DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros Alexandra Coelho Martins (árbitro presidente), A. Sérgio de Matos e Diogo Feio, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 5 de agosto de 2020, acordam no seguinte:
I. RELATÓRIO
A..., S.A., doravante designada por “Requerente”, pessoa coletiva n.º..., com sede na Rua ..., loja...– ...-... Lisboa, veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral Coletivo e deduzir pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo dos artigos 2.º, 5.º, n.º 3, alínea a) e 10.º, todos do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com as alterações subsequentes.
É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante referida por “AT” ou “Requerida”.
A Requerente pretende a anulação de quatro despachos do Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Lisboa..., datados de 16 e 18 de dezembro de 2019, que indeferiram as quatro Reclamações Graciosas deduzidas contra os atos de liquidação de Imposto do Selo e juros compensatórios emitidos sob os n.ºs ..., ..., ... e ... (notas de cobrança n.ºs 2019..., 2019..., 2019... e 2019...), no valor global de € 75.966,16 (€ 68.616,68 de Imposto do Selo e € 7.349,48 de juros compensatórios), com a consequente anulação destes atos tributários.
Peticiona também a condenação da AT ao pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida, nos termos do disposto no artigo 53.º da Lei Geral Tributária (“LGT”) e do artigo 171.º, n.º 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), caso a mesma venha a ser ordenada pela AT.
Como fundamento das referidas pretensões, a Requerente alega, em síntese, que não tem aplicação ao seu caso a regra do valor tributável contida no artigo 12.º, n.º 5, alínea h) do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (“IMT”), para a qual remete o artigo 9.º, n.º 4 do Código do Imposto do Selo, que determina que se devem considerar compreendidos no valor constante do contrato [cumulativamente] “… quaisquer encargos a que o comprador ficar legal ou contratualmente obrigado”.
Considera a Requerente que, apesar de sobre os imóveis por si adquiridos terem sido constituídas hipotecas e de à data das correspondentes escrituras ainda não ter sido registado o cancelamento das mesmas, todos os encargos relativos às hipotecas se encontravam totalmente liquidados e o respetivo cancelamento autorizado, ou em vias de o ser, pelas entidades bancárias beneficiárias. Assim, argumenta que não ficou obrigada ao pagamento de quaisquer ónus e, por essa razão, não devem ser acrescidos encargos aos preços acordados entre as partes.
A Requerente juntou 23 documentos e não requereu prova testemunhal.
Em 17 de março de 2020, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e seguiu a sua normal tramitação, com a notificação da AT em 25 de março de 2020.
Em conformidade com os artigos 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a) e 11.º, n.º 1, alínea a), todos do RJAT, o Exmo. Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável. As Partes, notificadas dessa designação em 6 de julho de 2020, não manifestaram vontade de a recusar.
O Tribunal Arbitral Coletivo ficou constituído em 5 de agosto de 2020.
Em 20 de setembro de 2020, notificada para o efeito, a Requerida juntou a sua Resposta, na qual apresentou defesa por impugnação. Sustenta que, no momento da compra dos imóveis, os mesmos estavam onerados, pois o cancelamento das hipotecas ocorreu posteriormente, bastando para tal a leitura das escrituras públicas e da certidão de registo predial dos imóveis em questão, bem como dos mútuos constituídos com garantia hipotecária e da própria contabilidade da Requerente.
Para a Requerida, os valores efetivamente suportados pela Requerente para concretizar a compra não foram integralmente declarados, diminuindo de forma artificial o valor tributável para efeitos de Imposto do Selo, com a “convolação” dos encargos em causa em “abate” de dívidas da vendedora, como resulta dos registos contabilísticos da Requerente. Tais encargos fazem parte do preço, devendo ser adicionado o valor em dívida (da responsabilidade do vendedor) que o comprador (a Requerente) assumiu, e terão de integrar o cálculo do valor tributável.
A Requerida conclui pela improcedência do pedido arbitral, com a inerente manutenção na ordem jurídica dos atos contestados.
Por despacho de 23 de setembro de 2020, foram notificadas ambas as Partes da não realização da diligência de inquirição de testemunhas, atendendo a que a matéria de facto relevante para a decisão apenas comporta prova documental respeitante a ónus e encargos sobre bens imóveis.
Por despacho de 15 de outubro de 2020, o Tribunal Arbitral dispensou a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT, por desnecessidade, e determinou a notificação das Partes para apresentação de alegações facultativas e sucessivas, fixando o prazo para prolação da decisão arbitral até à data limite prevista no artigo 21.º, n.º 1 do RJAT. A Requerente foi ainda advertida em relação ao pagamento da taxa arbitral subsequente.
A Requerente produziu alegações finais em 30 de outubro de 2020, mantendo a posição assumida no pedido arbitral.
A Requerida optou por não apresentar alegações.
II. SANEAMENTO
O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria para conhecer dos atos de liquidação Imposto do Selo e juros compensatórios impugnados, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a) e 11.º, n.º 1, todos do RJAT.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (cf. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo de 90 dias previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT, contado a partir da notificação das decisões de indeferimento das Reclamações Graciosas (cf. remissão para o artigo 102.º, n.º 1, alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”)).
A cumulação de pedidos é admissível, atento o disposto no artigo 3.º, n.º 1 do RJAT, uma vez que os atos tributários, apesar de se reportarem a diferentes aquisições de imóveis, respeitam ao mesmo imposto, derivam de idênticas circunstâncias de facto (a incidência de alegados ónus sobre os imóveis) e estão sujeitos aos mesmos princípios e regras de direito, em concreto, o artigo 12.º, n.º 1 e n.º 5, alínea h) do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (“IMT”), conjugado com o artigo 9.º, n.º 4 do Código do Imposto do Selo.
Não foram identificadas questões que obstem ao conhecimento do mérito.
III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
1. MATÉRIA DE FACTO PROVADA
Com relevo para a decisão, importa atender aos seguintes factos que se julgam provados:
A. A A..., S.A., aqui Requerente, é uma sociedade que tem por objeto social, desde a sua constituição, a “construção civil, compra, venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim, arrendamento, importação e exportação”, encontrando-se inscrita, até 31 de dezembro de 2017, com o CAE principal 41200 “Construção de Edifícios (Residenciais e não Residenciais)” – cf. Documento 13 (certidão permanente) junto pela Requerente e Relatório de Inspeção Tributária (“RIT”), junto como Documento 15.
B. A Requerente adquiriu diversos bens imóveis com ónus ou encargos registados – hipotecas e penhora –, nomeadamente os relativos às frações autónomas C, I, J, X, BL, CA e EU do prédio urbano sito na Rua ... (...), inscrito sob o artigo matricial ... da freguesia de ..., em Lisboa – cf. RIT junto pela Requerente como Documento 15.
C. As frações C, I, J e X foram adquiridas à sociedade B..., LDA., adiante também referida por “B...”, por escritura outorgada em 12 de novembro de 2015. As frações BL, CA e EU foram adquiridas à mesma sociedade, por escritura de 28 de abril de 2016 – cf. RIT junto pela Requerente como Documento 15.
D. O BANCO C... (PORTUGAL), de ora em diante “C...”, emitiu uma declaração, datada de 28 de julho de 2015, a:
“AUTORIZAR O CANCELAMENTO da inscrição hipotecária, AP. 1 de 2005/08/03, que incide sobre as frações autónomas designadas pelas letras “C”, “I”, “J” e “X”, do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o n,º..., freguesia de ..., POR JÁ NÃO TER INTERESSE NA SUA SUBSISTÊNCIA, como garantia de empréstimo concedido à sociedade B..., LDA.”.
– cf. Documentos 17 e 19 juntos pela Requerente.
E. Declaração idêntica à anterior foi emitida pelo C..., na mesma data [28 de julho de 2015], em relação à fração “EU” do mesmo prédio – cf. Documentos 17 e 19 juntos pela Requerente.
F. Em 9 de novembro de 2015, o C... emitiu outra declaração nos seguintes termos:
(a) Aceitava receber o montante de € 175.800,00 da sociedade B...;
(b) Esse valor seria destinado à liquidação parcial antecipada das responsabilidades assumidas pela B... perante o C..., emergentes do Contrato de Mútuo com aquela celebrado;
(c) Se a B..., para além de fazer o pagamento de € 175.800,00, viesse a vender a fração “EU” do prédio inscrito sob o artigo matricial ... por um valor igual ou superior a € 448.250,00, e entregasse esse valor ao C... para pagamento parcial da dívida emergente do Contrato de Mútuo, o C... entregaria à B... as autorizações de cancelamento das inscrições hipotecárias relativas às frações autónomas “C”, “X”, “I” e “J” do mesmo artigo;
(d) O montante do capital em dívida por força do Contrato de Mútuo, era de € 5.054.117,00, garantido por hipoteca voluntária que, nessa mesma data (9 de novembro de 2015), passaria apenas a incidir sobre as frações do prédio em causa designadas pelas letras “BT”, “AX”, “CA”, “BL” “C”, “X”, “I”, “J” e “EU”;
(e) Caso os contratos promessa de compra e venda com terceiros celebrados em relação às frações “CA” e “BL” [e outras que não relevam para o caso em análise] fossem cumpridos e celebrada a escritura de venda, o C... entregaria as declarações de autorização para cancelamento das inscrições hipotecárias dessas frações, desde que a B... lhe pagasse valores iguais ou superiores àqueles que se encontram na coluna “Valor a receber pelo cumprimento dos CPCV” do Anexo I àquela declaração
– cf. Documento 18 junto pela Requerente.
G. Assim, em 9 de novembro de 2015, o C... era credor da importância de € 5.054.117,00, da qual era devedora a B..., encontrando-se as referidas frações autónomas C, I, J, X, BL, CA e EU do prédio urbano sob o artigo matricial ... da freguesia de ... [e outras do mesmo prédio urbano] hipotecadas para garantia do pagamento dessa quantia – cf. Documentos 16 e 18 juntos pela Requerente.
H. Quando da celebração da escritura de 12 de novembro de 2015 (frações C, I, J e X do artigo ...), subsistia registada, no Registo Predial, uma inscrição hipotecária sobre essas frações a favor do C..., com valor de capital de € 28.000.000,00 – cf. RIT e certidão permanente do registo predial juntos pela Requerente como Documentos 15 e 16.
I. Quando da celebração da escritura de 28 de abril de 2016 (frações EU, BL e CA do artigo ...), subsistia registada, no Registo Predial, uma inscrição hipotecária sobre essas frações, a favor do C..., com valor de capital de € 28.000.000,00 – cf. RIT e certidão permanente do registo predial juntos pela Requerente como Documentos 15 e 16.
J. Em 27 de julho de 2016, o C... emitiu uma declaração a:
“AUTORIZAR O CANCELAMENTO da inscrição hipotecária, AP. 1 de 2005/08/03, que incide sobre a fração autónoma designada pelas letras “CA”, do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o n.º..., freguesia de ..., POR JÁ NÃO TER INTERESSE NA SUA SUBSISTÊNCIA […]”
– cf. Documento 21 junto pela Requerente.
K. O distrate das hipotecas relativas às frações designadas pelas letras “EU”, “CA” e “BL” teve lugar em 29 de setembro de 2016, em 14 de dezembro de 2016 e em 19 de setembro de 2017, respetivamente. Até 16 de abril de 2019 não tinha sido registado o distrate das hipotecas referentes às frações designadas pelas letras “C”, “I”, “J” e “X” – cf. certidão permanente do registo predial junta pela Requerente como Documento 16.
L. A Requerente foi objeto de um procedimento de inspeção tributária de natureza externa, com início em 11 de abril de 2018, ao abrigo das ordens de serviço n.ºs OI2017..., OI2017... e OI2017..., abrangendo os períodos de tributação de 2014, 2015 e 2016, respetivamente. O âmbito inicial das duas primeiras era geral e o da OI2017... parcial (IRC e IVA). Em 11 de julho de 2018, o âmbito desta última foi alterado para geral – cf. RIT junto pela Requerente como Documento 15.
M. Na sequência da ação inspetiva, foram emitidas as seguintes notas de cobrança, com data limite de pagamento fixada em 4 de março de 2019:
a. 2019... – no valor de € 4.136,26 (€ 3.739,56 de Imposto do Selo e € 396,70 de juros compensatórios);
b. 2019... – no valor de € 32.999,61 (€ 29.834,68 de Imposto do Selo e € 3.164,93 de juros compensatórios);
c. 2019... – no valor de € 32.731,75 (€ 29.592,51 de Imposto do Selo e € 3.139,24 de juros compensatórios);
d. 2019... – no valor de € 6.098,55 (€ 5.449,93 de Imposto do Selo e € 648,61 de juros compensatórios);
– cf. notas de cobrança juntas pela Requerente como Documentos 9, 10, 11 e 12.
N. Como fundamento para as liquidações de Imposto do Selo e juros compensatórios ora identificadas (no ponto anterior), retiram-se do Relatório de Inspeção Tributária os seguintes excertos relevantes – cf. RIT junto pela Requerente como Documento 15:
“II.3.5. Análise Contabilística e Fiscal (Análise das Demonstrações Financeiras)
Atendendo à patente no quadro infra, ao nível da Demonstração de Resultados destacam-se as rubricas e os valores a seguir mencionados:
[…]
4. O elevado valor inscrito na rubrica de outros gastos e perdas do ano 2016, de € 2.922.617,31 encontra-se distribuído pelas principais contas:
a) #68781 – «Expurgos de hipotecas» no montante de € 1.415.434,11, respeitante ao distrate de várias frações autónomas;
[…]
III DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL
[…]
III. 2. Exercício de 2015
[…]
III.2.2 Em sede de IS – Verba 1.1 – artigo ...
[…]
Por escritura notarial celebrada em 12/11/2015 a sociedade B... Lda NIPC ... (doravante designada por B...), vendeu à A... as frações autónomas designadas pelas letras «C», «I», «J», «X», «BE» e «CO» que fazem parte integrante do prédio urbano sito na Rua ... (...) NºS/N Lisboa, inscrito na matriz predial da freguesia de ..., sob o artigo..., vide anexo XIX.
É referido na escritura que as seis (6) frações, adquiridas pela A..., se destinam a revenda.
De igual forma, consta na referida escritura, que as frações «C», «I», «J» e «X» foram transmitidas com ónus ou encargos, uma vez que sobre as mesmas incide uma hipoteca registada a favor do Banco C... (Portugal) S.A. (doravante C...).
Na notificação efetuada ao sujeito passivo em 11/07/2018, para prestar informações e esclarecimentos adicionais acerca da hipoteca voluntária a favor do C..., que incide sobre o artigo urbano n.º..., inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ..., em resposta o mesmo apresentou como documento justificativo uma declaração do C... datada de 09/11/2015. Adicionalmente juntou escritura pública de aditamento à escritura pública de mútuo com hipoteca de 03/08/2005, celebrado entre a B... e o C..., conforme anexo XX.
Nestas circunstâncias urge examinar a referida declaração, elencando para tal os pontos mais relevantes do ponto de vista obrigacional com relevância fiscal nos factos tributários praticados pela sociedade A...:
a) A declaração emitida pelo C..., enquanto entidade mutuária e entidade mutuante B... Lda, reconhece que, à data de 09/11/2015, o capital em dívida por força da outorga do contrato de mútuo celebrado entre as partes é de € 5.054.117,00;
b) Do clausulado da referida declaração sobressai que, se a B... liquidar o montante de € 175.800,00 e proceder à venda da fração «EU» por um valor igual ou superior a € 448.250,00 e a subsequente entrega do valor recebido como forma de antecipação parcial da dívida, o C... entregará à B... as autorizações de cancelamento das inscrições hipotecárias das frações autónomas designadas pelas letras «C», «I», «J» e «X» que fazem parte integrante do artigo matricial n.º... .
c) No anexo 1 que faz parte integrante da declaração, o C..., assume como valor em dívida associada a cada fração autónoma:
• «X» - €352.146,00;
• «C» - €167.767,00;
• «I» - €96.911,00;
• «J» - €64.417,00.
Do acima destacado, assume particular relevo:
a) A A... não se encontra contratualmente (sublinhado nosso) ligada ao contrato de mútuo celebrado entre a B... e o C...;
b) A fração autónoma designada pela letra «EU», adquirida à B... pela A... somente em 28/04/2016 pelo valor de €234.100,00, foi revendida em 29/09/2016 pelo montante de €540.000,00.
Assim, tendo presente a factualidade descrita e no que diz respeito à aquisição das frações «C», «I», «J» e «X», é factual que as mesmas foram adquiridas com ónus ou encargos para a entidade adquirente, A... .
Contudo, aquando da liquidação de IMT, respeitante à aquisição das frações adquiridas pela outorga da escritura de 12/11/2015, não foi mencionada a existência de ónus ou encargos (vide no anexo XXI, a declaração Modelo 1 de IMT a que coube o n.º de registo ...), ainda que o C... tenha definido o montante do valor associado a cada fração objeto de transação na declaração por si emitida em 09/11/2015.
Por outro lado, da consulta à descrição predial sob o n.º ... da freguesia de ..., datada de 09/08/2018, respeitante ao artigo matricial urbano da freguesia ... inscrito na matriz sob o n.º..., verifica-se que relativamente às frações autónomas designadas pelas letras «C», «I», «J» e «X», não se encontra averbado qualquer cancelamento parcial respeitante à Hipoteca Voluntária, de que é credor hipotecário o C..., conforme anexo XXVII.
Pese embora esse facto, é também do conhecimento da Autoridade Tributária que a fração «EU» foi vendida em 29/09/2016 por valor superior ao estipulado pelo C..., pelo que à priori encontram-se reunidas as condições exigidas pela entidade bancária para os cancelamentos parciais das referidas frações.
Resultando daqui que as frações, na data da sua transmissão, se encontravam oneradas pelos montantes acima elencados, e que esses ónus não foram tidos em consideração na liquidação de IMT e do IS liquidado conjuntamente com o IMT.
Nesses termos, vejamos os efeitos dessa omissão na base tributável que esteve na origem da liquidação do IMT e do IS – Verba 1.1.
Quanto aos efeitos nas bases tributáveis de IMT, e levando em consideração o valor de ónus ou encargos resultante da hipoteca voluntária, cumulativamente ao valor declarado ser superior, no ano de 2015 não haverá lugar a qualquer pagamento adicional, uma vez que as frações autónomas adquiridas se destinavam a revenda, continuando o sujeito passivo A... a usufruir do benefício consagrado no artigo 7.º do CIMT.
Ao invés, em sede de IS – Verba 1.1, e para cumprimento legal da alínea h) do n.º 5 e n.º 1 do artigo 12.º do CIMT conjugado com o n.º 4 do artigo 9.º do CIS, haverá lugar à liquidação adicional, resultante da cumulação do valor dos ónus ou encargos a que a A... ficou legalmente obrigada, com o valor do acto ou contrato declarado inicialmente.
Considerando o atrás aduzido, sobressai um valor em falta a título de IS – Verba 1.1 de €5.449,93 […]
III. 3. Exercício de 2016
[…]
III.3.2 Em sede de IS – Verba 1.1 – ónus e encargos
Na continuação da sua atividade comercial, a A... adquiriu à B..., através da escritura notarial exarada em 28/04/2016, as seguintes frações autónomas, conforme anexo XXV:
1. Designadas pelas letras «AX», «BL», «CA» e «EU», que fazem parte integrante do artigo matricial urbano inscrito na matriz da freguesia ... sob o artigo ...;
2. Designada pela letra «B», que faz parte integrante do artigo matricial urbano inscrito na matriz da freguesia da União de Freguesia ... e ..., sob o artigo ...;
3. Designada pela letra «C», que faz parte integrante do artigo matricial urbano inscrito na matriz da freguesia da União de Freguesia de ... e ..., sob o artigo ...;
4. Designadas pelas letras «J», «L» e «M», que fazem parte integrante do artigo matricial urbano inscrito na matriz da freguesia da União de Freguesia de ... e ..., sob o artigo ... (pese embora por lapso na escritura notarial tenha sido mencionado o artigo matricial ...)
Naquela escritura é também dito que as referidas frações se destinam a revenda e as frações designadas pelas letras «BL», «CA» e «EU» foram transmitidas com ónus ou encargos. No entanto, aquando da liquidação do IMT e do IS Verba 1.1 respeitante à aquisição daquelas frações não foi feita qualquer menção à existência de quaisquer ónus ou encargos, conforme declaração modelo 1 de IMT a que couberam os n.ºs ... (liquidação de IMT das frações «AX» e «BL»), ... (liquidação de IMT da fração «CA») e ... (liquidação de IMT da fração «EU»), conforme anexo XXVI.
Sendo a temática dos ónus ou encargos recorrente, importa nesta altura trazer à colação o artigo 696.º do CC, que consagra o princípio da indivisibilidade da hipoteca.
A hipoteca constituída sobre a totalidade de um prédio para garantia de crédito exequendo, estende-se a todas as frações autónomas que o compões, pelo que cada uma das frações garante também a totalidade daquele crédito, podendo ainda, de igual forma, o credor hipotecário executar a hipoteca, na sua totalidade, sobre qualquer uma das frações.
Retornando ao negócio jurídico objeto da referida escritura, sabe-se que o C... emitiu declaração em 09/11/2015, onde fez constar o valor em dívida associado a algumas das frações que fazem parte integrante do artigo matricial ... da freguesia ..., sobre as quais detinha a seu favor o registo de hipoteca voluntária. Além de ter feito constar o valor em dívida à data de 09/11/2015, na declaração que reduziu a escrito, individualizou o montante em dívida associado à fração «CA» no valor de € 467.445,00, sendo que o valor em dívida do contrato de mútuo celebrado entre a B... e o C..., ascendia ao montante de €5.054.117,00.
Não sendo possível individualizar o valor em dívida associado a cada uma das frações, por aplicação do princípio da indivisibilidade ínsito no artigo 696.º CC, se ao valor total em dívida expurgarmos o valor associado a cada uma das frações conforme indicado na declaração emitida pelo C... em 09/11/2015, apuramos um valor de € 3.699.064,00, para as restantes frações objeto de hipoteca a favor do C... […]
Em face de tudo o acima exposto, e seguindo o itinerário cognoscitivo, já dissecado no ponto III.2.2 do presente relatório, por força da aplicação da alínea h) do n.º 5 e n.º 1 do artigo 12.º do CIMT conjugado com o n.º 4 do artigo 9.º do CIS, haverá lugar à liquidação adicional de Imposto de Selo, resultante da cumulação do valor dos ónus ou encargos a que a A... ficou legalmente obrigada, com o valor do acto ou contrato declarado inicialmente.
Não descurando que sobre a fração designada pela letra «EU» se encontrava registada a penhora a favor da D... no montante de €30.271,48, pelo que o mesmo será acrescido ao valor em dívida associado às restantes frações de €3.699.064,00 da hipoteca voluntária registada a favor do C..., tudo conforme mapa que segue:
Quadro n.º 20 – Imposto de Selo Verba 1.1 – artigo ...
Artigo/
fração autónoma Freguesia Data de compra […] […] Ónus registados na Conservatória do Registo predial Valor de correção de ónus
[…] […] Taxa IS
[…] […] Colecta em falta
[…] […] […] […] […] […] […]
...-EU ... 28-04-2016 […] […] Hipoteca Voluntária-credor hipotecário C...
3.963435,48 […]
0,80% […]
29.834,68
...-CA ... 28-04-2016 […] […] Voluntária-credor hipotecário C...
836.645,00 […]
0,80% […]
3.739,56
...-BL ... 28-04-2016 […] […] Voluntária-credor hipotecário C...
3.845.294,00 […]
0,80% […]
29.592,51
TOTAL […] […] 7.895.844,48 […] […] 63.166,76
[…]
VIII OUTROS ELEMENTOS RELEVANTES
Sobre o valor dos impostos em falta, conforme correções que anteriormente se sustentaram em termos de enunciação e quantificação, que para o efeito se expuseram no presente relatório, serão calculados nos termos do art.º 35.º da LGT os correspondentes juros compensatórios, em conformidade com o disposto no art.º 33.º do CIMT, art.º 40.º do CIS e art.º 102.º do CIRC.
IX DIREITO DE AUDIÇÃO
Nos termos do artigo 60.º da LGT e do artigo 60.º do RCPITA, o sujeito passivo foi notificado, para o domicílio fiscal constante do sistema informático da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), para exercer, no prazo de quinze dias, o direito de audição sobre o projeto de correções do relatório da inspeção Tributária, através de carta registada, nosso ofício n.º... de 23/11/2018 a coberto do registo postal n.º RH ... PT, cuja entrega ocorreu no dia 26/11/2018.
Apesar de validamente notificado, o sujeito passivo não exerceu até à presente data o direito de audição, precludindo deste modo o seu direito.
[…]
Lisboa, 20 de dezembro de 2018”
O. Inconformada com os mencionados atos tributários de liquidação de Imposto do Selo e juros compensatórios, a Requerente apresentou quatro Reclamações Graciosas, em 7 de junho de 2019, dando origem aos procedimentos de Reclamação autuados sob os n.ºs ...2019..., ...2019..., ...2019..., ...2019... – cf. Documentos 1 a 4 juntos pela Requerente e provado por acordo.
P. As Reclamações Graciosas foram indeferidas por despachos do Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Lisboa..., ao abrigo de delegação de competências, datados de 13 de dezembro de 2019 (os dois primeiros) e de 16 de dezembro de 2019 (os dois últimos), tendo sido notificados à Requerente através da Via CTT, em 16 e 18 de dezembro de 2019 – cf. Documentos 1 a 4 juntos pela Requerente e provado por acordo.
Q. A Requerente foi citada da instauração dos processos de execução fiscal n.ºs ...2019... e ...2019..., cujas dívidas exequendas respeitam a duas das liquidações impugnadas – cf. Documentos 22 e 23 juntos pela Requerente.
R. Em discordância das liquidações de Imposto do Selo e juros compensatórios supra identificadas e dos despachos de indeferimento das Reclamações Graciosas que as tiveram por objeto, a Requerente apresentou no CAAD, em 16 de março de 2020, o requerimento de constituição do Tribunal Arbitral que deu origem ao presente processo – cf. registo de entrada do pedido de pronúncia arbitral (“ppa”) no SGP do CAAD.
2. MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO E FACTOS NÃO PROVADOS
Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT, não tendo o Tribunal de se pronunciar sobre todas as alegações das Partes.
Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja validade terá de ser aferida em relação à concreta matéria de facto consolidada.
No que se refere aos factos provados, a convicção dos árbitros fundou-se nas posições assumidas por ambas as Partes em relação aos factos essenciais e na análise crítica da prova documental junta aos autos, que está referenciada em relação a cada facto julgado assente.
Com relevo para a decisão, não se provou o alegado nos artigos 34.º, 36.º, 39.º, 40.º e 42.º do pedido de pronúncia arbitral (“ppa”), designadamente que, à data das escrituras de compra e venda dos imóveis (12 de novembro de 2015 e 28 de abril de 2016):
As hipotecas sobre as frações autónomas em questão já estavam canceladas – provando-se, quanto a este ponto, o contrário, pois encontravam-se validamente registadas, conforme certidão da Conservatória do Registo Predial de Lisboa; e
Não existiam quaisquer ónus ou encargos sobre as frações em causa, nem qualquer dívida à instituição bancária.
Com efeito, as declarações emitidas pelo Banco credor [C...] não suportam o que a Requerente deles extrai.
Desde logo, porque o alegado pagamento parcial referido na declaração de 9 de novembro de 2015 do C... (Documento 18), de € 175.800,00 (artigo 43.º do ppa), tendo em conta a dívida global superior a 5 milhões de euros, dos quais € 681.241,00 imputáveis às frações autónomas “C”, “I”, “J” e “X” (de acordo com o anexo 1 àquela declaração, apud RIT ), é ilustrativo da insuficiência do argumento.
Por outro lado, o C... nem sequer declarou no documento em causa (Documento 18) ter recebido esse valor, mas tão só que o “aceita receber” e que o valor “será pago”. Não pode, assim, ser tido como comprovativo da extinção das dívidas (de € 681.241,00 inerentes à hipoteca das frações em questão), nem sequer como comprovativo do pagamento de € 175.800,00, que aí está apenas anunciado e não concretizado.
Por outro lado, as declarações do C... contêm contradições relevantes que o Tribunal não pode deixar de valorar.
Em relação às frações autónomas “C”, “I”, “J” e “X”, o C... emitiu em 28 de julho de 2015 uma Declaração a autorizar o cancelamento da inscrição hipotecária que incide sobre essas frações, por já não ter interesse na sua subsistência (Documento 17).
Porém, paradoxalmente, cerca de 3 meses depois, em 9 de novembro de 2015, o C... emite outra declaração (Documento 18) em que se compromete a entregar autorizações de cancelamento das inscrições hipotecárias quanto a essas mesmas frações, na condição de serem cumpridos determinados requisitos futuros. Ora, um primeiro ponto a notar é que esta última declaração parte do pressuposto de que ainda existiam encargos a saldar e de que não era efetiva a anterior autorização de cancelamento dessas inscrições, pois seria desprovido de qualquer sentido o C... comprometer-se a emitir as declarações, se elas já tivessem sido emitidas.
Acresce que a condição para que essas autorizações fossem futuramente emitidas era a de ser vendida a fração “EU” por, pelo menos, € 448.250,00 e que esse valor fosse entregue ao C... para amortização parcial da dívida.
A venda dessa fração “EU” (à qual estava condicionada a emissão das autorizações de cancelamento das hipotecas sobre as frações “C”, “I”, “J” e “X”) apenas veio a ocorrer em 28 de abril de 2016, vários meses depois da transmissão das frações “C”, “I”, “J” e “X” , e por um valor inferior (de € 234.100,00) ao da condição estabelecida pelo C... para autorizar o distrate das hipotecas, pelo que não se reuniram as condições para esse efeito.
Quanto às frações adquiridas na escritura celebrada em 28 de abril de 2016:
a) Para a fração “BL”, a Requerente não juntou qualquer meio de prova;
b) No caso da fração “CA”, a respetiva declaração de autorização de cancelamento da hipoteca data de 27 de julho de 2016, posterior, portanto, à data da escritura e superveniente ao facto tributário;
c) A fração “EU” tem uma autorização de cancelamento de hipoteca datada de 28 de julho de 2015, que enferma de inconsistências similares às apontadas a respeito das frações “C”, “I”, “J” e “X”, cuja declaração tem também essa data.
Por fim, não se provou que foi prestada garantia bancária pela Requerente no âmbito dos processos executivos instaurados.
Não foram identificados outros factos que devam considerar-se não provados.
IV. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
1. QUESTÃO A DECIDIR
A questão a apreciar nesta ação é de facto e respeita à aferição da (in)existência de ónus ou encargos sobre as frações autónomas supra identificadas, no momento da sua aquisição pela Requerente à sociedade B..., por forma a concluir pelo preenchimento (ou não) dos pressupostos de aplicação da alínea h) do n.º 5 do artigo 12.º do Código do IMT, aplicável por remissão do artigo 9.º, n.º 4 do Código do Imposto do Selo.
2. INCIDÊNCIA DE IMPOSTO DO SELO SOBRE ÓNUS OU ENCARGOS ASSOCIADOS À AQUISIÇÃO DE IMÓVEIS
Está em causa a aquisição, a título oneroso, pela Requerente, de diversas frações autónomas de um prédio urbano, operação que se encontra sujeita a Imposto do Selo, de acordo com a aplicação conjugada do artigo 1.º, n.º 1 do Código deste imposto e da verba 1.1 da respetiva Tabela Geral .
Neste âmbito, o artigo 9.º, n.º 4 do Código do Imposto do Selo determina que são aplicáveis à tributação dos negócios jurídicos sobre bens imóveis, prevista na tabela geral, “as regras de determinação da matéria tributável do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis”.
Matéria sobre que rege o artigo 12.º do Código do IMT. Para além da enunciação da regra geral contida no seu n.º 1, segundo a qual o imposto incidirá “sobre o valor constante do ato ou do contrato ou sobre o valor patrimonial tributário dos imóveis, consoante o que for maior”, especifica ainda o n.º 5 do citado preceito, que se considera, designadamente, valor constante do ato ou do contrato, isolada ou cumulativamente, a importância em dinheiro paga a título de preço pelo adquirente - alínea a) - e, em geral, quaisquer encargos a que o comprador ficar legal ou contratualmente obrigado - alínea h). É em relação a esta alínea h) que surge o dissídio.
Como assinalam J. SILVÉRIO MATEUS e L. CORVELO DE FREITAS, integram o referido conceito [de valor do ato ou contrato] eventuais encargos hipotecários que incidem sobre os prédios transmitidos e que, conjuntamente com este, se transmitem ao adquirente – cf. “Os Impostos sobre o Património Imobiliário, O Imposto do Selo, Anotados e Comentados”, Engifisco, 2005, p. 428.
A Requerente alega que, apesar de à data da escritura estarem registadas hipotecas, todas as dívidas respeitantes às mesmas se encontravam liquidadas e tinha sido autorizado o respetivo cancelamento pela instituição de crédito credora, pelo que não existiam encargos passíveis de subsunção à mencionada norma (alínea h)).
No entanto, a Requerente não conseguiu demonstrar o que alega.
Pelas razões enunciadas na fundamentação de facto, não ficou provado que os valores em dívida ao Banco credor estivessem integralmente pagos nas datas em que foram outorgadas as escrituras de compra e venda das frações autónomas em causa, evidenciando-se, aliás, o contrário. No momento da transmissão dos imóveis, não só se mantinham valores substanciais em dívida, como o compromisso assumido pelo Banco [C...] de cancelar as hipotecas correspondentes estava dependente do cumprimento de um conjunto de condições, que respeitavam precisamente à realização de pagamentos consideráveis, cuja prova não foi feita, e à transmissão de uma fração, que só veio a ocorrer mais tarde, sendo superveniente aos factos tributários.
Constata-se, em sintonia com a demais factualidade apurada, que o primeiro distrate de hipoteca relativo às frações em questão ocorreu cerca de 5 meses após a aquisição (em 29 de setembro de 2016 – fração “EU”), o segundo distrate quase 8 meses (em 14 de dezembro de 2016 – fração “CA”) e o terceiro distrate aproximadamente 1 ano e 5 meses depois da escritura (em 19 de setembro de 2017 – fração “BL”).
A certidão predial junta pela Requerente, de 16 de abril de 2019, revela ainda que a essa data, mais de 3 anos após a escritura de 12 de novembro de 2015, ainda não tinham sido canceladas as inscrições hipotecárias referentes às frações “C”, “I”, “J” e “X”.
Por fim, convém salientar que, a acrescer às hipotecas, incidia ainda sobre a fração “EU” uma penhora de € 30.271,48, que foi considerada pela AT na determinação do valor tributável, para efeitos de Imposto do Selo, em relação à qual a Requerente não invoca qualquer fundamento que sustente a pretensão anulatória.
Em síntese, à data da aquisição dos imóveis objeto dos atos tributários controvertidos, estes estavam onerados com hipotecas devidamente registadas, para pagamento de quantias em dívida ao abrigo de Contrato de Mútuo celebrado entre a sociedade alienante [B...] e o Banco credor [C...].
A constituição [nascimento] da obrigação tributária referente ao Imposto do Selo devido no âmbito das transações vertentes reporta-se ao momento da celebração das escrituras de compra e venda dos imóveis, atento o disposto no artigo 5.º, n.º 1, alínea a) do Código do Imposto do Selo. E nas correspondentes datas impendiam sobre a Requerente as obrigações prestativas inerentes, não tendo resultado do adquirido processual quaisquer factos que infirmem a existência e validade dessas obrigações ou traduzam o cancelamento das hipotecas e a extinção das dívidas por estas garantidas.
Nestes termos, improcede a pretensão da Requerente, por não provada, não se julgando verificado o invocado vício material, de erro nos pressupostos, em relação aos atos de liquidação de Imposto do Selo e de juros compensatórios controvertidos.
3. INDEMNIZAÇÃO POR PRESTAÇÃO DE GARANTIA INDEVIDA
A obrigação de indemnização por prestação de garantia indevida depende do ganho de causa da Requerente, conforme dispõe o artigo 53.º, n.º 1 da LGT, o que não se verificou na situação em análise, pelo que também improcede este pedido, que, em qualquer caso, sempre estaria sujeito à demonstração da prova da efetiva prestação de uma garantia, que a Requerente também não produziu.
* * *
Por fim, importa referir que foram conhecidas e apreciadas as questões relevantes submetidas à apreciação deste Tribunal, não o tendo sido aquelas cuja decisão ficou prejudicada pela solução dada a outras, ou cuja apreciação seria inútil – cf. artigo 608.º do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
V. DECISÃO
De harmonia com o supra exposto, acordam os árbitros deste Tribunal Arbitral em julgar totalmente improcedente o pedido arbitral, com as legais consequências.
VI. VALOR DO PROCESSO
Fixa-se o valor do processo em € 75.966,17 correspondente ao valor das liquidações de Imposto do Selo e juros compensatórios que constituem o objeto da presente ação arbitral – cf. artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT, aplicável por remissão do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”).
VII. CUSTAS
Custas no montante de € 2.448,00, a cargo da Requerente, em razão do decaimento, de acordo com a Tabela I anexa ao RCPAT e com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4 do RJAT, 4.º, n.º 5 do RCPAT e 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
Notifique-se.
Lisboa, 4 de dezembro de 2020
Os Árbitros,
Alexandra Coelho Martins
A. Sérgio de Matos
Diogo Feio