DECISÃO ARBITRAL (consultar versão completa no PDF)
Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dra. Raquel Franco e Dr. Álvaro Caneira (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 27-08-2020, acordam no seguinte:
1. Relatório
A..., contribuinte nº..., com domicilio na Rua ..., n.º ..., ..., ..., ...-... Carcavelos, e, B..., contribuinte nº ..., com domicilio na Rua ..., nº..., ..., ...-... Lisboa, (adiante mencionados como os Requerentes) vieram, nos termos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), requerer a constituição de Tribunal Arbitral.
Os Requerentes pedem a declaração de ilegalidade das seguintes liquidações adicionais de IVA:
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 18-05-2020.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, os Árbitros que foram designados pelo Conselho Deontológico comunicaram a aceitação do encargo, no prazo aplicável.
Em 28-07-2020, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 27-08-2020.
A Administração Tributária e Aduaneira apresentou Resposta em que defendeu que o pedido de pronúncia arbitral deve ser julgado improcedente.
Em 16-11-2020, realizou-se uma reunião em que foi produzida prova testemunhal e decidido que o processo prosseguisse com junção de documentos pela Requerente e posteriores alegações escritas simultâneas.
A Requerente apresentou documentos.
Apenas a Requerente apresentou alegações.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e é competente.
As Partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos:
A) Os Requerentes foram citados, por reversão, na qualidade de responsáveis subsidiários, nos seguintes processos de execução fiscal, relativos a IVA:
B) Na origem dos referidos processos de execução fiscal, estão as liquidações adicionais de IVA e consequentes Demonstrações de acerto de contas abaixo identificadas, efectuadas a C... SA., com o NIPC ..., (doravante “C...”), sociedade da qual os Requerentes foram administradores:
C) As liquidações referidas foram efectuadas na sequência de uma acção inspectiva à C..., em que foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária (RIT) que consta do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:
(...)
III.3 - Apreciação contabilístico - fiscal III.3.1 - Estrutura de Gastos e Rendimentos
Tendo em conta o âmbito do presente procedimento, verifica-se que a Demonstração de Resultados (DR) da entidade em análise apresenta os seguintes indicadores:
Os indicadores apresentados mostram que no exercício de 2013, a C... suportou o montante de € 1.040.257,32 a título de gastos para obter € 230.374,76 de rendimentos, isto é, por cada euro auferido em prestações de serviços, a empresa gastou € 4,52.
III.3.1.1 - Estrutura de Rendimentos
Vejamos o detalhe das faturas com valor superior a € 3.000,00 emitidas pela entidade:
III.3.1.2 - Estrutura de Gastos
A realidade apresentada obriga a uma verificação da estrutura de gastos da entidade C..., nomeadamente o Custo das mercadorias vendidas e das matérias consumidas (CMVMC), os Fornecimentos e serviços externos (FSE), os Gastos com pessoal e os Outros gastos.
III.3.1.2.1 - Custo das mercadorias vendidas e das matérias consumidas (CMVMC)
O CMVMC, com um peso de 18,63% nas vendas e apresenta-se dentro dos indicadores normais para o setor de atividade. Foram analisados os documentos contabilísticos que originaram registo nesta rubrica, sendo os mesmos válidos e cumprindo os requisitos legais para a sua contabilização como gasto, nos termos do artigo 23.º do CIRC.
III.3.1.2.2 - Fornecimentos e serviços externos (FSE)
Analisado o detalhe das contas relativas a Fornecimentos e Serviços Externos (FSE) no ano de 2013, verifica-se que as mesmas correspondem a 228,77% do montante das prestações de serviços efetuadas pela entidade em análise. Isto é: por cada euro faturado pela empresa, a mesma suportou um gasto de aproximadamente € 2,29 em FSE.
Na rubrica em questão (FSE), foram analisados os documentos que originaram registo contabilístico, sendo que parte deles não preenchem os requisitos do artigo 23.º do CIRC, conjugado com o artigo 36.º do CIVA.
Relativamente aos documentos que não preenchem os critérios da dedutibilidade, foram solicitados esclarecimentos adicionais, através de notificação pessoal (ANEXO 2) em 9 de junho do corrente ano, nomeadamente:
- Documentos e/ou esclarecimentos que permitam determinar a natureza das prestações de serviços e qual a relação dos referidos serviços com os rendimentos da C..., para os efeitos do artigo 23.º do CIRC, relativos a faturas emitidas pelas seguintes entidades:
a) D...- NIF...;
b) E..., SA - NIF ...;
c) F…, SA – NIF…;
d) G…- NIF…;
- Contrato de arrendamento e discriminação das despesas associadas, constantes das faturas emitidas pela entidade E..., SA – NIF... .
Em resposta à notificação, a C... apresentou contratos de prestações de serviços com as entidades D..., E... e F..., tendo ainda informado que os mesmos visavam suprir necessidades no âmbito da gestão, assessoria comercial e operacional, gestão técnica, direção financeira (num contexto de preparação de PER), serviços de intermediação e partilha de rendas de um escritório na Rua ... .
Analisados os esclarecimentos e documentos apresentados para cada uma das entidades emitentes de faturas ao adquirente C..., temos:
a) D...
Foi apresentado um contrato de prestação de serviços com esta entidade, outorgado em 23-10-2009, de prospecção comercial para angariação, orçamentações, planeamento, coordenação e acompanhamento de obras, atividades gerais de marketing e supervisão e formação técnica.
O contrato refere que a C... pagaria mensalmente à D..., pela prestação dos serviços, o valor mensal de € 3.000,00, montante este que está de acordo com as faturas emitidas pelo prestador no ano em análise, e consequentemente aceite o gasto.
b) E..., SA
Foi apresentado um contrato de prestação de serviços com esta entidade (ANEXO 3), outorgado em 17-08-2006, de "coordenação e supervisão relativos à gestão operacional" nas áreas da "logística, stocks e fornecedores", "administrativa e pessoal" "gestão financeira corrente e controle de gestão", "marketing", "vendas" e "produção".
A terceira cláusula do contrato refere que a C... pagaria à E..., pela prestação dos serviços referidos, "o valor mensal de € 4.500,00" "contra entrega de fatura/recibo" e ainda que "todas as despesas e custos que a "E..." tiver de efetuar para desempenhar a sua prestação correm por conta da mesma".
Por outro lado, estava ainda prevista uma remuneração variável de "5% (cinco porcento) do E.B.I.T. (E.B.I.T. = resultados operacionais após amortizações do exercício e antes de encargos financeiros e impostos sobre lucros...)" e "ainda, cumulativamente, a uma percentagem do E.B.I.T". que dependerá do grau de concretização dos E.B.I.T. objetivo" de acordo com uma tabela apresentada, na qual constam percentagens que variam entre os 0% e os 7,5%.
Foi ainda referido pela entidade em análise, que os valores faturados pela E... sob a designação assessoria comercial e operacional, correspondem à disponibilização de quadros de direção num determinado período de tempo (sem qualquer especificação temporal), os seus vencimentos eram assegurados por aquela empresa e debitados à C..., não tendo sido formalizado qualquer contrato de prestação de serviços nestes termos, conforme ANEXO 4.
Relativamente ao fornecedor E..., SA - NIF ... foram contabilizadas as seguintes faturas, nas seguintes contas de gastos:
Confrontando os documentos e esclarecimentos apresentados pela C... com a realidade apresentada, no que concerne às faturas contabilizadas na conta SNC 62219 - Trabalhos especializados - Outros, não é aceite como gasto o montante de € 113.801,47 - [€167.801,47 - (€ 4.500,00 * 12)], uma vez que o contrato de prestação de serviços apenas refere o valor de € 4.500,00 a título de remuneração mensal, os encargos com a prestação são da responsabilidade do prestador e, uma eventual remuneração variável apenas ser prevista se a sociedade E... respeitar os requisitos previstos no contrato anexo, os quais estão relacionados com o nível de EBIT alcançado pelo sujeito passivo em análise (em 2013 foi de € - 786.414,93).
Em relação às faturas contabilizadas na conta SNC 6228114 — Outros Fornecimentos e Serviços - Custos Comuns E..., não é aceite como gasto o montante de € 100.395,33, por não estar contratualizada qualquer remuneração a título de rendas ou comparticipação em despesas associadas.
c) F..., SA
Foi apresentado um contrato de prestação de serviços com esta entidade, outorgado em 17-07-2012, de angariação de trabalho de pintura no mercado angolano.
O contrato (ANEXO 5) refere que a C... pagaria uma remuneração variável a F..., “em função da adjudicação de trabalhos” no mercado angolano de acordo com os seguintes objetivos:
. € 25.000,00 se o valor das encomendas superar os € 250.000,00;
. € 37.500,00 se o valor das encomendas superar os € 400.000,00;
. € 50.000,00 se o valor das encomendas superar os € 550.000,00;
. € 75.000,00 se o valor das encomendas superar os € 900.000,00.
Relativamente ao fornecedor F..., SA, em 2013, foi contabilizada uma única fatura, na seguinte conta de gastos:
Ora, no exercício em análise, a C... obteve apenas € 61.171,68 relativos a prestações de serviços no mercado angolano, não sendo assim aceite o gasto no montante de € 50.000,00.
d) G..., SA
Conforme esclarecimento da C..., as faturas emitidas pela G..., SA foram relativas ao exercício de funções de direção financeira num contexto de preparação do Processo Especial de Revitalização (PER) apresentado pela entidade em análise em agosto de 2013. O montante das faturas é aceite como gasto do exercício.
(...)
III.3.3 - Em sede de IVA
No exercício de 2013 a C... efetuou prestação de serviços no montante de € 230.374,76 para o mercado nacional e para outros mercados.
Foram verificados os documentos contabilísticos na vertente do Imposto sobre o Valor Acrescentado no que concerne ao IVA liquidado, dedutível e às regularizações.
O sujeito passivo, na medida em que maioritariamente efetua prestações de serviços a empresas de construção civil, na qualidade de subempreiteiro, pratica operações isentas que conferem o direito à dedução, não liquidando IVA. Cabe à entidade adquirente dos serviços de construção civil prestados pela C... liquidar o IVA devido pela aplicação da regra da Inversão do sujeito passivo nos termos da alínea j) do n.' 1 do artigo 2.º do CIVA.
Por outro lado, quando efetua aquisições de bens ou serviços, tem a possibilidade de deduzir o IVA suportado, o que faz normalmente. Esta situação origina imposto a recuperar e consequente pedido de reembolso de IVA. Em 2013 a entidade obteve um reembolso de IVA no montante de 93.686,31 euros.
Em relação às regularizações de IVA a favor do sujeito passivo, as mesmas 5.580,00 e preenchem os requisitos do artigo 78.º do CIVA.
(...)
FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS
(...)
O contribuinte deduziu IVA com base nos documentos a seguir identificados, nos montantes e períodos indicados:
Os documentos acima identificados não respeitam a alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º do CIVA. nomeadamente porque não indicam a unidade de medida e designação usual dos serviços prestados, logo o respetivo IVA não é dedutível por força do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 19.º (por lapso indicada a alínea c) do n.º 2 do artigo 19.º do CIVA no Projeto de Relatório), conjugado com o n.º 1 do artigo 20.º, ambos do CIVA.
Refere-se ainda, por outro lado, uma vez que os documentos acima identificados não corresponderam a encargos normais de exploração, pelos motivos referidos em III.3, também a dedutibilidade do IVA se encontrada excluída por força da alínea e) do n.º 1 do artigo 21.º do CIVA.
Assim, não é dedutível o IVA no montante de € 60.765,25.
(...)
9.2 - Audição Prévia
O sujeito passivo, em 21 de agosto do corrente ano, exerceu através de comunicação escrita, entregue nesta Direção de Finanças de Lisboa, o seu direito de audição prévia (o qual fica arquivado no processo), manifestando o seu desacordo com as correcções propostas alegando para tal, em resumo, o seguinte:
(...)
2. – IVA
A referência à legislação que suporta os fundamentos da exclusão do direito a dedução do IVA, referidos no projeto de relatório, nomeadamente a alínea c) do nº 2 do artigo 19.º e a alínea e) do nº 1 do artigo 21.º, ambos do CIVA, “só podem resultar de manifesto equívoco, porque não está em causa nenhuma das situações abrangidas pelos referidos normativos”;
A exclusão do direito à dedução do IVA nos termos da alínea b) do nº 5 do artigo 36.º, porque não indicam a unidade de medida e designação usual dos serviços prestados, conforme referido no Projeto de Relatório, não se aplica porque os “serviços prestados não se medem em quantidades” e a descrição constante das “faturas em causa não suscita qualquer dúvida, por estarmos perante operações sujeitas à taxa normal de IVA."
No "caso das faturas emitidas pela E... é certo que não indicam a pretendida unidade de medida" mas “tal exigência não resulta de nenhuma imposição legal e as faturas têm a designação usual dos serviços”, e além disso “têm como informação complementar o contrato celebrado entre as partes”, “pelo que a extensão e natureza dos serviços prestados está descrita nos documentos disponibilizados no âmbito do procedimento de inspeção”.
“Relativamente a fatura da F... foi apresentado o contrato de Angariação de trabalho de pintura no mercado angolano” pelo que “não pode prevalecer o invocado fundamento de inobservância de requisitos formais” nem que “as controvertidas prestações de serviços não correspondem a encargos normais de exploração”.
Por outro lado, “as empresas E... e F... entregaram também o mesmo valor de IVA ao Estado" pelo que o posicionamento da AT, ao excluir o direito a dedução do imposto, originaria uma duplicação de receita de IVA
O alegado merece as seguintes considerações:
(...)
2. – Em sede de IVA
Analisada a alegação da C..., em fase de audição prévia, refere-se desde já que, por lapso, no Projeto de Relatório foi mencionada a “alínea c) do nº 2 do artigo 19.º da CIVA” devendo ler-se alínea a) do nº 2 do artigo 19.º do CIVA.
Relativamente à exclusão ao direito a dedução do IVA, o argumento de que os “serviços prestados não se medem em quantidades" e que a descrição constante das “faturas em causa não suscita qualquer dúvida, por estarmos perante operações sujeitas à taxa normal de IVA" não é atendível.
Ainda assim, o fundamento de que as faturas emitidas, e colocadas em causa neste procedimento inspetivo para efeitos de direito à dedução do IVA, não indicam a denominação usual dos serviços prestados mas que “tal exigência não resulta de nenhuma imposição legal", porque "têm como informação complementar o contrato celebrado entre as partes" e “a extensão e natureza dos serviços prestados está descrita nos documentos disponibilizados no âmbito do procedimento de inspeção” também não é admissível.
Reafirma-se que as faturas em causa não respeitam a alínea b) do nª 5 do artigo 36.º do CIVA, nomeadamente porque não indicam a quantidade e denominação usual dos serviços prestados, logo não estão passadas em forma legal e, por isso, o respetivo IVA não é dedutível por força do disposto na alínea a) do nº 2 do artigo 19.º, conjugado com o n.º 1 do artigo 20.º, ambos do CIVA.
Salienta-se também, conforme referido no relatório, que, no que concerne às despesas que não constituam despesas normais de exploração, o respectivo IVA também se encontra excluído do direito à dedução por força do disposto na alínea e) do nº 1 do artigo 21.º do CIVA.
Refere-se, também, quanto a “alegada duplicação da receita...” que o SP parece fazer crer que a dedutibilidade do IVA seria uma consequência directa da sua exigibilidade noutros operadores. Ora, salienta-se que tal não está previsto em circunstância alguma na legislação do IVA.
Assim, tendo em conta que o sujeito passivo apresentou factos novos, são alteradas as correções meramente aritméticas inicialmente propostas, nos termos do artigo 23.º conjugado com o artigo 36.º, ambos do CIRC, conforme quadro seguinte:
A exclusão do direito à dedução do IVA mantém-se conforme Projeto de Relatório, nos termos do disposto na alínea a) do nº 2 do artigo 19.º, conjugado com o nº 1 do artigo 20.º, ambos do CIVA, no montante de € 60.765.
D) As instalações onde funcionava a C... eram parte de um imóvel arrendado pela E... que subarrendava metade à C... (depoimento da testemunha H... e contrato de arrendamento que consta do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido);
E) Na metade do espaço subarrendada à C... trabalhavam os seus colaboradores, em número superior a 30 e que eram mais dos colaborados da E..., que ocupavam a outra metade (depoimento da testemunha H...);
F) Não foi celebrado contrato de subarrendamento, por ele estar expressamente previsto no contrato de arrendamento celebrado pela C... e ser comprovado pelas facturas emitidas referentes a »comparticipação nas rendas e despesas associadas», que se reportavam a 50% do valor da renda e 50% dos encargos gerais com a ocupação do espaço, como água e electricidade (contrato de arrendamento junto ao processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, e depoimento da testemunha H...);
G) As facturas emitidas pela E... à C... que não se referem ao arrendamento reportam-se a serviços de administração, gestão operacional e comercial (depoimento da testemunha H... e contrato de gestão junto ao processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido);
H) Os administradores da C... não eram remunerados por esta, havendo uma remuneração meramente simbólica, sendo remunerados pela E..., de quem eram administradores, que facturava pelos serviços de administração prestados à C... (depoimento da testemunha H...);
I) Os directores de operações, de vendas e da área de projectos que prestavam serviços à C... tinham contratos com a E... e não com a C... e eram cedidos a esta, sendo facturados pela E... os serviços prestados (depoimento da testemunha H...);
J) E havia um outro funcionário da E... encarregado de angariar obras na área dos condomínios e institucionais de grande dimensão que recebia uma percentagem pelas obras que angariava para a C..., que lhe era paga pela E..., que facturava à C... (depoimento da testemunha H...);
K) A E... é uma empresa de consultadoria que presta serviços desde 1991 e as facturas foram sempre emitidas de acordo com o formato das que estão em causa, sem que a Administração Tributária suscitasse qualquer problema até à inspecção relativa ao exercício de 2013 (depoimento da testemunha H...);
L) Houve atrasos de um ano e alguns meses no pagamento da remuneração pelos serviços de administração sendo o acerto efectuado em Abril de 2013 (depoimento da testemunha H...);
M) Em 2012, devido à crise da construção civil, a C... foi fortemente afectada na prestação de serviços de pintura de edifícios, que era a sua actividade, pelo que decidiu procurar desenvolver a sua actividade em Angola (depoimento da testemunha H...);
N) Para conseguir entrar no mercado angolano, a C... pediu a colaboração da F..., que conhecia bem esse mercado, para «abrir as portas» desse mercado, em que era difícil entrar sem parceria com alguma empresa angolana (depoimento da testemunha H...);
O) Com a colaboração da F..., a C... conseguiu obter contratos em Angola, o primeiro dos quais foi uma obra de grande dimensão no edifício do banco I... em Luanda (depoimento da testemunha H...);
P) As prestações se serviços para o mercado angolano obtidas pela C... na sequência dos serviços prestados pela F... tiveram o valor de € 61.171,78 em 2013, e atingiram € 298.000,00 em 2014 e € 240.00,00 em 2015, com intermediação da parceira angolana da C..., que era a empresa J..., Lda (doravante “J...”), que, além do mais, recrutava a mão-de-obra necessária (documentos juntos em 26-11-2020, e depoimento da testemunha H...);
Q) As obras em Angola eram adjudicadas à J..., que faturava ao cliente e dos resultados da obra uma parte era entregue à C... (depoimento da testemunha H...);
R) Os serviços prestados pela F... consistiam apenas na «abertura das portas» do mercado angolano, pelo que a C... nada teve de pagar pela adjudicação de obras posteriores (depoimento da testemunha H...);
S) Não houve facturas de jantares ou ofertas extravagantes ou quaisquer despesas de luxo ou divertimento (depoimento da testemunha H...);
T) Em 29-05-2020, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.
2.2. Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto
Os factos provados baseiam-se no processo administrativo e nos documentos juntos pela Requerente cuja correspondência à realidade não é contestada pela Autoridade Tributária e Aduaneira e, nos pontos indicados, no depoimento da testemunha H....
A testemunha prestava serviços de consultadoria, como consultor externo, à E..., desde 1992 e acompanhou a inspecção tributária. A testemunha aparentou depor com isenção e com conhecimento dos factos que relatou.
3. Matéria de direito
A Administração Tributária efectuou uma inspecção à C..., efectuando correcções em sede de IVA, por não aceitar o exercício do direito a dedução em relação à totalidade dos valores das facturas emitidas por aquela empresa à E... e a uma factura emitida à F... .
Os Requerentes imputam às liquidações impugnadas vício de falta de fundamentação e violação das normas relativas ao direito à dedução.
A fundamentação das correcções relativas a IVA é a seguinte:
Os documentos acima identificados não respeitam a alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º do CIVA. nomeadamente porque não indicam a unidade de medida e designação usual dos serviços prestados, logo o respetivo IVA não é dedutível por força do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 19.º (por lapso indicada a alínea c) do n.º 2 do artigo 19.º do CIVA no Projeto de Relatório), conjugado com o n.º 1 do artigo 20.º, ambos do CIVA.
Refere-se ainda, por outro lado, uma vez que os documentos acima identificados não corresponderam a encargos normais de exploração, pelos motivos referidos em III.3, também a dedutibilidade do IVA se encontrada excluída por força da alínea e) do n.º 1 do artigo 21.º do CIVA.
Os artigos 19.º, 20.º e 21.º do CIVA estabelecem o seguinte, o que aqui interessa:
Artigo 19.º
Direito à dedução
1 - Para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzem, nos termos dos artigos seguintes, ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuaram:
a) O imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos;
Artigo 20.º
Operações que conferem o direito à dedução
1 - Só pode deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização das operações seguintes:
a) Transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas;
Artigo 21.º
Exclusões do direito à dedução
1 - Exclui-se, todavia, do direito à dedução o imposto contido nas seguintes despesas:
(...)
e) Despesas de divertimento e de luxo, sendo consideradas como tal as que, pela sua natureza ou pelo seu montante, não constituam despesas normais de exploração.
Por outro lado, o artigo 226.º da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, estabelece o seguinte, quanto aos requisitos das facturas, no que aqui interessa:
Artigo 226.º
Sem prejuízo das disposições específicas previstas na presente directiva, as únicas menções que devem obrigatoriamente figurar, para efeitos do IVA, nas facturas emitidas em aplicação do disposto nos artigos 220.º e 221.º são as seguintes:
(...)
6) A quantidade e natureza dos bens entregues ou a extensão e natureza dos serviços prestados;
3.1. Facturas emitidas pela E... com o descritivo «comparticipação na renda e despesas associadas»
Da prova produzida resulta que as facturas emitidas pela E... com a designação de «comparticipação na renda e despesas associadas» se reportam ao subarrendamento pela E... à C... de parte das instalações de que era arrendatária.
A designação referida afigura-se adequada à materialidade das despesas suportadas com o subarrendamento e a partilha de despesas gerais conexas e, complementada pelo contrato de arrendamento, em que se refere expressamente a possibilidade de subarrendar à C..., era possível à Administração Tributária comprovar a que se reportavam.
A prova testemunhal não deixa margem para quaisquer dúvidas sobre a relação das despesas com a actividade da C..., pois o local subarrendado era onde trabalhavam os seus colaboradores.
No exercício do direito de audição, a C... juntou o contrato em que se refere o subarrendamento pelo E... e indicou vários colaboradores seus que podiam ser inquiridos sobre o desenvolvimento da sua actividade nas instalações arrendadas.
Com base nesses elementos, se realizasse as diligências sugeridas pela C..., a Administração Tributária poderia ter concluído que houve um subarrendamento e que as facturas em causa se reportam ao pagamento da parte do valor da renda e despesas correspondente à parte das instalações ocupada pela C..., isto é, como se refere no seu descritivo, à «comparticipação na renda e despesas associadas».
Por outro lado, trata-se, manifestamente, de despesas suportadas pela C... para realizar as operações tributadas, pois era nessas instalações que trabalhavam os seus colaboradores, os quais efectuavam tarefas de administração e gestão e de natureza administrativa e não há qualquer indício de se trate de despesas de divertimento ou luxo enquadráveis na alínea e) do n.º 1 do artigo 21.º do CIVA.
Sendo assim, independentemente de este descritivo ser ou não a «designação usual dos serviços prestados», o direito à dedução não pode ser recusado, pois, como refere o TJUE no acórdão de 15-09-2016, proferido no processo C-516/14, Barlis 06, «o artigo 178.º, alínea a), da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que as autoridades tributárias nacionais possam recusar o direito a dedução do imposto sobre o valor acrescentado pelo simples facto de o sujeito passivo possuir uma fatura que não cumpre os requisitos exigidos pelo artigo 226.º, n.ºs 6 e 7, desta diretiva, quando essas autoridades dispõem de todas as informações necessárias para verificar se os requisitos substantivos relativos ao exercício desse direito se encontram satisfeitos».
O direito da União Europeia tem primazia sobre o direito nacional, como decorre do n.º 4 do artigo 8.º da CRP.
Para além disso, como tem sido pacificamente entendido pela jurisprudência e é corolário da obrigatoriedade de reenvio prejudicial prevista no artigo 267.º do TFUE (que substituiu o artigo 234.º do Tratado de Roma, anterior artigo 177.º), a jurisprudência do TJUE tem carácter vinculativo para os Tribunais nacionais, quando tem por objecto questões conexas com o Direito da União Europeia ( ).
Pelo exposto, as liquidações impugnadas enfermam de vício de violação de lei, por errada interpretação das normas que foram invocadas, numa interpretação compaginável com o Direito da União Europeia.
3.2. Facturas emitidas pela E... com os descritivos «contrato de gestão», «acompanhamento à gestão operacional» e «assessoria comercial»
As despesas a que se referem estas facturas estão conexionadas com o contrato de prestação de serviços, que engloba "coordenação e supervisão relativos à gestão operacional" nas áreas da "logística, stocks e fornecedores", "administrativa e pessoal", "gestão financeira corrente e controle de gestão", "marketing", "vendas" e "produção".
Em sede de IRC, a Administração Tributária não recusou a dedutibilidade da totalidade destas despesas como gastos, mas apenas na parte que excede o valor de € 4.500,00 mensais «uma vez que o contrato de prestação de serviços apenas refere o valor de € 4.500,00 a título de remuneração mensal, os encargos com a prestação são da responsabilidade do prestador e, uma eventual remuneração variável apenas ser prevista se a sociedade E... respeitar os requisitos previstos no contrato anexo, os quais estão relacionados com o nível de EBIT alcançado pelo sujeito passivo em análise (em 2013 foi de € - 786.414,93)».
Isto é, foi o entendimento de que os valores facturados eram excessivos e não a eventual falta da sua conexão com a actividade da C... que justificou a correcção em sede de IRC.
No que concerne à correcção em sede de IVA, baseia-se, como se disse, na falta de indicação da «quantidade e denominação usual dos ... serviços prestados» e em tratar-se de «despesas de divertimento e de luxo, sendo consideradas como tal as que, pela sua natureza ou pelo seu montante, não constituam despesas normais de exploração».
Como já se referiu, não há qualquer indício de que se trata de despesas de divertimento e luxo e a Administração Tributária reconheceu, para efeito de IRC, que se trata de despesas conexas com a actividade da C..., o que, aliás, resulta do contrato de prestação de serviços e da prova testemunhal produzida.
Por outro lado, o facto de ter sido pago em 2013 um montante superior aos € 4.500,00 mensais previstos no contrato foi explicado pela testemunha H..., como sendo devido a um acerto de contas efectuado no mês de Abril, por terem ocorrido atrasos de mais de um ano nos pagamentos.
Assim, também quanto a estas despesas, não se pode considerar demonstrado que se trate de despesas anormais, quer pela sua natureza, quer pelo seu montante, nem que possa considerar-se apropriada qualificá-las como de divertimento ou luxo.
Por isso, a correcção apenas se poderá basear na falta de indicação da «quantidade e denominação usual dos ... serviços prestados».
No entanto, este requisito formal não está previsto, nestes termos, na Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, e foi esclarecido pelo acórdão do TJUE de 15-07-2010, Pannon Gép Centrum kft, proferido no processo C-368/09, o seguinte:
40 O artigo 226.° da Directiva 2006/112 precisa que, sem prejuízo das disposições particulares desta directiva, só as referências citadas neste artigo devem constar obrigatoriamente, para efeitos de IVA, das facturas emitidas em aplicação do artigo 220.° da referida directiva.
41 Daqui decorre que não é legítimo aos Estados-Membros associar o exercício do direito à dedução do IVA ao preenchimento de pressupostos relativos ao conteúdo das facturas que não estão expressamente previstos nas disposições da Directiva 2006/112. Esta interpretação é igualmente corroborada pelo artigo 273.° desta directiva, que prevê que os Estados-Membros podem impor obrigações que considerem necessárias para assegurar a exacta percepção do IVA e para evitar a fraude, mas que esta faculdade não pode ser utilizada para impor obrigações de facturação suplementares às fixadas, designadamente, no artigo 226.° da referida directiva.
Assim, após esta jurisprudência do TJUE e sua obrigatoriedade, não há fundamento para exigir que as facturas satisfaçam requisitos formais não previstos no artigo 226.º da Directiva n.º 2006/112/CE, nem para, em vez de os exigir tal como estão previstos nesta norma, efectuar adaptações, como se terá pretendido fazer no artigo 36.º do CIVA.
Ora, a Directiva n.º 2006/112/CE não exige que seja indicada nas facturas, quanto a prestação de serviços, a «quantidade e denominação usual dos ... serviços prestados», mas sim, no n.º 6) do seu artigo 226.º, quanto a prestação de serviços, a «extensão e natureza dos serviços prestados».
Sendo assim, em face da primazia do Direito de União e da obrigatoriedade da jurisprudência do TJUE, tem de se concluir que a exigência formulada pela Administração Tributária com base no artigo 36.º do CIVA, quanto ao descritivo das facturas, não tem suporte legal válido.
Por outro lado, sendo o processo arbitral tributário um meio alternativo ao processo de impugnação judicial (n.º 2 do artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril), é, como este, um meio processual de mera legalidade, em que se visa eliminar os efeitos produzidos por actos ilegais, anulando-os ou declarando a sua nulidade ou inexistência [artigos 2.º do RJAT e 99.º e 124.º do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea a), daquele], pelo que os actos têm de ser apreciados tal como foram praticados, não podendo o tribunal, perante a constatação da invocação de um fundamento ilegal como suporte da decisão administrativa, apreciar se a sua actuação poderia basear-se noutros fundamentos. ( )
Por isso, não pode este Tribunal Arbitral substituir a fundamentação de direito das liquidações que consta do RIT por uma fundamentação alternativa, designadamente apurando se ocorre falta de cumprimento dos requisitos previstos naquele n.º 6 do artigo 226.º da Directiva n.º 2006/112/CE, como aventa a Administração Tributária na sua resposta.
De qualquer modo, também quanto a este ponto, o contrato de prestação de serviços permitiu à Administração Tributária apurar qual a natureza dos serviços prestados, que ela própria considerou relevantes com gastos para efeitos de IRC e, por isso, conexionados com a actividade da C..., bem como a taxa aplicável que é a máxima.
Por outro lado, num contrato de prestação de serviços de vários tipos sem termo definido, com um preço mensal global fixado, a unidade de medida dos serviços é o mês a que corresponde a mensalidade facturada, isto é, é essa a extensão dos serviços que, neste caso, também foi apurada através do contrato. Para efeitos de facturação, num contexto em que foi acordado um preço mensal fixo por um conjunto de serviços que podem variar de mês para mês, não tem relevância qualquer outra indicação da extensão dos serviços que não seja a do período a que se reportam, pois qualquer que fosse a dimensão e intensidade dos serviços prestados (a extensão ou quantidade) o valor da facturação seria o mesmo. Como disse a C... no exercício do direito de audição, trata-se de serviços que não são pagos em função de quantidades, mas sim pela duração, estando prevista no contrato o período de tempo de prestação (mês) a que corresponde o pagamento de € 4.500,00. Por isso, não se justifica a indicação de outra «quantidade» ou «extensão» que não seja a do período a que corresponde o pagamento, que consta do contrato.
Por outro lado, foi dada uma explicação pela testemunha H... para o excesso de facturação ocorrido o mês de Abril de 2013 (acerto de contas por omissão de facturação durante mais de um ano), pelo que, não havendo elementos que permitam concluir que não corresponda a realidade, não se pode concluir que não se esteja perante despesas que conexionadas com a actividade da C... .
Pelo exposto, também quanto a esta correcção, as liquidações impugnadas enfermam de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, que justificam a sua anulação, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.
3.3. Factura emitida à F...
Em 17-07-2012, a C... celebrou com a F... um contrato de prestação de serviços de angariação de trabalho de pintura de edifícios no mercado angolano.
Relativamente ao exercício de 2013, a C... obteve apenas € 61.171,68 relativos a prestações de serviços no mercado angolano, pelo que a Administração Tributária não aceitou, para efeito de IRC, o gasto no montante de € 50.000,00, que consta da factura 37/2013 emitida pela F... .
O descritivo da factura é apenas «Serviços Prestados», mas esta é complementada com o contrato apresentado à Administração Tributária durante a inspecção.
Os fundamentos da não aceitação da dedução do IVA quanto a esta factura são idênticos aos das restantes correcções, designadamente a não indicação da «unidade de medida e designação usual dos serviços prestados» e não se tratar de «encargos normais de exploração» e as normas dos artigos 36.º, n.º 5, alínea b) e 21.º, n.º 1, alínea e), do CIVA.
Relativamente ao primeiro fundamento, vale o que já se referiu sobre não se tratar de exigências feitas, nesses termos, pelo artigo 226.º da Directiva n.º 2006/112/CE e não ser admitida, à face da jurisprudência do TJUE, a exigência de satisfação de requisitos diferentes dos que naquele artigo estão previstas.
Quanto ao segundo fundamento, poderia considerar-se excessivo o pagamento e, a existir excesso, não ser «encargo normal de exploração» para efeitos da alínea e) do n.º 1 do artigo 21.º do CIVA.
Mas, a C... referiu no ponto 25 exercício do direito de audição que «a remuneração da F... é fixada em função dos trabalhos adjudicados para a C..., não havendo naturalmente coincidência temporal entre o momento da adjudicação e a correspondente faturação destes serviços pela F... e o momento da execução dos trabalhos no mercado angolano e consequente faturação pela C..., que naturalmente ocorreram em período temporal posterior».
A testemunha H... e as facturas emitidas pela J..., parceira angolana da C..., relativas aos anos de 2014 e 2015, confirmam aquelas afirmações, mostrando que, além dos € 61.171,78 facturados em 2013, foram facturados € 298.000,00 em 2014 e € 240.00,00 em 2015, na sequência da «abertura de portas» do mercado angolano decorrente dos serviços prestados pela F... . A soma destes valores supera o valor de € 550.000 de encomendas. que no contrato com a F... se previa como justificando o pagamento de € 50.000,00. Sendo assim, o pagamento foi o adequado, pelo que está afastada a possibilidade de enquadramento da situação na alínea e) do n.º 1 do artigo 21.º do CIVA.
Por outro lado, como o TJUE entendeu no citado acórdão Barlis 06, para apurar os requisitos do direito à dedução,
– «a Administração Fiscal não deve limitar se ao exame da própria fatura. Deve igualmente ter em conta informações complementares prestadas pelo sujeito passivo. Esta constatação é confirmada pelo artigo 219.º da Diretiva 2006/112 que equipara a fatura qualquer documento ou mensagem que altere a fatura inicial e a ela faça referência específica e inequívoca», (n.º 44), e
– devem-se ter «em conta todas as informações constantes das faturas em causa e dos documentos anexos apresentados pela Barlis com vista a verificar se os requisitos substantivos do seu direito a dedução do IVA se encontram satisfeitos» (n.º 45).
Pelos exposto, comprovando-se pelos documentos juntos que estão satisfeitos os requisitos do direito à dedução quanto à factura emitida pela F..., tem de se concluir que procede o pedido de pronúncia arbitral também quanto a esta correcção, sendo ilegais as liquidações impugnadas, na pare em que assentam nesta correcção.
4. Decisão
De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
b) Anular as seguintes liquidações de IVA subjacentes às demonstrações de acerto de contas com os seguintes n.ºs de compensação:
5. Valor do processo
De harmonia com o disposto nos artigos 296.º, n.º 1, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 60.765,25.
6. Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 2.448,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Administração Tributária.
Lisboa, 24-12-2020
Os Árbitros
(Jorge Lopes de Sousa)
(Raquel Franco)
(Álvaro Caneira)