DECISÃO ARBITRAL
I - RELATÓRIO
1. Requerente
A..., SA, com sede na Av. ..., n.º..., ...-... Lisboa e titular do NIF n.º ... .
2. Requerida
Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) representada pelos Ex.mºs. Juristas dr. B... e dr. C... .
3. Tramitação e constituição do Tribunal Arbitral
A Requerente apresentou, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, pedido de constituição de tribunal arbitral, por requerimento datado de 8 de Fevereiro de 2021 e aceite no dia imediato.
Constituiu objeto imediato o pedido a anulação dos atos de liquidação adicional de IVA identificados com os números 2020... e 2020..., por referência aos períodos de 2016/12 e 2017/12, nos montantes de € 445.536,44 e 683.864,55, respetivamente, dos atos de liquidação de juros compensatórios identificados com os números 2020..., 2020..., 2020... 2020..., 2020..., 2020..., nos montantes de € 63.864,29, € 70.522,36, € 21.000,19, € 4.909,67, € 17.587,77 e € 5.573,35, respetivamente, bem como os atos de demonstração e acerto de contas 2020..., 2020..., 2020..., 2020..., 2020..., 2020..., 2020..., 2020..., 2020..., 2020..., 2020..., 2020..., 2020..., 2020... e 2020..., no montante total de € 2.048.183,56.
Constituiu pedido mediato uma indemnização pelos encargos a suportar pela Requerente relativos aos custos da garantia para suspensão do processo de execução fiscal.
O Tribunal Arbitral foi constituído por despacho de 25 de Maio de 2021.
Por despacho desse mesmo dia, 25 de Maio, foi solicitada resposta à Requerida.
Por requerimento de 31 de Maio de 2021, veio a Requerida juntar aos autos o despacho do Sub Diretor Geral, Miguel Gonçalves Correia, com data de 27 desse mesmo mês de Maio, que procedeu à revogação de todos os atos impugnados e já supra identificados.
A Requerente foi notificada, em 02.06.2021, do teor do requerimento apresentado pela Requerida em 31.05.2021 e, por requerimento de 8 de junho, veio aos autos, ao abrigo do artigo 277.º, alínea e) do Código de Processo Civil ("CPC"), aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT, declarar que não se opõe à extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, declarando igualmente que desiste, para este efeito, do pedido de indemnização para o pagamento dos encargos suportados com a garantia bancária apresentada para a suspensão do processo de execução fiscal com o número ...2020... .
A Requerente considera que não tendo sido a revogação efetuada antes do pedido e da constituição do Tribunal Arbitral, deve a Requerida ser responsável pelo pagamento das custas, por haver dado causa à constituição do Tribunal Arbitral, nos termos dos artigos 527.º e 536.º, n.ºs 3 e 4 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
Notificada a Requerida para responder ao requerimento do SP, nada disse.
II – SANEAMENTO
O Tribunal é competente e encontra-se constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º1, alínea a), 5.º e 6.º do RJAT.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias.
As partes são legítimas e estão legalmente representadas.
III – Questões decidendas
Face a quanto ficou dito, são duas as questões que compete ao Tribunal Arbitral decidir:
- Se no caso em apreço se verifica inutilidade ou impossibilidade superveniente da lide;
- Qual a parte que deve ser responsabilizada pelo pagamento das custas.
1. Da inutilidade/impossibilidade da lide
Tanto a Requerida quanto a Requerente estão de acordo relativamente à extinção da instância por força do despacho da Requerida que revogou os atos impugnados.
Esta extinção decorre do disposto no artigo 277º, alínea e), do CPC ( aplicável ex vi artigo 29º, n.º 1, alínea e), do RJAT), que determina que “A instância extingue-se com a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide”.
No caso presente a Requerida, por despacho do Sub Diretor Geral Miguel Gonçalves Correia, procedeu à revogação de todos os atos impugnados, o mesmo é dizer-se que a lide ficou sem objeto imediato, circunstância que conduz à impossibilidade da sua continuação, já que a revogação dos atos administrativos determina a cessação dos respetivos efeitos, conforme dispõe o n.º 1 do artigo 165º do Código de Procedimento Administrativo.
Está-se, pois, perante um caso de impossibilidade superveniente da lide. Este entendimento tem sido unânime nas inúmeras decisões proferidas no âmbito do CAAD (indicando-se a título meramente exemplificativo as n.ºs 454/2018-T; 697/2018-T; 142/2019-T; 400/2019-T).
Segundo José Lebre de Freitas, Rui Pinto e João Redinha (Código de Processo Civil Anotado, Volume 1º, 2ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2008, pag. 555), “a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide dá-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar – além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por já ter sido atingido por outro meio”.
Acresce que a Requerente declarou desistir do pedido de indemnização para o pagamento dos encargos suportados com a garantia bancária apresentada para a suspensão do processo de execução fiscal com o número ...2020... .
Termos em que, foram extintos quer o objeto imediato do pedido de pronúncia arbitral, quer o mediato. Aliás, há que esclarecer que nunca a instância poderia prosseguir para apreciar apenas o pedido mediato.
2. Da responsabilidade pelas custas
A Requerida foi notificada do pedido de pronúncia arbitral a 15 de fevereiro de 2021 e procedeu à revogação dos atos impugnados pela Requerente por despacho de 27 de maio, ou seja, fora do prazo previsto no n.º 1 do artigo 13º do RJAT.
Assim, o prosseguimento da instância é totalmente imputável à Requerida, pelo que as custas devem ser unicamente da sua responsabilidade, de acordo com o princípio geral expresso no artigo 536º, n.ºs 3 e 4 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 29º do RJAT.
IV – Decisão
Por quanto ficou dito, o Tribunal decide:
• declarar extinta a lide, por impossibilidade da mesma, nos termos do disposto no artigo 277º, alínea e) do Código de Processo Civil;
• julgar válida a desistência do pedido de indemnização pela prestação de garantia;
• condenar a Autoridade Tributária ao pagamento das custas processuais.
Fixa-se o valor do processo em €2.048.183,56 (dois milhões, quarenta e oito mil e cento e oitenta e três euros e cinquenta e seis cêntimos) nos termos do artigo 97º-A, n.º 1, a) do CPPT, aplicável por força da alínea a) do n.º 1 do artigo 29º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em €26.622,00 (vinte e seis mil e seiscentos e vinte e dois euros) nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar integralmente pela Requerida, de acordo com os artigos 12º, n.º 2, e 22º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4º, n.º 4, do citado Regulamento.
Notifique-se.
Lisboa, 24 de junho de 2021
Os Árbitros
Desembargador Manuel Luís Macaísta Malheiros (Presidente)
Prof.º Doutor Júlio Tormenta
Dr.ª Raquel Montes Fernandes