SUMÁRIO: I - Nos anos de 1991, 1992 e 1993, os ganhos proporcionados por operações de swap com entidades não residentes, não estavam sujeitos a tributação e a pagamento de IRC, por tal não estar previsto pela alínea o) do art. 6º, nº 1 e pelo artigo 75º, do CIRS, na redação em vigor nesses anos de 1991 a 1993.
Decisão Arbitral
Os árbitros José Poças Falcão (árbitro-presidente), André Festas da Silva e Nina Aguiar (árbitros vogais) designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 12-03-2020, acordam no seguinte:
I. Relatório
A...- SUCURSAL EM PORTUGAL, com o número de pessoa colectiva e identificação fiscal ... e com sede na Rua ..., n.º...-..., ...-... Lisboa, doravante designada por "Requerente", na qualidade de representante em Portugal de B...- SUCURSAL EM PORTUGAL (adiante designada B...), pessoa coletiva nº ..., o qual cessou a sua actividade, apresentou, em 20-12-2019, nos termos do disposto no artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”) e ao abrigo do art. 11º, nº 1 do Decreto-lei nº 81/2018, de 11 de outubro, pedido de pronúncia arbitral, tendo em vista:
1) A declaração de ilegalidade e anulação da decisão de indeferimento de Recurso Hierárquico apresentado contra as liquidações adicionais de IRC, referentes aos exercícios de 1991 e 1993, com os n.ºs ... e ..., respetivamente.
2) A declaração de ilegalidade e anulação das liquidações adicionais de IRC, referentes aos exercícios de 1991 e 1993, com os n.ºs ... e ..., respetivamente.
3) A condenação da Requerida ao pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida, nos termos do art. 53º, nº1 da Lei Geral Tributária (LGT).
4) A condenação da Requerida ao pagamento de juros indemnizatórios nos termos do art. 43º da LGT.
É Requerida a ATA - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 23-12-2019.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitros os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 11-02-2020, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 12-03-2020.
Fundamentos do Pedido
O Requerente fundamenta o seu pedido nos seguintes fundamentos:
Os rendimentos de contratos de swap não se encontravam, nos anos em que foram gerados e pagos, sujeitos a tributação em IRS como rendimentos de capital;
Contrariamente ao que foi sustentado pela Administração Tributária, tais rendimentos não se encontravam nem expressamente previstos no art. 5º do IRS, nem implicitamente previstos na al. o) desse mesmo preceito, na redação vigente nos anos a que dizem respeito as liquidações (1991, 1992 e 1993).
A interpretação efetuada pela Administração Tributária sobre esse preceito, incluindo os rendimentos das operações de swap na previsão genérica da al. o) do art. 6º do CIRS, contraria e viola o princípio da legalidade dos impostos.
Também nunca tais rendimentos se qualificariam como rendimentos de capitais pois, sendo rendimentos obtidos por entidades bancárias no exercício da sua atividade comercial, seriam antes de qualificar como rendimentos comerciais, por força do art. 3º do Código do IRS.
As liquidações em causa violam, igualmente, as convenções sobre dupla tributação assinadas por Portugal com (alguns dos) Estados de residência das entidades contraparte nos contratos de swap em causa, pois tais convenções não permitem que os rendimentos em causa sejam tributados em Portugal, já que o termo “juros” definido nas CDT não abrange os rendimentos de swap.
Finalmente, também a isenção estabelecida no art. 30º do EBF (em vigor à data dos factos) que, no nº 1 e no nº 2, abrangia os vários tipos de rendimentos de operações de swap, quando tais rendimentos fossem pagos a entidade financeiras não residentes e, simultaneamente, não fossem imputáveis a estabelecimento estável daquelas instituições situado no território português.
O ato de indeferimento do recurso hierárquico interposto pelo B... é ainda ilegal por omissão de pronúncia, por não ter feito referência ou respondido à questão suscitada pelo Requerente relativa à violação das convenções sobre dupla tributação aplicáveis.
Resposta
A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu ao pedido da Requerente, defendendo a improcedência dos pedidos, com base nos seguintes fundamentos:
Não existe tratamento discriminatório da Requerente em relação às sociedades residentes.
As normas de direito da União Europeia que são invocadas (art. 56º do TFUE) para fundamentar uma violação desse direito, por parte das liquidações impugnadas, não têm efeito direto.
Tramitação subsequente
Por despacho de 09-07-2020, considerando tratar-se de processo não passível de uma definição de trâmites processuais específicos, diferentes dos comummente seguidos pelo CAAD na generalidade dos processos arbitrais, não haver exceções ou questões prévias a debater e decidir e não haver nem se revelarem úteis ou necessárias quaisquer outras diligências instrutórias, o Tribunal decidiu dispensar a realização da reunião prevista no art. 18º do RJAT e ordenar às Partes a apresentação de alegações escritas no prazo simultâneo de 20 dias.
II. SANEAMENTO
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e é competente.
As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão regularmente representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades.
III. QUESTÕES A DECIDIR
São a questões a decidir:
1) Se, nos anos 1991, 1992 e 1993, os ganhos proporcionados por uma operação de swap como as que o B... efetuou nesses anos, com entidades não residentes sem estabelecimento estável, estavam sujeitos ao pagamento de IRC por retenção na fonte.
2) Se, estando sujeitos a tal imposto, dele ficavam isentos por força do art. 30º do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
3) Se, ao não se referir, na respetiva fundamentação, a questão da violação das convenções sobre dupla tributação aplicáveis, a ora impugnada decisão sobre o recurso hierárquico ficou inquinada por vício de omissão de pronúncia.
IV. FUNDAMENTAÇÃO
1. MATÉRIA DE FACTO
A. O Banco B...- Sucursal em Portugal (aqui referido como B... Portugal) cessou a sua atividade em 01-03-2019.
B. O Banco C... passou, a partir dessa data, a ser representado em Portugal pelo banco A... - Sucursal em Portugal.
C. Nos anos de 1991, 1992 e 1993, o B... realizou os seguintes contratos de compra e venda com acordo de revenda de divisas com entidades não residentes:
Banco não residente Data de Início Data de Fim
Capital
inicial
(divisa)
(milhares) Capital
Reembolsado
(divisa)
(milhares) Capital
inicial
(PTE)
(milhares) Capital
Reembolsado
(PTE)
(milhares)
D... 18.4.91 20.05.91 5.000,000 5000,000 723.750,000 725.650,000
D... 18.4.91 20.05.91 5.000,000 5.000,000 724.000,000 730.000,000
E... 09.10.92 11-05-93 250,232 242,479 31.603,763 31.782,425
F... 19-01-93 20-11-93 10.242,404 10.239,537 1.500.000,000 1.500,000
G... 02-02-93 03-02-93 136,240 136,204 20.000,000 20.000,000
H... 19-05-93 21-06-93 10.000,000 10.000,000 1.547.900,000 1.564.400,000
B... 10-08-93 20-08-93 500,000 500,000 86.670,000 86867,500
B... 20-08-93 23-08-93 325,411 325,157 56.000,000 54.000,000
Y... 23-08-93 24-08-93 736,541 736,394 1.260.000,000 1.260.000,000
J... 10-08-93 16-08-93 1175,454 1173,313 204.000,000 204.000,000
I... NY 20-08-93 23-08-93 732,133 731,662 120.000,000 126.000,000
K... B 14-10-93 15-10-93 1.390,000 1.300,000 215.215,000 215.262,450
K... A 21-10-93 22-11-93 20.000,000 20.000,000 2.034.200,000 2.081.964,000
L... A 26-10-93 02-11-93 10.000,000 10.000,000 1.030.000,000 1.030.965,000
D. Em todos estes contratos, o Requerente efetuou uma compra de divisa estrangeira contra a entrega de escudos, obrigando-se a, dentro de prazo estipulado, recomprar os escudos à contraparte, contra a entrega da divisa recebida ou de outra divisa.
E. Com base na Credencial nº 2004/94, de 26-11-1994, foi efetuado um exame à contabilidade do B... .
F. O Ponto 6.3 do Relatório do Exame à Escrita Intitula-se “Operações de Swap” e diz:
“Face às alterações introduzidas ao artigo 6º do CIRS pela Lei nº 31/95, de 18/08, e porque se trata de uma norma de natureza interpretativa, no que respeita ao nº 4 daquele preceito, procedeu-se à validação do cumprimento, por parte do sujeito passivo, das obrigações fiscais daí decorrentes quanto às operações de swaps por si efetuadas, limitadas, segundo informação verbal a swaps de divisas.
Sendo os swaps operações do mercado cambial que se traduzem numa troca de divisas simultaneamente à vista e a prazo, a taxas de câmbio previamente acordadas, refletem-se diretamente na Posição Cambial da instituição, conta 59000, cujos extratos, por divisas, evidenciam um número pouco significativo deste tipo de transações, embora envolvendo valores na ordem dos milhões com maior incidência nas divisas: Dólares (USD); Marcos (DEM); Libras (GBP); Francos Franceses (FRF).
O diferencial entre as taxas de câmbio das operações à vista e a prazo expressa-se num prémio ou desconto e resulta do diferencial de taxas de juro existentes entre as duas moedas.
Sempre que o banco compra uma divisa à vista e a vende a prazo a um câmbio mais elevado ganha um prémio que o compensa do facto de ter posto à disposição da outra parte a divisa cuja taxa de juro é mais elevada do que a por si tomada.
Se comprar a divisa à vista e a vender a prazo a uma taxa inferior paga um desconto compensado deste modo o outro interveniente por ter aceite uma divisa com taxa de juro mais baixa do que a que cedeu em troca.
Neste contexto, propusemo-nos verificar todas as operações de swaps com as divisas que apresentaram maior movimento nos exercícios em análise e que pela sua génese constituíram um desconto para o banco e consequentemente um prémio para a outra parte que interveio na negociação.
Todavia é provável que a análise tenha ficado aquém da exaustão, porquanto se verificou que operações identificadas nos extratos da conta 59000 como swaps correspondia a operações cambiais a prazo efetuadas isoladamente (outright), admitindo-se, naturalmente, que a situação contrária também possa ter acontecido.
Da análise proposta detetaram-se as seguintes situações (Anexos G2, G3 e G4):
- As operações de swaps foram realizadas na quase totalidade com sucursais de instituições de crédito residentes e uma percentagem diminuta com instituições não residentes, sendo a participação de empresas residentes meramente pontual. Os prazos das transações variaram entre um dia e um ano.
- O Escudo foi a moeda tomada ou oferecida na maioria das transações, embora se tenham realizado swaps cruzados (cross) isto é, que envolveram troca de divisas estrangeiras.
- Os movimentos de divisas fazem-se por simples registo de débito e crédito em contas bancárias, que as partes possuem em bancos situados no exterior, não havendo saídas reais de moeda dos países de origem.
- Por sua vez, o prémio ou desconto existente entre as duas moedas negociadas reflete-se nas contas 809420 e 709420, respetivamente.
As operações são negociadas através de mediadores (brokers) e cambistas (dealers) e confirmadas de imediato por swift ou telefax em cuja mensagem se faz referência à identificação dos intervenientes, montante das moedas trocadas, datas da operação à vista e vencimento do contrato, taxas de câmbio à vista e a prazo e contas de depósitos por onde se processam as transferências de fundos.
Em simultâneo o banco processa dois documentos internos: um, referente à operação à vista e outro à operação a prazo onde é vertida a mesma informação.
- Grande parte das operações selecionadas não foram documentalmente comprovadas (Anexo G1), outras foram-no em parte e só em relação a um número diminuto foram facultados todos os documentos.
O sujeito passivo alegou dificuldades de localização no arquivo relacionadas com as mudanças ocorridas em 92 no sistema informático do banco.
- Os montantes das divisas negociadas são movimentadas em contas de depósitos em PTEs, que O. B... (sic) e as instituições de crédito residentes que operam como intermediários ou bancos correspondentes nas operações cambiais possuem no Banco de Portugal ou em contas existentes em bancos situados no estrangeiro paras as demais divisas (contas nostro).
- Não foi possível verificar se as transações, quando realizadas com instituições de crédito, são objeto de relevação contabilística em conta de depósitos à ordem existente no B... e das quais os credores dos prémios sejam titulares.
- Não foi liquidado IRC sobre os resultados das operações de swap efetuadas.
Perante as situações descritas somos de parecer que:
A) Se os prémios decorrentes das operações de swap pagos pelo sujeito passivo à outra parte contratante, instituições de crédito, não constituírem remuneração de depósitos por não serem creditados em contas de depósito existentes no B... e das quais os credores sejam titulares, é nosso entendimento, que os juros a pagar pela moeda da qual se passa a dispor durante o período convencionado configuram rendimentos de aplicação de capitais com enquadramento na alínea o) do art. 6º do CIRC e sujeito a retenção na fonte, nos termos da alínea c) do art. 75º do CIRC.
B) Se os referidos prémios constituírem remuneração de depósitos creditados em contas existentes no B... de que os credores sejam titulares, afigura-se serem de incluir na al. b) do nº 1 do CIRS, sujeitos a retenção na fonte nos termos da al. c) do art. 75º do CIRC.
Em face do exposto os prémios pagos a instituições de crédito residentes ou respetivas sucursais, estão dispensados de retenção de IRC, ao abrigo do disposto no nº 1 do art. 10º do Decreto-lei nº 215/89, de 1 de julho, diploma que aprovou o Estatuto dos Benefícios Fiscais.
No que respeita aos prémios pagos a instituições não residentes foi apurado IRC em falta no montante de 5 525 a 2 380 contos, referentes aos exercícios de 91 e 93, respetivamente (Anexos G2 e G4).
Nas trocas em que a moeda swapada foi uma divisa estrangeira, o que significa ser o seu montante igual no início e fim do swap, o prémio subjacente expressa-se em PTEs e corresponde à diferença positiva entre o valor de venda a prazo e o de compra à vista.
Se a moeda swapada foi o Escudo, então o prémio expressa-se na outra divisa negociada e traduz-se na diferença positiva entre o valor de venda à vista e o de compra a prazo, uma vez o acréscimo patrimonial do titular do prémio advir do facto de, no fim da operação trocar os mesmos PTEs por menos divisa.
Idêntico raciocínio se aplica aos swaps cruzados.
Por último, refira-se que para efeitos de apuramento de imposto os prémios em moeda estrangeira foram convertidos para PTEs ao câmbio médio do dia do vencimento da operação de swap.”
G. Na sequência do relatório de inspeção, foram emitidas as liquidações adicionais de IRC:
Nº..., de 06/11/1996, com o montante de imposto a pagar de PTE 4.879.782$00, referente ao ano 1991, sendo PTE 2.380.000$00 e PTE 2.499.782$00 de juros compensatórios.
Nº..., de 21/11/1996, com o montante de imposto a pagar de PTE 8.807.122$00, referente ao ano 1993, sendo PTE 5.525.167$00 de imposto e PTE 3.281.955$00 de juros compensatórios.
H. Em 27-02-97, o B... apresentou reclamação graciosa contra as liquidações referidas em G).
I. Na sequência da reclamação graciosa apresentada, o B... foi notificado, por despacho de 07-09-01, para exercer o direito de audição prévia sobre projeto de indeferimento parcial dessa reclamação.
J. o B... exerceu o direito de audição prévia.
K. Após esta pronúncia, o B... foi notificado, por despacho de 12-11-01, de segundo projeto de decisão, de indeferimento total da reclamação graciosa.
L. O B... foi notificado do indeferimento definitivo da reclamação graciosa por despacho de 02-01-02.
M. O B... interpôs recurso hierárquico das liquidações reclamadas, o qual foi tramitado na Divisão de Justiça Administrativa da Direção de Finanças de Lisboa com o nº de processo RHQ... .
N. O B... foi notificado do indeferimento do recurso hierárquico mencionado em M. por despacho de 12-10-11.
O. Em abril de 2012, a B... impugnou as liquidações reclamadas e recorridas junto do Tribunal Tributário de Lisboa, tendo a impugnação sido liminarmente admitida por despacho de 17-07-2012 e corrido termos sob o nº .../12...BELRS.
P. O B... requereu, nos termos do artigo 11º, do DL nº 81/2018, a extinção da instância neste processo, após o que apresentou no CAAD, em 23-12-2019, o presente pedido de pronúncia arbitral.
Os factos indicados foram dados como provados com base na prova documental junta pelas Partes aos Autos e, em certos casos, com base em alegação por uma das Partes sem que se tenha verificado contestação pela Parte contrária.
Não ficaram provados os seguintes factos:
Q. Que o B... tenha constituído garantia bancária para suspensão da execução do imposto correspondente às liquidações impugnadas.
R. Que o B... tenha pago o imposto correspondente às liquidações impugnadas.
2. Matéria de direito
2.1 Enquadramento dos rendimentos de swaps cambiais na al. o) do art. 6º, nº 1 do CIRS, na redação em vigor nos anos de 1991 a 1993.
À data dos factos (anos de 1991 a 1993), o Código do IRC, no seu artigo 75º estipulava:
1 - O IRC é objecto de retenção na fonte relativamente aos seguintes rendimentos obtidos em território português:
c) Rendimentos de aplicação de capitais não abrangidos nas alíneas anteriores e rendimentos prediais, tal como são definidos para efeitos de IRS, quando o seu devedor seja sujeito passivo de IRC ou quando os mesmos constituam encargo relativo à actividade comercial, industrial ou agrícola de sujeitos passivos de IRS que devam possuir contabilidade;
(...)
5 - Exceptuam-se do disposto no número anterior as retenções que, nos termos do n.º 3, tenham carácter definitivo, em que são aplicáveis as taxas previstas no n.º 2 do artigo 69.º
O art. 69º do mesmo Código dizia:
2 - Tratando-se de rendimentos de entidades que não tenham sede nem direcção efectiva em território português e aí não possuam estabelecimento estável ao qual os mesmos sejam imputáveis, a taxa do IRC é de 25%, excepto relativamente aos seguintes rendimentos:
(...)
c) Outros rendimentos de aplicação de capitais, exceptuados os de quaisquer títulos nominativos ou ao portador, em que a taxa do IRC é de 20%.
Assim, qualquer rendimento que devesse qualificar-se “de capital”, cujo pagamento fosse devido por um sujeito passivo de IRC a um não residente sem estabelecimento estável, ficava sujeito a pagamento de IRC por retenção na fonte a título definitivo, à taxa de 20%.
A qualificação como “rendimento de capital” deveria fazer-se nos termos definidos para efeitos de IRS, o que continha uma remissão para o art. 6º do Código do IRS, o qual enumerava os rendimentos de capital para efeitos deste imposto.
O art. 6º, al. o) do Código do IRS, por seu turno, não continha, à data, qualquer menção específica a rendimentos de contratos de swap, mas dizia:
[1. Consideram-se rendimentos de capitais:]
o) Quaisquer outros rendimentos derivados da simples aplicação de capitais.
A Lei nº 31/95 de 18-08 acrescentou ao art. 6º do CIRS a al. p) que dizia então:
[1. Consideram-se rendimentos de capitais:]
p) O ganho, seja qual for a designação que as partes lhe atribuam, resultante de contratos de venda de moeda depositada numa conta de depósito à ordem ou a prazo em instituições de crédito.
O Decreto-Lei 257-B/96, de 31-12, através do qual o legislador expressamente visou criar um enquadramento fiscal, no âmbito específico dos impostos sobre o rendimento, para os instrumentos financeiros derivados, alterou a alínea p) do art. 6º do CIRS, a qual passou a ter a seguinte redação:
p) O ganho decorrente de operações de swaps cambiais, swaps de taxa de juro, swaps de taxa de juro e divisas e de operações cambiais a prazo, desde que, neste último caso, tenham subjacente um elemento, designadamente depósitos ou valores mobiliários, que assegure a cobertura do risco.
A Autoridade Tributária considerou que esta alteração legislativa teve caráter meramente interpretativo, pois os rendimentos de swaps eram, por natureza, rendimentos decorrentes da aplicação de capitais; e, consequentemente, que os rendimentos dos contratos de swap (prémios) pagos pelo B... a entidades não residentes e não imputáveis a estabelecimento estável dessas entidades em Portugal, devendo qualificar-se como rendimentos de capital por força da al. o) do art. 6º do CIRS, ficavam por esse motivo sujeitos a IRC, por retenção na fonte, por força da al. c) do nº 1 do art. 75º.
Sendo assim, a entidade devedora dos rendimentos – o B...– estaria obrigada a proceder a retenção na fonte, constituindo-se ela própria, na falta de cumprimento da obrigação de retenção na fonte, devedora do imposto.
Vejamos se este entendimento deve prevalecer.
Apesar de se encontrarem, na bibliografia portuguesa como na estrangeira, abundantes definições de contrato de swap, e nem sempre coincidentes, talvez seja mais importante e mais útil começar por sublinhar que, sendo “os contratos de swap contratos nominados, uma vez que se encontra fixado na lei o seu nomen iuris, não deixam por isso de ser contratos atípicos, pois que a mesma lei não define para eles um modelo regulativo típico (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 13-05-2013, em que foi relatora a Juíza Desembargadora Maria do Rosário Morgado, referente ao processo 309.11.8TVLSB.L1-7).
Não definindo a lei o conteúdo nuclear do contrato de swap, é possível encontrar na prática operações muito diversas a que as partes dão, e a que na gíria financeira se dá, o nome de swap mas que poucas características, na verdade, têm em comum.
Daí que as definições do contrato de swap dadas pelos autores que entre nós têm estudado a figura nos surjam com uma latitude que permite cobrir um leque amplo de possibilidades de desenho concreto de contratos financeiros, mas que de pouca ajuda se revelam a quem procure, através dessas definições, compreender a lógica ou a essência deste tipo de contratos.
Assim, Clara Calheiros, por exemplo, define swaps como uma família de contratos, pelos quais se estabelece entre as partes uma obrigação recíproca de pagar, de acordo com modalidades pré-estabelecidas, na mesma divisa ou em diferentes divisas, certas quantias de dinheiro calculadas por referência aos fluxos financeiros ligados a ativos e passivos monetários, reais ou fictícios, ditos subjacentes” (in CALHEIROS, M. Clara, O Contrato de Swap, Coimbra, Coimbra Editora, 2000).
Mas já o Regulamento UE n.º 549/2013 do Parlamento e do Conselho de 21 de Maio de 2013, relativo ao Sistema Europeu de Contas Nacionais e Regionais na União Europeia, no ponto 5.210 do seu Anexo A (relativo às Normas, definições, nomenclaturas e regras contabilísticas comuns que devem ser utilizadas para elaborar contas e quadros), define swaps como “acordos contratuais entre duas partes que acordam na troca, ao longo do tempo e segundo regras predeterminadas, de uma série de pagamentos correspondentes a um valor hipotético de capital, entre elas acordado.”
Ao contrário da definição de Clara Calheiros, a definição do Regulamento não considera nuclear do conceito que as quantias de dinheiro que as partes contratantes se obrigam reciprocamente a pagar sejam ou não calculadas por referência aos fluxos financeiros ligados a ativos e passivos monetários, reais ou fictícios, ditos subjacentes.
Por outro lado, no seio da “família de contratos” que dá pelo nome de swap na terminologia financeira, parece haver unanimidade em que se destacam três tipos fundamentais, os quais se encontram também assim diferenciados no Regulamento.
São eles os swaps de taxa de juro, os swaps cambiais e os swaps de divisas.
De acordo com o Regulamento, os swaps de taxa de juros “consistem na troca de juros de diferentes tipos relativos a um capital hipotético que nunca é trocado. Exemplos de taxas de juro que podem ser objeto de swaps: taxas fixas, taxas variáveis e taxas denominadas numa divisa. Geralmente, os pagamentos ocorrem em numerário e correspondem à diferença entre as duas taxas de juro estipuladas no contrato e que se aplicam ao capital hipotético que foi acordado”.
Os swaps cambiais serão, na definição do Regulamento, “transações em divisas estrangeiras a uma taxa de câmbio definida no contrato.”
Por fim, os swaps de divisas, ainda de acordo com esse normativo europeu, envolvem uma troca de fluxos de caixa no correspondente ao pagamento de juros e, no final do contrato, uma troca de capital a uma taxa de câmbio acordada.”
A fim de clarificar as diferenças entre estas formas de swap, vejamos ainda o que sobre elas diz ANTUNES, J. E., Os instrumentos financeiros, Almedina, Coimbra, 2009, p. 120. Diz este autor “que é possível distinguir (...) entre duas modalidades fundamentais: os “swaps” de divisas e de juros. Nos “swaps” de divisas (“currency swaps”, “Währungsswap”) – a forma historicamente primogénita deste tipo de derivado – as partes acordam permutar ou trocar entre si quantias pecuniárias expressas em duas moedas diferentes, calculadas mediante a aplicação de uma taxa de câmbio predeterminada: estes contratos podem implicar meramente a troca do capital (“currency swaps” simples) ou envolver simultaneamente a troca de juros periódicos (“cross-currency swaps”), a qual pode ser realizada a taxa fixa para ambas as partes (“fix to fix swap”), a taxa fixa para uma das partes e taxa variável para a outra (“circus swap”), ou a taxas variáveis, embora indexadas a diferentes referenciais, para ambas as partes (“floating to floating swap”) Já nos “swaps” de juros (“interest rate swaps”, “Zinssatzswap”) – aliás, hoje bastante mais frequentes e relevantes –, as partes contratantes acordam trocar entre si quantias pecuniárias expressas numa mesma moeda, representativas de juros vencidos sobre um determinado capital hipotético, calculados por referência a determinadas taxas de juro fixas e/ou variáveis: estes contratos podem também, por seu turno, revestir duas variantes fundamentais, consoante o cálculo dos juros de uma das partes se realiza a taxa fixa e o da outra a taxa variável (“coupon swap”) ou mediante a aplicação a ambas de taxas variáveis definidas em bases distintas (“basis rate swap”).”
Independentemente das designações adotadas, é claro existir um tipo de contrato swap em que as partes acordam trocar entre si quantias pecuniárias expressas numa mesma moeda, representativas de juros vencidos sobre um determinado capital hipotético, calculados por referência a determinadas taxas de juro fixas e/ou variáveis.
Lebre de Freitas (Contrato de Swap meramente especulativo. Regimes de validade e de alteração de circunstâncias, R.O.A., Ano 72, Vol. IV Outubro/Dezembro, 2012, Lisboa. p. 949) refere-se assim a este tipo de contrato: “o swap apareceu, por isso, com a função de cobrir o risco inerente a uma operação económica subjacente. Uma empresa contrai um empréstimo bancário, mas receia que a taxa de juro, indexada a um valor variável, se lhe torne insuportável; ou, contratando a prazo a importação ou a exportação de certa mercadoria, receia que a taxa de câmbio se lhe torne desfavorável. Troca por isso a taxa de juro ou de câmbio variável por uma taxa fixa, assim se garantindo contra as flutuações de mercado que receia.”
Assim, podemos assentar que nesta primeira modalidade de swap – que não terá sido a primeira a surgir historicamente – que será o “swap de taxas de juro”, se encontram subjacentes, isto é existindo anteriormente ao swap, dois empréstimos, titulados do lado passivo por duas partes independentes, com taxas de juro diferentes: um com uma taxa flutuante, de maior risco, e outro com uma taxa fixa. Os dois titulares obrigam-se mutuamente, perante uma terceira entidade – o credor dos créditos subjacentes – a pagar os juros da outra parte. Para a parte obrigada por uma taxa flutuante, trata-se de eliminar o risco de uma possível variação desfavorável, enquanto para a parte obrigada a uma taxa fixa, o swap constitui uma operação especulativa, baseada na aceitação dum maior risco, mas também na possibilidade de um maior ganho.
Numa segunda modalidade, o swap tem como função duas trocas sucessivas de divisas. Num primeiro momento – na parte da operação “à vista”, as partes trocam entre si uma quantidade de divisas a um câmbio acordado, e num segundo momento (parte da operação a prazo) as partes voltam a comprar a divisa que entregaram, a um câmbio determinado no momento inicial.
Este swap sobre divisas pode ser simples, se apenas se troca o capital em diferentes divisas (swap de divisas simples), ou pode envolver também uma troca de taxas de juro, partilhando neste caso elementos com o swap de taxas de juro (cross-currency swaps), sendo que esta segunda modalidade é usada em particular quando existem subjacentes empréstimos em duas diferentes moedas, cada um com a sua taxa de juro.
Ora, não sendo nosso intuito delimitar rigorosamente os vários conceitos – o que, de resto, se afigura tarefa impossível e até talvez metodologicamente errada, dada a insuperável indefinição do termo swap, acriticamente recebido da gíria financeira pelo legislador – pode retirar-se do que foi dito com razoável segurança, indo agora ao que interessa à matéria dos autos, que, em algumas situações, o ganho que o swap proporciona a uma das partes resulta de um diferencial de taxas de juro. No entanto, outros casos existem em que não se pode afirmar que o ganho obtido no final do swap resulta de um diferencial de taxas de juro, pois que nenhumas taxas de juros são diretamente tidas em conta.
Vejamos agora em que consistiam os contratos de swap efetuados pelo BB Plc Portugal.
Nas datas a que se reportam os factos – anos de 1991, 1992 e 1993 – essa sucursal tinha dificuldades em obter certas divisas.
Através de swaps de divisas, essa sucursal obtinha as divisas de que necessitava.
Por exemplo, se o B... Portugal necessitava de marcos, contrataria um swap dessa divisa com um banco alemão. O B... Portugal entregava ao banco alemão uma determinada quantidade de escudos, recebendo em troca uma determinada quantidade de marcos, ao câmbio da data da operação (à vista). Ficando desde logo estipulado que, dentro de um determinado prazo, por exemplo um mês, o B... Portugal devolveria os marcos ao banco alemão, recebendo de volta os escudos inicialmente entregues. Pela operação, o B... Portugal pagava um prémio ao banco alemão, que se poderia traduzir em receber uma quantidade de escudos menor que a inicialmente entregue, ou em pagar uma quantidade de marcos maior que a inicialmente recebida.
Ora, a Autoridade Tributária, em face destes contratos, afirma: i) em primeiro lugar, que o ganho que eles proporcionaram resultou de um diferencial de taxas de juro; e ii) em segundo lugar, que se trataria sempre de um rendimento proveniente de uma aplicação de capital e, por conseguinte, o ganho gerado seria sempre um rendimento de capital nos termos da al. o) do art. 6º do CIRS.
Estas duas premissas, qualquer delas carecendo de demonstração, serviram de fundamento às liquidações impugnadas.
Quanto à primeira, não cremos que se possa afirmar que o ganho proporcionado por um contrato de swap de divisas simples como os que estão em causa seja o diferencial de duas taxas de juro. A não ser que a Autoridade Tributária sustentasse que a desvalorização de uma divisa face a outra seria uma consequência da diferença de taxas de juros de referência das duas moedas. Mas então a Autoridade Tributária estava obrigada a expor e a sustentar este argumento, coisa que não fez, e de qualquer forma só de forma indireta o prémio do swap se relacionaria com um diferencial de taxas de juro.
Quanto à segunda premissa - que se trataria sempre de um rendimento proveniente de uma aplicação de capital – vejamos o que se retira da evolução legislativa.
À data dos factos relevantes, o art. 6º do CIRS não mencionava expressamente, como já se disse, os rendimentos de contratos de swaps.
A al. o) do art. 6º CIRS dizia:
[1. Consideram-se rendimentos de capitais:]
o) Quaisquer outros rendimentos derivados da simples aplicação de capitais.
Em 1995, o legislador fez uma primeira alteração, em que ainda não mencionava o termo swaps, mas que já visava atingir os ganhos gerados por estes contratos, ao art. 6º, nº 1, al p), que passou a ter a seguinte redação:
[1. Consideram-se rendimentos de capitais:]
p) O ganho, seja qual for a designação que as partes lhe atribuam, resultante de contratos de venda de moeda depositada numa conta de depósito à ordem ou a prazo em instituições de crédito.
Em 1996, o legislador incluiu no art. 6º do CIRS, pela primeira vez, uma referência expressa aos rendimentos de swaps.
[1 - Consideram-se rendimentos de capitais:]
p) O ganho decorrente de operações de swaps cambiais, swaps de taxa de juro, swaps de taxa de juro e divisas e de operações cambiais a prazo, desde que, neste último caso, tenham subjacente um elemento, designadamente depósitos ou valores mobiliários, que assegure a cobertura do risco.
O preâmbulo do diploma legal que procedeu a esta alteração (D.L. 257-B/96 de 31 de Dezembro) é elucidativo, no que diz respeito à sua inovação: “O regime fiscal de novos instrumentos financeiros em matéria de imposto do selo deu lugar ao Decreto-Lei n.º 85/96, de 29 de Junho. Pretende-se agora estabelecer o regime desses instrumentos quanto a impostos sobre o rendimento.”
Subsequentemente, a Lei 30-G/00, de 29 de Dezembro voltou a alterar o art. 6º, nº 1, aditando-lhe uma alínea q) que passou a dizer:
[2. Os frutos e vantagens económicas referidas no número anterior compreendem, designadamente:]
q) O ganho decorrente de operações de swaps cambiais, swaps de taxa de juro, swaps de taxa de juro e divisas e de operações cambiais a prazo, desde que, neste último caso, tenham subjacente um elemento, designadamente depósitos ou valores mobiliários, que assegure a cobertura do risco
Já em 2001, o Decreto-Lei n.º 198/2001, de 3 de Julho republicou o CIRS, renumerando as disposições em causa e passando o anterior artigo 6º a 5º. A redação da norma não foi alterada, continuado a dizer:
[2 - Os frutos e vantagens económicas referidas no número anterior compreendem, designadamente:]
q) O ganho decorrente de operações de swaps cambiais, swaps de taxa de juro, swaps de taxa de juro e divisas e de operações cambiais a prazo, desde que, neste último caso, tenham subjacente um elemento, designadamente depósitos ou valores mobiliários, que assegure a cobertura do risco.
Com essa mesma lei, foi introduzida uma importante alteração ao art. 10º, nº 1, al. e) do CIRS que passou, pela primeira vez, a mencionar as operações de swap, dizendo:
[1 - Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de:]
e) “Operações relativas a instrumentos financeiros derivados, com excepção dos ganhos previstos na alínea q) do n.º 2 do artigo 5.º.”
Esta alteração é de especial relevância para a compreensão da evolução em torno da tributação dos ganhos gerados em operações de swap, uma vez que alguns desses ganhos passam a ser considerados mais-valias, o que já permite concluir que, ao contrário do sustentado pela AT em 1994, nem todos os ganhos provenientes de contratos de swap são rendimentos de capital.
Ainda no ano 2001, a Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, voltou a alterar a al. q) do nº 2 do art. 5º (anterior art. 6º) do CIRS, que passou a dizer:
[2 - Os frutos e vantagens económicas referidas no número anterior compreendem, designadamente:]
q) O ganho decorrente de operações de swaps cambiais, swaps de taxa de juro, swaps de taxa de juro e divisas e de operações cambiais a prazo.
Finalmente, com a republicação do CIRS pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de dezembro, o art. 5º, nº 2, al. q) passa a ter a seguinte redação:
[2 - Os frutos e vantagens económicas referidos no número anterior compreendem, designadamente:]
q) O ganho decorrente de operações de swaps de taxa de juro;
Com esta mesma lei, a al. e) do nº 1 do art. 10º não sofreu alteração, continuando a dizer:
[1 - Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de:]
“Operações relativas a instrumentos financeiros derivados, com excepção dos ganhos previstos na alínea q) do n.º 2 do artigo 5.º.”
Retiram-se desta evolução legislativa duas conclusões. A primeira, que entre 1995 e 2014, o legislador fiscal não cessou de rever a natureza dos rendimentos dos contratos de swap; e a segunda, que, hoje, o legislador considera como rendimento de capital, apenas, o ganho decorrente de um tipo particular de swap, e esse é o swap de taxa de juro.
Os ganhos de quaisquer outras operações de swap são tributados como mais-valias.
Com isto concluímos dizemos que, até 1995, nem a lei (art. 6º do CIRS) qualificava expressamente os rendimentos de swap como rendimentos de capitais, nem era correto afirmar que tais rendimentos, no caso de swaps de divisas, se incluíam na al. o) – a qual dizia [1. Consideram-se rendimentos de capitais:] (...) o) Quaisquer outros rendimentos derivados da simples aplicação de capitais – uma vez que, na evolução posterior, o legislador veio a incluir na categoria de rendimentos de capitais, de forma inequívoca, apenas os rendimentos gerados em contratos de swap de taxas de juros.
E assim sendo, há que concluir que os rendimentos dos swaps de divisas, como os que foram praticados pelo Representado do Requerente nos anos 1991 a 1993, e que deram origem às liquidações impugnadas, não eram enquadráveis, nessas datas, como rendimentos de capitais e, portanto, sobre eles não podia incidir qualquer tributação ao abrigo do art. 6º, nº 1, al. o) CIRS, como foi.
Com o que se deve concluir, antecipando o conteúdo da decisão, pela ilegalidade das liquidações impugnadas por erro nos pressupostos de direito.
2.2 Questões de conhecimento prejudicado
Sendo de anular as liquidações impugnadas com fundamento em vício de violação de lei, que assegura eficaz tutela dos interesses da Requerente, fica prejudicado, por ser inútil, o conhecimento dos restantes vícios arguidos [artigos 103.º e 608.º, n.º 2, do CPC, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT].
2.3 Juros compensatórios
Os juros compensatórios, no caso, foram liquidados e a sua notificação foi efetuada com a própria liquidação de imposto, pelo que a liquidação do imposto e a liquidação de juros compensatórios se contêm nos atos impugnados.
Ao declarar-se a ilegalidade das liquidações, fica também declarada a ilegalidade da liquidação de juros compensatórios.
De qualquer modo, as liquidações de juros compensatórios têm como pressuposto as liquidações de IRC impugnadas (artigo 35.º, n.º 8, da LGT), pelo que enfermam dos vícios que afetam estas, por isso se justificando também a sua anulação.
2.4 Indemnização por garantia indevida
Não ficou provado que o B... tenha constituído garantia bancária para suspensão da execução do imposto correspondente às liquidações impugnadas.
Por conseguinte, não pode o Tribunal condenar a Requerida ao pagamento da indemnização prevista no art. 53º da LGT, sem prejuízo de o eventual direito a essa indemnização poder ser exercido em processo autónomo de execução do julgado.
2.5 Direito a juros indemnizatórios
Também não ficou provado que o B... tenha pago o imposto correspondente às liquidações impugnadas, pelo que também não pode o Tribunal condenar a Requerida ao pagamento de juros indemnizatórios nos termos do art. 43º da LGT, sem prejuízo de o eventual direito a juros indemnizatórios poder ser exercido em processo autónomo de execução do julgado.
V. Decisão
Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
b) Anular a decisão de indeferimento do Recurso Hierárquico interposto pelo C..., Representado do Requerente, contra as liquidações de IRC número ..., referente ao ano de 1991, e número ..., referente ao ano de 1993, que correu termos na Divisão de Justiça Administrativa da Direção de Finanças de Lisboa com o número de processo RHQ ....
c) Anular as liquidações de IRC número..., referente ao ano de 1991, e número..., referente ao ano de 1993.
d) Julgar improcedente o pedido de indemnização por garantia indevida e absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira deste pedido.
e) Julgar improcedente o pedido de juros indemnizatórios por pagamento indevido de imposto e absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira deste pedido.
VI. Valor do processo
De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 68.269,98.
VII. Custas
Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 2 448,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 12 de outubro de 2020
Os Árbitros
José Poças Falcão
(Árbitro-presidente)
André Festas da Silva
(Árbitro Vogal)
Nina Aguiar
(Árbitro Vogal)