 2 do art.º 17.º do RJAT, notifique-se o dirigente máximo do serviço da Administração Tributária, para, no prazo de trinta dias, apresentar resposta e, caso queira, solicitar a produção de prova adicional, acrescentando-se que deve ser remetido ao Tribunal Arbitral cópia do processo administrativo dentro do prazo de apresentação da resposta, aplicando-se, na falta de remessa, o disposto no n.º 5 do art.º 110.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.”
7. A Requerida não contestou.
8. Por requerimento de 13.7.2021, o Requerente veio, por intermédio dos Ilustres mandatários constituídos nos autos, informar da decisão da Requerida de revogar in totum o acto tributário objecto de pedido de pronúncia arbitral e ainda informar que não mantém interesse no prosseguimento do procedimento, invocando o n.º 2 do art.º 13º do RJAT.
9. Os n.ºs 1 e 2 do art.º 13º do RJAT, dizem: “1 – Nos pedidos de pronúncia arbitral que tenham por objeto a apreciação da legalidade dos atos tributários previstos no artigo 2.º, o dirigente máximo do serviço da administração tributária pode, no prazo de 30 dias a contar do conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral, proceder à revogação, ratificação, reforma ou conversão do ato tributário cuja ilegalidade foi suscitada, praticando, quando necessário, ato tributário substitutivo, devendo notificar o presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) da sua decisão, iniciando-se então a contagem do prazo referido na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º. 2 – Quando o ato tributário objeto do pedido de pronúncia arbitral seja, nos termos do número anterior, total ou parcialmente, alterado ou substituído por outro, o dirigente máximo do serviço da administração tributária procede à notificação do sujeito passivo para, no prazo de 10 dias, se pronunciar, prosseguindo o procedimento relativamente a esse último ato se o sujeito passivo nada disser ou declarar que mantém o seu interesse.
10. Tal como resulta do acima explicitado, a requerente não procedeu à revogação da liquidação de IRS sindicada no prazo previsto no n.º 1 do acima transcrito art.º 13º do RJAT.
11. Assim sendo, resulta meridianamente claro que o regime previsto naquele normativo não tem aqui aplicação.
12. Aliás, a sua eventual aplicabilidade obstaria a que o presente Tribunal Arbitral Singular houvesse sequer sido constituído.
13. Assim sendo, o Tribunal tem de apreciar a manifestação de desinteresse na continuação do processo não já em conformidade com o disposto no art.º 13º do RJAT, tal como se sugere no requerimento apresentado em 13.7.2021, mas antes ao abrigo das normas gerais que regulam a desistência da instância.
14. A aludida manifestação de desinteresse consubstanciada na apresentação do requerimento datado de 13.7.2021, configura, objectivamente, uma desistência da instância.
15. O quadro normativo relevante para apreciação da questão é o seguinte: i) n.º 2 do artigo 45.º do CPC: “Os mandatários judiciais só podem confessar a ação, transigir sobre o seu objeto e desistir do pedido ou da instância quando estejam munidos de procuração que os autorize expressamente a praticar qualquer desses atos.”; ii) alínea d) artigo 277.º do CPC: “A instância extingue-se com: (...) d) A desistência, confissão ou transação;” iii) n.º 2 do art.º 285.º do CPC: “A desistência da instância apenas faz cessar o processo que se instaurara.”; iv) n.º 1 do art.º 286.º/1 do CPC: “A desistência da instância depende da aceitação do réu desde que seja requerida depois do oferecimento da contestação.”; v) n.º 1 do art.º 290.º do CPC: “1- A confissão, a desistência ou a transação podem fazer-se por documento autêntico ou particular, sem prejuízo das exigências de forma da lei substantiva, ou por termo no processo. (...) 3- Lavrado o termo ou junto o documento, examina-se se, pelo seu objeto e pela qualidade das pessoas que nela intervieram, a confissão, a desistência ou a transação é válida, e, no caso afirmativo, assim é declarado por sentença, condenando-se ou absolvendo-se nos seus precisos termos.”.
16. A aludida desistência da instância faz cessar o processo onde ela é requerida, nos termos e em conformidade com o acima transcrito n.º 2 do art.º 285.º do CPC, subsidiariamente aplicável ex vi do disposto na alínea e) do n.º 1 do art.º 29º do RJAT.
17. Não devendo olvidar-se que os Ilustres mandatários constituídos nos autos têm poderes especiais para confessar, desistir e transigir, tal como resulta da procuração forense junta ao Pedido de pronúncia Arbitral.
18. Sendo que, nos termos e em conformidade com o disposto no acima transcrito n.º 1 do art.º 286.º do CPC, por interpretação a contrario, a desistência da instância não depende da aceitação da Requerente, conquanto ela seja apresentada antes do oferecimento da contestação, o que, como visto, efectivamente aqui ocorreu.
19. Termos em que se conclui que a pretensão de arquivamento já não do procedimento mas do processo arbitral (ou do seu não prosseguimento), firmada no requerimento de 13.7.2021, donde, manifestada antes da apresentação da resposta da AT, é relevante como desistência da instância.
II. DECISÃO:
FACE AO EXPOSTO, O TRIBUNAL ARBITRAL SINGULAR DECIDE:
C) DECLARAR EXTINTA A INSTÂNCIA POR DESISTÊNCIA;
D) FIXAR O VALOR DO PROCESSO EM 2.460,59 € EM CONFORMIDADE COM O DISPOSTO NO ART.º 97.º-A DO CPPT, APLICÁVEL POR REMISSÃO DO ART.º 3º DO REGULAMENTO DAS CUSTAS NOS PROCESSOS DE ARBITRAGEM TRIBUTÁRIA (RCPAT).
III. CUSTAS:
FIXO O VALOR DAS CUSTAS EM 612,00 €, CALCULADAS EM CONFORMIDADE COM A TABELA I DO REGULAMENTO DE CUSTAS DOS PROCESSOS DE ARBITRAGEM TRIBUTÁRIA EM FUNÇÃO DO VALOR DO PEDIDO E NÃO CONTRADITADO PELA AT, A CARGO DA REQUERENTE QUE DEU CAUSA À PRESENTE ACÇÃO, NOS TERMOS DO DISPOSTO NOS ARTIGOS 12.º, N.º 2 E 22.º, N.º 4 DO RJAT E AINDA ART.º 4.º, N.º 5 DO RCPAT E ART.º 527, NºS 1 E 2 DO CPC, EX VI DO ART.º 29.º, N.º 1, ALÍNEA E) DO RJAT.
NOTIFIQUE-SE.
Lisboa, 8 de Setembro de 2021.
A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia antiga.
O árbitro,
(Fernando Marques Simões)