Decisão Arbitral (consultar versão completa no PDF)
Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Prof. Doutor Francisco Nicolau Domingos e Dra. Marisa Isabel Almeida Araújo (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 14-10-2020, acordam no seguinte:
1. Relatório
A..., LDA. - EM LIQUIDAÇÃO, NIPC..., [anteriormente sediada na Rua ..., n.º..., ..., fração “D”, ...] aqui representada pelo Administrador de Insolvência, com domicílio na Av. ..., n.º..., ...-... Porto (doravante designada apenas por “Requerente”), veio, ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), apresentar pedido de pronúncia arbitral tendo em vista a apreciação da legalidade dos atos tributários de liquidação do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) e Imposto do Selo (IS) , e respetivos juros compensatórios, no montante global de €272.496,16, promovidos pela Direção de Finanças do Porto - Serviço de Finanças da ..., com referência ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo U-..., da freguesia ..., concelho da Maia.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante também identificada por “AT” ou simplesmente “Administração Tributária”).
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 22-07-2020.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 11-09-2020, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados das alíneas a) e) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 14-10-2020.
A AT apresentou resposta, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.
Por despacho de 13-11-2020, foi decidido dispensar a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e alegações.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado na alínea e) do n.º 1 do artigo 2.º, e do n.º 1 do artigo 10.º, ambos do RJAT e é competente.
As partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigo 4.º e n.º 2 do artigo 10.º, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão:
A) Em Junho de 2013, a sociedade “A..., LDA.”, doravante designada, apenas, “A...”, apresentou-se a Processo Especial de Revitalização (PER), que correu termos sob o processo n.º .../ 13...TYVNG, no 3.º Juízo do Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia (documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido):
B) No âmbito do referido PER, foi pela “A...” elaborado plano de revitalização, no âmbito do qual a mesma consignou que o respetivo património imobiliário, no final de 2011, tinha sido avaliado em € 7.247.000,00 (documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
C) À data em que foi apresentado o plano de revitalização, os imóveis que integravam o património da “A...” correspondiam aos seguintes:
a) prédio urbano (terreno para construção) sito na Rua..., ...-... Maia – inscrito na matriz predial urbana sob o art.º ... na freguesia de ..., Maia;
b) prédio urbano (edifício...) sito na Rua ..., ...-... Maia - inscrito na matriz predial urbana sob o art.º ... na freguesia de ..., Maia (documento n.º 4);
D) No dia 13-06-2014, foi requerida, por terceiro, a insolvência da sociedade “A...”, que veio a ser decretada por sentença, em 04-02-2015 (documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
E) Em 18-07-2014, já depois de instaurado o processo de insolvência - a “A...” celebrou, na qualidade de vendedora, com a sociedade “B..., S.A. ”, doravante designada, apenas, “B...”, na qualidade de compradora, um contrato de compra e venda a retro, que teve por objecto o prédio urbano com o artigo matricial U-..., subjacente às liquidações de IMT e IS, aqui em mérito, sendo fixado um preço de € 1.000.000,00, que na escritura foi declarado já ter sido recebido pela vendedora (documentos n.ºs 7 a 9 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
F) Foi no prédio referido na alínea anterior que os trabalhadores da A... sempre exerceram as suas funções laborais até à data em que foi deliberado o encerramento do estabelecimento da “A...”, em 14-04-2015 (documento n.º 10 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido que aqui se junta).
G) Em 23-07-2015, a massa insolvente da A..., representada pelo Administrador da Insolvência, instaurou acção de resolução em benefício da massa insolvente, no Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Juízo de Comércio de Aveiro, J3, que correu termos por apenso ao processo de insolvência, sob o n.º de processo .../14...TYVNG (documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
H) Em 23-01-2020, foi homologada transacção por sentença proferida naquela acção (documento n.º 12 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
I) A transacção referida foi efectuada nos termos que constam do documento n.º 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:
1. Pela presente transacção, as Rés aceitam, expressa e irrevogavelmente, com os efeitos previstos no n.º 1 do art.º 126.º do CIRE, a licitude e eficácia da resolução em benefício da Massa Insolvente, Autora, do contrato de compra e venda celebrado em 18 de Julho de 2014 entre a 1.ª Ré como compradora e a 2.ª Ré na qualidade de vendedora e que teve por objecto o prédio urbano destinado a indústria, constituído por 4 naves, serviços administrativos e apoio, oficinas, casa de guarda e portaria, e alpendre, descrito na Conservatória do Registo Predial da Maia sob o número... da freguesia de ..., e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ... da mencionada freguesia, sendo como consequência anulada a Ap. 27^8 de 2014/07/18 que incide no registo predial acima identificado (doc. l em anexo) restituindo-se a propriedade à sociedade 2.ª Ré A..., Lda, integrando mesmo o Auto de Apreensão de Bens do processo de insolvência desta 2.ª Ré do qual presente acção constitui apenso.
2. As partes dão igualmente por integral e irrevogavelmente resolvido, com os efeitos previstos no n.º 1 do art." 126.º do CIRE, o contrato de arrendamento celebrado em 18 de Julho de 2014 entre as duas Rés e que teve por objecto o mesmo imóvel identificado na cláusula precedente, declarando, seja a que título for, nada ter a haver uma da outra, nem da Aurora no que ao mesmo diz respeito.
3. A 1.ª Ré desiste integral e irrevogavelmente da contestação/reconvenção apresentada e especificamente do pedido reconvencional formulado reconhecendo que o preço constante da escritura de compra e venda acima referida, outorgada em 18 de Julho de 2014, não foi por si pago.
4. A 2.ª Ré desiste integral e irrevogavelmente da contestação deduzida nos presentes autos.
5. Como contrapartida pela celebração da presente transacção, no prazo de quinze dias após o Senhor Administrador de Insolvência nomeado à 2.ª Ré ter concretizado a venda do imóvel identificado na primeira cláusula, no âmbito dos actos de liquidação do processo de insolvência, será pela Autora entregue à 1.ª Ré a quantia de € 360.000,00 (trezentos e sessenta mil euros) por transferência bancária para a conta com o IBAN ... da qual a 1.ª Ré é titular no Banco C..., devendo o respetivo comprovativo ser enviado para o endereço de e-mail do mandatário da 1.ª Ré (...)
6. O pagamento da quantia constante do ponto anterior fica condicionado à circunstância da Autora conseguir registar na Conservatória do Registo Predial o cancelamento do registo de aquisição do imóvel acima identificado a favor da 1.ª Ré (Ap.2758 de 2014/07/18) bem como todos os ónus e encargos registados com data posterior àquela sobre o imóvel, nomeadamente os respeitantes às Ap. 2548 de 2015/01/15, Ap. 47 de 2016/01/13 c Ap. 16 de 2018/05/07, conforme doc. 1 em anexo, e ainda o averbamento da titularidade do imóvel junto cia Autoridade Tributária e Aduaneira em nome da 2.ª Ré.
7. Com a celebração da presente transacção, as Rés reconhecem expressa, formal e irrevogavelmente, para todos os efeitos legais, nada terem a receber ou a exigir da Autora por referência à ação judicial sub judice ou seja a que título for, independentemente da qualidade em que as mesmas atuem no presente, ou tenham atuado no passado, a título de responsabilidade civil contratual ou extracontratual.
8. As Partes declaram ter perfeita consciência da amplitude, efeitos e consequências do disposto no presente acordo, reconhecendo, designadamente, saber tratar-se de uma cláusula de remissão abdicativa, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 863.º do Código Civil, à luz da qual extinguem qualquer obrigação que qualquer uma das Partes possa ter, à presente data, relativamente a qualquer uma da outra Parte.
9. As Rés declaram aceitar a remissão abdicativa da Aurora constante do presente acordo.
10. A Autora declara aceitar a remissão abdicativa das Rés constante da presente transacção.
11. A presente transacção foi previamente autorizada pela Comissão de Credores nos termos do n.º 8 do art.º 55.º do CIRE.
12. Eventuais custas que ainda forem devidas em juízo deverão ser pagas pela 1.ª Ré, renunciando todas as partes processuais a reclamar custas de parte.
13. As Partes renunciam ao prazo e ao direito de recurso da decisão que homologar a presente transação, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 632.º do Código de Processo Civil.
J) A sociedade “A...” nunca chegou a receber o preço de € 1.000.000,00 estipulado na escritura de 18-07-2014 (cláusula 3.ª da transacção);
K) Não se verificou a tradição do imóvel, sendo que este ficou sempre na posse da “A...” (artigo 17.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado pela Administração Tributária);
L) Foi enviado à Requerente, na pessoa do administrador judicial da insolvência, o ofício nº 2020... de 15-04-2020, do SF da Maia, que consta da parte I do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, que foi recebido em 22-04-2020, com notificação para querendo exercer, no prazo de 15 dias, o direito de audição prévia, nos termos do art. 60.ºda LGT, quanto ao projecto de decisão da liquidação de IMT e IS, decorrente da sentença homologatória da transação no Proc.º .../14.4..TYVNG-D, sendo no mesmo ofício é identificado o sujeito passivo, o prédio, a fundamentação de facto e de direito do projecto de decisão.
M) As guias/notas de cobrança referidas são os documentos que constam dos documentos n.ºs 2 e 3 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos, datados de 16-06-2020, referentes a Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) n.º ... e de Imposto do Selo (IS) n.º..., considerando como facto tributário a «aquisição do direito de propriedade plena sobre imóveis»;
N) No documento n.º... refere-se, além do mais, o seguinte:
O) Na «Descrição» que consta do documento n.º ... refere-se o seguinte:
Assunto: A resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, do contrato de compra e venda ou troca de bens imóveis e as do respetivo contrato-promessa, quando, neste último caso, ocorrerem depois de passados 10 anos sobre a tradição ou posse nos termos do artigo 2.º n.º5 alínea a) DO CÓDIGO DO IMT
O Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT) dispõe o seguinte:
Alínea a) n. º5 do art.º 2.º - A resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, do contrato de compra e venda ou troca de bens imóveis e as do respetivo contrato-promessa, quando, neste último caso, ocorrerem depois de passados 10 anos sobre a tradição ou posse
N. º1 art.º 12o- O IMT incidirá sobre o valor constante do ato ou do contrato ou sobre o valor patrimonial tributário dos imóveis, consoante o que for maior
Art.º 17.º -1 As taxas do IMT são as seguintes:
b) Aquisição de prédio urbano ou de fracção autónoma de prédio urbano destinado exclusivamente a habitação, não abrangida pela alínea anterior:
De mais de € 92.407,00 até € 126.403,00- 2% Parcela abater € 924,07
c) Aquisição de prédios rústicos 5%
d) Aquisição de outros prédios urbanos e outras aquisições onerosas 6,5%
N.º 1 do art.º º18.º - O imposto será liquidado pelas taxas em vigor ao tempo da ocorrência do facto tributário...
N. º1 do art.º 35.D - só pode ser liquidado imposto nos oito anos seguintes a transmissão ou à data em que a isenção ficou sem efeito, sem prejuízo do disposto no número seguinte e, quanto ao restante, no art.º 46.º da Lei Geral Tributária (LGT).
N.º 3 do art.º 36.º-Se os bens se transmitirem por arrematação e venda judicial ou administrativa, adjudicação, transação e conciliação, o imposto será pago dentro de 30 dias contados da assinatura do respetivo auto ou da sentença que homologar a transação.
A resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, do contrato de compra e venda ou troca de bens imóveis, determina a sujeição ao IMT, prevista na alínea a) do n.º 5 do art.º 2.º do CIMT, aplicada à transação em julgado 2020-02-03.
Assim, fica notificado para, querendo, exercer o direito de audição previsto na alínea c) do n.º 1 do art.º 60.º da Lei Geral Tributária, no prazo de 15 (quinze) dias, relativamente ao projecto de decisão e fundamentação seguintes: 1 - O IMT incidirá sobre o valor constante do ato ou do contrato ou sobre o valor patrimonial tributário dos imóveis, consoante o que for maior
Projeto de decisão: liquidação de IMT/IS, (Processo n.º.../14... TYVNG-D)
Facto Tributário: aquisição do direito de propriedade plena sobre imóveis- liquidação por resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, do contrato de compra e venda ou troca de bens imóveis, prevista na alínea a) do N.º5 art.º 2.º do CIMT
Prédio Urbano:
Matéria Coletável: € 3.691.959,56
Taxa: 6,5 %
IMT a pagar: € 239.977,37
Juros Compensatórios:
São devidos juros Compensatórios nos termos do art.º 35.º da Lei Geral Tributária (LGT) e art.º 33.º do CIMT, calculados sobre a importância de € 239.977,37, contados de 2020-03-04, à taxa de 4%, nos termos da portaria n.º 291/03 de 08.04, até a data da liquidação em 12-06-2020, no valor de €2.656,19, coima devida no processo ...2016..., nos termos dos art.º26.ºe 117.º do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT).
Da liquidação poderá (ao) V. Exa. (s) deduzir reclamação ou impugnação, nos termos e prazos previstos nos art.º 70.ºe 102.ºdoCPPT.
Fundamentação: Artigos 2.º, 12.º, 17.º, 18.º, 33.º e 35.º do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT); artigo 40 e verba 1.1 do Imposto do Selo (CIS), artigo 60.º da Lei Geral Tributária (LGT); e Artigos 26.º e 117.º do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) e Art.º 70.º e 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
Valor Global do Acto ou Contrato: € 3.691.959,56
P) No documento n.º ... refere-se, além do mais, o seguinte:
Q) Na «Descrição» que consta do documento n.º ... refere-se, além do mais, o seguinte:
Assunto: A resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, do contrato de compra e venda ou troca de bens imóveis e as do respetivo contrato-promessa, quando, neste último caso, ocorrerem depois de passados 10 anos sobre a tradição ou posse nos termos do artigo 2.º n.º5 alínea a) DO CÓDIGO DO IMT O Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT) dispõe o seguinte:
Alínea a) n. º5 do art." 2.º - A resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, do contrato de compra e venda ou troca de bens imóveis e as do respetivo contrato-promessa, quando, neste último caso, ocorrerem depois de passados 10 anos sobre a tradição ou posse
N. º1 art.º 12o- O IMT incidirá sobre o valor constante do ato ou do contrato ou sobre o valor patrimonial tributário dos imóveis, consoante o que for maior
Art.º 17.º -1 As taxas do IMT são as seguintes:
b) Aquisição de prédio urbano ou de fracção autónoma de prédio urbano destinado exclusivamente a habitação, não abrangida pela alínea anterior:
De mais de €; 92.407,00 até €; 126.403,00- 2% Parcela abater €; 924,07
c) Aquisição de prédios rústicos 5%
d) Aquisição de outros prédios urbanos e outras aquisições onerosas 6,5%
N.º 1 do art.º º18.º - O imposto será liquidado pelas taxas em vigor ao tempo da ocorrência do facto tributário...
N. º1 do art.º 35.º - só pode ser liquidado imposto nos oito anos seguintes a transmissão ou à data em que a isenção ficou sem efeito, sem prejuízo do disposto no número seguinte e, quanto ao restante, no art." 46.º da Lei Geral Tributária (LGT).
N. º3 do art.º 36.º-Se os bens se transmitirem por arrematação e venda judicial ou administrativa, adjudicação, transação e conciliação, o imposto será pago dentro de 30 dias contados da assinatura do respetivo auto ou da sentença que homologar a transação.
A resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, do contrato de compra e venda ou troca de bens imóveis, determina a sujeição ao IMT, prevista na alínea a) do n.º5 do art.º 2.º do CIMT, aplicada à transação em julgado 2020-02-03.
Assim, fica notificado para, querendo, exercer o direito de audição previsto na alínea c) do n.º 1 do art.º60.º da Lei Geral Tributária, no prazo de 15 (quinze) dias, relativamente ao projecto de decisão e fundamentação seguintes: 1 - O IMT incidirá sobre o valor constante do ato ou do contrato ou sobre o valor patrimonial tributário dos imóveis, consoante o que for maior.
Projeto de decisão: liquidação de IMT/IS, (Processo n.º.../14... TYVNG-D)
Facto Tributário: aquisição do direito de propriedade plena sobre imóveis- liquidação por resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, do contrato de compra e venda ou troca de bens imóveis, prevista na alínea a) do N.º5 art.º 2.º do CIMT
Imposto do selo:
Matéria coletável: € 3.691.959,56
Taxa: 0,8%
Is a pagar: €; 29.535,68
Juros Compensatórios:
São devidos juros compensatórios nos termos do art.º 35º da Lei Geral Tributária (LGT) e art.º 40.º do CIS, calculados sobre a importância de € 29.535,68, contados de 2020-03-04, à taxa de 4% nos termos da portaria n.º 291/03 de 08.04, até a data da liquidação em 12-06-2020, no valor de € 326,92, coima nos termos dos art.º 26.º e 117.º do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT).
Da liquidação poderá (ao) V. Exa. (s) deduzir reclamação ou impugnação, nos termos e prazos previstos nos art.º 70º e 102ºdo CPPT.
Fundamentação: Artigos 2.º, 12.º, 17.º, 18.º, 33.º e 35.º do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT); artigo 40 e verba 1.1 do Imposto do Selo (CIS), artigo 60.º da Lei Geral Tributária (LGT); e Artigos 26.º e 117.º do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) e Art.º 70.º e 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
Valor Global do Acto ou Contrato: €3.691.959,56
R) Por e-mail de 12/06/2020, o administrador judicial da R. solicitou ao SF da Maia o seguinte (página 4 da parte I do processo administrativo:
S) Na sequência do e-mail referido na alínea anterior foi emitida, em 17-06-2020, a certidão que consta da página 10 da parte I do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:
(...) certifico em cumprimento do despacho que antecede, de harmonia com n.º 1 do art.º 37.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que da notificação da liquidação de IMT, enviada em 15-04-2020, ofício 2020..., aviso de receção assinado em 22-04-2020, consta a fundamentação de fato e de direito aplicada por força da resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, do contrato de compra e venda ou troca de bens imóveis, conforme Processo n.º.../14...TYVNG-D, transitada em julgado em 03-02-2020 (artigo 2.º n.º5 alínea a do CIMT).
Por ser verdade e para os devidos efeitos, passei a presente certidão que vai por mim assinada, rubricada e autenticada com o selo branco em uso neste serviço. Isenta de emolumentos nos lermos do n.º 1 do art.º 37.º do CPPT».
T) Na sequência de novo requerimento do Administrador da Insolvência apresentado em 18-06-2020, que consta da página 2 da parte II do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, foi emitida a certidão que consta da página 4 da parte 2 do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:
«Em aditamento ao mais de 2020/06/13 (18h 16m) e complemento à certidão entregue em 2020/06/17 ao Sr. Administrador D... certifico que:
1. As notas de cobrança são as guias de IMT e imposto do selo emitidas nos termos do artigo 38.º do CIMT que que deve ser pago no próprio dia;
2. O prazo para solicitar as guias de IMT e imposto do selo é de 30 dias conforme artigo 36.º e 38.º do CIMT;
3. As notas de cobrança (guias IMT) foram solicitadas por mails de 2020/06/12 e remetidas pela mesma via, em 2020/06/16»
U) Não tendo a Requerente solicitado a emissão de guias de pagamento do IMT e do Imposto do Selo referidos, foram emitidas oficiosamente, em 03-08-2020, as
guias de IMT (...) e imposto do selo (...), que constam das partes 5 e 6 do processo administrativo cujos teores se dão como reproduzidos;
V) Em 21-07-2020, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.
2.2. Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto
Não há factos relevantes para decisão da causa que na se tenham provado.
A fixação da matéria de facto baseia-se nos documentos juntos pelo Requerente e no processo administrativo.
3. Matéria de direito
A Requerente imputa às liquidações impugnadas vícios de forma, por preterição de formalidade legal e falta de fundamentação e vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto e de direito.
3.1. Ordem de conhecimento de vícios
O artigo 124.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) estabelece o seguinte:
Artigo 124.º
Ordem de conhecimento dos vícios na sentença
1 – Na sentença, o tribunal apreciará prioritariamente os vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do acto impugnado e, depois, os vícios arguidos que conduzam à sua anulação.
2 – Nos referidos grupos a apreciação dos vícios é feita pela ordem seguinte:
a) No primeiro grupo, o dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos;
b) No segundo grupo, a indicada pelo impugnante, sempre que este estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade e não sejam arguidos outros vícios pelo Ministério Público ou, nos demais casos, a fixada na alínea anterior.
Este artigo 124.º do CPPT estabelece regras sobre a ordem de conhecimento de vícios em processo de impugnação judicial, que são subsidiariamente aplicáveis ao processo arbitral, por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT.
No caso de vícios geradores de anulabilidade, a alínea b) do n.º 2 daquele artigo 124.º estabelece que se deve se deve atender prioritariamente à ordem indicada pelo impugnante, sempre que este estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade.
No caso em apreço, a Requerente imputa às liquidações impugnadas prioritariamente os vícios de preterição de formalidade legal e falta de fundamentação e, nos artigos 140.º e 141.º do pedido de pronúncia arbitral que «Independentemente das razões formais que vimos de expor, e que inquinam os atos de liquidação em mérito (...) as liquidações de IMT e IS, in questio, são ainda ilegais por razões de substância, o que afeta a sua validade intrínseca, e legitima a reposição da legalidade por via da sua anulação», o que permite concluir que pretende a apreciação prioritária daqueles vícios de preterição de formalidade legal e falta de fundamentação.
3.2. Preterição de formalidade legal
A Requerente defende, em suma, que se a notificação efectuada pelo ofício n.º 2020..., de 15-04-2020, corresponde à notificação o projecto de decisão para efeitos do exercício do direito de audição, não lhe foi efectuada a notificação da liquidação e, caso aquele ofício seja considerado notificação das liquidações, foi preterido o direito de audição.
É manifesto que a notificação efectuada pelo ofício n.º 2020..., de 15-04-2020, se reporta ao exercício do direito de audição, pois isso consta expressamente seu teor, fixando-se um prazo para esse exercício.
As liquidações juntas com o referido ofício, em face do contexto em que foram enviadas, devem ser interpretadas como projectos de liquidações. Por isso, não relevam, para esse efeito, as informações posteriores, designadamente as que se referem nos documentos n.ºs 14 e 15 juntos pela Requerente que, aliás, não certificam que a notificação efectuada pelo ofício referido se destinou ao exercício do direito de audição, como resulta com evidência do seu teor. De qualquer forma, se, hipoteticamente, as informações contadas nestes documentos permitissem concluir que com aquele ofício se comunicou a decisão final do procedimento, elas não corresponderiam à realidade, pelo que qualquer eventual vício apenas afectaria as próprias informações.
Assim, apenas poderá equacionar-se, como possível preterição de formalidade legal, a falta de notificação das liquidações que constam das guias posteriormente efectuadas, em 03-08-2020, que confirmam as liquidações enviadas com a notificação para exercício do direito de audição.
A falta de notificação dos actos de liquidação, quando está conexionada com a caducidade do direito de liquidação, pode constituir uma ilegalidade das liquidações, porque a lei faz depender a não caducidade do direito da notificação da liquidação da concretização da notificação dentro do prazo previsto na lei.
Porém, a falta de notificação das liquidações, quando não está conexionada com violação prazo de caducidade do direito de liquidação, apenas afecta a eficácia daqueles actos, como decorre do n.º 6 do artigo 77.º da LGT e do n.º 1 do artigo 36.º do CPPT, não afectando a sua legalidade.
Na verdade, quando não está em causa a caducidade do direito de liquidação, a notificação, sendo um acto posterior ao acto de liquidação, não afecta a legalidade daquele, que continua imutável, com notificação ou sem ela.
As irregularidades de natureza formal e procedimental, designadamente as praticadas durante o procedimento de liquidação de tributos, podem repercutir-se nestes actos de liquidação, afectando a sua validade, por estes actos de liquidação serem posteriores à ocorrência do vício e terem como pressuposto os actos procedimentais anteriores.
Mas, a ilegalidade de um acto não pode resultar supervenientemente da eventual ilegalidade formal de actos posteriores, como é a sua notificação.
As irregularidades de actos posteriores à prática dos actos de liquidação não podem afectar a sua validade, pois aqueles actos mantêm o conteúdo que têm, legal ou ilegal, independentemente de irregularidades posteriores.
Assim, a falta de notificação das liquidações, afectando a sua eficácia, tem potencialidade para obstar a que se iniciem os prazos de impugnação administrativa ou contenciosa e à exequibilidade dos actos de liquidação, mas não constitui ilegalidade dos actos de liquidação.
Pelo exposto, improcede a preterição de formalidade legal como vício dos actos de liquidação.
3.3. Falta de fundamentação
A exigência de fundamentação dos actos administrativos lesivos é feita no artigo 268.º, n.º 3, da CRP, que estabelece, que «carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos».
Concretizando o conteúdo da fundamentação no procedimento tributário, o artigo 77.º, n.º 1, da LGT que estabelece a regra geral de que «a decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária».
O Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender uniformemente que a fundamentação do acto administrativo ou tributário é um conceito relativo que varia conforme o tipo de acto e as circunstâncias do caso concreto, mas que a fundamentação é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do acto para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do acto decidiu como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear dos mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação. ( )
Assim, para a fundamentação ser considerada suficiente é necessário que sejam perceptíveis as razões por que se decidiu no sentido em que se decidiu.
Mas, por força do disposto no n.º 2 do referido artigo 77.º da LGT, «a fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo».
No caso em apreço, a Requerente defende que as liquidações enfermam de vício de falta de fundamentação por a Administração Tributária invocar com fundamento de direito a alínea a) do n.º 5 do artigo 2.º do Código de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT) e esta norma prever três hipóteses distintas: resolução, invalidade ou extinção do contrato de compra e venda.
Aquela norma estabelece que «são também sujeitas ao IMT, designadamente:
a) A resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, do contrato de compra e venda ou troca de bens imóveis e as do respectivo contrato-promessa, quando, neste último caso, ocorrerem depois de passados 10 anos sobre a tradição ou posse;»
De facto, como diz a Requerente, prevêem-se várias situações nesta norma (três tipos de factos tributários, reportados a três situações distintas, designadamente a venda ou troca de bens imóveis e as do respectivo contrato-promessa), pelo que a fundamentação suficiente terá de permitir identificar em qual das hipóteses é enquadrável a situação que a Administração Tributária considera constituir facto tributário.
A Administração Tributária no presente processo diz que consta da notificação que «o facto tributário que gera a liquidação de IMT e IS assentou na resolução do contrato de compra e venda celebrado entre a R. e a REC, nos termos do acordo de transacção homologado judicialmente no Proc.º .../14...TYVNG-D, factualidade que se enquadra legalmente na “aquisição do direito de propriedade plena sobre imóveis – liquidação por resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, do contrato de compra e venda ou troca de bens imóveis, prevista na alínea a) do nº 5 do art. 2.º do CIMT” (artigo 30.º da resposta).
Mas, o que se diz na notificação não é precisamente isso, fazendo-se referência à «resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, do contrato de compra e venda ou troca de bens imóveis, determina a sujeição ao IMT, prevista na alínea a) do nº5 do art.º2º do CIMT, aplicada à transação em julgado 2020-02-03» e ao processo n.º .../14...TYVNG-D, mas indicando-se como «Facto Tributário: 1 aquisição do direito de propriedade plena sobre imoveis- liquidação por resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, do contrato de compra e venda ou troca de bens imóveis, prevista na alínea a) DO Nº5 art.º 2.º do CIMT».
Isto é, se é certo que se faz referência à transacção e ao processo em que foi homologada, também o é que a Administração Tributária não indica em qual das situações previstas na alínea a) do n.º 5 do artigo 2.º do CIMT entendeu que a situação se enquadra, referindo repetidamente as situações de «resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, do contrato de compra e venda ou troca de bens imóveis».
Só no artigo 30.º da sua resposta apresentada no presente processo a Administração Tributária vem esclarecer que o facto tributário será a «resolução do contrato de compra e venda celebrado entre a R. e a REC, nos termos do acordo de transacção homologado judicialmente no Proc.º .../14...TYVNG-D».
Mas, a fundamentação sucessiva ou a posteriori não é relevante para aferir a sua suficiência, quando não acompanhada de revogação e prática de um novo acto. ( ) Por isso, a fundamentação ou a remissão para documentos que a contenham têm de integrar-se no próprio acto e serem contemporâneas dele, não relevando para apreciação da validade formal do acto fundamentos invocados posteriormente.
O artigo 37.º do CPPT, invocado pela Administração Tributária como forma de suprir a falta de notificação, não tem essa potencialidade, pois ele reporta-se apenas às deficiências da notificação e não às deficiências da própria fundamentação dos actos notificados.
De qualquer modo, mesma entender-se que das várias situações previstas na alínea a) do n.º 5 do artigo 2.º do CIMT e na verba 1.1. da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS) era, como pretende esclarecer a Administração Tributária no presente processo, a «resolução» o conceito em que se enquadravam as liquidações, ficaria por esclarecer se a Administração Tributária entendeu tratar-se de uma «resolução» prevista nos artigos 432.º e seguintes do Código Civil ou uma «resolução em benefício da massa insolvente», prevista nos artigos 120.º e seguintes do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), o que se justificava num contexto em que era esta e não aquela que foi objecto da transacção.
Por outro lado, «equivale à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato» artigo 153.º, n.º 2, do Código do Procedimento Administrativo, subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.
Neste caso, está-se perante uma situação de obscuridade, pois a fundamentação não esclarece em qual das situações previstas na alínea a) do n.º 5 do artigo 2.º do CIMT a Administração Tributária entendeu que se enquadra a situação.
Pelo exposto, é de concluir que as liquidações são ilegais por falta de fundamentação, o que justifica a sua anulação, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.
3.4. Erro nos pressupostos de facto e de direito
A Requerente defende, em suma, que a situação de resolução em benefício da massa insolvente prevista nos artigos 120.º e seguintes do CIRE é distinta da figura da resolução do contrato prevista no artigo 432.º do Código Civil, pelo que não se encontra prevista na alínea a) do n.º 5 do artigo 2.º do CIMT nem na verba 1.1. da TGIS.
A Administração Tributária diz, em suma, o seguinte:
– «não reconduziu, nem confundiu, o instituto da resolução contratual com o da resolução em benefício da massa insolvente, antes enquadrou a situação em causa no âmbito de uma transacção judicial homologada no âmbito do Proc... /14...TYVNG-D, na qual as partes (partes no respectivo processo judicial) decidem resolver o contrato de compra e venda que (os mesmos) tinham celebrado em 18/07/2014»;
– «não está aqui em causa a figura da resolução em benefício da massa insolvente, ao abrigo dos artºs 120.º e segs. do CIRE, porque, apesar do administrador da insolvência ter instaurado uma acção de declaração judicial de resolução a favor da massa insolvente, certo é que não foi proferida sentença, porquanto as partes, decidiram extinguir a instância por transacção»;
– «a sentença homologatória refere-se expressamente aos artºs 45.º, n.º 2; 277.º, al. d); 283.º, n.º 2; 289.º, n.º 1, todos do CPC e ao art. 1248.º do C. Civil»;
– «no caso concreto, estamos perante, um contrato, nos termos do nº 1 do art. 1248º do C. Civil, outorgado pelas mesmas partes que intervieram na escritura de compra e venda (a R. e a sociedade REC)»;
– «o que a AT sabe, e tem de saber, é que por transação judicial, homologada judicialmente, foi constituída uma nova transmissão do mesmo imóvel, a favor da R., que se traduz no reingresso do mesmo para a sua esfera jurídica (insolvente)»;
Esta argumentação da Administração Tributária é contraditória com a fundamentação das liquidações.
Na verdade, dessa fundamentação e da referência à alínea a) do n.º 5 do artigo 2.º do CIMT resulta que a Administração Tributária considerou como facto tributário ou uma resolução ou uma invalidade ou a extinção de um contrato de compra e venda e não a hipotética celebração de um novo contrato autónomo, «uma nova transmissão do mesmo imóvel» efectuada com base na transacção, que, a ter correspondência com a realidade, seria enquadrável no n.º 1 do artigo 2.º do CIMT e não na alínea a) do n.º 5 do mesmo artigo.
A transacção é o «contrato pelo qual as partes previnem ou terminam um litígio mediante recíprocas concessões» (artigo 1248.º do Código Civil) e não um contrato pelo que se opera directamente uma nova transmissão de um imóvel. O reingresso do imóvel na esfera jurídica do anterior proprietário é uma consequência da eliminação dos efeitos jurídicos do anterior contrato que é consequência da transacção e não um efeito autónomo de um novo contrato.
Por outro lado, a transacção só pode ter por objecto o «objecto da causa» em que é efectuada (artigos 45.º, n.º 2, e 283.º, n.º 2, do CPC) que, neste caso, é a «declaração judicial de resolução em benefício da massa insolvente».
Assim, é inequívoco que a homologação da transacção teve por objecto e decidiu uma «resolução em benefício da massa insolvente» e não qualquer outra figura jurídica, designadamente uma resolução contratual.
Por isso, a questão que se coloca relativamente ao vício de violação de lei invocado pela Requerente é a de saber se o termo «resolução» utilizado na alínea a) do n.º 5 do artigo 2.º do CIMT e na verba 1.1. da TGIS abrange a «resolução em benefício da massa insolvente», já que é na «resolução» e não na «invalidade» ou «extinção» previstas naquelas normas que a Administração Tributária defende no presente processo que se enquadra a situação dos autos.
A «resolução do contrato» prevista no aos artigos 432.º e seguintes do Código Civil e a «resolução em benefício da massa insolvente» são institutos distintos como expressamente decorre do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março, que aprovou o CIRE, em que se refere que «prevê-se a reconstituição do património do devedor (a massa insolvente) por meio de um instituto específico - a ‘resolução em benefício da massa insolvente’ -, que permite, de forma expedita e eficaz, a destruição de actos prejudiciais a esse património» (ponto 41).
Trata-se, assim, de um instituto específico, que se destina a «(…) apreender para a massa insolvente não só aqueles bens que se mantenham na titularidade do insolvente, como aqueles que nela se manteriam caso não houvessem sido por ele praticados ou omitidos aqueles actos, que se mostrem prejudiciais para a massa» ( ), visando «reconstituir-se a situação que existiria se o acto não tivesse sido praticado ou omitido, consoante o caso» (artigo 126.º, n.º 1, do CIRE).
A resolução do contrato de compra e venda referido na alínea a) do n.º 5 do artigo 2.º do CIMT e resolução do contrato de aquisição onerosa que se refere na verba 1.1. da TGIS, em qualquer dos casos por mútuo consenso, é a «destruição da relação contratual operada por um dos contraentes, ou por ambos por comum acordo, com base num facto posterior à celebração do contrato». ( ) Na verdade, aquela expressão «mútuo consenso» é sinónima da expressão «mutuo consentimento dos contraentes» que, nos termos do n.º 1 do artigo 406.º do Código Civil, é causa de extinção dos contratos. ( )
A exigência de «mutuo consenso» como elemento de incidência objectiva revela, como bem diz a Requerente, que se trata de «uma opção legislativa que tem em vista acautelar a celebração de putativos negócios simulados, encapotados de actos que conduzem à extinção contratual, e em consequência a transferência do património, mas não sujeitos a tributação», isto é, «impedir que, sob a capa de resolução ou invalidade, as partes operassem uma verdadeira transmissão onerosa de bens, ocultando uma transação em prejuízo do fisco».
Na verdade, só sendo essa a ratio desta disposição se pode compreender que não seja aplicada a mesma tributação quando a resolução é decidida judicialmente, situação em que são precisamente os mesmos os efeitos da resolução a nível da transmissão da titularidade do direito de propriedade do imóvel, isto é , está-se perante a mesma a substância económica dos factos tributários que o n.º 3 do artigo 11.º da LGT erige em elemento decisivo da interpretação das normas fiscais.
No caso em apreço, como resulta dos termos da transacção, as Rés na acção referida, que eram os contraentes no contrato de compra e venda, não acordaram entre si resolvê-lo com base em qualquer facto posterior à celebração do contrato, antes aceitaram «expressa e irrevogavelmente, com os efeitos previstos no n.º 1 do art.º 126.º do CIRE, a licitude e eficácia da resolução em benefício da Massa Insolvente».
Por isso, não tem correspondência com a realidade a afirmação da Administração Tributária de que «estamos perante, um contrato, nos termos do n.º 1 do art. 1248.º do C. Civil, outorgado pelas mesmas partes que intervieram na escritura de compra e venda (a R. e a sociedade REC)», pois uma das partes na transacção é administrador da insolvência que não interveio no contrato de compra e venda.
Por outro lado, a resolução em benefício da massa insolvente é efeito de uma decisão unilateral do administrador da insolvência, como decorre do artigo 123.º do CIRE, embora possa recorrer à acção judicial para a concretizar, designadamente nos casos em que seja de prever que possa haver dificuldade em concretizar os efeitos da resolução, como se depreende dos n.ºs 1 e 2 do artigo 26.º do CIRE.
Assim, a destruição da relação contratual decidida judicialmente com base na transacção é efeito da resolução em benefício da massa insolvente decidida pelo administrador da insolvência e aceite pelos contraentes do contrato de compra e venda e não resultado de um acordo entre estes intervenientes no contrato resolvido.
Não se está assim, perante uma resolução por mútuo consenso dos contraentes, o que, desde logo, afasta a possibilidade de incidência do IMT e do Imposto do Selo com base na alínea a) do n.º 5 do artigo 2.º do CIMT e da verba 1.1. da TGIS.
Pelo exposto, as liquidações impugnadas enfermam de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, que justifica a sua anulação de harmonia com o disposto no artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.
3.5. Juros compensatórios
As liquidações de juros compensatórios têm como pressuposto as respectivas liquidações de IRC (artigo 35.º, n.º 8, da LGT), pelo que enfermam dos mesmos vícios que afectam estas, justificando-se também a sua anulação.
3.6. Questões de conhecimento prejudicado
Resultando do exposto a declaração de ilegalidade das liquidações que são objecto do presente processo, por vício que impede a renovação dos actos, fica prejudicado, por ser inútil (artigos 130.º e 608.º, n.º 2, do CPC), o conhecimento dos restantes vícios que lhes são imputados pela Requerente.
Na verdade, o artigo 124.º do CPPT, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, do RJAT, ao estabelecer uma ordem de conhecimento de vícios, pressupõe que, julgado procedente um vício que assegura a eficaz tutela dos direitos dos impugnantes, não é necessário conhecer dos restantes, pois, se fosse sempre necessário apreciar todos os vícios imputados ao acto impugnado, seria indiferente a ordem do seu conhecimento.
Pelo exposto, não se toma conhecimento dos restantes vícios imputados pela Requerente.
4. Decisão
Em face do exposto. justifica-se a anulação das liquidações, quer as que foram enviadas com a notificação para exercício do direito de audição, quer as guias emitidas oficiosamente em 03-08-2020, que são confirmação daquelas.
Nestes termos acordam neste Tribunal Arbitral em:
A) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
B) Anular as liquidações liquidação de IMT e IS, e respetivos juros compensatórios, no montante de € 242.633,56 e € 29.862,60, respectivamente, que constam dos documentos n.ºs 2 e 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral (documentos n.ºs ... e ...), bem como as respectivas guias emitidas oficiosamente, em 03-08-2020, que as confirmaram relativas de IMT (n.º...) e imposto do selo (n.º...), que constam das partes 5 e 6 do processo administrativo.
5. Valor do processo
De harmonia com o disposto nos artigos 305.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 3.º, n.º 2, do Regulamento de € 272.496,16.
6. Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 4.896,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 20-11-2020
Os Árbitros
(Jorge Lopes de Sousa)
(Francisco Nicolau Domingos)
(Marisa Isabel Almeida Araújo)