Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 265/2020-T
Data da decisão: 2021-05-10  IVA  
Valor do pedido: € 33.717,35
Tema: IVA – Isenção na exportação de bens. Requisitos de prova da exportação.
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DECISÃO ARBITRAL

 

1. Relatório

A..., LDA, doravante designada como “Demandante”, titular do número de identificação de pessoa coletiva (NIPC)..., com sede na ..., ...-...,  ..., apresentou, em 14-05-2020, ao abrigo do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT)  e do artigo 97.º  do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT, pedido de pronúncia arbitral, com vista à anulação do ato de indeferimento tácito da reclamação graciosa deduzida contra os atos de liquidação oficiosa:

             N.º ... (de 09-10-2018, nº de documento ...);

             N.º ... (de 09-10-2018, nº de documento ...);

             N.º 2018 ... (de 09-10-2018, nº de documento 2018...).

É demandada a AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante também identificada por “Demandada”, “Autoridade Tributária” ou simplesmente “AT”).

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária em 15-05-2020.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular a signatária, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 07-07-2020, foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a mesma, nos termos conjugados das alíneas a) e e) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral singular foi constituído em 27-08-2020.

A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu à petição, defendendo que as liquidações impugnadas são legais, estando justificadas pela falta de apresentação, por parte da Demandante, dos documentos comprovativos da existência de exportações, nos termos impostos pelo art. 29º, números 8 e 9 do CIVA.

Em 23-12-2020, foi proferido despacho arbitral determinando a dispensa, por desnecessária, da reunião prevista no art. 18º do RJAT e concedendo prazos sucessivos para apresentação de alegações finais escritas.

As Partes apresentaram alegações.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e é competente.

As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades.

 

2. Matéria de facto

2.1. Factos provados

São os seguintes os factos dados como provados com relevância para a decisão:

A)           Foi realizada uma ação inspetiva à Demandante, a coberto das ordens de serviço números OI20218... e OI2018..., com âmbito de incidência limitado ao IVA, e relativa aos períodos tributários (IVA) 2017/11, 2017/12, 2018/01, 2018/02 e 2018/03.

B)           Da inspeção foi elaborado o Relatório de Inspecção Tributária (RIT) junto com o processo administrativa, cujo teor se dá como reproduzido, e em que se refere, além do mais, o seguinte:

“III – Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas à matéria tributável

Face à análise efetuada aos valores inscritos nas declarações periódicas do IVA enviadas pelo sujeito passivo nos termos da alínea c) do artigo 29º do CIVA, destaca-se, desde logo, o peso no volume de negócio, das transmissões de bens expedidos ou transportados para fora do Território Nacional, quer por via de exportações, quer por via [de] transmissões intracomunitárias de bens, tratando-se, portanto, de operações isentas nos termos do art. 14º d CIVA e artigo 14º do RITE, respetivamente. Nessa medida, tendo presente que ambas isenções deverão estar comprovadas através de formalidades a cumprir por parte do sujeito passivo na expedição desses bens para fora do Território Nacional, em 2018/07/02 foi notificado (...) o sujeito passivo para, no prazo de 10 dias, remeter a esta Direção de Finanças, especificamente todos os documentos comprovativos da isenção das transmissões de bens ao abrigo da alínea a) do artigo 14º do CIVA, conforme dispõe o nº 8 do artigo 29º do CIVA. Desde então, o sujeito passivo tem enviado vários emails com documentação, sendo o último mail enviado em 2018/08/07.

(...)

Contudo, da análise à documentação remetida pelo sujeito passivo, verificou-se que nem todas as faturas de exportação declaradas no campo 8 das respetivas declarações periódicas estão devidamente comprovadas com o documento de certificação de saída, conforme impõe  [o] nº 8 do artigo 29º CIVA, pelo que, relativamente a essas e nos termos do nº 9 do mesmo artigo, deverá ser exigido o imposto em falta conforme evidencia no anexo I, nos respetivos períodos de imposto, resultante (sic) imposto em falta no montante de €232.453,92.

(...)

IX – Direito de audição – Fundamentação

1. O sujeito passivo foi notificado, (...) para nos termos dos artigos 60º da LGT e do RCPITA e no prazo de 15 dias, querendo, exercer o direito de audição prévia.

2. Em 2018-09-11, o sujeito passivo exerceu o direito de audição (...) remetendo, para o efeito, vários documentos que comprovam a isenção de parte das operações descritas no anexo I e II. Ou seja, o sujeito passivo remeteu alguns dos certificados de expedição que constavam em falta, nos termos do nº 8 do artigo 29º do CIVA.

3. No entanto, da confirmação aos elementos remetidos, verificou-se que permanecem por remeter vários certificados de expedição de mercadorias, relativamente às faturas constantes do anexo I, remetido com o projeto de relatório, pelo que, relativamente a essas faturas dever-se-á exigir o imposto em falta que consta no anexo IV.”

C)           Na sequência da ação de inspecção, aplicando as correções efetuadas no Relatório de Inspeção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu as seguintes liquidações de IVA:

             N.º 2018... (de 09-10-2018, nº de documento 2018...);

             N.º... (de 09-10-2018, nº de documento...);

             N.º ... (de 09-10-2018, nº de documento...).

D)           A Demandante apresentou reclamação graciosa contra as liquidações de IVA referidas em C).

E)            Na reclamação graciosa, a Demandante alegou, além do mais, o seguinte:

“8º Diga-se que a Reclamante não procedeu à apresentação dos documentos comprovativos da saída dos bens do território nacional, por, à data da notificação do Relatório de Inspeção Tributária suprarreferido, não ter acesso aos mesmos.

9º No entanto, vem agora apresentar os devidos documentos.

Ora,

10º Do anexo IV ao Relatório, constam as faturas relativamente às quais a Autoridade Tributária e Aduaneira considera não estar preenchido o requisito do artigo 29º, nº 8 do CIVA,

11º Sendo que as liquidações adicionais cuja legalidade a reclamante vem impugnar correspondem ao período compreendido entre o mês 11 e 12 de 2017, e ao mês 04 de 2018.

12º Os bens exportados em questão foram faturados ao Contribuinte nº..., com sede na Noruega – “B... AS  -...” e ao Contribuinte nº..., com sede na Noruega – “C... AS” – relativamente aos quais foram emitidas as seguintes faturas:

PERÍODO             DATA     FATURA               VALOR

(EUROS)              IVA A EXIGIR

11/2017               30/11/2017         719/2017             8.124,00               1.868,52

11/2017               30/11/2017         720/2017             6.632,00               1.525,36

12/2017               14/12/2017         751/2017             32.287,52             7.426,13

12/2017               19/12/2017         768/2017             1.009,00               232,07

04/2018               09/04/2018         202/2018             16.557,00             3.808,23

04/2018               09/04/2018         203/2018             13.300,00             3.059,00

04/2018               10/04/2018         209/2018             1.143,20               262,94

04/2018               10/04/2018         210/2018             11.620,00             2.672,60

04/2018               10/04/2018         211/2018             3.449,92               793,48

04/2018               10/04/2018         212/2018             52.474,00             12.069,02

 

13º Da exportação dos bens identificados nas faturas nº 719/2017 e 720/2017 foi emitido documento de certificação de saída para o Expedidor/Exportador com referência nº..., com montante total de faturação igual a 14.756,00 euros (doc. 1 que ora se junta e se dá por integrado e reproduzido para todos os efeitos legais).

14º Da exportação de bens identificados na fatura nº 751/2017, foi emitido documento de certificação de saída para o Expedidor/Exportador com referência nº LNR-.../..., com montante total de faturação igual a 32.288,00 euros (doc. 2 que ora se junta e se dá por integrado e reproduzido para todos os efeitos legais).

15º Mais se diga que a fatura número 768/2017, versa sobre uma prestação de serviços, relativa a certificação de inspeção, e não de uma transição de bens, e, como tal, não recai sobre esta operação a obrigação de apresentação do documento de certificação de saída, não estando sujeita a IVA, visto que são efetuadas a sujeito passivo com sede noutro Estado, ao abrigo do artigo 1º do CIVA, a contrario.

16º Da exportação de bens identificados nas faturas números 202/2018 e 203/2018 foi emitido Documento de certificação de saída para o expedidor/exportador com referências nºs ... e LNR –..., com montante total faturado igual a 29.857,00 euros (doc. 3 que ora se junta e se dá por integrado e reproduzido para todos os efeitos legais).

17º da exportação de bens identificados nas faturas nºs 209/2018, 210/2018, 211/2018 e 212/2018, foi emitido Documento de certificação de saída para o expedidor/exportador com referências ...– ... e ...-..., com montante total faturado igual a 67.544,00 euros (doc. 4 que ora se junta e se dá por integrado e reproduzido para todos os efeitos legais).”

F)            Em 31 de Janeiro de 2019, a Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de ... elaborou “Informação” sobre a reclamação graciosa, em que disse, além do mais, o seguinte:

“11. Através da presente reclamação graciosa, a reclamante pretende comprovar documentalmente a qualidade de exportação de 10 operações, efetuadas para dois clientes com sede noruega, nos períodos 201711, 201712 e 201804, por forma a ver anuladas as respetivas correções de IVA no montante total de 33.717,35 €:

201711 (2) – 3.393,88 €;

201712 (2) – 7.658,20 €;

201804 (6) – 22.665,27 €

12. Os clientes com sede na Noruega são:

NO...– B... AS – ...(doravante apenas...)

NO ... –C... AS (doravante apenas C...)

IV. Apreciação

Relativamente às operações que a reclamante entende serem exportações, verifica se o seguinte:

1. 2017.11:

Fatura nº 719/2017, 30.11.2017 –B...– 8.124,00 € (IVA 1.868,52 €) [fls 9]

Fatura nº 720/2017, 30.11.2017 –B...– 6.632,00 € (IVA 1.525,36 €) [fl. 10]

Fatura nº 768/2017, 19.12.2017 –B...– 1.009,00 € (IVA 232,07 €) esta fatura será referente às “Inspection Certficate Expenses” relacionadas com a fatura nº 720/2017, conforme escrito à mão na cópia da fatura aquando do direito de audição ao PRIT [fls. 84]

a) Nos presentes autos, junta os documentos que constam a fols 7- 10:

1. Guia de transporte nº GT2017/331, de 30/11/2017;

2. Guia de transporte nº 0155147 do transportador D... Lda, identificando como destinatário uma empresa com sede em ..., onde se situa o local de descarga;

3. Cópia das faturas nº 71 e 720

b) Na petição alegava juntar documento de certificação de saída para o expedidor/exportador com referência nº..., no entanto o mesmo não constava dos documentos anexos a petição, pelo que foi expedida notificação no sentido de a mesma ser junta aos autos [fls. 89-90];

c) Aos 06.08.2019 foram entregues mais documentos aos autos, entre os quais consta o documento de fls. 108, que efetivamente constitui a certificação de saída pela estância aduaneira de expedição das mercadorias necessária para comprovar a exportação nos termos do nº 8 do artigo 29º do CIVA;

d) Relativamente à fatura nº 768/2017, de dezembro de 2017, a reclamante alega que se refere a prestação de serviços relativa a certificação de inspeção de material objeto de exportação, junta apenas a documentação comprovativa da certificação de saída das mercadorias exportadas a que se refere; alega ainda que por serem efetuadas a sujeito passivo com sede no outro estado, não são sujeitas a IVA ao abrigo do artigo primeiro do CIVA, a contrario;

e) As prestações de serviços diretamente relacionadas com a exportação de bens para fora da comunidade poderão beneficiar da isenção de IVA prevista na alínea p) e do nº 1 do artigo 14º do CIVA.

f) No caso em apreço, uma vez que as operações relacionadas são qualificadas como exportações para efeitos de isenção de IVA, também as prestações de serviços “conexas” ficam abrangidas por tal isenção de IVA.

Conclusão: Face ao exposto, por se encontrar documentalmente comprovada a exportação das mercadorias, estão reunidos os requisitos necessários a isenção de IVA relativamente a estas três faturas, devendo ser anulada a liquidação de IVA referente ao período 2017. 11 no montante de €3.393,88 e a de 2017.12 no montante de €232,07.

2. 2017.12:

Fatura número 751/2017, de 14/12/2017 –C...– 32.287,52€ (IVA 7.426,13€) [fls.13]

a) Nos presentes autos junta os documentos que constam a fls. 11-18:

1. Guia de transporte nº GT 2017/349 de 14.12.2017;

2. CMR nº ... do transportador Soc. E... Lda, identificando o local de entrega da mercadoria na Noruega sem carimbo de receção da mercadoria;

3. Cópia de fatura;

4. Cópia de documento emitido por entidade alfandegária norueguesa;

5. “International consigment note” (CMR), assinado e datado quanto à receção das mercadorias, sem qualquer carimbo;

6. Documento “Europese...” nº ..., de acompanhamento da exportação;

7. Documento denominado “Confirmation of Exit”, onde identifica o documento referido no ponto anterior e informa confirmar a saída da União Europeia.

b) Na petição alega juntar documento de “Certificação de saída para o expedidor/exportador nº... -...”, no entanto, o mesmo não constava dos documentos anexos à petição pelo que foi expedida notificação no sentido de a mesma ser junta aos autos [fls. 89-90];

c) Em sede de direito de audição ao PRIT a reclamante já tinha apresentado estes documentos exceto o último (“Confirmation of Exit”);

d) Não se trata do impresso oficial da autoridade alfandegária, conforme o documento que logrou obter relativamente às faturas anteriores – ponto 1);

e) Na sequência da notificação mencionada em B, a reclamante não acrescentou qualquer documento novo, tendo enviado documentos que já anteriormente tinha apresentado, sendo que nenhum deles configura a Certificação de Saída pela estância aduaneira de expedição das mercadorias, necessária para comprovar a exportação nos termos do nº 8 do artigo 29º do C IVA.

f) Subsistindo a falta de apresentação da documentação alfandegária apropriada nos termos do nº 8 do artigo 29º do CIVA, serão de manter as correções referentes a estas faturas (2017.12 – 7.426,13€).

4. 2018:04:

Fatura nº 209/2018,10.04.2018 –B...– 1.143,20 € (IVA 262,94 €) [fls. 29]

Fatura nº 210/2018,10.04.2018 –B...– 11.620,00 € (IVA 2.672,60 €) [fls. 27]

Fatura nº 211/2018,10.04.2018 –B...– 3.449,92 € (IVA 793,48 €) [fls. 28]

Fatura nº 212/2018,10.04.2018 –B...– 52.474,00€ (IVA 12.069,02 €) [fls. 30]

a) Nos presentes autos junta os documentos que constam a fls. 25-33:

1. Guia de transporte nº GT2018/95, de 10.04.2018;

2. CMR nº ... do transportador F..., AS, identificando o local de entrega da mercadoria na Noruega sem carimbo de receção da mercadoria;

3. Cópia das faturas;

4. Documento emitido por entidade alfandegária norueguesa;

5. Documento denominado “Confirmation of Exit”, onde se informa confirmar a saída da União Europeia.

b) Na petição alega juntar “documento de Certificação de saída para o expedidor/exportador com referências nº ...-... e ...-...”, no entanto o mesmo não constava dos documentos anexos à petição, pelo que foi expedida notificação no sentido de as mesmas serem juntas aos autos [fls. 89-90];

c) Em sede de direito de audição ao PRIT a reclamante já tinha apresentado estes documentos, exceto o último e tinha ainda apresentado uma documento “Europese...” nº ..., de acompanhamento da exportação [fls. 88];

d) O documento ora acrescido não configura o impresso oficial da autoridade alfandegária, conforme outros documentos que tinha junto em sede de direito de audição e que foram aceites para a comprovação exigida (exemplo para fatura nº 643/2017, a fls. 87), pelo que não será de aceitar para este efeito;

e) Na sequência da notificação mencionada em b), a reclamante não acrescentou qualquer documento novo, tendo reenviado documentos que já anteriormente tinha apresentado, sendo que nenhum deles configura a Certificação de Saída pela estância aduaneira de expedição das mercadorias, necessária para comprovar a exportação nos termos do nº 8 do artigo 29º do CIVA;

f) relativamente à fatura nº 209/2018, a reclamante alega que se referem a prestação de serviços relativas a certificação de inspeção de material objeto de exportação, juntando apenas a documentação comprovativa da certificação de saída das mercadorias exportadas a que se refere; alega ainda que por serem efetuadas a sujeito passivo com sede no outro estado, não são sujeitas a IVA, ao abrigo do artigo 1º do CIVA, a contrario;

g) As prestações de serviços diretamente relacionadas com a exportação de bens para fora da comunidade poderão beneficiar da isenção de IVA prevista na alínea p) do nº 1 do artigo 14º do C IVA;

h) No caso em apreço, uma vez que as operações relacionadas não podem ser qualificadas como exportações para efeitos de isenção de IVA, por falta de comprovação documental prevista no nº 8 do artigo 29º do CIVA, também as prestações de serviços “conexas” ficam fora do âmbito da isenção de IVA.

Subsistindo a falta de apresentação da documentação alfandegária apropriada nos termos do nº 8 do artigo 29º do C IVA, serão de manter as correções referentes a estas faturas (2018.04 – 15.798,04 €).

3.  2018.04:

Fatura nº 202/2018, 09.04.2018 –C...– 16.557,52 € (IVA 3.808,23 €) [fls. 21]

Fatura nº 203/2018, 09.04.2018 – C... – 13.300,00 € (IVA 3.059,00 €) [fls. 22]

a) Nos presentes autos junta dos documentos que constam a fls. 19-24:

1. Guia de transporte nº GT2018/96, de 10.04.2018;

2. CMR nº ... do transportador F..., AS, identificando o local de entrega da mercadoria na Noruega sem carimbo de receção da mercadoria;

3. Cópia das faturas;

4. Documento denominado “Europese...” nº 1..., de acompanhamento da exportação;

5. Documento denominado “Confirmation of Exit”, onde identifica o documento referido no ponto anterior e informa confirmar a saída da União Europeia.

b) Na petição alega juntar “documento de Certificação de saída para o expedidor/exportador com referências nº UCR-... e LNR-...”, no entanto o mesmo não constava dos documentos anexos à petição, pelo que foi expedida notificação no sentido de as mesmas serem juntas aos autos [fls. 89-90];

c) Em sede de direito de audição ao PRIT a reclamante já tinha apresentado estes documentos, exceto o último;

d) Não se trata do impresso oficial da autoridade alfandegária, conforme o documento que logrou obter relativamente às faturas referidas no ponto 1);

e) Na sequência da notificação mencionada em b), a reclamante não acrescentou qualquer documento novo, tendo reenviado documentos que já anteriormente tinha apresentado, sendo que nenhum deles configura a Certificação de Saída pela estância aduaneira de expedição das mercadorias, necessária para comprovar a exportação nos termos do nº 8 do artigo 29º do CIVA;

Subsistindo a falta de apresentação da documentação alfandegária apropriada nos termos do nº 8 do artigo 29º do IVA, serão de manter as correções referentes a estas faturas (2018.04 – 6.867,23€).

V. Conclusão

Considerando tudo quanto anteriormente foi exposto, propõe-se o deferimento parcial da presente reclamação graciosa:

- anulando-se a liquidação adicional de IVA referente ao período 2017. 11 no montante de 3.393,88 € e a de 1017. 12 no montante de 232,07 €;

- mantendo-se as restantes liquidações de IVA reclamadas.”

G)           Pelo ofício nº..., de 29-08-2019, a Demandante foi notificada para audiência prévia no procedimento de reclamação graciosa.

H)           A Demandante apresentou pronúncia de audiência prévia, em que disse, além do mais, o seguinte:

“3º A AT, de entre os documentos comprovativos da saída dos bens do território da União Europeia para a Noruega, com transporte de Portugal à Holanda, e saída desse Estado para o país terceiro, apenas considerou que só relativamente às faturas nºs 719/2017, 720/2017 e 768/2017 se encontram preenchidos os requisitos legais para que as operações subjacentes a estes documentos sejam isentas de IVA por efeito da sua subsunção ao regime da alínea a) do nº 1 do artigo 14º do RITI da alínea a do número um do artigo 14º do CIVA.

(...)

5º Logo, a AT considera que não estarem preenchidos os requisitos do artigo 29º nº 8 do CIVA, relativamente às seguintes faturas:

PERÍODO             DATA     FATURA               VALOR

(EUROS)              IVA A EXIGIR

12/2017               14/12/2017         751/2017             32.287,52             7.426,13

04/2018               09/04/2018         202/2018             16.557,00             3.808,23

04/2018               09/04/2018         203/2018             13.300,00             3.059,00

04/2018               10/04/2018         209/2018             1.143,20               262,94

04/2018               10/04/2018         210/2018             11.620,00             2.672,60

04/2018               10/04/2018         211/2018             3.449,92               793,48

04/2018               10/04/2018         212/2018             52.474,00             12.069,02

 

ASSIM

6º Da exportação de bens identificados na fatura nº 751/2017, foi emitido o documento de certificação de saída para o Expedidor/Exportador nº ... (doc. 1 que ora se junta e se dá por integrado e reproduzido para todos os efeitos legais), tido pela Noruega, redigido na língua norueguesa.

7º Consta também o documento de confirmação de saída número LRN-.../... (doc. 2 que ora se junta e se dá por integrado e reproduzido para todos os efeitos legais).

8º Ora, em ambos os documentos constam dados claros dos quais se pode retirar a conclusão de que a mercadoria em transporte, e cuja saída da União Europeia se encontra certificada, dado que todos os dados expostos são consistentes com os dados constantes da fatura respetiva:

Exemplo: pedo bruto constante te da fatura, corresponde ao peso bruto da mercadoria constante da confirmação de saída.

9º Diga-se que o documento de certificação de saída da mercadoria da EU encontra-se devidamente assinado e cumpre todos os requisitos legais.

10º Este documento de certificação de saída para o expedidor deve cumprir um determinado número de requisitos, identificados por números, aos quais devem fazer corresponder os dados exigidos.

11º Isto é assim, tanto para um documento redigido em norueguês, como em português, e através desses números, que identificam as “casas” e os requisitos exigidos, traduzidos em dados da operação de exportação é possível proceder a uma correlação entre os dados fornecidos em “casas” com denominações em outras línguas, com as “casas” denominadas em português.

12º O mesmo se diga relativamente às faturas números 210/2018, 211/2018 e 212/2018, cujos bens sujeitos a exportação constam dos documentos de certificação de saída para o expedidor/exportador nºs UL ... (docs. 3 e 4 que ora se juntam e se dão por integrados e reproduzidos para todos os efeitos legais).

13º Mais uma vez, tais documentos encontram-se redigidos em norueguês, que é a língua do país do destinatário dos bens.

14º Mais, exportação destes bens é confirmada pelo documento de confirmação de saída com as referências nºs UCR-... e LNR-..., documento este que confirma a saída destes bens a partir da Holanda, com destino a Noruega, e no qual é expressamente referido o número das faturas 210/2018, 211/2018 e 212/2018, assim como pedo bruto da mercadoria corresponde ao total do peso bruto previsto nas faturas (doc. 5 que ora se junta e se dá por integrado e reproduzido para todos os efeitos legais).

15º Também a exportação dos bens descritos nas faturas números 202/2018 e 203/2018 encontram-se expressamente previstas no documento de confirmação de saída com referência nº o UCR-... e LNR-..., cujo pedo bruto da mercadoria em exportação corresponde exatamente ao peso bruto total previsto em ambas as faturas, assim como o preço total pago pelos bens (doc. 6 que ora se junta e se dá por integrado e reproduzido para todos os efeitos legais).

16º Resulta do exposta que a AT tem documentos suficientes para estabelecer um nexo causal com as faturas em análise.

(...)”

I)             Em 20-09-2019, a Direção de Finanças de ... enviou à Direção de Serviços do Imposto sobre o Valor Acrescentado a comunicação nº ...2019..., em que pedia esclarecimento sobre se os documentos juntos pela Demandante ao processo de reclamação graciosa (a fls. 16-16, 23-24 e 31-33) deveriam ser aceites como prova de exportação dos bens em causa, para efeitos do previsto no nº 8 do artigo 29º do CIVA.

 

2.2. Factos não provados

Não se provou que tivesse sido notificada à Demandante decisão expressa sobre o procedimento de reclamação graciosa e, portanto, que tenha havido um deferimento parcial da reclamação graciosa.

 

2.3. Fundamentação da decisão da matéria de facto

Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos ao processo por ambas as Partes.

 

3. Matéria de direito

3.1. Questões a decidir

A questão a decidir no presente processo arbitral consiste em saber se é legal a recusa, por parte da Autoridade Tributária e Aduaneira, de reconhecer a isenção de IVA em determinadas vendas, com base na falta de certos documentos alfandegários, nomeadamente o documento de “certificação de saída” emitido pela estância alfandegária competente no termos da legislação aduaneira aplicável.

 

3.2. Discussão

A demandante efetuou vendas de bens, entre novembro de 2017 e abril de 2018, pelas quais emitiu as faturas: 719/2017; 720/2017; 751/2017; 768/2017; 202/2018; 203/2018; 209/2018; 210/2018; 211/2018; e 212/2018.

A Demandante alega que estas vendas se qualificam como exportações, por terem tido como destinatárias/compradoras as empresas B... AS e C... AS, ambas domiciliadas na Noruega, e por as mercadorias terem efetivamente sido expedidas/transportadas para fora do território da Uni\ao Europeia, pelo que pretende que em relação às mesmas seja reconhecida a isenção de IVA estabelecida no art. 14º, n.º 1, al. a) do respetivo Código.

O artigo 29º do CIVA estabelece, no seu nº 8, que “As transmissões de bens e as prestações de serviços isentas ao abrigo das alíneas a) a j), p) e q) do n.º 1 do artigo 14.º e das alíneas b), c), d) e e) do n.º 1 do artigo 15.º devem ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados ou, não havendo obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros, de declarações emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhes irá ser dado.”

Acrescenta ainda, no nº 9, que “a falta dos documentos comprovativos referidos no número anterior determina a obrigação para o transmitente dos bens ou prestador dos serviços de liquidar o imposto correspondente.”

A Demandante apresentou os seguintes documentos, que pretende serem comprovativos das exportações para efeitos do nº 8 do art. 29º:

             Para as faturas nº 719/2017 (30.11.2017), nº 720/2017 (30.11.2017) e a fatura nº 768/2017 (19.12.2017):

o             Cópia das faturas;

o             Guia de transporte nº GT2017/331, de 30/11/2017;

o             Guia de transporte nº 0155147 do transportador D... Lda;

o             Certificação de saída das mercadorias pela estância aduaneira de expedição (Freixieiro - Portugal);

             Para a fatura nº 751/2017 (14/12/2017):

o             Cópia de fatura;

o             Guia de transporte nº GT 2017/349 de 14.12.2017;

o             CMR nº ...do transportador Soc. E... Lda;

o             Cópia de documento emitido por entidade alfandegária norueguesa, datado de 22.12.2017, que alega ser a Certificação de Saída para o Expedidor/Exportador nº ...;

o             “International consignment note” (CMR), assinado e datado quanto à receção das mercadorias, sem qualquer carimbo;

o             Documento “Europese...” nº..., de acompanhamento da exportação;

o             Documento denominado “Confirmation of Exit” n.º LRN-.../... onde se identifica o documento referido no ponto anterior e se confirma a saída da União Europeia pela estância alfandegária de Roterdão – Holanda.

             Para as faturas nº 209/2018 (10.04.2018), nº 210/2018 (10.04.2018), nº 211/2018 (10.04.2018), e nº 212/2018 (10.04.2018) 

o             Cópia das faturas;

o             Guia de transporte nº GT2018/95, de 10.04.2018;

o             CMR nº ... do transportador F..., AS, identificando o local de entrega da mercadoria na Noruega sem carimbo de receção da mercadoria;

o             Cópia de documento emitido por entidade alfandegária norueguesa, datado de 20.04.2018, que alega ser a Certificação de Saída para o Expedidor/Exportador nº UL... (referente à fatura 210/2018);

o             Cópia de documento emitido por entidade alfandegária norueguesa, datado de 20.04.2018, que alega ser a Certificação de Saída para o Expedidor/Exportador nº UL..., referente às faturas 211/2018 e 212/2018;

o             Documento denominado “Confirmation of Exit”, emitido a 18.04.2018 pela estância alfandegária de Roterdão – Holanda;

             Para as faturas nº 202/2018 (09.04.2018) e nº 203/2018 (09.04.2018):

o             Cópia das faturas;

o             Guia de transporte nº GT2018/96, de 10.04.2018;

o             CMR nº ... do transportador F..., S.A., identificando o local de entrega da mercadoria na Noruega sem carimbo de receção da mercadoria;

o             Documento denominado “Europese...” nº..., de “acompanhamento da exportação”;

o             Documento denominado “Confirmation of Exit” emitido a 14.04.2018 pela estância aduaneira de Roterdão – Holanda;

Destes documentos, alguns foram apresentados ainda no âmbito da inspeção tributária, outros foram-no já no âmbito do procedimento de reclamação graciosa.

No Relatório de Inspeção, que serviu de base e de fundamento às liquidações impugnadas, a Autoridade Tributária considerou que os documentos (até então) apresentados não provavam a existência de exportações, para os efeitos do art. 29º, nº 8 do CIVA.

A Diretiva IVA (Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006), relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, no art. 14.º, n.º 1, estabelece:

“Entende‑se por «entrega de bens» a transferência do poder de dispor de um bem corpóreo como proprietário.”

Incluído no capítulo 1, sob a epígrafe «Disposições gerais», do título IX, intitulado «Isenções», da Diretiva IVA, o artigo 131.º dispõe:

“As isenções previstas nos capítulos 2 a 9 aplicam‑se sem prejuízo de outras disposições comunitárias e nas condições fixadas pelos Estados—Membros a fim de assegurar a aplicação correta e simples das referidas isenções e de evitar qualquer possível fraude, evasão ou abuso.”

Incluído no capítulo 6, intitulado “Isenções na exportação”, do título IX da Diretiva IVA, o artigo 146.º, n.º 1, prevê:

“Os Estados—Membros isentam as seguintes operações:

As entregas de bens expedidos ou transportados, pelo vendedor ou por sua conta, para fora da Comunidade;

 […]”

Incluído no capítulo 7, sob a epígrafe “Disposições diversas”, do título XI, sob a epígrafe “Obrigações dos sujeitos passivos e de determinadas pessoas que não sejam sujeitos passivos”, da Diretiva IVA, o artigo 273.º estabelece:

“Os Estados‑Membros podem prever outras obrigações que considerem necessárias para garantir a cobrança exata do IVA e para evitar a fraude, sob reserva da observância da igualdade de tratamento das operações internas e das operações efetuadas entre Estados‑Membros por sujeitos passivos, e na condição de essas obrigações não darem origem, nas trocas comerciais entre Estados‑Membros, a formalidades relacionadas com a passagem de uma fronteira.”

O art. 14º, n.º 1, al. a) do CIVA constitui transposição do art. 146.º, n.º 1, al. b) da Diretiva IVA, nos termos da qual os Estados Membros “isentam as entregas de bens expedidos ou transportados pelo adquirente ou por sua conta para fora da União”.

 

Constitui doutrina do Tribunal de Justiça da União Europeia que esta disposição deve ser interpretada em conjugação com o artigo 14.º, n.º 1, desta diretiva, nos termos do qual se entende por “entrega de bens” a transferência do poder de dispor de um bem corpóreo como proprietário (v., neste sentido, Acórdãos de 28.02.2018, Pieńkowski, C 307/16, EU:C:2018:124, n.º 24; e 17.12.2020, BAKATI PLUS, C‑656/19, EU:C:2020:1045, nº 55).

Esta isenção visa garantir a tributação das prestações de serviços no lugar de destino, ou seja, aquele onde os produtos exportados serão consumidos (v., neste sentido, Acórdão de 08.11.2018, Cartrans Spedition, C 495/17, EU:C:2018:887, n.º 34; e Acórdão de 28.03.2019, Milan Vins, C-275/18, nº 23).

Decorre das exigências tanto da aplicação uniforme do direito da União como do princípio da igualdade, que os termos de uma disposição do direito da União que não comporte uma remissão expressa para o direito dos Estados‑Membros para determinar o seu sentido e o seu alcance devem em princípio ser objeto de uma interpretação autónoma e uniforme em toda a União (Acórdãos de 18.10.2011, Brüstle, C‑34/10, EU:C:2011:669, n.° 25 e jurisprudência referida, e de 23 de abril de 2020, Associazione Avvocatura per i diritti LGBTI, C‑507/18, EU:C:2020:289, n.° 31 e jurisprudência referida).

Decorre, por outro lado, do disposto no art. 146º, n.º 1, als. a) e no art. 14º, n.º 1 da Diretiva IVA, que a isenção da entrega para exportação é aplicável quando o direito de dispor do bem como proprietário tiver sido transferido para o adquirente, quando o fornecedor demonstrar que o bem foi expedido ou transportado para fora da União e quando, na sequência dessa expedição ou transporte, o bem saiu fisicamente do território da União (v., neste sentido, Acórdão de 28 de fevereiro de 2018, Pieńkowski, C 307/16, EU:C:2018:124, n.º 25; ).

No que diz respeito às exigências de prova da ocorrência de uma exportação, a jurisprudência do TJUE tem firmado o entendimento de que, para dar como provado que os bens foram “expedidos ou transportados para fora da União” não é necessária verificação do cumprimento exaustivo das obrigações impostas pela legislação aduaneira, nomeadamente o Código Aduaneiro da União e o seu Regulamento de Aplicação.

Nomeadamente, a qualificação de uma operação como entrega para exportação nos termos do artigo 146.º, n.º 1, alínea a), da Diretiva IVA não pode depender da colocação dos bens em causa sob o regime aduaneiro de exportação, cujo incumprimento tenha por consequência privar definitivamente o sujeito passivo da isenção na exportação. (v. Acórdão de 28.03.2019, Milan Vins, C-275/18, nº 27).

Cabe aos Estados Membros fixar, em conformidade com o artigo 131.º da Diretiva IVA, as condições da isenção das operações de exportação com o fim de assegurar a aplicação correta e simples das isenções previstas por esta diretiva e evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso. No exercício dos seus poderes, os Estados Membros devem respeitar os princípios gerais de direito que fazem parte da ordem jurídica da União, entre os quais se inclui o princípio da proporcionalidade (v., neste sentido, Acórdão de 8 de novembro de 2018, Cartrans Spedition, C 495/17, EU:C:2018:887, n.º 37).

Em relação a este princípio, importa salientar que uma medida nacional vai para além do que é necessário para assegurar a cobrança exata do imposto se fizer depender, no essencial, o direito à isenção de IVA do cumprimento de obrigações formais, sem ter em conta os seus requisitos materiais e, nomeadamente, sem se interrogar sobre se estes foram respeitados. Com efeito, as operações devem ser tributadas tomando em consideração as suas características objetivas (Acórdão de 8 de novembro de 2018, Cartrans Spedition, C 495/17, EU:C:2018:887, n.º 38).

Ora, no caso dos autos, a Demandante juntou, para todas as vendas que pretende ver isentas, documentos alfandegários que atestam materialmente a saída dos bens do território aduaneiro da União, independentemente de saber se todas as formalidades alfandegárias foram respeitadas.

Vejamos:

Para as faturas nº 719/2017 (30.11.2017), nº 720/2017 (30.11.2017) e a fatura nº 768/2017 (19.12.2017), foi junto, já no procedimento de reclamação graciosa, o documento de “Certificação de saída” das mercadorias, emitido pela estância aduaneira de expedição, sendo esta a alfândega do Freixieiro (Portugal).

A Autoridade Tributária, no projeto de decisão da reclamação graciosa, dá como provada a exportação no caso destas faturas.

Para a fatura nº 751/2017 (14/12/2017), a Demandante juntou:

             Cópia de documento emitido por entidade alfandegária norueguesa, datado de 22.12.2017, que alega ser a Certificação de Saída para o Expedidor/Exportador nº 100073405;

             Documento denominado “Confirmation of Exit” n.º LRN-... onde se identifica o documento referido no ponto anterior e se confirma a saída da União Europeia pela estância alfandegária de Roterdão – Holanda.

Para as faturas nº 209/2018 (10.04.2018), nº 210/2018 (10.04.2018), nº 211/2018 (10.04.2018), e nº 212/2018 (10.04.2018), a Demandante junta os seguintes documentos alfandegários:

             Cópia de documento emitido por entidade alfandegária norueguesa, datado de 20.04.2018, que alega ser a Certificação de Saída para o Expedidor/Exportador nº UL... (referente à fatura 210/2018);

             Cópia de documento emitido por entidade alfandegária norueguesa, datado de 20.04.2018, que alega ser a Certificação de Saída para o Expedidor/Exportador nº UL..., referente às faturas 211/2018 e 212/2018;

             Documento denominado “Confirmation of Exit”, emitido a 18.04.2018 pela estância alfandegária de Roterdão – Holanda;

Para as faturas nº 202/2018 (09.04.2018) e nº 203/2018 (09.04.2018), a Demandante juntou:

             Documento denominado “Europese...” nº ..., de “acompanhamento da exportação”;

             Documento denominado “Confirmation of Exit” emitido a 14.04.2018 pela estância aduaneira de Roterdão – Holanda;

Para todas as faturas, junta ainda vários outros documentos: guias de transporte, documento de acompanhamento de exportação, etc.

Em relação a alguns destes documentos – aqueles juntos no âmbito do procedimento de reclamação graciosa – a Autoridade Tributária não tomou qualquer decisão definitiva expressa, mas apenas se pronunciou na “Informação” junta ao procedimento de reclamação graciosa.

Contudo, no Relatório de Inspeção, que serve de fundamento às liquidações impugnadas, a Autoridade Tributária diz:

“(...) da análise à documentação remetida pelo sujeito passivo, verificou-se que nem todas as faturas de exportação declaradas no campo 8 das respetivas declarações periódicas estão devidamente comprovadas com o documento de certificação de saída, conforme impõe o nº 8 do artigo 29º CIVA, pelo que, relativamente a essas e nos termos do nº 9 do mesmo artigo, deverá ser exigido o imposto em falta (...).”

É certo que vários dos documentos alfandegários juntos pela Demandante o foram apenas na fase da reclamação graciosa, não podendo o RIT pronunciar-se sobre eles.

Relativamente às vendas às quais correspondem esses documentos, ocorreu o indeferimento tácito sobre a reclamação deduzida, sem que se possam conhecer os fundamentos de tal indeferimento.

Por conseguinte, a fundamentação relevante é a que consta do RIT, consistindo esta em que não foi junto o “documento de certificação de saída”.

Ora, resulta da jurisprudência já citada do TJUE que não é essencial, para que um sujeito passivo possa beneficiar da isenção prevista no art. 146.º, nº 1, al. a) da Diretiva, que o mesmo cumpra rigorosamente a legislação aduaneira. O que tem, sim, é de provar que a saída das mercadorias do território da União ocorreu.

Segundo jurisprudência do Tribunal de Justiça, só existem dois casos em que o incumprimento de um requisito formal pode implicar a perda do direito à isenção de IVA (Acórdão de 8 de novembro de 2018, Cartrans Spedition, C 495/17, EU:C:2018:887, n.º 40).

Em primeiro lugar, o princípio da neutralidade fiscal não pode ser invocado, para efeitos da isenção de IVA, por um sujeito passivo que tenha participado intencionalmente numa fraude fiscal que pôs em perigo o funcionamento do sistema comum do IVA. Segundo jurisprudência do Tribunal de Justiça, não é contrário ao direito da União exigir a um operador que aja de boa fé e tome todas as medidas que lhe podem ser razoavelmente exigidas para garantir que a operação que efetua não implica a sua participação numa fraude fiscal. Na hipótese de o sujeito passivo em causa saber ou dever saber que a operação que efetuou estava implicada numa fraude cometida pelo adquirente e de não ter tomado todas as medidas razoáveis ao seu alcance para evitar essa fraude, deve ser lhe recusado o direito à isenção de IVA (Acórdão de 8 de novembro de 2018, Cartrans Spedition, C 495/17, EU:C:2018:887, n.º 41).

No caso em apreço, a recusa da isenção em causa não se baseou na existência de tal fraude.

Por outro lado, a violação de um requisito formal pode levar a uma recusa de isenção de IVA se essa violação tiver por efeito impedir a produção da prova incontestável do cumprimento dos requisitos de fundo (Acórdão de 8 de novembro de 2018, Cartrans Spedition, C 495/17, EU:C:2018:887, n.º 42).

Na medida em que a não colocação dos bens destinados a exportação no referido regime aduaneiro pode ter normalmente por efeito tornar mais difícil ou até impossível para as autoridades tributárias a verificação da saída efetiva dos bens do território da União, é verdade que a realidade da exportação deve ser objeto de prova bastante perante as autoridades tributárias competentes, uma vez que esta exigência se refere aos requisitos materiais de concessão da isenção (v., neste sentido, Acórdão de 8 de novembro de 2018, Cartrans Spedition, C 495/17, EU:C:2018:887, n.º 48).

Contudo, não foi alegado pela Autoridade Tributária que a falta de colocação dos bens em causa sob o regime aduaneiro de exportação tenha impedido de provar que os requisitos materiais, in casu, a saída efetiva dos bens do território da União, foram cumpridos.

A Autoridade Tributária apenas alegou que o documento apresentado não era o devido, sem alegar ou demonstrar que os documentos apresentados não provavam materialmente a exportação.

Na sua resposta, a Autoridade Tributária alega que a Demandante não deu ou não provou ter dado devido cumprimento às suas obrigações legais no âmbito da legislação aduaneira, nomeadamente declarando os bens para o regime de exportação.

Mas, em primeiro lugar, não foi com base nessa alegação que, no Relatório de Inspeção, se recusaram os documentos apresentados, mas apenas com base no argumento de que os documentos apresentados não eram os “documentos de certificação de saída” previstos na legislação aduaneira.

Em segundo lugar, o Tribunal considerou já, expressamente, que não é indispensável que as mercadorias sejam colocadas no “regime aduaneiro de exportação”, para que possa haver-se por provada uma exportação para efeitos de isenção de IVA.

Com efeito, disse o Tribunal no acórdão Milan Vinš, já citado:

“A este respeito, uma condição como a prevista no artigo 66.º, n.º 1, da Lei n.º 235/2004, que impede a concessão de uma isenção de IVA a uma entrega de bens que não tenham sido colocados sob o regime aduaneiro de exportação, ainda que seja ponto assente que esses bens foram efetivamente exportados em conformidade com os critérios recordados no n.º 24 do presente acórdão, e que, por conseguinte, esta entrega corresponde, pelas suas características objetivas, às condições de isenção previstas no artigo 146.º, n.º 1, alínea a), da Diretiva IVA, não respeita o princípio da proporcionalidade.

Com efeito, impor tal condição equivaleria a fazer depender o direito à isenção do cumprimento de obrigações formais, na aceção da jurisprudência citada no n.º 29 do presente acórdão, sem examinar a questão de saber se os requisitos de fundo impostos pelo direito da União foram ou não efetivamente satisfeitos. A simples circunstância de um exportador não ter colocado os bens em causa sob o regime aduaneiro da exportação não implica que essa exportação não tenha efetivamente ocorrido (v., por analogia, Acórdão de 8 de novembro de 2018, Cartrans Spedition, C‑495/17, EU:C:2018:887, n.º 50).”

Assim, não bastava à Autoridade Tributária alegar que o documento apresentado não é aquele que a legislação aduaneira impõe que o sujeito passiva tenha para efeitos de exportação, mas teria de alegar e demonstrar que os documentos apresentados não provam materialmente as exportações, o que a Demandada não fez.

 Ao basear a recusa da isenção, meramente, no não cumprimento, por parte da Demandante, de uma obrigação formal – a apresentação do documento de “certificação de saída” emitido pela estância aduaneira competente nos termos da legislação aduaneira em vigor, a Autoridade Tributária impôs àquela uma condição não conforme com o artigo 29º, nº 8 do CIVA, ferindo os atos tributários de ilegalidade por erro sobre os pressupostos de direito.

 

4. DECISÃO

Assim, nos termos anteriormente expostos, decide-se:

A.           Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;

B.            Anular a decisão de indeferimento tácito do procedimento de reclamação graciosa nº ...2019...;

C.            Anular, consequentemente, as liquidações de IVA:

             N.º ... (de 09-10-2018, nº de documento...);

             N.º ... (de 09-10-2018, nº de documento...);

             N.º 2018 ... (de 09-10-2018, nº de documento 2018...).

 

5. Valor do processo

Nos termos do art. 97.º-A nº 1, al. a) do CPPT do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 3 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor do processo em 33.717,35 euros.

 

6. Custas

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em 1 836.00 euros, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Demandada.

Notifique-se.

 

Porto, 10 de maio de 2021.

 

O Árbitro

(Nina Aguiar)