SUMÁRIO:
Uma sociedade gestora de participações sociais constitui uma instituição financeira para efeito da isenção de Imposto do Selo prevista no artigo 7.º n.º 1 alínea e) do Código do Imposto do Selo.
DECISÃO ARBITRAL
I – RELATÓRIO
No dia 02-01-2020, a sociedade anónima A..., SGPS, S.A., pessoa coletiva n.º ..., com sede na Rua ..., n.º..., ..., ..., ...-... Lisboa, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa sob o n.º..., apresentou pedido de constituição de Tribunal Arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), com vista, de forma mediata, à declaração de ilegalidade do ato de indeferimento do pedido de revisão interposto, e de forma mediata, à declaração de ilegalidade do ato de liquidação de Imposto do Selo, dos meses de maio a dezembro de 2015, repercutido na Requerente, com origem em operações de prestação de garantia com os bancos B..., C... e D..., no valor total de 41.111,16 €.
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Ex.mo Senhor Presidente do CAAD no dia 03-01-2020 e notificado à Requerida na mesma data.
A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6º n.º 2 alínea a) do RJAT, foi designada como árbitro, pelo Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, em 26-02-2020, a Dra. Suzana Fernandes da Costa, tendo a nomeação sido aceite, no prazo e termos legalmente previstos.
Na mesma data foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos do disposto no artigo 11º, nº 1, alíneas a) e b) do RJAT, conjugado com os artigos 6º e 7º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c), do nº 1, do artigo 11º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 06-07-2020.
Em 07-07-2020, foi proferido despacho a ordenar a notificação da Requerida para, no prazo de 30 dias, apresentar resposta e, caso quisesse, solicitar a produção de prova adicional e remeter ao tribunal arbitral cópia do processo administrativo dentro do prazo de apresentação da resposta. No mesmo despacho, foi ainda notificada a Requerida para informar se estava ou não de acordo com a dispensa de reunião e com a dispensa de alegações.
Em 23-09-2020, a Requerente juntou aos autos o acórdão do CAAD do processo n.º 911/2019-T, alegando que o mesmo se pronunciou sobre a matéria em discussão nos presentes autos.
Em 28-09-2020, a Requerida apresentou a sua resposta, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral. E na mesma data, a Requerida juntou aos autos o processo administrativo.
No dia 06-10-2020, foi proferido despacho a ordenar a notificação da Requerida para, ao abrigo do princípio do contraditório, em 10 dias, se pronunciar sobre o requerimento e acórdão apresentados pela Requerente.
No dia 19-10-2020 foi proferido despacho a ordenar a notificação da Requerente, para em 10 dias indicar os factos sobre os quais recairá a inquirição da testemunha arrolada.
Foi proferido despacho, em 23-10-2020, a admitir a junção aos autos do acórdão junto pela Requerente, tendo em contar que a Requerida não se opôs a tal junção.
Na mesma data foi também proferido despacho a agendar a reunião do tribunal arbitral, prevista no artigo 18º do RJAT, e a inquirição da testemunha arrolada, para o dia 30-11-2020 pelas 14:30 horas. Foi também determinado que a diligência seria efetuada através da plataforma digital CISXCO Webex Meetings, devendo a testemunha comparecer nas instalações do CAAD, exceto se estivesse numa das condições previstas no n.º 4 do artigo 6º-A da Lei n.º 1-A/2020 de 19-03.
Em 10-11-2020, a Requerente veio aos autos informar que prescindia da inquirição da testemunha por si arrolada.
No dia seguinte, 11-11-2020, a Requerente juntou ao processo o acórdão do CAAD do processo n.º 819/2019-T. No mesmo dia, foi proferido despacho a ordenar a notificação da Requerida para se pronunciar, em 5 dias, sobre o requerimento e acórdãos juntos pela Requerente.
Em 17-11-2020, foi proferido despacho a dispensar a reunião prevista no artigo 18º do RJAT, tendo em conta que a Requerente prescindiu da inquirição da sua testemunha, não foram deduzidas exceções, e ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal Arbitral na condução do processo, da celeridade, da simplificação e informalidade processuais. No mesmo despacho determinou-se ainda o prosseguimento do processo para alegações escritas facultativas por um período de 15 dias, iniciando-se com a notificação do despacho o prazo para alegações da Requerente e com a notificação da apresentação das alegações da Requerente o prazo para as alegações da AT. Foi ainda indicado o dia 05-01-2021 para a prolação da decisão arbitral.
A Requerente juntou as suas alegações em 04-12-2020, tendo também junto a decisão arbitral do processo n.º 110/2020-T.
A Requerida apresentou alegações em 05-01-2021.
No dia 05-01-2021, foi proferido despacho a prorrogar por dois meses o prazo para a prolação da decisão, tendo em conta que ainda não se encontrava terminado o processo de elaboração da decisão final, e tendo em conta a tramitação processual verificada, o período de férias judiciais e a situação de pandemia que assola o país. Mais se determinou que se previa que a decisão arbitral fosse proferida no prazo de quinze dias.
A Requerente juntou aos autos o comprovativo do pagamento da taxa arbitral subsequente no dia 15-01-2021.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (artigos 4º e 10º n.º 1 e 2 do RJAT e artigo 1º da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 de março).
O pedido arbitral é tempestivo, nos termos do artigo 10º n.º 1 alínea a) do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de janeiro e do artigo 102º n.º 1 alínea a) do Código do Procedimento e do Processo Tributário.
O processo não enferma de nulidades e não se verificam exceções.
2. Posição das partes
A Requerente começa por referir que suportou Imposto do Selo sobre comissões associadas à prestação de garantias, designadamente conforme previsto na verba 17 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), com referência aos meses de maio a dezembro de 2015. As referidas liquidações de Imposto do Selo e as operações de prestação de garantias que as desencadearam foram efetuadas pelo B..., SA, pela C..., SA e pelo D..., SA, e legalmente repercutidos na Requerente, na qualidade de entidade obrigada à apresentação de garantia e devedora de comissões.
A Requerente refere que apresentou pedido de revisão oficiosa das referidas liquidações e que o mesmo pedido foi objeto de indeferimento expresso, em 19-10-2019.
A Requerente alega que se trata de uma sociedade gestora de participações sociais domiciliada em Portugal, e que exerce uma atividade económica de forma apenas indireta, tendo o papel de intermediário no circuito financeiro e económico, incluindo a intermediação do financiamento das suas participadas.
A Requerente refere que celebrou diversos contratos para prestação de garantias bancárias junto das instituições de crédito B..., SA, C..., SA e D..., SA., tendo estas instituições liquidado e entregue ao Estado Imposto do Selo, na qualidade de sujeitos passivos, com referência às comissões cobradas sobre aquelas garantias, nos termos da verba 17 da TGIS. Posteriormente, estas instituições de crédito repercutiram o encargo do referido Imposto do Selo na esfera da Requerente enquanto entidade obrigada à apresentação das garantias em causa e devedora das comissões associadas às garantias.
No entender da Requerente, às operações em causa deveria ter sido aplicada a isenção de Imposto do Selo prevista no artigo 7º n.º 1 alínea e) do Código do Imposto do Selo. No entanto, refere que a AT põe em causa apenas o preenchimento do requisito da qualificação da entidade obrigada à apresentação da garantia (a Requerente) como instituição financeira, à luz dos tipos previstos na legislação comunitária.
Segundo a Requerente, as sociedades gestoras de participações sociais estão incluídas na lista de entidades que podem beneficiar da aludida isenção de Imposto do Selo, uma vez que as mesmas se qualificam como instituições financeiras ao abrigo da legislação comunitária (Diretiva n.º 2013/36/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26-06-2013, e o Regulamento n.º 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho de 26-06-2013).
Para sustentar a sua posição, a Requerente faz referência às seguintes decisões do CAAD: 123/2018-T, 670/2018-T, 663/2018-T, 678/2018-T, 679/2018-T e 669/2018-T.
Por fim, a Requerente pede a condenação da AT no reembolso do Imposto do Selo indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios, contados desde a data do indeferimento do pedido de revisão oficiosa até integral reembolso, nos termos do artigo 43º da Lei Geral Tributária (LGT).
Já a Requerida, na sua resposta, apresentou defesa por impugnação, pugnando pela manutenção na ordem jurídica da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa por entender que a mesma consubstancia uma correta aplicação do direito aos factos.
3. Matéria de facto
3. 1. Factos provados:
Analisada a prova documental produzida e a posição das partes constante das peças processuais, consideram-se provados e com interesse para a decisão da causa os seguintes factos:
1. A Requerente é uma sociedade gestora de participações sociais, com sede em Portugal, que tem como objeto social a gestão de participações sociais noutras sociedades, como forma indireta de exercício de atividades económicas, nos termos da lei, conforme resulta da certidão permanente e dos estatutos juntos ao pedido arbitral como documentos 1 e 7.
2. A Requerente celebrou, na qualidade de devedora, os seguintes contratos para prestação de garantias bancárias:
a) Garantia bancária n.º ... emitida pelo Banco B..., SA em 08-08-2014, conforme documento 8 junto ao pedido arbitral;
b) Garantia bancária n.º ... emitida pela C..., SA em 05-06-2009, conforme documento 9 junto ao pedido arbitral;
c) Garantia bancária n.º ... emitida pela C..., SA em 04-03-2010, conforme documento 10 junto ao pedido arbitral;
d) Garantia bancária n.º ... emitida pela C..., SA em 12-03-2012, conforme documento 11 junto ao pedido arbitral;
e) Garantia bancária n.º... emitida pela C..., SA em 25-02-2014, conforme documento 12 junto ao pedido arbitral;
f) Garantia bancária n.º ... emitida pelo D..., SA em 05-06-2009, conforme documento 13 junto ao pedido arbitral;
g) Garantia bancária n.º ... emitida pelo D..., SA em 04-03-2010, conforme documento 14 junto ao pedido arbitral;
h) Garantia bancária n.º... emitida pelo D..., SA em 15-06-2011, conforme documento 15 junto ao pedido arbitral;
i) Garantia bancária n.º ... emitida pelo D..., SA em 08-11-2011, conforme documento 16 junto ao pedido arbitral;
j) Garantia bancária n.º ... emitida pelo D..., SA em 08-06-2012, conforme documento 17 junto ao pedido arbitral;
k) Garantia bancária n.º ... emitida pelo D..., SA em 08-03-2013, conforme documento 18 junto ao pedido arbitral.
3. As sociedades Banco B..., SA, C..., SA e D..., SA liquidaram e entregaram ao Estado Imposto do Selo, com referência às comissões cobradas sobre aquelas garantias, nos termos da verba 17 da TGIS, conforme documentos 2 a 4 e 25 juntos ao pedido arbitral.
4. A Requerente suportou o Imposto de Selo, no valor de 41.111,16 €, que lhe foi repercutido pelas sociedades Banco B..., SA, C..., SA e D..., SA, relativo aos meses de maio a dezembro de 2015, conforme documentos 2 a 4, 25 e 26 juntos ao pedido arbitral.
5. A Requerente interpôs pedido de revisão oficiosa das liquidações de Imposto do Selo em 19-06-2019, que foi expressamente indeferido em 19-10-2019.
6. A Requerente interpôs o presente pedido de pronúncia arbitral em 02-01-2020.
Não se provaram outros factos com relevância para a decisão da causa.
3.2. Factos não provados
Não se verificaram quaisquer factos que não tenham sido provados.
3.3. Fundamentação da matéria de facto provada:
A convicção do árbitro fundou-se nos documentos juntos aos autos pela Requerente, designadamente o processo administrativo e na posição das partes demonstrada nas peças processuais produzidas.
4. Matéria de direito:
4.1. Objeto e âmbito do presente processo
A questão essencial de direito que se coloca neste processo é a de saber se se aplica a isenção de Imposto do Selo prevista no artigo 7º n.º 1 alínea e) do Código do Imposto do Selo quanto ao Imposto do Selo suportado pela Requerente entre os meses de maio e dezembro de 2015, no valor total de 41.111,16€.
A Requerente refere que deveria ter direito à isenção de Imposto do Selo por se tratar de uma sociedade gestora de participações sociais que se qualifica como instituição financeira ao abrigo da legislação comunitária. Já a Requerida entende que não se aplica a isenção de Imposto do Selo à Requerente por não se tratar de uma instituição financeira.
Nos termos do artigo 1.º do Código do Imposto do Selo, o Imposto do Selo incide, além do mais, sobre os atos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos previstos na Tabela Geral.
Na verba 17 da TGIS prevê-se a incidência do Imposto sobre «operações financeiras», concretamente no que respeita à “utilização de crédito, sob a forma de fundos, mercadorias e outros valores, em virtude da concessão de crédito a qualquer título” (verba 17.1).
O artigo 7.º n.º 1 alínea e) do Código do Imposto do Selo estabelece o seguinte:
1 – São também isentos do imposto:
(...)
e) Os juros e comissões cobrados, as garantias prestadas e, bem assim, a utilização de crédito concedido por instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras a sociedades de capital de risco, bem como a sociedades ou entidades cuja forma e objecto preencham os tipos de instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras previstos na legislação comunitária, umas e outras domiciliadas nos Estados membros da União Europeia ou em qualquer Estado, com excepção das domiciliadas em territórios com regime fiscal privilegiado, a definir por portaria do Ministro das Finanças”.
Esta norma via isentar as operações financeiras em sentido estrito promovidas no âmbito da atividade bancária e de intermediação financeira entre instituições de crédito, sociedade financeiras, instituições financeiros e sociedades de capital de risco e sociedades ou entidades cuja forma e objeto preencham os tipos de instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras previstos na legislação comunitária.
4.2. Qualificação da Requerente como instituição financeira
A isenção prevista no artigo 7º n.º 1 alínea e) do Código do Imposto do Selo, acima transcrito, contempla dois requisitos. Um deles de natureza objetiva, incidindo sobre juros e comissões cobrados pela concessão do crédito, garantias prestadas na concessão do crédito e utilização de crédito concedido, e um outro, de natureza subjetiva na origem, respeitante às entidades financeiras (instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras) que cobram os juros e comissões, recebem as garantias e concedem crédito, e de natureza subjetiva no destino, respeitante às entidades beneficiárias da concessão do crédito, que incluem as sociedades de capital de risco, bem como as sociedades ou entidades cuja forma e objeto preencham os tipos de instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras previstos na legislação comunitária.
Em qualquer dos casos, as entidades intervenientes devem ser domiciliadas nos Estados membros da União Europeia ou em qualquer Estado, com exceção das domiciliadas em territórios com regime fiscal privilegiado, definidos por Portaria do Ministro das Finanças (Portaria n.º 150/2004, de 13-02 e respetivas alterações).
A isenção abrange, assim, as “instituições financeiras previstas na legislação comunitária”, tal como refere a própria norma.
A legislação comunitária que trata das instituições de crédito e financeiras é a Diretiva n.º 2013/36/UE de 26-06-2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, e o Regulamento n.º 573/2013 de 26-06-2013 do Parlamento Europeu e do Conselho.
A Diretiva n.º 2013/36/UE refere o seguinte no seu artigo 3º:
“Artigo 3º
Definições
1. Para efeitos da presente diretiva, entende-se por:
(…)
22) “instituição financeira”: uma instituição financeira na aceção do artigo 4º, n.º 1, ponto 26), do Regulamento (UE) n.º 575/2013;”.
E o artigo 4º n.º 1 ponto 26) do referido Regulamento (UE) n.º 575/2013 dispõe o seguinte:
“Artigo 4º
Definições
1. Para efeitos do presente regulamento, aplicam-se as seguintes definições:
26) “Instituição financeira”: uma empresa que não seja uma instituição, cuja atividade principal é a aquisição de participações ou o exercício de uma ou mais das atividades anumeradas no Anexo I, pontos 2 a 12 e 15, da Diretiva 2013/36/UE, incluindo uma companhia financeira, uma companhia financeira mista, uma instituição de pagamento, na aceção da Diretiva 2007/64/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de novembro de 2007, relativa aos serviços de pagamento no mercado interno, e uma sociedade de gestão de ativos, mas excluindo as sociedades gestoras de participações no setor dos seguros e as sociedades gestoras de participações de seguros mistas, na aceção do artigo 212.º, n.º 1, ponto g) da Diretiva 2009/138/CE;”.
A Diretiva 2013/36/EU foi transposta para o direito interno pelo Decreto-Lei n.º 157/2014, de 24-10, que alterou o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras.
Este Decreto-lei n.º 157/2014 aditou o artigo 2.º-A, que sob a epígrafe “Definições”, refere o seguinte:
“(…) s) «Instituições financeiras», com exceção das instituições de crédito e das empresas de investimento:
i) As sociedades gestoras de participações sociais sujeitas à supervisão do Banco de Portugal, incluindo as companhias financeiras e as companhias financeiras mistas;
ii) As sociedades cuja atividade principal consista no exercício de uma ou mais das atividades enumeradas nos pontos 2 a 12 e 15 da lista constante do anexo I à Diretiva n.º 2013/36/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013;
iii) As instituições de pagamento;
iv) as sociedades gestoras de fundos de investimento mobiliário na aceção do ponto 6.º do artigo 199º-A”.
Esta disposição legal está relacionada com o artigo 117.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, que, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 157/2014, sob a epígrafe “Sociedades Gestoras de Participações Sociais”, dispõe o seguinte:
“1 - Ficam sujeitas à supervisão do Banco de Portugal as sociedades gestoras de participações sociais quando as participações detidas, direta ou indiretamente, lhes confiram a maioria dos direitos de voto em uma ou mais instituições de crédito ou sociedades financeiras.
2 - O Banco de Portugal pode ainda sujeitar à sua supervisão as sociedades gestoras de participações sociais que, não estando incluídas na previsão do número anterior, detenham participação qualificada em instituição de crédito ou em sociedade financeira.
3 - Excetuam-se da aplicação do número anterior as sociedades gestoras de participações sociais sujeitas à supervisão do Instituto de Seguros de Portugal.
4 – O disposto nos artigos 30.º a 32.º, com as necessárias adaptações, 42.º-A, 43.ºA e nos n.ºs 1 e 3 do artigo 115.º é aplicável às sociedades gestoras de participações sociais sujeitas à supervisão do Banco de Portugal”.
A decisão do CAAD do processo n.º 911/2019-T refere que “efetuando o artigo 7.º, n.º 1, alínea e), do Código do Imposto do Selo uma remissão para as “sociedades ou entidades cuja forma e objeto preencham os tipos de instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras previstos na legislação comunitária”, quando se refere a entidades beneficiárias da concessão do crédito, parece claro que o preceito pretende remeter para as disposições de direito europeu aplicáveis, e, na atualidade, no que se refere às instituições financeiras, essas disposições são - como se viu - a do artigo 3.º, n.º 1, ponto 22), da Diretiva 2013/36/EU e, por via de remissão, a do artigo 4.º, n.º 1, ponto 26), do Regulamento (UE) n.º 575/2013”.
O referido Regulamento define como instituição financeira uma empresa que não seja uma instituição (de crédito), cuja atividade principal é a aquisição de participações ou o exercício de uma ou mais das atividades enumeradas no Anexo I, pontos 2 a 12 e 15, da Diretiva 2013/36/UE, com exclusão das sociedades gestoras de participações no setor dos seguros e as sociedades gestoras de participações de seguros mistas, na aceção do artigo 212.º, n.º 1, ponto g) da Diretiva 2009/138/CE.
Assim, a remissão da norma fiscal que determina a isenção do Imposto do Selo é feita para o direito europeu e, especificamente, para as transcritas disposições da Diretiva 2013/36/UE e do Regulamento (UE) n.º 575/2013.
Em conclusão, nos termos dos referidos normativos legais, uma instituição financeira, para o aludido efeito, é, além de outras que exerçam certas atividades enumeradas no anexo, uma empresa que, não sendo uma instituição de crédito, tem como principal atividade é a aquisição de participações, desde que se não trate de sociedades gestoras de participações no setor dos seguros, tal como refere a decisão do CAAD do processo n.º 911/2019-T.
Na transposição da Diretiva 2013/36/EU de 26-06-2013 para o direito interno, através do Decreto-Lei n.º 157/2014, o legislador nacional adotou um conceito mais restritivo de instituição financeira, caracterizando como tal “as sociedades gestoras de participações sociais sujeitas à supervisão do Banco de Portugal”.
No entanto, para efeitos da aplicação da isenção do imposto de selo, o artigo 7.º, n.º 1, alínea e) do Código do Imposto do Selo não remete para o direito interno, mas para o direito da União Europeia, o que significa que a definição constante do artigo 2.º-A do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aditado pelo diploma que procedeu à transposição da Diretiva, releva para os demais efeitos da regulação das sociedades gestoras de participações sociais mas não para o específico aspeto da isenção de imposto de selo.
O regime jurídico das sociedades gestoras de participações sociais, previsto no Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de dezembro, dispõe no seu artigo primeiro que estas sociedades “têm por único objeto contratual a gestão de participações sociais de outras sociedades, como forma indireta de exercício de atividades económicas” (n.º 1), sendo que a participação numa sociedade é considerada forma indireta de exercício da atividade económica desta quando não tenha carácter ocasional e atinja, pelo menos, 10% do capital com direito de voto da sociedade participada, quer por si só, quer através de participações de outras sociedades em que a SGPS seja dominante (n.º 2).
Os contratos pelos quais se constituem estas sociedades gestoras de participações sociais devem mencionar expressamente como objeto único da sociedade a gestão de participações sociais de outras sociedades, como forma indireta de exercício de atividades económicas (artigo 2.º, n.º 2), sendo permitida às SGPS a prestação de serviços técnicos de administração e gestão a todas ou a algumas das sociedades em que detenham participações ou com as quais tenham celebrado contratos de subordinação (artigo 4.º, n.º 1).
Tratando-se de sociedades que têm por único objeto a gestão de participações sociais de outras sociedades, como forma indireta de exercício de atividades económicas, não oferece dúvidas que as sociedades gestoras de participações sociais se enquadram no conceito de “instituição financeira”, tal como se encontra definido no direito europeu, e, assim sendo, beneficiam da isenção de imposto estabelecida no artigo 7.º, n.º 1, alínea e), do Código do Imposto do Selo.
Tal como ficou provado e nem sequer é colocado em causa pelas partes, a Requerente é uma sociedade gestora de participações sociais, que se encontra regulada pelo Decreto-Lei n.º 495/88, de 30-12-1988, e está domiciliada em Portugal. E nessa qualidade não pode deixar de se encontrar abrangida pelo conceito relevante de instituição financeira para efeito da aplicação da isenção do imposto de selo prevista no artigo 7.º n.º 1 alínea e) do Código do Imposto de Selo.
Em conclusão, conclui-se que as operações financeiras em causa preenchem os pressupostos objetivos e subjetivos da isenção de imposto de selo, na medida que respeitam à concessão de garantias por instituições de crédito (Banco B..., SA, C..., SA e D..., SA) a uma sociedade gestora de participações sociais, que se qualifica, à luz da legislação de direito europeu, como instituição financeira, e em que intervieram instituições que se encontram domiciliadas em Portugal, e não em nenhum dos territórios com regime privilegiado previsto no Portaria n.º 150/2004, de 13-02-2004.
Pelo exposto, as liquidações referidas estão abrangidas pela isenção prevista na alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo, pelo que, sendo ilegais, devem ser anuladas, artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT, bem como o indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa.
5. Juros indemnizatórios
A Requerente pede que seja condenada a Requerida no reembolso do imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43º n.º 1 da LGT, contados desde a data de indeferimento do pedido de revisão oficiosa (02-10-2019) até integral reembolso.
Dispõe o artigo 43.º n.º 1 da LGT que: “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”, estatuindo o n.º 4 do art. 61.º do CPPT que “se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea”.
O artigo 100º da LGT refere que “a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei”.
Nos presentes autos, verifica-se que a ilegalidade das liquidações controvertidas é imputável à AT.
Assim, o Requerente tem direito, em conformidade com o disposto nos arts. 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, ao reembolso do montante de imposto indevidamente pago e aos juros indemnizatórios, nos termos do estatuído nos arts. 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º do CPPT.
Quanto ao prazo de cálculo dos juros indemnizatórios, dispõe o acórdão de uniformização de jurisprudência de 03-07-2019, do processo n.º 04/19.0BALSB, que “Pedida pelo sujeito passivo a revisão oficiosa do acto de liquidação (cfr. art. 78.º, n.º 1, da LGT) e vindo o acto a ser anulado, mesmo que em impugnação judicial do indeferimento daquela revisão, os juros indemnizatórios são devidos depois de decorrido um ano após a apresentação daquele pedido, e não desde a data do pagamento da quantia liquidada [cfr. art. 43.º, n.ºs 1 e 3, alínea c), da LGT]”.
Com efeito, a Requerente tem direito a juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43º da LGT, depois de decorrido um ano após a apresentação do pedido de revisão, até integral reembolso do imposto indevidamente pago.
6. Decisão
Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral:
a) Julgar procedente o pedido formulado pela Requerente no presente processo arbitral, quanto às liquidações de Imposto do Selo relativo aos meses de maio a dezembro de 2015, no valor total de 41.111,16 €;
b) Julgar procedente o pedido de condenação da AT a reembolsar à Requerente o valor do imposto indevidamente pago, e ao pagamento de juros indemnizatórios nos termos legais, contados depois de decorrido um ano após a apresentação do pedido de revisão até integral reembolso do imposto pago;
c) Condenar a Requerida no pagamento das custas do presente processo.
7. Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em 41.111,16 €, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 3 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
8. Custas
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 2.142,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerida nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5, do citado Regulamento.
Notifique.
Lisboa, 20 de janeiro de 2021.
Texto elaborado por computador, nos termos do artigo 138º, n.º 5 do Código do Processo Civil (CPC), aplicável por remissão do artigo 29º, n.º 1, alínea e) do Regime de Arbitragem Tributária, por mim revisto.
A Juiz-Árbitro
(Suzana Fernandes da Costa)