Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 934/2019-T
Data da decisão: 2020-11-13  IRC  
Valor do pedido: € 145.788,27
Tema: IRC – Convenção para evitar a Dupla Tributação; Meios probatórios.
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SUMÁRIO: 

I.             Existindo convenção destinada a evitar a dupla tributação há, para efeitos de conhecer da dispensa de efetuar a retenção na fonte de IRC, que atender apenas aos pressupostos materiais convencionados.

II.            As normas convencionais vinculam os Estados contratantes não podendo ser alteradas pela lei interna de um deles, dada a primazia do direito convencional sobre a lei interna.

III.          Os formulários exigidos como prova da dispensa da retenção na fonte de IRC dos rendimentos auferidos por entidades não residentes são meros documentos ad probationem, termos em que, tendo natureza meramente declarativa, podem ser apresentados a posteriori.

 

DECISÃO ARBITRAL

Os Árbitros Conselheira Maria Fernanda dos Santos Maçãs (Árbitro Presidente), Dr. António Alberto Franco (Árbitro Vogal) e Dr. Alexandre Andrade (Árbitro Vogal), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (adiante designado apenas por CAAD) para formar o Tribunal Arbitral Coletivo, constituído em 18 de Março de 2020, decidem no seguinte:

1. Relatório

A..., S.A. (adiante designada apenas por Requerente), NIPC..., com sede no ..., em..., Oeiras, apresentou um pedido de constituição de Tribunal Arbitral, nos termos do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, adiante designado apenas por RJAT), em que é Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (adiante designada apenas por Requerida).

No Pedido de Pronúncia Arbitral a Requerente diz [...], tendo sido notificada no passado dia 2 de Abril de 2013 da decisão de indeferimento expresso do recurso hierárquico apresentado sobre a liquidação de retenções na fonte de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) do exercício de 2008 e, por conseguinte, apresentado, em 03.07.2013, impugnação judicial contra aquele ato de indeferimento e contra a mencionada liquidação de retenções na fonte de IRC, vem, ao abrigo do disposto no artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 81/2018, de 15 de outubro, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e no artigo 10.º, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, requerer a CONSTITUIÇÃO DE TRIBUNAL ARBITRAL COLETIVO.

Completa a Requerente no Pedido de Pronúncia Arbitral, Em 03.07.2013, a Requerente apresentou impugnação judicial contra a decisão de indeferimento expresso do recurso hierárquico apresentado sobre a liquidação de retenções na fonte de IRC do exercício de 2008 (liquidação n.º 2010...), em que requereu a revogação desta decisão e, consequentemente, a anulação parcial da referida liquidação, no valor de EUR 145.788,27, por violação do artigo 7.º do ADT entre Portugal e Espanha e por desconformidade do artigo 90.º-A do CIRC com o princípio da prevalência do Direito Internacional Convencional e o princípio da não discriminação previsto no Direito Comunitário. Este processo correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra sob o n.º .../13...BESNT, tendo sido apresentada contestação pela Fazenda Pública em 20.03.2014. Em 22.05.2015, a Requerente apresentou as suas alegações de direito. Na sequência da apresentação das alegações escritas a Requerente, ao abrigo do princípio da colaboração e da descoberta da verdade material, juntou aos autos certificado oficial Modelo 21-RFI emitido e autenticado pelas Autoridades Fiscais Espanholas, o que motivou a apresentação de alegações complementares em 16.05.2016. Desde então, os autos não tiveram qualquer ulterior desenvolvimento. Sucede que o Decreto-Lei n.º 81/2018, de 15 de outubro [...], que entrou em vigor em 16.10.2018, prevê expressamente, no contexto das medidas de recuperação de pendências na jurisdição administrativa e tributária, a possibilidade de serem submetidas à arbitragem tributária, dentro das respetivas competências, pretensões que tenham sido formuladas em processos de impugnação. Com efeito, dispõe o artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 81/2018 que “[o]s sujeitos passivos podem, até 31 de dezembro de 2019, submeter aos tribunais arbitrais tributários, dentro das respetivas competências, as pretensões que tenham formulado em processos de impugnação judicial que se encontrem pendentes de decisão em primeira instância nos tribunais tributários, e que nestes tenham dado entrada até 31 de dezembro de 2016, com dispensa de pagamento de custas processuais”. No caso sub judice encontram-se verificados todos os pressupostos de que o artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 81/2018 acima citado faz depender o cometimento da pretensão contida no processo de impugnação judicial à arbitragem tributária, conforme se segue: (i) A pretensão da ora Requerente é abrangida pelo âmbito material de competências dos tribunais arbitrais, ex vi do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT, na medida em que está em causa a “declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos”. (ii) O processo encontrava-se pendente de decisão em primeira instância nos tribunais tributários (no caso, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra); (iii) O processo deu entrada antes de 31.12.2016 (rectius, em 03.07.2013). Acresce que, em respeito do n.º 2 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 81/2018, a pretensão ora submetida à arbitragem tributária coincide com o pedido e a causa de pedir do processo de impugnação judicial n.º .../13...BESNT [...]. Termos em que deverá ser admitido o presente pedido de pronúncia arbitral, pelos fundamentos que de seguida se expõem.

Continua a Requerente no Pedido de Pronúncia Arbitral, O objeto do presente pedido arbitral corresponde à análise da legalidade da liquidação adicional de retenções na fonte de IRC do exercício de 2008, na parte respeitante aos serviços prestados pela entidade B..., SL, ascendendo o valor de imposto em causa a EUR 145.788,27. Conforme resulta da factualidade acima exposta, a Administração Tributária desconsiderou como meio de prova o certificado de residência fiscal apresentado pela Requerente relativamente à entidade acima identificada para efeitos do artigo 7.º do ADT celebrado por Portugal com o Estado da residência do beneficiário do rendimento (neste caso Espanha) e da consequente dispensa de retenção na fonte de IRC sobre os referidos rendimentos. Na ótica dos serviços de inspeção “(...) torna-se pertinente realçar o facto de que o sujeito passivo, para os pagamentos de serviços prestados por parte de entidades não residente, detalhadamente identificados em quadro anexo (Anexo VI) não procedeu à apresentação dos Formulários supra referidos com vista a que assim se possa considerar devida e corretamente acionada a correspondente C.D.T. e, consequentemente, fazer uso da respetiva taxa de retenção na fonte aí prevista”. De igual modo, já em sede do procedimento de recurso hierárquico, os serviços da UCG vieram a indeferir a pretensão da ora Requerente, com fundamento na desconformidade do documento apresentado para justificar a dispensa de retenção na fonte sobre os serviços pagos à entidade B..., SL com o artigo 90.º-A, n.º 2, alínea a) do CIRC, na redação em vigor à data dos factos (atual artigo 98.º/2 a) do CIRC). A Requerente veio, contudo, em momento posterior dos autos proceder à junção aos autos do certificado oficial Modelo 21-RFI emitido e autenticado pelas Autoridades Fiscais Espanholas, que confirma que B..., SL, era no ano de 2008 uma entidade com residência fiscal em Espanha, o que motiva desde logo a procedência do presente pedido arbitral. Face à apresentação por parte da Requerente do documento invocado pela AT, é evidente que foi produzida prova material da residência da referida entidade, pelo que se mostram preenchidos todos os requisitos para que sejam acionadas as normas convencionais – em concreto do ADT entre Portugal e Espanha -, as quais, recorde-se, no caso de lucros das empresas, atribuem competência exclusiva ao Estado da residência para sujeitar tais rendimentos a tributação, salvo em casos de existência de estabelecimento estável no outro país, o que não se verifica no caso em apreço.

Diz a Requerente no Pedido de Pronúncia Arbitral, Tudo resumido, é evidente, face ao quadro legal acima exposto, que o certificado oficial Modelo 21-RFI junto pela Requerente ao presente processo constitui prova legal bastante para efeitos de dispensa de retenção na fonte de IRC sobre os rendimentos de prestação de serviços pagos no ano de 2008 à entidade B..., SL, em virtude do disposto no artigo 7.º do ADT entre Portugal e Espanha, o que motivará a anulação parcial do ato tributário ora sindicado. [...]. Face ao exposto e à prova produzida nos presentes autos, requer-se a este Tribunal a revogação da decisão de indeferimento do recurso hierárquico ora sindicada e, consequentemente, a anulação parcial da liquidação ora sindicada, no valor de € 145.788,27, por violação do artigo 7.º do ADT entre Portugal e Espanha, tudo com as demais consequências legais, em particular a anulação parcial da liquidação dos correspondentes juros compensatórios e o direito da Requerente ao reembolso das quantias de imposto e juros indevidamente pagas por compensação efetuada pelo órgão de execução fiscal ao abrigo do artigo 89.º do CPPT, acrescidas dos correspondentes juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º da LGT.

Pede, a final, a Requerente, no Pedido de Pronúncia Arbitral, o seguinte: Nestes termos e nos melhores de direito, solicita-se respeitosamente a V. Exas. que se dignem conceder provimento ao presente pedido de pronúncia arbitral, por provado, e determinada, em consequência: (i) A anulação parcial da liquidação n.º 2010..., no valor total de imposto de EUR 145.788,27, com base nos fundamentos acima melhor expostos na presente petição arbitral, e a consequente anulação proporcional da liquidação dos juros compensatórios, tudo com as devidas consequências legais, mormente o direito da Requerente ao reembolso das quantias de imposto e juros compensatórios indevidamente pagas por compensação efetuada pelo órgão de execução fiscal ao abrigo do artigo 89.º do CPPT, acrescidas dos correspondentes juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º da LGT; (ii) Com a procedência do pedido, a condenação da AT no pagamento das custas de arbitragem, na proporção do respetivo decaimento, tudo com as demais consequências legais.

Na Resposta, a Requerida diz, O presente pedido de pronúncia arbitral tem por objecto a decisão de indeferimento expresso do recurso hierárquico apresentado sobre a liquidação de retenções na fonte de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) do exercício de 2008 e, por conseguinte, apresentado, em 03.07.2013, impugnação judicial contra aquele ato de indeferimento e contra a mencionada liquidação de retenções na fonte de IRC. A liquidação em crise resultou dos factos apurados na acção inspectiva realizada no âmbito da Ordem de Serviço n.º OI2010..., peticionando a Requerente a sua anulação, com fundamento em ilegalidade das mesmas. A AT pugna pela manutenção na ordem jurídica daquela liquidação adicional, na parte ora controvertida, por entender que a mesma consubstancia uma correcta aplicação do direito aos factos.

Mais diz a Requerida na Resposta, Do n.º 6 do art. 88.º, conjugado com o n.º 5 do art.º 90.º-A, ambos do CIRC e disposições legais respeitantes ao momento em que ocorre a obrigação de efectuar Retenção na Fonte, os Formulários de Modelo oficial deverão ser apresentados à entidade pagadora, o mais tardar até ao dia 20 do mês seguinte àquele em que ocorreu o pagamento dos rendimentos decorrentes dos serviços prestados. A sua não apresentação impossibilita que a Requerente possa gozar da aplicação da Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada entre Portugal e Espanha.

Pede, a final, a Requerida, na Resposta, o seguinte: Nos termos supra expostos, e nos demais de direito que V. Exas doutamente suprirão, deve o pedido de pronúncia arbitral ser julgado improcedente.

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD em 31 de Dezembro de 2019 e posteriormente notificado à Requerida.

Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico do CAAD designou como Árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 17 de Fevereiro de 2020, foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.

Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral Coletivo foi constituído em 18 de Março de 2020.

Em 19 de Março 2020, o Tribunal Arbitral Coletivo proferiu o seguinte Despacho Arbitral: Nos termos do previsto nos n.ºs 1 e 2 do art. 17.º do RJAT, notifique o dirigente máximo do serviço da administração tributária, para, no prazo de 30 dias, apresentar resposta e, caso queira, solicitar a produção de prova adicional, acrescentando que, deve ser remetido ao tribunal arbitral cópia do processo administrativo dentro do prazo de apresentação da resposta, aplicando-se, na falta de remessa, o disposto no n.º 5 do artigo 110.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

Em 19 de Junho de 2020, a Requerida apresentou Resposta.

Em 24 de Junho de 2020, o Tribunal Arbitral Coletivo proferiu o seguinte Despacho Arbitral: 1. Notifique-se a Requerida para juntar aos autos o PA no prazo de dez dias. 2.Não havendo lugar a produção de prova constituenda, por a questão a decidir ser essencialmente de direito, nisso convergindo ambas as partes, por um lado, e não tendo sido suscitada matéria de excepção, por outro, o Tribunal dispensa a realização da reunião prevista no art. 18.º do RJAT, o que faz ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal na condução do processo, e em ordem a promover a celeridade, simplificação e informalidade deste. Vd. arts. 19.º, n.º 2 e 29.º, n.º 2 do RJAT. 3. Notifiquem-se ambas as partes para produzirem alegações escritas, no prazo de quinze dias a partir da notificação do presente despacho, sendo que se concede à Requerida a faculdade de, caso assim o entenda, juntar as suas alegações com carácter sucessivo relativamente às produzidas pelo sujeito passivo. 4. Designa-se o dia 18 de Setembro de 2020 como prazo limite para a prolação da decisão arbitral (embora sem ter em conta o período de suspensão do processo). 5. Em nome do princípio da colaboração das partes solicita-se o envio das peças processuais em formato WORD. Do presente despacho, notifiquem-se ambas as partes.

Em 27 de Julho de 2020, o Tribunal Arbitral Coletivo proferiu o seguinte Despacho Arbitral: Em nome do princípio da colaboração das partes reitera-se o pedido de envio das peças processuais em formato WORD. Do presente despacho, notifiquem-se ambas as partes.

Em 9 de Setembro de 2020, o Tribunal Arbitral Coletivo proferiu o seguinte Despacho Arbitral: 1. Atento o facto de o prazo de seis meses para emitir a decisão arbitral, segundo o estatuído no n.º 1 do artigo 21.º do RJAT, incluir períodos de férias judiciais e a complexidade do processo, não é possível proferir decisão naquele prazo. 2.Assim, nos termos do n.º 2 do mesmo preceito, prorroga-se o prazo da arbitragem por dois meses e indica-se como data limite para ser proferida a decisão o dia 18 de Novembro de 2020. Esta data não tem em conta o período de suspensão do processo. Do presente despacho notifiquem-se ambas as partes.

As Partes apresentaram alegações.

O Tribunal Arbitral Coletivo é competente e foi regularmente constituído.

As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas (artigo 4.º e n.º 2 do artigo 10.º, ambos do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades.

2. Matéria de Facto

2.1 Factos Provados

Analisada a prova produzida no âmbito do presente Processo Arbitral, este Tribunal Arbitral Coletivo considera provados, com relevo para a presente Decisão Arbitral, os seguintes factos:

1.            A Requerente exerce a sua atividade na área do comércio por grosso de combustíveis líquidos e lubrificantes (conforme Pedido de Pronúncia Arbitral).

2.            No exercício de 2008, a Requerente contratou diversos serviços a entidades não residentes em território português (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

3.            Uma das entidades contratadas foi a empresa B..., SL, NIF..., entidade residente para efeitos fiscais em Espanha (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

4.            A Requerente foi alvo de uma ação de inspeção tributária de âmbito geral ao exercício de 2008, iniciada através da Ordem de Serviço n.º OI2010... (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

5.            Diz o ponto I.4.3. do Relatório de Inspeção Tributária (RIT): Imposto não retido e não entregue, relativo a rendimentos pagos ou colocados à disposição de entidades não residentes. Prestação de Serviços. O sujeito passivo, ao longo do exercício objeto de análise, procedeu ao pagamento/ colocação à disposição de entidades não residentes de rendimentos, a título de Prestação de Serviços, enquadráveis no disposto no ponto 7 da alínea 7 da alínea c) do n.º 3 do artigo 4.º do CIRC, no montante agregado de 2.201.359,13 Euros. Considerando que não procedeu à retenção e respetiva entrega nos cofres do Estado do correspondente IRC, em relação à qual se encontrava obrigado – por força da alínea g) do n.º 1 e n.º 6 do artigo 88.º do CIRC em conjugação com os n.ºs 2, 3 e 4 do artigo 90.º-A do mesmo Código – à taxa de 15% (nos termos da aliena e) do n.º 2 do artigo 80.º do CIRC), consequentemente se apurou IRC em falta no valor total de 330.203,87 Euros (€2.201.359,13 x 15% [...] vide ponto III.3.). [...]. III.3. Imposto não retido e não entregue, relativo a rendimentos pagos ou colocados à disposição de entidades não residentes. Prestação de Serviços. Tendo sido à priori constatada a não entrega da Declaração Modelo 30, relativa a pagamentos efetuados a entidades não residentes e a que o sujeito passivo se encontrava obrigado à luz da alínea a) do n.º 7 do artigo 119.º do Código do IRS, foi adicionalmente constatado que, no decurso do exercício de 2008, o sujeito passivo não procedeu ao correto acionamento das correspondentes Convenções de Dupla Tributação (C.D.T.´s) no que respeita a diferentes valores pagos a titulo de serviços que lhes foram prestados e que somam o montante total de 2.201.359,13 Euros, em total consonância com o quadro que se apresenta em anexo [...]. No que em particular respeita ao enquadramento normativo aplicável ao assunto presentemente em análise, mencione-se que, em total concordância com o estabelecido no ponto 7 alínea c) do n.º 3 do artigo 4.º do CIRC, os rendimentos decorrentes da Prestação de Serviços pagos por parte do sujeito passivo a entidades não residentes, são considerados como rendimentos obtidos em território português e, subsequentemente, sujeitos a retenção na fonte de IRC, com carater definitivo (aliena b) do n.º 3 e n.º 5 do artigo 88.º do CIRC), nos termos da alínea g) do n.º 1 do artigo 88.º do CIRC, à taxa interna de 15%, prevista na alínea e) do n.º 2 do artigo 80.º do mesmo diploma legal. Conforme anteriormente foi referido, de relevar o facto de ter sido efetuada a devida confirmação relativa à evidencia inequívoca de não terem sido acionadas, por parte do sujeito passivo, as respetivas Convenções (C.D.T.´s) destinadas a atenuar ou eliminar a dupla tributação, por via de Formulário próprio para o efeito devidamente autenticado pelas Autoridades Fiscais do Estados das residências das entidades beneficiárias, forma pela qual haveria efetivamente a possibilidade de ser assim feita a aplicação da taxa prevista na C.D.T. de acordo com o n.º 2 do artigo 90.º-A do CIRC. Note-se que esta situação é tomada em consideração quando os beneficiários dos rendimentos fizerem prova, perante a entidade que se encontra obrigada a efetuar a Retenção na Fonte, da verificação dos pressupostos legais de que depende a isenção ou dos que resultem de Convenção destinada a atenuar/ eliminar a Dupla Tributação aplicável, celebrada por Portugal com o país terceiros, em conformidade com as normas legais indicadas no paragrafo anterior. De mencionar então que, para as quantias pagas pelo sujeito passivo, consiste prova necessária a efetuar na devida apresentação de Formulário (Modelos RFI a apresentar até dia 20 do mês seguinte face à data em que a retenção deve ser efetuada e que, neste caso, em concreto, reside à data do pagamento do quantitativo em dívida (n.º 6 do artigo 88.º do CIRC em conjugação com o n.º 1 do artigo 98.º do CIRS e n.º 3 do artigo 8.º do D.L. n.º 42/91 de 22 de Janeiro) certificado pelas autoridades competentes do Estado de Residência das entidades beneficiárias dos respetivos rendimentos (vide n.º 3 do artigo 90.º-A do CIRC). Nos termos do já referido n.º 6 do artigo 88.º, conjugado com o n.º 5 do artigo 90.º, ambos do CIRC e disposições legais respeitantes ao momento em que ocorrer a obrigação de efetuar Retenção na Fonte, os Formulários de Modelo Oficial deverão ser apresentados à entidade residente pagadora, o mais tardar até ao dia 20 do mês seguinte àquele em que ocorreu o pagamento dos rendimentos decorrentes do serviço prestado. Em total concordância com o que se deve inferir do n.º 1 do artigo 74.º da Lei Geral Tributária (L.G.T.), recai assim sobre o sujeito passivo o ónus de provar perante a Administração Fiscal que estão reunidas as condições de aplicação das Convenções para evitar a Dupla Tributação, mediante a apresentação dos referidos Formulários de Modelo Oficial, devidamente autenticados pelas autoridades fiscais do país da entidade não residente recebedora dos rendimentos. Detetadas que sejam situações face às quais a prova da verificação dos pressupostos de aplicação da correspondente Convenção não seja efetuada à entidade pagadora, dentro dos prazos legalmente definidos, fica esta última, na qualidade de substituta tributária, obrigada a fazer a entrega da quantia que deveria ter sido retida, nos termos do que se encontra vertido no artigo 28.º da LGT em articulação com o preceituado no referido n.º 5 do artigo 90.º-A do CIRC. A título complementar, dispõe ainda no n.º 5 do artigo 106.º do CIRC no sentido de que, quando se esteja perante retenções na fonte a título definitivo (como é o caso em apreciação), a responsabilidade originária pelo pagamento do imposto devido, caberá à entidade pagadora dos rendimentos correspondentes. Assim sendo, torna-se pertinente realçar o facto de que o sujeito passivo, para os pagamentos de serviços prestados por parte de entidades não residentes, detalhadamente identificados em quadro anexo (Anexo VI), não procedeu à apresentação dos Formulários supra referidos com vista a que assim se possa considerar devida e corretamente acionada a correspondente C.D.T. e, consequentemente, fazer uso da respetiva taxa de retenção na fonte aí prevista. Na realidade, no que concerne aos pagamentos discriminados no anexo anteriormente referido, e que perfazem o montante total de 2.201.359,13 Euros, o sujeito passivo não comprovou ter efetivamente em sua posse, à data devida (dia 20 do mês seguinte aos correspondentes pagamentos), o referido meio de prova que o desobrigaria/ eximiria de efetuar a retenção na fonte à taxa de 15% prevista na alínea e) do n.º 2 do artigo 80.º do CIRC, à qual se encontrava obrigado nos termos da alínea g) do n.º 1 e n.º 6 do artigo 88.º do CIRC em conjugação com os n.ºs 2, 3 e 4 do artigo 90.º-A do mesmo Código, e que são respeitantes aos rendimentos de entidades não residentes, referentes a prestações de serviços (como referido, sujeitas a IRC nos termos do ponto 7 da alínea c) do n.º 3 do artigo 4.º do CIRC), de acordo com o que se disponibiliza em detalhada apresentação do calculo de apuramento valorimétrico do montante agregado de imposto em falta. Do presente modo, tendo o sujeito passivo feito a utilização da taxa, de acordo com a respetiva convenção (0%), sem a indispensável apresentação do respetivo meio de prova legalmente exigido, e não da correspondente taxa interna já indicada (15%) para a totalidade dos pagamentos constantes do referido Anexo VII, verifica-se ser devido imposto (em falta) na importância total de 313.990,52 Euros (€ 2.201.359,13 x 15%), bem como ainda os respetivos Juros Compensatórios, pelo atraso da receita devida ao Estado, inteiramente de acordo com o previsto na artigo 35.º da LGT e n.º 2 do artigo 106.º do CIRC). Acresce ainda o facto de que, nos termos do artigo 123.º do CIRC, “Não podem realizar-se transferências para o estrangeiro de rendimentos sujeitos a IRC, obtidos em território português por entidade não residentes, sem que se mostre pago ou assegurado o imposto que for devido”. [...] (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).      

6.            Na sequência da ação de inspeção referida no ponto 4 do 2.1 dos Factos Provados, a Administração Tributária emitiu a liquidação adicional de IRC e juros compensatórios n.º 2010..., no valor total de € 343.877,57, correspondente a € 313.999,52 e € 29.887,05, respetivamente, cujo prazo de pagamento voluntário terminava a 7 de Fevereiro de 2011 (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

7.            A Requerente não efetuou o pagamento da liquidação adicional de IRC e juros compensatórios n.º 2010..., no valor total de € 343.877,57 (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

8.            O Serviço de Finanças de Oeiras ... instaurou o processo de execução fiscal n.º ...2011... para cobrança coerciva da quantia de € 343.877,57, tendo a Requerente apresentado garantia bancária para suspensão do referido processo (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

9.            Apesar da Requerente ter apresentado garantia bancária, o Serviço de Finanças de Oeiras ... efetuou, ao abrigo do artigo 89.º do CPPT, a compensação integral da dívida exequenda no âmbito de processo de execução fiscal acima referido com várias quantias devidas à Requerente a título de IRC e IMI (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

10.          Em 6 de Junho de 2011, a Requerente apresentou junto do Serviço de Finanças de Oeiras ..., Reclamação Graciosa da liquidação adicional de IRC e juros compensatórios n.º 2010..., no valor total de EUR 343.877,57, invocando a inexigibilidade parcial do imposto liquidado por força da aplicação dos Acordos sobre Dupla Tributação (“ADT”), à qual foi dado o n.º ...2011... (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

11.          De modo a fundamentar a sua posição, a Requerente juntou à Reclamação Graciosa cópia de certificado de residência fiscal da B..., SL, emitido pelas Autoridades Fiscais Espanholas, que atesta a residência fiscal desta entidade no ano de 2008 e requereu a anulação da liquidação de IRC na parte correspondente aos pagamentos de serviços efetuados àquela entidade no valor total de € 145.788,27 (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

12.          A Requerente foi notificada do Projeto de Decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa, para, no prazo de 10 dias, exercer o seu direito de audição prévia (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

13.          A Requerente exerceu o seu direito de audição prévia (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

14.          A 2 de Janeiro de 2012, a Requerente foi notificada da Decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

15.          Diz o ponto 2 da Decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa: 2. Identificação do Processo. 2.1. O sujeito passivo [...] vem, [...], apresentar reclamação graciosa solicitando a anulação parcial da liquidação adicional relativa a retenções na fonte de IRC n.º 2010 ... de 30.12.2010 (313 990,52€) e de juros compensatórios (29 887,05 €) praticadas por referência ao IRC (Períodos 01 a 12) do ano de 2008 [...] (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).   

16.          Dizem os pontos 4.2 e 4.3 da Decisão final de indeferimento da Reclamação Graciosa: 4.2 No âmbito da Ordem de Serviço n.º OI2010... de 24.05.2010 o sujeito passivo foi objeto de procedimento de inspeção externa de âmbito geral ao exercício fiscal de 2008, do qual resultou, entre outras, correções efetuadas em sede de IRC não retido e não entregue nos cofres do Estado pelo montante global de 313 990,52 €, inclusas em relatório final de inspeção tributária (doravante RIT) elaborado para efeitos de conclusão do citado procedimento de inspeção e notificado na integra ao sujeito passivo ora reclamante; correções essas refletidas na liquidação adicional de retenções na fonte de IR n.º 2010... de 30.12.2010. 4.3 Analisado o requerimento de reclamação graciosa facilmente se constata pela leitura dos pontos do seu articulado, que a reclamante apenas contesta a legalidade da correção efetuada em sede de retenção na fonte de IRC pelo montante de 145 788,27 € relativamente à aplicação da taxa interna de retenção na fonte de IR de 15% aos rendimentos de prestação de serviços pagos à sociedade “B..., SL” no montante global de 971 921,81 €, cujas razões de facto e de direito que a motivaram constam dos pontos I.4.3 e III – 3 (Imposto não retido e não entregue, relativo a rendimentos pagos ou colocados à disposição de entidades não residentes) do RIT elaborado em 20.12.2010 e notificado na integra ao sujeito passivo ora reclamante em 23.12.2010 (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

17.          Diz o ponto 6 da Decisão final de indeferimento da Reclamação Graciosa: 6. Conclusão. 6.1. Face a todo o exposto, e tendo em atenção os factos e os fundamentos invocados na presente informação de decisão final e de mais documentos constantes dos presentes autos de reclamação graciosa, deverá ser indeferido na totalidade o pedido, mantendo-se a correção de imposto efetuada em sede de retenção na fonte de IRC respeitante ao ano de 2008 – Liquidação adicional n.º 2010... de 30.12.2010 – contestada pelo montante de 145 788,27 €, bem como o valor dos respetivos juros compensatórios, dado que a reclamante ao não apresentar o formulário modelo 21-RFI, aprovado pelo Despacho n.º 30359/2007 de 29.11.2007, não fez prova da qualidade de residente fiscal em Espanha da sociedade “B..., SL” e sem estabelecimento estável em Portugal, pelo que é de manter as correções de imposto refletidas na liquidação atrás referida concretizadas pelo valor global de 313.990,52 € (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

18.          A 31 de Janeiro de 2012, a Requerente deduziu recurso hierárquico do indeferimento da Reclamação Graciosa (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

19.          Por Ofício datado de 28 de Março de 2013, a Requerente foi notificada por parte da Unidade dos Grandes Contribuintes da Decisão de indeferimento do Recurso Hierárquico (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

20.          Diz o ponto 7.2. da Decisão final de indeferimento do Recurso Hierárquico: 7.2. A matéria em apreço. 7.2.1. O que está em discussão na presente situação é a questão da prova da residência fiscal em Espanha da empresa “B..., SL”. O sujeito passivo refere que, o certificado que apresenta junto aos Autos de reclamação como documento n.º 3 ([...]), embora não seja um certificado de modelo oficial como o formulário modelo 21 – RFI aprovado pelo Despacho 1171/2003 de 28.05 da Ministra de Estado e das Finanças no Diário da República, 2.ª Séria, n.º 138 de 17.06.03, é suficiente para comprovar a residência fiscal dessa entidade. Traz em abono da sua tese, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo datado de 22.06.11, proferido no processo n.º 283/11. Por sua vez, a entidade da AT que proferiu a decisão sobre a reclamação interposta pelo sujeito passivo considera que, a mesma prova de residência fiscal só deve ser efetuada através da apresentação do formulário modelo 21 – RFI, porquanto este modelo a partir de 01.01.08, substitui todos os outros modelos, conforme Despacho 30359/07 de 29.11.07. Analisados os elementos em apreço, temos a referir que, na verdade e não obstante no referido Acórdão “se referir que a certificação da residência é um ato de mero reconhecimento dos pressupostos dos benefícios previstos nas Convenções, sendo que, assim, a prova de residência fiscal efetuada através de qualquer outros modelo que não o oficial, deve ser aceite, o fato é que a Autoridade Tributária enquanto órgão da Administração Pública deve atuar em obediência à Lei e ao direito [...]. Assim, referindo-se expressamente na alínea a) do n.º 2 do artigo 98.º do CIRC que: “A verificação dos pressupostos de que depende a aplicação das Convenções sobre dupla tributação ou de outro acordo de direito internacional ou ainda da legislação interna aplicável, deve ser feita através da apresentação de formulários de modelo a aprovar por despacho do Ministro das Finanças certificado pelas autoridades competentes do respetivo Estado de residência” e sendo o Despacho em questão o n.º 30359/07 datado de 29.11.07 entretanto substituído pelo Despacho n.º 4743 – A/08 de 08.02.08, em que se aprovam modelos específicos de formulários para efeitos das Convenções de dupla tributação, para o caso o formulário modelo 21 – RFI, somo de parecer que deve ser através deste único meio que deve ser efetuada a prova inequívoca de residência fiscal da entidade residente em Espanha designada “B..., SL”, e não qualquer outros. Nestes termos, não pode ser aceite para a situação em apreço, o documento n.º 3 apresentado pelo contribuinte a comprovar a residência fiscal da entidade em questão. [...]. Em face de tudo o antes exposto, somos da opinião que o presente recurso hierárquico deve ser indeferido (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).   

21.          A Requerente, não se conformando com a Decisão de indeferimento do Recurso Hierárquico, na parte respeitante aos serviços prestados pela entidade B..., SL, cujo imposto liquidado adicionalmente ascende a € 145.788,27, apresentou impugnação judicial da referida Decisão de indeferimento do Recurso Hierárquico junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

22.          No dia 5 de Maio de 2014, a Requerente foi notificada da contestação apresentada pela Fazenda Pública, que remetia a sua argumentação para a informação prestada pela Divisão de Justiça Contenciosa da Direção de Finanças de Lisboa, bem como para o teor da decisão proferida em sede de Reclamação Graciosa e de Recurso Hierárquico, concluindo pela improcedência da impugnação judicial apresentada (conforme Pedido de Pronúncia Arbitral).

23.          No dia 22 de Maio de 2015, a Requerente apresentou as suas alegações escritas (conforme Pedido de Pronúncia Arbitral).

24.          No dia 4 de Junho de 2015, a Requerente requereu a junção aos autos do formulário oficial Modelo 21-RFI emitido e autenticado pelas Autoridades Fiscais Espanholas (conforme Pedido de Pronúncia Arbitral).

25.          O formulário oficial Modelo 21-RFI emitido e autenticado pelas Autoridades Fiscais Espanholas confirma que a B..., SL era, no ano de 2008, uma entidade com residência fiscal em Espanha (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

26.          Em 16 de Maio de 2016, a Requerente apresentou as suas alegações complementares (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

27.          Em 20 de Dezembro de 2019, a Requerente apresentou o seguinte requerimento junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra: A..., S.A., NIPC..., Impugnante nos autos à margem melhor identificados, vem, nos termos e para os efeitos do disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 81/2018, de 15 de outubro e do n.º 2 do artigo 285.º do CPC, aplicável ex vi da alínea e) do artigo 2.º do CPPT, requerer a desistência da instância (conforme documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral).

28.          Em 31 de Dezembro de 2019 deu entrada o Pedido de Pronúncia Arbitral em causa nos presentes Autos Arbitrais (conforme informação no Sistema de Gestão Processual do CAAD).

2.2 Factos Não Provados

                Não há factos relevantes para esta Decisão Arbitral que não se tenham provado.

2.3 Fundamentação da Fixação da Matéria de Facto

A matéria de facto foi fixada por este Tribunal Arbitral Coletivo e a sua convicção ficou formada com base nas peças processuais e requerimentos apresentados pelas Partes e nos documentos juntos pelas Partes ao presente Processo Arbitral.

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem o dever de se pronunciar sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor, conforme n.º 1 do artigo 596.º e n.º 2 a 4 do artigo 607.º, ambos do Código Processo Civil (CPC), aplicável ex vi da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e consignar se a considera provada ou não provada, conforme n.º 2 do artigo 123.º Código do Procedimento e do Processo Tributário (CPPT), aplicável ex vi da alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.

Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento das pessoas, conforme n.º 5 do artigo 607.º do CPC. Somente quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (e.g. força probatória plena dos documentos autênticos, conforme artigo 371.º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação. 

Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas Partes e a prova documental junta aos presentes Autos Arbitrais, consideraram-se provados, com relevo para a presente Decisão Arbitral, os factos acima elencados.

3. Matéria de Direito (fundamentação)

                O artigo 7.º do ADT entre Portugal e Espanha estabelece um regime de tributação exclusiva no Estado da Residência para rendimentos passíveis de serem qualificados como lucros, i.e., rendimentos não especialmente enquadrados noutras categorias como sejam os juros, dividendos, royalties ou mais-valias.

O artigo 90.º do CIRC, na redação introduzida pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2003 ou LOE/2003), a qual entrou em vigor a 1 de janeiro de 2003, estabeleceu diversos requisitos formais para efeitos de aplicação das normas convencionais ao abrigo de ADTs ratificados pelo Estado Português.

Nos termos do n.º 3 do referido preceito legal, estabelece-se que, “Nas situações referidas no número anterior, os beneficiários dos rendimentos devem fazer prova perante a entidade que se encontra obrigada a efetuar a retenção na fonte, da verificação dos pressupostos legais de que depende a isenção ou dos que resultem de convenção destinada a eliminar a dupla tributação, consistindo neste último caso, na apresentação de um formulário de modelo a aprovar por despacho do Ministro das Finanças certificado pelas autoridades competentes do respetivo Estado de residência.”

Nos termos do n.º 5 da mesma disposição legal, é determinado que “Quando não seja efetuada a prova até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto (...) fica o substituto tributário obrigado a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos da lei.”

Na Lei de Orçamento de Estado para o ano de 2008 (Lei n.º 67-A/2007, de 31.12), foi alterada de novo a redação do artigo 90.º-A do CIRC (anterior artigo 90.º), estabeleceu-se que “1 - Não existe obrigação de efetuar a retenção na fonte de IRC, no todo ou em parte, consoante os casos, relativamente aos rendimentos referidos no nº 1 do artigo 88.º do Código do IRC quando, por força de uma convenção destinada a eliminar a dupla tributação ou de um outro acordo de direito internacional que vincule o Estado Português ou de legislação interna, a competência para a tributação dos rendimentos auferidos por uma entidade que não tenha a sede nem direção efetiva em território português e aí não possua estabelecimento estável ao qual os mesmos sejam imputáveis não seja atribuída ao Estado da fonte ou o seja apenas de forma limitada.

2 - Nas situações referidas no número anterior, bem como na alínea g) do n.º 2 do artigo 80.º, os beneficiários dos rendimentos devem fazer prova perante a entidade que se encontra obrigada a efetuar a retenção na fonte, até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos das normas legais aplicáveis:

a) Da verificação dos pressupostos que resultem de convenção destinada a eliminar a dupla tributação ou de um outro acordo de direito internacional ou ainda da legislação interna aplicável, através da apresentação de formulário de modelo a aprovar por despacho do Ministro das Finanças certificado pelas autoridades competentes do respetivo Estado de residência;

(…)

5 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, quando não seja efetuada a prova até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto, e, bem assim, nos casos previstos nos n.ºs 3 e seguintes do artigo 14.º, fica o substituto tributário obrigado a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos da lei.

6 - Sem prejuízo da responsabilidade contraordenacional, a responsabilidade estabelecida no número anterior pode ser afastada sempre que o substituto tributário comprove com o documento a que se refere o n.º 2 do presente artigo e os n.ºs 3 e seguintes do artigo 14.º, consoante o caso, a verificação dos pressupostos para a dispensa total ou parcial de retenção.”    A questão central a decidir nos presentes autos gira em torno de saber se se verificam, ou não, os pressupostos legais de dispensa de retenção na fonte de IRC, referidos no artigo 98.º do CIRC, relativamente aos rendimentos pagos pela Requerente à B..., SL, entidade residente para efeitos fiscais em Espanha (cfr. pontos dos factos provados).

A Administração Tributária desconsiderou como meio de prova o certificado de residência fiscal apresentado pela Requerente, em sede de reclamação graciosa, para efeitos do artigo 7.º do ADT celebrado por Portugal com o Estado da residência do beneficiário do rendimento (i.e., Espanha), tendo concluído pela não verificação dos pressupostos da consequente dispensa de retenção na fonte de IRC sobre os referidos rendimentos.

Para esse efeito invocou a Requerida, entre o mais, que, o despacho n.º 4743-A/2008, de 8/2, do Ministro das Finanças, aprovou os modelos de formulários para comprovação dos pressupostos de que depende a aplicação das convenções sobre dupla tributação internacional, destinados a solicitar a dispensa total ou parcial de retenção na fonte.

                Neste seguimento, existindo no direito interno uma norma como a do artigo 98.º do CIRC, que impõe a observância da apresentação do Modelo 21-RFI, não subsistem dúvidas de que, para acionar uma convenção para evitar a dupla tributação celebrada por Portugal, é indispensável a utilização do formulário de modelo oficial.

Formulário que, sublinha a Requerida, a Requerente não exibiu, nem durante o procedimento inspetivo, nem depois, em sede de reclamação graciosa ou de recurso hierárquico, o que viola o disposto no n.º 6 do artigo 88.º, conjugado com o n.º 5 do art.º 90.º-A, ambos do CIRC e disposições legais respeitantes ao momento em que ocorre a obrigação de efetuar Retenção na Fonte, segundo as quais os Formulários de Modelo oficial deverão ser apresentados à entidade pagadora, o mais tardar até ao dia 20 do mês seguinte àquele em que ocorreu o pagamento dos rendimentos decorrentes dos serviços prestados.

Realce-se que mesmo em sede do procedimento de recurso hierárquico, a pretensão da Requerente veio a ser indeferida, com fundamento na desconformidade do documento apresentado para justificar a dispensa de retenção na fonte sobre os serviços pagos à entidade B..., SL com o artigo 90.º-A, n.º 2, alínea a) do CIRC, na redação em vigor à data dos factos (atual artigo 98.º/ 2 a) do CIRC).

Finalmente, é de sublinhar que, no dia 4 de junho de 2015, a Requerente  procedeu à junção aos autos do certificado oficial Modelo 21-RFI emitido e autenticado pelas Autoridades Fiscais Espanholas, que confirma que a B..., SL, era no ano de 2008, uma entidade com residência fiscal em Espanha, o que motiva desde logo a procedência da presente petição arbitral.

Na ótica da Requerente, a questão ora controvertida consiste em determinar se o estabelecimento de um único meio legal de prova se mostrava compatível com a aplicação e execução das normas convencionais ou se pelo contrário tal exigência se mostra desproporcionada e coloca em causa de forma arbitrária a aplicação das referidas normas, em violação do artigo 8.º da CRP e do artigo 27.º do Tratado de Viena.

Vejamos.

A propósito da força jurídica em termos de prova daquele formulário e da necessidade, ou não, da respetiva apresentação para comprovar a verificação dos pressupostos legais conducentes à dispensa total ou parcial de retenção na fonte de IRC, pronunciaram-se diversas decisões judiciais e arbitrais, as quais, por merecerem a nossa concordância passamos a reproduzir.

Em relação ao momento da apresentação do referido formulário, bem como quanto ao valor jurídico da prova, apontamos o Acórdão do STA de 22.06.2011, prolatado no processo n.º 0283/11, cujo sumário se transcreve:

«I - Face à nova redacção dada pela Lei n.º 67-A/2007, de 31/12 (OE/2008), aos então art.ºs 90.º e 90.º-A do CIRC, a prova da residência dos beneficiários de rendimentos auferidos em Portugal, para efeitos de dispensa de retenção na fonte, em conformidade com o disposto nos actuais art.ºs 97.º e 98.º do CIRC, pode ser efectuada a posteriori.

II - Se à data da ocorrência dos factos tributários, não existia no direito interno norma que impusesse a observância das formalidades que viriam a ser exigidas pela AF através do Despacho n.º 11701/2003, de 28/5, da Ministra de Estado e das Finanças, publicado no DR, II Série, n.º 138, de 17/6/2003, não se podia impor aos interessados a obrigatoriedade de utilização, nesse momento, de tais formulários.

III - Estes formulários não constituem requisitos “ad substantiam”, sendo a prova de residência um mero requisito “ad probationem”, já que a certificação de residência é um acto de mero reconhecimento dos pressupostos dos benefícios previstos nas convenções, limitando-se a AF à confirmação desses pressupostos, sendo que, na verdade, o que releva é a efectiva verificação dos respectivos pressupostos, pelo que não devem aqueles formulários constituir o único meio de prova necessário para certificar a sua residência.

IV - Assim, ainda que não correspondendo ao modelo oficial actual, atestando os certificados de residência apresentados a residência, e mostrando-se certificados pela autoridade fiscal respectiva, devem os mesmos ser aceites pela AF como prova efectiva da residência dessas entidades.»

Também, neste sentido, vide Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 14.12.2016, no processo n.º 0141/14, onde, sem margem para qualquer dúvida, se pode ler: “Sendo os formulários documentos ad probationem e não ad substantiam há que admitir a prova de residência no estrangeiro baseada em certificados emitidos pelas autoridades respectivas face ao disposto no artigo 364.º/ 2 do Código Civil. Resultando, como se deixou dito, da interpretação do n.º 2 al a) do artigo 90.º-A do CIRC (anterior n.º 3 do artigo 90.º) que o formulário é apenas exigido como meio de prova, podendo ser apresentado no prazo aí consignado podia o mesmo ser substituído por documento estrangeiro de igual valor nos termos também do n.º 1 do artigo 365.º do Código Civil. Nessa medida o acórdão do TCA que julgou improcedente a liquidação adicional por considerar o formulário exigido como documento ad substantiam não pode manter-se”.

Resulta do exposto que, tendo os referidos formulários natureza meramente declarativa, podem ser apresentados a posteriori.

Por sua vez, quanto ao facto de não poder o legislador de um Estado, através de legislação interna, alterar de forma unilateral uma Convenção Internacional, atenta a supremacia desta, pode ler-se no sumário do atrás mencionado Acórdão do STA, de 14.12.2016, proferido no processo n.º 0141/14:

«I - Existindo convenção destinada a evitar a dupla tributação há, para efeitos de conhecer da dispensa de efectuar a retenção na fonte de IRC, que atender apenas aos pressupostos materiais convencionados.

II - As normas convencionais vinculam os Estados contratantes não podendo ser alteradas pela lei interna de um deles, dada a primazia do direito convencional sobre a lei interna.

III - Ainda que seja da competência de cada um dos estados contratantes regular as normas procedimentais para efeitos da aplicação da convenção não pode aproveitar-se tal facto para em norma procedimental alterar os pressupostos materiais de aplicação da convenção sob pena de violação das normas convencionadas e do disposto no n.º 1 do artigo 1.º da LGT.

IV - Resulta da interpretação dos artigos 103.º da CRP e 90.º do CIRC que os formulários exigidos como prova da dispensa da retenção na fonte de IRC dos rendimentos auferidos por entidades não residentes são meros documentos ad probationem pelo que podem ser apresentados “a posteriori” dentro dos prazos legalmente fixados podendo ser substituídos nos termos do artigo 364.º, n.º 2 do Código Civil.».

Este entendimento já foi também, de resto, expressamente sufragado em sede arbitral, designadamente, nas decisões dos processos n.ºs 715/2014-T, de 15.09.2016 e 605/2019-T, de 11.03.2020.

Em face do exposto, deve o indeferimento do recurso hierárquico ser anulado, com a consequente anulação parcial da liquidação impugnada, e respetivos juros compensatórios, com as legais consequências.

4. Pedido de restituição da quantia paga e juros indemnizatórios

A Requerente formula pedido de restituição da quantia arrecadada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, bem como o pagamento de juros indemnizatórios. Veja-se o que diz a Requerente no Pedido de Pronúncia Arbitral: Face ao exposto e à prova produzida nos presentes autos, requer-se a este Tribunal a revogação da decisão de indeferimento do recurso hierárquico ora sindicada e, consequentemente, a anulação parcial da liquidação ora sindicada, no valor de € 145.788,27, por violação do artigo 7.º do ADT entre Portugal e Espanha, tudo com as demais consequências legais, em particular a anulação parcial da liquidação dos correspondentes juros compensatórios e o direito da Requerente ao reembolso das quantias de imposto e juros indevidamente pagas por compensação efetuada pelo órgão de execução fiscal ao abrigo do artigo 89.º do CPPT, acrescidas dos correspondentes juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º da LGT.

Nos termos do n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, É devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário.

Nos termos do n.º 1 do artigo 43.º da Lei Geral Tributária (LGT), são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

Acontece que, no caso dos autos, conforme resulta do supra exposto, à data da elaboração das liquidações impugnadas, não dispunha a AT de quaisquer elementos que lhe permitissem não liquidar o imposto devido nos termos ora consignados, uma vez que a Requerente apenas fez a junção do certificado de residência após a elaboração das liquidações, concretamente aquando da apresentação da reclamação graciosa.

Assim, não poderá defender-se terem sido as liquidações impugnadas determinadas por errada aplicação da lei ou erro imputável aos serviços. A Requerente tem direito à reconstituição da situação que existiria sem a ilegalidade cometida, mas não aos juros indemnizatórios. 

Improcede, pois, a peticionada condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios.

5. Decisão Arbitral

Nestes termos, decide este Tribunal Arbitral Coletivo o seguinte:

a)            Julgar parcialmente procedente o pedido de anulação do indeferimento do recurso hierárquico;

b)           Em consequência anular parcialmente a liquidação n.º 2010..., no valor total no valor de € 145.788,27, e respetivos juros compensatórios;

c)            Julgar improcedente o pedido de juros indemnizatórios.

d)           Condenar a Requerida nas custas do processo, conforme ponto 7 (custas) da presente Decisão Arbitral.

6. Valor do processo

Nos termos do n.º 2 do artigo 306.º do CPC, alínea a) do n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT e n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, o valor do processo é fixado em € 145.788,27.

7. Custas

Entende este Tribunal Arbitral Coletivo que o valor a considerar para efeitos de determinação das custas no presente Pedido de Pronúncia Arbitral é o valor que motivou a constituição deste Tribunal Arbitral Coletivo, i.e., o valor de € 145.788,27, correspondente à importância cuja anulação a Requerente pretende e valor inicialmente indicado pela Requerente no Pedido de Pronúncia Arbitral.

Nos termos do n.º 2 do artigo 12.º e do n.º 4 do artigo 22.º, ambos do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 3.060,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária. 

Assim, o montante das custas fixado em € 3.060,00, fica a cargo da Requerida.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 13 de Novembro de 2020

 

Tribunal Arbitral Coletivo

 

Os Árbitros,

Fernanda Maçãs (Árbitro Presidente)

Dr. António Alberto Franco

Dr. Alexandre Andrade