DECISÃO ARBITRAL (consultar versão completa no PDF)
Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dra. Cristina Aragão Seia e Dra. Rita Guerra Alves (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 01-09-2020, acordam no seguinte:
1. Relatório
A..., S.A., (doravante “Requerente” ou “Sociedade”), com sede na ..., ..., Lote..., ...-... ..., pessoa coletiva e matriculada na Conservatória do Registo Comercial sob o número único ..., veio, nos termos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), requerer a constituição de Tribunal Arbitral.
A Requerente pede que se
i) Declare a ilegalidade das liquidações de IVA n.ºs 2020..., 2020..., 2020..., 2020..., e das liquidações de juros de IVA n.ºs 2020..., 2020..., 2020..., 2020..., referentes aos períodos de T12/2016, T12/2017, T12/2018 e T12/2019, ordenando a sua anulação e consequente restituição das importâncias pagas, no montante total de 112.951 euros;
(ii) Declare a ilegalidade das liquidações adicionais de IVA n.ºs..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ... referentes aos períodos de T06/2015 a T12/2019, devendo as mesmas ser anuladas, e em consequência ser reconhecido o direito da Requerente ao reporte do IVA deduzido no montante de 137.983,97 euros;
(iii) Julgue procedente o pedido de pagamento de juros indemnizatórios a calcular sobre a importância de 112.951,00 euros, contados desde a data em que foi efetuado o respetivo pagamento até integral reembolso das quantias pagas.
A Requente defende ainda que deve ser suspensa a instância para reenvio prejudicial ao TJUE, para que esta instância se pronuncie sobre a conformidade do n.º 1 do artigo 19.º e do n.º 2 do artigo 26.º do Código do IVA, na interpretação proposta pela AT, com os princípios e normas que constituem o sistema comum do IVA, nomeadamente com as normas previstas na Diretiva 2006/112/CE, de 28 de novembro de 2006 e com os princípios aí consagrados, tais como o princípio da neutralidade do IVA e o princípio do direito à dedução do IVA.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 04-06-2020.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, os Árbitros que foram designados pelo Conselho Deontológico comunicaram a aceitação do encargo, no prazo aplicável.
Em 31-07-2020, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 01-09-2020.
A Administração Tributária e Aduaneira apresentou Resposta em que defendeu que o pedido de pronúncia arbitral deve ser julgado improcedente.
Em 13-01-2021, foi realizada uma reunião em que foi produzida prova testemunhal e decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas simultâneas.
Apenas a Requerente apresentou alegações.
No entanto, a Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou em 19-04-2021 um requerimento exercendo o direito de contraditório em relação a documentos juntos pelo Sujeito Passivo.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e é competente.
As Partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos:
A) A Requerente era possuidora do prédio urbano designado por ..., ..., situado na ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o número ... e inscrito na matriz urbana sob o artigo ..., da freguesia e concelho de ... (Documentos n.ºs 39 e 40);
B) A posse do referido imóvel foi tomada pela Requerente em Janeiro de 2005, na sequência da celebração de um contrato promessa de constituição de direito de superfície entre a Requerente e o Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento (AICEP) (documento n.º 41 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
C) A escritura de constituição do direito de superfície veio a ser outorgada em 22 de Dezembro de 2009 (documento n.º 41);
D) O direito de superfície constituído pelo prazo de 20 anos, prorrogável, consistiu inicialmente no direito de a ora Requerente construir e manter uma unidade industrial de produção de cimento por meio de moagem de clinker, na parcela de terreno que compunha o prédio urbano;
E) A Requerente levou a efeito a construção de uma unidade industrial na referida parcela de terreno, tendo as obras do imóvel terminado em 2007;
F) Com a celebração de contrato de direito de superfície, para durar até 2025, e a subsequente construção do imóvel, a Requerente ficou com encargos anuais de cerca de € 220.000 anuais (depoimento da testemunha B...);
G) A intenção da Requerente era importar cimento do Egipto e Turquia e distribuir no mercado português, mas, quando estava para iniciar a actividade, ocorreu a crise na construção civil e a crise financeira em 2009 que inviabilizaram o projecto, por falta de competitividade (depoimento da testemunha B...)
H) Em 2009, para atenuar os prejuízos, a Requerente cedeu de arrendamento a unidade industrial, composta pelo edifício e equipamentos, à C... S.A. – Sucursal em Portugal (adiante referida abreviadamente por “C...”) (documento n.º 43 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e depoimento da testemunha B...);
I) De acordo com o contrato de arrendamento celebrado com a C..., SA em 31-07-2009, o conjunto de imóveis alvo de arrendamento consistiu em:
1. Silo de armazenagem, composto por duas zonas. com área total de 5,10 m2;
2 Terreno na área envolvente do silo com 5.000 m2;
3. Edifício destinado a vestiário e instalações sanitárias;
4. Edifício de escritório;
5. Portaria e báscula de pesagem de camiões e controlo de entradas e saídas;
J) O valor da renda mensal inicial era de 22.000,00 EUR, com dois meses de caução (44.000,00 EUR) e a duração do contrato seria de 24 meses. renovável automaticamente por períodos de 12 meses;
K) Em 26-04-2010, foi redigido novo contrato, já não constando o "Terreno na área envolvente do silo", existindo, contudo, a possibilidade de acesso ao mesmo mediante acordo entre as partes e respetiva retribuição.
L) O valor da renda mensal fixado no novo contrato passou a de € 27.000,00, com uma caução € 44.000,00; a duração do contrato passou para 19 meses, renovável automaticamente por períodos de 12 meses;
M) O contrato de arrendamento manteve-se até ao período 2015-03T (Relatório da Inspecção Tributária e depoimento da testemunha B...);
N) Não obstante não ter apurado receitas desde o segundo trimestre de 2015, em virtude de as instalações já não se encontrarem arrendadas, a Requerente teve contudo de manter alguns custos com a sua própria estrutura e com o imóvel, essencialmente serviços de outsourcing de contabilidade e consultoria, serviços de manutenção de infraestruturas prestados nomeadamente pela X…, revisão legal das contas e IMI (documentos n.ºs 44 a 48 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos e depoimento da testemunha B...);
O) A Requerente procedeu à dedução do IVA incorrido, tendo dado origem a um reporte de IVA no valor de € 137.983,97, referente aos períodos de tributação de 6T/2015 a 12T/2019;
P) O edifício e os equipamentos que compõem a unidade industrial mantiveram-se, nos períodos em análise, reconhecidos nas demonstrações financeiras da Requerente como propriedades de investimento, sendo detidos com o objetivo de obter rendas (cf. nota 6 das notas às demonstrações financeiras dos anos de 2015 a 2019 (documentos n.ºs 44 a 48);
Q) No segundo semestre de 2019, a Requerente efetuou um pedido de reembolso de IVA no montante de 150.563,39 euros;
R) Na sequência do pedido de reembolso de IVA realizado pela Requerente no período de tributação do segundo trimestre de 2019 (T06/2019), a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) deu início a um procedimento de inspecção externo de âmbito parcial relativo a IVA para o período de 2014 a T06/2019;
S) Nesse procedimento inspectivo foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária que consta do documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:
l - Conclusões da ação inspetiva
Da análise efetuada ao sujeito passivo A..., SA, NIF ... na sequência do despacho/da ordem de serviço acima mencionados, para os períodos de 2014, 2015, 2016, 2017, 2018, 2019, concluem-se as seguintes correções conforme fundamentação no ponto III do relatório da inspeção:
1-1. Em sede de IVA
1-1.1. Deduções indevidas - Art. 19º nº 1 do CIVA
Relativamente ao imposto deduzido de outros bens e serviços, mencionado nas declarações periódicas de IVA por via da exclusão do direito à dedução, são efetuadas as seguintes correções:
1-1.2. Regularizações IVA a Favor do Estado - Art.º 26 nº 1 do CIVA
No que respeita a imposto deduzido aquando da construção da unidade fabril, são corrigidos os seguintes valores:
1- 1.3. Conclusão
Face às correções no total de 225.098,18 EUR, no período de 201906T não existe crédito de imposto pelo que é indeferido na totalidade o pedido de reembolso. Importa referir que serão elaborados os documentos de correção (DC) relativos ao imposto em falta acima mencionado.
(...)
- Atividade efetivamente desenvolvida pelo sujeito passivo
Conforme informação fornecida pela empresa, a atividade para a qual a empresa foi constituída nunca se iniciou, alegadamente por razões de mercado. Durante um determinado período de tempo, que se estendeu até 2015, foi exercida apenas a atividade de arrendamento das instalações de ... à C... SA - Sucursal em Portugal, NIF... .
De acordo com o contrato de arrendamento para fins não habitacionais celebrado com a C..., SA em 2009-07-31 (Anexo 3), o conjunto de imóveis alvo de arrendamento consistia em:
1. Silo de armazenagem, composto por duas zonas, com área total de 5.150 m2;
2. Terreno na área envolvente do silo com 5.000 m2;
3. Edifício destinado a vestiário e instalações sanitárias;
4. Edifício de escritório;
5. Portaria e báscula de pesagem de camiões e controlo de entradas e saídas.
O valor da renda mensal seria de 22.000,00 EUR, com dois meses de caução (44.000,00 EUR) e a duração do contrato seria de 24 meses, renovável automaticamente por períodos de 12.
Em 2010-04-28, foi redigido novo contrato, já não constando o "Terreno na área envolvente do silo com 5.000 m2" ponto 2 atrás referenciado, existindo, contudo, a possibilidade de acesso ao mesmo mediante acordo entre as partes e respetiva retribuição.
O valor da renda mensal seria de 27.000,00 EUR, com uma caução 44.000,00 EUR. A duração do contrato passou para 19 meses, renovável automaticamente por períodos de 12. Não houve alterações relativamente à cessação do contrato.
Tendo a C..., SA manifestado a intenção de denunciar este contrato em comunicação de 2011-08-17, foi efetuado um aditamento ao mesmo em 2012-02-06, em que esta comunicação fica sem efeito e se altera retroativamente a duração do contrato de dezanove meses para dois anos.
Em 2014 e em função da diminuição da atividade, a C..., SA solicitou à A..., SA a diminuição das áreas e edifícios alvo de contrato de arrendamento, restando através deste 2º aditamento apenas o espaço correspondente ao edifício de escritório, com uma renda mensal de 800,00 EUR.
(...)
- Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA)
O sujeito passivo encontra-se enquadrado em sede de IVA no regime normal de periodicidade trimestral. O sistema informático da AT revela que o sujeito passivo não se encontra em falta no que respeita à entrega de declarações.
Da análise às declarações periódicas constantes do Cadastro verifica-se que o SP entrega declarações periódicas de IVA desde 0206T. Foi credor de IVA até 1003T, passando a entregador de IVA a partir deste período até 1406T. No período de 1409T o sujeito passivo começa com crédito IVA sendo que neste período resulta de uma regularização a seu favor no montante de 24.840,00 EUR.
A partir de 1412T verifica-se uma redução das prestações de serviços sujeitas IVA, constatando-se que a partir de 1506T deixa de haver operações ativas, continuando o sujeito passivo a deduzir IVA nas suas operações passivas, de onde resulta o crédito de IVA que conduziu ao valor de reembolso solicitado no montante de 150.563,39 EUR, com origem no período 1409T.
- Património / Imóveis
O sistema informático da AT apresenta os seguintes imóveis em nome da entidade, sitos na ...:
A inscrição matricial foi efetuada apenas em 2010, tendo a declaração Mod. 1 do lMl sido entregue em 2010-02-11.
III - Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas
III. 1 - Exclusão do Direito à Dedução de IVA
Da análise efetuada às declarações periódicas de IVA verifica-se que a partir de 201503T o sujeito passivo deixou de ter operações ativas e apenas IVA dedutível, conforme quadro síntese:
Face ao quadro anterior e ao disposto no art. 19º n.º 1 do CIVA, que refere que "Para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzem, nos termos dos artigos seguintes, ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuaram", conclui-se que todo o IVA dedutível a partir de 201506T está excluído o direito à dedução dado que o sujeito passivo não pratica operações ativas.
Relativamente ao período 201503T a operação tributável declarada refere-se a uma prestação de serviços pelo aluguer do espaço, conforme contrato celebrado, à empresa C... SA- Sucursal em Portugal, NIF ... .
Porque o reembolso teve origem no período 201409T em que existe uma regularização a favor do sujeito passivo no montante de 24.840,00 EUR, foi esta regularização objeto de análise tendo-se concluído que se refere à anulação de faturas emitidas para a C..., resultante da alteração ao contrato e de acordo com os documentos apresentados os quais constam em papéis de trabalho, confirmando-se que reúne os requisitos do art.º 78º do CIVA.
Assim e dado que o sujeito deixou de ter operações ativas a partir de 201503T, logo todo o IVA deduzido após esse período são deduções indevidas nos termos do artº 19º nº 1 do CIVA, pelo que se propõem as seguintes correções, por período:
III.2 - IVA Regularizações (art.º 26º nº 1 do CIVA)
O sujeito passivo construiu um imóvel na Zona Industrial e Logística de ..., tendo deduzido IVA no montante de 673.351,53 EUR (Anexo 5). As obras do imóvel terminaram em 2007. O imóvel foi ocupado e utilizado a partir de 31/07/2009 conforme contrato em anexo (Anexo 3)
A construção esteve entregue à empresa J... SA e o projeto de construção à D..., SA, cujas faturas abaixo se discriminam:
Assim, a obra e o projeto orçaram 3.206.435,80 EUR, tendo sido deduzido IVA relativo a obra no valor de 673.351,53 EUR.
Desde 201506T até à presente data que o imóvel em questão não está afeto a qualquer atividade, pelo que importava averiguar se há ou não lugar a regularizações de IVA nos termos dos art.º 24º, 25º e 26 º todos do CIVA.
Refere o art.º 26º do CIVA que:
1- A não utilização em fins da empresa de bens imóveis relativamente aos quais houve dedução do imposto durante 1 ou mais anos civis completos após o início do período de 19 anos referido no n.º 2 do artigo 24.º dá lugar à regularização anual de 1/20 da dedução efectuada, que deve constar da declaração do último período do ano a que respeita.
2- A regularização anual prevista no número anterior é também aplicável no caso de bens imóveis relativamente aos quais houve inicialmente lugar à dedução total ou parcial do imposto que onerou a respectiva construção, aquisição ou outras despesas de investimento com eles relacionadas, quando tais bens sejam afectos a uma das utilizações referidas na alínea d) do n.º 1 do artigo 21º
No caso em apreço, o imóvel está desocupado desde 2015 (Anexo 6, página 1), não existindo qualquer utilização do mesmo desde essa data, pelo que se verifica estarem cumpridas as condições do nº 1 do artº 26º do CIVA.
Foi solicitado ao sujeito passivo que fizesse prova documental de diligências promocionais efetuadas com vista ao arrendamento ou prestação de serviços.
Em comunicação dirigida a estes serviços efetuada a 2019-12-03 (Anexo 6), o sujeito passivo refere que a A... tem intenção de vender o imóvel em apreço, ao que junta e-mail de outubro de 2018, dirigido pela E... à F... com conhecimento ao administrador da A..., G..., com a intenção de promover uma reunião em Lisboa, a ocorrer na semana de 2018-10-22, perante o elemento representante da AICEP, no sentido de lhe dar conhecimento do seguinte:
a) Da intenção de transferir a A... para o F...;
b) Da necessidade de existir um contrato de longo prazo a baixo custo;
c) De ter um compromisso para um acordo, fechado até ao fim do ano.
Simultaneamente é solicitada alguma indicação do valor a oferecer pelo F... à E... pela compra dos ativos constituídos pelo armazém, equipamento e escritórios.
Ora no mencionado e-mail apenas se declara intenção de realizar uma reunião, com vista à concretização de um hipotético negócio, no entanto não existem evidências de que tenha sido concretizado negócio nem apresentada qualquer prova documental para além do atrás referido e-mail, que permitisse concluir que foram encetados esforços para continuar a exercer uma atividade tributada.
Assim estão reunidos os requisitos do art.º 26º nº 1 do CIVA devendo o sujeito passivo regularizar o IVA tendo em conta:
No caso de construção de imóvel, o prazo de regularização deve ser contado a partir da data de ocupação do imóvel, ou seja, desde agosto de 2009.
O procedimento é regularizar 1/20 avos da dedução do IVA, efetuada pela construção do imóvel, desde 2016, por cada ano que falte para se completar o prazo de 20 anos, sendo aceite a dedução de imposto dos anos já decorridos até 2015, uma vez que se considera que essa dedução ocorreu em bens afetos a uma atividade tributada.
Como já passaram 7 anos sobre o momento do início da utilização do imóvel (com IVA deduzido nas despesas de construção), iniciado em 1 de agosto de 2009 com o arrendamento à A..., SA, deveria o sujeito passivo regularizar 1/20 avos por cada ano a partir de 2016, sendo esta regularização devida no último período de cada ano.
Então, neste caso, deverá proceder-se à regularização do IVA deduzido e relativo a imóveis nos montantes e períodos a seguir referidos:
Resultando os valores apresentados dos seguintes cálculos: 673.351,53 EUR/20
Assim, a correção ascende a 33.667,58 EUR nos períodos 201612T, 201712T e 201812T, de acordo com o disposto no nº 1 do artº 26º do CIVA.
(...)
VII - Infrações verificadas
As irregularidades praticadas e descritas no item III deste relatório são punidas de acordo com a legislação aplicável, conforme quadro seguinte:
(...)
IX - Direito de audição - fundamentação
O procurador do sujeito passivo foi notificado em sede de audiência prévia a 2019-12-11 através do n. ofício nº..., para exercer o direito de audição nos termos do artigo 60.º da LGT e artigo 60º do RCPITA, que foi recebido em 2019-12-12 (Anexo 7).
Em 2019-12-13 veio o procurador solicitar o alargamento do prazo de resposta à audiência prévia para 25 dias, nos termos do nº 2 do artº 60º do RCPITA, tendo o pedido sido aceite a 2019-12-16, estabelecendo como data limite o dia 6 de janeiro de 2020 (Anexo 8).
O procurador do sujeito passivo veio responder à audiência prévia na forma escrita a 2020-01-06 (Anexo 9). Da resposta salientam-se os seguintes aspetos:
Dos factos:
Ponto 1. "A exponente é uma empresa que tem como atividade principal a fabricação de cimento."
Ponto 3. "Desde a sua criação até 2015, a exponente exerceu a atividade nas instalações de..., cedendo parte do edifício à C...S.A. — Sucursal em Portugal."
Fundamentos da exponente:
Ponto 10. "A exponente não concorda com a correcção no valor de € 225.098,18 com os fundamentos que seguidamente se expõem."
Ponto 11. "Os SIT efetuam as suas correções com fundamentos no artigo 19º e no artigo 26º do CIVA."
Ponto 12. "De acordo com o nº 1 do artigo 19º do CIVA, para o apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzem ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efetuaram o imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos."
Ponto 13. "Por sua vez, o nº 1 do artigo 26º do CIVA dita que a não utilização em fins da empresa de bens imóveis em relação aos quais tenha havido a dedução do imposto dá lugar à regularização anual de 1/20 da dedução efetuada, que deve constar da declaração do último período a que respeita."
Ponto 14. "Não obstante o exposto pelos SIT, entende a exponente que, em momento algum deixou de pretender realizar operações tributáveis."
Ponto 15. "Neste sentido, o IVA em causa não foi indevidamente deduzido e, relativamente ao imóvel, não deverá ser efetuada qualquer regularização a favor do Estado considerando que o mesmo não está devoluto."
Analisando a fundamentação do procurador do sujeito passivo, verifica-se que os argumentos por este apresentado nos pontos 12 e 13, coincidem com a fundamentação legal apresentada pela AT para efetuar as correções apresentadas no Projeto de Relatório.
Assim, o nº 1 do artº 19º do CIVA ao referir expressamente "...os sujeitos passivos deduzem ... ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efetuaram", assume que o direito à dedução está intimamente ligado à atividade desenvolvida.
Já no que se refere ao ponto 14, não foi apresentada qualquer evidência que comprovasse o exercício efectivo da actividade ou a utilização empresarial do imóvel, sendo apenas referido que existe uma intenção (... pretender realizar operações tributáveis).
Não tendo existido comprovadamente actividade desde 2015, mais concretamente a partir do período 201506T, não é dedutível o IVA suportado a partir desse período.
Por outro lado, o artº 26º do CIVA obriga à reposição do valor de 1/20 avos do IVA deduzido na construção do imóvel, quando este deixa de estar afeto aos fins da empresa. Ora, a A..., SA foi constituída como empresa produtora de cimentos, actividade que nunca veio a desenvolver.
Apenas existiu um aluguer de espaço, que terminou em 2015, não sendo apresentada qualquer perspetiva sólida da utilização do imóvel após essa data, o que justificou a correcção de IVA a partir 2016, à razão de 1/20 avos por ano do valor do IVA deduzido nas faturas associadas à construção do imóvel.
Face ao exposto, somos de opinião que as alegações do sujeito passivo não trazem elementos novos ou permitem nova interpretação dos já conhecidos, pelo que se mantêm as conclusões constantes do Projecto de Relatório de Inspeção, que aqui se dão por reproduzidas.
Assim não é aceite o pedido formulado pelo procurador do sujeito passivo no sentido de reformular o Projeto de Relatório, anulando a proposta de correcção e reconsiderando o pedido de reembolso apresentado, que é indeferido na totalidade.
T) Na sequência da inspecção, foram emitidas liquidações adicionais n.ºs..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ... (documentos n.ºs 2 a 18 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos), referentes aos períodos de tributação do segundo trimestre de 2015 (T06/2015) ao segundo trimestre de 2019 (T06/2019), das quais resultou uma correção ao excesso de IVA a reportar no montante total de 124.095,45 euros, conforme se detalha:
U) A Requerente foi ainda notificada das demonstrações de liquidação de IVA n.ºs 2020..., 2020..., 2020..., respeitantes às liquidações de IVA números 2020..., 2020..., 2020..., 2020... (Documentos n.º 19 a 21 que se juntam) e das demonstrações de liquidação de juros n.ºs 2020..., 2020... e 2020..., respeitantes às liquidações de juros de IVA n.ºs 2020..., 2020..., 2020..., 2020... (documentos n.º 22 a 24 que se juntam), as quais deram origem às demonstrações de acerto de contas n.ºs 2020..., 2020..., 2020..., 2020..., 2020..., 2020...(documentos n.ºs 25 a 30 que se juntam), referentes ao quarto trimestre dos períodos de 2016 a 2018 (12T/2016, 12T/2017, 12T/2018), das quais resultou um valor total a pagar de 79.124,77 euros, correspondente a imposto e juros compensatórios, cuja data limite para pagamento ocorreu em 09.03.2020, conforme se detalha:
V) Em 24-01-2020, a AT deu início a um novo procedimento de inspeção, de âmbito interno, relativo ao IVA do terceiro e quarto trimestres de 2019 (09T/2019 e 12T/2019), em que foi elaborado o RIT que consta do documento n.º 31 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:
III. 4 - Exclusão do Direito à Dedução de IVA
Como resulta das declarações periódicas de IVA verifica-se que a partir de 201503T o sujeito passivo deixou de ter operações ativas e apenas IVA dedutível, o que face ao disposto no art. 19.º n.º 1 do CIVA, que refere que "Para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzem, nos termos dos artigos seguintes, ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuaram", conclui-se que todo o IVA dedutível a partir de 201506T está excluído o direito à dedução dado que o sujeito passivo não pratica operações ativas.
As declarações periódicas de IVA relativamente aos períodos 1909T e 1912T, apresentam os seguintes valores:
Assim e dado que o sujeito deixou de ter operações ativas a partir de 201503T, logo todo o IVA deduzido após esse período configura uma dedução indevida nos termos do artº 19º nº 1 do CIVA, pelo que se propõem as seguintes correções, por período:
III. 5 - IVA Regularizações (art.º 26º nº 1 do CIVA)
O sujeito passivo construiu um imóvel na Zona Industrial e Logística de ..., tendo deduzido IVA no montante de 673.351,53 EUR. As obras do imóvel terminaram em 2007. O imóvel foi ocupado e utilizado a partir de 2009-07-31 conforme contrato em anexo (Anexo 3)
A construção esteve entregue à empresa J... SA e o projeto de construção à D..., SA, cujas faturas abaixo se discriminam:
Conforme faturas arquivadas em papéis de trabalho.
Assim, a obra e o projeto orçaram 3.206.435,80 EUR, tendo sido deduzido IVA relativo à obra no valor de 673.351,53 EUR.
Desde 201506T até à presente data que o imóvel em questão não está afeto a qualquer atividade, pelo que importava averiguar se há ou não lugar a regularizações de IVA nos termos dos art.º 24º,25º e 26 º todos do CIVA.
Refere o art.º 26º do CIVA que:
1- A não utilização em fins da empresa de bens imóveis relativamente aos quais houve dedução do imposto durante 1 ou mais anos civis completos após o início do período de 19 anos referido no n.º 2 do artigo 24º dá lugar à regularização anual de 1/20 da dedução efectuada, que deve constar da declaração do último período do ano a que respeita.
2- A regularização anual prevista no número anterior é também aplicável no caso de bens imóveis relativamente aos quais houve inicialmente lugar à dedução total ou parcial do imposto que onerou a respectiva construção, aquisição ou outras despesas de investimento com eles relacionadas, quando tais bens sejam afectos a uma das utilizações referidas na alínea d) do n.º 1 do artigo 21º
No caso em apreço, o imóvel está desocupado desde 2015 (Anexo 8), não existindo qualquer utilização do mesmo desde essa data, pelo que se verifica estarem cumpridas as condições do nº 1 do artº 26º do CIVA.
Foi solicitado ao sujeito passivo que fizesse prova documental de diligências promocionais efetuadas com vista ao arrendamento ou prestação de serviços.
Em comunicação dirigida a estes serviços efetuada a 2019-12-03 (Anexo 8), o sujeito passivo refere que a A... tem intenção de vender o imóvel em apreço, ao que junta e-mail de outubro de 2018, dirigido pela E... à F... com conhecimento ao administrador da A..., G..., com a intenção de promover uma reunião em Lisboa, a ocorrer na semana de 2018-10-22, perante o elemento representante da AICEP, no sentido de lhe dar conhecimento do seguinte:
a) Da intenção de transferir a A... para o F...;
b) Da necessidade de existir um contrato de longo prazo a baixo custo;
c) De ter um compromisso para um acordo, fechado até ao fim do ano.
Simultaneamente é solicitada alguma indicação do valor a oferecer pelo F... à E... pela compra dos ativos constituídos pelo armazém, equipamento e escritórios.
Ora no mencionado e-mail apenas se declara intenção de realizar uma reunião, com vista à concretização de um hipotético negócio, no entanto não existem evidências de que tenha sido concretizado negócio nem apresentada qualquer prova documental para além do atrás referido e-mail, que permitisse concluir que foram encetados esforços para continuar a exercer uma atividade tributada.
Assim estão reunidos os requisitos do art.º 26º nº 1 do CIVA devendo o sujeito passivo regularizar o IVA tendo em conta:
No caso de construção de imóvel, o prazo de regularização deve ser contado a partir da data de ocupação do imóvel, ou seja, desde agosto de 2009.
O procedimento é regularizar 1/20 avos da dedução do IVA, efetuada pela construção do imóvel, desde 2016, por cada ano que falte para se completar o prazo de 20 anos, sendo aceite a dedução de imposto dos anos já decorridos até 2015, uma vez que se considera que essa dedução ocorreu em bens afetos a uma atividade tributada.
Como já passaram 7 anos sobre o início da utilização do imóvel (com IVA deduzido nas despesas de construção), iniciado em 1 de agosto de 2009 com o arrendamento à C..., SA, deveria o sujeito passivo regularizar 1/20 avos por cada ano a partir de 2016, sendo esta regularização devida no último período de cada ano.
Então, neste caso, deverá proceder-se à regularização do IVA deduzido e relativo a imóveis nos montantes e períodos a seguir referidos:
Resultando os valores apresentados dos seguintes cálculos: 673.351,53 EUR/20
Assim, a correção ascende a 33.667,58 EUR no período 1912T, de acordo com o disposto no nº 1 do artº 26º do CIVA.
(...)
VII - Infrações verificadas
As irregularidades praticadas e descritas no item III deste relatório são punidas de acordo com a legislação aplicável, conforme quadro seguinte:
W) A partir do 2.º trimestre de 2015, a Requerente deixou de receber receitas, continuando a ter os mesmos problemas de custos (depoimento da testemunha B...);
X) Para procurar melhorar a situação, a Requerente, através da testemunha B..., começou a estabelecer contactos para encontrar quem arrendasse ou comprasse as suas instalações (depoimento da testemunha B...);
Y) Entre esses contactos, no início de 2016, a Requerente contratou uma empresa de consultoria imobiliária, K..., com o propósito de promover comercialmente as suas instalações fabris, bem como identificar potenciais clientes que pudessem ocupar as referidas instalações (documentos n.ºs 49, 50, 51, 52, 62 e 63 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos e depoimento da testemunha B...);
Z) Em declaração datada de 23-01-2020, que consta do documento n.º 51, a K.. indicou as acções realizadas no quadro da sua assistência à venda do Terminal A..., designadamente as seguintes, o que está em sintonia com a realidade (depoimento da testemunha B...):
Entre Fevereiro de Dezembro de 2016 :
– contactos com representantes do I... (Gerente de Terminais portuários e agente marítimo), da AICEP, do Terminal de Contentores da L..., da Autoridade Portuária ... (M...), N... e O... (P...-Lisboa);
- realização de uma reunião com Q... (...) em maio de 2016;
- busca de informações sobre os preços de arrendamento através da empresa R...;
– realização de uma apresentação do terminal em suporte do PowerPoint e de um Flyer Promocional;
- contactos com a imobiliária S... (Lisboa);
- contatos com a imobiliária T... (Lisboa);
- contatos com o U... em Lisboa;
- Participação nas seguintes conferências/salões: ... (março), ... Barcelona (julho), ...-Madrid (outubro), ...-Istambul (outubro), ...-Marselha (Novembro);
– entre Junho de 2017 e Janeiro de 2018
– organização em Julho de 2017 de novas reuniões em Portugal entre B... (...) e R..., ..., M..., Terminal XXI (L...) e AICEP;
- contactos contínuos entre Junho de 2017 e Janeiro de 2018 com Bruno Mascarenhas da imobiliária T... (Lisboa);
- organização de visita ao terminal em Novembro de 2017;
- Transmissão do anúncio através do U... (Lisboa);
- Envio do Folheto Comercial para W... e X...;
- contacto com a imobiliária Y... em Lisboa;
- trocas regulares com o advogado O... (Z... Associados);
- Contato ao vivo com AA... em ... (Outubro de 2017);
- Contato com V... do Grupo BB... em Sacavém (Portugal)
- Transmissão do folheto promocional através do CC... (novembro);
- organização de encontro entre B... (...) e R... em Dezembro de 2017;
- participação em feiras/conferências: ...-Paris (março), ...-Barcelona (junho), ...- Marselha (janeiro), ...-Roma (outubro),... .
Em 2018
- continuou ajudando a DD... a encontrar um comprador para o terminal A... transmitindo o Flyer promocional e falando sobre o terminal à venda em feiras, conferências que temos participado, bem como durante o viagens, particularmente na Espanha. incluir: - ...- Paris (março) - ...-Bremen (maio) - ...-Barcelona (junho) - Viagem à Andaluzia (Cádiz, Sevilha, Huelva) com reuniões das Autoridades (Ership, Bergé, Sevitrade, Portillo);
AA) A testemunha B... veio a Portugal 3 vezes e teve 2 reuniões em Madrid entre 2016 e 2018, teve varias reuniões e contactos pelo telefone com a K... em Paris e com potenciais interessados portugueses tratar de assuntos relacionados com o arrendamento ou venda das instalações da Requerente (depoimento da testemunha B...);
BB) Os serviços a K... custaram € 10.000,00 com € 5.000,00 de adiantamento (depoimento da testemunha B...);
CC) Os emails dos documentos n. 61 e 62 correspondem à realidade (depoimento da testemunha B...);
DD) As instalações da Requerente foram vendidas à AA... em Dezembro de 2019 (documento n.º 63 e depoimento da testemunha B...);
EE) Até 2019 a Requerente de suportar custos com contabilidade, com a AICEP com a zona industrial e com revisão de contas (depoimento da testemunha B...);
FF) A Requerente procedeu ao pagamento das seguintes quantias liquidadas, no montante global de € 112.951,30:
– € 7.199,64 em 06-03-2020 (documento n.º 53 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
– € 833,97 em 06-03-2020 (documento n.º 54 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
– € 33.667,58 em 09-03-2020 (documento n.º 55 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
– € 2.549,51 em 06-03-2020 (documento n.º 56 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
– € 33.667,58 em 09-03-2020 (documento n.º 57 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
– € 1.206,49 em 06-03-2020 (documento n.º 58 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
– € 33.667,58 em 21-05-2020 (documento n.º 59 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
– € 158,65 em 21-05-2020 (documento n.º 60 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
GG) Em 25-06-2020, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.
2.2. Factos não provados
Não há factos relevantes para decisão da causa que não se tenham provado.
2.3. Fundamentação da decisão da matéria de facto
Os factos provados baseiam-se no processo administrativo, nos documentos juntos pela Requerente e no depoimento da testemunha B... .
A testemunha aparentou depor com isenção e com conhecimento directo dos factos dados como provados.
3. Matéria de direito
A Requerente apresentou um pedido de reembolso de IVA, relativo ao período 2019-06T.
A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma inspecção à Requerente em que concluiu que, a Requerente teve actividade tributada no período 201503T, mas, a partir desse período «deixou de ter operações ativas» pelo que «todo o IVA deduzido após esse período são deduções indevidas nos termos do artº 19º nº 1 do CIVA»,
Para além disso, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que a Requerente deveria efectuar regularizações, nos termos do artigo 26.º, n.º 1, do CIVA, por ter construído um imóvel na Zona Industrial e Logística de ..., em 2007, que foi utilizado a partir de 31-07-2009, tendo deduzido IVA no montante de € 673.351,53, relativo a obras no valor de € 3.206.435,80, por o imóvel estar desocupado desde 2015.
A Requerente comunicou aos serviços de inspecção tributária tinha a intenção de vender o imóvel em apreço, juntando um e-mail de Outubro de 2018, dirigido pela E... à Grupo F... com conhecimento ao administrador da A..., G..., com a intenção de promover uma reunião em Lisboa, a ocorrer na semana de 22-10-2018 perante o elemento representante da AICEP, no sentido de lhe dar conhecimento, além dom mais, «da intenção de transferir a A... para o Grupo F...».
Mas, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que «no mencionado e-mail apenas se declara intenção de realizar uma reunião, com vista à concretização de um hipotético negócio, no entanto não existem evidências de que tenha sido concretizado negócio nem apresentada qualquer prova documental para além do atrás referido e-mail, que permitisse concluir que foram encetados esforços para continuar a exercer uma atividade tributada».
Por isso, concluiu a Autoridade Tributária e Aduaneira que estão reunidos os requisitos do artigo 26.º, n.º 1, do CIVA devendo o sujeito passivo regularizar o IVA, «1/20 avos por cada ano a partir de 2016, sendo esta regularização devida no último período de cada ano».
Na sequência do exercício do direito de audição pela Requerente, a Autoridade Tributária e Aduaneira continuou a entender, em suma, que
– «não foi apresentada qualquer evidência que comprovasse o exercício efectivo da actividade ou a utilização empresarial do imóvel, sendo apenas referido que existe uma intenção (...pretender realizar operações tributáveis). Não tendo existido comprovadamente actividade desde 2015, mais concretamente a partir do período 201506T, não é dedutível o IVA suportado a partir desse período»;
– Por outro lado, o artº 26º do CIVA obriga à reposição do valor de 1/20 avos do IVA deduzido na construção do imóvel, quando este deixa de estar afeto aos fins da empresa. Ora, a A..., SA foi constituída como empresa produtora de cimentos, actividade que nunca veio a desenvolver.
– Apenas existiu um aluguer de espaço, que terminou em 2015, não sendo apresentada qualquer perspetiva sólida da utilização do imóvel após essa data, o que justificou a correcção de IVA a partir 2016, à razão de 1/20 avos por ano do valor do IVA deduzido nas faturas associadas à construção do imóvel».
Posteriormente, a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou um outro procedimento de inspecção relativo ao IVA do terceiro e quarto trimestres de 2019 (09T/2019 e 12T/2019) em que concluiu, pelas mesmas razões, que o IVA não era dedutível e deviam ser feitas as regularizações, nos termos do artigo 26.º, n.º 1, do CIVA, relativamente ao referido imóvel.
3.1. Erro sobre os pressupostos de facto
A prova documental e testemunhal produzida no presente processo demonstra que a Requerente, a partir da cessação do arrendamento à C... que vigorou até ao período 2015-03T, diligenciou reiteradamente no sentido de arrendar ou vender o imóvel.
A testemunha B... referiu mesmo que trabalhou quatro anos intensamente para conseguir interessados.
Esta afirmação é corroborada pela prova documental apresentada no presente processo e afigura-se merecedora de credibilidade, não só por não se ter detectado qualquer razão para duvidar da veracidade do depoimento, que foi convincente, mas também porque é uma atitude perfeitamente normal, à face das regras da vida e da experiência comum, numa empresa que detém um imóvel sem utilização suportando encargos de mais de € 200.000 por ano e tem de manter a situação até 2025 (ano previsto para da extinção do direito de superfície).
Conclui-se, assim, que as correcções efectuadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira assentam em pressupostos errados, designadamente o de não ter existido actividade desde o período 2015-06T e de que não existiu perspetiva sólida da utilização do imóvel após essa data.
3.2. Direito a dedução
No acórdão do TJUE de 14-09-2017, Iberdrola Inmobiliaria Real Estate Investments, processo C-132/16), na linha de jurisprudência anterior, refere-se o seguinte:
O direito à dedução «faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado. Exerce-se imediatamente em relação à totalidade dos impostos que incidiram sobre as operações efetuadas a montante (v., neste sentido, designadamente, acórdãos de 29 de outubro de 2009, SKF, C-29/08, EU:C:2009:665, n.º 55, e de 18 de julho de 2013, AES-3C Maritza East 1, C-124/12, EU:C:2013:488, n.º 25)» (n.º 25);
«26. O regime das deduções destina-se, com efeito, a libertar completamente o empresário do ónus do IVA devido ou pago no âmbito de todas as suas atividades económicas. Por conseguinte, o sistema comum do IVA garante a neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, quaisquer que sejam os seus fins ou resultados, na condição de as mesmas estarem, em princípio, sujeitas ao IVA (v., designadamente, acórdãos de 29 de outubro de 2009, SKF, C-29/08, EU:C:2009:665, n.º 56, e de 18 de julho de 2013, AES-3C Maritza East 1, C-124/12, EU:C:2013:488, n.º 26).
27. Resulta do artigo 168.º da Diretiva 2006/112 que na medida em que o sujeito passivo, agindo nessa qualidade no momento em que adquire um bem ou um serviço, utilize esse bem ou serviço para as necessidades das suas operações tributadas está autorizado a deduzir o IVA devido ou pago em relação ao referido bem ou serviço (v., neste sentido, acórdão de 22 de outubro de 2015, Sveda, C-126/14, EU:C:2015:712, n.º 18).
O artigo 19.º do CIVA, em sintonia com o artigo 17.º, n.º 2, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, e com o artigo 168.º da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, estabelece que «para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzem, nos termos dos artigos seguintes, ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuaram: a) O imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos».
Não foi questionado pela Autoridade Tributária e Aduaneira que a Requerente tinha direito à dedução até ao período 2015-03T, apenas o recusando a partir do período 2015-06T, porque «a partir de 1506T deixa de haver operações ativas, continuando o sujeito passivo a deduzir IVA nas suas operações passivas».
No entanto, o TJUE, tem entendido que «o direito à dedução, uma vez criado, subsiste mesmo que a actividade económica projectada não dê origem a operações tributadas», como pode ver-se pelo acórdão de 29-02-1996, INZO, processo C-110/9, em que decidiu:
O artigo 4. da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, deve ser interpretado no sentido de que:
quando a administração fiscal admitiu a qualidade de sujeito passivo do IVA de uma sociedade que declarou a sua intenção de iniciar uma actividade económica que daria origem a operações tributáveis, a encomenda de um estudo de rentabilidade para a actividade projectada pode ser considerada uma actividade económica na acepção desse artigo, mesmo que esse estudo tenha por objectivo analisar em que medida a actividade projectada é rentável, e que
excepto no caso de situações fraudulentas ou abusivas, a qualidade de sujeito passivo do IVA não pode ser retirada a essa sociedade com efeitos retroactivos, quando, perante os resultados desse estudo, foi decidido não passar à fase operacional e colocá-la em liquidação, de modo que a actividade económica projectada não deu origem a operações tributáveis.
Na mesma linha, o TJUE decidiu no acórdão de 15-01-1998, Ghent Coal Terminal NV, processo C-37/95 que «o direito à dedução subsiste mesmo que, por razões alheias à sua vontade, o sujeito passivo jamais tenha feito uso de tais bens e serviços para realizar operações tributadas».
Nos termos do n.º 4 do artigo 8.º da CRP, «as disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático».
Como tem sido pacificamente entendido pela jurisprudência e é corolário da obrigatoriedade de reenvio prejudicial prevista no artigo 267.º do TFUE (que substituiu o artigo 234.º do Tratado de Roma, anterior artigo 177.º), a jurisprudência do TJUE tem carácter vinculativo para os Tribunais nacionais, quando tem por objecto questões conexas com o Direito da União Europeia ( ).
Quando se suscita uma questão de interpretação e aplicação de Direito da União Europeia, os tribunais nacionais devem colocar a questão ao TJUE através de reenvio prejudicial.
No entanto, quando a lei comunitária seja clara e quando já haja um precedente na jurisprudência europeia a interpretação do Direito da União Europeia resulta já da jurisprudência do TJUE não é necessário proceder a essa consulta, como o TJUE concluiu no Acórdão de 06-10-1982, Caso Cilfit, Proc. 283/81.
Até mesmo quando as questões em apreço não sejam estritamente idênticas (doutrina do acto aclarado) e quando a correcta aplicação do Direito da União Europeia seja tão óbvia que não deixe campo para qualquer dúvida razoável no que toca à forma de resolver a questão de DUE suscitada (doutrina do acto claro) (idem, n.º14).
No caso em apreço, a citada jurisprudência afigura-se clara, pelo que o artigo 19.º do CIVA, invocado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, deve ser interpretado em consonância com ela, permitindo o direito a dedução que a Requerente pretendeu exercer através do pedido de reembolso.
À face desta jurisprudência, o direito à dedução criado mantém-se, apesar de a Requerente, por razões alheias à sua vontade, ter cessado a actividade tributada de arrendamento e ter continuado a diligenciar até 2019 no sentido de a retomar.
Por isso, estando subjacente às liquidações impugnadas um entendimento contrário a esta jurisprudência, aquela liquidações enfermam de vício de violação de lei, quanto à «exclusão do Direito à Dedução de IVA» referida no Relatório da Inspecção Tributária.
3.3. Regularizações
As correcções efectuadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira quanto a «regularizações» tem por fundamento o facto de que «desde 201506T até à presente data que o imóvel em questão não está afeto a qualquer atividade»: «o imóvel está desocupado desde 2015 (Anexo 6, página 1), não existindo qualquer utilização do mesmo desde essa data, pelo que se verifica estarem cumpridas as condições do nº 1 do artº 26º do CIVA».
Este artigo 26.º, n.ºs 1 e 2, do CIVA estabelecem o seguinte:
1- A não utilização em fins da empresa de bens imóveis relativamente aos quais houve dedução do imposto durante 1 ou mais anos civis completos após o início do período de 19 anos referido no n.º 2 do artigo 24.º dá lugar à regularização anual de 1/20 da dedução efectuada, que deve constar da declaração do último período do ano a que respeita.
2- A regularização anual prevista no número anterior é também aplicável no caso de bens imóveis relativamente aos quais houve inicialmente lugar à dedução total ou parcial do imposto que onerou a respectiva construção, aquisição ou outras despesas de investimento com eles relacionadas, quando tais bens sejam afectos a uma das utilizações referidas na alínea d) do n.º 1 do artigo 21º
Também no que concerne ao dever de efectuar regularizações, há jurisprudência do TJUE, designadamente o acórdão de 28-02-2018, Imofloresmira — Investimentos Imobiliários S.A., processo n.º C-672/16, em que decidiu entendeu e decidiu o seguinte:
35. Nos termos do artigo 167.o da Diretiva IVA, o direito à dedução surge no momento em que o imposto dedutível se torna exigível. Consequentemente, apenas a qualidade em que o particular age nesse momento pode determinar a existência de um direito à dedução (v., neste sentido, Acórdãos de 11 de julho de 1991, Lennartz, C-97/90, EU:C:1991:315, n.º 8, e de 30 de março de 2006, Uudenkaupungin kaupunki, C-184/04, EU:C:2006:214, n.º 38).
36. A partir do momento em que a Administração Tributária aceitou, com base nos dados fornecidos por uma empresa, que lhe seja atribuída a qualidade de sujeito passivo, este estatuto já não pode, em princípio, ser-lhe depois retirado com efeitos retroativos devido à ocorrência ou não ocorrência de determinados acontecimentos (v., neste sentido, Acórdão de 29 de fevereiro de 1996, INZO, C-110/94, EU:C:1996:67, n.º 21), salvo em caso de fraude ou abuso.
37. Há que recordar que, segundo jurisprudência constante, o direito a dedução previsto nos artigos 167.° a 172.° da Diretiva IVA faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado. É imediatamente exercido em relação à totalidade dos impostos que tenham onerado as operações efetuadas a montante (Acórdão de 15 de dezembro de 2005, Centralan Property, C-63/04, EU:C:2005:773, n.º 50 e jurisprudência referida).
38. O regime das deduções visa desonerar inteiramente o empresário do encargo do IVA devido ou pago no quadro de todas as suas atividades económicas. O sistema comum do IVA garante, por conseguinte, a perfeita neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, quaisquer que sejam os fins ou os resultados dessas atividades, na condição de as referidas atividades estarem, elas próprias, sujeitas ao IVA (Acórdão de 15 de dezembro de 2005, Centralan Property, C-63/04, EU:C:2005:773, n.º 51 e jurisprudência referida).
39. Importa recordar também que é a aquisição de bens ou serviços por um sujeito passivo agindo nessa qualidade que determina a aplicação do regime do IVA e, portanto, do mecanismo da dedução. A utilização que é dada aos bens ou serviços, ou que lhes é destinada, apenas determina o montante da dedução inicial a que o sujeito passivo tem direito, nos termos do artigo 168.o da Diretiva IVA, e o âmbito das eventuais regularizações nos períodos seguintes, mas não afeta o surgimento do direito à dedução (v., neste sentido, Acórdão de 11 de julho de 1991, Lennartz, C-97/90, EU:C:1991:315, n.º 15).
40. Daqui resulta que o direito a essa dedução subsiste, em princípio, mesmo que, posteriormente, em razão de circunstâncias estranhas à sua vontade, o sujeito passivo não faça uso dos referidos bens e serviços que deram origem à dedução no âmbito de operações tributadas (v., neste sentido, Acórdãos de 29 de fevereiro de 1996, INZO, C-110/94, EU:C:1996:67, n.º 20, e de 15 de janeiro de 1998, Ghent Coal Terminal, C-37/95, EU:C:1998:1, n.ºs 19 e 20).
41. No caso em apreço, segundo a interpretação adotada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, o facto de um edifício estar desocupado por um determinado período interrompe a afetação do imóvel aos fins da empresa, obrigando o sujeito passivo a proceder à regularização do imposto deduzido, mesmo se se provar que este último teve sempre a intenção de continuar a exercer uma atividade tributada.
42. Ora, resulta da jurisprudência referida nos n.ºs 39 e 40 do presente acórdão que um sujeito passivo mantém o direito à dedução, uma vez que esse direito surgiu, ainda que esse sujeito passivo não possa, por razões independentes da sua vontade, utilizar os bens ou os serviços que estão na origem da dedução no âmbito de operações tributadas.
43. Uma interpretação diferente da Diretiva IVA seria contrária ao princípio da neutralidade do IVA quanto à carga fiscal da empresa. Seria suscetível de criar, quando do tratamento fiscal de atividades de investimento idênticas, diferenças não justificadas entre empresas que já realizam operações tributáveis e outras que procuram, através de investimentos, iniciar atividades que serão fonte de operações tributáveis. Do mesmo modo, seriam estabelecidas diferenças arbitrárias entre essas últimas empresas, na medida em que a aceitação definitiva das deduções dependesse da questão de saber se esses investimentos conduzem ou não a operações tributadas (Acórdão de 29 de fevereiro de 1996, INZO, C-110/94, EU:C:1996:67, n.º 22).
44. Por conseguinte, o princípio da neutralidade fiscal opõe-se a uma legislação nacional que, fazendo depender a aceitação definitiva das deduções de IVA dos resultados da atividade económica exercida pelo sujeito passivo, cria, no que se refere ao tratamento fiscal de atividades de investimento imobiliário idênticas, diferenças injustificadas entre empresas com o mesmo perfil e que exercem a mesma atividade.
45. Esta conclusão não pode ser posta em causa pelo argumento do Governo português segundo o qual, em virtude da rescisão dos contratos de arrendamento anteriormente celebrados, se verificaram «alterações dos elementos tomados em consideração para a determinação do montante das deduções», na aceção do artigo 185.o, n.º 1, da Diretiva IVA, pelo que havia que proceder a uma regularização proporcional do imposto deduzido.
46. Com efeito, em primeiro lugar, embora seja verdade que a necessidade de proceder à regularização do imposto deduzido pode igualmente existir devido a circunstâncias independentes da vontade dos sujeitos passivos (v., neste sentido, Acórdão de 29 de abril de 2004, Gemeente Leusden e Holin Groep, C-487/01 e C-7/02, EU:C:2004:263, n.º 55), não é menos certo que esta disposição não deve pôr em causa os princípios fundamentais em que assenta o sistema instituído pela Diretiva IVA, designadamente, o princípio da neutralidade fiscal.
47. Ora, contrariamente ao que sustenta o Governo português, considerar que basta, para demonstrar a existência de «alterações» na aceção do artigo 185.o da Diretiva IVA, que um imóvel tenha permanecido vazio, após a cessação de um contrato de arrendamento de que era objeto, devido a circunstâncias independentes da vontade do seu proprietário, mesmo que esteja provado que este último teve sempre a intenção de o explorar para os fins de uma atividade tributada e empreendeu as diligências necessárias para esse efeito, equivaleria a restringir o direito à dedução através das disposições aplicáveis em matéria de regularizações.
Na sequência destes fundamentos o TJUE decidiu o seguinte:
Os artigos 167.°, 168.°, 184.°, 185.° e 187.° da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional que prevê a regularização do imposto sobre o valor acrescentado inicialmente deduzido, pelo facto de se considerar que um imóvel, relativamente ao qual foi exercido o direito de opção pela tributação, já não é utilizado pelo sujeito passivo para os fins das suas próprias operações tributadas, quando esse imóvel ficou desocupado durante mais de dois anos, mesmo se se provar que o sujeito passivo procurou arrendá lo durante esse período.
No caso em apreço, a prova produzida mostra que a Requerente procurou, continuadamente, promover o arrendamento do imóvel e equipamentos desde o período 2015-06T até 2019, ano em que o vendeu, pelo que se verifica uma situação a que, à luz desta jurisprudência, não há lugar à regularização pretendida pela Autoridade Tributária e Aduaneira, pois esta actividade tinha em vista a prática de operações sujeitas a imposto.
Pelo que se referiu no ponto anterior, a jurisprudência do TJUE é obrigatória, pelo que o entendimento do TJUE das indicadas normas da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, prevalece sobre o artigo 26.º do CIVA.
Por isso, tendo a Autoridade Tributária e Aduaneira aplicado o artigo 26.º, n.º 1, em dissonância com o Direito da União, conclui-se que as liquidações impugnadas enfermam de erro sobre os pressupostos de direito, na parte em que se assentam em alegada falta de regularizações.
4. Reembolso de quantias pagas e juros indemnizatórios
A Requerente pagou das quantias liquidadas, no montante global de € 112.951,00, formulando pedido de restituição de, com juros indemnizatórios.
No que concerne a juros indemnizatórios, de harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».
Embora o art. 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».
O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do art. 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do art. 61.º, n.º 4 do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».
Assim, o n.º 5 do art. 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.
Como o direito a juros indemnizatórios depende de uma quantia em reembolsar, está ínsito nos poderes de cognição em processo arbitral a apreciação da existência de direito a reembolso.
Na sequência da anulação das liquidações, a Requerente tem direito a ser reembolsada da quantia de € 112.951,00, cujo pagamento de provou, o que é efeito da própria anulação, por força dos artigos 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT.
O regime substantivo do direito a juros indemnizatórios é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, o seguinte:
Artigo 43.º
Pagamento indevido da prestação tributária
1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
Apesar de as liquidações estarem afectadas por erros nos pressupostos de facto e de direito, afigura-se que eles não podem considera-se imputáveis à Autoridade Tributária e Aduaneira por a prova que serve de base à fixação da matéria de facto só ter sido apresentada no processo arbitral.
Na verdade, a prova apresentada pela Requerente no procedimento de inspecção, não permitia concluir que «em momento algum deixou de pretender realizar operações tributáveis» como aí alegou, no exercício do direito de audição.
Como se refere no Relatório da Inspecção Tributária, sem que a Requerente suscite qualquer objecção a nível factual:
Foi solicitado ao sujeito passivo que fizesse prova documental de diligências promocionais efetuadas com vista ao arrendamento ou prestação de serviços.
Em comunicação dirigida a estes serviços efetuada a 2019-12-03 (Anexo 8), o sujeito passivo refere que a A... tem intenção de vender o imóvel em apreço, ao que junta e-mail de outubro de 2018, dirigido pela E... à Grupo F... com conhecimento ao administrador da A..., G..., com a intenção de promover uma reunião em Lisboa, a ocorrer na semana de 2018-10-22, perante o elemento representante da AICEP, no sentido de lhe dar conhecimento do seguinte:
a) Da intenção de transferir a A... para o Grupo F...;
b) Da necessidade de existir um contrato de longo prazo a baixo custo;
c) De ter um compromisso para um acordo, fechado até ao fim do ano.
Simultaneamente é solicitada alguma indicação do valor a oferecer pelo Grupo F... à E... pela compra dos ativos constituídos pelo armazém, equipamento e escritórios.
Ora no mencionado e-mail apenas se declara intenção de realizar uma reunião, com vista à concretização de um hipotético negócio, no entanto não existem evidências de que tenha sido concretizado negócio nem apresentada qualquer prova documental para além do atrás referido e-mail, que permitisse concluir que foram encetados esforços para continuar a exercer uma atividade tributada.
À face deste materialidade, afigura-se correcta a posição da Autoridade Tributária e Aduaneira, ao entender que, em face da prova apresentada, não se podia concluir que a Requerente tivesse mantido actividade relacionada com operações tributadas a partir do período 2015-06-T.
Assim, os erros de facto e de direito que afectam as liquidações, só detectáveis após a produção de prova efectuada no presente processo, não se devem considerar imputáveis aos serviços, para efeitos do n.º 1 do artigo 43.º da LGT.
Pelo exposto, procede parcialmente o pedido de pronúncia arbitral quanto ao pedido de reembolso da quantia de € € 112.951,30 e improcede o pedido de juros indemnizatórios.
5. Pedido de reconhecimento de direito ao reporte de IVA no montante de € 137.983,97
A Requerente formula ainda pedido de reconhecimento de direito ao reporte de IVA no montante de € 137.983,97.
Como se referiu, o processo arbitral, para além da apreciação da legalidade de actos dos tipos indicados no artigo 2.º do RJAT, abrange a apreciação dos direitos a reembolso e a juros indemnizatórios.
Mas, não há suporte legal estender esses poderes à fixação de montantes de reporte de IVA, sem prejuízo de a Autoridade Tributária e Aduaneira, nos termos do artigo 24.º, n.º 1, do RJAT, dever, em execução da decisão arbitral, proceder a tal fixação em sintonia com a decisão arbitral, em cumprimento do preceituado nas alíneas b) e c) daquele n.º 1 que lhe impõem dever de:
b) Restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito;
c) Rever os actos tributários que se encontrem numa relação de prejudicialidade ou de dependência com os actos tributários objecto da decisão arbitral, designadamente por se inscreverem no âmbito da mesma relação jurídica de imposto, ainda que correspondentes a obrigações periódicas distintas, alterando-os ou substituindo-os, total ou parcialmente.
Pelos exposto, improcede o pedido de reconhecimento do direito da Requerente ao reporte do IVA deduzido no montante de 137.983,97 euros, sem prejuízo de tal direito dever ser apreciado em execução do presente acórdão.
6. Decisão
De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à ilegalidade das liquidações;
b) Anular as seguintes Liquidações de IVA e juros compensatórios: n.ºs..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ...;
c) Anular as demonstrações de liquidação de IVA n.ºs 2020…, 2020 …, 2020 …, respeitantes às liquidações de IVA números 2020 … e das demonstrações de liquidação de juros n.ºs 2020 …, respeitantes às liquidações de juros de IVA n.ºs 2020 …, as quais deram origem às demonstrações de acerto de contas n.ºs 2020 …; e ainda a demonstração de liquidação de IVA n.º 2020 …, respeitante à liquidação de IVA n.º 2020 … e a demonstração de liquidação de juros n.º 2020 …, respeitante à liquidação de juros de IVA n.º 2020 …, as quais deram origem às demonstrações de acerto de contas de IVA n.ºs 2020 … e ….
d) Julgar parcialmente procedente o pedido de reembolso quanto ao valor de € 112.951,00 e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar esta quantia à Requerente;
e) Julgar improcedente o pedido de juros indemnizatórios, absolvendo a Autoridade Tributária e Aduaneira deste pedido;
f) Julgar improcedente o pedido de reconhecimento do direito da Requerente ao reporte do IVA deduzido no montante de 137.983,97 euros, sem prejuízo de tal direito dever ser apreciado em execução do presente acórdão;
7. Valor do processo
De harmonia com o disposto nos artigos 296.º, n.º 1, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 250.934,97.
8. Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 4.896,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
Como se referiu, não existiram erros imputáveis aos serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira na emissão das liquidações impugnadas.
No entanto, a Autoridade Tributária e Aduaneira contestou, pelo que, independentemente de se entender ou não que deu causa à acção, é-lhe imputável a responsabilidade por custas, como decorre do n.º 2 do artigo 527.º e do n.º 1 do artigo 535.º do CPC, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
Lisboa, 26-04-2021
Os Árbitros
(Jorge Lopes de Sousa)
(Cristina Aragão Seia)
(Rita Guerra Alves)