SUMÁRIO:
No cálculo do ISV devido por veículos usados portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados membros da União Europeia, o artigo 11.º, n.ºs 1 e 2 do Código do ISV dispunha, à data dos factos, que “o imposto incidente sobre veículos portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados membros da União Europeia é objeto de liquidação provisória nos termos das regras do presente Código, com exceção da componente cilindrada à qual são aplicadas as percentagens de redução previstas na tabela D ao imposto resultante da tabela respetiva, as quais estão associadas à desvalorização comercial média dos veículos no mercado nacional (…)”. A norma contida no artigo 11º do Código do ISV mostra-se incompatível com o disposto no artigo 110º do TFUE porquanto determina que o cálculo do imposto sobre veículos usados oriundos de outro EM seja efetuado sem se ter em conta a depreciação dos mesmos, de tal forma que o imposto resultante da sua aplicação ultrapassa o montante de ISV contido no valor residual de veículos usados similares que já foram registados no EM de importação, ou seja, dos veículos usados nacionais.
DECISÃO ARBITRAL
A árbitro Raquel Franco, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral, constituído em 11.09.2020, decide nos termos que se seguem:
1. Relatório
A, contribuinte fiscal n.º …, com domicílio na …, …, Braga, (doravante, o "Requerente"), tendo sido notificado através do Ofício n.º …, de 01.04.2020, do despacho proferido pelo Diretor do Serviço Central dos Impostos Especiais sobre o Consumo e Imposto sobre Veículos, no sentido do indeferimento do recurso hierárquico n.º 0...8, interposto contra a decisão de indeferimento liminar da revisão oficiosa do ato de liquidação de Imposto sobre Veículos (ISV) n.º 2019/0...8, vem contra tal liquidação e decisão apresentar pedido de pronúncia arbitral ao abrigo dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 15.º e seguintes do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT).
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante também identificada por “AT” ou simplesmente “Administração Tributária”).
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 19.06.2020.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular a signatária, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 12.08.2020, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação, nos termos conjugados das alíneas a) e e) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral foi constituído em 11.09.2020.
A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta, em que defendeu a extemporaneidade do pedido, e a consequente exceção de caducidade do direito de ação, que determina que a Requerida seja absolvida do pedido.
Tendo em conta a exceção invocada, notificou-se a Requerente para, no prazo de 10 dias, exercer o contraditório sobre a mesma, o que esta veio a fazer a 04.11.2020. Esta questão será analisada após a seleção da matéria de facto.
Por despacho de 02.09.2020, foi decidido dispensar a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado na alínea e) do n.º 1 do artigo 2.º, e do n.º 1 do artigo 10.º, ambos do RJAT e é competente.
As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigo 4.º e n.º 2 do artigo 10.º, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades.
Através de despacho de 08.12.2021, o Tribunal fixou prazo para alegações. Contudo, a referida faculdade não foi aproveitada pelas Partes.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão:
A. O Impugnante adquiriu na Alemanha e introduziu em Portugal, para seu uso particular, o veículo automóvel de passageiros, da marca BMW, modelo 640d, movido a gasóleo, com o quadro n.º ….
B. Tal veículo foi adquirido em estado de usado, com 43.198 km percorridos.
C. No país de origem, o veículo tinha sido matriculado pela primeira vez em 16.06.2014, com a matrícula ....
D. A 23.03.2019, o Requerente apresentou, junto da Alfândega de Braga, a DAV para introdução no consumo da referida viatura ligeira de passageiros – a que foi atribuído o n.º 2019/0...6.
E. Na referida DAV, concretamente no que diz respeito ao Quadro E - “Características do Veículo” -, o Requerente inscreveu, no ponto 50, relativo à “Emissão de Gases CO2”, o valor de 158g/Km e no ponto 51, respeitante à “Emissão de partículas”, o valor de 0,0002 g/Km.
F. Tendo em consideração a data da primeira matrícula (no país de origem), foi o veículo em questão considerado, para efeitos dos escalões da Tabela D, prevista no n.º 1 do artigo 11.º do Código do ISV, como um veículo com mais de quatro a cinco anos de uso, ao qual corresponde uma percentagem de redução de 43%.
G. No “Quadro R” da referida DAV, relativo ao cálculo do ISV, verifica-se que o cálculo do imposto foi efetuado pela AT com recurso à aplicação da tabela aplicável aos veículos ligeiros de passageiros (Tabela A-3.º), pelo valor total de € 13.717,59.
H. No que diz respeito à componente cilindrada, o valor de € 9.544,58 foi deduzido pela quantia correspondente a 43% do seu montante, ou seja, € 4.104,17.
I. Relativamente ao montante de € 8.277,18, respeitante à parte do ISV incidente sobre a componente ambiental, não foi aplicada qualquer percentagem de dedução.
J. A liquidação de imposto foi integralmente paga pelo Requerente.
K. Ao veículo em causa veio a ser atribuída a matrícula ...-...-....
L. O Requerente apresentou um pedido de revisão oficiosa da liquidação descrita em 06.09.2019.
M. Desta decisão apresentou a Requerente, em 14.02.2020, junto da Diretora Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), recurso hierárquico, (que deu origem ao Procedimento de Recurso Hierárquico n.º 0...8).
N. Através do ofício n.º …, de 04.03.2020, da DSIECIV, rececionado em 09.03.2020, o Requerente foi notificado do projeto de decisão de indeferimento, ao qual não respondeu.
O. Em 01.04.2020 foi proferido despacho de indeferimento do recurso hierárquico.
P. Em 19.06.2020, o Requerente apresentou o presente pedido de pronúncia arbitral.
2.2. Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto
Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.
A fixação da matéria de facto baseia-se nos documentos juntos pelo Requerente e no processo administrativo.
Não há controvérsia sobre a matéria de facto relevante para decisão da causa.
3. Matéria de direito
3.1 Questão prévia: a exceção de intempestividade invocada pela AT
A AT invocou a exceção de intempestividade do pedido nos seguintes termos:
Entende a Requerida que, no caso dos autos, procede a exceção da intempestividade do pedido arbitral, com base na extemporaneidade do pedido de revisão da liquidação efetuada e do recurso hierárquico subsequente, cujo indeferimento está na origem do presente pedido arbitral, nada havendo a censurar na decisão da Autoridade Tributária e Aduaneira/Alfândega de Braga por ter decidido nesse sentido.
Com efeito, constata-se que o meio jurídico utilizado pelo Requerente para apresentar a impugnação no tribunal arbitral foi o despacho de indeferimento do recurso hierárquico apresentado pelo requerente, em 14.02.2020, na sequência do indeferimento do pedido de revisão oficiosa apresentada em 06.09.2019.
Considera a Requerida que não pode o Requerente pretender justificar a tempestividade do pedido de pronúncia arbitral com base no indeferimento do recurso hierárquico que manteve o indeferimento do pedido de revisão, extemporâneo, pois, deste modo estaria aberto o caminho para continuar a discutir a legalidade de atos tributários relativamente aos quais findaram já os respetivos prazos de contestação.
O Requerente apresentou, em 19.06.2020, o presente pedido de pronúncia arbitral, na sequência do indeferimento, datado de 01.04.2020, do recurso hierárquico apresentado junto da Directora-Geral da AT, em 14.02.2020, do despacho do Director da Alfândega de Braga, que indeferiu, em 13.01.2020, o pedido de revisão apresentado em 06.09.2019, da liquidação de ISV constante da DAV nº 2019/0...6, (cfr. P.A.), apresentada em 23.03.2019 junto da Alfândega de Braga, cujo termo do prazo de pagamento do imposto ocorreu em 03.04.2019.
Tal pedido de revisão foi indeferido, com fundamento na sua intempestividade, tendo a administração aduaneira analisado o pedido face ao disposto no artigo 78.º da Lei Geral Tributária
Efetivamente, analisando o pedido de revisão, com referência à primeira parte do nº 1 do artigo 78º da LGT, refere a Alfândega: (…) Artigo 78º Revisão dos atos tributários 1.A revisão dos atos tributários pela entidade que os praticou pode ser efetuada por iniciativa do sujeito passivo, no prazo da reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade, ou, por iniciativa da administração tributária, no prazo de 4 anos após a liquidação, ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços. (…) Não obstante, o prazo previsto na 2ª parte do nº 1 do artigo 78º da LGT só será aplicável se o fundamento de revisão do ato tributário consistir em erro e esse erro for imputável aos serviços. No que concerne ao prazo previsto na 1ª parte do nº 1 do artigo 78º da LGT (prazo da reclamação administrativa, o mesmo já se encontra precludido, uma vez que o termo do prazo de pagamento voluntário ocorreu em 2019/04/03 e o prazo para apresentação da reclamação graciosa culminou em 2019/08/01, face ao estatuído no nº 1 do artigo 78º da LGT, conjugado com a alínea a) do nº 1 do artigo 102º do Código de Procedimento e do Processo Tributário (CPPT), aprovado pelo DL 433/99, de 26 de Outubro.
E, com referência à 2ª parte do nº 1 do artigo 78º da LGT, afirma o seguinte: (…) No que respeita à existência de erro, tendo as liquidações de ISV sido efetuadas de acordo com a disciplina legal aplicável, é posição da AT de que as mesmas não enfermam de qualquer vício, pois, encontrando-se estas em total consonância com as normas legais aplicáveis à factualidade que lhe está subjacente, são as mesmas legais (logo, isentas de erro). Com efeito, estando a AT sujeita ao princípio da legalidade (cfr.nº 2 do artigo 266º da constituição da república Portuguesa e artigo 55º da LGT), não pode deixar de aplicar uma norma com fundamento de que a mesma não estará em conformidade com o direito comunitário ( aplicável por força do disposto no nº 4 do artigo 8º da CRP).
Atendendo a que a administração tributária se limitou a fazer a interpretação das normas aplicáveis aos factos, sempre sob o espectro do princípio da legalidade, e não tendo, como referido, a prerrogativa de poder desaplicar normas com base num julgamento de pretensa desconformidade com o direito comunitário ( atribuição reservada aos tribunais) será forçoso concluir pela inexistência de imputabilidade aos serviços de erro que fundamente um procedimento de revisão do ato tributário, nos termos da 2ª parte do nº 1 do artigo 78º da LGT.(…)” Concluindo que: (…) Nessa conformidade, inexistindo erro imputável aos serviços, inexiste fundamento que legitime o procedimento de revisão do ato tributário, nos termos da 2ª parte do nº 1 do artigo 78º da LGT.”
Da decisão do Director da Alfândega de Braga que indeferiu, em 13.01.2020, o pedido de revisão oficiosa, apresentou o Requerente, em 14.02.2020, junto da Directora Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), recurso hierárquico, que veio a ser, também, indeferido por despacho datado de 01.04.2020 do Senhor Subdirector Geral Dr. Brigas Afonso com base nos seguintes fundamentos, e cito: “(…) O ato tributário de liquidação visado, foi praticado ao abrigo do artigo 11 desse Código (CISV), a AT não pode contrariar ou desobedecer às disposições legais nele ínsitas. (…) O ato de liquidação em causa não pode ser considerado ilegal, pois o mesmo foi efetuado de acordo com a disciplina legal aplicável, isto é, encontra-se em total consonância com as normas legais aplicáveis à factualidade que lhes está subjacente. (…) cumpre, de igual modo, referir que, não tendo sido proferida qualquer decisão que declare com força obrigatória geral o vício de violação de lei comunitária, a AT, uma vez vinculada ao princípio da legalidade, terá de proceder à tributação dos veículos usados de acordo com a legislação atualmente em vigor e que se encontra vertida no CISV. (…) não pode ser imputado qualquer erro à AT, pelo que o mesmo não pode ser invocado para solicitar a revisão do ato de liquidação relativo ao veículo da marca BMW em causa. (…)”
Não tendo o Requerente invocado especificamente a primeira ou segunda parte do nº 1 do artigo 78º da LGT, mas tendo-o referido como um todo, resulta claramente do que atrás se explanou que, à luz do nº 1, 1ª parte, do artigo 78º da LGT o pedido de revisão oficiosa apresentado foi manifestamente intempestivo, pois se encontrava ultrapassado o prazo da reclamação graciosa, de 120 dias a contar do termo do prazo do pagamento do ISV. Para além de que, relativamente à DAV, estando a AT vinculada ao princípio da legalidade e tendo a AT efectuado a liquidação em estrita observância da norma legal aplicável não poderia a AT proceder por forma diversa daquela por que actuou, não podendo deixar de efectuar as liquidações impugnadas, não existindo, pois, qualquer erro de direito imputável aos serviços.
Assim, tanto o prazo de 120 dias para apresentação do pedido de revisão oficiosa da liquidação, por iniciativa do sujeito passivo, se encontrava claramente ultrapassado, como, por outro lado, à data dos factos tributários, a AT aplicou aos mesmos a lei aplicável, em vigor, em estrita observância do princípio da legalidade, não existindo, pois, erro imputável aos serviços que fundamente a 2ª parte do n.º 1 do artigo 78.º da LGT.
Deste modo, tendo o pedido de revisão sido apresentado depois do prazo previsto na lei, encontra-se igualmente ultrapassado o prazo de 90 dias, contados após o termo do prazo de pagamento do imposto, para apresentação do pedido arbitral, que só veio a ser efetuado em 19.06.2020. Em face da manifesta extemporaneidade do pedido, verifica-se a exceção de caducidade do direito de ação, o que se invoca, devendo, em consequência, a Requerida, ser absolvida do pedido.
Chamada a pronunciar-se sobre a referida exceção, veio a Requerente sustentar o seguinte:
O artigo 78.° da LGT prevê a revisão do acto tributário «por iniciativa do sujeito passivo» ou «da administração tributária», aquela « no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade», e esta «no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços»
Todavia, tal não significa que o contribuinte não possa, no prazo da revisão oficiosa, pedir esta mesma revisão. Tal resulta, desde logo, dos princípios da legalidade, da justiça, da igualdade e da imparcialidade - art. 266°, n.° 2 da CRP.
Como se refere no Ac. do STA de 20/03/2002, rec 26.5 80: «Face a tais princípios, não se vê como possa a Administração demitir -se legalmente de tomar a iniciativa de revisão do acto quando demandada para o fazer através de pedido dos interessados já que tem o dever legal de decidir os pedidos destes, no domínio das suas atribuições, sendo que «o dever de pronúncia constitui, de resto, um princípio abertamente assumido pelo art. 9° do CPA, no domínio do procedimento admi nistrativo mas aqui também aplicável por mor do disposto no art. 2° do mesmo código».
E, mais adiante: «é claro que a revisão do acto tributário, na sua dimensão de acto a favor do contribuinte, que é a dimensão que aqui importa ter em conta, acaba po r implicar um alargamento do prazo de estabilidade da situação tributária a que se refere. Mas uma tal consequência não é uma objecção que o intérprete possa colocar ... pois a adopção, pelo legislador, da possibilidade de revisão do acto pressupõe exactamente o equacionamento dessa questão e a sua resolução no sentido de fazer, dentro de certos condicionalismos ... outros valores para além da segurança jurídica a prazo certo».
É, aliás, no sentido exposto, a jurisprudência, que se crê uniforme, do ST - Cfr., por todos, os Acds. de 20/03/2002 citado, 19/11/2003 rec. 1181/03, 17/12/2002 rec. 1182/03, 29/10/2003 rec. 462/03, 02/04/2003 rec. 1771/02, 20/07/2003 rec. 945/03, 30/01/2002 rec. 26.231.
Cumpre decidir.
De acordo com o disposto no artigo 608.º, n.º 1 do CPC, aplicável por força do disposto no artigo 29.º do RJAT, “(…) a sentença conhece, em primeiro lugar, das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância (…)”, devendo o juiz “resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)”.
Estando em causa apreciar um ato de indeferimento de um pedido de revisão oficiosa, caso se considere que o pedido foi apresentado fora de prazo e que, como tal, o mesmo nunca poderia ter sido atendido, então haverá que decidir pela legalidade do indeferimento, por extemporaneidade do pedido, o que acarreta que o mesmo pedido não pode reabrir a via contenciosa de impugnação.
O pedido de revisão oficiosa foi apresentado pelo Requerente em 06.09.2019, baseando-se no artigo 78.º, n.º 1, da LGT e tendo como fundamento a ilegalidade da liquidação de ISV, no que diz respeito ao cálculo da componente ambiental, por a norma jurídica que esteve na base da liquidação (contida no artigo 11.º CISV) violar direito da União Europeia (em concreto, a norma estabelecida no artigo 110.º TFUE) – o que, no seu entender, sendo um erro de direito, configuraria “erro imputável aos serviços”.
O pedido foi indeferido em 14.01.2020, tendo a AT sustentado que as liquidações foram efetuadas nos termos da lei e que, portanto, não se verificaria o “erro imputável aos serviços”, pelo que faltaria ao pedido de revisão oficiosa o pressuposto necessário para acionar o prazo de 4 anos previsto na 2.ª parte do n.º 1 do artigo 78.º da LGT.
Desta decisão apresentou a Requerente, em 14.02.2020, junto da Diretora Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), recurso hierárquico, (que deu origem ao Procedimento de Recurso Hierárquico n.º 0...8).
Através do ofício n.º 1197, de 04.03.2020, da DSIECIV, rececionado em 09.03.2020, o Requerente foi notificado do projeto de decisão de indeferimento, ao qual não respondeu.
Em 01.04.2020 foi proferido despacho de indeferimento do recurso hierárquico.
Em 19.06.2020, o Requerente apresentou o presente pedido de pronúncia arbitral.
No caso presente, a liquidação de que se pediu a revisão (liquidação de ISV n.º 2019/0...8, no valor total de € 13.717,59) foi emitida a 23.03.2019, tendo prazo de pagamento voluntário até ao dia 03.04.2019. O pedido de revisão oficiosa foi apresentado a 06.09.2019, ou seja, dentro do prazo de 4 anos dentro do qual pode ser suscitado, pela AT ou pelo sujeito passivo, com base em erro imputável aos serviços.
Verifica-se, quer pela análise do pedido, quer pela apreciação que ao mesmo foi feita pela AT, que o fundamento invocado foi o erro de direito imputável aos serviços ao efetuarem uma liquidação em violação de direito da União Europeia, aplicável em Portugal e com primazia face ao direito nacional.
Embora a AT se defenda sempre dizendo que não poderia ter agido de outra forma por estar vinculada à aplicação do direito vigente, e que, por essa razão, não se pode entender que exista erro imputável aos serviços pois, a verificar-se a violação do direito da União Europeia pela norma de direito português aplicada na liquidação, tal não procede da conduta imputável à AT, a verdade é que o conceito de erro imputável aos serviços tem um alcance mais amplo.
Com efeito, o erro abrange o erro nos pressupostos de facto e de direito, a imputabilidade aos serviços independente da demonstração da culpa dos funcionários envolvidos na emissão do ato de liquidação. Por outras palavras, está em causa qualquer ilegalidade não imputável ao contribuinte por conduta negligente, mas à AT, mais devendo tal erro no apuramento da situação tributária do contribuinte revestir carácter relevante, gerando um prejuízo efetivo.
Assim, verifica-se que o pedido de revisão oficiosa apresentado pelo Requerente era tempestivo. Tendo, posteriormente, corrido o processo de recurso hierárquico, que culminou no indeferimento de 01.04.2020, e tendo o pedido de pronúncia arbitral sido apresentado no dia 19.06.2020, constata-se que o mesmo é tempestivo.
3.2 Posições das Partes
O Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral por entender que as liquidações impugnadas estão feridas de ilegalidade no que diz respeito ao cálculo da componente ambiental do ISV.
O juízo de ilegalidade formulado repousa na convicção de que os atos de liquidação são ilegais porque a norma jurídica em que se baseiam – o artigo 11.º do CISV – viola o disposto no artigo 110.º do TFUE (Tratado de Funcionamento da União Europeia) ao permitir que o legislador nacional cobre um imposto sobre os veículos importados com base num valor que é superior ao valor real do veículo e, assim, onerando-o com uma tributação superior à que é aplicada aos veículos usados equivalentes matriculados originalmente em Portugal.
Com base nesta convicção, foi já apresentada uma queixa junto da Comissão Europeia, a qual deu origem à instauração de um processo de infração contra Portugal – CHAP 2017 2326 – no âmbito do qual foi emitido um parecer fundamentado pela Comissão Europeia com base no qual esta interpôs uma ação contra Portugal no Tribunal de Justiça da União Europeia.
O Requerente entende que, porque a AT não aplicou a redução à componente ambiental, mas apenas à componente cilindrada, liquidou a mais o valor de € 3.559,18 – cuja restituição agora solicita.
Quanto à AT, reage dizendo que se limitou a aplicar as normas jurídicas vigentes nos exatos termos da previsão legal. Nas suas palavras, “No caso concreto o imposto foi calculado de acordo com o previsto no artigo 7.º. do CISV, tendo sido aplicada uma redução para a componente ambiental nos termos deste artigo, não tendo sido aplicada outra/nova redução à componente ambiental porque tal redução não se encontra prevista no artigo 11.º do CISV, ao contrário do estabelecido para a componente cilindrada, que prevê uma redução em função dos “anos de uso” de acordo com a tabela D.”
Acrescenta, porém, que “A matéria em discussão extravasa, pois, a questão da legalidade das liquidações, que se repercute na esfera jurídica da Requerente, na medida em que o que está em causa não se cinge à mera liquidação de um tributo e anulação desse ato, mas a questões mais complexas, que têm na sua génese preocupações de ordem ambiental.
(...)
O modelo de tributação do ISV resultante da aprovação do CISV pela Lei 22-A/2007, de 29 de Junho, foi norteado por preocupações ambientais com respeito pelas orientações emanadas pelas instâncias comunitárias e pelos compromissos assumidos no âmbito do Protocolo de Quioto e, mais tarde, pelo Acordo de Paris.
O Protocolo de Quioto, tratado internacional ratificado pelo Estado Português, estabeleceu compromissos muito rígidos para a redução da emissão dos gases que agravam o efeito estufa, considerados, de acordo com a maioria das investigações científicas, como as causas do aquecimento global, passando, por conseguinte, a componente ambiental a ser determinante no cálculo do imposto que incide sobre os veículos novos e usados (estes com emissões elevadas, superiores às dos veículos novos), em obediência ao princípio do poluidor pagador, consagrado no CISV e no TFUE, levando os consumidores a optar por automóveis com menores emissões de dióxido de carbono.
(...)
O que se constata é que, no âmbito da tributação automóvel, relativamente aos elementos sobre os quais assenta tal tributação, existe uma confusão de conceitos, que são, por natureza, distintos, não podendo estabelecer-se uma equiparação entre a componente cilindrada e a componente ambiental, nem, por isso, consequentemente, ver-lhe aplicados os mesmos critérios, até porque no caso da vertente ambiental, as razões que lhe estão subjacentes não coincidem com as que determinam a tributação que atende à cilindrada do veículo.”
(...)
Por isso, não pode deixar de se referir o estabelecido no artigo 191.º do TFUE, o qual tendo surgido depois do artigo 90.º do TCE (anterior 110.º do TFUE), exige que se proceda a uma interpretação atualista, no que concerne ao enquadramento da questão sub judice, que deve atender aos elementos sistemático e teleológico, porquanto naquele dispositivo, afirma-se, expressamente, no n.º 1, que a política da União, no domínio do ambiente, contribuirá para a prossecução, entre outros, da preservação, da proteção e a melhoria da qualidade do ambiente, não podendo o artigo 110.º do TFUE ser interpretado nos termos defendidos pela Requerente.
Devendo, pois, a interpretação do artigo 110.º do TFUE ser efetuada à luz do disposto no artigo 191.º do mesmo tratado, sob pena de conflitualidade e desarmonia entre as duas normas, a não ser que o TJUE, em sede de interpretação, venha defender a existência de tal violação e que a norma do artigo 110.º do TFUE tem valor superior ao previsto no artigo 191.º quanto à proteção e a melhoria da qualidade ambiental. Face ao previsto no n.º 1, do artigo 11.º do CISV, constata-se que o legislador teve em consideração que a componente ambiental representa o custo do impacto ambiental, em conformidade com o disposto no n.º 3 do artigo 11.º do CISV, também suportada pelos veículos novos, devendo a mesma ser entendida como um montante que os sujeitos passivos pagam ao Estado, destinado a compensar os efeitos nefastos que o veículo automóvel causa ao ambiente, sendo que esse montante é progressivo em função das emissões de dióxido de carbono.
Pelo que, em nome da unidade e da coerência do modelo de tributação automóvel vigente em Portugal, a não aplicação da totalidade da componente ambiental aos veículos usados violaria os princípios suprarreferidos, tornando-se fonte de graves injustiças, já que beneficiaria claramente os veículos usados em detrimento dos novos, sem que, para tal, se encontrem razões válidas.
Em suma, destinando-se a componente ambiental a compensar os efeitos nefastos de qualquer redução em função da depreciação comercial ou dos anos de uso do automóvel, dado que o potencial poluidor do automóvel não diminui com a sua idade, muito pelo contrário, agrava-se, como é do conhecimento comum, a mesma não deve ser objeto de qualquer redução pois representa o “custo de impacte ambiental”, sendo o seu objetivo orientar a escolha dos consumidores para uma maior seletividade na compra dos automóveis, em função do seu grau poluidor.”
3.3 Do Mérito
A discussão nos presentes autos circunscreve-se à questão de saber se a norma do artigo 11.º do Código do Imposto sobre os Veículos (Código do ISV), na qual se baseou a liquidação de ISV impugnada, viola ou não o disposto no artigo 110.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia (TFUE).
Segundo o Requerente, a norma constante do artigo 11.º do CISV permite a cobrança sobre os veículos “importados” de outros Estados Membros da União Europeia de um imposto determinado com base em valor superior ao valor real do veículo – assim os onerando com uma tributação superior à que é aplicada aos veículos usados similares disponíveis no mercado nacional.
A AT alega, em síntese, que se limitou a aplicar a legalidade vigente e que a norma do artigo 11.º do CISV, ao fazer uma distinção entre a componente cilindrada e a componente ambiental, o faz por justificadas razões de política ambiental sustentadas por instrumentos jurídicos internacionais aos quais o Estado Português se vinculou.
Entende, por esse motivo, que a interpretação do direito da União Europeia - nomeadamente do disposto no artigo 110.º do TFUE - não poderá deixar de ter em consideração objetivos ambientais, sob pena de se gerarem incoerências insustentáveis entre a política fiscal e a política ambiental.
Destaca ainda que o n.º 2 do artigo 191.º do TFUE enfatiza o princípio do poluidor pagador ao postular que “A política da União no domínio do ambiente terá por objetivo atingir um nível de proteção elevado, tendo em conta a diversidade das situações existentes nas diferentes regiões da União. Basear-se-á nos princípios da precaução e da ação preventiva, da correção, prioritariamente na fonte, dos danos causados ao ambiente e do poluidor-pagador”.
Assim, da interpretação conjugada do disposto no artigo 110.º do TFUE e do artigo 191.º do mesmo tratado, conclui que o modelo de tributação automóvel português, ao fazer incidir sobre os veículos ligeiros de passageiros, novos e usados, a componente ambiental, não pretende restringir a entrada de veículos em território nacional para proteger a produção nacional, mas tão só direcionar as escolhas dos consumidores para a aquisição de veículos com menores emissões de dióxido de carbono, tendo por fim último a proteção do ambiente, no estrito cumprimento dos princípios consagrados no artigo 191.º do TFUE.
Sustenta ainda a AT que a interpretação do artigo 11.º do Código do ISV defendida pelo Requerente sempre seria inconstitucional face ao disposto no n.º 2 do artigo 103.º da CRP ao atribuir um desagravamento, que, no caso, redunda na atribuição de um verdadeiro benefício fiscal. Estando em causa matéria de elevada relevância social, e bem assim, a existência de disposições legais e objetivos de defesa ambiental definidos ao nível da União Europeia, internacional e nacional, não deve ser aplicada à componente ambiental a mesma redução que é aplicada à componente cilindrada no âmbito da tributação automóvel, concretamente no que se refere ao cálculo do imposto. A AT sustenta ainda outras inconstitucionalidades, que serão analisadas a final.
Vejamos.
Os artigos 7.º e 11.º do Código do ISV, aplicados ao ato de liquidação objeto do pedido arbitral, dispõem o seguinte:
“Artigo 7.º
Taxas normais – automóveis
1 – A tabela A, a seguir indicada, estabelece as taxas de imposto, tendo em conta a componente cilindrada e ambiental, e é aplicável aos seguintes veículos: (Redação dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro):
a) aos automóveis de passageiros; (Redação dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro)
b) aos automóveis ligeiros de utilização mista e aos automóveis ligeiros de mercadorias, que não sejam tributados pelas taxas reduzidas nem pela taxa intermédia. (Redação dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro)
TABELA A
Componente cilindrada
Escalão de cilindrada (em centímetros cúbicos) Taxas por centímetros cúbicos (em euros) Parcela a abater (em euros)
Até 1000 0,99 769,80
Entre 1001 e 1250 1,07 771,31
Mais de 1250 5,08 5.616,80
(Redação dada pela Lei n.º 2/2020, de 31 de Março de 2020)
Componente ambiental
Aplicável a veículos com emissões de CO2 resultantes dos testes realizados ao abrigo do Novo Ciclo de Condução Europeu Normalizado (New European Driving Cycle — NEDC)
Veículos a gasolina
Escalão de CO2 (em gramas por quilómetro) Taxas (em euros) Parcela a abater (em euros)
Até 99 4,19 387,16
De 100 a 115 7,33 680,91
De 116 a 145 47,65 5.353,01
De 146 a 175 55,52 6.473,8
De 176 a 195 141,42 21.422,47
Mais de 195 186,47 30.274,29
(Redação dada pela Lei n.º 2/2020 de 31 de Março de 2020)
Veículos a gasóleo
Escalão de CO2 (em gramas por quilómetro)
Taxas (em euros)
Parcela a abater (em euros)
Até 79 5,24 398,07
De 80 a 95 21,26 1.676,08
De 96 a 120 71,83 6.524,16
De 121 a 140 159,33 17.158,92
De 141 a 160 177,19 19.694,01
Mais de 160 243,38 30.326,67
Componente ambiental
Aplicável a veículos com emissões de CO2 resultantes dos testes realizados ao abrigo do Procedimento Global de Testes Harmonizados de Veículos Ligeiros (Worldwide Harmonized Light Vehicle Test Procedure — WLTP)
Veículos a gasolina
Escalão de CO2 (em gramas por quilómetro) Taxas (em euros) Parcela a abater (em euros)
Até 110 0,40 39,00
De 111 a 115 1,00 105,00
De 116 a 120 1,25 134,00
De 121 a 130 4,78 561,40
De 121 a 145 5,79 691,5
De 146 a 175 37,66 5.276,50
De 176 a 195 46,58 6.571,10
De 196 a 235 175,00 31.000,00
Mais de 235 212,00 38.000,00
(Redação dada pela Lei n.º 2/2020 de 31 de Março de 2020)
Veículos a gasóleo
Escalão de CO2 (em gramas por quilómetro)
Taxas (em euros)
Parcela a abater (em euros)
Até 110 1,56 10,43
De 111 a 120 17,20 1.728,32
De 121 a 140 58,97 6.673,96
De 141 a 150 115,50 14.580,00
De 151 a 160 145,80 19.200,00
De 161 a 170 201,00 26.500,00
De 171 a 190 248,50 33.536,42
Mais de 190 256,00 34.700,00
(Redação dada pela Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro)
2 – A tabela B, a seguir indicada, tem em conta exclusivamente a componente cilindrada, sendo aplicável aos seguintes veículos: (Redação dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro)
a) na totalidade do imposto, aos automóveis ligeiros de mercadorias, de caixa fechada, com lotação máxima de três lugares, incluindo o do condutor, e altura interior da caixa de carga inferior a 120 cm; (Redação dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro)
b) na totalidade do imposto, aos automóveis ligeiros de mercadorias, de caixa fechada, com lotação máxima de três lugares, incluindo o do condutor, e tração às quatro rodas, permanente ou adaptável; (Redação dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro)
c) aos automóveis abrangidos pelos n.os 2 e 3 do artigo seguinte, nas percentagens aí previstas; (Redação dada pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro)
d) aos automóveis abrangidos pelo artigo 9.º, nas percentagens aí previstas. (Redação dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro)
TABELA B
Componente cilindrada
Escalão de cilindrada (em centímetros cúbicos) Taxas por centímetros cúbicos (em euros) Parcela a abater (em euros)
Até 1 250 4,81 3 020,78
Mais de 1 250 11,41 11 005,76
(Redação dada pela Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro)
3 – Os veículos ligeiros, equipados com sistema de propulsão a gasóleo ficam sujeitos a um agravamento de 500 € no total do montante do imposto a pagar, sendo esse valor reduzido para 250 € relativamente aos veículos ligeiros de mercadorias referidos no n.º 2 do artigo 9.º, com exceção dos veículos que apresentarem nos respetivos certificados de conformidade ou, na sua inexistência, nas homologações técnicas, um valor de emissão de partículas inferior a 0,001 g/km. (Redação dada pela Lei n.º 2/2020 de 31 de Março)
4 – Sempre que o imposto relativo à componente ambiental apresentar um resultado negativo, será o mesmo deduzido ao montante do imposto da componente cilindrada, não podendo o total do imposto a pagar ser inferior a € 100, independentemente do cálculo que resultar da aplicação da tabela A ou da tabela B. (Redação dada pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março)
5 – A cilindrada dos automóveis movidos por motores Wankel corresponde ao dobro da cilindrada nominal, calculada nos termos do Regulamento das Homologações CE de Veículos, Sistemas e Unidades Técnicas Relativo às Emissões Poluentes, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 202/2000, de 1 de setembro.
6 – Nas situações previstas na alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º, o montante do imposto a pagar é o que resulta da diferença entre o imposto incidente sobre o veículo após a respetiva operação, atento o tempo de uso entretanto decorrido, e o imposto originariamente pago, exceto nos casos de mudança de chassis, em que o imposto é devido pela totalidade.
7 – (Revogado)
8 – Os veículos que se apresentem equipados com motores preparados para o consumo, no seu sistema de propulsão, exclusivamente de gás de petróleo liquefeito (GPL), gás natural ou bioetenol, são tributados, na componente ambiental, pelas taxas correspondentes aos veículos a gasolina. (Redação dada pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro)
9 – Os veículos que se encontrem equipados com motores preparados para o consumo, no seu sistema de propulsão, de biodiesel são tributados, na componente ambiental, pelas taxas correspondentes aos veículos a gasóleo. (Aditado pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro).
Por sua vez, o artigo 11.º do Código do ISV estabelece o seguinte:
Artigo 11.º
Taxas – veículos usados
1 – O imposto incidente sobre veículos portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados membros da União Europeia é objeto de liquidação provisória nos termos das regras do presente Código, com exceção da componente cilindrada à qual são aplicadas as percentagens de redução previstas na tabela D ao imposto resultante da tabela respetiva, as quais estão associadas à desvalorização comercial média dos veículos no mercado nacional: (Redação dada pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro).
TABELA D
Tempo de uso Percentagem de redução
Até 1 ano(1) 10
Mais de 1 a 2 anos 20
Mais de 2 a 3 anos 28
Mais de 3 a 4 anos 35
Mais de 4 a 5 anos 43
Mais de 5 a 6 anos 52
Mais de 6 a 7 anos 60
Mais de 7 a 8 anos 65
Mais de 8 a 9 anos 70
Mais de 9 a 10 anos 75
Mais de 10 anos 80
(Redação dada pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro)
2 – Para efeitos de aplicação do número anterior, entende-se por «tempo de uso» o período decorrido desde a atribuição da primeira matrícula e respetivos documentos pela entidade competente até ao termo do prazo para apresentação da declaração aduaneira de veículos.
3 – Sem prejuízo da liquidação provisória efetuada, sempre que o sujeito passivo entenda que o montante do imposto apurado nos termos do n.º 1 excede o imposto calculado por aplicação da fórmula a seguir indicada, pode requerer ao diretor da alfândega, mediante o pagamento prévio de taxa a fixar por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, e até ao termo do prazo de pagamento a que se refere o n.º 1 do artigo 27.º, que a mesma seja aplicada à tributação do veículo, tendo em vista a liquidação definitiva do imposto:
ISV = (V ÷ VR × Y) + C)
em que:
ISV representa o montante do imposto a pagar;
V representa o valor comercial do veículo, tomando por base o valor médio de referência determinado em função da marca, do modelo e respetivo equipamento de série, da idade, do modo de propulsão e da quilometragem média de referência, constante das publicações especializadas do setor, apresentadas pelo interessado; (Redação dada pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro)
VR é o preço de venda ao público de veículo idêntico no ano da primeira matrícula do veículo a tributar, tal como declarado pelo interessado, considerando-se como tal o veículo da mesma marca, modelo e sistema de propulsão, ou, no caso de este não constar de informação disponível, de veículo similar, introduzido no mercado nacional, no mesmo ano em que o veículo a introduzir no consumo foi matriculado pela primeira vez;
Y representa o montante do imposto calculado com base na componente cilindrada, tendo em consideração a tabela e a taxa aplicável ao veículo, vigente no momento da exigibilidade do imposto;
C é o custo de impacte ambiental’, aplicável a veículos sujeitos à tabela A, vigente no momento da exigibilidade do imposto, e cujo valor corresponde à componente ambiental da referida tabela.
4 – Na falta de pedido de avaliação formulado nos termos do número anterior presume-se que o sujeito passivo aceita como definitiva a liquidação do imposto feita por aplicação da tabela constante do n.º 1.
5 – (Revogado).”
Já o artigo 110.º do TFUE estabelece que “Nenhum Estado-Membro fará incidir, direta ou indiretamente, sobre os produtos dos outros Estados- Membros imposições internas, qualquer que seja a sua natureza, superiores às que incidam, direta ou indiretamente, sobre produtos nacionais similares. Além disso, nenhum Estado-Membro fará incidir sobre os produtos dos outros Estados-Membros imposições internas de modo a proteger indiretamente outras produções.”
A questão da conformidade com o direito europeu das normas nacionais relativas à tributação de veículos usados “importados” de outro Estado Membro já foi objeto de apreciação no Tribunal de Justiça da União Europeia por diversas vezes. É exemplo disso o caso Nunes Tadeu (Acórdão do TJUE, de 09.03.1995, proc. C-345/03), em que o TJUE entendeu que a cobrança por um Estado-Membro de um imposto sobre os veículos usados provenientes de outro Estado-Membro é contrária ao artigo 95.° do Tratado CEE quando o montante do imposto, calculado sem tomar em conta a depreciação real do veículo, exceda o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis usados semelhantes já matriculados no território nacional.
Noutro caso - Gomes Valente (Acórdão do TJUE, de 22-02-2001, proc. C-393/98) – o Tribunal entendeu que “A cobrança por um Estado-Membro de um imposto sobre os veículos usados provenientes de outro Estado-Membro é contrária ao artigo 95.° do Tratado CEE quando o montante do imposto, calculado sem tomar em conta a depreciação real do veículo, exceda o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis usados semelhantes já matriculados no território nacional”.
Resulta da jurisprudência acima mencionada que, para efeitos da comparação entre o regime de tributação dos veículos usados importados e o dos veículos usados comprados no mercado nacional (e, portanto, para efeitos de aplicação do disposto no artigo 110.º do TFUE), deve tomar-se em consideração não apenas a taxa da imposição interna que incide, direta ou indiretamente, sobre os produtos nacionais e os produtos importados, mas também a matéria coletável e as modalidades do imposto em causa. Ou seja, um Estado-Membro não pode cobrar um imposto sobre os veículos usados importados, calculado com base num valor superior ao valor real do veículo, tendo como efeito uma tributação mais onerosa destes relativamente à dos veículos usados similares disponíveis no mercado nacional. Assim, o valor do veículo usado importado utilizado pela Administração como base de tributação deve refletir fielmente o valor de um veículo similar já registado no território nacional (v. acórdão de 20 de setembro de 2007, Comissão/Grécia, C-74/06, EU:C:2007:534, n.ºs 27 e 28 e jurisprudência referida).
Ora, a alteração ao artigo 11.º do Código do ISV operada pela Lei n.º 42/2016, de 28/12, permitiu que passasse a ser considerada a desvalorização do veículo, mas tão-somente quanto à componente cilindrada, ficando excluída qualquer redução no tocante à componente ambiental.
Embora a tributação automóvel possa assentar em critérios como o do tipo de motor, a cilindrada e uma classificação assente em considerações ambientais – como tem sido admitido pelo TJUE -, a aplicação em concreto desses critérios não deve ter como efeito que o imposto automóvel onere mais os produtos provenientes de outros Estados‑Membros do que os produtos nacionais similares. É esse mesmo argumento que sustenta a ação judicial intentada recentemente pela Comissão Europeia contra o Estado Português. Pode ler-se no comunicado de 24.01.2019 que a Comissão Europeia deu início à ação “por este Estado-Membro não ter em conta a componente ambiental do imposto de matrícula aplicável aos veículos usados importados de outros Estados-Membros para fins de depreciação. A Comissão considera que a legislação portuguesa não é compatível com o artigo 110.º do TFUE, na medida em que os veículos usados importados de outros Estados-Membros são sujeitos a uma carga tributária superior em comparação com os veículos usados adquiridos no mercado português, uma vez que a sua depreciação não é plenamente tida em conta. Se Portugal não atuar no prazo de dois meses, a Comissão poderá enviar um parecer fundamentado sobre esta matéria às autoridades portuguesas.”
Têm sido proferidas várias decisões arbitrais no sentido de que o artigo 11.º do Código do ISV está em desconformidade com o disposto no artigo 110.º do TJUE porquanto aquele artigo não pode, em conformidade com o que este artigo dispõe, calcular o imposto sobre veículos usados oriundos de outro EM sem ter em conta a depreciação dos mesmos, de tal forma que, neste caso, o imposto calculado ultrapasse o montante de ISV contido no valor residual de veículos usados similares que já foram registados no EM de importação, ou seja, dos veículos usados nacionais (cfr. as Decisões Arbitrais n.º 572/2019-T, de 30.04.2019, n.º 346/2019, de 2.11.2019, n.º 348/2019, de 31.01.2020, n.º 350/2019, de 27.01.2020, n.º 498/2019, de 31.01.2020, n.º 872/2019-T, de 25.06.2020).
Na senda destas decisões, também este Tribunal Arbitral entende que a norma ínsita no artigo 11.º do Código do ISV está em desconformidade com o disposto no artigo 110.º do TFUE porquanto aquela norma determina que o cálculo do imposto sobre veículos usados oriundos de outro EM seja efetuado sem se ter em conta a depreciação dos mesmos, de tal forma que o imposto resultante da sua aplicação ultrapassa o montante de ISV contido no valor residual de veículos usados similares que já foram registados no EM de importação, ou seja, dos veículos usados nacionais.
Resultando da documentação junta aos autos que o Requerente liquidou imposto a mais, por força da aplicação do disposto no artigo 11.º do código do ISV, deve o ato de liquidação impugnado ser parcialmente anulado, porquanto se verifica que o mesmo padece de ilegalidade na parte em que não considera aplicável a redução de ISV relativa à componente ambiental, em conformidade com o disposto no artigo 110.º do TFUE.
Quanto ao invocado pela AT em matéria de constitucionalidade da interpretação do artigo 11.º do CISV aqui sustentada – em concreto, que a mesma viola os princípios da legalidade e da legalidade fiscal, da justiça tributária, da igualdade e da certeza e segurança jurídica, do Estado de direito ambiental e do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, não nos parece que lhe assista razão.
Vejamos o excerto da Resposta em que a AT refere que:
“Nesta medida, a interpretação do Requerente ofende claramente o princípio da equivalência previsto no artigo 1.º do CISV, sobre o qual assenta o atual modelo de tributação automóvel, e o artigo 9.º, alínea e) e artigo 66.º, n.º 1 e n.º 2, ambos da CRP, ocorrendo uma violação do princípio constitucional do Estado de direito ambiental. 116. Está em causa um direito constitucional fundamental, o direito ao Ambiente e Qualidade de Vida consagrado no n.º 1 do artigo 66.º da CRP, isto é, o direito de todos a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender, e do qual resulta (n.º 2), a obrigação, para o Estado, de assegurar o direito ao ambiente, a obrigação de prevenir e controlar a poluição e seus efeitos, promover a integração de objetivos ambientais nas várias políticas de âmbito setorial, bem como assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com proteção do ambiente e qualidade de vida (artigo 66.º, n.º 2, alíneas a), f) e h), da CRP). 117. E, com vista à concretização e defesa do direito ao ambiente, o Estado pode impor proibições ou deveres de abstenção de ações ambientalmente nocivas e, numa vertente positiva, impor a defesa do ambiente mediante obrigações políticas, legislativas, administrativas e penais, nas quais se incluem a utilização dos impostos, taxas e benefícios fiscais como instrumentos formais que propiciem a proteção do ambiente, defendendo J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira que, consagrando o artigo 66.º da CRP o direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender, a sua defesa até pode justificar restrições a outros direitos constitucionalmente protegidos, que incluem a redução de gases, do consumo e a seletividade nas escolhas. 118. E, estabelecendo o artigo 66.º (cf. alíneas f) e h) do n.º 2) a adoção de medidas de âmbito setorial e a política fiscal enquanto instrumento de proteção do ambiente e qualidade de vida, que podem consistir no agravamento fiscal de veículos particularmente poluentes, a CRP consagra expressamente, neste âmbito, um direito fiscal do ambiente que utilize os impostos, taxas, benefícios fiscais como instrumentos formais que propiciem a proteção do ambiente, por estarem em causa bens constitucionalmente protegidos de natureza coletiva, merecedores de tutela jurisdicional. 119. Na elaboração do CISV foram considerados os referidos princípios constitucionais, estando subjacentes, designadamente, nos artigos 1.º e 11.º do CISV, não podendo afastar-se a aplicação deste artigo, impondo-se que se afira a sua conformidade com os princípios constitucionais consagrados no artigo 9.º e 66.º da CRP, até porque está em causa matéria de reserva de lei (âmbito de reserva legislativa da Assembleia da República) o que deve ser apreciado.”
O n.º 4 do artigo 8.º da Constituição estabelece o primado do direito da União Europeia, prevendo que “as disposições dos tratados que regem a União Europeia prevalecem sobre as normas de direito nacionais, nos termos definidos pelos órgãos do direito da União, desde que respeitados os princípios fundamentais do Estado de direito democrático.”
Nestes termos, quando as normas de direito ordinário interno não são compatíveis com o direito da União Europeia, o Tribunal não as pode aplicar, suspendendo a sua força vinculativa no caso concreto. Assim esclareceu o TJUE no Acórdão de 09.03.1978, proferido no processo C-106/77 - Acórdão Simmenthal): «O juiz nacional, encarregado de aplicar, no âmbito da sua competência, as disposições do direito comunitário, tem a obrigação de assegurar o pleno efeito dessas normas, deixando se necessário inaplicadas, por sua própria autoridade, qualquer disposição contrária da legislação nacional, ainda que posterior, sem que tenha de pedir ou aguardar a eliminação prévia desta por via legislativa ou por qualquer outro processo constitucional».
Daqui se retira que o primado do direito da União Europeia é absoluto e impõe-se à própria Constituição. Assim, a legalidade da liquidação em crise deve aferir-se, em última instância, pela sua conformidade com o direito da União Europeia.
O próprio legislador nacional já reconheceu que a norma em crise estava em desconformidade com o direito da União Europeia ao alterar, através da Lei n.º 75-B/2020, de 31/12, a redação do artigo 11.º do CISV para a seguinte:
Artigo 11.º
[...]
1 - O imposto incidente sobre veículos portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados-Membros da União Europeia é objeto de liquidação provisória nos termos das regras do presente Código, ao qual são aplicadas as percentagens de redução previstas na tabela D ao imposto resultante da tabela respetiva, tendo em conta a componente cilindrada e ambiental, incluindo-se o agravamento previsto no n.º 3 do artigo 7.º, as quais estão associadas à desvalorização comercial média dos veículos no mercado nacional e à vida útil média remanescente dos veículos, respetivamente:
TABELA D
Componente cilindrada
(ver documento original)
Componente ambiental
(ver documento original)
2 - ...
3 - ...
em que:
ISV representa o montante do imposto a pagar;
V representa o valor comercial do veículo, tomando por base o valor médio de referência determinado em função da marca, do modelo e respetivo equipamento de série, da idade, do modo de propulsão e da quilometragem média de referência, constante das publicações especializadas do setor, apresentadas pelo interessado;
VR é o preço de venda ao público de veículo idêntico no ano da primeira matrícula do veículo a tributar, tal como declarado pelo interessado, considerando-se como tal o veículo da mesma marca, modelo e sistema de propulsão, ou, no caso de este não constar de informação disponível, de veículo similar, introduzido no mercado nacional, no mesmo ano em que o veículo a introduzir no consumo foi matriculado pela primeira vez;
Y representa o montante do imposto calculado com base na componente cilindrada, tendo em consideração a tabela e a taxa aplicável ao veículo, vigente no momento da exigibilidade do imposto;
C é o 'custo de impacte ambiental', aplicável a veículos sujeitos à tabela A, vigente no momento da exigibilidade do imposto, e cujo valor corresponde à componente ambiental da referida tabela, bem como ao agravamento previsto no n.º 3 do artigo 7.º;
U é o número de dias de tempo de uso da viatura;
UR é a média do número de dias de tempo de uso dos veículos contados desde a data da primeira matrícula até à data do cancelamento da matrícula dos veículos em fim de vida abatidos nos três anos civis anteriores à data de apresentação da DAV.
4 - ...
5 - ...»
Relativamente ao argumento de que “a aplicação de tal redução, não prevista na lei, não pode deixar de se considerar como um benefício fiscal que não se encontra previsto na lei e que é inconstitucional face ao disposto no n.º 2 do artigo 103.º da CRP, que estabelece que os impostos são criados por lei, determinando esta igualmente a incidência, taxa, benefícios fiscais e garantias dos contribuintes, que coloca igualmente o Requerente em situação de vantagem face aos demais sujeitos passivos, criando também, nesta parte, uma situação de desigualdade fiscal” e de que “Ademais, a pretensão do Requerente, além de não se estribar na lei e violar os acima indicados princípios constitucionais também olvida que estamos perante um imposto sobre o consumo não harmonizado, e que a tributação do consumo visa adaptar a estrutura do consumo à evolução das necessidades do desenvolvimento económico e da justiça social, devendo onerar os consumos de luxo, conforme o consagrado no n.º 4 do artigo 104.º da CRP”, não nos parece ser de aceitar porquanto a referida redução se estriba numa norma de direito da União Europeia, como tal aplicável em Portugal por força do disposto no artigo 8.º, n.º 2, da Constituição.
Quanto aos princípios do acesso ao direito e da tutela jurisdicional efetiva, defende a AT que, “tendo o Requerente recorrido à arbitragem tributária para impugnar a liquidação, a administração encontra-se coartada no seu direito de reação face aos limitados meios de recurso perante a prolação de uma decisão arbitral desfavorável, em geral e, concretamente, quanto ao recurso de decisão que desaplica norma nacional com fundamento em violação de princípio de direito da União Europeia. É que o RJAT prevê tão somente três tipos de reações recursórias, sendo eles o recurso para o Tribunal Constitucional, o recurso para uniformização de jurisprudência e a impugnação arbitral, com base nas nulidades elencadas no artigo 28.º, n.º 1 do RJAT. Em sede arbitral, não existe o clássico recurso de direito e de facto, em princípio a interpor para o Tribunal Central Administrativo competente. Ora, defendendo o Requerente a violação de um princípio do TFUE no caso concreto, e prevendo o RJAT que o recurso para o Tribunal Constitucional só pode ter como fundamento as alíneas a) e b) do artigo 70.º da Lei do TC, não há dúvida que, a vingar tal interpretação, estamos perante uma violação do princípio do livre acesso aos tribunais.”
Quanto a este ponto, diremos apenas que, a existir uma norma em violação dos referidos princípios, é a norma que prevê os recursos possíveis das decisões proferidas pelos tribunais arbitrais junto do CAAD e não a interpretação do artigo 11.º do CISV aqui sustentada.
4. Decisão
Termos em que este Tribunal Arbitral decide:
a) Julgar procedente o pedido de anulação parcial do ato de liquidação resultante da apresentação da Declaração Aduaneira de Veículo (DAV) 2019/0...6 relativa a Imposto Sobre Veículos (ISV), praticado pelo Diretor da Alfândega de Braga;
b) Condenar a AT a restituir à Requerente o montante de imposto pago a mais;
c) Condenar a AT no pagamento das custas devidas.
5. Valor do processo
De harmonia com o disposto nos artigos 305.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor € 3.559,18.
6. Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 612,00, de harmonia com a Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 02.06.2021,
A Árbitro
(Raquel Franco)