DECISÃO ARBITRAL (consultar versão completa no PDF)
Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. Ricardo Marques Candeias e Dra. Mariana Vargas (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do CAAD, para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 07-12-2020, acordam no seguinte:
1. A..., LDA., NIPC..., com sede na Rua ..., n.º ..., ..., ...-... Lisboa (doravante “Requerente” ou «A... »), veio, nos termos do disposto no artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), requerer a constituição de Tribunal Arbitral, tendo em vista a declaração de nulidade ou anulação da liquidação adicional de IMT referente ao ano de 2010 de 533.000,00 €, e dos respetivos juros compensatórios, de 10.514,00 €, bem como da decisão da reclamação graciosa com o n.º ...2019... de que aquela foi objecto.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 14-09-2020.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitros os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 04-11-2020, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 07-12-2020.
A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.
Em 04-05-2021, realizou-se uma reunião em que foi produzida prova testemunhal e decidido que o processo prosseguisse com alegações.
As Partes apresentaram alegações.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e é competente.
As Partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos:
A) A Requerente é uma sociedade cujo objeto social consiste em “O exercício da indústria imobiliária e turística, designadamente aquisição, construção, exploração, venda e revenda de imóveis e de empreendimentos turísticos, compra e venda de materiais de construção, elaboração de estudos e projetos, comércio de comissões e representações agenciamento comercial, importação e exportação, consultadoria técnica e comercial, assessoria de gestão empresarial e prestação de serviços conexos” (Documento n.º 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido )
B) Em 27 de Dezembro de 2010, a sociedade B..., S.A. vendeu à Requerente um conjunto de terrenos para construção, sitos na ... Rua ..., em ..., conforme resulta da escritura de compra e venda, que consta do documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido:
C) Os imóveis foram adquiridos para revenda, tal como consta da escritura, razão pela qual a liquidação de IMT foi de zero, tendo sido pago Imposto do Selo no montante de 65.600 €;
D) Já antes dos imóveis serem adquiridos, pendia no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, sob o n.º .../08...BEALM, a ação administrativa especial proposta pela C..., D... e E... contra o Município F..., com vista à declaração de nulidade do ato que aprovou o estudo de loteamento, que no âmbito do processo camarário nº..., outorgaram à B..., SA, indicada como Contrainteressada, a licença de loteamento e a licença de obras de urbanização tituladas pelo alvará de loteamento nº .../2006, de 2 de fevereiro de 2006 (documento n.º 19 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
E) Nesta acção a B..., S.A., na qualidade de proprietária à data, era contrainteressada (documento n.º 19);
F) A discussão nesta acção administrativa especial reportava-se aos termos em que poderiam ser edificadas construções naqueles terrenos, nomeadamente quanto à dimensão dos imóveis a edificar, ou seja, qual a altura máxima que poderiam ter (documento n.º 19);
G) Aquando da compra dos lotes de terreno pela Requerente, existiam tentativas de terminar a acção administrativa, concretamente propostas por parte dos autores, no sentido de acordar uma transação através da qual os prédios a construir seriam com menos andares (depoimentos das testemunhas G... e H...);
H) Esta informação foi transmitida à Requerente pelo seu advogado, que acompanhava a acção (depoimento da testemunha H...);
I) A Requerente aceitava o acordo nos termos projectados (depoimento da testemunha H...);
J) A Requerente, quando adquiriu os terrenos, sabia que havia a acção pendente, mas estava convencida de que a acção seria resolvida por acordo, com diminuição da capacidade construtiva, mas, depois, em 2011, apurou-se que isso não se iria verificar, por a Câmara Municipal F... ter decidido deixar prosseguir a acção até ao final, para não ter de se contradizer (depoimentos das testemunhas G... e H...);
K) Ulteriormente à data da aquisição por parte da Requerente, e por impossibilidade de entendimento dos autores com o Município F..., e não com a Requerente, as conversações não obtiveram o esperado resultado e a acção prosseguiu os seus termos, vindo a ser julgada improcedente por sentença de 27-01-2017 (documento n.º 19);
L) A Requerente, durante o período em que foi proprietária dos imóveis, tentou proceder à sua venda, pois era essa a sua actividade, como fez em todos os outros activos que tinha (depoimento da testemunha G...);
M) Num período subsequente à aquisição dos prédios pela Requerente havia uma crise do país, principalmente do ramo imobiliário, o que provocou desvalorização do activos e dificuldade em arranjar interessados que oferecessem valores adequados (depoimentos das testemunhas G... e H...);
N) Em 31 de Outubro de 2013, a Requerente requereu à AT uma avaliação dos identificados prédios, com fundamento na retificação de áreas, tendo o VPT dos imóveis sido fixado em € 4.126.140, com efeitos à data em que foi realizado o pedido (Documento n.º 10 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
O) A I..., Unipessoal, Lda. (doravante «I... ») foi constituída a 26 de Dezembro de 2013, com o seguinte objeto social: “Construção de edifícios residenciais e não residenciais, compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim e gestão, administração e arrendamento de bens imóveis.” (Documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido) ;
P) A I... tem uma única sócia, a sociedade J..., Lda. (doravante «J... »);
Q) No dia 27 de Dezembro de 2013, os identificados imóveis foram vendidos à sociedade I..., sendo os preços e os valores patrimoniais tributários os seguintes:
(documento n.º 12 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
R) Em Maio de 2013, foi feita uma avaliação dos terrenos, a pedido da Requerente, para apurar o valor actualizado dos terrenos (Documento n.º 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e depoimentos das testemunhas G... e H...);
S) A avaliação referida na alínea anterior foi efectuada por uma empresa certificada pela CMVM, que atribuiu os lotes, naquela data, era de 3.051.330 € (Documento n.º 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e depoimentos das testemunhas G... e H...);
T) Os valores de venda dos terrenos foram os possíveis na situação de crise, tendo sido fixados tendo em conta a avaliação particular referida e uma avaliação fiscal para fixação de valores matriciais que a Requerente pediu, de que resultava uma desvalorização considerável dos valores anteriores, comum a outros imóveis da Requerente (depoimentos das testemunhas G... e H...);
U) A Requerente tinha dificuldade em manter a situação em que se encontravam os terrenos, não tendo condições para suportar os encargos fiscais (mais de € 1000.000 por ano de IMI) e a manutenção dos terrenos, correndo o risco de ficar numa situação muito deficitária, por o mercado imobiliário estar parado e o valor dos imóveis a descer e não conseguir transaccionar os outros imóveis que tinha no activo, pelo que alguma coisa tinha de ser feita rapidamente para poder prosseguir a sua actividade (depoimentos das testemunhas G... e H...);
V) O valor patrimonial tributário à data da escritura correspondeu, precisamente, ao preço que foi acordado entre a Requerente e a I..., Unipessoal, Lda. (depoimento da testemunha G...);
W) O valor da avaliação de fixação de valores patrimoniais, superior ao da avaliação particular, era o valor mínimo a contratar, por força das presunções legais, não sendo fixado um preço superior, por a avaliação particular efectuada ter atribuído aos terrenos um valor ainda inferior ao valor patrimonial tributário (depoimentos das testemunhas G... e H...);
X) As dúvidas existentes sobre a capacidade construtiva dos terrenos, em virtude da acção que se encontrava pendente, influenciaram negativamente o valor dos imóveis; (depoimento da testemunha G...);
Y) Em 2019, na sequência da inspecção tributária, a Requerente pediu à I... (cuja denominação passara a ser K...) os elementos para a sua defesa (depoimento da testemunha G...);
Z) Vivia-se uma situação de profunda crise, em 2013, no sector imobiliário em que todas as empresas sofreram desvalorizações de activos e tinham dificuldades em vender (depoimentos das testemunhas G... e H...);
AA) A I..., Unipessoal, Lda., alterou a sua designação para L..., Unipessoal, Lda, a partir de 05-08-2016, e para K..., Lda., a partir de 27-03-2019;
BB) Em 24-01-2014, a I..., Unipessoal, Lda. requereu ao Serviço de Finanças de..., a devolução parcial do IMT e do IS, relativamente à aquisição que efetuou em 27-12-2013, por o valor patrimonial tributário ter vindo a ser fixado em 4.126.140 €, com efeitos reportados a 31-10-2013, e ser inferior ao que foi considerado na escritura, de 5.502.890,19 €, que serviu de base ao pagamento daqueles impostos (Documento n.º 15 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
CC) Em 13-03-2014, a I..., Unipessoal, Lda. foi notificada do deferimento da sua pretensão, sendo considerado que o VPT na data da escritura ascendia a € 4.126.140 (Documento n.º 16, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
DD) Na posse dos terrenos, a I... só tratava da sua limpeza e manutenção, pois enquanto a acção estava pendente era difícil fazer mais alguma coisa (depoimento da testemunha G...);
EE) Em 17-07-2015, a I..., Unipessoal, Lda. solicitou à Câmara F..., o averbamento do Processo .../00 em seu nome (Documento n.º 17, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
FF) Com data de 20-08-2015, o Município F... notificou a I..., Unipessoal, Lda. do deferimento do averbamento do projeto em seu nome (Documento n.º 18 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
GG) Depois deste deferimento e até Janeiro de 2017, a I..., Unipessoal, Lda. não fez qualquer investimento nos imóveis que adquiriu, uma vez que estava a aguardar o desfecho da acção administrativa supra identificada (depoimentos das testemunhas G... e H...);
HH) Em 27-01-2017, foi proferida sentença na acção em causa, julgando improcedente, por não provada, tendo o Réu e a contrainteressada sido absolvidos do pedido (Documento n.º 19 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
II) Depois da decisão da acção, a I... passou a executar o projecto que já tinha para os terrenos (depoimento da testemunha G...);
JJ) Em Março de 2017, a planta síntese do loteamento já se encontrava averbada em nome da L..., Unipessoal, Lda. (nova designação da I...) (Documento n.º 20 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
KK) A L..., Unipessoal, Lda. solicitou à M... a indicação de quais os trabalhos a realizar para preparar os terrenos, tendo este enviado uma carta com a descrição dos trabalhos a realizar (Documento n.º 21 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
LL) Os trabalhos referidos e ainda limpeza e vedação dos terrenos foram realizados em 2017 (Documentos n.º 22 a 25 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
MM) No início de 2019, a L..., Unipessoal, Lda iniciou o processo de construção dos prédios nos terrenos em causa, tendo solicitado diversos orçamentos de arquitetura e das especialidades e tendo obtido propostas de diversas empresas que pretendem prestar tais serviços, designadamente:
· N... (Documento n.º 26 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
· O..., Lda. (Documento n.º 27 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
· P..., Lda. (Documento n.º 28 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
· Q..., Lda. (Documento n.º 29 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido );
· R..., S. A. (Documento n.º 30 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido)
NN) Em 31-05-2019, a K..., Lda. requereu à Câmara F... alterações às especificações de alvará de licença de loteamento, relativas ao Processo .../00 (documento n.º 31 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
OO) Com o objetivo de proceder à construção de imóveis nos terrenos em causa, a K..., Lda., em 28-06-2019, entregou diversos elementos para apreciação, relativas ao Processo .../00 (Documento n.º 32 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
PP) Com data de 26-11-2019, a K..., Lda. foi notificada de um ofício da Câmara Municipal F..., no qual concedia um prazo de 15 dias para que fossem prestados diversos esclarecimentos. (Documento n.º 33 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
QQ) A K..., Lda. solicitou à S..., Lda., o levantamento topográfico dos terrenos, o que foi efectuado em Dezembro de 2019 (documento n.º 34 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
RR) Em 11-02-2020, a K... recebeu notificação da Câmara F..., relativas às condições do pedido de licença do alvará de loteamento, (Documento n.º 35 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
SS) Em 15-05-2020, a K... efectuou comunicação prévia à Câmara F... de obras de construção na área abrangida pelo loteamento (Documento n.º 36 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
TT) Em 27-05-2020, a K... procedeu à entrega de documentos na Câmara Municipal F... respeitantes à licença de edificação (Documento n.º 37 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido) ;
UU) Em 03-08-2020, a K... foi notificada pela Câmara Municipal F... da Informação relativa ao pedido de obras de construção de edifício (Documento n.º 38 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
VV) A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma inspecção à Requerente em que foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária (RIT) que consta do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:
11.3.4. CARACTERIZAÇÃO DAS ENTIDADES ENVOLVIDAS
As entidades diretamente intervenientes no negócio jurídico objeto de análise no âmbito do presente procedimento de inspeção foram a A... que procedeu à alienação de diversos prédios urbanos à I..., com alvará de loteamento n.º.../2006 da Câmara Municipal F... .
Seguidamente procede-se à caracterização da A..., da I... e da J..., uma vez que esta entidade detém a totalidade do capital da I... e conforma será descrito nos pontos seguintes também participou no negócio objeto de análise no presente projeto de aplicação da CGAA.
II.3.4.1. A...- NIF ...
A A... foi constituída em 23 de dezembro 1992, sob a natureza jurídica de sociedade anónima, com um capital social de € 50.000,0o, dividido em 100.000 ações com o valor nominal de € 0,50. As ações representativas do capital social são nominativas.
O capital social veio a ser alterado através de sucessivos aumentos do capital, para € 100.000,00, € 350.000,00 e € 20.350.000,00, tendo o primeiro ocorrido no ano de 2009 e os restantes em 2011.
A natureza das ações representativas do capital, passaram em 2011 a ser nominativas ou ao portador e reciprocamente convertíveis, sendo constituído por um número de ações de 40.700.000, com o valor nominal de € 0,50, o que totaliza um capital social de € 20.350.000,00.
No que respeita ao ano de 2013, de acordo com o divulgado na declaração de Informação contabilística e fiscal (IES) e respetivo livro de Atas são acionistas as seguintes entidades:
> T..., S.A., NIF..., com uma quota de 48,39%, correspondendo ao montante de € 10.050.000,00 do capital social;
> U..., S.A., NIF..., com uma quota de 39,31%, correspondendo ao montante de € 8.000.000,00 do capital social;
> V..., S.A., NIF ... com uma quota de 9,83%, correspondendo ao montante de € 2.000.000,00 do capital social;
> W...(doravante denominado W...) NIF..., com uma quota de 0,25%, que corresponde ao montante de € 50.000,00 do capital social;
> X..., com uma quota de 1,23%, que corresponde ao montante de € 250.000,00 do capital social.
Quanto à estrutura da sua administração esta competia, aquando da sua constituição, a um conselho de administração composto por três a cinco membros, sendo que a sociedade ficava obrigada pelas assinaturas de dois administradores do conselho de administração ou da comissão executiva, ou pela assinatura do administrador delegado.
Em 18 de abril de 2007 procede a alterações ao seu contrato de sociedade nomeadamente quanto à forma de obrigar e os seus órgãos sociais. A forma de obrigar passa a ser a assinatura do Administrador Único ou, quando exista conselho de administração à assinatura de dois administradores, sendo uma delas obrigatoriamente a do Presidente. Para atos de mero expediente basta a assinatura de um dos administradores. A estrutura da administração passa a ser constituída por um Administrador único ou Conselho de administração composto por três membros. A duração dos mandatos é de quatro anos. Foi nomeado Administrador único W..., para o período 2007/2010.
Por deliberação de 30 de março de 2011 foi designado como Administrador Único, para o quadriénio de 2011/2014, H..., (doravante H...), NIF... . H... consta, no sistema informático da AT, desde 08/09/2011, como representante de X... e W..., uma vez que ambos têm domicílio fiscal em ..., n.º ... ..., Suíça.
Em deliberação de 25 de março de 2013 é nomeado, para o quadriénio 2011/2014, o conselho de administração composto por W..., como Presidente, e X... e H..., como Vogais.
Tem como objeto social o exercício da indústria imobiliária e turística, designadamente:
> Aquisição, construção, exploração, venda e revenda de imóveis e de empreendimentos turísticos,
> Compra e vencia de materiais de construção,
> Elaboração de estudos e projetos, comércio de comissões e representações agenciamento comercial,
> Importação e exportação,
> Consultadoria técnica e comercial,
> Assessoria de gestão empresarial,
> Prestação de serviços conexos.
II.3.4,1.1. Administração de Facto
Exercem a administração de facto, conforme se comprova pela escritura de compra e venda celebrada em 27 de dezembro de 2013, no Cartório Notarial sito na Rua... , número..., loja direita, em ...:
> W..., na qualidade de Presidente, e
> X..., na qualidade de vogal do conselho de administração da A... e ambos residentes em..., n.º..., ... ..., Suiça.
(...)
II.3.4.1.3. Atividade efetivamente exercida
Exerce a atividade de revenda de imóveis, extraindo-se tal evidência da análise dos seguintes documentos e da forma como os mesmos foram relevados na contabilidade:
(...)
II.3.4.2 I... - NIF ...
A I... foi constituída em 26 de dezembro 2013, sob a natureza jurídica de sociedade por quotas, com um capitai social de € 100.000,00, distribuído numa quota única, correspondente a 100%, sendo titular a sociedade J..., Lda, NIF ... . Tem como objeto social:
> Construção de edifícios residenciais e não residenciais,
> Compra e venda de Imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim e
> Gestão, administração e arrendamento de bens imóveis.
No que respeita à forma de obrigar a sociedade é necessária a intervenção conjunta de dois gerentes, tendo sido designados para o cargo:
> W... e
> X... .
A constituição da I... foi decidida, por unanimidade, em Assembleia Geral da sociedade J..., conforme as atas n.º 17 e 18 lavradas em 20 de dezembro de 2013, o que veio a ser concretizado seis dias depois em 28 de dezembro.
Junta-se no Anexo 3 - Cópia das Atas n.º 17 e 18, da J...
II.3.4.2.1. Gerência de Facto
Exercem a gerência de facto, conforme se comprova pela escritura de compra e venda celebrada em 27 de dezembro de 2013, supramencionada no Cartório Notarial sito na Rua ..., número..., loja direita, em ...:
> W..., e
> X...,
ambos, na qualidade de gerentes, com poderes para o ato e ambos residentes em ..., n.º ..., ... ..., Suiça.
(...)
II.3.4.2.3. Atividade efetivamente exercida
A única operação conhecida realizada pela I... foi a escritura de compra e venda celebrada no dia 27 de dezembro de 2013, no Cartório Notarial sito na Rua ..., número..., loja direita, em ..., perante a Notária Y..., em que a I... intervém na qualidade de adquirente de diversos terrenos para construção urbana, com o alvará de loteamento n.º .../2006 e a mesma declara que os imóveis adquiridos se destinam a construção.
De acordo com informações prestadas por X... na qualidade de gerente da I... a construção dos imóveis ainda não foi iniciada por se encontrar em curso um processo no TAF de Almada contra a Câmara Municipal F..., cujo objeto é a construção no loteamento acima mencionada.
(...)
II.3.4.3. J...- NIF ...
A J..., detentora da quota única do capital da I..., é uma sociedade por quotas que declarou início de atividade em 30/12/2003 e tem por objeto social,
> Promoção e construção de empreendimentos imobiliários,
> Realização de investimentos,
> Gestão de imóveis próprios,
> Prestação de serviços em tais áreas das suas atividades, e
> Compra, comercialização e revenda de prédios adquiridos para esse fim.
No que respeita à forma de obrigar a sociedade é necessária a intervenção conjunta de dois gerentes, tendo sido designados para o cargo de gerentes:
> W... e
> X....
Os gerentes de direito são igualmente gerentes de facto como se comprova pelo livro de Atas em que compareceram na qualidade de gerentes.
(...)
De acordo com o Livro de Atas, a certidão permanente e com o divulgado na declaração de Informação contabilística e fiscal (IES), em 31 de dezembro de 2013, a sociedade tem um capital social de € 3.300.000,00, distribuído pelos seguintes sócios:
> Z..., Lda., NIF ... com uma quota de 27,27% correspondendo ao montante de € 900.000,00 do capital social;
> X... com uma quota de 18,18%, correspondendo ao montante de € 600.000,00 do capital social;
> B... S.A., NIF..., com uma quota de 16,18% correspondendo ao montante de € 600.000,00 do capital social;
> AA..., S.A., NIF ... com uma quota de 18,18%, correspondendo ao montante de € 600.000,00 do capital social;
> A..., S.A., com uma quota de 9,09%, correspondendo ao montante de € 300.000,00 do capital social;
> CC..., Lda., NIF..., com uma quota de 9,09%. correspondendo ao montante de € 300.000,00 do capital social;
II.3.4,3.1. Atividade efetivamente exercida
De acordo com esclarecimentos prestados por W... e X..., ambos na qualidade de gerentes da J..., a atividade efetivamente exercida por esta entidade respeita na sua maioria ao arrendamento dos seus imóveis.
(...)
II.3.5. RELAÇÕES ENTRE OS INTERVENIENTES À DATA DA ESCRITURA DE 27/12/2013
Seguidamente irá demonstrar-se que a A..., a I... e ainda a J... se encontram relacionadas direta ou indiretamente.
Ora, face ao exposto nos pontos anteriores comprova-se que W... e X..., detêm em todas as sociedades o controlo das decisões tomadas, uma vez que ambos são administradores/gerentes das mesmas. Por outro lado e conforme a seguir se detalha ambos individualmente ou em conjunto detêm direta ou indiretamente participações majoritárias nas 3 entidades.
Assim, as decisões que ambos tornam enquanto gerentes/administradores interessam-lhes igualmente enquanto sócios/acionistas, dado que são diretamente beneficiários da distribuição de lucros/dividendos resultantes dessas decisões.
Vejamos detalhadamente cada uma das três sociedades mencionadas.
No caso da A... constata-se que têm o poder de decisão, como Presidente e Vogal do conselho de Administração, respetivamente W... e X... e que o capital se encontra distribuído pelas participações e entidades seguidamente discriminadas:
Coligidos os elementos disponíveis e que se apresentam nos quatro quadros seguintes, relativamente aos acionistas da A..., nomeadamente, os extraídos do Livro de Registo de Atas, do Registo da Conservatória e da Declaração de informação Contabilística e Fiscal (IES), podemos verificar que W... além da quota direta de 0,25%, no capital da A..., detém uma participação indireta de 97,71%, cuja determinação a seguir se descreve, o que totaliza uma participação efetiva de 97,96%.
Refira-se desde já que a participação indireta de W... no capital da A... advém da sua participação na T..., S.A. (doravante T...), e da participação desta sociedade na BB..., S.L., que por sua vez participa no capital de U..., S.A. e V.... S.A., as quais participam no capital social da A... . De salientar que W... detém o poder decisório dessas 3 entidades, pois em todas faz parte do Conselho de Administração quer como Presidente do Conselho de Administração, quer como Vogal, ou na ausência de tal órgão como Administrador Único.
De acordo com o n.º 6 do artigo 69 do Código do IRC "Quando a participação é detida de forma indireta, a percentagem de participação efetiva é obtida pelo processo de multiplicação sucessiva das percentagens de participação em cada um dos níveis e, havendo participações numa sociedade detidas de forma direta e Indireta, a percentagem de participação efetiva resulta da soma das percentagens das participações."
Assim e atendendo apenas ao supracitado artigo verifica-se que:
> W... ao ser detentor de uma quota de 85% na T... que por sua vez detém uma participação de 49,39% da A..., detém uma participação indireta de 41,98% (55% * 49,39%), nesta última;
> Por outro lado a T... detém 32% na BB..., S.L. que por sua vez detém 100% da U..., SA a qual detém 39,31% da A..., o que traduz uma participação indireta de W... no capital da A... de 10,69% (85% * 32% * 39,31%).
> Por último a U..., SA, detém 100% da V... que por sua vez detém 9,63% da A..., o que traduz uma participação Indireta de W... no capital da A... de 2,67% (85% * 32% * 9,83%).
Porém além das participações diretas e indiretas detidas por W... na A..., que lhe permitem desde logo ter o controlo societário, há que considerar que entre as sociedades anteriormente referidas existem participações cruzadas e ações próprias, sendo que com estas W... detém a quase totalidade do capital da A..., mais concretamente 97,98%.
Verifica-se igualmente que X... é titular direto de uma quota de 1,23% do capital social de A... o que considerando as participações cruzadas e ações próprias entre as sociedades supra mencionadas totaliza uma participação efetiva de 2,04%, Detém ainda o cargo de Vogal nos Conselhos de Administração da A... e da V..., S.A.
Conclui-se portanto que W... e X... em conjunto detêm a totalidade do capital social da A... .
Refira-se que as percentagens de participação efetiva de W... e X... na A..., de 97,96% e de 2,04%, respetivamente, foram determinadas pela utilização do cálculo Matricial através da aplicação da seguinte fórmula, com recurso a ferramentas informáticas (Microsoft Excel):
Assim se constata que W... e X... controlam a A..., quer por participações diretas ou indiretas no seu capital social, quer por serem titulares de posições na Administração da sociedade que lhes permitem controlar as decisões tomadas.
No que concerne à sociedade I..., como já anteriormente se mencionou e se esquematiza no quadro seguinte, esta tem o seu capital distribuído numa quota única de que é titular a J... .
A gerência é exercida por W... e X... tanto na I... como na J..., o que demonstra que ambos conduzem os destinos de ambas as sociedades.
Quanto à distribuição do capital social da J..., o mesmo está distribuído conforme discriminado no quadro 15. De igual forma se descreve a distribuição do capital social das sociedades Z..., Lda e CC..., Lda, por tal se verificar necessário a fim de demonstrar que W... e X... detém o controlo societário da J..., porque em conjunto dispõem de forma direta e indireta de uma quota superior a 50% do capital da mesma.
Em face dos três quadros supramencionados constata-se que:
> A sociedade Z..., Lda., tem o seu capital de € 5.000,00, dividida em duas quotas de 50% cada, uma propriedade de W... e outra detida por DD..., NIF..., casada sob o regime de comunhão de adquiridos com W... . A gerência está a cargo de W..., sendo que a sociedade se obriga com a intervenção de um gerente.
Refira-se que o parágrafo 8.º da NCRF 5 - Divulgações de Partes Relacionadas - dispõe que sendo o cônjuge membro íntimo da família do indivíduo espera-se que esta seja influenciada pelo indivíduo nos negócios com a entidade. Pode, então, concluir-se que W... detém o controlo societário da Z... pois à sua participação direta junta-se a influência que exerce sobre a outra quota por via da sua relação conjugal com a proprietária da mesma.
> A sociedade CC..., Lda., com um capital social de € 3.000,00, dividido em quatro quotas e distribuído em três quotas de 30%, detidas por EE..., FF..., GG... e uma quota de 10% detida por HH..., sendo que os primeiros três são filhos de X... e a última sua cônjuge, de quem se encontra separado judicialmente de pessoas e bens.
A gerência está a cargo de X..., sendo que a sociedade se obriga com a intervenção de um gerente.
No que respeita à sociedade CC..., considera-se que sendo os acionistas seus descendentes e sua cônjuge, ao abrigo do citado parágrafo 8.º da NCFR 5, X... detém igualmente o controlo acionista por serem os detentores diretos do capital membros íntimos da sua família.
Assim, X... detém, na J..., uma participação direta de 18,18% e indireta de 9,09% (via CC...), enquanto W... tem uma participação indireta de 27,27% (via Z...), o que perfaz em conjunto um total de 54,54%, deste modo confirma-se que em conjunto além do controlo dos órgãos de gestão também detêm o controlo societário da J....
Acresce ainda que sendo a A..., sócia da J..., com uma quota de € 9,09% do capital se verifica a existência de mais um fator de influência dado que, entre ambos, detêm o controlo acionista da A... e consequentemente, acabam por controlar a participação desta entidade na J..., ou seja no total em conjunto controlam 63,63% da J... .
Considerando que, conforme as definições constantes das Normas Contabilísticas e de Relato Financeiro (NCRF) 5 e 13, publicadas pelo Aviso n.º 15 655/2009, D.R. n.º 173, Séria II de 2009-09-07 definem
Controlo como "o poder de gerir as políticas financeiras e operacionais de uma entidade ou de uma atividade económica a fim de obter benefícios da mesma",
Conclui-se que W... e X... têm, na prática, o controlo das sociedades A..., I... e J... por disporem do "poder de gerir as políticas financeiras e operacionais", sendo administradores/gestores e ainda detendo em conjunto por via direta e Indireta uma participação superior a 50% do capital social das entidades, possuindo o controlo societário.
(...)
III. ANÁLISE DE FACTO DOS ATOS JURÍDICOS
III.1. DESCRIÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO CELEBRADO
Em 26/12/2013 foi constituída a sociedade I... com base numa deliberação constante na Ata n.º 17 da J... .
Em 27 de dezembro de 2013 entre a A... e a I... foi celebrado o contrato de compra e venda que transferiu a propriedade, da primeira para a segunda, de diversos terrenos com alvará de construção urbana n.º .../2006.
III.1.1. MOTIVO DA CONSTITUIÇÃO DA I...
Conforme descreve a ata n.º 17 da sociedade J... aos 20 de dezembro de 2013, estando presentes:
> III... em representação das sócias JJ... SGPS, SA e B..., SA;
> X..., por si próprio enquanto sócio e em representação da sócia CC..., Lda.;
> W... em representação da sócia Z..., Lda.;
> KK... em representação da sócia A...;
Deliberaram a autorizar a J... a constituir uma sociedade unipessoal por quotas, mandatando os gerentes (X... e W...) para a outorga da escritura de constituição da mesma.
Descreve a ata n.º 18 elaborada na mesma data, estando presentes:
> II... em representação das sócias JJ..., SGPS, SA e B..., SA;
> X..., por si própria enquanto sócio e em representação da sócia CC..., Lda.;
> W... em representação da sócia Z..., Lda.;
> X... e W... em conjunto representam a sócia A... .
Deliberam novamente a autorizar a J... a constituir uma sociedade unipessoal por quotas, mandatando os gerentes (X... e W...) para a outorga da escritura de constituição da mesma, através do procedimento empresa na hora regulado pelo DL 111/2005 de 8 de julho, tendo tal deliberação sido tomada por unanimidade.
Com referência ao objetivo que motivou a constituição da I... foi inquirido o Sr. X..., na qualidade de gerente da mencionada sociedade, que ouvido em auto de Declarações, no dia 16 de julho de 2015 afirmou o seguinte:
"A I... é uma sociedade por quotas cujo objeto social é a construção de imóveis e foi constituída com o objetivo de proceder à construção nos terrenos adquiridos no final de 2013 à A..., S.A. Sendo a I... detida em 100% pela J..., …, Lda., o objetivo foi isolar o risco deste projeto numa sociedade, neste caso a I..., que não tivesse outro património que não o associado ao próprio projeto."
Junta-se em Anexo 6 - cópia do Auto de declarações de 16/07/2015
De referir que conforme mencionado no ponto III.3.4.2 do presente projeto de aplicação da CGAA da análise às demonstrações financeiras verifica-se que nos anos de 2013 e 2014 a I... não realizou quaisquer operações ativas, resumindo-se a sua atividade nesses anos à aquisição dos terrenos para construção à A... .
(...)
IV. 3. REQUISITOS PARA APLICAÇÃO DA CGAA
Factualmente a Administração Tributária comprovou, ao longo desta informação, os pressupostos que se extraem do n.º 2 do artigo 38.º da LGT.
Vejamos:
IV.3.1. ELEMENTO MEIO
O elemento meio está relacionado com os atos ou negócios praticados por livre escolha dos intervenientes com o objetivo principal de obter uma vantagem fiscal.
No caso em apreço o elemento meio está patente na celebração do contrato de compra e venda de 27 de dezembro de 2013, em que a sociedade A..., pelo preço de € 4.126.140,00, aliena os Imóveis mencionados no ponto III.1.2. à sociedade I..., cuja constituição se concretizara no dia imediatamente anterior, mediante decisão tomada pelos órgãos sociais da J..., única detentora do seu capital social, e lavrada em ata uma semana antes.
Acresce ainda que o controlo quer do capital social quer dos órgãos de decisão nas três sociedades é pertença em conjunto de W... e X... .
Mais ainda se verificou que, pela análise dos movimentos bancários, o montante referente ao preço a pagar pela I..., tem a sua origem na própria alienante A..., conforme descrição no ponto III.1.5.
De salientar ainda que conforme referido no ponto III.1.2, apesar dos gerentes da J..., W... e X... alegarem que a data de final de dezembro para a constituição da I... e a celebração do contrato de compra e venda entre esta sociedade e a A..., foi o reflexo de uma negociação que culminou nessa altura, constatou-se que na realidade entre a decisão de celebrar tais atos e a sua concretização decorreu um período muito curto, concluindo-se que a data escolhida para transferir a propriedade dos imóveis teve como objetivo evitar a caducidade da isenção e permitir o apuramento de um prejuízo fiscal elevado.
Esta conclusão alicerça-se no facto de existir um processo judicial em curso que impede a I... de iniciar a construção no curto prazo, bem como na falta de capacidade financeira da J... e da I... em proceder pelos seus próprios recursos, a tal aquisição.
Assim, estamos perante um conjunto de atos encadeados, configurando a efetiva vontade dos intervenientes, que se inicia com a deliberação dos órgãos societários da J..., culminando com a constituição da I... e com o contrato de compra e venda exatamente naquela data, com o propósito essencial de obtenção de vantagens fiscais por parte da A... .
IV.3.2. ELEMENTO RESULTADO
O elemento resultado versa sobre a vantagem fiscal obtida com a ação do contribuinte e a equivalência dos efeitos económicos com aqueles do ato normalmente tributado e tem-se por verificada pela diferença que surge da comparação entre os ónus fiscais normalmente suportados e os evitados com a sua atuação.
Conforme apurado anteriormente a A... tinha adquirido os imóveis, em 27 de dezembro de 2010, pelo preço de € 8.200.000,00, tendo beneficiado da isenção a que se refere o artigo 7.º do CIMT, o que lhe permitiu não efetuar o pagamento de € 533.000,00, referente a esse imposto, condicionado pela obrigação de revenda dos mesmos no prazo máximo de três anos. Logo, para manter o benefício, a A... teria que revender os bens até 27 de dezembro de 2013.
Efetivamente a A... revendeu os imóveis exatamente no dia 27 de dezembro de 2013. No entanto, a venda foi efetuada à I..., sociedade por si indiretamente controlada, constituída no dia anterior, sendo que para concretizar tal aquisição foram efetuados movimentos bancários nas três entidades envolvidas (A..., I... e J...) que se anulam entre si.
Constatou-se ainda que nos anos de 2013, 2014 e 2015 a I..., não tem custos relevantes associados ao desenvolvimento do projeto de construção e que, segundo declarações do seu responsável, X... e supramencionadas, foi o desenvolvimento deste projeto que motivou a sua constituição.
Mais ainda, concluiu-se que os imóveis em causa não saíram da esfera de influência da A... que mantém o controlo indireto sobre os mesmos.
Assim, ao concretizar a escritura naquele momento transferindo os imóveis para a esfera de uma sociedade sob o seu controlo conseguiu eliminar a carga fiscal referente a IMT no montante de € 533.000,00.
No que respeita ao IRC, o negócio mencionado conduziu ao apuramento de um prejuízo fiscalmente dedutível no montante de € 4.170.307,25, o que configura uma vantagem fiscal que lhe permite a dedução dos prejuízos aos lucros tributáveis de um ou mais dos cinco períodos de tributação posteriores.
Sobre o valor atribuído aos bens verificou-se que:
> os representantes da A... aquando da aquisição, em 2010, tomaram a decisão de gestão de proceder à aquisição pelo valor de € 8.200.000,00, o que refletiria, portanto, o valor de mercado,
> mas estes mesmos representantes, em 2013, aceitaram, em simultâneo, como representantes do vendedor A... e do adquirente I..., que o preço de mercado seria € 4.126.140,00,
> a situação do alvará de loteamento não teve, nestes três anos alterações substanciais,
> Está pendente de decisão o processo judicial que corre termos no TAF de Almada e que teve início em 2008, pelo que não se detetam motivos que justifiquem uma diminuição tão colossal do valor de mercado do bem e ainda verificando-se que são as mesmas entidades que controlam o poder de decisão tanto na A... como na I... considera-se que o ajustamento do preço teve por finalidade a obtenção das vantagens fiscais especificadas em sede de IMT e IRC.
Deste modo, a decisão tomada pelas sociedades envolvidas de transmissão dos imóveis para a esfera patrimonial da I... conseguiu eliminar a carga tributária da A... que ocorreria se o negócio de compra e venda tivesse sido concretizado em data posterior e entre entidade independentes/não relacionadas que permitissem determinar o preço em condições de livre concorrência.
IV.3.3. ELEMENTO INTELECTUAL/INTENCIONAL
O elemento intelectual incide sobre a motivação do contribuinte, exigindo-se que as suas escolhas sejam dirigidas a um fim fiscal e que este prevaleça sobre o resultado não fiscal equivalente. O que significa que a sua atuação visa a obtenção daquele resultado.
No caso concreto foi demonstrado que de modo deliberado os membros do conselho de administração da A..., W... e X... , utilizaram a sua influência, obtida através das suas participações diretas e indiretas conjuntas, na J..., para que esta se constituísse como a única sócia da I..., à qual foram vendidos os prédios que asseguraram deliberadamente de forma artificiosa, a obtenção de vantagens fiscais para a A... .
Não esquecendo que estes atos têm o seu início, por influência dos citados membros do conselho de administração, apenas seis dias antes do "terminus" do prazo para a caducidade da isenção e ainda que desde que a I... se tornou proprietária dos imóveis não se comprovou ter efetuado diligências para o desenvolvimento do projeto, mesmo as mais elementares e básicas, designadamente Junto do Município de F..., tomar as medidas necessárias ao averbamento do seu nome como proprietário no alvará de loteamento n.º .../2006, tal se concluindo da informação prestada pelo próprio Município que nos informou que a última alteração ao alvará teve lugar em 25 de setembro de 2012.
Conforme as declarações prestadas por X..., na qualidade de gerente da I..., em 16 de julho de 2015 e transcritas no ponto III.1.1., o declarante afirma que o objetivo é de isolar o risco associado à concretização do projeto. Apresentando, deste modo, uma justificação puramente empresarial, querendo com isto dizer que a concretização do empreendimento envolve riscos financeiros associados aos seus elevados custos de construção que poderiam pôr em causa a estabilidade patrimonial da J... .
Contudo, face ao exposto ao longo do presente projeto de aplicação da CGAA, tal justificação não se afigura suficiente uma vez que a existência do processo judicial em curso impede, mesmo até à presente data, a prossecução de tais desígnios, ou seja, o início da construção do empreendimento. Situação que era do conhecimento das duas sociedades intervenientes no negócio.
Estamos aqui perante negócios realizados entre entidades relacionadas ( A..., J... e I...), concluindo-se que a I... foi constituída apenas com o fito de transferir a propriedade dos imóveis. Assim, o contrato de compra e venda celebrado em 27 de dezembro de 2013, é puramente motivado por objetivos fiscais, tendo como objetivo essencial ou principal a obtenção de vantagens fiscais para a A... .
O que aqui está em causa não é uma limitação à liberdade da A..., J... ou I... dirigirem a gestão da sua vida societária da forma que melhor considerarem servir os seus interesses, mas sim a ilegitimidade de procurarem soluções, sob a capa do direito à liberdade de gestão empresarial, que visem atingir objetivos censurados pelo ordenamento jurídico, agindo em abuso de direito.
No que se refere à liberdade de gestão empresarial deve-se mencionar que os negócios jurídicos entre particulares, realizados no âmbito da sua autonomia privada, configuram uma das principais formas de manifestação da sua vontade, pelo que a liberdade contratual é vista como uma garantia na realização dos negócios compreendidos na sua esfera privada. Importa salientar que a liberdade de gestão empresarial alicerçada na autonomia privada legitima os sujeitos passivos de impostos a conduzir os seus negócios da forma que mais lhes convier e considerem mais vantajosa.
Contudo, a liberdade e a autonomia dos particulares não pode pôr em causa a subsistência e manutenção do sistema fiscal que visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e demais entidades públicas no quadro de uma repartição justa do rendimento e da riqueza criados (cfr. art 103, n.º 1, da Constituição da República).
Assim, a compatibilização destas duas realidades conduz à necessidade de prevenir a ocorrência de situações de elisão, evasão e fraude fiscais por razões de justiça social nessa medida se justificando a adoção de decisões de limitação legítima de direitos, liberdades e garantias dos particulares.
Deste modo, no caso em apreço estamos perante uma situação do exercício ilegítimo da liberdade empresarial promovendo o planeamento e premeditação de cenários que tiveram como fim a elisão fiscal e conduziram a uma diminuição efetiva das receitas fiscais.
IV.3.4. ELEMENTO NORMATIVO
O elemento normativo traduz-se na reprovação pelo direito que a conduta do contribuinte merece, ao demonstrar-se que o efeito fiscal obtido resulta do abuso das formas jurídicas.
A elisão fiscal traduz-se num aproveitamento de negócios lícitos, cuja única motivação se prende com a subtração do sujeito passivo ao pagamento do tributo, a reverter a favor do erário público. Ademais, a substância da realidade económica, consequência da celebração dos ditos negócios, não é a que reside na verdade dos seus efeitos, sendo antes, aquela cujo "animus" mora na eliminação do imposto. Por outras palavras, e de modo sucinto, e elisão conhece o seu alicerce num conjunto de meios lícitos, mas reportando-se, em exclusivo, a ilícitos propósitos.
O sujeito passivo A..., por intermédio da J..., constituiu apressadamente uma nova sociedade, para aí depositar "in extremis", os imóveis com o único intuito de obter as vantagens fiscais enumeradas no elemento resultado (ponto IV.3.2.), pois a sociedade não teve desde aí atividade justificativa para a sua constituição.
O contrato de compra e venda tal como foi celebrado, entre entidades relacionadas, permitiu à A...:
> cumprir o requisito a que alude o artigo 7.º do CIMT, evitando a caducidade da isenção nos termos do n.º 5 do artigo 11.º do diploma legal,
e
> Atribuir um preço de transmissão por forma ao apuramento de prejuízos fiscais dedutíveis nos termos do artigo 52.º do CIRC.
No entanto e conforme referido ao longo do presente projeto de aplicação da CGAA concluiu-se que nenhumas das três entidades envolvidas obteve vantagens económicas/empresariais com esta transferência de propriedade.
Por outro lado, caso a A... tivesse aguardado o desfecho do processo judicial em curso, sendo as expectativas dos representantes das sociedades intervenientes a possibilidade de edificação/construção, certamente, em condições normais de mercado, a negociação da transmissão da propriedade dos imóveis com entidades Independentes/não relacionadas seria economicamente mais vantajosa para a A..., dada a escassez de terrenos para construção naquela zona, bem como a sua privilegiada vista sobre o estuário do Sado.
Assim, a realização deste negócio nos moldes em que foi concretizado teve objetivo essencial ou principal a obtenção de vantagens fiscais, uma vez que a constituição da sociedade I... e a transmissão dos imóveis para a sua esfera patrimonial, não é promovida por razões de gestão societária, mas apenas por razões de âmbito fiscal, visando obter vantagens fiscais indevidas para a A... .
V. FUNDAMENTAÇÃO DA APLICAÇÃO DA CGAA
Em face do disposto no n.º 3 do artigo 63.º do CPPT, conforme redação dada pela lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, foi comprovado ao longo do presente projeto de aplicação da CGAA que os atos e negócios jurídicos mencionados, designadamente a decisão de constituição de uma sociedade, a concretização dessa decisão (constituição da I...), a transmissão da propriedade dos imóveis da A... para a I..., e a forma utilizada para efetivar o respetivo pagamento, foram essencialmente dirigidos à obtenção de vantagens fiscais a nível de IMT e IRC. Estas vantagens fiscais traduziram-se:
> em sede de IMT, pela não tributação, por caducidade da isenção concedida nos termos do artigo 7.º do CIMT, da aquisição concretizada pela A... em 27 de Dezembro de 2010, o que permitiu à A... obter uma poupança fiscal de € 533.000,00, pois foi este o valor de IMT que não entregou nos cofres do Estado.
> Em sede de IRC, a mesma transmissão teve como consequência o apuramento de um prejuízo fiscalmente dedutível no montante de € 4.170.307,25.
Os atos foram essencialmente dirigidos à obtenção dessas vantagens, tanto mais que se comprovou, que os imóveis continuam na esfera de influência de W... e X..., detentores em conjunto do capital da A... e administradores da mesma, uma vez que são os mesmos que controlam Igualmente a J... e a I..., quer por via do capital e direitos de votos que estes proporcionam, quer por deterem em ambas as sociedades os cargos de gerência. Sendo que foi a relação especial existente entre estas três entidades que tornou possível a realização dos atos supramencionados e que culminaram com a transferência da propriedade dos imóveis da A... para a I... naquele momento preciso com o único interesse de contribuir para o esforço de elisão fiscal da A... .
De salientar que existindo um processo a decorrer em tribunal do qual, à data do presente projeto de aplicação da CGAA, ainda não há caso julgado, não se vislumbra nem foi apresentada justificação razoável para a criação da I... e transmissão dos bens naquele preciso momento e não posteriormente quando efetivamente pudesse iniciar a construção do empreendimento.
Conclui-se, por fim, que o objetivo essencial e principal da escritura de compra e venda celebrada em 27 de dezembro de 2013 é a obtenção de vantagens fiscais para a sociedade vendedora A... .
Não se colocando, no entanto, em causa a validade extra fiscal dessa escritura, deverá a mesma ser desconsiderada para efeitos da sua qualificação fiscal, nos termos do n.º 2 do artigo 38.º da LGT, com a consequente:
> Tributação em IMT, no montante de € 533.000,00, a ser pago pelo sujeito passivo A..., e
> Não consideração em sede de IRC dos efeitos de tal negócio, expurgando-se o montante relativo ao prejuízo fiscalmente dedutível que este negócio originou na esfera do sujeito passivo, no montante de €4.170.307,25.
O sujeito passivo vai ser notificado para efeitos de audição prévia prevista no n.º 5 do artigo 63.º do CPPT.
VI – DIREITO DE AUDIÇÃO
(...)
VI.1.2. ARGUMENTOS DA AT
No ponto II.3.5 do procedimento de aplicação da CGAA, a AT conclui que W... e X..."têm, na prática, o controlo das sociedades A..., I... e J... por disporem do "poder de gerir as políticas financeiras e operacionais" sendo administradoras/gestores e ainda detendo em conjunto por via direta e indireta uma participação superior a 50% do capital social das entidades, possuindo o controlo societário", não querendo com isto dizer que este controlo é obtido unicamente via A... . Pois conforme mencionado no direito de audição, estamos perante um grupo de sociedades e foi sobejamente demonstrado pela AT que a relação neste grupo de sociedades é concretizada por participações diretas, indiretas e cruzadas que geram um emaranhado de participações sociais conducentes à concentração dos respetivos interesses na esfera de W... e X...,
Além do controle das participações sociais ficou evidente que também o controle decisório das entidades envolvidas (A..., J... e I...) se encontra concentrado em W... e X..., facto este de grande relevância e que não foi contrariado ao longo do direito de audição.
No seu direito de audição o sujeito passivo menciona o esquema 1 e quadro 9 do procedimento de aplicação da CGAA referentes à determinação das participações detidas por W... na A... não contestando a conclusão da AT de que este detém direta e indiretamente uma participação de 55,59%, nem contesta o cálculo matricial das participações cruzadas que originam uma participação efetiva de 97,96%.
O sujeito passivo serve-se do referido quadro e esquema para admoestar a AT por não ter elaborado um mapa equivalente para determinar o controlo societário da I..., Lembramos que a I... é detida na sua totalidade pela J... e na página 16 do procedimento de aplicação da CGAA é efetuada a descrição e apuramento da participação de W... e X... nesta entidade. Logo, essa participação de 63,63% na J... reflete a participação dos mesmos na I... .
No entanto, por tal associação não ter sido inferida por parte do sujeito passivo, seguidamente se esquematiza a descrição e apuramento da referida participação:
Assim, provado ficou que W... e X... detém em conjunto, através das participações sociais e poder decisório, o controlo societário na I..., na A... e na J..., o que lhes permitiu realizar atos e negócios jurídicas, designadamente a constituição da I... e a transmissão da propriedade dos imóveis da A... para essa nova sociedade no exato momento em que caducava a Isenção de IMT pela aquisição para revenda em 2010 desses imóveis.
Verifica-se portanto que mantendo-se o poder decisório sobre os imóveis em causa na esfera de W... e X... é obtida uma evidente vantagem/poupança fiscal,
(...)
Vl.2.2. ARGUMENTOS DA AT
O sujeito passivo alega que o financiamento da operação de aquisição pela I... foi concretizado, pela utilização de um descoberto bancário de €4.126,140,00 por parte da I... (entidade compradora) pela realização de suprimentos de €4.030,000, por parte da J..., os quais tiveram em parte origem na A... (entidade vendedora), considerando que estas operações de financiamento constituem operações correntes entre empresas do mesmo grupo.
A AT não contesta os movimentos entre empresas do mesmo grupo mas sim os que aqui estão em questão e que tiveram como objetivo camuflar o real objetivo de obtenção de vantagens fiscais, uma vez que ficou demonstrado que nenhuma das entidades do grupo envolvidas possuía liquidez suficiente para financiar a operação de aquisição pela I... e por outro lado, o recurso à instituição de crédito foi momentâneo, sendo que na prática não originou qualquer alteração ao saldo do fluxo de caixa diário dessa instituição, não gerando exfluxos monetários na instituição de crédito nem reais influxos monetários nas sociedades envolvidas.
O circuito financeiro identificado pela AT para suportar os mais de 4 milhões de euros, foi como se mencionou, momentâneo pois os movimentos bancários nas três entidades envolvidas (A..., J... e I...) foram todos realizados no dia 27/12/2013, não podendo efetivamente ser considerado como um financiamento externo. Constituem sim mais um ato legal realizado pelas entidades envolvidas por forma a credibilizar a operação ao fazer crer que existe pagamento e camuflar a real intenção de obter vantagens fiscais, sob a capa de irrepreensível legalidade. Quanto à alegação de que a J... se viu na contingência de proceder ao pagamento do IMT e do Imposto do Selo, uma vez que não seria ainda possível realizar as liquidações em nome da I... por esta ter sido constituída na véspera da celebração da escritura, tal não corresponde à verdade. Tanto mais que as liquidações que constam no sistema da AT foram emitidas em nome da adquirente I... . O que certamente o sujeito passivo pretende alegar, neste ponto específico, foi que a I... não possuía sequer os meios financeiros para suportar os encargos fiscais decorrentes da aquisição.
O sujeito passivo não concorda com os fundamentos apresentados pela AT quando esta considera que os meios utilizados para financiar a operação de compra e venda dos Imóveis, designadamente descobertos bancários momentâneos, suprimentos e prémio de emissão de participações sociais, constituem mais atos legais realizados pelas entidades envolvidas por forma a credibilizar a operação e camuflar a real intenção de obter vantagens fiscais.
Refere no direito de audição que parte dos suprimentos realizados pela J... teve origem na própria A... .
Sobre estas alegações temos que a parte dos suprimentos a que o sujeito passivo se refere corresponde a 91,84% da totalidade dos suprimentos realizados em 2013. Constata-se pois que, conforme mencionado no ponto III.1.6, do presente procedimento de aplicação da CGAA, existe uma contribuição muito diferenciada entre os suprimentos realizados pela A..., como sócio minoritário da J... (no total de €2.700.000,00) e os realizados pelos restantes sócios (no total de €240.000,00), sem que tenha sido apresentada justificação para tal diferenciação.
Assim, os suprimentos realizados pela A... tiveram origem no descoberto bancário da I... e serviram para pagar parte desse mesmo descoberto bancário, não existindo um efetivo dispêndio monetário, parece, portanto, evidente que o verdadeiro objetivo dos suprimentos em causa foi credibilizar o contrato de compra e venda dos imóveis.
Quanto ao prémio de emissão no montante de €1.400.000,00, que teve igualmente origem no descoberto bancário e como destino o pagamento de parte desse mesmo descoberto o sujeito passivo vem alegar que o prémio está previsto num acordo entre sócios datado de 2009 e ao abrigo do qual foram já realizados outros aumentos de capital nos mesmos termos.
O acordo entre sócios celebrado em 26/10/2009 determina o pagamento de "um prémio de emissão de 5 a 7 vezes o valor nominal da participação a adquirir por via de aumento de capital na sociedade em que se verifique a entrada de novos sócios ou alteração de posição dos sócios atuais".
Quanto ao invocado constatou-se que após o acordo celebrado foram efetuados dois aumentos de capital da J..., um pela entrada da A... na J..., em 2012, no montante de €100.000,00, que originou um prémio de emissão de €700.000,00 e outro de €200.000,00, pelo reforço da participação da A... na J..., que originou o prémio de emissão em causa no montante de € 1.400.000,00.
A exigência de um prémio de emissão de 7 vezes o valor nominal da participação traduz para o investidor uma expetativa de benefícios económicos nesse montante. Ora, aplicando essa condição ao caso concreto temos que antes da entrada da A... no capital social da J..., o capital social desta sociedade totalizava €3.000.000,00, assim sendo os prémios de emissão no montante global da €2.100.000,00, expressam uma expetativa de benefícios económicos no montante de € 21.000.000,00 (63.000.000,00 x 7).
Nas peças contabilísticas apresentadas pela J..., na IES do ano de 2011 e seguintes, designadamente no Balanço e ABDR (Anexo ao Balanço e é Demonstração de Resultados), não existe qualquer evidência/divulgação referente a "goodwill", bens, direitos e expetativas de negócios que façam prever que a J... irá gerar benefícios económicos futuros que justifiquem o pagamento de tal prémio de emissão, muito pelo contrário acumulou sim, até 2015, prejuízos no total de €715.165,03.
Ora, o acordo apresentado por si só não justifica a divergência entre o valor contabilístico da empresa e o valor exigido para novos aumentos de capital, perece-nos ser do senso comum que qualquer investidor aceite as condições do contrato apenas se tiver perspetivas de obter benefícios económicos proporcionais ao seu investimento, o que no caso em apreço não se mostra evidente nas demonstrações financeiras da J... .
A alegação de que a A... investiu cerca de € 180.000,00, o que se nos afigura ser constituído pela diferença entre o saldo bancário antes e depois da operação (€ 178.440.76 = € 270.788,10 - € 92.347,34), não retira o caráter circular do alegado financiamento da operação, uma vez que, está em causa uma liquidez de mais de 4 milhões de euros que a contabilidade das entidades envolvidas demonstra não possuírem.
Face ao exposto, o argumento apresentado pela A... de que estamos perante uma operação de financiamento corrente e bastante comum entre empresas do mesmo grupo não poderá ser aceite pela AT, dado que nenhuma das empresas envolvidas possuía liquidez para realizar tal financiamento monetário, nem se confirmou recurso ao efetivo financiamento externo.
Verificou-se sim a existência de um conjunto de atos legais entre a A..., J..., I... e com a intervenção momentânea da instituição de crédito LL..., designadamente de descobertos bancários momentâneos, suprimentos e prémio de emissão de participações sociais, realizados por forma a credibilizar o contrato de compra e venda dos imóveis e encobrir a real Intenção de obter vantagens fiscais.
A questão das entradas de capital em espécie para a constituição legítima das sociedades levantada no direito de audição, afigurando-se quererem referir-se à constituição da I..., não se coloca uma vez que, por um lado, a mesma foi constituída por entradas em numerário no montante de € 100,000,00, o que nem de perto nem de longe se aproxima do valor do Imóvel em causa e por outro lado, em nenhum momento foi posta em causa a constituição legítima da I... .
(...)
VI.3.2. ARGUMENTOS DA AT
O sujeito passivo alega que a decisão de constituição de uma sociedade, a concretização dessa decisão (constituição da I...), a transmissão da propriedade dos imóveis da A... para a I..., e a forma utilizada para efetivar o respetivo pagamento, configuram operações realizadas no âmbito da sua atividade comercial, em pleno cumprimento da liberdade contratual vigente no ordenamento jurídico português e foram determinadas por razões válidas e racionais.
Efetivamente no ordenamento jurídico português vigora o princípio da autonomia privada ao abrigo do qual é reconhecido aos particulares o direito de manifestar a sua própria vontade estabelecendo o conteúdo e disciplina das relações jurídicas em que participam. A liberdade contratual é um dos elementos integrantes desse princípio e que se define de acordo com o n.º 1 do artigo 405.º do Código Civil como a faculdade que as partes têm de fixar livremente o conteúdo dos contratos, sem descurar as limitações estabelecidas na lei.
Conforme se extrai da leitura da própria lei a liberdade contratual não é um direito sem qualquer limitação, tendo como limites aqueles que a lei fixar.
Ora, o n.º 2 do artigo 38.º da LGT configura uma limitação tributária a essa liberdade, determinando a ineficácia, para efeitos fiscais, dos atos os negócios jurídicos "essencial ou principalmente dirigidos por meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso das normas jurídicas à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas total ou parcialmente sem utilização desses meios," prevendo a tributação de acordo com as normas aplicáveis na ausência de tais atos eu negócios eliminando as vantagens fiscais obtidas.
Em algum momento pretende a AT colocar em questão a idoneidade ou desvalorizar os atos e negócios de gestão praticados, ou a sua eficácia jurídica, civil e comercial, sendo, pois, irrelevante a esta aferir se foram bem ou mal praticados. Isso é matéria da competência dos sócios/acionistas.
Contudo, após a sua prática, os atos de gestão originam factos tributários e deixam de ser exclusivo apanágio do sujeito passivo quanto à respetiva eficácia tributária.
De facto, a partir do momento em que integram a contabilidade e são objeto de declarações para efeitos fiscais, passa a AT a poder e a dever no âmbito das suas prerrogativas inspetivas, analisar e enquadrar os mesmos para subsunção dos factos às normas tributárias, em observância do disposto no artigo, 38.º, 58.º, 59.º, 75.º, todos da LGT, bem como nos artigos 6.º, 8.º e 9.º do RCPIT, porquanto o perfeito enquadramento tributário passa por aferir a conduta e a intenção da mesma em sede de poupança fiscal que se pretende obter, no que respeita à subsunção do facto à norma tributária.
Saliente-se que, na situação em apreço, jamais pretenderia a AT, imiscuir-se naquilo que são os atos de gestão. Porém, e tal como referido, quando tais atos adquirem implicações de cariz jurídico-tributário, deve a AT subsumir tais atos aos seus efeitos tributários, devendo, em consequência, e no estrito cumprimento das suas obrigações funcionais, emitir pronuncia sobre os mesmos.
Ressalvada que está a não intromissão nos atos de gestão e na liberdade contratual do sujeito passivo, cumpre à AT apreciá-los, particularmente no que respeita ao seu efeito tributário.
Não é o facto de a I... estar integrada num grupo de sociedade que leva a AT a considerar que a sua constituição foi abusiva, mas sim o facto de a operação de relevo identificada no âmbito do exercício da sua atividade ter sido a aquisição dos Imóveis à A... sem que fossem realizadas quaisquer diligências no sentido de desenvolver o projeto de construção objetivo este que é alegado por W... e X... como estando na origem na sua constituição.
(...)
Vl.4.2. ARGUMENTOS DA AT
Sobre o alegado apraz referir desde logo que a AT não questiona a intenção de revenda por parte da A... quando em 2010 adquiriu os Imóveis à B... .
Contudo, cumpre contra argumentar que a isenção contemplada no artigo 7.º do CIMT está sujeita a uma condição que é a revenda do imóvel no prazo de três anos. Significando isto que para manter a isenção e para que esta transite na ordem jurídica têm que se verificar dois momentos:
Primeiro momento - é necessário efetivamente a intenção de revenda, ato que o sujeito passivo concretizou e por isso lhe foi atribuída e isenção. A isenção atribuída teve como consequência o não pagamento do IMT no momento da aquisição;
Segundo momento - a revenda tem que ser concretizada no prazo dos 3 anos estipulados na lei. Neste ponto, a A... alega que revendeu, e na verdade formalmente concretizou a revenda. O proprietário passou a ser outra entidade (a I...) com personalidade jurídica distinta da A... .
A AT, ao longo do presente procedimento de aplicação da CGAA, apresenta evidências factuais de que esta segunda condição foi materializada com recurso abusivo a atos e negócios legais, não tendo sido apresentados factos e provas documentais pelo sujeito passivo que alterassem a convicção da AT, da real intenção destes atos e negócios legais ser a obtenção vantagens fiscais
Se não vejamos:
O sujeito passivo argumentou que não concretizou a revenda por vicissitudes várias e que efetuou vários contactos ao longo do tempo, no entanto não especifica quais são essas vicissitudes nem apresentou qualquer prova documental dos vários contactos que efetuou no sentido de proceder à venda dos lotes de terreno em causa.
Alega então, que gorada a possibilidade de revenda, entenderam os sócios do grupo ser de desenvolver o projeto imobiliário de construção e posterior vendas das frações construídas e por isso entenderam concretizar esse objetivo e limitar os riscos associados à detenção dos imóveis, através da constituição de uma nova sociedade, a I... e a transferência da propriedade dos imóveis para esta nova entidade.
No presente procedimento de aplicação da CGAA, a AT reuniu evidências factuais de que W... e X... em conjunto conduzem os destinos das entidades A..., J... e I..., tendo sido os mesmos que tomaram a decisão de gestão de criar uma nova entidade, sob a sua esfera de influência, com o objetivo, nas suas palavras, de desenvolver o projeto imobiliário. No entanto, provado ficou que, até à presente data, não existiram desenvolvimentos do projeto imobiliário em causa, alegando como motivo para esse facto que a gerência, ou seja W... e X..., tomou a decisão de aguardar pelo termo do processo judicial concluindo que é legítimo que até à definição do mesmo não sejam realizadas outras operações.
Sobre o alegado salienta-se que o processo judicial em causa é de 2008, pelo que quando a A... adquiriu os imóveis em 2010 já conhecia esse risco que lhes estava associado, e mesmo assim aceitou pagar o montante de €8.200.000,05, pois com certeza seria este o efetivo valor dos imóveis.
Ora, não tendo sido apresentadas pravas que justifiquem a diminuição do valor dos imóveis em causa desde a aquisição em 2010 até à transmissão da propriedade em 2013 e nem evidências de diligências no sentido do desenvolvimento do projeto imobiliário, não pode a AT aceitar o motivo apresentado por W... e X..., para a constituição da I... e a transferência da propriedade dos imóveis para aquela entidade.
Mantém-se, portanto a convicção firmada pela AT de que W... e X... constituíram a I... um dia antes da caducidade da isenção de IMT, com o propósito de esta ser um mero recetáculo da propriedade dos imóveis adquiridos pela A... em 2010, com a intenção de cumprir todos os requisitos exigidos por lei para consolidar essa isenção.
A descrição factual, e de todos os atos e negócios jurídicos, não deixa qualquer dúvida da existência de uma motivação fiscal preponderante e que faz prevalecer a finalidade de obter vantagens fiscais com o negócio sobre a única motivação declarada que foi o desenvolvimento do projeto imobiliário.
(...)
Vl.5.2. ARGUMENTOS DA AT
Quanto à questão de em diversas ocasiões no procedimento de aplicação da CGAA, a AT mencionar que a construção não é possível, quer com isto dizer-se não que é legalmente impossível a construção mas sim, que face à falta de trânsito em julgado do processo judicial a mesma não será viável apresentando potenciais riscos inerentes ao desconhecimento do desfecho do mesmo.
Quanto ao alegado de que a construção seria possível, uma vez que o processo judicial em curso não será impeditivo, mas que a nova proprietária considera ser mais razoável aguardar o seu desfecho e que terá sido por essa razão que a proprietária I... ainda não procedeu ao averbamento do seu nome no projeto de obras, afigura-se ter sido aqui aduzido um argumento que em nada altera as conclusões da AT, apenas as reforça ainda mais, uma vez que:
A existência de um processo em tribunal não obsta ao averbamento da identificação do novo proprietário, a I... . E o novo proprietário deverá com certeza ter interesse em saber o estado da ação e até se o considerar necessário intervir no próprio processo, sem necessidade de ter que se socorrer da alienante.
W... e X..., em representação das entidades envolvidas, ao considerarem ser a melhor decisão de gestão aguardar pelo desfecho da ação judicial e não tendo a I... realizado qualquer diligência até à presente data, conducente ao avanço do projeto de construção, demonstram que o objetivo da suas ações se resume apenas a evitar o pagamento do IMT devido pela caducidade da isenção.
Tratando-se de um contrato de compra e venda celebrado entre entidades relacionadas não havia qualquer necessidade de adquirir impreterivelmente naquela data, nem se detetaram razões de suporte à necessidade de escolha daquele momento em que por coincidência caducava a isenção de IMT, que não sejam razões de controle e minimização do encargo financeiro trazido pela caducidade da isenção.
Independentemente de ser falso que o processo judicial em curso impede o desenvolvimento do projeto de construção a verdade é que não foram efetuadas quaisquer diligências tendentes à concretização do projeto não se compreendendo qual a necessidade em transferir a propriedade dos imóveis naquele exato momento, uma vez que a situação judicial do imóvel não se alterou, desde 2008 até agora.
(...)
Vl.6.2. ARGUMENTOS DA AT
Em face do alegado afigura-se ter a exponente interpretado que a AT consideraria ser de aplicar a CGAA porque a transmissão foi concretizada no último dia do prazo. No entanto, mesmo que a transmissão tivesse ocorrido em data anterior face aos contornos envolventes estaríamos perante uma situação suscetível de configurar abuso das normas jurídicas e passível de aplicação do artigo 38.º da LGT.
Vejamos, formalmente estamos perante a situação de uma empresa que adquiriu um conjunto de prédios urbanos composto por lotes de terrenos indicando que o destino dado aos bens era a revenda e que dentro do prazo que as normas legais lhe concediam para proceder é concretização da revenda assim o fez. A A... utilizou os meios legais ao seu dispor para adquirir e revender os imóveis. Aqui nada fez de repreensível.
Contudo, passando além da superfície e analisando os meandros do contexto em apreço constata-se que até chegarmos ao momento de concretização da revenda existe todo um encadeado de atos e negócios jurídicos orquestrados por W... e X... que usando as suas diversas facetas, detentores de participações sociais e representantes das sociedades envolvidas as quais se encontram relacionadas entre si, se servem da criação da I... apenas como recetáculo da propriedade dos bens transmitidos, tentando mascarar esta realidade sob o pretexto da hipotética remoção de eventuais "riscos" que não foram delatados pelo AT nem foram apresentados pela exponente no decurso do presente procedimento de aplicação da CGAA.
Assim, ao contrário do que o sujeito passivo alega, o momento da transmissão é relevante exatamente por possibilitar que esta ocorra dentro do prazo de caducidade estipulado por lei, permitindo à A... recolher os seus benefícios tributários, de se excluir da tributação em sede de IMT por não cumprir os requisitos dessa mesma caducidade, o que não aconteceria caso a transmissão tivesse ocorrido fora do período de 3 anos.
VI.7.2. ARGUMENTOS DA AT
No que respeita à questão da restituição do IMT e do Imposto do Selo em sede de reclamação graciosa a solicitação da adquirente I..., decorre da legislação em vigor, tanto que o pedido foi deferido tendo produzido os seus efeitos com a devolução à reclamante dos montantes em causa. A sua referência no presente procedimento de aplicação da CGAA foi levada a cabo apenas para enquadramento factual de todos os elementos componentes da situação aqui em causa.
Quanto aos valores patrimoniais tributários (VPT) dos imóveis alienados constata-se que efetivamente estes sofreram uma diminuição de valor em resultado do pedido de avaliação apresentado em 31-10-2013 (retificação de áreas), contudo esta diminuição dos VPTs não poderá, de per se, ser usada como justificativo do valor atribuído à contraprestação no contrato de compra e venda de 27 de dezembro de 2013.
Atentemos na evolução do VPT desde a inscrição à matriz dos prédios aqui em consideração;
Na data da aquisição por parte da A..., em 27 de dezembro de 2010 os imóveis aqui em apreço possuíam um VPT global no montante de € 5.303.990,53, tendo a A... procedido à sua aquisição pelo montante global de € 8.200.000,00. Assim, constata-se ter havido uma valorização face ao VPT de € 2.896.009,47.
A A... manteve os imóveis sob a sua esfera patrimonial até 27 de dezembro de 2013. Neste período o VPT, por via das atualizações automática em sede de IMI, passou dos mencionados € 5.303.990,53 para € 5.502.890,19, até que, por via do pedido de avaliação apresentado em 31-10-2013 o VPT global dos imóveis é fixado em €4.125.140,00, o que significa um decréscimo no valor global de avaliação no montante de €1.376.750,19.
Ora, o importante a reter e que se revela essencial para a apreciação da presente situação é que:
A A..., representada pelo seu gerente W..., considerou que entregar o montante de € 8.200.000,00, recebendo em troca os imóveis identificados no presente procedimento de aplicação da CGAA refletia equilíbrio nas prestações contratuais, por outras palavras: os imóveis tinham para a A... o valor de € 8.200.000,00;
No momento em que a A... concretiza o negócio pelo valor de € 8.200.000,00 os mesmos imóveis tinham para a AT o VPT global de € 5.303.990,53, logo estes valores não se aproximam sequer. Quando da transmissão dos imóveis da A... para a I..., em que intervêm na outorga do ato de transmissão W... e X..., ambos em representação das duas empresas em simultâneo, isto é, ambos atuam no mesmo momento como compradores e como vendedores, é atribuído ao contrato um valor global que coincide com o VPT atribuído pela AT na sequência do pedido de avaliação que tinha sido apresentado em Outubro, ou seja o valor de € 4.126.140,00;
Em suma, o valor que a A... atribuiu primeiramente aos imóveis (€ 8.200.000,00) em nada se aproximava do seu VPT à data, não podendo ser atribuída à retificação do VPT resultante da correção de áreas, a causa para a redução do valor de venda aceite pela A... aquando da transmissão à I... (€ 4.126.140,00).
Tanto mais que a diminuição do VPT surge na sequência de um pedido de avaliação apresentado pelo sujeito passivo e por via de retificação de áreas, o que com certeza era do conhecimento do exponente quando adquiriu os imóveis em 2010 pelo preço de € 8.200.000,00, uma vez que as áreas cuja retificação foi solicitada no pedido de avaliação já constavam do alvará de loteamento n.º .../2006, que já deveria ser do conhecimento do sujeito passivo em 2010.
(...)
VI.8.2. ARGUMENTOS DA AT
Quanto à questão dos prejuízos fiscais alegam que dificilmente irá a A... gerar resultados positivos que permitem absorver esses prejuízos argumenta o sujeito passivo que em 2014 e 2015 registou também prejuízos fiscais pelo que não tinha qualquer interesse em incrementar esse valor.
Relativamente ao inovado pelo sujeito passivo apraz referir o seguinte: Decorre do próprio ordenamento jurídico e também do senso comum que o objetivo que subjaz à constituição e manutenção de uma entidade que exerce a título principal uma atividade comercial é a obtenção do lucro, no entanto, poderão existir períodos em que por diversos fatores esse objetivo não seja obtido e o resultado final seja o apuramento dos prejuízos.
O código do IRC prevê a dedutibilidade desses prejuízos em lucros futuros o que se traduz numa poupança fiscal nos períodos subsequentes ao apuramento desses prejuízos. A dedução dos prejuízos apurados em 2013 pode ter lugar em qualquer dos seis períodos subsequentes, ou seja, até 2018.
Ora o facto de nos anos de 2014 e 2015 a A... ter registado prejuízos fiscais não é sinónimo de que até 2018 não venha a obter lucros que lhe permitam beneficiar da vantagem fiscal de deduzir os prejuízos obtidos em 2013.
Face ao exposto não se afigura que os argumentos apresentados pelo sujeito passivo em sede de direito de audição do procedimento de aplicação da CGAA permitam afastar a convicção da AT de que a obtenção de um prejuízo fiscal no ano de 2013 no montante de é 4.170.307,25 constitui uma vantagem fiscal.
(...)
VI.9.2. ARGUMENTOS DA AT
Quanto à alegada não demonstração dos requisitos da CGAA, não nos é possível aceitar os argumentos aduzidos, uma vez que se encontra verificado cada um dos quatro pressupostos necessários à sua aplicação e cuja explanação pormenorizada se encontra ponto IV.3 do presente procedimento de aplicação da CGAA, não tendo sido apresentado por parte do sujeito passivo quaisquer elementos novos, em sede de direito de audição, que contrariem as conclusões firmadas pela AT.
Ainda assim, vamos proceder à sua revisão.
São quatro os pressupostos cuja verificação é necessária para aplicação da CGAA.
1. Elemento Meio
Conforme o anteriormente mencionado este pressuposto está relacionado com os atos ou negócios praticados por livre escolha dos intervenientes com o objetivo de obter uma vantagem fiscal.
O sujeito passivo alega no exercício do direito de audição que "estruturou as operações em causa da forma que entendeu mais conveniente", no uso da "liberdade de condução da sua atividade". Tais afirmações não colidem com os requisitos necessários à comprovação do elemento meio, reforçando-o de facto.
A A... escolheu no exercício da sua liberdade de condução da sua atividade, realizar os atos e negócios dos quais resultaram indiscutivelmente vantagens fiscais. O uso do seu próprio livre arbítrio levou-a a escolher este caminho e não outro.
Assim, foram meios livremente escolhidos pela A... e detetados pela AT:
A celebração da escritura de compra e venda de 27 de dezembro de 2013,
A promoção, por parte dos detentores do capital da A..., mais concretamente W... e X..., da constituição da sociedade I...,
A criação de um fluxo circular de movimentos nas contas de depósito à ordem das três
entidades envolvidas (A..., J... e I...).
Em suma, os atos e negócios praticados são formas previstas e/ou não proibidas no ordenamento jurídico e foram livremente escolhidas pela A... e tiveram como objetivo a obtenção de vantagens fiscais conforme se demonstrou ao longo do presente procedimento de aplicação da CGAA e se reforça nos pressupostos seguintes.
2. Elemento Resultado
Tal como antes exposto a atuação do contribuinte conduz a uma efetiva vantagem fiscal.
No caso em apreço as vantagens fiscais verificaram-se em sede de IMT e de IRC.
Em IMT, a transferência da propriedade, dentro do prazo de 3 anos mencionado no artigo 7.º do CIMT, para a I... traduziu-se no não pagamento de € 533.000,00.
Sobre este requisito não se afigura que no direito de audição venha a A... trazer alegações que contrariem as da AT, no entanto, parece-nos que a ele se refere quando afirma ser "irrelevante que os imóveis continuem a ser detidos por uma sociedade controlada pelos titulares da sociedade que os alienou, pois esse facto não é proibido nem merece qualquer censura."
É pois neste ponto que não podemos concordar, porque ainda que se aceite não ser proibido por lei que as entidades relacionadas mantenham entre si operações comerciais, não é isso que está em causa. Aqui o que importa é que a A... aproveitou a relação especial que mantém com a J... e a I... para obter vantagens fiscais em sede de IRC e IMT, que foram aquelas que efetivamente se verificaram.
3. Elemento intelectual ou intencional
Este elemento está verificado quando se demonstra que a atuação do contribuinte visa a obtenção daquele resultado.
O sujeito passivo, nos seus argumentos, afirma que a sua conduta não foi orientada pela intenção de obter vantagens fiscais e que "as operações realizadas foram estruturadas desta forma apenas por razões de índole económica, tendo sido ditadas por critérios da gestão rigorosa e eficiente que a Requerente adota". Cabe-nos, contudo, salientar que não se afigura que vender com um prejuízo tão elevado, como foi o caso, seja obedecer a um critério de gestão rigorosa e eficiente.
Tanto mais que a AT não encontrou outras razões além das fiscais que justifiquem a transmissão para a I... dos imóveis aqui em causa.
Adicionalmente ainda o sujeito passivo quer fazer crer que a necessidade de transferir a propriedade naquele momento se deve à necessidade de evitar "riscos" que não específica, parecendo-nos a nós, que não os especifica porque efetivamente não existem, sendo teóricos e não reais.
No decurso do direito de audição vêm alegar que a criação da sociedade I... e a transferência dos imóveis para a sua esfera patrimonial serviu não para obter vantagens fiscais em sede de IMT e IRC, mas sim:
- Limitar os riscos do processo judicial,
- E isolar os imóveis associados ao projeto do restante património da J...,
- Com o objetivo último de desenvolvimento do projeto de construção e venda posterior das frações construídas.
Seguidamente procede-se à apresentação dos argumentos da AT para desconsiderar as referidas alegações do sujeito passivo:
Quanto à limitação de riscos do processo judicial:
Aludem, nos parágrafos 26 e 28, à demora da obtenção de decisão no âmbito do processo judicial e a incerteza do seu teor como situações que poderiam trazer prejuízo à proprietária dos imóveis. Este argumento não pode ser considerado como válido, uma vez que o processo judicial teve, como se viu, o seu início no ano de 2008, ainda antes da aquisição dos imóveis por parte do sujeito passivo. Já era, portanto, do conhecimento da A..., quando, em 2010, procedeu à aquisição dos bens e considerou que o destino a atribuir era a revenda, que as decisões judiciais demorarão o tempo necessário e que este pode ser longo e ainda que existindo um litígio sobre o qual importa decidir poderá a decisão não ser a contento de todos os intervenientes, existindo a hipótese de a entidade que proceda ao desenvolvimento do projeto não o possa fazer nos moldes que para si seriam idílicos.
Em relação a esta situação que a A... denomina de "risco" afigura-se que o próprio direito de audição contradiz o argumentado, uma vez que também asseguram não ser a existência do mesmo processo impeditiva da construção nos aludidos terrenos, logo se a existência do processo não impede a construção porque é que a I... que detém o imóvel, desde 2013, não desenvolveu o projeto? O próprio direito de audição apresenta uma justificação, de que foi tomada a decisão de gestão em que se optou por aguardar pela decisão judicial.
Ora, se a opção de gestão é aguardar, estando nós perante um conjunto da sociedades que se assumem como um grupo, poderiam os imóveis ter continuado em nome do sujeito passivo A..., uma vez que não houve quaisquer desenvolvimentos no projeto.
Quanto ao desenvolvimento do projeto de construção e venda:
Tal como se verificou do exposto no presente procedimento de decisão da CGAA, o projeto a que o sujeito passivo se refere não apresenta, até à data, progressos, tendo as próprias entidades responsáveis pelos imóveis, mais concretamente, W... e X..., tomado a decisão, tal como admitido em direito de audição, de aguardar pelo desfecho do processa judicial. Logo, essa pretensa necessidade de impreterível transferência da propriedade para a I... a fim desenvolver o projeto imobiliário, não se verificou, não tendo esta transferência de propriedade debelado outro objetivo que não a imediata obrigatoriedade de pagamento do IMT e proporcionando ainda uma almofada de prejuízos fiscalmente dedutíveis, relevantes em IRC.
Quanto à necessidade de isolar os imóveis associados ao projeto do restante património:
Não sendo claramente identificada, em sede de direito de audição a entidade que é necessário proteger desta alegada necessidade de isolar os Imóveis do restante património, se a A... se a J..., parece-nos que o sujeito passivo se pretende referir à J... . Assim, afigura-se que o sujeito passivo quer com isto dizer que a transferência dos imóveis não foi efetuada para a J... com o objetivo de isolar os riscos associados ao desenvolvimento do projeto imobiliário do restante património daquela entidade. Ora, este argumento não pode ser acolhido pela AT para aceitar os efeitos fiscais decorrentes da transferência da propriedade da esfera da A..., sendo irrelevante que a transferência fosse para a I... ou para a J... uma vez que ambas são controladas por W... e X... .
Mais ainda se o objetivo era proteger a J..., os imóveis simplesmente poderiam ter-se mantido em nome da A... .
Ficou assim demonstrado que as ações das entidades envolvidas foram conduzidas objetivamente e intencionalmente com vista à obtenção do resultado tributário, reduzindo os encargos fiscais e atuando, ao abrigo da ordem jurídica com o propósito de obter vantagens condenadas pelo direito.
4. Elemento Normativo
Demonstrado o abuso das formas jurídicas a conduta do contribuinte merece reprovação pelo direito, traduzida na ineficácia para efeitos fiscais da conduta do contribuinte.
Conforme ficou demonstrado ao longo do presente procedimento o sujeito passivo agiu intencionalmente e em consciência com vista à obtenção de vantagens fiscais, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 38.º da LGT, os atos e negócios jurídicos produzidos em consequência das decisões tomadas pelas entidades envolvidas não devem ser consideradas para fins de tributação fiscais por se terem produzido vantagens fiscais em sede de IMT no montante de € 533.000,00 e de IRC ao possibilitar a consideração de é 4.170.307,25 a título de prejuízos fiscais.
Assim e em suma, constata-se ter ficado evidente e provados todos requisitos para aplicação da CGAA tendo o sujeito passivo utilizado meios legais ao seu dispor intencionalmente para obter vantagens fiscais que merecem censura do direito sendo por isso ineficazes.
(...)
VI.10.2. ARGUMENTOS DA AT
Alega o sujeito passivo que a aplicação da CGAA ao seu caso concreto é uma ilegalidade e uma inconstitucionalidade.
No que respeita à verificação de uma ilegalidade considera não estarem preenchidos os requisitos necessários à aplicação da CGAA. Contudo e tal como foi demonstrado ao longo do presente procedimento, mais incisivamente nos pontos IV.3 e VI.9 e que nos abstemos, por economia processual voltar a repetir, todos os requisitos necessários à aplicação da CGAA, elencados no n.º 2 do artigo 38.º da LGT, foram precedentemente identificados e devidamente fundamentados.
No que concerne à pretensa existência de uma violação de princípios constitucionalmente consagrados invocados pelo sujeito passivo, nomeadamente a violação dos artigos 13.º e n.º 1 do artigo 103.º da CRP, trazendo ainda à colação o artigo 4º da LGT e o artigo 1.º do CIRC, constata-se que estes são invocados de forma vaga sem fazer qualquer correlação com o caso concreto, no entanto, cumpre lembrar que a possibilidade de aplicação da CGAA resulta do facto de a mesma se encontrar contemplada no ordenamento jurídico e em nenhum momento se está a utilizar uma faculdade que não resulte de uma norma prevista na lei.
Ainda assim, salienta-se que o artigo 4.º da LGT, sob a epígrafe "pressupostos dos tributos", identifica os tipos de tributos previsto no ordenamento jurídico, onde se incluem os impostos, sendo que tanto IMT como IRC estão abrangidos por essa categoria de tributos, tendo a sua criação obedecido ao disposto no n.º 2 do artigo 103.º da CRP. O Código do IMT foi criado, no âmbito da reforma do património e no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 26/2003 de 30 de julho, pelo decreto-lei n.º 287/2003 de 12 de novembro. O Código do IRC foi criado, no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 106/88 de 17 de setembro, pelo decreto-lei n.º442-B/88 de 30 de novembro. Constata-se pois que a sua criação obedeceu ao princípio da legalidade cumprindo os requisitos do n.º 2 da artigo 103.º da CRP.
Quanto à suposta violação dos artigos 13.º (princípio da igualdade) e n.º 1 do artigo 103.º da CRP (princípio da capacidade contributiva) notamos que a mesma não se verifica, antes pelo contrário, a não aplicação da CGAA neste caso concreto, isso sim, seria uma violação destes princípios constitucionais, pois a utilização do ordenamento jurídico com a intenção de obter um resultado que não é à partida o desejado pelo direito é uma violação do princípio da igualdade que visa assegurar a paridade dos cidadãos perante a lei geral e abstrata e proibir discriminações tanto positivas como negativas, é também uma violação do princípio da capacidade contributiva que promove a justa repartição dos rendimentos e da riqueza.
Quer as normas antiabuso especificas, quer a cláusula geral antiabuso encontram a sua razão de ser no comportamento fiscal evasivo ou fraudulento e, bem assim, na necessidade de se estabelecerem meios de reacção adequados a garantir o cumprimento do princípio da igualdade na repartição dos encargos tributários e, também, a satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas.
VI.11. CONCLUSÕES D A AT
No que respeita à situação descrita detalhadamente no presente procedimento de aplicação de CGAA e tendo-se verificado nos seguintes factos:
- Os outorgantes nos negócios jurídicos analisados no projeto de aplicação da CGAA são invariavelmente W... e X... nas suas diversas qualidades de gerentes, administradores ou representantes das sociedades envolvidas;
As sociedades envolvidas (A..., J... e I...) estão relacionadas entre si através de um emaranhado de participações sociais cruzadas que conduzem à concentração dos respetivos interesses societários;
A participação social maioritária de W... e X..., em conjunto, de forma direta e indireta, nas sociedades A..., J... e I...;
- A sua simultânea intervenção como administradores/gerentes e acionistas/sócios e os correspondentes interesses societários e financeiros inerentes traduz a concentração nas suas mãos do destino daquelas entidades;
As circunstâncias da constituição da sociedade I..., que se revelou ser, inclusive, até à presente data, um mero recetáculo da propriedade dos imóveis transmitidos;
A desvalorização para metade do valor atribuído aos imóveis, face ao seu valor de aquisição em 2010, sem justificação, mesmo numa conjuntura de crise como a verificada.
O sujeito passivo através de claro abuso das formas jurídicas consegue, tal como se demonstrou, obter uma vantagem fiscal em sede de IMT, no montante de € 533.000,00 e uma dedutibilidade de prejuízos em sede de IRC de €4.170.307,25.
Ao longo do presente procedimento de aplicação da CGAA foram apresentados os fundamentos que, de modo cabal e incontornável, vem justificar a atuação da AT conducente à reposição da verdade fiscal com recurso à Cláusula Geral Antiabuso, reforçando-se, naturalmente e por consequência o facto que se traduz na inexistência de qualquer inconstitucionalidade, ilegalidade ou falta de fundamento como alega o sujeito passivo.
Em face de tudo o que antes foi exposto estamos em condições concluir que se dão por provados todos os pressupostos necessários à aplicação da CGAA, não tendo o sujeito passivo apresentado no direito de audição elementos /argumentos que alterassem a posição firmada pela AT.
WW) Sequência da inspecção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu e a Requerente foi notificada nos termos do documento junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:
Assunto: LIQUIDAÇÃO DE IMT - ADICIONAL
Liquidação de IMT - Matéria Coletável: € 8.200.000,00; Taxa: 6.5%; Coleta: € 533.000,00; Parcela a Abater € 000,00; Coleta Devida: € 533.000,00
Fica V, Exa. notificado, nos termos do Art 60º Nº 6 da Lei Geral Tributária (LGT) para no prazo de 15 dias a contar da data da presente notificação exercer, querendo, o direito de audição relativamente à liquidação de Imposto Municipal de Transmissões Onerosas de imóveis (IMT) acima.
Fica ainda notificado, nos termos do Art 36º Nº 6 do Código do IMT, para no prazo de 30 dias a contar da data da presente notificação, proceder ao pagamento da quantia de € 533,000;00 respeitante a IMT e € 10.514,00 respeitante a juros compensatórios, relativo à aquisição a B..., Lda, dos prédios urbanos da extinta freguesia de ...(...) com os artigos ..., ..., ..., ..., ... ,... ... e ... atualmente da União de freguesias de ...(...) com os artigos ..., ..., ..., ..., ..., ... ... e ... todos terrenos para construção. Na liquidação inicial de IMT com o registo nº 2010/..., foi-lhe reconhecida a isenção de prédios para revenda, no entanto de acordo com o despachado resultante da ordem de inspeção externa número Ol 2014... que concluiu estarmos frente a uma Cláusula Geral Anti Abuso pelo que o imposto deve ser liquidado como se não tivesse existido qualquer transmissão.
Da liquidação de IMT, poderá reclamar no prazo de 120 dias (artº 70º do Código de Procedimento e Processo Tributário - CPPT) ou impugnar no prazo de 90 dias (artº 102º do CPPT, com os fundamentos referidos no art 99º do CPPT).
Findo o referido prazo sem que se mostre efetuado o pagamento, será extraída certidão de dívida nos termos do artº 88º Nº 1 do Código de Procedimento e Processo Tributário, conjugado com o artº 38º Nº3 do CIMT.
XX) Em 31-07-2019, a Requerente enviou à Autoridade Tributária e Aduaneira requerimento a suscitar a nulidade da notificação, bem como, cautelarmente, a exercer a audição prévia (documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
YY) Por ofício datado de 13-08-2019, a Requerente foi notificada de que o seu direito de audição tinha sido indeferido (Documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral);
ZZ) Em 26-08-2019, a Requerente enviou novo requerimento à Autoridade Tributária e Aduaneira a informar que o prazo para impugnar/apresentar pedido de constituição de tribunal arbitral não era de 15 dias, como referia na notificação, uma vez que tal disposição tinha sido revogada pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de Dezembro. (Documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
AAA) Em 28-10-2019, a Requerente, na pessoa do seu mandatário, foi notificada do mesmo despacho relativo ao documento n.º 3 (Documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
BBB) Em 16-12-2019, a Requerente deduziu reclamação graciosa contra a liquidação de IMT (Documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
CCC) À reclamação graciosa foi atribuído o n.º ...2019...;
DDD) Em 15-06-2020, a Requerente, através do seu mandatário, foi notificada do indeferimento da reclamação graciosa, nos termos do Documento n.º 7 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
EEE) Em 2016, houve um aumento de capital com entrada de novos sócios na I... (depoimento da testemunha G...);
FFF) Em 2016, o sócio X... deixou de pertencer a administração da I... (depoimentos das testemunhas G... e H...);
GGG) Presentemente a sucessora da I... (K ...) é detida não só pela J..., mas também por outras empresas do Grupo MM..., empresas estas que são sócias maioritárias (depoimento da testemunha e H...);
HHH) Para pagar à Requerente a compra dos terrenos, a I... pediu ao banco um descoberto autorizado, que utilizou para fazer o pagamento, e depois o descoberto foi pago com suprimentos que a J..., então sócia única da I... fez nesta (depoimento da testemunha G...);
III)Para fazer esses suprimentos, a J... fez um aumento de capital com prémio de emissão (depoimento da testemunha G...);
JJJ) A Requerente fez suprimentos à J..., para se associar aos resultados desta, que era e é uma empresa lucrativa (depoimento da testemunha G...);
KKK) No momento da transacção entre a Requerente e a I..., os sócios W... e X... eram administradores das duas empresas, mas a decisão não passou por eles exclusivamente, pois não eram sócios maioritários (depoimento da testemunha G...);
LLL) A J..., que era a principal interessada na I..., tinha outros sócios maioritários, com interesse em promover a construção nos terrenos referidos (depoimento da testemunha G...);
MMM) A decisão da Requerente em vender estava associada ao interesse da J... em promover a construção (depoimento da testemunha G...);
NNN) A criação da I... para levar a cabo a construção nos terrenos era tema que já se vinha falando vários meses antes da data da transacção e, inclusivamente, a promoção de uma avaliação particular e o pedido de alteração dos valores matriciais já foram feitos com esse objectivo (depoimento da testemunha G...);
OOO) Quando foi feita a escritura, a Requerente já sabia quais os valores matriciais que iam ser fixados, mas eles ainda não constavam das respectiva matrizes prediais, pelo que foram considerados nesta os valores matriciais anteriores (depoimentos das testemunhas G... e H...);
PPP) Foi atrasado o momento da escritura até ao limite dos três anos após a aquisição dos terrenos pela Requerente que determinavam a caducidade da isenção de IMT, para ver se, entretanto, passavam a constar das matrizes os novos valores e eles podiam ser considerados para efeitos de determinação do preço relevante a efeitos de IMT e Imposto do Selo (depoimento da testemunha G...);
QQQ) Não tendo sido possível fazer a escritura com base nos novos valores, a Autoridade Tributária e Aduaneira devolveu à I..., no início de 2014, o que havia pago em excesso (depoimento da testemunha G...);
RRR) A fixação dos novos valores matriciais foi feita com fundamento em rectificação de áreas, mas a desvalorização também foi relevante (depoimento da testemunha G...);
SSS) A actividade da Requerente era apenas revenda de imóveis (depoimento da testemunha G...);
TTT) Os lotes de terreno para construção em causa foram oferecidos pela Requerente para venda à empresa NN... em Setembro de 2013, pelo valor de € 4.500.000,00 (depoimento da testemunha OO...);
UUU) A empresa NN..., que não tinha então nenhum projecto de construção com dimensão em curso, analisou a proposta da Requerente, mas acabou por perder o interesse e não concretizou a aquisição (depoimento da testemunha OO...);
VVV) A empresa NN... não avançou com a aquisição, porque em ... havia excesso de oferta de construção e, principalmente, porque havia a acção pendente que dava incerteza sobre as possibilidades de construção e consideraram o preço excessivo para a localização dos terrenos (depoimento da testemunha OO...);
WWW) Em 2013, havia perspectiva de sair da crise do imobiliário, com o regime dos Vistos Gold (depoimento da testemunha OO...);
XXX) Por volta de finais de 2017, a sociedade K... (através dos sócios W... e QQ..., contratou a testemunha Arquitecto PP... para desenvolver projectos dos edifícios a construir nos terrenos referidos no autos, quer de engenharia quer de arquitectura (depoimento da testemunha PP...);
YYY) Em finais de 2017, já estavam feitos projectos de engenharia e foi feita uma proposta integrada com a arquitectura, que foi adjudicada à testemunha Arquitecto PP... e a professores do Instituto Superior Técnico (depoimento da testemunha PP...);
ZZZ) Nessa ocasião, o terreno foi limpo e vedado, foram consolidadas as estruturas e foi feito um levantamento topográfico (depoimento da testemunha PP...);
AAAA) Ainda não houve adjudicação dos projectos de especialidades, mas já foram realizadas reuniões de coordenação (depoimento da testemunha PP...);
BBBB) A testemunha Arquitecto PP... superintende o processo das obras nos terrenos e tem feito reuniões com a Câmara Municipal F... (depoimento da testemunha PP...);
CCCC) Os edifícios a construir têm 3 pisos para baixo e 6 para com a cota de soleira (depoimento da testemunha PP...).
2.2. Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto
Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral, os que constam do processo administrativo e, nos pontos indicados, a prova testemunhal.
As testemunhas aparentaram depor com isenção e com conhecimento directo dos factos dados como provados com base nos seus depoimentos.
A testemunha G... é contabilista certificado e prestava serviços à Requerente às datas em que ocorreram os factos dos autos, acompanhando a gestão da Requerente.
A testemunha H... foi administradora da Requerente entre 2011 e 2014 e actualmente trabalha na J..., mas já anteriormente acompanhava a administração da Requerente e tinha sido convidada para a vir a integrar.
A testemunha OO... trabalhava numa empresa a quem foi proposta pela Requerente a aquisição dos terrenos.
A testemunha OO... é professor universitário e arquitecto, tendo efectuado projectos para a sociedade K... .
3. Matéria de direito
Em 27-12-2010, a Requerente A... adquiriu terrenos para construção, beneficiando da Isenção pela aquisição de prédios para revenda, prevista no artigo 7.º do CIMT, actividade a que se dedicava habitualmente.
Nos termos do n.º 7 do artigo 11.º do CIMT, «a aquisição a que se refere o artigo 7.º deixará de beneficiar de isenção logo que se verifique que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda».
Em 27-12-2013, último dia do prazo de três anos referido, a Requerente vendeu os prédios adquiridos à I..., sociedade criada no dia anterior, tendo como única sócia a J..., de que eram sócios W... e X..., que também eram sócios da A... .
A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu aplicar a cláusula geral antiabuso, prevista no artigo 38.º, n.º 2, da LGT, retirando efeitos fiscais à venda, e exigindo à A... o IMT da relativo à aquisição dos prédios que fizera em 2010.
O artigo 38.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária, na redacção vigente em 2013, estabelece que «são ineficazes no âmbito tributário os actos ou negócios jurídicos essencial ou principalmente dirigidos, por meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas, à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em resultado de factos, actos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmente, sem utilização desses meios, efectuando-se então a tributação de acordo com as normas aplicáveis na sua ausência e não se produzindo as vantagens fiscais referidas».
É sobre a Autoridade Tributária e Aduaneira que recai o ónus da prova da verificação dos pressupostos da cláusula geral antiabuso, pois é ela que a invoca (artigo 74.º, n.º 1, da LGT).
3.1. Ordem de conhecimento dos vícios
A Requerente imputa à liquidação impugnada vícios procedimentais relativos à inspecção e à notificação para exercício do direito de audição e simultaneamente pagamento do imposto, e vício de violação de lei por falta de verificação dos pressupostos de aplicação da cláusula geral antiabuso.
O artigo 124.º do CPPT estabelece regras sobre a ordem de conhecimento de vícios em processo de impugnação judicial, que são subsidiariamente aplicáveis ao processo arbitral, por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT.
No caso de vícios geradores de anulabilidade, a alínea a) do n.º 2 daquele artigo 124.º estabelece que se deve conhecer prioritariamente dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos.
Os vícios da inspecção e da notificação são procedimentais e formais e a anulação com base neles, não obsta necessariamente à renovação do acto anulado, com supressão dos vícios.
Por isso, começar-se-á por apreciar o vício de violação de lei relativo à falta de pressupostos de aplicação da cláusula geral antiabuso.
3.2. Planeamento fiscal legítimo e ilegítimo
Nas definições elaboradas por Saldanha Sanches ([1] ): o planeamento fiscal legítimo «consiste numa técnica de redução da carga fiscal pela qual o sujeito passivo renuncia a um certo comportamento por este estar ligado a uma obrigação tributária ou escolhe, entre as várias soluções que lhe são proporcionadas pelo ordenamento jurídico, aquela que, por acção intencional ou omissão do legislador fiscal, está acompanhada de menos encargos fiscais»; enquanto que o planeamento fiscal ilegítimo «consiste em qualquer comportamento de redução indevida, por contrariar princípios ou regras do ordenamento jurídico-tributário, das onerações fiscais de um determinado sujeito passivo».
Dentro do quadro do planeamento fiscal podemos, assim, distinguir as situações em que o sujeito passivo actua contra legem, extra legem e intra legem.
Quando este actua contra legem, a sua actuação é frontal e inequivocamente ilícita, pois infringe directamente a lei fiscal, e configura uma fraude fiscal ([2] ) passível, inclusive, de ser objecto de censura contra-ordenacional ou criminal.
A actuação extra legem ocorre quando o sujeito passivo aproveita de forma abusiva a lei para chegar a um resultado fiscal mais favorável, pese embora este não a violar directamente. Este adopta «um comportamento que tem como finalidade exclusiva ou principal contornar uma ou várias normas jurídico-fiscais, de modo a conseguir a redução ou a supressão do encargo fiscal» ([3] ). Sendo que dessa ou dessas normas jurídico-fiscais se deve detectar uma tentativa de contornar «uma clara intenção de tributar afirmada pelos princípios estruturantes do sistema» ([4] ). Este tipo de actuação é comummente designado de «fraude à lei fiscal» mas, conforme alerta Saldanha Sanches, pretendendo melhor ilustrar e distinguir estas situações das de fraude fiscal, também designada de «evitação abusiva de encargos fiscais», «evitação fiscal abusiva» ou ainda «elisão fiscal» ([5] ).
Só se afigura legítima – e, assim, planeamento fiscal legítimo ou não abusivo – a actuação intra legem. Com efeito, a obtenção de uma poupança fiscal não constitui um comportamento proibido pela lei, desde que a actuação não se enquadre na supra referida actuação extra legem ([6] ).
A doutrina e a jurisprudência têm vindo a desconstruir a letra da norma apontando cinco elementos nela patentes. Correspondendo um dos elementos à estatuição da norma, os restantes quatro afiguram-se requisitos cumulativos que permitem aferir – como se de um teste se tratasse – quanto à verificação de uma actividade caracterizável como um planeamento fiscal abusivo ([7] ).
Estes elementos, em torno dos quais ambas as partes aliás constroem a sua argumentação, consistem:
– no elemento meio, que diz respeito à via livremente escolhida – acto ou negócio jurídico, isolado ou parte de uma estrutura de actos ou negócios jurídicos sequenciais, lógicos e planeados, organizados de modo unitário – pelo contribuinte para obter o desejado ganho ou vantagem fiscal; como decorre do texto do artigo 38.º, n.º 2, da LGT, os meios relevantes para aplicação da cláusula geral antiabuso têm de ser «artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas» ;
– no elemento resultado, que contende com a obtenção de uma vantagem fiscal, em virtude da escolha daquele meio, quando comparada com a carga tributária que resultaria da prática dos actos ou negócios jurídicos «normais» e de efeito económico equivalente ([8] );
– no elemento intelectual, que exige que a escolha daquele meio seja «essencial ou principalmente dirigid[a] [...] à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos» (artigo 38.º, n.º 2 da LGT), ou seja, que exige não a mera verificação de uma vantagem fiscal, mas antes que se afira, objectivamente, se o contribuinte «pretende um acto, um negócio ou uma dada estrutura, apenas ou essencialmente, pelas prevalecentes vantagens fiscais que lhe proporcionam» ([9] );
– no elemento normativo, que «tem por sua função primordial distinguir os casos de elisão fiscal dos casos de poupança fiscal legítima, em consideração dos princípios de Direito Fiscal, sendo que só nos casos em que se demonstre uma intenção legal contrária ou não legitimadora do resultado obtido se pode falar naquela »([10] );
– e, por fim, no elemento sancionatório, que, pressupondo a verificação cumulativa dos restantes elementos, conduz à sanção de ineficácia, no exclusivo âmbito tributário, dos actos ou negócios jurídicos tidos por abusivos, «efectuando-se então a tributação de acordo com as normas aplicáveis na sua ausência e não se produzindo as vantagens fiscais referidas» (parte final do artigo 38.º, n.º 2, da LGT).
Apesar desta desconstrução, a análise dos elementos não pode ser estanque, pois, como realça Courinha, «a fixação de um elemento pode, na prática, depender de um outro», pelo que estes «não deixarão com frequência [...] de auxiliar-se mutuamente» ([11] ).
3.3.1. Elementos meio e intelectual
Como se referiu, o elemento meio, que diz respeito à via livremente escolhida pelo contribuinte para obter o desejado ganho ou vantagem fiscal. Como exige o n.º 2 do artigo 38.º, os meios relevantes para aplicação da cláusula geral antiabuso tem de ser qualificáveis como «artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas».
O elemento intelectual, que exige que a escolha daquele meio seja «essencial ou principalmente dirigid[a] [...] à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos» (artigo 38.º, n.º 2 da LGT), ou seja, que o contribuinte «pretende um acto, um negócio ou uma dada estrutura, apenas ou essencialmente, pelas prevalecentes vantagens fiscais que lhe proporcionam».
No caso em apreço, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que se verifica este elemento dizendo, em suma:
No caso em apreço o elemento meio está patente na celebração do contrato de compra e venda de 27 de dezembro de 2013, em que a sociedade A..., pelo preço de € 4.126.140,00, aliena os imóveis mencionados no ponto III.1.2. à sociedade I..., cuja constituição se concretizara no dia imediatamente anterior, mediante decisão tomada pelos órgãos sociais da J..., única detentora do seu capital social, e lavrada em ata uma semana antes.
Acresce ainda que o controlo quer do capital social quer dos órgãos de decisão nas três sociedades é pertença em conjunto de W... e X... .
Mais ainda se verificou que, pela análise dos movimentos bancários, o montante referente ao preço a pagar pela I..., tem a sua origem na própria alienante A..., conforme descrição no ponto III.1.5.
De salientar ainda que conforme referido no ponto III.1.2, apesar dos gerentes da J... W... e X... alegarem que a data de final de dezembro para a constituição da I... e a celebração do contrato de compra e venda entre esta sociedade e a A..., foi o reflexo de uma negociação que culminou nessa altura, constatou-se que na realidade entre a decisão de celebrar tais atos e a sua concretização decorreu um período muito curto, concluindo-se que a data escolhida para transferir a propriedade dos imóveis teve como objetivo evitar a caducidade da isenção e permitir o apuramento de um prejuízo fiscal elevado.
Esta conclusão alicerça-se no facto de existir um processo judicial em curso que impede a I... de iniciar a construção no curto prazo, bem como na falta de capacidade financeira da J... e da I... em proceder pelos seus próprios recursos, a tal aquisição.
Assim, estamos perante um conjunto de atos encadeados, configurando a efetiva vontade dos intervenientes, que se inicia com a deliberação dos órgãos societários da J..., culminando com a constituição da I... e com o contrato de compra e venda exatamente naquela data, com o propósito essencial de obtenção de vantagens fiscais por parte da A... .
A tese da Autoridade Tributária e Aduaneira tem como pressuposto a sua conclusão de que a gestão das três sociedades envolvidas, A..., I... e J..., era controlada conjuntamente pelos administradores/gerentes W..., X...:
Conclui-se que W... e X... têm, na prática, o controlo das sociedades A..., I... e J... por disporem do "poder de gerir as políticas financeiras e operacionais", sendo administradores/gestores e ainda detendo em conjunto por via direta e Indireta uma participação superior a 50% do capital social das entidades, possuindo o controlo societário.
(...)
W... e X..., utilizaram a sua influência, obtida através das suas participações diretas e indiretas conjuntas, na J..., para que esta se constituísse como a única sócia da I..., à qual foram vendidos os prédios que asseguraram deliberadamente de forma artificiosa, a obtenção de vantagens fiscais para a A... .
Neste pressuposto, invocado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, de que havia uma gestão comum dos interesses das sociedades pelos referidos W... e X..., afigura-se claro que a escolha para a venda do último dia do prazo de três anos findo o qual caducava a isenção provisória de que a A... beneficiava não é uma coincidência e que a venda nessa data teve como objectivo evitar que caducasse a isenção.
A prova testemunhal é no sentido de as partes no contrato terem estado a aguardar até essa data que fossem actualizadas as matrizes prediais em que foram reduzidos os valores patrimoniais, para serem menores os encargos de Imposto do Selo e IMT a pagar pela I..., e o facto de acabarem por celebrar o contrato quando ainda não tinha ocorrido essa esperada actualização revela que a única razão para a realização da venda nessa data, e não quando a actualização ocorresse, foi evitar que a isenção caducasse.
Por outro lado, não havia qualquer outra razão para apressar a transacção, pois, como bem diz a Autoridade Tributária e Aduaneira, a pendência da acção de duração imprevisível em que se discutia a volumetria de construção inviabilizava qualquer construção imediata.
Assim, a pressa em realizar a escritura sem sequer esperar pela actualização em baixa dos valores matriciais, que já era conhecida pela A..., obrigando a maior dispêndio momentâneo a título de Imposto do Selo e IMT por parte da I..., só pode ter com explicação a vontade concertada da J... e da A... de evitarem a caducidade da isenção.
Como diz a Autoridade Tributária e Aduaneira, noutro ponto do RIT, «não se vislumbra nem foi apresentada justificação razoável para a criação da I... e transmissão dos bens naquele preciso momento e não posteriormente quando efetivamente pudesse iniciar a construção do empreendimento».
É também claro, à face das regras da experiência comum, que, havendo uma gestão concertada dos interesses das sociedades envolvidas, por via dos poderes de administração de W... e X..., a criação pela J... da I..., no dia anterior ao da caducidade da isenção de que beneficiara a A..., visou criar as condições para evitar a caducidade da isenção.
Esta conclusão permite considerar verificado o elemento intelectual, pois a realização da venda efectuada pela A... à I... foi efectuada, no momento em que o foi, com o objectivo primacial de obter a eliminação do IMT que a A... teria de pagar na sequência da caducidade da isenção.
No entanto, para aplicação da cláusula geral antiabuso não basta que a realização de um negócio vise primacialmente objectivos fiscais, pois é imprescindível, no âmbito do elemento meio, que sejam utilizados «meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas».
Como se referiu, o elemento meio, que diz respeito à via livremente escolhida pelo contribuinte para obter o desejado ganho ou vantagem fiscal. Como exige o n.º 2 do artigo 38.º, os meios relevantes para aplicação da cláusula geral antiabuso tem de ser qualificáveis como «artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas».
No caso em apreço, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que se verifica este elemento meio dizendo, em suma:
No caso em apreço o elemento meio está patente na celebração do contrato de compra e venda de 27 de dezembro de 2013, em que a sociedade A..., pelo preço de € 4.126.140,00, aliena os imóveis mencionados no ponto III.1.2. à sociedade I..., cuja constituição se concretizara no dia imediatamente anterior, mediante decisão tomada pelos órgãos sociais da J..., única detentora do seu capital social, e lavrada em ata uma semana antes.
Acresce ainda que o controlo quer do capital social quer dos órgãos de decisão nas três sociedades é pertença em conjunto de W... e X... .
Mais ainda se verificou que, pela análise dos movimentos bancários, o montante referente ao preço a pagar pela I..., tem a sua origem na própria alienante A..., conforme descrição no ponto III.1.5.
De salientar ainda que conforme referido no ponto III.1.2, apesar dos gerentes da J..., W... e X... alegarem que a data de final de dezembro para a constituição da I... e a celebração do contrato de compra e venda entre esta sociedade e a A..., foi o reflexo de uma negociação que culminou nessa altura, constatou-se que na realidade entre a decisão de celebrar tais atos e a sua concretização decorreu um período muito curto, concluindo-se que a data escolhida para transferir a propriedade dos imóveis teve como objetivo evitar a caducidade da isenção e permitir o apuramento de um prejuízo fiscal elevado.
Esta conclusão alicerça-se no facto de existir um processo judicial em curso que impede a I... de iniciar a construção no curto prazo, bem como na falta de capacidade financeira da J... e da I... em proceder pelos seus próprios recursos, a tal aquisição.
Assim, estamos perante um conjunto de atos encadeados, configurando a efetiva vontade dos intervenientes, que se inicia com a deliberação dos órgãos societários da J..., culminando com a constituição da I... e com o contrato de compra e venda exatamente naquela data, com o propósito essencial de obtenção de vantagens fiscais por parte da A... .
Uma actuação dos sujeitos passivos que beneficiam de uma isenção temporária no sentido de evitarem que ela caduque não é, decerto, uma actuação censurável, antes é a conduta expectável em termos de boa gestão empresarial e que é mesmo implicitamente desejada e incentivada pela lei, ao fixar o prazo de caducidade da isenção.
Na verdade, são «benefícios fiscais as medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem» (artigo 2.º, n.º 1, do Estatuto dos Benefícios Fiscais EBF).
Neste caso, tratando-se de uma isenção (e não situação de não sujeição), há que partir do pressuposto de que legislativamente se pretendeu atingir fins extrafiscais considerados superiores aos da tributação.
No caso em apreço, como aventa a Requerente, afigura-se que o objectivo último da isenção é evitar que ocorra uma excessiva oneração do preço dos imóveis, derivada de dupla oneração com a tributação em IMT, num período curto.
Na verdade, a ser pago IMT pela empresa comercializadora de imóveis, o imposto será um gasto da sua actividade, que naturalmente se reflectirá no preço de venda aos seus clientes, que assim, se veriam, na prática, duplamente onerados com pagamento de IMT, um incorporado no preço de venda dos imóveis e outro o pagamento normal de IMT por adquirente que não goza de isenção. Por sua vez, a caducidade ao fim de três terá subjacente o entendimento legislativo de que é o prazo suficiente para a comercialização, findo o qual se presumirá que não foi adquirido como mercadoria, mas sim como propriedade de investimento.
De qualquer modo, o estabelecimento da caducidade da isenção ao fim de três anos tem necessariamente subjacente uma preferência legislativa de que os contribuintes procedam à venda dentro desse prazo, para, assim, ficar satisfeito o interesse público extrafiscal necessariamente visado com a isenção, considerado mais relevante que a tributação.
O que significa que, quando estão a criar as condições para que a isenção subsista, os contribuintes não estão, em princípio, a actuar contra legem ou extra legem, mas sim intra legem, isto é, estão a agir para que se concretize o fim extrafiscal, seja qual for, que na perspectiva legislativa justifica a isenção.
E, obviamente, sendo fixado um prazo legal para caducidade da isenção, é indiferente, na perspectiva legislativa, que o contribuinte proceda à venda em qualquer dia desse prazo, inclusivamente no último, para estar a actuar em sintonia com a lei.
Por outro lado, afigura-se que não tem necessariamente natureza artificiosa ou fraudulenta, no âmbito de sociedades relacionadas e com gestão concertada (como no caso em apreço a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu existir com a gestão de W... e X...), a especialização de actividades entre elas e, designadamente, que uma sociedade que pretende concretizar um projecto que envolve riscos consideráveis opte por autonomizar uma parte do seu património, para «isolar o risco associado à concretização do projeto», isto é, evitar que os possíveis efeitos negativos do projecto afectem a estabilidade da empresa que o pretende implementar.
Foi isso, afinal, o que sucedeu com a J..., ao criar a I..., como sociedade unipessoal de que era a única sócia, segundo o seu administrador X... informou a Autoridade Tributária e Aduaneira:
Conforme as declarações prestadas por X..., na qualidade de gerente da I..., em 16 de julho de 2015 e transcritas no ponto III.1.1., o declarante afirma que o objetivo é de isolar o risco associado à concretização do projeto. Apresentando, deste modo, uma justificação puramente empresarial, querendo com isto dizer que a concretização do empreendimento envolve riscos financeiros associados aos seus elevados custos de construção que poderiam pôr em causa a estabilidade patrimonial da J... .
O obstáculo à aceitação desta justificação invocado no Relatório da Inspecção Tributária é o de que «tal justificação não se afigura suficiente uma vez que a existência do processo judicial em curso impede, mesmo até à presente data, a prossecução de tais desígnios, ou seja, o início da construção do empreendimento. Situação que era do conhecimento das duas sociedades intervenientes no negócio».
No entanto, o facto de a construção não poder iniciar-se de imediato, por estar pendente a acção, não afecta a razoabilidade da decisão da J... de criação da I..., como acto de prudente gestão empresarial, ao autonomizar um património, através de uma sociedade de responsabilidade limitada, para adquirir e levar a cabo a construção nos terrenos de que poderiam provir riscos para a estabilidade da J... .
Como também se afigura decisão de normal gestão empresarial, sob a mesma perspectiva de optimização da gestão empresarial dos interesses comuns das sociedades referidas, que, perante a constatação de que a A... não conseguia vender os terrenos pelos preços que pretendia dentro do prazo de caducidade da isenção, a J... criasse uma sociedade para os adquirir, antes que a caducidade ocorresse, e levar a cabo a construção, o que, para além de satisfazer o interesse patrimonial da A... quanto à isenção, se harmoniza com a satisfação do interesse público extrafiscal subjacente, que legislativamente se considera satisfeito com manutenção da isenção e não com a sua caducidade.
Assim, afigura-se que estes actos de gestão só poderão integrar o elemento meio da cláusula geral antiabuso se se detectar algum artifício ou desígnio fraudulento, designadamente por não corresponderem à realidade, por um lado, a anunciada declaração da A... de que adquirira os prédios para revenda ou, por outro lado, a proclamada intenção de a I... levar a cabo construção dos terrenos.
Na verdade, não havendo qualquer restrição legal quanto às caraterísticas do comprador para efeitos de caducidade da isenção, designadamente não sendo afastada a relevância de vendas a entidades relacionadas, a realização da venda a uma sociedade do mesmo grupo criada propositadamente para adquirir os terrenos para construção antes que caducasse a isenção afigura-se caber dentro do âmbito do planeamento fiscal legítimo, desde que a intenção de construção pela sociedade adquirente corresponda à realidade, isto é, desde que esta não seja «um mero recetáculo da propriedade» criado par obter fins fiscais, como considerou a Autoridade Tributária e Aduaneira no ponto VI.4.2. do RIT.
No que concerne à intenção da A... adquirir os terrenos para revenda, não há razão para duvidar, já que a própria Autoridade Tributária e Aduaneira afirma no ponto «II.3.4.1.3. Atividade efetivamente exercida» que ela «exerce a atividade de revenda de imóveis, extraindo-se tal evidência da análise dos seguintes documentos e da forma como os mesmos foram relevados na contabilidade...». Por isso, é de presumir que os terrenos foram adquiridos para essa única actividade que se provou ser efectivamente exercida.
Por outro lado, a testemunha OO... afirmou que, em Setembro de 2013, foi proposta à empresa NN... a aquisição dos terrenos, não se tendo concretizado a transacção, essencialmente por o preço ter sido considerado excessivo, para a localização dos terrenos.
Por isso, não há qualquer razão para duvidar da afirmação da A... de que adquiriu os terrenos para venda, tentou vendê-los e só não os vendeu antes do momento em que os vendeu porque não conseguiu.
Assim, só se a intenção de construção pela I... não corresponder à realidade se poderá afirmar que a criação desta e subsequente aquisição dos terrenos serão um meio artificioso ou fraudulento para evitar a caducidade da isenção.
Mas, a prova produzida aponta no sentido de ser real a opção da J... pela construção nos lotes, perante a inviabilidade de a A... os vender.
Na verdade, desde logo, a posição da Autoridade Tributária e Aduaneira enferma de erro sobre os pressupostos de facto ao entender que
... desde que a I... se tornou proprietária dos imóveis não se comprovou ter efetuado diligências para o desenvolvimento do projeto, mesmo as mais elementares e básicas, designadamente Junto do Município F..., tomar as medidas necessárias ao averbamento do seu nome como proprietário no alvará de loteamento n.º .../2006, tal se concluindo da informação prestada pelo próprio Município que nos informou que a última alteração ao alvará teve lugar em 25 de setembro de 2012.
Com efeito, resulta da prova produzida que, em 17-07-2015, a I... solicitou à Câmara F..., o averbamento do Processo .../00 em seu nome (Documento n.º 17 junto com o pedido de pronúncia arbitral) e esse pedido foi deferido com a data de 20-08-2015 (Documento n.º 18 junto com o pedido de pronúncia arbitral).
Esse processo 973/00 reporta-se ao loteamento para que foi emitido o alvará .../2006 a que se refere a Autoridade Tributária e Aduaneira (como se confirma pela sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que consta do documento n.º 19).
Poderá ter havido algum equívoco na informação a que alude a Autoridade Tributária e Aduaneira por se fazer referência ao alvará e não ao processo em que ele foi emitido, mas o que resulta da prova produzida é que o processo em que foi emitido esse alvará foi averbado em nome da I... .
Consequentemente, enferma de erro sobre os pressupostos de facto o juízo que a Autoridade Tributária e Aduaneira fez com base na referida informação no sentido de a I... não ter sequer efectuado uma diligência para suceder na titularidade dos direitos da A... relativamente ao referido loteamento.
E é esse errado juízo que está subjacente à conclusão formulada pela Autoridade Tributária e Aduaneira de a I... ser «um mero recetáculo da propriedade dos imóveis transmitidos», que invocou para aplicar a cláusula geral antiabuso.
Por outro lado, a pendência da acção no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada em que se discutia a volumetria dos edifícios a construir nos terrenos justifica perfeitamente a inércia da I... (com a alteração da sua designação para L..., Unipessoal, Lda, a partir de 05-08-2016) em fazer outras diligências para concretizar as construções, designadamente encomendar projectos. De qualquer forma, a prova produzida é no sentido de a I... durante a pendência da acção não ter uma inércia completa, pois tratava da limpeza e manutenção dos terrenos, como referiu a testemunha G... .
Por isso, não se pode ver nessa inércia da I... até ao início do ano de 2017, em que foi decidida a acção, um indício de que a I... seria um «mero receptáculo da propriedade» dos terrenos (como aventa a Autoridade Tributária e Aduaneira) e não uma verdadeira proprietária que os destinava a construção.
A confirmação de que a aquisição se destinou mesmo a construção pela I... (com as alterações de designação posteriores para L... e K...) foi abundantemente feita no presente processo, com prática de uma série de actos com esse fim:
– em Março de 2017, a planta síntese do loteamento já se encontrava averbada em nome da L..., Unipessoal, Lda. (nova designação da I...);
– ainda no ano de 2017, a L..., solicitou à M... a indicação de quais os trabalhos a realizar para preparar os terrenos, tendo este enviado uma carta com a descrição dos trabalhos a realizar, que foram efectivamente realizados durante o ano de 2017;
– por volta de finais de 2017, a sociedade K... (nova designação da I...) contratou a testemunha Arquitecto PP... para desenvolver projectos dos edifícios a construir nos terrenos referidos no autos, quer de engenharia quer de arquitectura;
– em finais de 2017, já estavam feitos projectos de engenharia e foi feita uma proposta integrada com a arquitectura, que foi adjudicada à testemunha Arquitecto PP... e a professores do Instituto Superior Técnico;
– nessa ocasião, o terreno foi limpo e vedado, consolidadas as estruturas e feito um levantamento topográfico;
– no início de 2019, a L..., Unipessoal, Lda iniciou o processo de construção dos prédios nos terrenos em causa, tendo solicitado diversos orçamentos de arquitetura e das especialidades e tendo obtido propostas de diversas empresas que pretendem prestar tais serviços;
– em 31-05-2019, a K..., Lda. requereu à Câmara F... alterações às especificações de alvará de licença de loteamento, relativas ao Processo .../00;
– em 28-06-2019, entregou diversos elementos para apreciação, relativas ao Processo .../00;
– a K... solicitou à S..., Lda., o levantamento topográfico dos terrenos, o que foi efectuado em Dezembro de 2019;
– em 15-05-2020, a K... efectuou comunicação prévia à Câmara F... de obras de construção na área abrangida pelo loteamento;
– em 27-05-2020, a K... procedeu à entrega de documentos na Câmara Municipal F... respeitantes à licença de edificação;
É, assim, inequívoco, à face da prova produzida, que a aquisição dos terrenos pela I... não se destinou apenas a transmitir formalmente para ela a propriedade dos terrenos (isto é, não se destinou a torná-la um «mero receptáculo da propriedade»), antes foi uma verdadeira aquisição com finalidade de levar a cabo construções por esta empresa nos terrenos adquiridos.
Neste contexto, não se pode considerar demostrado que a venda dos terrenos pela A... à I... tenha sido um meio artificioso ou fraudulento de evitar a caducidade a isenção, embora esse objectivo também tenha sido visado.
Como diz a Requerente, «a I..., Unipessoal, Lda. praticou inúmeros atos e condutas que evidenciam, sem sombra de dúvida, a sua qualidade de proprietária efetiva e real dos imóveis», não sendo apenas um veículo para que a A... não pagasse IMT.
Por isso, a aplicação da cláusula geral antiabuso sem que se verifiquem estes requisitos previstos no artigo 38.º, n.º 2 da LGT, que integram o elemento meio, enferma de erro sobre os pressupostos de facto e de direito.
Por outro lado, ao considerar a Autoridade Tributária e Aduaneira como pressuposto relevante da aplicação da cláusula geral antiabuso a falsa informação de que, quando foi elaborado o RIT, o processo de loteamento ainda não estava averbado em nome da I..., a decisão de aplicação enferma de erro sobre os pressupostos de facto.
3.4. Decisão da reclamação graciosa
A reclamação graciosa confirmou a liquidação impugnada com a fundamentação utilizada no RIT, pelo que a sua decisão enferma dos mesmos vícios de violação do artigo 38.º, n.º 2, da LGT e de erro sobre os pressupostos de facto, pelo que também se justifica a sua anulação.
.
3.5. Questões de conhecimento prejudicado
Como se referiu, os requisitos de aplicação da cláusula geral antiabuso que se indicaram são cumulativos, pelo que a não verificação de uns dos elementos indicados, inviabiliza essa aplicação.
Os vícios decorrentes da fala de preenchimento do elemento meio e de erro sobre os pressupostos de facto justificam a anulação da decisão de aplicação da cláusula geral antiabuso e da consequente liquidação de IMT, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.
Sendo a falta de preenchimento do elemento meio um vício que obsta à renovação da liquidação, fica prejudicado, por ser inútil (artigos 130.º e 608.º, n.º 2, do CPC), o conhecimento dos restantes vícios que são imputados pela Requerente à liquidação impugnada.
Na verdade, o artigo 124.º do CPPT, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, do RJAT, ao estabelecer uma ordem de conhecimento de vícios, pressupõe que, julgado procedente um vício que assegura a eficaz tutela dos direitos dos impugnantes, não é necessário conhecer dos restantes, pois, se fosse sempre necessário apreciar todos os vícios imputados ao acto impugnado, seria indiferente a ordem do seu conhecimento.
Pelo exposto, não se toma conhecimento dos restantes vícios imputados pela Requerente.
4. Decisão
De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
b) Anular a liquidação de IMT no valor de € 533.000,00 referida na alínea WW) da matéria de facto fixada;
c) Anular a decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º ...2019....
5. Valor do processo
De harmonia com o disposto nos artigos 296.º, n.º 2, e 306.º do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 543.514,00, indicado pela Requerente, sem oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira.
6. Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 8.262,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 14-06-2021
Os Árbitros
(Jorge Lopes de Sousa)
(Ricardo Marques Candeias)
(Mariana Vargas)
DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. Ricardo Marques Candeias e Dra. Mariana Vargas (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do CAAD, para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 07-12-2020, acordam no seguinte:
1. A..., LDA., NIPC..., com sede na Rua ..., n.º ..., ..., ...-... Lisboa (doravante “Requerente” ou «A... »), veio, nos termos do disposto no artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), requerer a constituição de Tribunal Arbitral, tendo em vista a declaração de nulidade ou anulação da liquidação adicional de IMT referente ao ano de 2010 de 533.000,00 €, e dos respetivos juros compensatórios, de 10.514,00 €, bem como da decisão da reclamação graciosa com o n.º ...2019... de que aquela foi objecto.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 14-09-2020.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitros os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 04-11-2020, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 07-12-2020.
A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.
Em 04-05-2021, realizou-se uma reunião em que foi produzida prova testemunhal e decidido que o processo prosseguisse com alegações.
As Partes apresentaram alegações.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e é competente.
As Partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos:
A) A Requerente é uma sociedade cujo objeto social consiste em “O exercício da indústria imobiliária e turística, designadamente aquisição, construção, exploração, venda e revenda de imóveis e de empreendimentos turísticos, compra e venda de materiais de construção, elaboração de estudos e projetos, comércio de comissões e representações agenciamento comercial, importação e exportação, consultadoria técnica e comercial, assessoria de gestão empresarial e prestação de serviços conexos” (Documento n.º 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido )
B) Em 27 de Dezembro de 2010, a sociedade B..., S.A. vendeu à Requerente um conjunto de terrenos para construção, sitos na ... Rua ..., em ..., conforme resulta da escritura de compra e venda, que consta do documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido:
C) Os imóveis foram adquiridos para revenda, tal como consta da escritura, razão pela qual a liquidação de IMT foi de zero, tendo sido pago Imposto do Selo no montante de 65.600 €;
D) Já antes dos imóveis serem adquiridos, pendia no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, sob o n.º .../08...BEALM, a ação administrativa especial proposta pela C..., D... e E... contra o Município F..., com vista à declaração de nulidade do ato que aprovou o estudo de loteamento, que no âmbito do processo camarário nº..., outorgaram à B..., SA, indicada como Contrainteressada, a licença de loteamento e a licença de obras de urbanização tituladas pelo alvará de loteamento nº .../2006, de 2 de fevereiro de 2006 (documento n.º 19 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
E) Nesta acção a B..., S.A., na qualidade de proprietária à data, era contrainteressada (documento n.º 19);
F) A discussão nesta acção administrativa especial reportava-se aos termos em que poderiam ser edificadas construções naqueles terrenos, nomeadamente quanto à dimensão dos imóveis a edificar, ou seja, qual a altura máxima que poderiam ter (documento n.º 19);
G) Aquando da compra dos lotes de terreno pela Requerente, existiam tentativas de terminar a acção administrativa, concretamente propostas por parte dos autores, no sentido de acordar uma transação através da qual os prédios a construir seriam com menos andares (depoimentos das testemunhas G... e H...);
H) Esta informação foi transmitida à Requerente pelo seu advogado, que acompanhava a acção (depoimento da testemunha H...);
I) A Requerente aceitava o acordo nos termos projectados (depoimento da testemunha H...);
J) A Requerente, quando adquiriu os terrenos, sabia que havia a acção pendente, mas estava convencida de que a acção seria resolvida por acordo, com diminuição da capacidade construtiva, mas, depois, em 2011, apurou-se que isso não se iria verificar, por a Câmara Municipal F... ter decidido deixar prosseguir a acção até ao final, para não ter de se contradizer (depoimentos das testemunhas G... e H...);
K) Ulteriormente à data da aquisição por parte da Requerente, e por impossibilidade de entendimento dos autores com o Município F..., e não com a Requerente, as conversações não obtiveram o esperado resultado e a acção prosseguiu os seus termos, vindo a ser julgada improcedente por sentença de 27-01-2017 (documento n.º 19);
L) A Requerente, durante o período em que foi proprietária dos imóveis, tentou proceder à sua venda, pois era essa a sua actividade, como fez em todos os outros activos que tinha (depoimento da testemunha G...);
M) Num período subsequente à aquisição dos prédios pela Requerente havia uma crise do país, principalmente do ramo imobiliário, o que provocou desvalorização do activos e dificuldade em arranjar interessados que oferecessem valores adequados (depoimentos das testemunhas G... e H...);
N) Em 31 de Outubro de 2013, a Requerente requereu à AT uma avaliação dos identificados prédios, com fundamento na retificação de áreas, tendo o VPT dos imóveis sido fixado em € 4.126.140, com efeitos à data em que foi realizado o pedido (Documento n.º 10 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
O) A I..., Unipessoal, Lda. (doravante «I... ») foi constituída a 26 de Dezembro de 2013, com o seguinte objeto social: “Construção de edifícios residenciais e não residenciais, compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim e gestão, administração e arrendamento de bens imóveis.” (Documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido) ;
P) A I... tem uma única sócia, a sociedade J..., Lda. (doravante «J... »);
Q) No dia 27 de Dezembro de 2013, os identificados imóveis foram vendidos à sociedade I..., sendo os preços e os valores patrimoniais tributários os seguintes:
(documento n.º 12 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
R) Em Maio de 2013, foi feita uma avaliação dos terrenos, a pedido da Requerente, para apurar o valor actualizado dos terrenos (Documento n.º 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e depoimentos das testemunhas G... e H...);
S) A avaliação referida na alínea anterior foi efectuada por uma empresa certificada pela CMVM, que atribuiu os lotes, naquela data, era de 3.051.330 € (Documento n.º 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e depoimentos das testemunhas G... e H...);
T) Os valores de venda dos terrenos foram os possíveis na situação de crise, tendo sido fixados tendo em conta a avaliação particular referida e uma avaliação fiscal para fixação de valores matriciais que a Requerente pediu, de que resultava uma desvalorização considerável dos valores anteriores, comum a outros imóveis da Requerente (depoimentos das testemunhas G... e H...);
U) A Requerente tinha dificuldade em manter a situação em que se encontravam os terrenos, não tendo condições para suportar os encargos fiscais (mais de € 1000.000 por ano de IMI) e a manutenção dos terrenos, correndo o risco de ficar numa situação muito deficitária, por o mercado imobiliário estar parado e o valor dos imóveis a descer e não conseguir transaccionar os outros imóveis que tinha no activo, pelo que alguma coisa tinha de ser feita rapidamente para poder prosseguir a sua actividade (depoimentos das testemunhas G... e H...);
V) O valor patrimonial tributário à data da escritura correspondeu, precisamente, ao preço que foi acordado entre a Requerente e a I..., Unipessoal, Lda. (depoimento da testemunha G...);
W) O valor da avaliação de fixação de valores patrimoniais, superior ao da avaliação particular, era o valor mínimo a contratar, por força das presunções legais, não sendo fixado um preço superior, por a avaliação particular efectuada ter atribuído aos terrenos um valor ainda inferior ao valor patrimonial tributário (depoimentos das testemunhas G... e H...);
X) As dúvidas existentes sobre a capacidade construtiva dos terrenos, em virtude da acção que se encontrava pendente, influenciaram negativamente o valor dos imóveis; (depoimento da testemunha G...);
Y) Em 2019, na sequência da inspecção tributária, a Requerente pediu à I... (cuja denominação passara a ser K...) os elementos para a sua defesa (depoimento da testemunha G...);
Z) Vivia-se uma situação de profunda crise, em 2013, no sector imobiliário em que todas as empresas sofreram desvalorizações de activos e tinham dificuldades em vender (depoimentos das testemunhas G... e H...);
AA) A I..., Unipessoal, Lda., alterou a sua designação para L..., Unipessoal, Lda, a partir de 05-08-2016, e para K..., Lda., a partir de 27-03-2019;
BB) Em 24-01-2014, a I..., Unipessoal, Lda. requereu ao Serviço de Finanças de..., a devolução parcial do IMT e do IS, relativamente à aquisição que efetuou em 27-12-2013, por o valor patrimonial tributário ter vindo a ser fixado em 4.126.140 €, com efeitos reportados a 31-10-2013, e ser inferior ao que foi considerado na escritura, de 5.502.890,19 €, que serviu de base ao pagamento daqueles impostos (Documento n.º 15 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
CC) Em 13-03-2014, a I..., Unipessoal, Lda. foi notificada do deferimento da sua pretensão, sendo considerado que o VPT na data da escritura ascendia a € 4.126.140 (Documento n.º 16, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
DD) Na posse dos terrenos, a I... só tratava da sua limpeza e manutenção, pois enquanto a acção estava pendente era difícil fazer mais alguma coisa (depoimento da testemunha G...);
EE) Em 17-07-2015, a I..., Unipessoal, Lda. solicitou à Câmara F..., o averbamento do Processo .../00 em seu nome (Documento n.º 17, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
FF) Com data de 20-08-2015, o Município F... notificou a I..., Unipessoal, Lda. do deferimento do averbamento do projeto em seu nome (Documento n.º 18 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
GG) Depois deste deferimento e até Janeiro de 2017, a I..., Unipessoal, Lda. não fez qualquer investimento nos imóveis que adquiriu, uma vez que estava a aguardar o desfecho da acção administrativa supra identificada (depoimentos das testemunhas G... e H...);
HH) Em 27-01-2017, foi proferida sentença na acção em causa, julgando improcedente, por não provada, tendo o Réu e a contrainteressada sido absolvidos do pedido (Documento n.º 19 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
II) Depois da decisão da acção, a I... passou a executar o projecto que já tinha para os terrenos (depoimento da testemunha G...);
JJ) Em Março de 2017, a planta síntese do loteamento já se encontrava averbada em nome da L..., Unipessoal, Lda. (nova designação da I...) (Documento n.º 20 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
KK) A L..., Unipessoal, Lda. solicitou à M... a indicação de quais os trabalhos a realizar para preparar os terrenos, tendo este enviado uma carta com a descrição dos trabalhos a realizar (Documento n.º 21 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
LL) Os trabalhos referidos e ainda limpeza e vedação dos terrenos foram realizados em 2017 (Documentos n.º 22 a 25 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
MM) No início de 2019, a L..., Unipessoal, Lda iniciou o processo de construção dos prédios nos terrenos em causa, tendo solicitado diversos orçamentos de arquitetura e das especialidades e tendo obtido propostas de diversas empresas que pretendem prestar tais serviços, designadamente:
• N... (Documento n.º 26 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
• O..., Lda. (Documento n.º 27 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
• P..., Lda. (Documento n.º 28 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
• Q..., Lda. (Documento n.º 29 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido );
• R..., S. A. (Documento n.º 30 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido)
NN) Em 31-05-2019, a K..., Lda. requereu à Câmara F... alterações às especificações de alvará de licença de loteamento, relativas ao Processo .../00 (documento n.º 31 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
OO) Com o objetivo de proceder à construção de imóveis nos terrenos em causa, a K..., Lda., em 28-06-2019, entregou diversos elementos para apreciação, relativas ao Processo .../00 (Documento n.º 32 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
PP) Com data de 26-11-2019, a K..., Lda. foi notificada de um ofício da Câmara Municipal F..., no qual concedia um prazo de 15 dias para que fossem prestados diversos esclarecimentos. (Documento n.º 33 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
QQ) A K..., Lda. solicitou à S..., Lda., o levantamento topográfico dos terrenos, o que foi efectuado em Dezembro de 2019 (documento n.º 34 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
RR) Em 11-02-2020, a K... recebeu notificação da Câmara F..., relativas às condições do pedido de licença do alvará de loteamento, (Documento n.º 35 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
SS) Em 15-05-2020, a K... efectuou comunicação prévia à Câmara F... de obras de construção na área abrangida pelo loteamento (Documento n.º 36 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
TT) Em 27-05-2020, a K... procedeu à entrega de documentos na Câmara Municipal F... respeitantes à licença de edificação (Documento n.º 37 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido) ;
UU) Em 03-08-2020, a K... foi notificada pela Câmara Municipal F... da Informação relativa ao pedido de obras de construção de edifício (Documento n.º 38 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
VV) A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma inspecção à Requerente em que foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária (RIT) que consta do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:
11.3.4. CARACTERIZAÇÃO DAS ENTIDADES ENVOLVIDAS
As entidades diretamente intervenientes no negócio jurídico objeto de análise no âmbito do presente procedimento de inspeção foram a A... que procedeu à alienação de diversos prédios urbanos à I..., com alvará de loteamento n.º.../2006 da Câmara Municipal F... .
Seguidamente procede-se à caracterização da A..., da I... e da J..., uma vez que esta entidade detém a totalidade do capital da I... e conforma será descrito nos pontos seguintes também participou no negócio objeto de análise no presente projeto de aplicação da CGAA.
II.3.4.1. A...- NIF ...
A A... foi constituída em 23 de dezembro 1992, sob a natureza jurídica de sociedade anónima, com um capital social de € 50.000,0o, dividido em 100.000 ações com o valor nominal de € 0,50. As ações representativas do capital social são nominativas.
O capital social veio a ser alterado através de sucessivos aumentos do capital, para € 100.000,00, € 350.000,00 e € 20.350.000,00, tendo o primeiro ocorrido no ano de 2009 e os restantes em 2011.
A natureza das ações representativas do capital, passaram em 2011 a ser nominativas ou ao portador e reciprocamente convertíveis, sendo constituído por um número de ações de 40.700.000, com o valor nominal de € 0,50, o que totaliza um capital social de € 20.350.000,00.
No que respeita ao ano de 2013, de acordo com o divulgado na declaração de Informação contabilística e fiscal (IES) e respetivo livro de Atas são acionistas as seguintes entidades:
> T..., S.A., NIF..., com uma quota de 48,39%, correspondendo ao montante de € 10.050.000,00 do capital social;
> U..., S.A., NIF..., com uma quota de 39,31%, correspondendo ao montante de € 8.000.000,00 do capital social;
> V..., S.A., NIF ... com uma quota de 9,83%, correspondendo ao montante de € 2.000.000,00 do capital social;
> W...(doravante denominado W...) NIF..., com uma quota de 0,25%, que corresponde ao montante de € 50.000,00 do capital social;
> X..., com uma quota de 1,23%, que corresponde ao montante de € 250.000,00 do capital social.
Quanto à estrutura da sua administração esta competia, aquando da sua constituição, a um conselho de administração composto por três a cinco membros, sendo que a sociedade ficava obrigada pelas assinaturas de dois administradores do conselho de administração ou da comissão executiva, ou pela assinatura do administrador delegado.
Em 18 de abril de 2007 procede a alterações ao seu contrato de sociedade nomeadamente quanto à forma de obrigar e os seus órgãos sociais. A forma de obrigar passa a ser a assinatura do Administrador Único ou, quando exista conselho de administração à assinatura de dois administradores, sendo uma delas obrigatoriamente a do Presidente. Para atos de mero expediente basta a assinatura de um dos administradores. A estrutura da administração passa a ser constituída por um Administrador único ou Conselho de administração composto por três membros. A duração dos mandatos é de quatro anos. Foi nomeado Administrador único W..., para o período 2007/2010.
Por deliberação de 30 de março de 2011 foi designado como Administrador Único, para o quadriénio de 2011/2014, H..., (doravante H...), NIF... . H... consta, no sistema informático da AT, desde 08/09/2011, como representante de X... e W..., uma vez que ambos têm domicílio fiscal em ..., n.º ... ..., Suíça.
Em deliberação de 25 de março de 2013 é nomeado, para o quadriénio 2011/2014, o conselho de administração composto por W..., como Presidente, e X... e H..., como Vogais.
Tem como objeto social o exercício da indústria imobiliária e turística, designadamente:
> Aquisição, construção, exploração, venda e revenda de imóveis e de empreendimentos turísticos,
> Compra e vencia de materiais de construção,
> Elaboração de estudos e projetos, comércio de comissões e representações agenciamento comercial,
> Importação e exportação,
> Consultadoria técnica e comercial,
> Assessoria de gestão empresarial,
> Prestação de serviços conexos.
II.3.4,1.1. Administração de Facto
Exercem a administração de facto, conforme se comprova pela escritura de compra e venda celebrada em 27 de dezembro de 2013, no Cartório Notarial sito na Rua... , número..., loja direita, em ...:
> W..., na qualidade de Presidente, e
> X..., na qualidade de vogal do conselho de administração da A... e ambos residentes em..., n.º..., ... ..., Suiça.
(...)
II.3.4.1.3. Atividade efetivamente exercida
Exerce a atividade de revenda de imóveis, extraindo-se tal evidência da análise dos seguintes documentos e da forma como os mesmos foram relevados na contabilidade:
(...)
II.3.4.2 I... - NIF ...
A I... foi constituída em 26 de dezembro 2013, sob a natureza jurídica de sociedade por quotas, com um capitai social de € 100.000,00, distribuído numa quota única, correspondente a 100%, sendo titular a sociedade J..., Lda, NIF ... . Tem como objeto social:
> Construção de edifícios residenciais e não residenciais,
> Compra e venda de Imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim e
> Gestão, administração e arrendamento de bens imóveis.
No que respeita à forma de obrigar a sociedade é necessária a intervenção conjunta de dois gerentes, tendo sido designados para o cargo:
> W... e
> X... .
A constituição da I... foi decidida, por unanimidade, em Assembleia Geral da sociedade J..., conforme as atas n.º 17 e 18 lavradas em 20 de dezembro de 2013, o que veio a ser concretizado seis dias depois em 28 de dezembro.
Junta-se no Anexo 3 - Cópia das Atas n.º 17 e 18, da J...
II.3.4.2.1. Gerência de Facto
Exercem a gerência de facto, conforme se comprova pela escritura de compra e venda celebrada em 27 de dezembro de 2013, supramencionada no Cartório Notarial sito na Rua ..., número..., loja direita, em ...:
> W..., e
> X...,
ambos, na qualidade de gerentes, com poderes para o ato e ambos residentes em ..., n.º ..., ... ..., Suiça.
(...)
II.3.4.2.3. Atividade efetivamente exercida
A única operação conhecida realizada pela I... foi a escritura de compra e venda celebrada no dia 27 de dezembro de 2013, no Cartório Notarial sito na Rua ..., número..., loja direita, em ..., perante a Notária Y..., em que a I... intervém na qualidade de adquirente de diversos terrenos para construção urbana, com o alvará de loteamento n.º .../2006 e a mesma declara que os imóveis adquiridos se destinam a construção.
De acordo com informações prestadas por X... na qualidade de gerente da I... a construção dos imóveis ainda não foi iniciada por se encontrar em curso um processo no TAF de Almada contra a Câmara Municipal F..., cujo objeto é a construção no loteamento acima mencionada.
(...)
II.3.4.3. J...- NIF ...
A J..., detentora da quota única do capital da I..., é uma sociedade por quotas que declarou início de atividade em 30/12/2003 e tem por objeto social,
> Promoção e construção de empreendimentos imobiliários,
> Realização de investimentos,
> Gestão de imóveis próprios,
> Prestação de serviços em tais áreas das suas atividades, e
> Compra, comercialização e revenda de prédios adquiridos para esse fim.
No que respeita à forma de obrigar a sociedade é necessária a intervenção conjunta de dois gerentes, tendo sido designados para o cargo de gerentes:
> W... e
> X....
Os gerentes de direito são igualmente gerentes de facto como se comprova pelo livro de Atas em que compareceram na qualidade de gerentes.
(...)
De acordo com o Livro de Atas, a certidão permanente e com o divulgado na declaração de Informação contabilística e fiscal (IES), em 31 de dezembro de 2013, a sociedade tem um capital social de € 3.300.000,00, distribuído pelos seguintes sócios:
> Z..., Lda., NIF ... com uma quota de 27,27% correspondendo ao montante de € 900.000,00 do capital social;
> X... com uma quota de 18,18%, correspondendo ao montante de € 600.000,00 do capital social;
> B... S.A., NIF..., com uma quota de 16,18% correspondendo ao montante de € 600.000,00 do capital social;
> AA..., S.A., NIF ... com uma quota de 18,18%, correspondendo ao montante de € 600.000,00 do capital social;
> A..., S.A., com uma quota de 9,09%, correspondendo ao montante de € 300.000,00 do capital social;
> CC..., Lda., NIF..., com uma quota de 9,09%. correspondendo ao montante de € 300.000,00 do capital social;
II.3.4,3.1. Atividade efetivamente exercida
De acordo com esclarecimentos prestados por W... e X..., ambos na qualidade de gerentes da J..., a atividade efetivamente exercida por esta entidade respeita na sua maioria ao arrendamento dos seus imóveis.
(...)
II.3.5. RELAÇÕES ENTRE OS INTERVENIENTES À DATA DA ESCRITURA DE 27/12/2013
Seguidamente irá demonstrar-se que a A..., a I... e ainda a J... se encontram relacionadas direta ou indiretamente.
Ora, face ao exposto nos pontos anteriores comprova-se que W... e X..., detêm em todas as sociedades o controlo das decisões tomadas, uma vez que ambos são administradores/gerentes das mesmas. Por outro lado e conforme a seguir se detalha ambos individualmente ou em conjunto detêm direta ou indiretamente participações majoritárias nas 3 entidades.
Assim, as decisões que ambos tornam enquanto gerentes/administradores interessam-lhes igualmente enquanto sócios/acionistas, dado que são diretamente beneficiários da distribuição de lucros/dividendos resultantes dessas decisões.
Vejamos detalhadamente cada uma das três sociedades mencionadas.
No caso da A... constata-se que têm o poder de decisão, como Presidente e Vogal do conselho de Administração, respetivamente W... e X... e que o capital se encontra distribuído pelas participações e entidades seguidamente discriminadas:
Coligidos os elementos disponíveis e que se apresentam nos quatro quadros seguintes, relativamente aos acionistas da A..., nomeadamente, os extraídos do Livro de Registo de Atas, do Registo da Conservatória e da Declaração de informação Contabilística e Fiscal (IES), podemos verificar que W... além da quota direta de 0,25%, no capital da A..., detém uma participação indireta de 97,71%, cuja determinação a seguir se descreve, o que totaliza uma participação efetiva de 97,96%.
Refira-se desde já que a participação indireta de W... no capital da A... advém da sua participação na T..., S.A. (doravante T...), e da participação desta sociedade na BB..., S.L., que por sua vez participa no capital de U..., S.A. e V.... S.A., as quais participam no capital social da A... . De salientar que W... detém o poder decisório dessas 3 entidades, pois em todas faz parte do Conselho de Administração quer como Presidente do Conselho de Administração, quer como Vogal, ou na ausência de tal órgão como Administrador Único.
De acordo com o n.º 6 do artigo 69 do Código do IRC "Quando a participação é detida de forma indireta, a percentagem de participação efetiva é obtida pelo processo de multiplicação sucessiva das percentagens de participação em cada um dos níveis e, havendo participações numa sociedade detidas de forma direta e Indireta, a percentagem de participação efetiva resulta da soma das percentagens das participações."
Assim e atendendo apenas ao supracitado artigo verifica-se que:
> W... ao ser detentor de uma quota de 85% na T... que por sua vez detém uma participação de 49,39% da A..., detém uma participação indireta de 41,98% (55% * 49,39%), nesta última;
> Por outro lado a T... detém 32% na BB..., S.L. que por sua vez detém 100% da U..., SA a qual detém 39,31% da A..., o que traduz uma participação indireta de W... no capital da A... de 10,69% (85% * 32% * 39,31%).
> Por último a U..., SA, detém 100% da V... que por sua vez detém 9,63% da A..., o que traduz uma participação Indireta de W... no capital da A... de 2,67% (85% * 32% * 9,83%).
Porém além das participações diretas e indiretas detidas por W... na A..., que lhe permitem desde logo ter o controlo societário, há que considerar que entre as sociedades anteriormente referidas existem participações cruzadas e ações próprias, sendo que com estas W... detém a quase totalidade do capital da A..., mais concretamente 97,98%.
Verifica-se igualmente que X... é titular direto de uma quota de 1,23% do capital social de A... o que considerando as participações cruzadas e ações próprias entre as sociedades supra mencionadas totaliza uma participação efetiva de 2,04%, Detém ainda o cargo de Vogal nos Conselhos de Administração da A... e da V..., S.A.
Conclui-se portanto que W... e X... em conjunto detêm a totalidade do capital social da A... .
Refira-se que as percentagens de participação efetiva de W... e X... na A..., de 97,96% e de 2,04%, respetivamente, foram determinadas pela utilização do cálculo Matricial através da aplicação da seguinte fórmula, com recurso a ferramentas informáticas (Microsoft Excel):
Assim se constata que W... e X... controlam a A..., quer por participações diretas ou indiretas no seu capital social, quer por serem titulares de posições na Administração da sociedade que lhes permitem controlar as decisões tomadas.
No que concerne à sociedade I..., como já anteriormente se mencionou e se esquematiza no quadro seguinte, esta tem o seu capital distribuído numa quota única de que é titular a J... .
A gerência é exercida por W... e X... tanto na I... como na J..., o que demonstra que ambos conduzem os destinos de ambas as sociedades.
Quanto à distribuição do capital social da J..., o mesmo está distribuído conforme discriminado no quadro 15. De igual forma se descreve a distribuição do capital social das sociedades Z..., Lda e CC..., Lda, por tal se verificar necessário a fim de demonstrar que W... e X... detém o controlo societário da J..., porque em conjunto dispõem de forma direta e indireta de uma quota superior a 50% do capital da mesma.
Em face dos três quadros supramencionados constata-se que:
> A sociedade Z..., Lda., tem o seu capital de € 5.000,00, dividida em duas quotas de 50% cada, uma propriedade de W... e outra detida por DD..., NIF..., casada sob o regime de comunhão de adquiridos com W... . A gerência está a cargo de W..., sendo que a sociedade se obriga com a intervenção de um gerente.
Refira-se que o parágrafo 8.º da NCRF 5 - Divulgações de Partes Relacionadas - dispõe que sendo o cônjuge membro íntimo da família do indivíduo espera-se que esta seja influenciada pelo indivíduo nos negócios com a entidade. Pode, então, concluir-se que W... detém o controlo societário da Z... pois à sua participação direta junta-se a influência que exerce sobre a outra quota por via da sua relação conjugal com a proprietária da mesma.
> A sociedade CC..., Lda., com um capital social de € 3.000,00, dividido em quatro quotas e distribuído em três quotas de 30%, detidas por EE..., FF..., GG... e uma quota de 10% detida por HH..., sendo que os primeiros três são filhos de X... e a última sua cônjuge, de quem se encontra separado judicialmente de pessoas e bens.
A gerência está a cargo de X..., sendo que a sociedade se obriga com a intervenção de um gerente.
No que respeita à sociedade CC..., considera-se que sendo os acionistas seus descendentes e sua cônjuge, ao abrigo do citado parágrafo 8.º da NCFR 5, X... detém igualmente o controlo acionista por serem os detentores diretos do capital membros íntimos da sua família.
Assim, X... detém, na J..., uma participação direta de 18,18% e indireta de 9,09% (via CC...), enquanto W... tem uma participação indireta de 27,27% (via Z...), o que perfaz em conjunto um total de 54,54%, deste modo confirma-se que em conjunto além do controlo dos órgãos de gestão também detêm o controlo societário da J....
Acresce ainda que sendo a A..., sócia da J..., com uma quota de € 9,09% do capital se verifica a existência de mais um fator de influência dado que, entre ambos, detêm o controlo acionista da A... e consequentemente, acabam por controlar a participação desta entidade na J..., ou seja no total em conjunto controlam 63,63% da J... .
Considerando que, conforme as definições constantes das Normas Contabilísticas e de Relato Financeiro (NCRF) 5 e 13, publicadas pelo Aviso n.º 15 655/2009, D.R. n.º 173, Séria II de 2009-09-07 definem
Controlo como "o poder de gerir as políticas financeiras e operacionais de uma entidade ou de uma atividade económica a fim de obter benefícios da mesma",
Conclui-se que W... e X... têm, na prática, o controlo das sociedades A..., I... e J... por disporem do "poder de gerir as políticas financeiras e operacionais", sendo administradores/gestores e ainda detendo em conjunto por via direta e Indireta uma participação superior a 50% do capital social das entidades, possuindo o controlo societário.
(...)
III. ANÁLISE DE FACTO DOS ATOS JURÍDICOS
III.1. DESCRIÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO CELEBRADO
Em 26/12/2013 foi constituída a sociedade I... com base numa deliberação constante na Ata n.º 17 da J... .
Em 27 de dezembro de 2013 entre a A... e a I... foi celebrado o contrato de compra e venda que transferiu a propriedade, da primeira para a segunda, de diversos terrenos com alvará de construção urbana n.º .../2006.
III.1.1. MOTIVO DA CONSTITUIÇÃO DA I...
Conforme descreve a ata n.º 17 da sociedade J... aos 20 de dezembro de 2013, estando presentes:
> III... em representação das sócias JJ... SGPS, SA e B..., SA;
> X..., por si próprio enquanto sócio e em representação da sócia CC..., Lda.;
> W... em representação da sócia Z..., Lda.;
> KK... em representação da sócia A...;
Deliberaram a autorizar a J... a constituir uma sociedade unipessoal por quotas, mandatando os gerentes (X... e W...) para a outorga da escritura de constituição da mesma.
Descreve a ata n.º 18 elaborada na mesma data, estando presentes:
> II... em representação das sócias JJ..., SGPS, SA e B..., SA;
> X..., por si própria enquanto sócio e em representação da sócia CC..., Lda.;
> W... em representação da sócia Z..., Lda.;
> X... e W... em conjunto representam a sócia A... .
Deliberam novamente a autorizar a J... a constituir uma sociedade unipessoal por quotas, mandatando os gerentes (X... e W...) para a outorga da escritura de constituição da mesma, através do procedimento empresa na hora regulado pelo DL 111/2005 de 8 de julho, tendo tal deliberação sido tomada por unanimidade.
Com referência ao objetivo que motivou a constituição da I... foi inquirido o Sr. X..., na qualidade de gerente da mencionada sociedade, que ouvido em auto de Declarações, no dia 16 de julho de 2015 afirmou o seguinte:
"A I... é uma sociedade por quotas cujo objeto social é a construção de imóveis e foi constituída com o objetivo de proceder à construção nos terrenos adquiridos no final de 2013 à A..., S.A. Sendo a I... detida em 100% pela J..., …, Lda., o objetivo foi isolar o risco deste projeto numa sociedade, neste caso a I..., que não tivesse outro património que não o associado ao próprio projeto."
Junta-se em Anexo 6 - cópia do Auto de declarações de 16/07/2015
De referir que conforme mencionado no ponto III.3.4.2 do presente projeto de aplicação da CGAA da análise às demonstrações financeiras verifica-se que nos anos de 2013 e 2014 a I... não realizou quaisquer operações ativas, resumindo-se a sua atividade nesses anos à aquisição dos terrenos para construção à A... .
(...)
IV. 3. REQUISITOS PARA APLICAÇÃO DA CGAA
Factualmente a Administração Tributária comprovou, ao longo desta informação, os pressupostos que se extraem do n.º 2 do artigo 38.º da LGT.
Vejamos:
IV.3.1. ELEMENTO MEIO
O elemento meio está relacionado com os atos ou negócios praticados por livre escolha dos intervenientes com o objetivo principal de obter uma vantagem fiscal.
No caso em apreço o elemento meio está patente na celebração do contrato de compra e venda de 27 de dezembro de 2013, em que a sociedade A..., pelo preço de € 4.126.140,00, aliena os Imóveis mencionados no ponto III.1.2. à sociedade I..., cuja constituição se concretizara no dia imediatamente anterior, mediante decisão tomada pelos órgãos sociais da J..., única detentora do seu capital social, e lavrada em ata uma semana antes.
Acresce ainda que o controlo quer do capital social quer dos órgãos de decisão nas três sociedades é pertença em conjunto de W... e X... .
Mais ainda se verificou que, pela análise dos movimentos bancários, o montante referente ao preço a pagar pela I..., tem a sua origem na própria alienante A..., conforme descrição no ponto III.1.5.
De salientar ainda que conforme referido no ponto III.1.2, apesar dos gerentes da J..., W... e X... alegarem que a data de final de dezembro para a constituição da I... e a celebração do contrato de compra e venda entre esta sociedade e a A..., foi o reflexo de uma negociação que culminou nessa altura, constatou-se que na realidade entre a decisão de celebrar tais atos e a sua concretização decorreu um período muito curto, concluindo-se que a data escolhida para transferir a propriedade dos imóveis teve como objetivo evitar a caducidade da isenção e permitir o apuramento de um prejuízo fiscal elevado.
Esta conclusão alicerça-se no facto de existir um processo judicial em curso que impede a I... de iniciar a construção no curto prazo, bem como na falta de capacidade financeira da J... e da I... em proceder pelos seus próprios recursos, a tal aquisição.
Assim, estamos perante um conjunto de atos encadeados, configurando a efetiva vontade dos intervenientes, que se inicia com a deliberação dos órgãos societários da J..., culminando com a constituição da I... e com o contrato de compra e venda exatamente naquela data, com o propósito essencial de obtenção de vantagens fiscais por parte da A... .
IV.3.2. ELEMENTO RESULTADO
O elemento resultado versa sobre a vantagem fiscal obtida com a ação do contribuinte e a equivalência dos efeitos económicos com aqueles do ato normalmente tributado e tem-se por verificada pela diferença que surge da comparação entre os ónus fiscais normalmente suportados e os evitados com a sua atuação.
Conforme apurado anteriormente a A... tinha adquirido os imóveis, em 27 de dezembro de 2010, pelo preço de € 8.200.000,00, tendo beneficiado da isenção a que se refere o artigo 7.º do CIMT, o que lhe permitiu não efetuar o pagamento de € 533.000,00, referente a esse imposto, condicionado pela obrigação de revenda dos mesmos no prazo máximo de três anos. Logo, para manter o benefício, a A... teria que revender os bens até 27 de dezembro de 2013.
Efetivamente a A... revendeu os imóveis exatamente no dia 27 de dezembro de 2013. No entanto, a venda foi efetuada à I..., sociedade por si indiretamente controlada, constituída no dia anterior, sendo que para concretizar tal aquisição foram efetuados movimentos bancários nas três entidades envolvidas (A..., I... e J...) que se anulam entre si.
Constatou-se ainda que nos anos de 2013, 2014 e 2015 a I..., não tem custos relevantes associados ao desenvolvimento do projeto de construção e que, segundo declarações do seu responsável, X... e supramencionadas, foi o desenvolvimento deste projeto que motivou a sua constituição.
Mais ainda, concluiu-se que os imóveis em causa não saíram da esfera de influência da A... que mantém o controlo indireto sobre os mesmos.
Assim, ao concretizar a escritura naquele momento transferindo os imóveis para a esfera de uma sociedade sob o seu controlo conseguiu eliminar a carga fiscal referente a IMT no montante de € 533.000,00.
No que respeita ao IRC, o negócio mencionado conduziu ao apuramento de um prejuízo fiscalmente dedutível no montante de € 4.170.307,25, o que configura uma vantagem fiscal que lhe permite a dedução dos prejuízos aos lucros tributáveis de um ou mais dos cinco períodos de tributação posteriores.
Sobre o valor atribuído aos bens verificou-se que:
> os representantes da A... aquando da aquisição, em 2010, tomaram a decisão de gestão de proceder à aquisição pelo valor de € 8.200.000,00, o que refletiria, portanto, o valor de mercado,
> mas estes mesmos representantes, em 2013, aceitaram, em simultâneo, como representantes do vendedor A... e do adquirente I..., que o preço de mercado seria € 4.126.140,00,
> a situação do alvará de loteamento não teve, nestes três anos alterações substanciais,
> Está pendente de decisão o processo judicial que corre termos no TAF de Almada e que teve início em 2008, pelo que não se detetam motivos que justifiquem uma diminuição tão colossal do valor de mercado do bem e ainda verificando-se que são as mesmas entidades que controlam o poder de decisão tanto na A... como na I... considera-se que o ajustamento do preço teve por finalidade a obtenção das vantagens fiscais especificadas em sede de IMT e IRC.
Deste modo, a decisão tomada pelas sociedades envolvidas de transmissão dos imóveis para a esfera patrimonial da I... conseguiu eliminar a carga tributária da A... que ocorreria se o negócio de compra e venda tivesse sido concretizado em data posterior e entre entidade independentes/não relacionadas que permitissem determinar o preço em condições de livre concorrência.
IV.3.3. ELEMENTO INTELECTUAL/INTENCIONAL
O elemento intelectual incide sobre a motivação do contribuinte, exigindo-se que as suas escolhas sejam dirigidas a um fim fiscal e que este prevaleça sobre o resultado não fiscal equivalente. O que significa que a sua atuação visa a obtenção daquele resultado.
No caso concreto foi demonstrado que de modo deliberado os membros do conselho de administração da A..., W... e X... , utilizaram a sua influência, obtida através das suas participações diretas e indiretas conjuntas, na J..., para que esta se constituísse como a única sócia da I..., à qual foram vendidos os prédios que asseguraram deliberadamente de forma artificiosa, a obtenção de vantagens fiscais para a A... .
Não esquecendo que estes atos têm o seu início, por influência dos citados membros do conselho de administração, apenas seis dias antes do "terminus" do prazo para a caducidade da isenção e ainda que desde que a I... se tornou proprietária dos imóveis não se comprovou ter efetuado diligências para o desenvolvimento do projeto, mesmo as mais elementares e básicas, designadamente Junto do Município de F..., tomar as medidas necessárias ao averbamento do seu nome como proprietário no alvará de loteamento n.º .../2006, tal se concluindo da informação prestada pelo próprio Município que nos informou que a última alteração ao alvará teve lugar em 25 de setembro de 2012.
Conforme as declarações prestadas por X..., na qualidade de gerente da I..., em 16 de julho de 2015 e transcritas no ponto III.1.1., o declarante afirma que o objetivo é de isolar o risco associado à concretização do projeto. Apresentando, deste modo, uma justificação puramente empresarial, querendo com isto dizer que a concretização do empreendimento envolve riscos financeiros associados aos seus elevados custos de construção que poderiam pôr em causa a estabilidade patrimonial da J... .
Contudo, face ao exposto ao longo do presente projeto de aplicação da CGAA, tal justificação não se afigura suficiente uma vez que a existência do processo judicial em curso impede, mesmo até à presente data, a prossecução de tais desígnios, ou seja, o início da construção do empreendimento. Situação que era do conhecimento das duas sociedades intervenientes no negócio.
Estamos aqui perante negócios realizados entre entidades relacionadas ( A..., J... e I...), concluindo-se que a I... foi constituída apenas com o fito de transferir a propriedade dos imóveis. Assim, o contrato de compra e venda celebrado em 27 de dezembro de 2013, é puramente motivado por objetivos fiscais, tendo como objetivo essencial ou principal a obtenção de vantagens fiscais para a A... .
O que aqui está em causa não é uma limitação à liberdade da A..., J... ou I... dirigirem a gestão da sua vida societária da forma que melhor considerarem servir os seus interesses, mas sim a ilegitimidade de procurarem soluções, sob a capa do direito à liberdade de gestão empresarial, que visem atingir objetivos censurados pelo ordenamento jurídico, agindo em abuso de direito.
No que se refere à liberdade de gestão empresarial deve-se mencionar que os negócios jurídicos entre particulares, realizados no âmbito da sua autonomia privada, configuram uma das principais formas de manifestação da sua vontade, pelo que a liberdade contratual é vista como uma garantia na realização dos negócios compreendidos na sua esfera privada. Importa salientar que a liberdade de gestão empresarial alicerçada na autonomia privada legitima os sujeitos passivos de impostos a conduzir os seus negócios da forma que mais lhes convier e considerem mais vantajosa.
Contudo, a liberdade e a autonomia dos particulares não pode pôr em causa a subsistência e manutenção do sistema fiscal que visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e demais entidades públicas no quadro de uma repartição justa do rendimento e da riqueza criados (cfr. art 103, n.º 1, da Constituição da República).
Assim, a compatibilização destas duas realidades conduz à necessidade de prevenir a ocorrência de situações de elisão, evasão e fraude fiscais por razões de justiça social nessa medida se justificando a adoção de decisões de limitação legítima de direitos, liberdades e garantias dos particulares.
Deste modo, no caso em apreço estamos perante uma situação do exercício ilegítimo da liberdade empresarial promovendo o planeamento e premeditação de cenários que tiveram como fim a elisão fiscal e conduziram a uma diminuição efetiva das receitas fiscais.
IV.3.4. ELEMENTO NORMATIVO
O elemento normativo traduz-se na reprovação pelo direito que a conduta do contribuinte merece, ao demonstrar-se que o efeito fiscal obtido resulta do abuso das formas jurídicas.
A elisão fiscal traduz-se num aproveitamento de negócios lícitos, cuja única motivação se prende com a subtração do sujeito passivo ao pagamento do tributo, a reverter a favor do erário público. Ademais, a substância da realidade económica, consequência da celebração dos ditos negócios, não é a que reside na verdade dos seus efeitos, sendo antes, aquela cujo "animus" mora na eliminação do imposto. Por outras palavras, e de modo sucinto, e elisão conhece o seu alicerce num conjunto de meios lícitos, mas reportando-se, em exclusivo, a ilícitos propósitos.
O sujeito passivo A..., por intermédio da J..., constituiu apressadamente uma nova sociedade, para aí depositar "in extremis", os imóveis com o único intuito de obter as vantagens fiscais enumeradas no elemento resultado (ponto IV.3.2.), pois a sociedade não teve desde aí atividade justificativa para a sua constituição.
O contrato de compra e venda tal como foi celebrado, entre entidades relacionadas, permitiu à A...:
> cumprir o requisito a que alude o artigo 7.º do CIMT, evitando a caducidade da isenção nos termos do n.º 5 do artigo 11.º do diploma legal,
e
> Atribuir um preço de transmissão por forma ao apuramento de prejuízos fiscais dedutíveis nos termos do artigo 52.º do CIRC.
No entanto e conforme referido ao longo do presente projeto de aplicação da CGAA concluiu-se que nenhumas das três entidades envolvidas obteve vantagens económicas/empresariais com esta transferência de propriedade.
Por outro lado, caso a A... tivesse aguardado o desfecho do processo judicial em curso, sendo as expectativas dos representantes das sociedades intervenientes a possibilidade de edificação/construção, certamente, em condições normais de mercado, a negociação da transmissão da propriedade dos imóveis com entidades Independentes/não relacionadas seria economicamente mais vantajosa para a A..., dada a escassez de terrenos para construção naquela zona, bem como a sua privilegiada vista sobre o estuário do Sado.
Assim, a realização deste negócio nos moldes em que foi concretizado teve objetivo essencial ou principal a obtenção de vantagens fiscais, uma vez que a constituição da sociedade I... e a transmissão dos imóveis para a sua esfera patrimonial, não é promovida por razões de gestão societária, mas apenas por razões de âmbito fiscal, visando obter vantagens fiscais indevidas para a A... .
V. FUNDAMENTAÇÃO DA APLICAÇÃO DA CGAA
Em face do disposto no n.º 3 do artigo 63.º do CPPT, conforme redação dada pela lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, foi comprovado ao longo do presente projeto de aplicação da CGAA que os atos e negócios jurídicos mencionados, designadamente a decisão de constituição de uma sociedade, a concretização dessa decisão (constituição da I...), a transmissão da propriedade dos imóveis da A... para a I..., e a forma utilizada para efetivar o respetivo pagamento, foram essencialmente dirigidos à obtenção de vantagens fiscais a nível de IMT e IRC. Estas vantagens fiscais traduziram-se:
> em sede de IMT, pela não tributação, por caducidade da isenção concedida nos termos do artigo 7.º do CIMT, da aquisição concretizada pela A... em 27 de Dezembro de 2010, o que permitiu à A... obter uma poupança fiscal de € 533.000,00, pois foi este o valor de IMT que não entregou nos cofres do Estado.
> Em sede de IRC, a mesma transmissão teve como consequência o apuramento de um prejuízo fiscalmente dedutível no montante de € 4.170.307,25.
Os atos foram essencialmente dirigidos à obtenção dessas vantagens, tanto mais que se comprovou, que os imóveis continuam na esfera de influência de W... e X..., detentores em conjunto do capital da A... e administradores da mesma, uma vez que são os mesmos que controlam Igualmente a J... e a I..., quer por via do capital e direitos de votos que estes proporcionam, quer por deterem em ambas as sociedades os cargos de gerência. Sendo que foi a relação especial existente entre estas três entidades que tornou possível a realização dos atos supramencionados e que culminaram com a transferência da propriedade dos imóveis da A... para a I... naquele momento preciso com o único interesse de contribuir para o esforço de elisão fiscal da A... .
De salientar que existindo um processo a decorrer em tribunal do qual, à data do presente projeto de aplicação da CGAA, ainda não há caso julgado, não se vislumbra nem foi apresentada justificação razoável para a criação da I... e transmissão dos bens naquele preciso momento e não posteriormente quando efetivamente pudesse iniciar a construção do empreendimento.
Conclui-se, por fim, que o objetivo essencial e principal da escritura de compra e venda celebrada em 27 de dezembro de 2013 é a obtenção de vantagens fiscais para a sociedade vendedora A... .
Não se colocando, no entanto, em causa a validade extra fiscal dessa escritura, deverá a mesma ser desconsiderada para efeitos da sua qualificação fiscal, nos termos do n.º 2 do artigo 38.º da LGT, com a consequente:
> Tributação em IMT, no montante de € 533.000,00, a ser pago pelo sujeito passivo A..., e
> Não consideração em sede de IRC dos efeitos de tal negócio, expurgando-se o montante relativo ao prejuízo fiscalmente dedutível que este negócio originou na esfera do sujeito passivo, no montante de €4.170.307,25.
O sujeito passivo vai ser notificado para efeitos de audição prévia prevista no n.º 5 do artigo 63.º do CPPT.
VI – DIREITO DE AUDIÇÃO
(...)
VI.1.2. ARGUMENTOS DA AT
No ponto II.3.5 do procedimento de aplicação da CGAA, a AT conclui que W... e X..."têm, na prática, o controlo das sociedades A..., I... e J... por disporem do "poder de gerir as políticas financeiras e operacionais" sendo administradoras/gestores e ainda detendo em conjunto por via direta e indireta uma participação superior a 50% do capital social das entidades, possuindo o controlo societário", não querendo com isto dizer que este controlo é obtido unicamente via A... . Pois conforme mencionado no direito de audição, estamos perante um grupo de sociedades e foi sobejamente demonstrado pela AT que a relação neste grupo de sociedades é concretizada por participações diretas, indiretas e cruzadas que geram um emaranhado de participações sociais conducentes à concentração dos respetivos interesses na esfera de W... e X...,
Além do controle das participações sociais ficou evidente que também o controle decisório das entidades envolvidas (A..., J... e I...) se encontra concentrado em W... e X..., facto este de grande relevância e que não foi contrariado ao longo do direito de audição.
No seu direito de audição o sujeito passivo menciona o esquema 1 e quadro 9 do procedimento de aplicação da CGAA referentes à determinação das participações detidas por W... na A... não contestando a conclusão da AT de que este detém direta e indiretamente uma participação de 55,59%, nem contesta o cálculo matricial das participações cruzadas que originam uma participação efetiva de 97,96%.
O sujeito passivo serve-se do referido quadro e esquema para admoestar a AT por não ter elaborado um mapa equivalente para determinar o controlo societário da I..., Lembramos que a I... é detida na sua totalidade pela J... e na página 16 do procedimento de aplicação da CGAA é efetuada a descrição e apuramento da participação de W... e X... nesta entidade. Logo, essa participação de 63,63% na J... reflete a participação dos mesmos na I... .
No entanto, por tal associação não ter sido inferida por parte do sujeito passivo, seguidamente se esquematiza a descrição e apuramento da referida participação:
Assim, provado ficou que W... e X... detém em conjunto, através das participações sociais e poder decisório, o controlo societário na I..., na A... e na J..., o que lhes permitiu realizar atos e negócios jurídicas, designadamente a constituição da I... e a transmissão da propriedade dos imóveis da A... para essa nova sociedade no exato momento em que caducava a Isenção de IMT pela aquisição para revenda em 2010 desses imóveis.
Verifica-se portanto que mantendo-se o poder decisório sobre os imóveis em causa na esfera de W... e X... é obtida uma evidente vantagem/poupança fiscal,
(...)
Vl.2.2. ARGUMENTOS DA AT
O sujeito passivo alega que o financiamento da operação de aquisição pela I... foi concretizado, pela utilização de um descoberto bancário de €4.126,140,00 por parte da I... (entidade compradora) pela realização de suprimentos de €4.030,000, por parte da J..., os quais tiveram em parte origem na A... (entidade vendedora), considerando que estas operações de financiamento constituem operações correntes entre empresas do mesmo grupo.
A AT não contesta os movimentos entre empresas do mesmo grupo mas sim os que aqui estão em questão e que tiveram como objetivo camuflar o real objetivo de obtenção de vantagens fiscais, uma vez que ficou demonstrado que nenhuma das entidades do grupo envolvidas possuía liquidez suficiente para financiar a operação de aquisição pela I... e por outro lado, o recurso à instituição de crédito foi momentâneo, sendo que na prática não originou qualquer alteração ao saldo do fluxo de caixa diário dessa instituição, não gerando exfluxos monetários na instituição de crédito nem reais influxos monetários nas sociedades envolvidas.
O circuito financeiro identificado pela AT para suportar os mais de 4 milhões de euros, foi como se mencionou, momentâneo pois os movimentos bancários nas três entidades envolvidas (A..., J... e I...) foram todos realizados no dia 27/12/2013, não podendo efetivamente ser considerado como um financiamento externo. Constituem sim mais um ato legal realizado pelas entidades envolvidas por forma a credibilizar a operação ao fazer crer que existe pagamento e camuflar a real intenção de obter vantagens fiscais, sob a capa de irrepreensível legalidade. Quanto à alegação de que a J... se viu na contingência de proceder ao pagamento do IMT e do Imposto do Selo, uma vez que não seria ainda possível realizar as liquidações em nome da I... por esta ter sido constituída na véspera da celebração da escritura, tal não corresponde à verdade. Tanto mais que as liquidações que constam no sistema da AT foram emitidas em nome da adquirente I... . O que certamente o sujeito passivo pretende alegar, neste ponto específico, foi que a I... não possuía sequer os meios financeiros para suportar os encargos fiscais decorrentes da aquisição.
O sujeito passivo não concorda com os fundamentos apresentados pela AT quando esta considera que os meios utilizados para financiar a operação de compra e venda dos Imóveis, designadamente descobertos bancários momentâneos, suprimentos e prémio de emissão de participações sociais, constituem mais atos legais realizados pelas entidades envolvidas por forma a credibilizar a operação e camuflar a real intenção de obter vantagens fiscais.
Refere no direito de audição que parte dos suprimentos realizados pela J... teve origem na própria A... .
Sobre estas alegações temos que a parte dos suprimentos a que o sujeito passivo se refere corresponde a 91,84% da totalidade dos suprimentos realizados em 2013. Constata-se pois que, conforme mencionado no ponto III.1.6, do presente procedimento de aplicação da CGAA, existe uma contribuição muito diferenciada entre os suprimentos realizados pela A..., como sócio minoritário da J... (no total de €2.700.000,00) e os realizados pelos restantes sócios (no total de €240.000,00), sem que tenha sido apresentada justificação para tal diferenciação.
Assim, os suprimentos realizados pela A... tiveram origem no descoberto bancário da I... e serviram para pagar parte desse mesmo descoberto bancário, não existindo um efetivo dispêndio monetário, parece, portanto, evidente que o verdadeiro objetivo dos suprimentos em causa foi credibilizar o contrato de compra e venda dos imóveis.
Quanto ao prémio de emissão no montante de €1.400.000,00, que teve igualmente origem no descoberto bancário e como destino o pagamento de parte desse mesmo descoberto o sujeito passivo vem alegar que o prémio está previsto num acordo entre sócios datado de 2009 e ao abrigo do qual foram já realizados outros aumentos de capital nos mesmos termos.
O acordo entre sócios celebrado em 26/10/2009 determina o pagamento de "um prémio de emissão de 5 a 7 vezes o valor nominal da participação a adquirir por via de aumento de capital na sociedade em que se verifique a entrada de novos sócios ou alteração de posição dos sócios atuais".
Quanto ao invocado constatou-se que após o acordo celebrado foram efetuados dois aumentos de capital da J..., um pela entrada da A... na J..., em 2012, no montante de €100.000,00, que originou um prémio de emissão de €700.000,00 e outro de €200.000,00, pelo reforço da participação da A... na J..., que originou o prémio de emissão em causa no montante de € 1.400.000,00.
A exigência de um prémio de emissão de 7 vezes o valor nominal da participação traduz para o investidor uma expetativa de benefícios económicos nesse montante. Ora, aplicando essa condição ao caso concreto temos que antes da entrada da A... no capital social da J..., o capital social desta sociedade totalizava €3.000.000,00, assim sendo os prémios de emissão no montante global da €2.100.000,00, expressam uma expetativa de benefícios económicos no montante de € 21.000.000,00 (63.000.000,00 x 7).
Nas peças contabilísticas apresentadas pela J..., na IES do ano de 2011 e seguintes, designadamente no Balanço e ABDR (Anexo ao Balanço e é Demonstração de Resultados), não existe qualquer evidência/divulgação referente a "goodwill", bens, direitos e expetativas de negócios que façam prever que a J... irá gerar benefícios económicos futuros que justifiquem o pagamento de tal prémio de emissão, muito pelo contrário acumulou sim, até 2015, prejuízos no total de €715.165,03.
Ora, o acordo apresentado por si só não justifica a divergência entre o valor contabilístico da empresa e o valor exigido para novos aumentos de capital, perece-nos ser do senso comum que qualquer investidor aceite as condições do contrato apenas se tiver perspetivas de obter benefícios económicos proporcionais ao seu investimento, o que no caso em apreço não se mostra evidente nas demonstrações financeiras da J... .
A alegação de que a A... investiu cerca de € 180.000,00, o que se nos afigura ser constituído pela diferença entre o saldo bancário antes e depois da operação (€ 178.440.76 = € 270.788,10 - € 92.347,34), não retira o caráter circular do alegado financiamento da operação, uma vez que, está em causa uma liquidez de mais de 4 milhões de euros que a contabilidade das entidades envolvidas demonstra não possuírem.
Face ao exposto, o argumento apresentado pela A... de que estamos perante uma operação de financiamento corrente e bastante comum entre empresas do mesmo grupo não poderá ser aceite pela AT, dado que nenhuma das empresas envolvidas possuía liquidez para realizar tal financiamento monetário, nem se confirmou recurso ao efetivo financiamento externo.
Verificou-se sim a existência de um conjunto de atos legais entre a A..., J..., I... e com a intervenção momentânea da instituição de crédito LL..., designadamente de descobertos bancários momentâneos, suprimentos e prémio de emissão de participações sociais, realizados por forma a credibilizar o contrato de compra e venda dos imóveis e encobrir a real Intenção de obter vantagens fiscais.
A questão das entradas de capital em espécie para a constituição legítima das sociedades levantada no direito de audição, afigurando-se quererem referir-se à constituição da I..., não se coloca uma vez que, por um lado, a mesma foi constituída por entradas em numerário no montante de € 100,000,00, o que nem de perto nem de longe se aproxima do valor do Imóvel em causa e por outro lado, em nenhum momento foi posta em causa a constituição legítima da I... .
(...)
VI.3.2. ARGUMENTOS DA AT
O sujeito passivo alega que a decisão de constituição de uma sociedade, a concretização dessa decisão (constituição da I...), a transmissão da propriedade dos imóveis da A... para a I..., e a forma utilizada para efetivar o respetivo pagamento, configuram operações realizadas no âmbito da sua atividade comercial, em pleno cumprimento da liberdade contratual vigente no ordenamento jurídico português e foram determinadas por razões válidas e racionais.
Efetivamente no ordenamento jurídico português vigora o princípio da autonomia privada ao abrigo do qual é reconhecido aos particulares o direito de manifestar a sua própria vontade estabelecendo o conteúdo e disciplina das relações jurídicas em que participam. A liberdade contratual é um dos elementos integrantes desse princípio e que se define de acordo com o n.º 1 do artigo 405.º do Código Civil como a faculdade que as partes têm de fixar livremente o conteúdo dos contratos, sem descurar as limitações estabelecidas na lei.
Conforme se extrai da leitura da própria lei a liberdade contratual não é um direito sem qualquer limitação, tendo como limites aqueles que a lei fixar.
Ora, o n.º 2 do artigo 38.º da LGT configura uma limitação tributária a essa liberdade, determinando a ineficácia, para efeitos fiscais, dos atos os negócios jurídicos "essencial ou principalmente dirigidos por meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso das normas jurídicas à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas total ou parcialmente sem utilização desses meios," prevendo a tributação de acordo com as normas aplicáveis na ausência de tais atos eu negócios eliminando as vantagens fiscais obtidas.
Em algum momento pretende a AT colocar em questão a idoneidade ou desvalorizar os atos e negócios de gestão praticados, ou a sua eficácia jurídica, civil e comercial, sendo, pois, irrelevante a esta aferir se foram bem ou mal praticados. Isso é matéria da competência dos sócios/acionistas.
Contudo, após a sua prática, os atos de gestão originam factos tributários e deixam de ser exclusivo apanágio do sujeito passivo quanto à respetiva eficácia tributária.
De facto, a partir do momento em que integram a contabilidade e são objeto de declarações para efeitos fiscais, passa a AT a poder e a dever no âmbito das suas prerrogativas inspetivas, analisar e enquadrar os mesmos para subsunção dos factos às normas tributárias, em observância do disposto no artigo, 38.º, 58.º, 59.º, 75.º, todos da LGT, bem como nos artigos 6.º, 8.º e 9.º do RCPIT, porquanto o perfeito enquadramento tributário passa por aferir a conduta e a intenção da mesma em sede de poupança fiscal que se pretende obter, no que respeita à subsunção do facto à norma tributária.
Saliente-se que, na situação em apreço, jamais pretenderia a AT, imiscuir-se naquilo que são os atos de gestão. Porém, e tal como referido, quando tais atos adquirem implicações de cariz jurídico-tributário, deve a AT subsumir tais atos aos seus efeitos tributários, devendo, em consequência, e no estrito cumprimento das suas obrigações funcionais, emitir pronuncia sobre os mesmos.
Ressalvada que está a não intromissão nos atos de gestão e na liberdade contratual do sujeito passivo, cumpre à AT apreciá-los, particularmente no que respeita ao seu efeito tributário.
Não é o facto de a I... estar integrada num grupo de sociedade que leva a AT a considerar que a sua constituição foi abusiva, mas sim o facto de a operação de relevo identificada no âmbito do exercício da sua atividade ter sido a aquisição dos Imóveis à A... sem que fossem realizadas quaisquer diligências no sentido de desenvolver o projeto de construção objetivo este que é alegado por W... e X... como estando na origem na sua constituição.
(...)
Vl.4.2. ARGUMENTOS DA AT
Sobre o alegado apraz referir desde logo que a AT não questiona a intenção de revenda por parte da A... quando em 2010 adquiriu os Imóveis à B... .
Contudo, cumpre contra argumentar que a isenção contemplada no artigo 7.º do CIMT está sujeita a uma condição que é a revenda do imóvel no prazo de três anos. Significando isto que para manter a isenção e para que esta transite na ordem jurídica têm que se verificar dois momentos:
Primeiro momento - é necessário efetivamente a intenção de revenda, ato que o sujeito passivo concretizou e por isso lhe foi atribuída e isenção. A isenção atribuída teve como consequência o não pagamento do IMT no momento da aquisição;
Segundo momento - a revenda tem que ser concretizada no prazo dos 3 anos estipulados na lei. Neste ponto, a A... alega que revendeu, e na verdade formalmente concretizou a revenda. O proprietário passou a ser outra entidade (a I...) com personalidade jurídica distinta da A... .
A AT, ao longo do presente procedimento de aplicação da CGAA, apresenta evidências factuais de que esta segunda condição foi materializada com recurso abusivo a atos e negócios legais, não tendo sido apresentados factos e provas documentais pelo sujeito passivo que alterassem a convicção da AT, da real intenção destes atos e negócios legais ser a obtenção vantagens fiscais
Se não vejamos:
O sujeito passivo argumentou que não concretizou a revenda por vicissitudes várias e que efetuou vários contactos ao longo do tempo, no entanto não especifica quais são essas vicissitudes nem apresentou qualquer prova documental dos vários contactos que efetuou no sentido de proceder à venda dos lotes de terreno em causa.
Alega então, que gorada a possibilidade de revenda, entenderam os sócios do grupo ser de desenvolver o projeto imobiliário de construção e posterior vendas das frações construídas e por isso entenderam concretizar esse objetivo e limitar os riscos associados à detenção dos imóveis, através da constituição de uma nova sociedade, a I... e a transferência da propriedade dos imóveis para esta nova entidade.
No presente procedimento de aplicação da CGAA, a AT reuniu evidências factuais de que W... e X... em conjunto conduzem os destinos das entidades A..., J... e I..., tendo sido os mesmos que tomaram a decisão de gestão de criar uma nova entidade, sob a sua esfera de influência, com o objetivo, nas suas palavras, de desenvolver o projeto imobiliário. No entanto, provado ficou que, até à presente data, não existiram desenvolvimentos do projeto imobiliário em causa, alegando como motivo para esse facto que a gerência, ou seja W... e X..., tomou a decisão de aguardar pelo termo do processo judicial concluindo que é legítimo que até à definição do mesmo não sejam realizadas outras operações.
Sobre o alegado salienta-se que o processo judicial em causa é de 2008, pelo que quando a A... adquiriu os imóveis em 2010 já conhecia esse risco que lhes estava associado, e mesmo assim aceitou pagar o montante de €8.200.000,05, pois com certeza seria este o efetivo valor dos imóveis.
Ora, não tendo sido apresentadas pravas que justifiquem a diminuição do valor dos imóveis em causa desde a aquisição em 2010 até à transmissão da propriedade em 2013 e nem evidências de diligências no sentido do desenvolvimento do projeto imobiliário, não pode a AT aceitar o motivo apresentado por W... e X..., para a constituição da I... e a transferência da propriedade dos imóveis para aquela entidade.
Mantém-se, portanto a convicção firmada pela AT de que W... e X... constituíram a I... um dia antes da caducidade da isenção de IMT, com o propósito de esta ser um mero recetáculo da propriedade dos imóveis adquiridos pela A... em 2010, com a intenção de cumprir todos os requisitos exigidos por lei para consolidar essa isenção.
A descrição factual, e de todos os atos e negócios jurídicos, não deixa qualquer dúvida da existência de uma motivação fiscal preponderante e que faz prevalecer a finalidade de obter vantagens fiscais com o negócio sobre a única motivação declarada que foi o desenvolvimento do projeto imobiliário.
(...)
Vl.5.2. ARGUMENTOS DA AT
Quanto à questão de em diversas ocasiões no procedimento de aplicação da CGAA, a AT mencionar que a construção não é possível, quer com isto dizer-se não que é legalmente impossível a construção mas sim, que face à falta de trânsito em julgado do processo judicial a mesma não será viável apresentando potenciais riscos inerentes ao desconhecimento do desfecho do mesmo.
Quanto ao alegado de que a construção seria possível, uma vez que o processo judicial em curso não será impeditivo, mas que a nova proprietária considera ser mais razoável aguardar o seu desfecho e que terá sido por essa razão que a proprietária I... ainda não procedeu ao averbamento do seu nome no projeto de obras, afigura-se ter sido aqui aduzido um argumento que em nada altera as conclusões da AT, apenas as reforça ainda mais, uma vez que:
A existência de um processo em tribunal não obsta ao averbamento da identificação do novo proprietário, a I... . E o novo proprietário deverá com certeza ter interesse em saber o estado da ação e até se o considerar necessário intervir no próprio processo, sem necessidade de ter que se socorrer da alienante.
W... e X..., em representação das entidades envolvidas, ao considerarem ser a melhor decisão de gestão aguardar pelo desfecho da ação judicial e não tendo a I... realizado qualquer diligência até à presente data, conducente ao avanço do projeto de construção, demonstram que o objetivo da suas ações se resume apenas a evitar o pagamento do IMT devido pela caducidade da isenção.
Tratando-se de um contrato de compra e venda celebrado entre entidades relacionadas não havia qualquer necessidade de adquirir impreterivelmente naquela data, nem se detetaram razões de suporte à necessidade de escolha daquele momento em que por coincidência caducava a isenção de IMT, que não sejam razões de controle e minimização do encargo financeiro trazido pela caducidade da isenção.
Independentemente de ser falso que o processo judicial em curso impede o desenvolvimento do projeto de construção a verdade é que não foram efetuadas quaisquer diligências tendentes à concretização do projeto não se compreendendo qual a necessidade em transferir a propriedade dos imóveis naquele exato momento, uma vez que a situação judicial do imóvel não se alterou, desde 2008 até agora.
(...)
Vl.6.2. ARGUMENTOS DA AT
Em face do alegado afigura-se ter a exponente interpretado que a AT consideraria ser de aplicar a CGAA porque a transmissão foi concretizada no último dia do prazo. No entanto, mesmo que a transmissão tivesse ocorrido em data anterior face aos contornos envolventes estaríamos perante uma situação suscetível de configurar abuso das normas jurídicas e passível de aplicação do artigo 38.º da LGT.
Vejamos, formalmente estamos perante a situação de uma empresa que adquiriu um conjunto de prédios urbanos composto por lotes de terrenos indicando que o destino dado aos bens era a revenda e que dentro do prazo que as normas legais lhe concediam para proceder é concretização da revenda assim o fez. A A... utilizou os meios legais ao seu dispor para adquirir e revender os imóveis. Aqui nada fez de repreensível.
Contudo, passando além da superfície e analisando os meandros do contexto em apreço constata-se que até chegarmos ao momento de concretização da revenda existe todo um encadeado de atos e negócios jurídicos orquestrados por W... e X... que usando as suas diversas facetas, detentores de participações sociais e representantes das sociedades envolvidas as quais se encontram relacionadas entre si, se servem da criação da I... apenas como recetáculo da propriedade dos bens transmitidos, tentando mascarar esta realidade sob o pretexto da hipotética remoção de eventuais "riscos" que não foram delatados pelo AT nem foram apresentados pela exponente no decurso do presente procedimento de aplicação da CGAA.
Assim, ao contrário do que o sujeito passivo alega, o momento da transmissão é relevante exatamente por possibilitar que esta ocorra dentro do prazo de caducidade estipulado por lei, permitindo à A... recolher os seus benefícios tributários, de se excluir da tributação em sede de IMT por não cumprir os requisitos dessa mesma caducidade, o que não aconteceria caso a transmissão tivesse ocorrido fora do período de 3 anos.
VI.7.2. ARGUMENTOS DA AT
No que respeita à questão da restituição do IMT e do Imposto do Selo em sede de reclamação graciosa a solicitação da adquirente I..., decorre da legislação em vigor, tanto que o pedido foi deferido tendo produzido os seus efeitos com a devolução à reclamante dos montantes em causa. A sua referência no presente procedimento de aplicação da CGAA foi levada a cabo apenas para enquadramento factual de todos os elementos componentes da situação aqui em causa.
Quanto aos valores patrimoniais tributários (VPT) dos imóveis alienados constata-se que efetivamente estes sofreram uma diminuição de valor em resultado do pedido de avaliação apresentado em 31-10-2013 (retificação de áreas), contudo esta diminuição dos VPTs não poderá, de per se, ser usada como justificativo do valor atribuído à contraprestação no contrato de compra e venda de 27 de dezembro de 2013.
Atentemos na evolução do VPT desde a inscrição à matriz dos prédios aqui em consideração;
Na data da aquisição por parte da A..., em 27 de dezembro de 2010 os imóveis aqui em apreço possuíam um VPT global no montante de € 5.303.990,53, tendo a A... procedido à sua aquisição pelo montante global de € 8.200.000,00. Assim, constata-se ter havido uma valorização face ao VPT de € 2.896.009,47.
A A... manteve os imóveis sob a sua esfera patrimonial até 27 de dezembro de 2013. Neste período o VPT, por via das atualizações automática em sede de IMI, passou dos mencionados € 5.303.990,53 para € 5.502.890,19, até que, por via do pedido de avaliação apresentado em 31-10-2013 o VPT global dos imóveis é fixado em €4.125.140,00, o que significa um decréscimo no valor global de avaliação no montante de €1.376.750,19.
Ora, o importante a reter e que se revela essencial para a apreciação da presente situação é que:
A A..., representada pelo seu gerente W..., considerou que entregar o montante de € 8.200.000,00, recebendo em troca os imóveis identificados no presente procedimento de aplicação da CGAA refletia equilíbrio nas prestações contratuais, por outras palavras: os imóveis tinham para a A... o valor de € 8.200.000,00;
No momento em que a A... concretiza o negócio pelo valor de € 8.200.000,00 os mesmos imóveis tinham para a AT o VPT global de € 5.303.990,53, logo estes valores não se aproximam sequer. Quando da transmissão dos imóveis da A... para a I..., em que intervêm na outorga do ato de transmissão W... e X..., ambos em representação das duas empresas em simultâneo, isto é, ambos atuam no mesmo momento como compradores e como vendedores, é atribuído ao contrato um valor global que coincide com o VPT atribuído pela AT na sequência do pedido de avaliação que tinha sido apresentado em Outubro, ou seja o valor de € 4.126.140,00;
Em suma, o valor que a A... atribuiu primeiramente aos imóveis (€ 8.200.000,00) em nada se aproximava do seu VPT à data, não podendo ser atribuída à retificação do VPT resultante da correção de áreas, a causa para a redução do valor de venda aceite pela A... aquando da transmissão à I... (€ 4.126.140,00).
Tanto mais que a diminuição do VPT surge na sequência de um pedido de avaliação apresentado pelo sujeito passivo e por via de retificação de áreas, o que com certeza era do conhecimento do exponente quando adquiriu os imóveis em 2010 pelo preço de € 8.200.000,00, uma vez que as áreas cuja retificação foi solicitada no pedido de avaliação já constavam do alvará de loteamento n.º .../2006, que já deveria ser do conhecimento do sujeito passivo em 2010.
(...)
VI.8.2. ARGUMENTOS DA AT
Quanto à questão dos prejuízos fiscais alegam que dificilmente irá a A... gerar resultados positivos que permitem absorver esses prejuízos argumenta o sujeito passivo que em 2014 e 2015 registou também prejuízos fiscais pelo que não tinha qualquer interesse em incrementar esse valor.
Relativamente ao inovado pelo sujeito passivo apraz referir o seguinte: Decorre do próprio ordenamento jurídico e também do senso comum que o objetivo que subjaz à constituição e manutenção de uma entidade que exerce a título principal uma atividade comercial é a obtenção do lucro, no entanto, poderão existir períodos em que por diversos fatores esse objetivo não seja obtido e o resultado final seja o apuramento dos prejuízos.
O código do IRC prevê a dedutibilidade desses prejuízos em lucros futuros o que se traduz numa poupança fiscal nos períodos subsequentes ao apuramento desses prejuízos. A dedução dos prejuízos apurados em 2013 pode ter lugar em qualquer dos seis períodos subsequentes, ou seja, até 2018.
Ora o facto de nos anos de 2014 e 2015 a A... ter registado prejuízos fiscais não é sinónimo de que até 2018 não venha a obter lucros que lhe permitam beneficiar da vantagem fiscal de deduzir os prejuízos obtidos em 2013.
Face ao exposto não se afigura que os argumentos apresentados pelo sujeito passivo em sede de direito de audição do procedimento de aplicação da CGAA permitam afastar a convicção da AT de que a obtenção de um prejuízo fiscal no ano de 2013 no montante de é 4.170.307,25 constitui uma vantagem fiscal.
(...)
VI.9.2. ARGUMENTOS DA AT
Quanto à alegada não demonstração dos requisitos da CGAA, não nos é possível aceitar os argumentos aduzidos, uma vez que se encontra verificado cada um dos quatro pressupostos necessários à sua aplicação e cuja explanação pormenorizada se encontra ponto IV.3 do presente procedimento de aplicação da CGAA, não tendo sido apresentado por parte do sujeito passivo quaisquer elementos novos, em sede de direito de audição, que contrariem as conclusões firmadas pela AT.
Ainda assim, vamos proceder à sua revisão.
São quatro os pressupostos cuja verificação é necessária para aplicação da CGAA.
1. Elemento Meio
Conforme o anteriormente mencionado este pressuposto está relacionado com os atos ou negócios praticados por livre escolha dos intervenientes com o objetivo de obter uma vantagem fiscal.
O sujeito passivo alega no exercício do direito de audição que "estruturou as operações em causa da forma que entendeu mais conveniente", no uso da "liberdade de condução da sua atividade". Tais afirmações não colidem com os requisitos necessários à comprovação do elemento meio, reforçando-o de facto.
A A... escolheu no exercício da sua liberdade de condução da sua atividade, realizar os atos e negócios dos quais resultaram indiscutivelmente vantagens fiscais. O uso do seu próprio livre arbítrio levou-a a escolher este caminho e não outro.
Assim, foram meios livremente escolhidos pela A... e detetados pela AT:
A celebração da escritura de compra e venda de 27 de dezembro de 2013,
A promoção, por parte dos detentores do capital da A..., mais concretamente W... e X..., da constituição da sociedade I...,
A criação de um fluxo circular de movimentos nas contas de depósito à ordem das três
entidades envolvidas (A..., J... e I...).
Em suma, os atos e negócios praticados são formas previstas e/ou não proibidas no ordenamento jurídico e foram livremente escolhidas pela A... e tiveram como objetivo a obtenção de vantagens fiscais conforme se demonstrou ao longo do presente procedimento de aplicação da CGAA e se reforça nos pressupostos seguintes.
2. Elemento Resultado
Tal como antes exposto a atuação do contribuinte conduz a uma efetiva vantagem fiscal.
No caso em apreço as vantagens fiscais verificaram-se em sede de IMT e de IRC.
Em IMT, a transferência da propriedade, dentro do prazo de 3 anos mencionado no artigo 7.º do CIMT, para a I... traduziu-se no não pagamento de € 533.000,00.
Sobre este requisito não se afigura que no direito de audição venha a A... trazer alegações que contrariem as da AT, no entanto, parece-nos que a ele se refere quando afirma ser "irrelevante que os imóveis continuem a ser detidos por uma sociedade controlada pelos titulares da sociedade que os alienou, pois esse facto não é proibido nem merece qualquer censura."
É pois neste ponto que não podemos concordar, porque ainda que se aceite não ser proibido por lei que as entidades relacionadas mantenham entre si operações comerciais, não é isso que está em causa. Aqui o que importa é que a A... aproveitou a relação especial que mantém com a J... e a I... para obter vantagens fiscais em sede de IRC e IMT, que foram aquelas que efetivamente se verificaram.
3. Elemento intelectual ou intencional
Este elemento está verificado quando se demonstra que a atuação do contribuinte visa a obtenção daquele resultado.
O sujeito passivo, nos seus argumentos, afirma que a sua conduta não foi orientada pela intenção de obter vantagens fiscais e que "as operações realizadas foram estruturadas desta forma apenas por razões de índole económica, tendo sido ditadas por critérios da gestão rigorosa e eficiente que a Requerente adota". Cabe-nos, contudo, salientar que não se afigura que vender com um prejuízo tão elevado, como foi o caso, seja obedecer a um critério de gestão rigorosa e eficiente.
Tanto mais que a AT não encontrou outras razões além das fiscais que justifiquem a transmissão para a I... dos imóveis aqui em causa.
Adicionalmente ainda o sujeito passivo quer fazer crer que a necessidade de transferir a propriedade naquele momento se deve à necessidade de evitar "riscos" que não específica, parecendo-nos a nós, que não os especifica porque efetivamente não existem, sendo teóricos e não reais.
No decurso do direito de audição vêm alegar que a criação da sociedade I... e a transferência dos imóveis para a sua esfera patrimonial serviu não para obter vantagens fiscais em sede de IMT e IRC, mas sim:
- Limitar os riscos do processo judicial,
- E isolar os imóveis associados ao projeto do restante património da J...,
- Com o objetivo último de desenvolvimento do projeto de construção e venda posterior das frações construídas.
Seguidamente procede-se à apresentação dos argumentos da AT para desconsiderar as referidas alegações do sujeito passivo:
Quanto à limitação de riscos do processo judicial:
Aludem, nos parágrafos 26 e 28, à demora da obtenção de decisão no âmbito do processo judicial e a incerteza do seu teor como situações que poderiam trazer prejuízo à proprietária dos imóveis. Este argumento não pode ser considerado como válido, uma vez que o processo judicial teve, como se viu, o seu início no ano de 2008, ainda antes da aquisição dos imóveis por parte do sujeito passivo. Já era, portanto, do conhecimento da A..., quando, em 2010, procedeu à aquisição dos bens e considerou que o destino a atribuir era a revenda, que as decisões judiciais demorarão o tempo necessário e que este pode ser longo e ainda que existindo um litígio sobre o qual importa decidir poderá a decisão não ser a contento de todos os intervenientes, existindo a hipótese de a entidade que proceda ao desenvolvimento do projeto não o possa fazer nos moldes que para si seriam idílicos.
Em relação a esta situação que a A... denomina de "risco" afigura-se que o próprio direito de audição contradiz o argumentado, uma vez que também asseguram não ser a existência do mesmo processo impeditiva da construção nos aludidos terrenos, logo se a existência do processo não impede a construção porque é que a I... que detém o imóvel, desde 2013, não desenvolveu o projeto? O próprio direito de audição apresenta uma justificação, de que foi tomada a decisão de gestão em que se optou por aguardar pela decisão judicial.
Ora, se a opção de gestão é aguardar, estando nós perante um conjunto da sociedades que se assumem como um grupo, poderiam os imóveis ter continuado em nome do sujeito passivo A..., uma vez que não houve quaisquer desenvolvimentos no projeto.
Quanto ao desenvolvimento do projeto de construção e venda:
Tal como se verificou do exposto no presente procedimento de decisão da CGAA, o projeto a que o sujeito passivo se refere não apresenta, até à data, progressos, tendo as próprias entidades responsáveis pelos imóveis, mais concretamente, W... e X..., tomado a decisão, tal como admitido em direito de audição, de aguardar pelo desfecho do processa judicial. Logo, essa pretensa necessidade de impreterível transferência da propriedade para a I... a fim desenvolver o projeto imobiliário, não se verificou, não tendo esta transferência de propriedade debelado outro objetivo que não a imediata obrigatoriedade de pagamento do IMT e proporcionando ainda uma almofada de prejuízos fiscalmente dedutíveis, relevantes em IRC.
Quanto à necessidade de isolar os imóveis associados ao projeto do restante património:
Não sendo claramente identificada, em sede de direito de audição a entidade que é necessário proteger desta alegada necessidade de isolar os Imóveis do restante património, se a A... se a J..., parece-nos que o sujeito passivo se pretende referir à J... . Assim, afigura-se que o sujeito passivo quer com isto dizer que a transferência dos imóveis não foi efetuada para a J... com o objetivo de isolar os riscos associados ao desenvolvimento do projeto imobiliário do restante património daquela entidade. Ora, este argumento não pode ser acolhido pela AT para aceitar os efeitos fiscais decorrentes da transferência da propriedade da esfera da A..., sendo irrelevante que a transferência fosse para a I... ou para a J... uma vez que ambas são controladas por W... e X... .
Mais ainda se o objetivo era proteger a J..., os imóveis simplesmente poderiam ter-se mantido em nome da A... .
Ficou assim demonstrado que as ações das entidades envolvidas foram conduzidas objetivamente e intencionalmente com vista à obtenção do resultado tributário, reduzindo os encargos fiscais e atuando, ao abrigo da ordem jurídica com o propósito de obter vantagens condenadas pelo direito.
4. Elemento Normativo
Demonstrado o abuso das formas jurídicas a conduta do contribuinte merece reprovação pelo direito, traduzida na ineficácia para efeitos fiscais da conduta do contribuinte.
Conforme ficou demonstrado ao longo do presente procedimento o sujeito passivo agiu intencionalmente e em consciência com vista à obtenção de vantagens fiscais, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 38.º da LGT, os atos e negócios jurídicos produzidos em consequência das decisões tomadas pelas entidades envolvidas não devem ser consideradas para fins de tributação fiscais por se terem produzido vantagens fiscais em sede de IMT no montante de € 533.000,00 e de IRC ao possibilitar a consideração de é 4.170.307,25 a título de prejuízos fiscais.
Assim e em suma, constata-se ter ficado evidente e provados todos requisitos para aplicação da CGAA tendo o sujeito passivo utilizado meios legais ao seu dispor intencionalmente para obter vantagens fiscais que merecem censura do direito sendo por isso ineficazes.
(...)
VI.10.2. ARGUMENTOS DA AT
Alega o sujeito passivo que a aplicação da CGAA ao seu caso concreto é uma ilegalidade e uma inconstitucionalidade.
No que respeita à verificação de uma ilegalidade considera não estarem preenchidos os requisitos necessários à aplicação da CGAA. Contudo e tal como foi demonstrado ao longo do presente procedimento, mais incisivamente nos pontos IV.3 e VI.9 e que nos abstemos, por economia processual voltar a repetir, todos os requisitos necessários à aplicação da CGAA, elencados no n.º 2 do artigo 38.º da LGT, foram precedentemente identificados e devidamente fundamentados.
No que concerne à pretensa existência de uma violação de princípios constitucionalmente consagrados invocados pelo sujeito passivo, nomeadamente a violação dos artigos 13.º e n.º 1 do artigo 103.º da CRP, trazendo ainda à colação o artigo 4º da LGT e o artigo 1.º do CIRC, constata-se que estes são invocados de forma vaga sem fazer qualquer correlação com o caso concreto, no entanto, cumpre lembrar que a possibilidade de aplicação da CGAA resulta do facto de a mesma se encontrar contemplada no ordenamento jurídico e em nenhum momento se está a utilizar uma faculdade que não resulte de uma norma prevista na lei.
Ainda assim, salienta-se que o artigo 4.º da LGT, sob a epígrafe "pressupostos dos tributos", identifica os tipos de tributos previsto no ordenamento jurídico, onde se incluem os impostos, sendo que tanto IMT como IRC estão abrangidos por essa categoria de tributos, tendo a sua criação obedecido ao disposto no n.º 2 do artigo 103.º da CRP. O Código do IMT foi criado, no âmbito da reforma do património e no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 26/2003 de 30 de julho, pelo decreto-lei n.º 287/2003 de 12 de novembro. O Código do IRC foi criado, no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 106/88 de 17 de setembro, pelo decreto-lei n.º442-B/88 de 30 de novembro. Constata-se pois que a sua criação obedeceu ao princípio da legalidade cumprindo os requisitos do n.º 2 da artigo 103.º da CRP.
Quanto à suposta violação dos artigos 13.º (princípio da igualdade) e n.º 1 do artigo 103.º da CRP (princípio da capacidade contributiva) notamos que a mesma não se verifica, antes pelo contrário, a não aplicação da CGAA neste caso concreto, isso sim, seria uma violação destes princípios constitucionais, pois a utilização do ordenamento jurídico com a intenção de obter um resultado que não é à partida o desejado pelo direito é uma violação do princípio da igualdade que visa assegurar a paridade dos cidadãos perante a lei geral e abstrata e proibir discriminações tanto positivas como negativas, é também uma violação do princípio da capacidade contributiva que promove a justa repartição dos rendimentos e da riqueza.
Quer as normas antiabuso especificas, quer a cláusula geral antiabuso encontram a sua razão de ser no comportamento fiscal evasivo ou fraudulento e, bem assim, na necessidade de se estabelecerem meios de reacção adequados a garantir o cumprimento do princípio da igualdade na repartição dos encargos tributários e, também, a satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas.
VI.11. CONCLUSÕES D A AT
No que respeita à situação descrita detalhadamente no presente procedimento de aplicação de CGAA e tendo-se verificado nos seguintes factos:
- Os outorgantes nos negócios jurídicos analisados no projeto de aplicação da CGAA são invariavelmente W... e X... nas suas diversas qualidades de gerentes, administradores ou representantes das sociedades envolvidas;
As sociedades envolvidas (A..., J... e I...) estão relacionadas entre si através de um emaranhado de participações sociais cruzadas que conduzem à concentração dos respetivos interesses societários;
A participação social maioritária de W... e X..., em conjunto, de forma direta e indireta, nas sociedades A..., J... e I...;
- A sua simultânea intervenção como administradores/gerentes e acionistas/sócios e os correspondentes interesses societários e financeiros inerentes traduz a concentração nas suas mãos do destino daquelas entidades;
As circunstâncias da constituição da sociedade I..., que se revelou ser, inclusive, até à presente data, um mero recetáculo da propriedade dos imóveis transmitidos;
A desvalorização para metade do valor atribuído aos imóveis, face ao seu valor de aquisição em 2010, sem justificação, mesmo numa conjuntura de crise como a verificada.
O sujeito passivo através de claro abuso das formas jurídicas consegue, tal como se demonstrou, obter uma vantagem fiscal em sede de IMT, no montante de € 533.000,00 e uma dedutibilidade de prejuízos em sede de IRC de €4.170.307,25.
Ao longo do presente procedimento de aplicação da CGAA foram apresentados os fundamentos que, de modo cabal e incontornável, vem justificar a atuação da AT conducente à reposição da verdade fiscal com recurso à Cláusula Geral Antiabuso, reforçando-se, naturalmente e por consequência o facto que se traduz na inexistência de qualquer inconstitucionalidade, ilegalidade ou falta de fundamento como alega o sujeito passivo.
Em face de tudo o que antes foi exposto estamos em condições concluir que se dão por provados todos os pressupostos necessários à aplicação da CGAA, não tendo o sujeito passivo apresentado no direito de audição elementos /argumentos que alterassem a posição firmada pela AT.
WW) Sequência da inspecção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu e a Requerente foi notificada nos termos do documento junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:
Assunto: LIQUIDAÇÃO DE IMT - ADICIONAL
Liquidação de IMT - Matéria Coletável: € 8.200.000,00; Taxa: 6.5%; Coleta: € 533.000,00; Parcela a Abater € 000,00; Coleta Devida: € 533.000,00
Fica V, Exa. notificado, nos termos do Art 60º Nº 6 da Lei Geral Tributária (LGT) para no prazo de 15 dias a contar da data da presente notificação exercer, querendo, o direito de audição relativamente à liquidação de Imposto Municipal de Transmissões Onerosas de imóveis (IMT) acima.
Fica ainda notificado, nos termos do Art 36º Nº 6 do Código do IMT, para no prazo de 30 dias a contar da data da presente notificação, proceder ao pagamento da quantia de € 533,000;00 respeitante a IMT e € 10.514,00 respeitante a juros compensatórios, relativo à aquisição a B..., Lda, dos prédios urbanos da extinta freguesia de ...(...) com os artigos ..., ..., ..., ..., ... ,... ... e ... atualmente da União de freguesias de ...(...) com os artigos ..., ..., ..., ..., ..., ... ... e ... todos terrenos para construção. Na liquidação inicial de IMT com o registo nº 2010/..., foi-lhe reconhecida a isenção de prédios para revenda, no entanto de acordo com o despachado resultante da ordem de inspeção externa número Ol 2014... que concluiu estarmos frente a uma Cláusula Geral Anti Abuso pelo que o imposto deve ser liquidado como se não tivesse existido qualquer transmissão.
Da liquidação de IMT, poderá reclamar no prazo de 120 dias (artº 70º do Código de Procedimento e Processo Tributário - CPPT) ou impugnar no prazo de 90 dias (artº 102º do CPPT, com os fundamentos referidos no art 99º do CPPT).
Findo o referido prazo sem que se mostre efetuado o pagamento, será extraída certidão de dívida nos termos do artº 88º Nº 1 do Código de Procedimento e Processo Tributário, conjugado com o artº 38º Nº3 do CIMT.
XX) Em 31-07-2019, a Requerente enviou à Autoridade Tributária e Aduaneira requerimento a suscitar a nulidade da notificação, bem como, cautelarmente, a exercer a audição prévia (documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
YY) Por ofício datado de 13-08-2019, a Requerente foi notificada de que o seu direito de audição tinha sido indeferido (Documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral);
ZZ) Em 26-08-2019, a Requerente enviou novo requerimento à Autoridade Tributária e Aduaneira a informar que o prazo para impugnar/apresentar pedido de constituição de tribunal arbitral não era de 15 dias, como referia na notificação, uma vez que tal disposição tinha sido revogada pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de Dezembro. (Documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
AAA) Em 28-10-2019, a Requerente, na pessoa do seu mandatário, foi notificada do mesmo despacho relativo ao documento n.º 3 (Documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
BBB) Em 16-12-2019, a Requerente deduziu reclamação graciosa contra a liquidação de IMT (Documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
CCC) À reclamação graciosa foi atribuído o n.º ...2019...;
DDD) Em 15-06-2020, a Requerente, através do seu mandatário, foi notificada do indeferimento da reclamação graciosa, nos termos do Documento n.º 7 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
EEE) Em 2016, houve um aumento de capital com entrada de novos sócios na I... (depoimento da testemunha G...);
FFF) Em 2016, o sócio X... deixou de pertencer a administração da I... (depoimentos das testemunhas G... e H...);
GGG) Presentemente a sucessora da I... (K ...) é detida não só pela J..., mas também por outras empresas do Grupo MM..., empresas estas que são sócias maioritárias (depoimento da testemunha e H...);
HHH) Para pagar à Requerente a compra dos terrenos, a I... pediu ao banco um descoberto autorizado, que utilizou para fazer o pagamento, e depois o descoberto foi pago com suprimentos que a J..., então sócia única da I... fez nesta (depoimento da testemunha G...);
III) Para fazer esses suprimentos, a J... fez um aumento de capital com prémio de emissão (depoimento da testemunha G...);
JJJ) A Requerente fez suprimentos à J..., para se associar aos resultados desta, que era e é uma empresa lucrativa (depoimento da testemunha G...);
KKK) No momento da transacção entre a Requerente e a I..., os sócios W... e X... eram administradores das duas empresas, mas a decisão não passou por eles exclusivamente, pois não eram sócios maioritários (depoimento da testemunha G...);
LLL) A J..., que era a principal interessada na I..., tinha outros sócios maioritários, com interesse em promover a construção nos terrenos referidos (depoimento da testemunha G...);
MMM) A decisão da Requerente em vender estava associada ao interesse da J... em promover a construção (depoimento da testemunha G...);
NNN) A criação da I... para levar a cabo a construção nos terrenos era tema que já se vinha falando vários meses antes da data da transacção e, inclusivamente, a promoção de uma avaliação particular e o pedido de alteração dos valores matriciais já foram feitos com esse objectivo (depoimento da testemunha G...);
OOO) Quando foi feita a escritura, a Requerente já sabia quais os valores matriciais que iam ser fixados, mas eles ainda não constavam das respectiva matrizes prediais, pelo que foram considerados nesta os valores matriciais anteriores (depoimentos das testemunhas G... e H...);
PPP) Foi atrasado o momento da escritura até ao limite dos três anos após a aquisição dos terrenos pela Requerente que determinavam a caducidade da isenção de IMT, para ver se, entretanto, passavam a constar das matrizes os novos valores e eles podiam ser considerados para efeitos de determinação do preço relevante a efeitos de IMT e Imposto do Selo (depoimento da testemunha G...);
QQQ) Não tendo sido possível fazer a escritura com base nos novos valores, a Autoridade Tributária e Aduaneira devolveu à I..., no início de 2014, o que havia pago em excesso (depoimento da testemunha G...);
RRR) A fixação dos novos valores matriciais foi feita com fundamento em rectificação de áreas, mas a desvalorização também foi relevante (depoimento da testemunha G...);
SSS) A actividade da Requerente era apenas revenda de imóveis (depoimento da testemunha G...);
TTT) Os lotes de terreno para construção em causa foram oferecidos pela Requerente para venda à empresa NN... em Setembro de 2013, pelo valor de € 4.500.000,00 (depoimento da testemunha OO...);
UUU) A empresa NN..., que não tinha então nenhum projecto de construção com dimensão em curso, analisou a proposta da Requerente, mas acabou por perder o interesse e não concretizou a aquisição (depoimento da testemunha OO...);
VVV) A empresa NN... não avançou com a aquisição, porque em ... havia excesso de oferta de construção e, principalmente, porque havia a acção pendente que dava incerteza sobre as possibilidades de construção e consideraram o preço excessivo para a localização dos terrenos (depoimento da testemunha OO...);
WWW) Em 2013, havia perspectiva de sair da crise do imobiliário, com o regime dos Vistos Gold (depoimento da testemunha OO...);
XXX) Por volta de finais de 2017, a sociedade K... (através dos sócios W... e QQ..., contratou a testemunha Arquitecto PP... para desenvolver projectos dos edifícios a construir nos terrenos referidos no autos, quer de engenharia quer de arquitectura (depoimento da testemunha PP...);
YYY) Em finais de 2017, já estavam feitos projectos de engenharia e foi feita uma proposta integrada com a arquitectura, que foi adjudicada à testemunha Arquitecto PP... e a professores do Instituto Superior Técnico (depoimento da testemunha PP...);
ZZZ) Nessa ocasião, o terreno foi limpo e vedado, foram consolidadas as estruturas e foi feito um levantamento topográfico (depoimento da testemunha PP...);
AAAA) Ainda não houve adjudicação dos projectos de especialidades, mas já foram realizadas reuniões de coordenação (depoimento da testemunha PP...);
BBBB) A testemunha Arquitecto PP... superintende o processo das obras nos terrenos e tem feito reuniões com a Câmara Municipal F... (depoimento da testemunha PP...);
CCCC) Os edifícios a construir têm 3 pisos para baixo e 6 para com a cota de soleira (depoimento da testemunha PP...).
2.2. Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto
Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral, os que constam do processo administrativo e, nos pontos indicados, a prova testemunhal.
As testemunhas aparentaram depor com isenção e com conhecimento directo dos factos dados como provados com base nos seus depoimentos.
A testemunha G... é contabilista certificado e prestava serviços à Requerente às datas em que ocorreram os factos dos autos, acompanhando a gestão da Requerente.
A testemunha H... foi administradora da Requerente entre 2011 e 2014 e actualmente trabalha na J..., mas já anteriormente acompanhava a administração da Requerente e tinha sido convidada para a vir a integrar.
A testemunha OO... trabalhava numa empresa a quem foi proposta pela Requerente a aquisição dos terrenos.
A testemunha OO... é professor universitário e arquitecto, tendo efectuado projectos para a sociedade K... .
3. Matéria de direito
Em 27-12-2010, a Requerente A... adquiriu terrenos para construção, beneficiando da Isenção pela aquisição de prédios para revenda, prevista no artigo 7.º do CIMT, actividade a que se dedicava habitualmente.
Nos termos do n.º 7 do artigo 11.º do CIMT, «a aquisição a que se refere o artigo 7.º deixará de beneficiar de isenção logo que se verifique que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda».
Em 27-12-2013, último dia do prazo de três anos referido, a Requerente vendeu os prédios adquiridos à I..., sociedade criada no dia anterior, tendo como única sócia a J..., de que eram sócios W... e X..., que também eram sócios da A... .
A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu aplicar a cláusula geral antiabuso, prevista no artigo 38.º, n.º 2, da LGT, retirando efeitos fiscais à venda, e exigindo à A... o IMT da relativo à aquisição dos prédios que fizera em 2010.
O artigo 38.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária, na redacção vigente em 2013, estabelece que «são ineficazes no âmbito tributário os actos ou negócios jurídicos essencial ou principalmente dirigidos, por meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas, à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em resultado de factos, actos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmente, sem utilização desses meios, efectuando-se então a tributação de acordo com as normas aplicáveis na sua ausência e não se produzindo as vantagens fiscais referidas».
É sobre a Autoridade Tributária e Aduaneira que recai o ónus da prova da verificação dos pressupostos da cláusula geral antiabuso, pois é ela que a invoca (artigo 74.º, n.º 1, da LGT).
3.1. Ordem de conhecimento dos vícios
A Requerente imputa à liquidação impugnada vícios procedimentais relativos à inspecção e à notificação para exercício do direito de audição e simultaneamente pagamento do imposto, e vício de violação de lei por falta de verificação dos pressupostos de aplicação da cláusula geral antiabuso.
O artigo 124.º do CPPT estabelece regras sobre a ordem de conhecimento de vícios em processo de impugnação judicial, que são subsidiariamente aplicáveis ao processo arbitral, por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT.
No caso de vícios geradores de anulabilidade, a alínea a) do n.º 2 daquele artigo 124.º estabelece que se deve conhecer prioritariamente dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos.
Os vícios da inspecção e da notificação são procedimentais e formais e a anulação com base neles, não obsta necessariamente à renovação do acto anulado, com supressão dos vícios.
Por isso, começar-se-á por apreciar o vício de violação de lei relativo à falta de pressupostos de aplicação da cláusula geral antiabuso.
3.2. Planeamento fiscal legítimo e ilegítimo
Nas definições elaboradas por SALDANHA SANCHES ( ): o planeamento fiscal legítimo «consiste numa técnica de redução da carga fiscal pela qual o sujeito passivo renuncia a um certo comportamento por este estar ligado a uma obrigação tributária ou escolhe, entre as várias soluções que lhe são proporcionadas pelo ordenamento jurídico, aquela que, por acção intencional ou omissão do legislador fiscal, está acompanhada de menos encargos fiscais»; enquanto que o planeamento fiscal ilegítimo «consiste em qualquer comportamento de redução indevida, por contrariar princípios ou regras do ordenamento jurídico-tributário, das onerações fiscais de um determinado sujeito passivo».
Dentro do quadro do planeamento fiscal podemos, assim, distinguir as situações em que o sujeito passivo actua contra legem, extra legem e intra legem.
Quando este actua contra legem, a sua actuação é frontal e inequivocamente ilícita, pois infringe directamente a lei fiscal, e configura uma fraude fiscal ( ) passível, inclusive, de ser objecto de censura contra-ordenacional ou criminal.
A actuação extra legem ocorre quando o sujeito passivo aproveita de forma abusiva a lei para chegar a um resultado fiscal mais favorável, pese embora este não a violar directamente. Este adopta «um comportamento que tem como finalidade exclusiva ou principal contornar uma ou várias normas jurídico-fiscais, de modo a conseguir a redução ou a supressão do encargo fiscal» ( ). Sendo que dessa ou dessas normas jurídico-fiscais se deve detectar uma tentativa de contornar «uma clara intenção de tributar afirmada pelos princípios estruturantes do sistema» ( ). Este tipo de actuação é comummente designado de «fraude à lei fiscal» mas, conforme alerta SALDANHA SANCHES, pretendendo melhor ilustrar e distinguir estas situações das de fraude fiscal, também designada de «evitação abusiva de encargos fiscais», «evitação fiscal abusiva» ou ainda «elisão fiscal» ( ).
Só se afigura legítima – e, assim, planeamento fiscal legítimo ou não abusivo – a actuação intra legem. Com efeito, a obtenção de uma poupança fiscal não constitui um comportamento proibido pela lei, desde que a actuação não se enquadre na supra referida actuação extra legem ( ).
A doutrina e a jurisprudência têm vindo a desconstruir a letra da norma apontando cinco elementos nela patentes. Correspondendo um dos elementos à estatuição da norma, os restantes quatro afiguram-se requisitos cumulativos que permitem aferir – como se de um teste se tratasse – quanto à verificação de uma actividade caracterizável como um planeamento fiscal abusivo ( ).
Estes elementos, em torno dos quais ambas as partes aliás constroem a sua argumentação, consistem:
– no elemento meio, que diz respeito à via livremente escolhida – acto ou negócio jurídico, isolado ou parte de uma estrutura de actos ou negócios jurídicos sequenciais, lógicos e planeados, organizados de modo unitário – pelo contribuinte para obter o desejado ganho ou vantagem fiscal; como decorre do texto do artigo 38.º, n.º 2, da LGT, os meios relevantes para aplicação da cláusula geral antiabuso têm de ser «artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas» ;
– no elemento resultado, que contende com a obtenção de uma vantagem fiscal, em virtude da escolha daquele meio, quando comparada com a carga tributária que resultaria da prática dos actos ou negócios jurídicos «normais» e de efeito económico equivalente ( );
– no elemento intelectual, que exige que a escolha daquele meio seja «essencial ou principalmente dirigid[a] [...] à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos» (artigo 38.º, n.º 2 da LGT), ou seja, que exige não a mera verificação de uma vantagem fiscal, mas antes que se afira, objectivamente, se o contribuinte «pretende um acto, um negócio ou uma dada estrutura, apenas ou essencialmente, pelas prevalecentes vantagens fiscais que lhe proporcionam» ( );
– no elemento normativo, que «tem por sua função primordial distinguir os casos de elisão fiscal dos casos de poupança fiscal legítima, em consideração dos princípios de Direito Fiscal, sendo que só nos casos em que se demonstre uma intenção legal contrária ou não legitimadora do resultado obtido se pode falar naquela »( );
– e, por fim, no elemento sancionatório, que, pressupondo a verificação cumulativa dos restantes elementos, conduz à sanção de ineficácia, no exclusivo âmbito tributário, dos actos ou negócios jurídicos tidos por abusivos, «efectuando-se então a tributação de acordo com as normas aplicáveis na sua ausência e não se produzindo as vantagens fiscais referidas» (parte final do artigo 38.º, n.º 2, da LGT).
Apesar desta desconstrução, a análise dos elementos não pode ser estanque, pois, como realça COURINHA, «a fixação de um elemento pode, na prática, depender de um outro», pelo que estes «não deixarão com frequência [...] de auxiliar-se mutuamente» ( ).
3.3.1. Elementos meio e intelectual
Como se referiu, o elemento meio, que diz respeito à via livremente escolhida pelo contribuinte para obter o desejado ganho ou vantagem fiscal. Como exige o n.º 2 do artigo 38.º, os meios relevantes para aplicação da cláusula geral antiabuso tem de ser qualificáveis como «artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas».
O elemento intelectual, que exige que a escolha daquele meio seja «essencial ou principalmente dirigid[a] [...] à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos» (artigo 38.º, n.º 2 da LGT), ou seja, que o contribuinte «pretende um acto, um negócio ou uma dada estrutura, apenas ou essencialmente, pelas prevalecentes vantagens fiscais que lhe proporcionam».
No caso em apreço, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que se verifica este elemento dizendo, em suma:
No caso em apreço o elemento meio está patente na celebração do contrato de compra e venda de 27 de dezembro de 2013, em que a sociedade A..., pelo preço de € 4.126.140,00, aliena os imóveis mencionados no ponto III.1.2. à sociedade I..., cuja constituição se concretizara no dia imediatamente anterior, mediante decisão tomada pelos órgãos sociais da J..., única detentora do seu capital social, e lavrada em ata uma semana antes.
Acresce ainda que o controlo quer do capital social quer dos órgãos de decisão nas três sociedades é pertença em conjunto de W... e X... .
Mais ainda se verificou que, pela análise dos movimentos bancários, o montante referente ao preço a pagar pela I..., tem a sua origem na própria alienante A..., conforme descrição no ponto III.1.5.
De salientar ainda que conforme referido no ponto III.1.2, apesar dos gerentes da J... W... e X... alegarem que a data de final de dezembro para a constituição da I... e a celebração do contrato de compra e venda entre esta sociedade e a A..., foi o reflexo de uma negociação que culminou nessa altura, constatou-se que na realidade entre a decisão de celebrar tais atos e a sua concretização decorreu um período muito curto, concluindo-se que a data escolhida para transferir a propriedade dos imóveis teve como objetivo evitar a caducidade da isenção e permitir o apuramento de um prejuízo fiscal elevado.
Esta conclusão alicerça-se no facto de existir um processo judicial em curso que impede a I... de iniciar a construção no curto prazo, bem como na falta de capacidade financeira da J... e da I... em proceder pelos seus próprios recursos, a tal aquisição.
Assim, estamos perante um conjunto de atos encadeados, configurando a efetiva vontade dos intervenientes, que se inicia com a deliberação dos órgãos societários da J..., culminando com a constituição da I... e com o contrato de compra e venda exatamente naquela data, com o propósito essencial de obtenção de vantagens fiscais por parte da A... .
A tese da Autoridade Tributária e Aduaneira tem como pressuposto a sua conclusão de que a gestão das três sociedades envolvidas, A..., I... e J..., era controlada conjuntamente pelos administradores/gerentes W..., X...:
Conclui-se que W... e X... têm, na prática, o controlo das sociedades A..., I... e J... por disporem do "poder de gerir as políticas financeiras e operacionais", sendo administradores/gestores e ainda detendo em conjunto por via direta e Indireta uma participação superior a 50% do capital social das entidades, possuindo o controlo societário.
(...)
W... e X..., utilizaram a sua influência, obtida através das suas participações diretas e indiretas conjuntas, na J..., para que esta se constituísse como a única sócia da I..., à qual foram vendidos os prédios que asseguraram deliberadamente de forma artificiosa, a obtenção de vantagens fiscais para a A... .
Neste pressuposto, invocado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, de que havia uma gestão comum dos interesses das sociedades pelos referidos W... e X..., afigura-se claro que a escolha para a venda do último dia do prazo de três anos findo o qual caducava a isenção provisória de que a A... beneficiava não é uma coincidência e que a venda nessa data teve como objectivo evitar que caducasse a isenção.
A prova testemunhal é no sentido de as partes no contrato terem estado a aguardar até essa data que fossem actualizadas as matrizes prediais em que foram reduzidos os valores patrimoniais, para serem menores os encargos de Imposto do Selo e IMT a pagar pela I..., e o facto de acabarem por celebrar o contrato quando ainda não tinha ocorrido essa esperada actualização revela que a única razão para a realização da venda nessa data, e não quando a actualização ocorresse, foi evitar que a isenção caducasse.
Por outro lado, não havia qualquer outra razão para apressar a transacção, pois, como bem diz a Autoridade Tributária e Aduaneira, a pendência da acção de duração imprevisível em que se discutia a volumetria de construção inviabilizava qualquer construção imediata.
Assim, a pressa em realizar a escritura sem sequer esperar pela actualização em baixa dos valores matriciais, que já era conhecida pela A..., obrigando a maior dispêndio momentâneo a título de Imposto do Selo e IMT por parte da I..., só pode ter com explicação a vontade concertada da J... e da A... de evitarem a caducidade da isenção.
Como diz a Autoridade Tributária e Aduaneira, noutro ponto do RIT, «não se vislumbra nem foi apresentada justificação razoável para a criação da I... e transmissão dos bens naquele preciso momento e não posteriormente quando efetivamente pudesse iniciar a construção do empreendimento».
É também claro, à face das regras da experiência comum, que, havendo uma gestão concertada dos interesses das sociedades envolvidas, por via dos poderes de administração de W... e X..., a criação pela J... da I..., no dia anterior ao da caducidade da isenção de que beneficiara a A..., visou criar as condições para evitar a caducidade da isenção.
Esta conclusão permite considerar verificado o elemento intelectual, pois a realização da venda efectuada pela A... à I... foi efectuada, no momento em que o foi, com o objectivo primacial de obter a eliminação do IMT que a A... teria de pagar na sequência da caducidade da isenção.
No entanto, para aplicação da cláusula geral antiabuso não basta que a realização de um negócio vise primacialmente objectivos fiscais, pois é imprescindível, no âmbito do elemento meio, que sejam utilizados «meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas».
Como se referiu, o elemento meio, que diz respeito à via livremente escolhida pelo contribuinte para obter o desejado ganho ou vantagem fiscal. Como exige o n.º 2 do artigo 38.º, os meios relevantes para aplicação da cláusula geral antiabuso tem de ser qualificáveis como «artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas».
No caso em apreço, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que se verifica este elemento meio dizendo, em suma:
No caso em apreço o elemento meio está patente na celebração do contrato de compra e venda de 27 de dezembro de 2013, em que a sociedade A..., pelo preço de € 4.126.140,00, aliena os imóveis mencionados no ponto III.1.2. à sociedade I..., cuja constituição se concretizara no dia imediatamente anterior, mediante decisão tomada pelos órgãos sociais da J..., única detentora do seu capital social, e lavrada em ata uma semana antes.
Acresce ainda que o controlo quer do capital social quer dos órgãos de decisão nas três sociedades é pertença em conjunto de W... e X... .
Mais ainda se verificou que, pela análise dos movimentos bancários, o montante referente ao preço a pagar pela I..., tem a sua origem na própria alienante A..., conforme descrição no ponto III.1.5.
De salientar ainda que conforme referido no ponto III.1.2, apesar dos gerentes da J..., W... e X... alegarem que a data de final de dezembro para a constituição da I... e a celebração do contrato de compra e venda entre esta sociedade e a A..., foi o reflexo de uma negociação que culminou nessa altura, constatou-se que na realidade entre a decisão de celebrar tais atos e a sua concretização decorreu um período muito curto, concluindo-se que a data escolhida para transferir a propriedade dos imóveis teve como objetivo evitar a caducidade da isenção e permitir o apuramento de um prejuízo fiscal elevado.
Esta conclusão alicerça-se no facto de existir um processo judicial em curso que impede a I... de iniciar a construção no curto prazo, bem como na falta de capacidade financeira da J... e da I... em proceder pelos seus próprios recursos, a tal aquisição.
Assim, estamos perante um conjunto de atos encadeados, configurando a efetiva vontade dos intervenientes, que se inicia com a deliberação dos órgãos societários da J..., culminando com a constituição da I... e com o contrato de compra e venda exatamente naquela data, com o propósito essencial de obtenção de vantagens fiscais por parte da A... .
Uma actuação dos sujeitos passivos que beneficiam de uma isenção temporária no sentido de evitarem que ela caduque não é, decerto, uma actuação censurável, antes é a conduta expectável em termos de boa gestão empresarial e que é mesmo implicitamente desejada e incentivada pela lei, ao fixar o prazo de caducidade da isenção.
Na verdade, são «benefícios fiscais as medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem» (artigo 2.º, n.º 1, do Estatuto dos Benefícios Fiscais EBF).
Neste caso, tratando-se de uma isenção (e não situação de não sujeição), há que partir do pressuposto de que legislativamente se pretendeu atingir fins extrafiscais considerados superiores aos da tributação.
No caso em apreço, como aventa a Requerente, afigura-se que o objectivo último da isenção é evitar que ocorra uma excessiva oneração do preço dos imóveis, derivada de dupla oneração com a tributação em IMT, num período curto.
Na verdade, a ser pago IMT pela empresa comercializadora de imóveis, o imposto será um gasto da sua actividade, que naturalmente se reflectirá no preço de venda aos seus clientes, que assim, se veriam, na prática, duplamente onerados com pagamento de IMT, um incorporado no preço de venda dos imóveis e outro o pagamento normal de IMT por adquirente que não goza de isenção. Por sua vez, a caducidade ao fim de três terá subjacente o entendimento legislativo de que é o prazo suficiente para a comercialização, findo o qual se presumirá que não foi adquirido como mercadoria, mas sim como propriedade de investimento.
De qualquer modo, o estabelecimento da caducidade da isenção ao fim de três anos tem necessariamente subjacente uma preferência legislativa de que os contribuintes procedam à venda dentro desse prazo, para, assim, ficar satisfeito o interesse público extrafiscal necessariamente visado com a isenção, considerado mais relevante que a tributação.
O que significa que, quando estão a criar as condições para que a isenção subsista, os contribuintes não estão, em princípio, a actuar contra legem ou extra legem, mas sim intra legem, isto é, estão a agir para que se concretize o fim extrafiscal, seja qual for, que na perspectiva legislativa justifica a isenção.
E, obviamente, sendo fixado um prazo legal para caducidade da isenção, é indiferente, na perspectiva legislativa, que o contribuinte proceda à venda em qualquer dia desse prazo, inclusivamente no último, para estar a actuar em sintonia com a lei.
Por outro lado, afigura-se que não tem necessariamente natureza artificiosa ou fraudulenta, no âmbito de sociedades relacionadas e com gestão concertada (como no caso em apreço a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu existir com a gestão de W... e X...), a especialização de actividades entre elas e, designadamente, que uma sociedade que pretende concretizar um projecto que envolve riscos consideráveis opte por autonomizar uma parte do seu património, para «isolar o risco associado à concretização do projeto», isto é, evitar que os possíveis efeitos negativos do projecto afectem a estabilidade da empresa que o pretende implementar.
Foi isso, afinal, o que sucedeu com a J..., ao criar a I..., como sociedade unipessoal de que era a única sócia, segundo o seu administrador X... informou a Autoridade Tributária e Aduaneira:
Conforme as declarações prestadas por X..., na qualidade de gerente da I..., em 16 de julho de 2015 e transcritas no ponto III.1.1., o declarante afirma que o objetivo é de isolar o risco associado à concretização do projeto. Apresentando, deste modo, uma justificação puramente empresarial, querendo com isto dizer que a concretização do empreendimento envolve riscos financeiros associados aos seus elevados custos de construção que poderiam pôr em causa a estabilidade patrimonial da J... .
O obstáculo à aceitação desta justificação invocado no Relatório da Inspecção Tributária é o de que «tal justificação não se afigura suficiente uma vez que a existência do processo judicial em curso impede, mesmo até à presente data, a prossecução de tais desígnios, ou seja, o início da construção do empreendimento. Situação que era do conhecimento das duas sociedades intervenientes no negócio».
No entanto, o facto de a construção não poder iniciar-se de imediato, por estar pendente a acção, não afecta a razoabilidade da decisão da J... de criação da I..., como acto de prudente gestão empresarial, ao autonomizar um património, através de uma sociedade de responsabilidade limitada, para adquirir e levar a cabo a construção nos terrenos de que poderiam provir riscos para a estabilidade da J... .
Como também se afigura decisão de normal gestão empresarial, sob a mesma perspectiva de optimização da gestão empresarial dos interesses comuns das sociedades referidas, que, perante a constatação de que a A... não conseguia vender os terrenos pelos preços que pretendia dentro do prazo de caducidade da isenção, a J... criasse uma sociedade para os adquirir, antes que a caducidade ocorresse, e levar a cabo a construção, o que, para além de satisfazer o interesse patrimonial da A... quanto à isenção, se harmoniza com a satisfação do interesse público extrafiscal subjacente, que legislativamente se considera satisfeito com manutenção da isenção e não com a sua caducidade.
Assim, afigura-se que estes actos de gestão só poderão integrar o elemento meio da cláusula geral antiabuso se se detectar algum artifício ou desígnio fraudulento, designadamente por não corresponderem à realidade, por um lado, a anunciada declaração da A... de que adquirira os prédios para revenda ou, por outro lado, a proclamada intenção de a I... levar a cabo construção dos terrenos.
Na verdade, não havendo qualquer restrição legal quanto às caraterísticas do comprador para efeitos de caducidade da isenção, designadamente não sendo afastada a relevância de vendas a entidades relacionadas, a realização da venda a uma sociedade do mesmo grupo criada propositadamente para adquirir os terrenos para construção antes que caducasse a isenção afigura-se caber dentro do âmbito do planeamento fiscal legítimo, desde que a intenção de construção pela sociedade adquirente corresponda à realidade, isto é, desde que esta não seja «um mero recetáculo da propriedade» criado par obter fins fiscais, como considerou a Autoridade Tributária e Aduaneira no ponto VI.4.2. do RIT.
No que concerne à intenção da A... adquirir os terrenos para revenda, não há razão para duvidar, já que a própria Autoridade Tributária e Aduaneira afirma no ponto «II.3.4.1.3. Atividade efetivamente exercida» que ela «exerce a atividade de revenda de imóveis, extraindo-se tal evidência da análise dos seguintes documentos e da forma como os mesmos foram relevados na contabilidade...». Por isso, é de presumir que os terrenos foram adquiridos para essa única actividade que se provou ser efectivamente exercida.
Por outro lado, a testemunha OO... afirmou que, em Setembro de 2013, foi proposta à empresa NN... a aquisição dos terrenos, não se tendo concretizado a transacção, essencialmente por o preço ter sido considerado excessivo, para a localização dos terrenos.
Por isso, não há qualquer razão para duvidar da afirmação da A... de que adquiriu os terrenos para venda, tentou vendê-los e só não os vendeu antes do momento em que os vendeu porque não conseguiu.
Assim, só se a intenção de construção pela I... não corresponder à realidade se poderá afirmar que a criação desta e subsequente aquisição dos terrenos serão um meio artificioso ou fraudulento para evitar a caducidade da isenção.
Mas, a prova produzida aponta no sentido de ser real a opção da J... pela construção nos lotes, perante a inviabilidade de a A... os vender.
Na verdade, desde logo, a posição da Autoridade Tributária e Aduaneira enferma de erro sobre os pressupostos de facto ao entender que
... desde que a I... se tornou proprietária dos imóveis não se comprovou ter efetuado diligências para o desenvolvimento do projeto, mesmo as mais elementares e básicas, designadamente Junto do Município F..., tomar as medidas necessárias ao averbamento do seu nome como proprietário no alvará de loteamento n.º .../2006, tal se concluindo da informação prestada pelo próprio Município que nos informou que a última alteração ao alvará teve lugar em 25 de setembro de 2012.
Com efeito, resulta da prova produzida que, em 17-07-2015, a I... solicitou à Câmara F..., o averbamento do Processo .../00 em seu nome (Documento n.º 17 junto com o pedido de pronúncia arbitral) e esse pedido foi deferido com a data de 20-08-2015 (Documento n.º 18 junto com o pedido de pronúncia arbitral).
Esse processo 973/00 reporta-se ao loteamento para que foi emitido o alvará .../2006 a que se refere a Autoridade Tributária e Aduaneira (como se confirma pela sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que consta do documento n.º 19).
Poderá ter havido algum equívoco na informação a que alude a Autoridade Tributária e Aduaneira por se fazer referência ao alvará e não ao processo em que ele foi emitido, mas o que resulta da prova produzida é que o processo em que foi emitido esse alvará foi averbado em nome da I... .
Consequentemente, enferma de erro sobre os pressupostos de facto o juízo que a Autoridade Tributária e Aduaneira fez com base na referida informação no sentido de a I... não ter sequer efectuado uma diligência para suceder na titularidade dos direitos da A... relativamente ao referido loteamento.
E é esse errado juízo que está subjacente à conclusão formulada pela Autoridade Tributária e Aduaneira de a I... ser «um mero recetáculo da propriedade dos imóveis transmitidos», que invocou para aplicar a cláusula geral antiabuso.
Por outro lado, a pendência da acção no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada em que se discutia a volumetria dos edifícios a construir nos terrenos justifica perfeitamente a inércia da I... (com a alteração da sua designação para L..., Unipessoal, Lda, a partir de 05-08-2016) em fazer outras diligências para concretizar as construções, designadamente encomendar projectos. De qualquer forma, a prova produzida é no sentido de a I... durante a pendência da acção não ter uma inércia completa, pois tratava da limpeza e manutenção dos terrenos, como referiu a testemunha G... .
Por isso, não se pode ver nessa inércia da I... até ao início do ano de 2017, em que foi decidida a acção, um indício de que a I... seria um «mero receptáculo da propriedade» dos terrenos (como aventa a Autoridade Tributária e Aduaneira) e não uma verdadeira proprietária que os destinava a construção.
A confirmação de que a aquisição se destinou mesmo a construção pela I... (com as alterações de designação posteriores para L... e K...) foi abundantemente feita no presente processo, com prática de uma série de actos com esse fim:
– em Março de 2017, a planta síntese do loteamento já se encontrava averbada em nome da L..., Unipessoal, Lda. (nova designação da I...);
– ainda no ano de 2017, a L..., solicitou à M... a indicação de quais os trabalhos a realizar para preparar os terrenos, tendo este enviado uma carta com a descrição dos trabalhos a realizar, que foram efectivamente realizados durante o ano de 2017;
– por volta de finais de 2017, a sociedade K... (nova designação da I...) contratou a testemunha Arquitecto PP... para desenvolver projectos dos edifícios a construir nos terrenos referidos no autos, quer de engenharia quer de arquitectura;
– em finais de 2017, já estavam feitos projectos de engenharia e foi feita uma proposta integrada com a arquitectura, que foi adjudicada à testemunha Arquitecto PP... e a professores do Instituto Superior Técnico;
– nessa ocasião, o terreno foi limpo e vedado, consolidadas as estruturas e feito um levantamento topográfico;
– no início de 2019, a L..., Unipessoal, Lda iniciou o processo de construção dos prédios nos terrenos em causa, tendo solicitado diversos orçamentos de arquitetura e das especialidades e tendo obtido propostas de diversas empresas que pretendem prestar tais serviços;
– em 31-05-2019, a K..., Lda. requereu à Câmara F... alterações às especificações de alvará de licença de loteamento, relativas ao Processo .../00;
– em 28-06-2019, entregou diversos elementos para apreciação, relativas ao Processo .../00;
– a K... solicitou à S..., Lda., o levantamento topográfico dos terrenos, o que foi efectuado em Dezembro de 2019;
– em 15-05-2020, a K... efectuou comunicação prévia à Câmara F... de obras de construção na área abrangida pelo loteamento;
– em 27-05-2020, a K... procedeu à entrega de documentos na Câmara Municipal F... respeitantes à licença de edificação;
É, assim, inequívoco, à face da prova produzida, que a aquisição dos terrenos pela I... não se destinou apenas a transmitir formalmente para ela a propriedade dos terrenos (isto é, não se destinou a torná-la um «mero receptáculo da propriedade»), antes foi uma verdadeira aquisição com finalidade de levar a cabo construções por esta empresa nos terrenos adquiridos.
Neste contexto, não se pode considerar demostrado que a venda dos terrenos pela A... à I... tenha sido um meio artificioso ou fraudulento de evitar a caducidade a isenção, embora esse objectivo também tenha sido visado.
Como diz a Requerente, «a I..., Unipessoal, Lda. praticou inúmeros atos e condutas que evidenciam, sem sombra de dúvida, a sua qualidade de proprietária efetiva e real dos imóveis», não sendo apenas um veículo para que a A... não pagasse IMT.
Por isso, a aplicação da cláusula geral antiabuso sem que se verifiquem estes requisitos previstos no artigo 38.º, n.º 2 da LGT, que integram o elemento meio, enferma de erro sobre os pressupostos de facto e de direito.
Por outro lado, ao considerar a Autoridade Tributária e Aduaneira como pressuposto relevante da aplicação da cláusula geral antiabuso a falsa informação de que, quando foi elaborado o RIT, o processo de loteamento ainda não estava averbado em nome da I..., a decisão de aplicação enferma de erro sobre os pressupostos de facto.
3.4. Decisão da reclamação graciosa
A reclamação graciosa confirmou a liquidação impugnada com a fundamentação utilizada no RIT, pelo que a sua decisão enferma dos mesmos vícios de violação do artigo 38.º, n.º 2, da LGT e de erro sobre os pressupostos de facto, pelo que também se justifica a sua anulação.
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3.5. Questões de conhecimento prejudicado
Como se referiu, os requisitos de aplicação da cláusula geral antiabuso que se indicaram são cumulativos, pelo que a não verificação de uns dos elementos indicados, inviabiliza essa aplicação.
Os vícios decorrentes da fala de preenchimento do elemento meio e de erro sobre os pressupostos de facto justificam a anulação da decisão de aplicação da cláusula geral antiabuso e da consequente liquidação de IMT, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.
Sendo a falta de preenchimento do elemento meio um vício que obsta à renovação da liquidação, fica prejudicado, por ser inútil (artigos 130.º e 608.º, n.º 2, do CPC), o conhecimento dos restantes vícios que são imputados pela Requerente à liquidação impugnada.
Na verdade, o artigo 124.º do CPPT, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, do RJAT, ao estabelecer uma ordem de conhecimento de vícios, pressupõe que, julgado procedente um vício que assegura a eficaz tutela dos direitos dos impugnantes, não é necessário conhecer dos restantes, pois, se fosse sempre necessário apreciar todos os vícios imputados ao acto impugnado, seria indiferente a ordem do seu conhecimento.
Pelo exposto, não se toma conhecimento dos restantes vícios imputados pela Requerente.
4. Decisão
De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
b) Anular a liquidação de IMT no valor de € 533.000,00 referida na alínea WW) da matéria de facto fixada;
c) Anular a decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º ...2019....
5. Valor do processo
De harmonia com o disposto nos artigos 296.º, n.º 2, e 306.º do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 543.514,00, indicado pela Requerente, sem oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira.
6. Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 8.262,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 14-06-2021
Os Árbitros
(Jorge Lopes de Sousa)
(Ricardo Marques Candeias)
(Mariana Vargas)
[1] Cfr. Saldanha Sanches, J.L., Os Limites do Planeamento Fiscal, Coimbra Editora, Coimbra, 2006, p. 21.
[2] Cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 12-02-2011, processo n.º 04255/10.
[3] Cfr. Jónatas Machado e Nogueira da Costa, Curso de Direito Tributário, Coimbra Editora, Coimbra, 2009, pp. 340-341.
[4] Cfr. Saldanha Sanches, J.L., Os Limites..., p. 181.
[5] Cfr. Saldanha Sanches, J.L., Os Limites..., pp. 21-23; ainda Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 12-02-2011, processo n.º 04255/10.
[6] Cfr. Saldanha Sanches, J.L., Reestruturação de empresas e limites do planeamento fiscal, As duas constituições – nos dez anos da cláusula geral antiabuso, Coimbra Editora, Coimbra, 2009, pp. 49-50, que afirma, a este respeito: «a consagração da cláusula geral antiabuso implica [...] que a partir da sua introdução está claramente delimitado aquilo que o sujeito passivo pode e não pode fazer. As habilidades fiscais, a destreza fiscal deixam de ser possíveis (as operações artificiosas e fraudulentas que têm como fim principal ou exclusivo a obtenção de uma poupança fiscal mediante a fraude à lei) e o sujeito passivo passa a ter o seu comportamento julgado de acordo com este critério. [...] a evolução da lei é clara no sentido de proporcionar fundamento legal para o planeamento fiscal, desde que seja praticado sem o abuso de formas jurídicas, sem negócios jurídicos artificiosos e fraudulentos mas limitando-se a escolher a via que se encontra aberta e que lhe permite realizar economias fiscais». Cfr., também, Marques, Paulo, Elogio do Imposto, Coimbra Editora, Coimbra, 2009, pp. 360-364.
[7] Ou seja, a uma «actuação planeada do contribuinte que se traduz num comportamento aparentemente lícito, geradora de uma vantagem fiscal não admitida pelo ordenamento tributário» (cfr. Courinha, Gustavo Lopes, Cláusula Geral Antiabuso no Direito Tributário: Contributos para a sua compreensão, Almedina, Coimbra, 2009, pp.15-17 e 163-165; bem como Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 15-02-2011, proc. n.º 04255/10, conclusões XIII e XIV).
[8] Tal decorre do seguinte segmento do artigo 38.º, n.º 2, da LGT: «redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em resultado de factos, actos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmente, sem utilização desses meios». Decorre ainda do artigo 63.º, n.º 3, alíneas a) e b) do CPPT, na redacção dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, que exigem que a Administração Tributária inclua na sua fundamentação, respectivamente, «a descrição do negócio jurídico celebrado ou do acto jurídico realizado e dos negócios ou actos de idêntico fim económico, bem como a indicação das normas de incidência que se lhes aplicam» e «a demonstração de que a celebração do negócio jurídico ou prática do acto jurídico foi essencial ou principalmente dirigida à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em caso de negócio ou acto com idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais».
[9] Cfr. Courinha, Gustavo Lopes, Cláusula..., p. 180.
[10] Cfr. Courinha, Gustavo Lopes, Cláusula..., p. 211.
[11] Cfr. Courinha, Gustavo Lopes, Cláusula..., p. 165. Identicamente, Saldanha Sanches, J.L., Os Limites..., p. 170, que aponta uma «relação de conexão e interdependência em relação aos requisitos exigidos pela lei».