DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros Conselheiro Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. Rui Ferreira Rodrigues e Dr.ª Carla Almeida Cruz (árbitros vogais) designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 05-08-2020, acordam no seguinte:
1. Relatório
A..., S.A., doravante designada "Requerente" ou “A...", com sede na Rua ... n.º..., em Lisboa, titular do número único de matrícula e de identificação de pessoa coletiva..., veio, nos termos do disposto no artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), requerer a constituição de Tribunal Arbitral, tendo em vista:
– a anulação da decisão que indeferiu o Recurso Hierárquico n.º ...2018...;
– a declaração de ilegalidade e anulação parcial da demonstração de liquidação de imposto do selo n.º 2017..., de 29-12-2016, e a respetiva liquidação de juros compensatórios, respeitantes ao exercício de 2014, no montante de € 674.995,89 e € 64.707,65, respetivamente, por violação do nº 2 do artigo 28.º da LGT;
– a condenação da Administração Tributária a restituir o imposto pago e, bem assim, dos respetivos juros compensatórios pagos, no montante total de € 739.703,54;
– ser reconhecido o direito do Requerente ao pagamento de juros indemnizatórios vencidos sobre o montante de € 739.703,54, contados, à taxa legal de 4% ao ano, ou de outra que venha a ser fixada até à data da emissão da nota de crédito em que esses juros indemnizatórios devem ser incluídos, desde a data em que foi efetuado o pagamento, até à data da emissão da nota de crédito em que esses juros indemnizatórios devem ser incluídos, condenando-se a AT no pagamento desses mesmos juros indemnizatórios.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 18-02-2020.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitros os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 06-07-2020, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 05-08-2020.
A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.
Por despacho de 24-09-2020, foi dispensada a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e alegações.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e é competente.
As Partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
A. O A... é uma instituição de crédito do tipo caixa económica bancária, cujo objecto social consiste na realização das operações descritas no artigo 4.º, nº 1 do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei nº 298/92, de 31 de Dezembro;
B. Em cumprimento da ordem de serviço n.º Ol 2016..., de 2 de Março de 2016, a Divisão de Inspeção a Bancos e Outras Instituições Financeiras da Unidade dos Grandes Contribuintes da AT procedeu a uma ação de inspeção externa de âmbito geral à Requerente, com referência ao exercício de 2014;
C. Nessa inspecção foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária que consta do documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:
II.3.3.3 Imposto do Selo
Quanto ao Imposto do Selo, a Caixa, enquanto Instituição de Crédito, aproveita da isenção relativa ao imposto que incida sobre a utilização de crédito nos termos e condições melhor definidos na alínea e) do n.º 1 do art.º 7.º do Código do Imposto do Selo (CIS).
Por outro lado, enquanto entidade concedente do crédito e da garantia ou credora de juros, prémios, comissões e outras contraprestações, é sujeito passivo de imposto, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 2.º do CIS, sendo responsável pela liquidação e entrega nos cofres do Estado do Imposto do Selo, nos termos dos artigos 23.º, 41º e 44.º, todos do CIS.
III. - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS
Da análise às áreas contabilístico-fiscais selecionadas, foram verificadas as seguintes situações, relativamente ao exercício de 2014.
(...)
III.1.2 - IMPOSTO DO SELO
III.1.2.1 - CORREÇÕES AO CÁLCULO DO IMPOSTO (IS)
III.1.2.1.1 - TAXA DE SERVIÇO DO COMERCIANTE [N.º 1 DO ART.º 1. DO CIS - VERBA 17.3.4. DA TGIS]
€180.361,43
Apurou-se Imposto do Selo em falta, relativamente a comissões (taxa de serviço do comerciante), no montante de €180.361,43, em resultado da aplicação da taxa de 4%, prevista na verba 17.3.4. da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), às bases tributáveis das comissões acima referidas.
Para uma melhor compreensão da presente correção e dos seus fundamentos dever-se-ão ter presentes os seguintes aspetos:
a) Dos elementos solicitados à A... e das suas respostas
Por forma a validar a liquidação de Imposto do Selo sobre a comissão designada por "Taxa de Serviço do Comerciante", adiante também designada por TSC, cobrada aos clientes pela utilização de Terminais de Pagamento Automático (TPA), foram solicitadas ao Sujeito Passivo, no ponto 3 do Pedido de Elementos n.º 3, datado de 24-05-2016, as seguintes informações:
"3- Tendo presente que no Caderno n.º 10 do Banco de Portugal (BdP) - "Terminais de Pagamento e Caixas Automáticas" (adiante também designados por TPA) - se refere que, em traços gerais, o TPA é um terminal (de pagamento) que permite fazer pagamentos por via eletrónica em estabelecimentos comerciais, através de cartões bancários, e que o pagamento num TPA, passa pelas seguintes etapas:
i) O titular do cartão dá uma ordem de pagamento relativa à liquidação de uma compra ao comerciante, através da utilização do seu cartão no TPA e para a sua autenticação marca um código secreto ou é solicitada a sua assinatura;
ii) A informação é transmitida pelo adquirente (ou "acquirer") ao emissor do cartão, pedindo a respetiva autorização;
iii) O emissor do cartão dá uma "garantia" de pagamento através de uma autorização;
iv) O adquirente (ou "acquirer") paga ao comerciante e cobra-lhe uma comissão, geralmente chamada de "taxa de serviço do comerciante";
v) O emissor do cartão cobra o valor da transação ao titular do cartão.
Solicitamos a discriminação, relativamente ao exercício de 2014, por mês de cobrança, os seguintes montantes:
a) Do valor das comissões referidas no ponto iv) supra [comissão que o comerciante paga ao acquirer quando realiza uma transação que o cliente liquida com cartão, quer se trate de uma operação a débito (cartão de débito) ou a crédito (cartão de crédito)];
b) Do reflexo contabilístico - conta de réditos - onde são refletidas as comissões referidas na alínea a) supra.".
Em resposta ao ponto 3 do Pedido de Elementos n.º 3, através de e-mail datado de 23-06-2016 -[Anexo 4 (1 folha) - veio o Sujeito Passivo quantificar o montante das comissões TSC por si cobradas em 2014, por mês de cobrança, conforme expresso no quadro infra, bem como indicar a conta NCA de réditos onde as mesmas foram reconhecidas [conta "8139195-8 - COM.RECEB.OPER.TPA-MB"):
Por e-mail datado de 16 de novembro de 2016, foi ainda solicitado à Caixa que "nos confirmasse, ou não, que no exercício de 2014, não existiu liquidação de Imposto do Selo", relativamente à TSC, tendo-nos, em resposta dada por e-mail com a mesma data, sido expressamente confirmado que não existiu liquidação de Imposto do Selo na TSC. - Anexo 5 (1 folha).
Verificou-se assim que o Sujeito Passivo não procedeu à liquidação de qualquer Imposto do Selo relativamente às comissões TSC.
Face aos factos acima descritos, e uma vez que a A... não procedeu à liquidação de Imposto do Selo relativamente às comissões TSC - encontrando-se (como veremos adiante) em falta o Imposto do Selo sobre estas comissões - importa, para efeitos da presente correção e de uma melhor compreensão da comissão TSC cobrada aos Comerciantes pela utilização de Terminais de Pagamento Automático, ter presente os seguintes aspetos:
b) Da Taxa de Serviço do Comerciante (TSC)
Para uma melhor compreensão deste ponto, vamos subdividi-lo nos seguintes subpontos:
b.1) Terminal de Pagamento Automático (TPA);
b.2) O que é a "Taxa de Serviço do Comerciante";
b.3) Condições Gerais e Particulares do Contrato de Adesão em matéria de "Taxa de Serviço do Comerciante".
Vejamos então:
b.1) Terminal de Pagamento Automático (TPA)
O Banco de Portugal (BdP) como entidade de supervisão e de regulação das instituições de crédito e outras entidades financeiras, publicou no seu sítio na internet (site) na área de "Publicações" os "Cadernos do Banco de Portugal" que têm por finalidade exclusiva prestar informações específicas do setor bancário ao público em geral.
Neste sentido, publicou no seu site", o Caderno n.º 10, intitulado "Terminais de Pagamento e Caixas Automáticos" que se junta no Anexo 6 (22 folhas).
Na referida publicação, o BdP relativamente ao TPA define-o como "...um dispositivo de aceitação de cartões que permite realizar pagamentos por via eletrónica. Efetua a leitura dos dados do cartão para autorização da operação e recolha dos elementos da transação para processamento. Possibilita ainda a autenticação eletrónica da operação (digitação do código secreto) e a emissão de talões com informações sobre os dados da transação".
Em traços gerais, trata-se de um terminal que permite fazer pagamentos por via eletrónica em estabelecimentos comerciais, através de cartões bancários, em alternativa ao pagamento através de numerário.
Nessa publicação, o Banco de Portugal vem esclarecer a forma como é efetuado um pagamento no TPA, passando pelas seguintes etapas:
1. O titular do cartão dá urna ordem de pagamento relativa à liquidação de uma compra ao comerciante, através da utilização do seu cartão no TPA e para a sua autenticação marca um código secreto ou é solicitada a sua assinatura;
2. A informação é transmitida pelo adquirente (ou "acquirer") ao emissor do cartão, pedindo a respetiva autorização;
3. O emissor do cartão dá uma "garantia" de pagamento através de uma autorização;
4. O adquirente paga ao comerciante e cobra-lhe uma comissão, chamada de "taxa de serviço do comerciante"',
5. O adquirente é depois reembolsado pelo emissor do cartão e paga-lhe uma comissão intitulada de taxa multilateral de intercâmbio (ou "multilateral interchange fee");
6. O emissor do cartão cobra o valor da transação ao titular do cartão.
Atendendo às etapas acima referidas, apresentamos infra - através de um esquema - o processamento de uma operação em TPA;
b.2) O que é a "Taxa de Serviço do Comerciante"
Para uma melhor compreensão deste item, vamos subdividi-lo nos seguintes subitens:
b.2.1) Da regulamentação das operações de pagamento baseadas em cartões; b.2.2) Da TSC na ótica do Banco de Portugal (BdP).
Vejamos então
b.2.1) Da regulamentação das operações de pagamento baseadas em cartões
Tendo presente a matéria em apreço, importa tecer algumas considerações relativamente ao quadro regulamentar aplicável ao sistema de pagamento em cartões e às entidades intervenientes.
Em primeiro lugar chama-se à colação o Decreto-Lei n.º 317/2009, de 30 de outubro, que aprovou o regime jurídico de acesso à atividade das instituições de pagamento e a prestação de serviços de pagamento, bem como o acesso à atividade das instituições de moeda eletrónica e a prestação de serviços de emissão de moeda eletrónica.
O disposto neste Decreto-Lei, projetou-se em vários diplomas reguladores de matérias financeiras, merecendo destaque, pelas interseções com a temática sob análise, as alterações introduzidas nos seguintes domínios:
i. o art.º 3.º deste Decreto-Lei alterou o art.º 4º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), que passou a integrar na lista das atividades que podem ser exercidas pelos bancos [cfr, alínea c) do n.º 1], os "Serviços de pagamento, tal como definidos no artigo 4.º do regime jurídico dos serviços de pagamento e da moeda eletrónica"',
ii. a redação dada ao art.º 117.º-A do RGICSF para estabelecer que "As instituições de pagamento encontram-se sujeitas à supervisão do Banco de Portugal, nos termos das normas legais e regulamentares que regem a respetiva atividade":
iii. O aditamento das Instituições de pagamento, numa nova alínea [atual alínea k)] do art.º 3.º (Entidades financeiras) da Lei n.º 25/2008, de 5 de junho (que estabelece medidas de natureza preventiva e repressiva de combate ao branqueamento de vantagens de proveniência ilícita e ao financiamento do terrorismo); e,
iv. A inclusão das instituições de pagamento no elenco de "Prestador de serviços financeiros" constante da alínea d) do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 95/2006, de 29 de maio (que estabelece o regime jurídico aplicável aos contratos à distância relativos a serviços financeiros celebrados com consumidores, sendo que a definição de «Serviços financeiros» dada pela alínea c) do mesmo art.º 2.º compreende: «qualquer serviço bancário, de crédito, de seguros, de investimento ou de pagamento e os relacionados com a adesão individual a fundos de pensões abertos]».
No que concerne ao Regime jurídico dos serviços de pagamento e da moeda eletrónica, aprovado pelo n.º 1 do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 317/2009, que integra o Anexo l deste diploma, tem interesse realçar as definições de alguns termos que constam do elenco do art.º 2.º do Regime, não só por contribuírem para uma melhor elucidação da temática em análise, mas também pelo seu entrecruzamento com algumas definições dadas pelo art.º 2.º do Regulamento (UE) n.º 2015/751.
Assim, o art.º 2.º do Regime jurídico dos serviços de pagamento e da moeda eletrónica, apresenta:
i. na alínea c), a definição de «Serviços de pagamento», que remete para as atividades enumeradas no art.º 4.º, cuja alínea c), subalínea ii), inclui "A execução de operações de pagamento através de um cartão de pagamento ou de um dispositivo semelhante";
ii. na alínea k), a definição de «Prestador de serviços de pagamento», que abrange, nos termos do art.º 7.º, as instituições de crédito e sociedades financeiras, cujo objeto compreenda o exercício dessa atividade, de acordo com as normas legais e regulamentares aplicáveis, e as instituições de pagamento;
iii. na alínea e), a definição de «Instituições de pagamento» que abrange "pessoas coletivas a quem tenha sido concedida autorização, nos termos do artigo 10º, para prestar e executar serviços de pagamento em toda a União Europeia";
iv. na alínea g), a definição de «Operação de pagamento» que compreende "o ato, praticado pelo ordenante ou pelo beneficiário, de depositar, transferir ou levantar fundos, independentemente de quaisquer obrigações subjacentes entre o ordenante e o beneficiário";
v. na alínea h), «Sistema de pagamento» é definido como "um sistema de transferência de fundos que se rege por disposições formais e normalizadas e por regras comuns relativas ao tratamento, compensação e liquidação de operações de pagamento";
vi. na alínea i), a definição de «Ordenante» abrange "uma pessoa singular ou coletiva que detém uma conta de pagamento e que autoriza uma ordem de pagamento a partir dessa conta, ou, na ausência de conta de pagamento, a pessoa singular ou coletiva que emite uma ordem de pagamento";
vii. na alínea j), a definição de «Beneficiário» compreende "uma pessoa singular ou coletiva que seja o destinatário previsto dos fundos que foram objeto de uma operação de pagamento"; e
viii. na alínea m), «Utilizador de serviços de pagamento» é definido como "uma pessoa singular ou coletiva que utiliza um serviço de pagamento a título de ordenante, de beneficiário ou em ambas as qualidades".
Por seu lado, embora apenas publicado em 2015, por igualmente abordar esta matéria e entrecruzar-se com os conceitos aqui abordados, recordamos o disposto no Regulamento (UE) 2015/751 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2015, relativo às taxas de intercâmbio aplicáveis a operações de pagamento baseadas em cartões que "deverá aplicar-se à emissão e à aceitação de operações de pagamento com cartões a nível transfronteiriço e nacional", (cfr. preâmbulo, ponto 15).
Neste contexto, reputa-se de interesse destacar algumas das definições fornecidas pelo art.º 2.º do Regulamento, seguindo a ordem aí estabelecida, pela sua relevância para a compreensão da matéria em apreço:
"1) «Adquirente» um prestador de serviços de pagamento vinculado por contrato a um beneficiário para aceitar e processar operações de pagamento baseadas em cartões, as quais dão origem a uma transferência de fundos para o beneficiário;
2) «Emitente», um prestador de serviços de pagamento vinculado por contrato para fornecer um instrumento de pagamento a um ordenante a fim de iniciar e processar operações de pagamento do ordenante baseadas em cartões;
7) «Operação de pagamento baseada num cartão», um serviço baseado na infra-estrutura e nas regras comerciais de um sistema de pagamento com cartões para efetuar operações de pagamento por meio de cartões, dispositivos ou programas de telecomunicações, digitais ou informáticos, que dá origem a uma operação com cartões de débito ou de crédito. As operações de pagamento baseadas em cartões excluem as operações baseadas noutros tipos de serviços de pagamentos;
10) «Taxa de intercâmbio», uma taxa paga direta ou indiretamente (ou seja, através de terceiros), por cada operação realizada entre o emitente e o adquirente das operações de pagamento baseadas em cartões. A compensação líquida ou qualquer outra remuneração acordada faz parte da taxa de intercâmbio;
12) «Taxa de serviço do comerciante», uma taxa paga pelo beneficiário ao adquirente relativa a operações de pagamento baseadas em cartões;
13) «Beneficiário», uma pessoa singular ou coletiva que é a destinatária prevista dos fundos pagos através de uma operação de pagamento;
14) «Ordenante», uma pessoa singular ou coletiva que detém uma conta de pagamento e que autoriza uma ordem de pagamento a partir dessa conta ou, caso não exista conta de pagamento, urna pessoa singular ou coletiva que emite uma ordem de pagamento;
24) «Prestador de serviços de pagamento», uma pessoa singular ou coletiva autorizada a prestar serviços de pagamento enumerados no anexo da Diretiva 2007/64/CE ou reconhecida como emitente de moeda eletrónica nos termos do artigo 1º, n.º 1, da Directiva 2009/11 O/CE. O prestador de serviços de pagamento pode ser um emitente e/ou um adquirente;
26) «Operação de pagamento», um ato praticado pelo ordenante ou em seu nome, ou pelo beneficiário dos fundos a transferir, independentemente das obrigações subjacentes existentes entre o ordenante e o beneficiário.".
No que em particular se refere à TSC, dispõe o n.º 1 do art.º 9.º (Diferenciação) do Regulamento, que os «adquirentes propõem e cobram aos beneficiários taxas de serviço do comerciante individualmente especificadas para diferentes categorias e para diferentes marcas de cartões de pagamento com diferentes níveis de taxas de intercâmbio, salvo se os beneficiários solicitarem por escrito aos adquirentes a cobrança de taxas de serviço ao comerciante indiferenciadas» e, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, estipula-se que os «adquirentes devem incluir nos seus acordos com os beneficiários informações individualmente especificadas sobre os montantes das taxas de serviço ao comerciante, das taxas de intercâmbio e das taxas de sistema aplicáveis a cada categoria e a cada marca de cartões de pagamento, salvo se o beneficiário apresentar posteriormente por escrito um pedido diferente.».
Com base nos normativos acima apresentados, é possível alinhar as seguintes ilações:
1.ª A prestação e execução de operações de pagamentos baseados em cartões eletrónicos integra a categoria de serviços de pagamento;
2.ª A categoria de Prestadores de serviços de pagamento compreende instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições de pagamento, todas qualificadas como entidades financeiras sujeitas à supervisão do Banco de Portugal;
3.ª As instituições de pagamento integram a definição de Prestador de serviços financeiros constante da alínea d) do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 95/2006, de 29 de maio (que estabelece o regime jurídico aplicável aos contratos à distância relativos a serviços financeiros celebrados com consumidores);
4.ª Cabe no conceito de serviço financeiro, qualquer serviço bancário, de crédito, de seguros, de investimento ou de pagamento:
5.ª Um adquirente (instituição de crédito ou instituição de pagamento) é o prestador de serviços de pagamento que no quadro de um contrato de aceitação de operações de pagamento baseadas em cartões, efetua a transferência de fundos para o beneficiário (em regra, o comerciante que aceita pagamentos com cartões), independentemente das obrigações subjacentes existentes entre o ordenante e o beneficiário; e,
6.ª Taxa de serviço do comerciante, é uma taxa paga pelo beneficiário ao adquirente relativa a operações de pagamento baseadas em cartões.
Aqui chegados, forçoso é concluir que a TSC se inscreve nos sistemas de pagamento e que representa a contraprestação cobrada pelo prestador de serviços de pagamento, designado adquirente, ao beneficiário, por cada operação realizada, revestindo, assim, a natureza de remuneração por prestação de serviços financeiros.
E, como veremos de seguida, também assim o entende o Banco de Portugal.
b.2.2) Da TSC na ótica do Banco de Portugal (BdP)
O Banco de Portugal (BdP), define a "Taxa de Serviço do Comerciante" como sendo uma "Comissão que o comerciante paga ao acquirer quando realiza uma transação que o cliente liquida com cartão. Normalmente é uma percentagem do valor da venda, embora nalguns casos possa ser um valor fixo. Em Portugal, a TSC é diferente consoante se trate de uma operação a débito ou a crédito e varia com o tipo de cartão e as marcas associadas.''.
Por sua vez, o adquirente (ou "acquirer") é a "...entidade que adquire os créditos dos comerciantes que aceitam os cartões de crédito e de débito e à qual os comerciantes transmitem os dados relativos à transação. O adquirente, que contrata com o comerciante a aceitação da marca que representa e que autoriza a realização da transação pelo cliente, é também responsável pela compilação da informação relativa à transação e respetiva liquidação aos comerciantes. Depois de pagar (ou seja, adquirir o crédito) ao comerciante, o adquirente é reembolsado pela entidade emitente. O adquirente remunera a entidade emitente através de uma comissão que se designa por interchange fee.".
Porém, até atendendo ao esquema já reproduzido será que, em substância, a troca económica entre o titular do cartão e o comerciante é um crédito? Afigura-se-nos que não.
O crédito é a "operação mediante a qual se cede a disponibilidade efectiva de um bem, por uma contraprestação futura, consistente num bem análogo ao primeiro".
Ora, na operação em apreço, existindo um conjunto de controlos instituídos ao nível dos fluxos financeiros pode-se dizer que a prestação e contraprestação se realizam em simultâneo com a celebração do contrato, encontrando-se no domínio de uma "operação a contado" ou "à vista": na prática decorreu um pequeno intervalo de tempo entre a ordem de pagamento (fase 1 do esquema) e o pagamento do valor da transação (fase 6).
E tanto assim é, que o fator tempo não interveio nesta operação, desde logo na medida em que não foi fixada qualquer remuneração - juro - entre o comerciante e o adquirente dos bens e serviços titular do cartão.
Até porque se ocorrerem problemas nos terminais de pagamento automático, e a operação for recusada e não se concretizar, a operação de compra fica imediatamente sem efeito porque o comerciante não está disposto a incorrer em nenhum tipo de risco.
Assim, tendo em consideração que são elementos fundamentais do crédito o tempo, o risco, a confiança e o juro, não se considera estarmos, em substância, na presença de créditos. Estamos, isso sim, na presença de transferência de fundos através de plataforma fornecida pelo Banco.
Em termos gerais, a TSC trata-se de uma comissão que é paga pelo comerciante ao adquirente do sistema de pagamento (que neste caso em concreto se trata da A...) por vendas liquidadas com cartão bancário pelo cliente (do comerciante).
Alias, a ideia de que a TSC representa uma comissão bancária está bem patente na Carta Circular n.º3/2013/DSC, de 01-02-2013, do BdP na qual se lê: "(...) Em contrapartida, os comerciantes que aceitam a utilização de cartões em terminais de pagamento automático estão sujeitos ao pagamento de comissões, habitualmente designadas «taxas de serviço ao comerciante» ou «TSC». (...) As TSC relativas a pagamentos efetuados com cartão de crédito são, por via de regra, superiores às aplicadas nas operações realizadas com cartão de débito. Este diferente comissionamento encontra o seu fundamento no facto de, no caso dos pagamentos com cartão de crédito, existir uma assunção de risco pelo emitente do cartão, decorrente da antecipação dos fundos ao comerciante em resultado da concessão de crédito ao titular do cartão. De acordo com a prática atual, e tendo em conta os dois tipos de TSC existentes, os cartões de pagamento são classificados, para efeito do regime de comissionamento aplicável, apenas como cartões de débito ou cartões de crédito. (...) 2. O Banco de Portugal considera, que, em respeito pelos princípios de transparência e de proporcionalidade que devem reger a atuação das instituições, o comissionamento associado à aceitação de cartões deve corresponder exclusivamente à natureza da transação efetuada (a débito ou a crédito) e não à classificação do cartão utilizado. Este modelo de comissionamento, baseado na natureza da transação realizada, está já em implementação em alguns países europeus".
E no estudo do BdP, intitulado "Os custos sociais dos instrumentos de pagamento de retalho em Portugal", são usadas expressões bem reveladoras de que a TSC é percebida pelo sistema bancário e pelos próprios Comerciantes como uma comissão; expressões ou frases como - [Nos cartões de débito e de crédito, os proveitos são originados pela aplicação de comissões aos clientes titulares dos cartões (na forma de anuidades, por exemplo) e aos comerciantes aceitantes desses cartões (através, nomeadamente, das Taxas de Serviço ao Comerciante,). (...) Uma parte expressiva dos custos suportados pelos comerciantes com os instrumentos de pagamento é justificada pelas comissões pagas ao sistema bancário (69,4 por cento). (...) Nos pagamentos com cartões de débito e de crédito, a maior parte dos custos incorridos pelos comerciantes decorreram dos encargos associados ao processamento das operações (65,2 por cento nos cartões de débito e 76,1 por cento nos cartões de crédito). Nestes encargos incluem-se as comissões fixas, ou por transação, cobradas pelos bancos/acquirers pela aceitação das marcas de cartões (expressos, nomeadamente, nas Taxas de Serviço ao Comerciante). (...) Para aceitarem pagamentos com cartão, os comerciantes têm de disponibilizar terminais de pagamento automático aos seus clientes e contratualizar a aceitação da(s) marca(s) com o banco de apoio/acquirer. O banco de apoio/acquirer que viabiliza a transação faz-se remunerar mediante a aplicação de comissões fixas (mensais ou anuais) e/ou de comissões por transação (Taxas de Serviço ao Comerciante). Estas comissões representaram 62.7 por cento do total de custos dos comerciantes com os cartões de débito e 72,6 por cento nos cartões de crédito. (...) Estima-se que, de entre os instrumentos de pagamento passíveis de utilização nos pontos de venda físicos, o cartão de crédito é o mais caro para os comerciantes (1,34 € por pagamento) e o cartão de débito o mais barato (0,32 € por pagamento)" - (vide págs. 9, 10, 49 e 50) -, ilustram de forma esclarecedora que a TSC é uma comissão bancária.
Como prestadores de serviços bancários os Bancos de uma forma geral têm direito a uma remuneração: "Comissões" - que "assumem hoje um peso relevante, enquanto componente do custo total dos produtos e serviços financeiros comercializados pelas instituições de crédito e sociedades financeiras e na relação concorrencial entre instituições"-, as quais são livremente fixadas devendo atender a princípios de "razoabilidade" e de "proporcionalidade".
Sendo na linguagem bancária as comissões qualificadas como "as prestações pecuniárias exigíveis aos clientes pelas instituições de crédito como retribuição por serviços por elas prestados, ou subcontratados a terceiros, no âmbito da sua atividade".
Então a TSC mais não é que uma comissão que representa a remuneração do banco, pelos serviços prestados ao comerciante, conexos com a disponibilização de um serviço que lhe permite aceitar cartões das mais diversas marcas e redes, nacionais ou internacionais (v.g., Multibanco, Visa Electron, Visa, MasterCard, etc.) como forma de pagamento dos bens e serviços entretanto por si comercializados e que reflete, nomeadamente, a execução das ações necessárias ao processamento eletrónico das transações (v.g. autorização, validação, processamento das operações de pagamento a crédito na conta do seu cliente comerciante, etc.) bem como, o eventual custo pelo uso das licenças de marcas de cartões internacionais aceites para pagamento, via TPA, no seu ponto de venda.
Em conclusão, a TSC consiste então inequivocamente numa comissão que é paga pelo comerciante ao adquirente do sistema de pagamento (que, neste caso em concreto, se trata da A...) por vendas liquidadas com cartão bancário pelo cliente do comerciante.
b.3) Condições Gerais e Particulares do Contrato de Adesão referente à "Tarifa Serviço Comerciante"
Atendendo ao acima referido, quer na alínea a) quer na alínea b), em termos de funcionamento genérico do TPA e onde se inclui a TSC, analisámos, a título meramente indicativo, um contrato de adesão ao serviço de pagamento automático fornecido pela A... .
O contrato determina as condições gerais e particulares que regulam a prestação do serviço automático denominado por Serviço de Pagamento Automático, disponibilizado pela Caixa ao comerciante.
Nas condições particulares do contrato [no ponto "Preçário a aplicar: Diferenciado (durante 6 meses)"] encontra-se a TSC, que é calculada através de uma percentagem estipulada pelo Sujeito Passivo sobre a faturação com cartões Multibanco (MB), com um limite máximo e mínimo.
Relativamente à TSC, a Cláusula 13.1 das Condições Gerais do referido contrato determina que "o preçário em vigor para a prestação do serviço ao abrigo do presente contrato, consta do protocolo de Adesão".
c) Do enquadramento da comissão "Taxa de Serviço do Comerciante" em IVA
Relativamente às operações financeiras, "...a regra acolhida no regime comum do IVA, constante do artigo 13.º, B, alínea d) da Sexta Diretiva 77/388/CEE, do Conselho, de 17 de Maio de 1977, transposta para o direito português através do n.º 28 [atual n.º 27] cio artigo 9.º do Código do IVA, é a da isenção, sem direito a dedução do imposto suportado a montante".
Assim, o [então] art.º 13.º, ponto B, da Sexta Diretiva prevê:
"Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados-Membros isentarão, nas condições por eles fixadas com o fim de assegurar a aplicação correta e simples das isenções a seguir enunciadas e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso:
d) As seguintes operações:
1. A concessão e a negociação de créditos, e bem assim a gestão de créditos efetuada por parte de quem os concedeu:
2. A negociação e a aceitação de compromissos, fianças e outras garantias, e bem assim a gestão de garantias de crédito efetuada por parte de quem concedeu esses créditos:
3. As operações, incluindo a negociação relativa a depósitos de fundos, contas-correntes, pagamentos, transferências, créditos, cheques e outros efeitos de comércio, com exceção da cobrança de dividas:
4. As operações, incluindo a negociação, relativas a divisas, papel-moeda e moeda com valor liberatório, com exceção de moedas e notas de coleção: consideram-se de colecção as moedas de ouro, de prata ou de outro metal, e bem assim as notas, que não são normalmente utilizadas pelo seu valor liberatório ou que apresentam um interesse numismático:
5. As operações, incluindo a negociação, mas excetuando a guarda e a gestão, relativas às acções, participações em sociedades ou em associações, obrigações e demais títulos, com exclusão:
- dos títulos representativos de mercadorias,
- dos direitos ou títulos referidos no n.º 3 do art.º 5º;
6. A gestão de fundos comuns de investimento, tal como são definidos pelos Estados membros;".
A então alínea d) do ponto B, do art.º 13.º da Sexta Diretiva 77/388/CEE32, do Conselho, de 17 de maio de 1977, passou a constar nas alíneas b) a g) do n.º 1 do art.º 135.º do Capítulo 3 - "Isenções em benefício de outras entidades" da Diretiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro, relativa ao sistema do imposto comum sobre o valor acrescentado.
"Os Estados-Membros isentam as seguintes operações: (...)
b) A concessão e a negociação de créditos, e bem assim a gestão de créditos efetuada por parte de quem os concedeu;
c) A negociação e a aceitação de compromissos, fianças e outras garantias, e bem assim a gestão de garantias de crédito efetuada por parte de quem concedeu o crédito;
d) As operações, incluindo a negociação relativas a depósitos de fundos, contas-correntes, pagamentos, transferências, créditos, cheques e outros efeitos de comércio, com exceção da cobrança de dividas;
e) As operações, incluindo a negociação, relativas a divisas, papel-moeda e moeda com valor liberatório, com exceção das moedas e notas de coleção, nomeadamente as moedas de ouro, prata ou outro metal, e bem assim as notas que não são normalmente utilizadas pelo seu valor liberatório ou que apresentem um interesse numismático;
f) As operações, incluindo a negociação, excluindo a guarda e gestão, relativas às ações, participações em sociedades ou em associações, obrigações e demais títulos, com exclusão dos títulos representativos de mercadorias, os direitos ou títulos referidos no n.º 2 do artigo 15.º;
g) A gestão de fundos comuns de investimento, tal corno definidos pelos Estados-Membros;".
A redação deste preceito - quer da Diretiva 77/388/CEE quer da Diretiva n.º 2006/112/CE - teve assim correspondência no n.º 27 (anterior n.º 28) do art.º 9.º do CIVA.
O referido normativo do CIVA [n.º 27 do art.º 9.º] "...identifica as operações bancárias e financeiras abrangidas pela isenção, referindo expressamente outras que lhes sendo próximas são delas excluídas", pelo que estão, assim, isentas do IVA, as "...operações seguintes:
a. A concessão e a negociação de créditos, sob qualquer forma, compreendendo operações de desconto e redesconto, bem como a sua administração ou gestão efectuada por quem os concedeu;
b. A negociação e a prestação de fianças, aveles, cauções e outras garantias, bem como a administração ou gestão de garantias de créditos efectuada por quem os concedeu;
c. As operações, compreendendo a negociação, relativas a depósitos de fundos, contas correntes, pagamentos, transferências, recebimentos, cheques, efeitos de comércio e afins, com excepção das operações de simples cobrança de dividas;
d. As operações, incluindo a negociação, que tenham por objecto divisas, notas bancárias e moedas, que sejam meios legais de pagamento, com excepção das moedas e notas que não sejam normalmente utilizadas como tal, ou que tenham interesse numismático;
e. As operações e serviços, incluindo a negociação, mas com exclusão da simples guarda e administração ou gestão, relativos a acções, outras participações em sociedades ou associações, obrigações e demais títulos, com exclusão dos títulos representativos de mercadorias e dos títulos representativos de operações sobre bens imóveis quando efectuadas por um prazo inferior a 20 anos;
f. Os serviços e operações relativos à colocação, tomada e compra firmes de emissões de títulos públicos ou privados;
g. A administração ou gestão de fundos de investimento".
Em face do que antecede, importa proceder ao enquadramento da comissão designada "Taxa de Serviço do Comerciante" em sede de IVA.
Mas, para se proceder ao seu enquadramento importa recordar que "Terminal de Pagamento Automático" é definido como um "dispositivo de aceitação de cartões que permite realizar pagamentos por via eletrónica"34. Estabelece-se assim uma transferência eletrónica de fundos entre as contas de depósito do pagador (cliente ou consumidor final) e do beneficiário (comerciante) da transferência, através da utilização pelo primeiro, de um cartão bancário no terminal de pagamento instalado para o efeito no estabelecimento do segundo.
Parecendo, portanto, inquestionável que se estabelecem com a entidade prestadora do serviço automático (A...) duas relações distintas. Por um lado, é a relação que se estabelece entre tal entidade (A...) e os seus clientes (comerciantes) que são também os beneficiários dessa transferência. Por outro lado, é a relação inerente à transferência de fundos entre as contas de depósito do pagador e do beneficiário da transferência e que se estabelece entre a entidade prestadora do serviço automático e o consumidor final, este titular do cartão bancário.
Pelo que, é nesta relação de cobrança efetiva do serviço prestado que "os bancos" (no caso a A...) fixam um preço a cobrar pela realização daquela transferência eletrónica de fundos entre o consumidor final e o comerciante que detém um terminal de pagamento.
Mais, as relações que se estabelecem entre a entidade prestadora dos serviços automáticos e o beneficiário da transferência (comerciante) podem-se chamar relações condicionadas, isto porque, o processo de transferência de fundos se desencadeia a partir de uma ordem emitida por um terceiro (o cliente final), e essa ordem tem sempre subjacente a aquisição de bens ou serviços. Não havendo aquisição (com utilização do cartão bancário), não há prestação de serviço automático.
Assim, esta prestação de serviços está dependente da realização de operações de aquisição e da consequente utilização do cartão bancário (por isso condicionada), pelo que se caracteriza pelo carácter acessório relativamente à operação principal, a qual está, no entanto, subordinada à operação principal (inerente às relações cliente final/comerciante).
Para melhor compreensão do seu carácter acessório em relação à operação principal, verifica-se que o serviço automático permite que as entidades aderentes ao sistema recebam em tempo real as importâncias inerentes às operações principais. O serviço prestado consiste, portanto, num tratamento e envio de dados que se caracteriza pela leitura ótica dos dados constantes do cartão bancário, ou seja, pela análise dos saldos das contas visando a confirmação ou não de pagamento da operação em causa, por forma a transferir para a conta do comerciante os valores correspondentes à operação.
Pela utilização do sistema acima referido, a entidade prestadora do serviço de pagamento automático (A...) cobra ao beneficiário da transferência (comerciante), uma "Taxa de Serviço do Comerciante", que constitui, assim, uma comissão pelo serviço prestado.
Deste modo, esta TSC é enquadrável na alínea c) do n.º 27.º do art.º 9.º do CIVA, a qual estipula que estão isentas de imposto as "...operações, compreendendo a negociação, relativas a depósitos de fundos, contas correntes, pagamentos, transferências, recebimentos, cheques, efeitos de comércio e afins, com exceção das operações de simples cobrança de dívidas;".
Relativamente aos serviços prestados no âmbito da prestação em análise e atendendo à caracterização supra, pode-se concluir que estamos perante operações de pagamento/transferências, cuja ordem é dada pelo utilizador do cartão bancário, configurando-se, assim, como transferências de fundos, operações estas enquadráveis na alínea c) do n.º 27 do art.º 9.º do CIVA.
Por um lado, não se aplica a exceção prevista na parte final da alínea c) do n.º 27 do art.º 9.º do CIVA, uma vez que as operações que se estabelecem no âmbito da relação entidade prestadora do serviço/comerciante não configuram operações de simples cobrança de dívidas, em virtude de não haver uma total autonomia da operação acessória relativamente à operação principal. Podendo-se concluir que a operação acessória está subordinada e se relaciona com a operação principal, existindo uma relação de completa dependência (direta).
Por outro lado, inerente a esta relação está a realização de serviços que consistem na utilização de todo um sistema automático de transferência de valores conta a conta, posto à disposição pela entidade prestadora dos serviços, e não a realização de serviços de simples "cobrança de dívidas".
Não existe aqui qualquer diferença entre o pagamento da operação principal (pelo cliente final) com recurso a dinheiro em espécie e o pagamento desta mesma operação recorrendo-se a meios automáticos de pagamento (utilização do cartão bancário), até porque a transferência das importâncias envolvidas na operação é feita em tempo real.
Donde claramente se conclui que a comissão "Taxa de Serviço do Comerciante", que visa retribuir a operação de transferência de fundos, estando sujeita a IVA, é uma operação isenta, por ter enquadramento na alínea c) do n.º 27 do art.º 9.º do CIVA.
d) Da sujeição a Imposto do Selo da comissão "Tarifa Serviço Comerciante"
No Preâmbulo do Código do Imposto do Selo (CIS), aprovado pela Lei n.º 150/99, de 11 de setembro, é referido que:
"O imposto do selo é o imposto mais antigo do sistema fiscal português (foi criado por alvará de 24 de dezembro de 1660) e era considerado, até à sua reforma, operada em 2000, um imposto anacrónico.
A reforma de 2000 marcou uma tendência para a alteração de uma das suas mais ancestrais características, que de imposto sobre os documentos se tende a afirmar cada vez mais como imposto sobre as operações que, independentemente da sua materialização, revelem rendimento ou riqueza.".
De acordo com o n.º 1 do art.º 1.º do CIS, "o imposto do selo incide sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos, livros, papéis e outros factos previstos na Tabela Geral".
Por sua vez o n.º 2 do art.º 1.º do CIS estabelece que "Não são sujeitas a imposto as operações sujeitas a imposto sobre o valor acrescentado e dele não isentas".
Ou seja, na "...definição do âmbito de incidência do imposto do selo nas operações financeiras importa ter-se presente o disposto no n.º 2 do artigo 1.º do Código, que no sentido evitar a sobreposição de tributações, afasta da incidência deste tributo as operações sujeitas ao l VA e dele não isentas35".
Pelo que, sendo a comissão TSC cobrada ao comerciante pela entidade prestadora do serviço automático (A...) sujeita a IVA mas isenta do mesmo, encontra-se sujeita a Imposto do Selo nos termos do n.º 1 do art.º 1." do respetivo código (não sendo de aplicar o n.º 2 do art.º 1." do CIS), caso se encontre prevista na Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS).
Assim, constituindo normas de incidência objetiva do Imposto de Selo as verbas previstas na Tabela Geral de Imposto do Selo (TGIS), importa primeiramente analisar as verbas aí constantes. E, dessa análise, rapidamente se conclui que a verba "17 - Operações financeiras", mais concretamente a verba "17.3.4 - Outras comissões e contraprestações por serviços financeiros", prevê a incidência de Imposto do Selo em comissões cobradas nas operações realizadas por ou com a intermediação de instituições financeiras (como seja o caso da TSC, em que a pela entidade prestadora do serviço automático - no caso, a A...- cobra ao comerciante).
Como bem referem João Espanha e Marta Gaudêncio são sujeitas a imposto "(...) b) as comissões auferidas em razão da prestação de serviços financeiros; c) todas as demais contraprestações auferidas em razão da prestação de serviços financeiros, desde que as comissões e contraprestações sejam relativas a operações praticada por instituições de crédito ou sociedades financeiras (e ainda entidades legalmente equiparadas e, bem assim, quaisquer outras instituições financeiras,) ou por elas intermediadas".
Ora, estando preenchidos tanto o pressuposto de natureza objetiva que se prende com a natureza de "serviços financeiros" atribuída à TSC, como o pressuposto de natureza subjetiva que tem a ver com a qualificação de instituição de crédito que resulta do art.º 3.º do RGICSF, de que gozam os prestadores de serviços de pagamento adquirentes (instituições de crédito e instituições de pagamento), não subsistem quaisquer dúvidas de que a TSC cabe na verba 17.3.4 - Outras comissões e contraprestações por serviços financeiros, da TGIS.
De facto, a TSC constitui a contrapartida cobrada por entidades financeiras (Instituições de Crédito ou Instituições de Pagamento) aos comerciantes pela prestação de serviços de pagamento, qualificados como serviços financeiros e, portanto, tem assim pleno enquadramento na verba 17.3.4 da TGIS.
Ainda a propósito desta verba, convém referir que "diversamente do que dispunha o artigo 120-A da Tabela anterior, que limitava o âmbito de incidência às comissões, a norma atual alarga-o, pois, a todas e quaisquer contraprestações por serviços financeiros, desde que, naturalmente, não se trate de serviços sujeitos ao imposto sobre o valor acrescentado e não isentos deste imposto".
Refira-se ainda que a esta sujeição a Imposto do Selo, nos termos acima expostos, não é aplicável a isenção prevista na alínea e) do n.º 1 do art.º 7.º do CIS, desde logo na medida em que o comerciante não configura uma das entidades identificadas nesta alínea (sociedades de capital de risco ou sociedades ou entidades cuja forma e objeto preencham os tipos de instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras previstos na legislação comunitária).
A este propósito, refira-se ainda - sem contudo conceder -, que se por mera hipótese académica e dever de raciocínio se concedesse que, as entidades identificadas na alínea e) do n.º 1 do art.º 7.º do CIS abrangeriam os "comerciantes" acima referidos, ainda assim, não estaria a comissão TSC a coberto da referida isenção da alínea e) do n.º 1 do art.º 7.º do CIS, na medida em que, como é sabido, apenas as comissões diretamente relacionadas com a concessão de crédito estão abrangidas por esta isenção40. Ora, face ao acima exposto, não configurando a comissão TSC uma operação de crédito ou uma operação diretamente destinada à concessão de crédito, também por aqui (comissão TSC cobrada pelo Sujeito Passivo ao comerciante), não tem aplicação a isenção prevista na e) do n.º 1 do art.º 7.º do CIS.
e) Da síntese conclusiva
Face ao exposto, somos a concluir que:
1. A TSC é uma comissão que é cobrada pela entidade prestadora do serviço de pagamento automático (a A...) ao beneficiário da transferência (o comerciante), sobre as vendas liquidadas por cartão bancário, de forma a retribuir a A... nas operações de pagamento baseadas em cartões (tendo subjacente a transferência de fundos da conta do cliente/consumidor final para a conta do comerciante);
2. A A... não procede para a TSC a qualquer liquidação de imposto;
3. O próprio Banco de Portugal (entidade de supervisão) considera a TSC uma comissão;
4. A TSC estando sujeita a IVA, encontra-se dele isenta, por se enquadrar na alínea c) do n.º 27 do art.º 9.º do CIVA;
5. Estando isenta de IVA, a TSC encontra-se sujeita a imposto do selo, nos termos do n.º 1 e n.º 2 do art.º1.ºdoCIS;
6. Nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 2.º do CIS, são sujeitos passivos de imposto as "Entidades concedentes de crédito e de garantias ou credoras de juros, prémios, comissões e outras contraprestações...", competindo-lhes pelo n.º 1 do art.º 23.º, art.º 41.º e n.º 1 do art.º 44.º, todos do CIS, a sua liquidação e entrega nos cofres do Estado.
7. De acordo com o disposto na alínea g) do n.º 3 do art.º 3.º - "Encargo do imposto" do CIS, determina que nas "...restantes operações financeiras realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades ou outras instituições financeiras...", que suporta o encargo do imposto é o cliente (neste caso os comerciantes que utilizam o Serviço de Pagamento Automático);
8. Por sua vez, ao abrigo da alínea h) do n.º 1 do art.º 5.º do CIS, o nascimento da obrigação tributária ocorre nas "...operações realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas, no momento da cobrança dos juros, prémios, comissões e outras contraprestações ...";
9. Nos termos do n.º 1 do art.º 9 do CIS, o valor tributável de Imposto do Selo é o que resulta da TGIS;
10. O n.º 1 do art.º 22.º do CIS, remete as taxas de imposto para a TGIS;
11. Pelo que a comissão TSC tem pleno cabimento na verba 17.3.4 da TGIS, por ser uma comissão cobrada pela entidade prestadora do serviço automático (A...) ao comerciante;
12. Esta comissão não se encontra abrangida pela isenção prevista na alínea e) do n.º 1 do art.º 7.º do CIS.
Face ao que antecede, na medida em que, conforme supra referido, tendo por e-mail datado de 16 de novembro de 2016, sido solicitado à A... que "nos confirmasse, ou não, que no exercício de 2014, não existiu liquidação de Imposto do Selo", relativamente à TSC, e que a A... em resposta, dada por e-mail na mesma data, expressamente confirma que não existiu liquidação de Imposto do Selo na TSC -Anexo 5 (1 folha) -, e uma vez que, conforme acima demonstrado, a A... deveria ter liquidado Imposto do Selo relativamente às comissões TSC cobradas aos Comerciantes pela utilização de Terminais de Pagamento Automático, foi, ao abrigo do princípio de colaboração plasmado nos números 1 e 4 do art.º 59.º da Lei Geral Tributária (LGT) e do principio da cooperação consagrado nos artigos 9.º e 48." do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA), a A... convidada a apurar o montante de Imposto do Selo a liquidar mensalmente com estas comissões.
Com efeito, na medida em que os diversos elementos (dados e informações) que possibilitam o cálculo estavam na posse do Sujeito Passivo, solicitámos-lhe, através da alínea d) da notificação datada de 07 de outubro de 2016, a "discriminação, por mês de cobrança, do valor do imposto do Selo que a A... teria apurado caso não tivesse considerado que [estas comissões] estavam (i) isentas de Imposto do Selo ao abrigo do art.º 7.º do respetivo Código ou (ii) fora do âmbito de aplicação e/ou sujeição deste imposto."- Anexo 7 (4 folhas).
Contudo a A... não procedeu à discriminação, por mês de cobrança, do valor do Imposto do Selo que teria apurado (caso não tivesse considerado as respetivas comissões como isentas de Imposto do Selo ao abrigo do art.º 7.º do respetivo Código ou fora do âmbito de aplicação e/ou sujeição deste imposto), alegando que "Não é possível fazer este cálculo uma vez que apenas dispomos da informação agregada, pelo que não é possível identificar operações diárias e isenções.". - Anexo 8 (4 folhas).
Deste modo, tendo a A... informado que (i) em 2014 não liquidou Imposto do Selo sobre as comissões TSC cobradas aos comerciantes por utilização dos TPA e, convidada a apurar o Imposto do Selo em falta, referido que (ii) não lhe é possível fazer este cálculo uma vez que apenas dispõe de informação agregada, não lhe sendo possível identificar operações diárias e isenções, outra solução não resta aos Serviços de Inspeção Tributária que não seja, com base na discriminação mensal das comissões TSC cobradas - informação facultada pela A... aos Serviços de Inspeção Tributária [Anexo 4 (1 folha)]42 -, proceder ao apuramento do Imposto do Selo a liquidar.
Face ao que antecede, tendo por base a informação mensal das comissões TSC cobradas, a Inspeção Tributária apurou Imposto do Selo em falta, no montante de € 180.361,43, em resultado da aplicação da taxa de 4%, prevista na verba 17.3.4. da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), sobre a base tributável da comissão intitulada "Taxa de Serviço do Comerciante", no valor total de € 4.509.035,82.
De forma a dar cumprimento ao disposto no art.º 44.º do CIS, o Imposto do Selo apurado em falta deveria ter sido entregue nos cofres do Estado até ao dia 20 do mês seguinte àquele em que a obrigação tributária se tenha constituído.
O Imposto do Selo apurado em falta, repartido mensalmente por mês de cobrança, é apresentado no quadro infra.
A presente correção é efetuada nos termos e com os fundamentos acima referidos.
III.1.2.1.2 - TAXA MULTILATERAL DE INTERCÂMBIO E COMISSÕES SOBRE OPERAÇÕES EFETUADAS COM CARTÕES BANCÁRIOS EM CAIXAS AUTOMÁTICOS [N.º 1 DO ART.º 1.º DO CIS - VERBA 17.3.4. DA TGIS]
€668.175,61
Apurou-se Imposto do Selo em falta, relativamente a comissões (taxa multilateral de intercâmbio e comissões sobre operações efetuadas com cartões bancários em Caixas Automáticos), no montante de € 668.175,61, em resultado da aplicação da taxa de 4%, prevista na verba 17.3.4. da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), às bases tributáveis das comissões acima referidas.
Para uma melhor compreensão da presente correção e dos seus fundamentos dever-se-ão ter presentes os seguintes aspetos:
a) Dos elementos solicitados à A... e das suas respostas
Por forma a validar a liquidação de Imposto do Selo sobre a comissão designada por Taxa Multilateral de Intercâmbio (TMI) também conhecida por Multilateral Interchange Fee, bem como sobre as comissões cobradas pelos Bancos detentores das Caixas Automáticos (adiante também designadas por caixas multibanco ou ATM) aos Bancos emissores de cartões bancários - [relativamente às operações (com os cartões bancários) efetuadas pelos clientes dos Bancos emissores dos cartões bancários nos acima referidos ATM] -, foram solicitadas ao Sujeito Passivo, através de notificação datada de 07-10-2016 -Anexo 7 (4 folhas), os seguintes elementos/informações:
"Considerando que:
i. os clientes dos Bancos efetuam diversos pagamentos com cartões (seja de débito seja de crédito) existindo, pelos serviços prestados inerentes (ou que possibilitam) estes pagamentos, a cobrança de diversas comissões tal como, a título meramente indicativo, se retira do Caderno n.º 10 do Banco de Portugal - "Terminais de Pagamento e Caixas Automáticas";
ii. existem pagamentos de bens e/ou serviços que são efetuados através da utilização de cartões bancários, seja em terminais de pagamento - os vulgarmente designados TPA (existentes, por exemplo, na quase totalidade dos estabelecimentos comerciais) - seja em caixas automáticas (vulgarmente designadas por caixas multibanco ou ATM):
iii. os TPA permitem ao cliente detentor de um cartão de débito (ou de um cartão de crédito), aquando da aquisição de um bem ou serviço, fazer o seu respetivo pagamento por via eletrónica;
iv. o pagamento (através de cartões bancários) efetuado num TPA, passa pelas seguintes etapas:
iv.a) O titular do cartão dá uma ordem de pagamento relativa à liquidação de uma compra ao comerciante, através da utilização do seu cartão no TPA e para a sua autenticação marca um código secreto ou é solicitada a sua assinatura;
iv.b) A informação é transmitida pelo adquirente (ou "acquirer") ao emissor do cartão, pedindo a respetiva autorização;
iv.c) O emissor do cartão dá uma "garantia" de pagamento através de uma autorização;
iv.d) O adquirente (ou "acquirer") paga ao comerciante e cobra-lhe uma comissão, geralmente chamada de "taxa de serviço do comerciante".
iv.e) O adquirente (ou "acquirer") é depois reembolsado pelo emissor do cartão e paga-lhe uma comissão geralmente intitulada de taxa multilateral de intercâmbio (ou "multilateral interchange fee");
iv.f) O emissor do cartão cobra o valor da transação ao titular do cartão.
v. tal como sucede com os TPA's, os clientes atualmente efetuam diversos pagamentos com cartões (seja de débito seja de crédito) - logo pagamentos efetuados por cartão - através das Caixas Automáticas (ATM);
vi. existindo um pagamento (por exemplo, da água, da eletricidade, ou de qualquer outro bem e/ou serviço) efetuado através dos ATM, tal como referido aquando da análise dos TPA, também aqui é cobrada uma comissão - neste caso, pelo Banco detentor do ATM ao Banco detentor do cartão bancário (seja de débito seja de crédito) - pelo serviço prestado;
vii de igual modo, quando o cliente de um banco procede ao levantamento de numerário numa caixa automática (ou ATM) pertencente a outro Banco [Banco detentor do ATM], o Banco detentor do ATM cobra uma comissão ao banco detentor ou emissor do cartão bancário/SIBS15, pelo serviço prestado.
Elementos Pretendidos
Tendo presente as operações efetuadas com cartões (supra referidas) e as correspondentes comissões cobradas pelos serviços prestados, solicitamos, relativamente ao exercício de 2014, os seguintes elementos:
a) Indicação, por mês de cobrança, do valor das comissões referidas no ponto iv.e) supra [a entidade que contrata com o comerciante a aceitação da marca que representa e que autoriza a realização da transação, depois de pagar ao comerciante, é reembolsado pela entidade emitente do cartão (de débito ou de crédito), sendo ainda remunerado (através de uma comissão) pela entidade emitente desse cartão (de débito ou de crédito)]:
b) Indicação, por mês de cobrança, do valor das comissões referidas no ponto vi) supra [existindo um pagamento (por exemplo, da água, da eletricidade, ou de qualquer outro bem e/ou serviço) efetuado através dos ATM, é cobrada uma comissão - neste caso, pelo Banco detentor do ATM ao Banco detentor do cartão bancário (seja de débito seja de crédito) - pelo serviço prestado];
c) Indicação, por mês de cobrança, do valor das comissões referidas no ponto vii) supra [quando o cliente de um banco procede ao levantamento de numerário numa caixa automática (ou ATM) pertencente a outro Banco [Banco detentor do ATM], o Banco detentor do ATM cobra uma comissão ao banco detentor ou emissor do cartão bancário/SIBS, pelo serviço prestado];
d) Discriminação, por mês de cobrança, do valor do Imposto do Selo que a A... teria apurado caso não tivesse considerado que as comissões referidas na alínea iv.d) supra estavam (i) isentas de Imposto do Selo ao abrigo do art.º 7.º do respetivo Código ou (ii) fora do âmbito de aplicação e/ou sujeição deste imposto;
e) Discriminação, por mês de cobrança, do valor do Imposto do Selo que a A... teria apurado caso não tivesse considerado que as comissões referidas na alínea iv.e) supra estavam (i) isentas de Imposto do Selo ao abrigo do art.º 7.º do respetivo Código ou (ii) fora do âmbito de aplicação e/ou sujeição deste imposto;
f) Discriminação, por mês de cobrança, do valor do Imposto do Selo que a A... teria apurado caso não tivesse considerado que as comissões referidas na alínea vi) supra estavam (i) isentas de Imposto do Selo ao abrigo do art.º 7.º do respetivo Código ou (ii) fora do âmbito de aplicação e/ou sujeição deste imposto;
g) Discriminação, por mês de cobrança, do valor do Imposto do Selo que a A... teria apurado caso não tivesse considerado que as comissões referidas na alínea vii) supra estavam (í) isentas de Imposto do Selo ao abrigo do art.º 7.º do respetivo Código ou (ii) fora do âmbito de aplicação e/ou sujeição deste imposto;
h) Reflexo contabilístico - conta de réditos - onde são refletidas as comissões referidas na alínea iv.d) supra;
i) Reflexo contabilístico - conta de réditos - onde são refletidas as comissões referidas na alínea iv.e) supra;
j) Reflexo contabilístico - conta de réditos - onde são refletidas as comissões referidas na alínea vi) supra;
k)Reflexo contabilístico - conta de réditos - onde são refletidas as comissões referidas na alínea vii) supra.".
Por meio de e-mail, datado de 27-10-2016, Anexo 8 (4 folhas), veio o Sujeito Passivo, em resposta às questões supra elencadas, prestar a seguinte informação:
No que respeita à Taxa Multilateral de Intercâmbio (TMI) ou Multilateral Interchange Fee, a A... quantificou o montante das comissões TMI por si cobradas em 2014, por mês de cobrança, conforme quadro infra [resposta à alínea a) das nossas questões supra]:
No que respeita a comissões sobre pagamentos efetuados por cartão e sobre levantamentos de numerário, ambas as operações efetuadas em Caixas Automáticos - isto é, comissões cobradas pela A... relativamente a operações efetuadas com cartões bancários nos seus ATM -, veio o Sujeito Passivo quantificar as referidas comissões, por mês de cobrança, conforme se sintetiza no quadro infra [resposta às alíneas b) e c) das nossas questões supra]:
Mais esclareceu a A..., no referido e-mail, datado de 27-10-2016, que os valores constantes no quadro supra, incluem os valores/comissões cobrados pela A... inerentes às diversas operações efetuados nas suas Caixas Automáticos, a saber, os levantamento bancários, as consulta de saldos, as consultas de movimentos, os pagamentos de serviços, os pagamentos ao Estado, os carregamentos de telemóveis, a compra de bilhetes, a adesão a serviços, entre outros. Esclareceu ainda que no "que respeita ao ponto b) e c) a informação que dispomos não está desagregada por pagamentos e é comunicada pela SIBS em fechos (aglomerado de transações).".
• No que respeita às questões colocadas através das alíneas e), f) e g) supra, em que se solicitava a discriminação, por mês de cobrança, do valor do Imposto do Selo que a A... teria apurado caso não tivesse considerado as comissões referidas supra estavam isentas de Imposto do Selo ao abrigo do art.º 7.º do respetivo Código ou fora do âmbito de aplicação e/ou sujeição deste imposto, a A... não procedeu à discriminação, por mês de cobrança, do valor do Imposto do Selo que teria apurado (nas condições referidas), tendo alegado que "Não é possível fazer este cálculo uma vez que apenas dispomos da informação agregada, pelo que não é possível identificar operações diárias e isenções."48. - Anexo 8 (4 folhas).
• A nível contabilístico, relativamente às contas movimentadas pelo reconhecimento do rédito inerente às comissões aqui em apreço, e conforme solicitado nas alíneas i, j), k) supra, viria o Sujeito Passivo, por e-mail datado de 2016-11-09, a identificá-las em ficheiro intitulado "sibs_BA".
Atenta a matéria de facto acima descrita, e por forma a ter uma melhor compreensão das comissões "multilateral interchange fee" (ou taxa multilateral de intercâmbio) - taxa cobrada pelo emissor dos cartões bancários [A...] ao detentor do TPA - e das comissões/taxas cobradas pelo detentor dos ATM [A...] ao Banco emissor do cartão bancário (relativamente às operações efetuadas com cartões bancários junto dos referidos ATM), dever-se-ão ter presentes os seguintes aspetos:
b) Das Comissões "multilateral interchange fee" e das comissões cobradas pelo detentor dos ATM ao Banco emissor do cartão bancário (relativamente às operações efetuadas com cartões bancários junto dos referidos ATM, pelos clientes do banco emissor do cartão bancário)
Para uma melhor compreensão deste ponto, vamos subdividi-lo nos seguintes subpontos:
b.1) Terminal de Pagamento Automático (TPA) e Caixas Automáticos (CA),
b.2) O que é a Taxa Multilateral de Intercâmbio (TMI) ou Multilateral Interchange Fee e o que são as Comissões Interbancárias cobradas pela utilização de Caixas Automáticos em operações efetuadas com cartões bancários.
Vejamos então:
b.1) Terminal de Pagamento Automático (TPA) e Caixas Automáticos (CA)
O Banco de Portugal (BdP) como entidade de supervisão e de regulação das instituições de crédito e outras entidades financeiras, publicou no seu site na área de "Publicações" os "Cadernos do Banco de Portugal" que têm por finalidade exclusiva prestar informações específicas do setor bancário ao público em geral.
Neste sentido, publicou o Caderno n.º 10, intitulado "Terminais de Pagamento e Caixas Automáticos"" que se junta no Anexo 6 (22 folhas).
Na referida publicação, o BdP debruça-se sobre os Terminais de Pagamento Automático (TPA) e sobre as Caixas Automáticos (CA), conforme seguidamente se sintetiza:
b.1.1) Terminais de Pagamento Automático (TPA)
Relativamente ao Terminal de Pagamento Automático (TPA), aquele documento define-o como "...um dispositivo de aceitação de cartões que permite realizar pagamentos por via eletrónica. Efetua a leitura dos dados do cartão para autorização da operação e recolha dos elementos da transação para processamento. Possibilita ainda a autenticação eletrónica da operação (digitação do código secreto) e a emissão de talões com informações sobre os dados da transação."
Em traços gerais, trata-se de um terminal que permite fazer pagamentos por via eletrónica em estabelecimentos comerciais, através de cartões bancários, em alternativa ao pagamento através de numerário.
Nessa publicação, o Banco de Portugal vem esclarecer a forma como é efetuado um pagamento no TPA, operação composta pelas seguintes etapas:
1. O titular do cartão dá uma ordem de pagamento relativa à liquidação de uma compra ao comerciante, através da utilização do seu cartão no TPA, que autentica através da marcação de um código secreto ou assinatura;
2. A informação é transmitida pelo adquirente (ou "acquirer") ao emissor do cartão, pedindo a respetiva autorização;
3. O emissor do cartão dá uma "garantia" de pagamento através de uma autorização;
4. O adquirente paga ao comerciante e cobra-lhe uma comissão, chamada de "taxa de serviço do comerciante".
5. O adquirente é depois reembolsado pelo emissor do cartão e paga-lhe uma comissão intitulada de taxa multilateral de intercâmbio (ou "multilateral interchange fee");
6. O emissor do cartão cobra o valor da transação ao titular do cartão.
Embora apenas publicado em 2015, por igualmente abordar esta matéria e entrecruzar-se com os conceitos aqui abordados, recordamos o disposto no Regulamento (DE) 2015/751 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2015, relativo às taxas de intercâmbio aplicáveis a operações de pagamento baseadas em cartões que "deverá aplicar-se à emissão e à aceitação de operações de pagamento com cartões a nível transfronteiriço e nacional", (cfr. preâmbulo, ponto 15).
O Regulamento (UE) 2015/751 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2015 estabelece uma definição para esta taxa de intercâmbio. Assim, do seu artigo 2.º podemos retirar que «taxa de intercâmbio» consiste numa taxa paga direta ou indiretamente (ou seja, através de terceiros), por cada operação realizada entre o emitente e o adquirente das operações de pagamento baseadas em cartões. A compensação líquida ou qualquer outra remuneração acordada faz parte da taxa de intercâmbio.
De acordo com o ponto 10 do preâmbulo do Regulamento (UE) 2015/751 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2015 "As taxas de intercâmbio são habitualmente aplicadas entre os prestadores de serviços de pagamento adquirentes e os prestadores de serviços de pagamento emitentes de cartões pertencentes a um determinado sistema de pagamento com cartões. As taxas de intercâmbio constituem uma parte importante das taxas cobradas aos comerciantes pelos prestadores de serviços de pagamento adquirentes por cada operação de pagamento associada a um cartão. Por sua vez, os comerciantes incorporam esses custos do cartão, tal como todos os seus outros custos, nos preços dos bens e serviços,"
A cobrança deste tipo de comissão nasce no âmbito de operações de pagamento baseadas em cartões suportadas nos dois principais modelos de negócio, os chamados sistemas tripartidos de pagamento com cartões (titular do cartão-adquirente e emitente-comerciante) e sistemas quadripartidos de pagamento com cartões (titular do cartão-banco adquirente-banco emitente-comerciante).
De acordo com o ponto 29 do preâmbulo do Regulamento (UE) 2015/751 acima referido, "O serviço de emissão baseia-se numa relação contratual entre o emitente do instrumento de pagamento e o ordenante, independentemente da circunstância de o emitente deter ou não os fundos em nome do ordenante. O emitente coloca cartões de pagamento à disposição do ordenante, autoriza a realização de operações em terminais ou dispositivos equivalentes e pode garantir ao adquirente o pagamento das operações que estejam em conformidade com as regras do sistema em causa. Por conseguinte, não constitui emissão a mera distribuição de cartões de pagamento ou a prestação de serviços técnicos, tais como o mero processamento e armazenamento de dados.".
O emitente, neste âmbito, é claramente um prestador de serviços de pagamento (cfr. item 24 do art.º 2.º do acima citado Regulamento).
b.1.2) Caixas Automáticos (CA)
Um Caixa Automático (CA), também vulgarmente designado de caixas multibanco ou de ATM50, de acordo com o Caderno n.º 10 ("Terminais de pagamento e Caixas Automáticos") do BdP, é definido como "um terminal de uma rede do sistema bancário que permite ao cliente efetuar diversos tipos de operações51 em regime de auto-serviço, sem necessidade de recorrer aos balcões das agências bancárias".
Os Caixas Automáticos permitem que operações correntes, como levantamentos, consultas, pagamentos e depósitos, ou outras operações normalmente realizadas junto do caixa do banco, possam ser realizadas pelos clientes, mesmo que o banco não esteja aberto. Isso possibilita o acesso a esses serviços de forma mais rápida e cómoda, evitando filas de espera nos balcões.".
"Em Portugal existem dois tipos de CA: os pertencentes a redes partilhadas (como a Rede Multibanco52J e os pertencentes a redes privativas. Nos CA de redes partilhadas, o acesso faz-se através de um cartão de pagamento53 de uma marca aceite no terminal (Multibanco, American Express, Maestro, MasterCard, Visa, Visa Electron, entre outros), emitido por qualquer entidade devidamente autorizada para tal. Na maioria das operações é exigida a introdução do código secreto.
Nos CA pertencentes a redes privativas, a utilização é restrita aos clientes do banco proprietário do Caixa Automático, podendo o acesso ser efectuado através de um cartão emitido pelo próprio banco ou, em alguns bancos e para alguns CA, através de caderneta. Na maioria das operações é exigida a introdução do código secreto".
Refira-se que no Glossário do Banco de Portugal, consta, para Caixa Automático, a seguinte definição: "Equipamento automático que permite aos titulares de cartões bancários com banda magnética e/ou chip aceder a serviços disponibilizados a esses cartões, designadamente, levantar dinheiro de contas, consultar saldos e movimentos de conta, efetuar transferências de fundos e depositar dinheiro. Os caixas automáticos podem funcionar em sistema real-time, com ligação ao sistema automático da entidade emitente do cartão, ou em on line, com acesso a uma base de dados autorizada que contém informação relativa à conta de depósitos à ordem associado ao cartão de débito. Ver ATM”54.
b.2) Taxa Multilateral de Intercâmbio (TMI) ou Multilateral Interchange Fee e Comissões Interbancárias cobradas pela utilização de Caixas Automáticos em operações efetuadas com cartões bancários
Na continuidade das operações de pagamento de compras realizados através de TPA - conforme já se referiu, - o adquirente (ou "acquirer"), uma vez efetuado o pagamento da compra ao comerciante, é depois reembolsado pelo emissor do cartão bancário e paga-lhe uma comissão intitulada de Taxa Multilateral de Intercâmbio (TMI) ou Multilateral Interchanqe Fee.
Por outro lado, existindo um pagamento (por exemplo, da água, da eletricidade, ou de qualquer outro bem e/ou serviço) efetuado através dos ATM, é cobrada uma comissão pelo Banco detentor do ATM ao Banco emissor do cartão bancário (seja de débito seja de crédito) pelo serviço prestado; e, de igual modo, quando o cliente de um banco procede ao levantamento de numerário numa caixa automática (ou ATM) pertencente a outro Banco [Banco detentor do ATM], este cobra uma comissão ao banco emissor do cartão bancário pelo serviço prestado com aquela operação55. Estas são, pois, as comissões interbancárias cobradas pela utilização de CA em operações de pagamentos com cartões, de levantamentos de numerário, de consultas de saldos ou de movimentos, de carregamentos telemóveis, de compra de bilhetes, de adesões a serviços, etc.
c) Do enquadramento em sede de IVA das comissões em apreço [Taxa Multilateral de Intercâmbio (TMI) ou Multilateral Interchange Fee e Interbancárias cobradas pela utilização de Caixas Automáticos em operações efetuadas com cartões bancários]
Sendo o IVA um imposto geral sobre o consumo que pretende tributar toda a atividade económica, então as operações bancárias e financeiras - que pela sua natureza são normalmente desenvolvidas por entidades bancárias: prestações de serviços exercidas/efetuadas por sujeitos passivos - são operações sujeitas a IVA.
Relativamente às operações financeiras, "...a regra acolhida no regime comum do IVA, constante do artigo 13º, B, alínea d) da Sexta Diretiva56 77/388/CEE, do Conselho, de 17 de Maio de 1977, transposta para o direito português através do n.º 28 [atual n.º 27] do artigo 9.º do Código do IVA, é a da isenção, sem direito a dedução do imposto suportado a montante57"58.
Assim, o [então] art.º 13.º, ponto B, da Sexta Diretiva prevê:
"Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados-Membros isentarão, nas condições por eles fixadas com o fim de assegurar a aplicação correta e simples das isenções a seguir enunciadas e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso:
(...)
d) As seguintes operações:
1. A concessão e a negociação de créditos, e bem assim a gestão de créditos efetuada por parte de quem os concedeu;
2. A negociação e a aceitação de compromissos, fianças e outras garantias, e bem assim a gestão de garantias de crédito efetuada por parte de quem concedeu esses créditos;
3. As operações, incluindo a negociação relativa a depósitos de fundos, contas-correntes, pagamentos, transferências, créditos, cheques e outros efeitos de comércio, com exceção da cobrança de dívidas;
4. As operações, incluindo a negociação, relativas a divisas, papel-moeda e moeda com valor liberatório, com exceção de moedas e notas de coleção; consideram-se de colecção as moedas de ouro, de prata ou de outro metal, e bem assim as notas, que não são normalmente utilizadas pelo seu valor liberatório ou que apresentam um interesse numismático;
5. As operações, incluindo a negociação, mas excetuando a guarda e a gestão, relativas às acções, participações em sociedades ou em associações, obrigações e demais títulos, com exclusão:
- dos títulos representativos de mercadorias,
- dos direitos ou títulos referidos no n.º 3 do art.º 5.º;
6. A gestão de fundos comuns de investimento, tal como são definidos pelos Estados membros',".
A então alínea d) do ponto B, do art.º 13.º da Sexta Diretiva 77/388/CEE59, do Conselho, de 17 de maio de 1977, passou a constar nas alíneas b) a g) do n.º 1 do art.º 135.º do Capítulo 3 - "Isenções em benefício de outras entidades" da Diretiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro, relativa ao sistema do imposto comum sobre o valor acrescentado.
"Os Estados-Membros isentam as seguintes operações: (...)
b) A concessão e a negociação de créditos, e bem assim a gestão de créditos efetuada por parte de quem os concedeu;
c) A negociação e a aceitação de compromissos, fianças e outras garantias, e bem assim a gestão de garantias de crédito efetuada por parte de quem concedeu o crédito;
d) As operações, incluindo a negociação relativas a depósitos de fundos, contas-correntes, pagamentos, transferências, créditos, cheques e outros efeitos de comércio, com exceção da cobrança de dívidas;
e) As operações, incluindo a negociação, relativas a divisas, papel-moeda e moeda com valor liberatório, com exceção das moedas e notas de coleção, nomeadamente as moedas de ouro, prata ou outro metal, e bem assim as notas que não são normalmente utilizadas pelo seu valor liberatório ou que apresentem um interesse numismático;
f) As operações, incluindo a negociação, excluindo a guarda e gestão, relativas às ações, participações em sociedades ou em associações, obrigações e demais títulos, com exclusão dos títulos representativos de mercadorias, os direitos ou títulos referidos no n.º 2 do artigo 15.º;
g) A gestão de fundos comuns de investimento, tal como definidos pelos Estados-Membros".
A redação deste preceito - quer da Diretiva 77/388/CEE quer da Diretiva n.º 2006/112/CE - teve assim correspondência no n.º 27 (anterior n.º 28) do art.º 9 º do CIVA, o qual "...identifica as operações bancárias e financeiras abrangidas pela isenção, referindo expressamente outras que lhes sendo próximas são delas excluídas".
Assim, pelo n.º 27 do art.º 9.º do CIVA, estão isentas do IVA as "...operações seguintes:
a. A concessão e a negociação de créditos, sob qualquer forma, compreendendo operações de desconto e redesconto, bem como a sua administração ou gestão efectuada por quem os concedeu;
b. A negociação e a prestação de fianças, avales, cauções e outras garantias, bem como a administração ou gestão de garantias de créditos efectuada por quem os concedeu;
c. As operações, compreendendo a negociação, relativas a depósitos de fundos, contas correntes, pagamentos, transferências, recebimentos, cheques, efeitos de comércio e afins, com excepção das operações de simples cobrança de dívidas;
d. As operações, incluindo a negociação, que tenham por objecto divisas, notas bancárias e moedas, que sejam meios legais de pagamento, com excepção das moedas e notas que não sejam normalmente utilizadas como tal, ou que tenham interesse numismático;
e. As operações e serviços, incluindo a negociação, mas com exclusão da simples guarda e administração ou gestão, relativos a acções, outras participações em sociedades ou associações, obrigações e demais títulos, com exclusão dos títulos representativos de mercadorias e dos títulos representativos de operações sobre bens imóveis quando efectuadas por um prazo inferior a 20 anos;
f. Os serviços e operações relativos à colocação, tomada e compra firmes de emissões de títulos públicos ou privados;
g. A administração ou gestão de fundos de investimento;".
Em face do que antecede, temos de concluir que, quer a comissão intitulada taxa multilateral de intercâmbio, quer as comissões interbancárias cobradas pela utilização de Caixas Automáticos ou ATM em operações efetuadas com cartões bancários, são prestações de serviços (remuneradas por comissões) enquadráveis na isenção prevista na alínea c) do n.º 27 do art.º 9.º do CIVA, a qual, isenta deste imposto as "...operações, compreendendo a negociação, relativas a depósitos de fundos, contas correntes, pagamentos, transferências, recebimentos, cheques, efeitos de comércio e afins, com exceção das operações de simples cobrança de dívidas".
(...)
D. Na sequência da inspecção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação de Imposto do Selo n.º 2017..., de 29-12-2016, no montante de € 869 137,61, e as respetivas liquidações de juros compensatórios, n.ºs 2017..., 2017..., 2017..., 2017..., 2017..., 2017..., 2017..., 2017..., no montante global de € 83 072,21 (documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
E. Em 16-01-2017, a Requerente pagou as quantias referidas (documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
F. Em 03-07-2017, a Requerente deduziu reclamação graciosa contra as referidas liquidações (documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
G. A reclamação graciosa foi indeferida por despacho de 10-11-2017 (documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
H. Em 13-12-2017, por despacho da Sr.ª Chefe de Divisão de Gestão e Assistência Tributária da UGC foi determinado proceder, nos termos e para os efeitos da 2.ª parte do n.º 1 do artigo 78.º da LGT, a instauração de procedimento de revisão oficiosa tendo por objeto a liquidação nº 2017...;
I. Em 05-06-2018, a revisão oficiosa referida foi parcialmente deferida, tendo sido dada razão à Requerente na parte referente ao Imposto do Selo devido pela cobrança de comissões de avaliação subjacentes a operações de crédito à habitação, no valor de € 20.600,57;
J. Mantendo-se inconformada com as restantes correções promovidas, a Requerente apresentou Recurso Hierárquico daquela decisão a 06-07-2018 (documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
K. Por despacho de 19-11-2019, foi indeferido o recurso hierárquico (documento n.º 7 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
L. Na reclamação graciosa, a Requerente apresentou a lista de clientes que beneficiavam de isenção de Imposto do Selo que consta do documento n.º 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
M. Em 18-02-2020, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo.
2.2. Factos não provados e fundamentação da fixação da matéria de facto
Não há factos relevantes para decisão da causa que não se tenham provado.
Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos pela Requerente.
A Autoridade Tributária e Aduaneira não apresentou processo administrativo.
No que concerne à lista de clientes que beneficiavam de isenção de Imposto do Selo que consta do documento n.º 8, considera-se provado, uma vez que a correspondência do seu conteúdo à realidade não é questionada e a Autoridade Tributária e Aduaneira dispunha de meios para controlar a sua veracidade, através dos números fiscais que são indicados pela Requerente.
3. Matéria de direito
A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou correcções ao Imposto do Selo (IS) apurado pela Requerente no ano de 2014, entendendo que deveria ter liquidado Imposto do Selo, aplicando a verba 17.3.4 da TGIS, no âmbito da sua actividade relativamente à “Taxa de Serviço do Comerciante” (TSC) e à taxa multilateral de intercâmbio e comissões sobre operações efectuadas com cartões bancários em caixas automáticas (“ATMs”).
A Requerente defende no presente processo, em suma, que, relativamente ao ano de 2014, não há lugar a pagamento de Imposto do Selo relativamente a estas taxas e que, a existir, não será sobre ela que recai a obrigação de liquidação.
Para além disso, a Requerente defende que goza de isenção subjectiva e que os seus clientes indicados na lista que consta do documento n.º 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral também gozam de isenção subjectiva.
3.1. Questão da Taxa de Serviço ao Comerciante (“TSC”)
3.1.1. Posições das Partes
A Requerente defende o seguinte, em suma:
– estando a TSC sujeita a imposto do selo, nos termos do artigo 6.º do Código do Imposto do Selo, do nº 13 do artigo 66.º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais e outra legislação avulsa, as entidades previstas nessas normas estão isentas de IS (isenção subjectiva) quando este constitua seu encargo;
– os clientes da Requerente eram os titulares do interesse económico nas operações financeiras realizadas por ou com intermediação de instituições de rédito, sociedades ou outras instituições financeiras, nos termos da alínea g) do n.º 3 do artigo 3.º do Código do Imposto do Selo (CIS);
– só com a Lei nº 22/2017, de 23 de Maio se veio estabelecer que são titulares do interesse económico “nas operações de pagamento baseadas em cartões, previstas na verba 17. 3. 4. da Tabela Geral do Imposto do Selo, as instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras a quem aquelas forem devidas" (cf. alínea h) do n.º 3 do artigo 3.º do Código do Imposto do Selo);
– ainda que se aplicasse esta norma, não seria devido IS, na medida em que o Banco A..., na qualidade de pessoa coletiva de utilidade pública, está isenta subjetivamente do pagamento do IS quando este constitua seu encargo
– à data da apresentação dos elementos a AT no âmbito da acção de inspeção, o Banco A... apenas dispunha de informação agregada, não lhe sendo possível identificar operações diárias e isenções, pelo que não lhe era possível efetuar o apuramento correto do Imposto do Selo a liquidar;
– deste modo, a AT procedeu ao apuramento do IS, com base na informação facultada pelo Banco A...;
– no entanto, no âmbito do procedimento da Reclamação Graciosa, o Banco A... apresentou uma lista de clientes que subjetivamente se encontravam IS, para os quais a AT procedeu ilegalmente ao apuramento deste imposto relativamente às comissões que lhe foram cobradas, cuja cópia se anexa como Documento n.º 8;
– a AT limitou-se a ignorar a informação facultada no procedimento de Reclamação Graciosa, alegando que o Banco A... não lhe tinha feito chegar a documentação com a discriminação solicitada;
– nenhum pedido de informação adicional foi efetuado pela AT para analisar a informação facultada no procedimento de Reclamação Graciosa, colocando-se, sempre, a Requerente à disposição para facultar toda a informação adicional que a AT entendesse necessária para a verificação dos elementos enviados.
– pretende a Requerente que seja anulada parte da correcção, no montante de € 6.820,28, resultante da aplicação da taxa de 4%, prevista na Verba 17.3.4. da TGIS, sobre a comissão TSC cobrada pelo Banco A... (no montante de € 170.506,91) a clientes (comerciantes) que subjetivamente se encontram isentos de IS, bem como os respetivos juros compensatórios, no montante de € 653,65;
e que seja anulada a correcção no montante de € 668.175,61, resultante da aplicação da taxa de 4%, prevista na Verba 17.2.4. da TGIS, sobre o valor cobrado com as comissões “taxa multilateral de intercâmbio” e com as comissões cobradas nas “operações efetuadas com cartões bancários em caixas automático”, bem como os respetivos juros compensatórios, no montante de € 64.054,00.
A Autoridade Tributária e Aduaneira no presente processo defendendo o seguinte, em suma:
– a Requerente é o sujeito passivo do imposto, nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 2º do CIS;
– ainda que considerando que o encargo do imposto é titulado pelo detentor do interesse económico (in casu, os comerciantes, que são os clientes do banco), é aplicável o nº 1 do artigo 28º da LGT, preceito que responsabiliza o substituto (ou seja o sujeito passivo, no caso presente) pelas importâncias retidas e não entregues nos cofres do Estado, ficando o substituído desonerado de qualquer responsabilidade;
– houve retenção pelo sujeito passivo;
– o comerciante recebe o crédito reduzido pela retenção de determinadas importâncias que o Banco tem por devidas;
– estamos perante uma situação de substituição com retenção, sendo aplicável o disposto no n.º 1 do artigo 28º da LGT;
– nem se pode argumentar que o Banco (prestador de serviço) reteve a sua comissão, mas não o imposto devido;
– pelas importâncias que não foram retidas e deveriam ter sido a título definitivo, a Requerente é a responsável, nos termos do n.º 3 do artigo 28.º da LGT;
– assim se conclui ser a Requerente a efectiva responsável pelo pagamento do imposto de selo devido pela TSC, quer se entenda que efectuou a sua retenção, quer se entenda que não;
– a TSC enquadra-se na verba 17.3.4 da TGIS, como foi esclarecido pela Lei n. 7-A/2016, de 30 de Março, como natureza interpretativa;
3.1.2. Apreciação da questão
A Requerente pretende a anulação das liquidações de IS e juros compensatórios apenas nas partes em que as taxas foram cobradas a entidades isentas.
Nos termos do artigo 6.º do Código do Imposto do Selo, estão isentas de Imposto do Selo, designadamente, o Estado e seus organismos públicos, as pessoas coletivas de utilidade pública e as IPSS, e também, nos termos do artigo 66.º-A, n.º 12 (actual n.º 13), do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), estão isentas de Imposto do Selo as cooperativas. Por isso, entende a Requerente que não tinha de liquidar IS quanto às TSC cobradas a estas entidades.
A Autoridade Tributária e Aduaneira nada diz sobre as isenções subjectivas que a Requerente invoca, designadamente as dos seus clientes indicados na lista que consta do documento n.º 8.
Na falta de qualquer contestação relativa à correspondência a realidade da lista de clientes isentos de imposto do selo que consta do documento n.º 8, considerou-se provado que essa correspondência existe. Na verdade, neste documento são indicados os números fiscais desses clientes, pelo que a Administração Tributária teve oportunidade de comprovar se as alegadas isenções subjectivas desses contribuintes existiam ou não. No mínimo, neste contexto, perante a falta de invocação por quem tem a possibilidade de apurar a realidade, de qualquer fundamento para colocar em dúvida a correspondência à realidade da lista referida, teria de concluir-se pela existência de uma dúvida fundada sobre a natureza das entidades a que se reportam os números fiscais indicados pela Requerente, que se reconduz a dúvida fundada sobre a existência de facto tributário, que teria de ser valorada processualmente a favor da Requerente, por força do disposto no artigo 100.º, n.º 1, do CPPT.
À face do regime legal vigente em 2014, o imposto constituía encargo do titular do interesse económico que, no caso de operações financeiras não especificadas, era o cliente destas, nos termos dos n.ºs 1 e 3, alínea g), do artigo 3.º do CIS. Na verdade, só com a Lei n.º 22/2017, de 23 de Maio, se veio a estabelecer que são titulares do interesse económico «nas operações de pagamento baseadas em cartões, previstas na verba 17.3.4. da Tabela Geral do Imposto do Selo, as instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras a quem aquelas forem devidas» [alínea h) do n.º 3 do referido artigo 3.º].
Assim, tratando-se de casos em que o imposto era encargo dos clientes, eram aplicáveis as isenções subjectivas previstas no artigo 6.º do CIS.
De resto, estabelecendo a alínea c) do artigo 6.º do CIS uma isenção subjectiva para as pessoas colectivas de utilidade pública, quando o IS seja seu encargo, a entender-se que relativamente à TSC se estaria perante um encargo da própria Requerente, teria de se concluir pela ilegalidade das liquidações de IS e juros compensatórios, nas partes respectivas. Na verdade, essa qualidade de pessoa colectiva de utilidade pública foi reconhecida à Requerente pelo Despacho de 08-10-1991, publicado no Diário da República, II Série, de 22-10-1991, n.º 243, página 10.528, em que se declara de utilidade pública a C..., que era a designação anterior da Requerente ( ).
Assim, tem de se concluir que as liquidações impugnadas são ilegais nas partes em que têm como pressuposto as TSC referidas na lista que consta do documento n.º 8, independentemente do entendimento que se adopte sobre que questão de saber se o IS, em 2014, era encargo das instituições financeiras ou dos seus clientes.
Na verdade, beneficiando todos de isenção subjectiva, não se constitui obrigação de imposto em relação a qualquer deles.
Pelo exposto, as liquidações de IS e juros compensatórios são ilegais, por violação do referido artigo 6.º do CIS, nas partes em que têm como pressuposto as TSC que constam do documento n.º 8.
Procede, assim, o pedido de pronúncia arbitral à anulação das liquidações quanto ao montante de € 6.820,28, resultante da aplicação da taxa de 4%, prevista na Verba 17.34. da TGIS, sobre a comissão TSC cobrada pelo Banco A... (no montante de € 170.506,91) a clientes que subjectivamente se encontram isentos de IS, bem como os respetivos juros compensatórios, no montante de € 653,65.
Procedendo o pedido de pronúncia arbitral com base neste fundamento, por vício que impede a renovação dos actos, fica prejudicado, por ser inútil (artigos 130.º e 608.º, n.º 2, do CPC), o conhecimento das restantes questões suscitadas pela Requerente quanto a esta questão, designadamente relativas ao não atendimento dos documentos apresentados na reclamação graciosa e não formulação de nenhum pedido de informação adicional.
Na verdade, o artigo 124.º do CPPT, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, do RJAT, ao estabelecer uma ordem de conhecimento de vícios, pressupõe que, julgado procedente um vício que assegura a eficaz tutela dos direitos dos impugnantes, não é necessário conhecer dos restantes, pois, se fosse sempre necessário apreciar todos os vícios imputados ao acto impugnado, seria indiferente a ordem do seu conhecimento.
Pelo exposto, não se toma conhecimento dos restantes vícios imputados pela Requerente.
3.2. Questão da ilegalidade da liquidação de imposto do selo sobre a taxa multilateral de intercâmbio (TMI) e comissões cobradas sobre operações efectuadas com cartões em caixas automáticos
3.2.1. Posições das Partes
A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma correcção em sede de IS, apurando o montante em falta € 668.175,61, resultante da aplicação de 4%. prevista na Verba 17.3.4 da TGIS, sobre o valor cobrado com as comissões “taxa multilateral de intercâmbio" e com as comissões cobradas nas "operações efetuadas com cartões bancários em caixas automáticos”.
No entendimento da Autoridade Tributária e Aduaneira, as comissões referidas encontram-se sujeitas à Verba 17.3.4 da TGIS, por respeitarem a serviços financeiros e estarem isentas de IVA, não sendo aplicável a isenção prevista na alínea e) do nº 1 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo, por as comissões em causa, embora cobradas por e entre bancos, não estão diretamente relacionadas com a concessão de crédito entre eles.
Entendeu ainda a Autoridade Tributária e Aduaneira que a alínea e) do nº 1 do art.º 7.º do CIS, só isenta de Imposto do Selo aqueles juros e comissões que estejam diretamente ligadas a operações de concessão de crédito, no âmbito de atividade exercida pelas instituições e entidades referidas naquele normativo.
A Requerente defende, em suma, o seguinte:
– efectuando uma análise a evolução histórica da norma em causa, verifica-se que apenas na versão original e, posteriormente, entre o período em que vigorou a redação dada pelo artigo 37.º da Lei nº 30-C/2000, de 29 de dezembro (que acrescentou o nº 2 ao artigo 6.º tal como referido no Relatório de Inspeção pela AT), a isenção se podia aplicar às comissões que tivessem subjacentes operações destinadas à concessão de crédito;
– a partir do momento em que, por vontade do legislador, aquele nº 2 foi revogado, não se pode deixar de concluir que a isenção da alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo não se restringia, anteriormente à entrada em vigor da Lei nº 7- A/2016, às operações diretamente destinadas à concessão de crédito;
– a Lei do Orçamento do Estado para 2016, através do aditamento do n.º 7 ao artigo 7.º do CIS, veio restringir o campo de aplicação da isenção de IS prevista na alínea e) do nº 1 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo, estando, assim, perante uma norma inovadora;
– está-se perante a imposição de um encargo fiscal que não se encontra previsto na ordem jurídica desde 2003, tem de o considerar retroactivo e como tal inconstitucional, por violação do princípio da proteção da confiança e da segurança jurídica;
No presente processo a Autoridade Tributária e Aduaneira defende, em suma, que a nova norma do n.º 7 do artigo 7.º do CIS, aditada pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, não é inovadora, mas sim verdadeiramente interpretativa, pelo que não é materialmente inconstitucional.
3.2.2. Apreciação da questão
As comissões TMI (Taxa Multilateral de Intercâmbio) e as comissões interbancárias cobradas pela utilização de Caixas Automáticos (ATM ou multibanco) em operações com cartões bancários, são comissões cobradas entre bancos [detentores de ATM ou emissores de cartões bancários].
Como se refere no Relatório da Inspecção Tributária, no âmbito dos procedimentos originados pelo pagamento de compras em Terminais de Pagamento Automático, depois do pagamento pelo adquirente (acquirer) ao comerciante, aquele é reembolsado e paga-lhe uma comissão (taxa multilateral de intercâmbio ou multilateral interchange fee).
Com base na informação retirada do site do Banco de Portugal, que serve de suporte ao Relatório da Inspecção Tributária, conclui-se que, existindo um pagamento (por exemplo, da água, da eletricidade, ou de qualquer outro bem e/ou serviço) efetuado através dos ATM, é cobrada uma comissão pelo Banco detentor do ATM ao Banco emissor do cartão bancário (seja de débito seja de crédito) pelo serviço prestado; e, de igual modo, quando o cliente de um banco procede ao levantamento de numerário numa caixa automática (ou ATM) pertencente a outro Banco [Banco detentor do ATM], este cobra uma comissão ao banco emissor do cartão bancário pelo serviço prestado com aquela operação. Estas são, pois, as comissões interbancárias cobradas pela utilização de CA em operações de pagamentos com cartões, de levantamentos de numerário, de consultas de saldos ou de movimentos, de carregamentos telemóveis, etc..
A Requerente não procedeu a qualquer liquidação de Imposto do Selo sobre as comissões TMI nem sobre as comissões interbancárias que cobrou pela utilização de Caixas Automáticas em operações efetuadas com cartões bancários.
A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma correcção relativamente a estas comissões, por entender que elas também se enquadram na verba 17.3.4 da TGIS.
Como se vê pelo resumo que se fez do alegado pela Requerente, não questiona que comissões referidas se enquadram nesta verba, nem coloca qualquer dúvida quanto à constitucionalidade da natureza interpretativa que foi atribuída pelo artigo 154.º da Lei n.º 7-A/2016, à nova redacção que deu a essa verba.
Na verdade, a Requerente apenas questiona o entendimento da Autoridade Tributária e Aduaneira de que não era aplicável a esta situação a isenção prevista na alínea e) do n.º 1, do artigo 7.º do CIS, por abranger apenas operações de crédito e defende que o n.º 7 deste artigo, aditado pela Lei n.º 7-A/2016, não é aplicável, apesar da natureza interpretativa que lhe foi atribuída pelo seu artigo 154.º, por ter natureza inovadora e, por isso, ser materialmente inconstitucional.
Antes de mais, importa precisar qual o alcance da alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º, na redacção vigente em 2014. Se se entender que a interpretação da Requerente era a correcta, à face dos critérios gerais de interpretação, será necessário apreciar se o n.º 7 do artigo 7.º do CIS aditado pela Lei n.º 7-A/2013, de 30 de Março, é ou não materialmente inconstitucional.
3.2.2.1. Interpretação da alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS
A alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS, na redacção introduzida pela Lei n.º 107-B/2003, de 31 de Dezembro, estabelece o seguinte:
1 - São também isentos do imposto:
(...)
e) Os juros e comissões cobrados, as garantias prestadas e, bem assim, a utilização de crédito concedido por instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras a sociedades de capital de risco, bem como a sociedades ou entidades cuja forma e objecto preencham os tipos de instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras previstos na legislação comunitária, umas e outras domiciliadas nos Estados membros da União Europeia ou em qualquer Estado, com excepção das domiciliadas em territórios com regime fiscal privilegiado, a definir por portaria do Ministro das Finanças;
A Requerente defendeu na reclamação graciosa que as comissões em causa se enquadram nesta isenção, mas a Administração Tributária, na decisão, entendeu que
– «68. Estando sujeitas a Imposto do Selo, também se dirá que estas comissões não se encontram isentas, isto é, no que respeita a estas comissões, estando as mesmas sujeitas à verba 17.3.4 da TGIS como vimos supra, às mesmas não é aplicável a isenção a que alude a alínea e) do n." 1 do art.º 7º do CIS, na justa medida em que as comissões em apreço, embora cobradas por e entre bancos não estão diretamente relacionadas com a concessão de crédito entre eles [como o impõe a alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS].
69. Nestes termos, temos de concluir que, a norma agora introduzida pela Lei Orçamento do Estado para 2016 (e o seu caráter interpretativo) não constitui qualquer novidade, porquanto o legislador, no âmbito da sua liberdade conformadora acrescentou, através do artigo 152.º da Lei do Orçamento do Estado para 2016, o n.º 7 ao artigo 7.º do CIS o qual estabelece que "O disposto na alínea e) do n.º 1 apenas se aplica às garantias e operações financeiras diretamente destinadas à concessão de crédito, no âmbito da atividade exercida pelas instituições e entidades referidas naquela alínea". As comissões em apreço, embora cobradas por e entre "Bancos" não estão diretamente relacionadas com a concessão de crédito entre eles, pelo que se encontram sujeitas e não isentas ao imposto do Selo.
70. Conforme resulta do texto legal o legislador não se limitou a alterar o artigo 7.º do CIS introduzindo-lhe o novo n.º 7, ou seja, foi mais atém e, sob a epígrafe "Disposição interpretativa no âmbito do Código do Imposto do Selo", estabeleceu no artigo 154.º da Lei do Orçamento do Estado para 2016 que as redações dadas ao n.º 1, n.º 3 e alínea b) do n." 5, todos do artigo 2.º ao n.º 8 do artigo 4.º e ao n.º 7 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo e à verba 17.3.4 da Tabela Geral do Imposto do Selo têm caráter interpretativo.
Na decisão do recurso hierárquico, a Administração Tributária manteve este sentido decisório, invocando uma Instrução de Serviço n.º 40051, - Série I. de 2017-12-04 do Gabinete da Subdiretora-Geral da Área dos Impostos sobre o Património", em que se divulga, o seguinte entendimento: “As Taxas e Comissões referidas preenchem todos os pressupostos de incidência previstos no CIS, estando por isso sujeitas a imposto do selo, nos termos previstos na verba 17.3.4 da respetiva TGIS. Dada a natureza deste tipo de operações, não lhes é aplicável a isenção prevista na alínea e) do n.º 1 do artigo 7." do CIS, conforme resulta da interpretação do n.º 7 do mesmo dispositivo legal. De acordo com o artigo 154.º da Lei 7-A/2016, de 30 de março (Lei do Orçamento de Estado para 2016), as redações do n.º 7 do artigo 7.º do CIS e da verba 17.3.4 da TGIS, introduzidas pelos artigos 152º e 153º, respetivamente, tem caráter interpretativo”.
À face das redacções iniciais do Regulamento do Imposto do Selo, aprovado pelo Decreto n.º 12.700, de 20-11-1926, e da Tabela Geral do Imposto do Selo aprovada pelo Decreto n.º 21.916, de 28-11-1932, não estava prevista isenção para comissões cobradas pela prestação de serviços financeiros.
Com o Decreto-Lei n.º 119-B/83, de 28 de Fevereiro, passara a ficar «isentos do imposto os juros dos empréstimos concedidos para aquisição de habitação própria» (artigo 120.º-A, n.º 2, da TGIS).
O Decreto-Lei n.º 154/84, de 16 de Maio, alargou o âmbito desta isenção, estabelecendo que «ficam isentos do imposto os juros dos empréstimos concedidos para aquisição de habitação própria, bem como os devidos por instituições de crédito ou parabancárias a instituições da mesma natureza».
Com o Decreto-Lei n.º 205/90, de 25 de Junho, foram aditadas isenções para «os seguros-caução, as comissões incidentes sobre garantias bancárias e as fianças constituídas para garantir direitos aduaneiros e outras imposições relativamente a mercadorias importadas sob regimes aduaneiros suspensivos» (artigo 4.º, § único da TGIS), para «as transferências bancárias efectuadas pela Nunciatura Apostólica a favor da Santa Sé» (artigo 120.º-A, n.º 5, da TGIS), e para operações de crédito ao consumo (artigo 120.º-B, n.º 4, da TGIS).
O Decreto-Lei n.º 223/91, de 18 de Junho, efectuou uma revisão das isenções relativas a operações bancárias, alterando o n.º 2 do artigo 120.º-A da TGIS, mas não incluiu qualquer referência a comissões:
2 - São isentos do imposto:
a) Os juros dos empréstimos concedidos para aquisição, construção, reconstrução ou melhoramento de habitação própria;
b) Os juros devidos por instituições de crédito ou parabancárias a instituições da mesma natureza, uma e outras domiciliadas em território português, bem como as operações cambiais realizadas entre as mesmas instituições;
c) Os juros das operações do Crédito Agrícola de Emergência, criado pelo Decreto-Lei n.º 251/75, de 28 de Maio, cuja responsabilidade directa venha a ser assumida pelo Estado, quer como utilizador directo, quer como avalista;
d) As operações sobre certificados de depósito;
e) As transferências bancárias efectuadas pela Nunciatura Apostólica a favor da Santa Sé;
f) As operações bancárias realizadas entre sucursais financeiras exteriores instaladas nas Zonas Francas da Madeira e da ilha de Santa Maria e não residentes no território nacional;
g) As operações de venda com garantia de recompra que tenham por objecto bilhetes do Tesouro (BT) ou créditos em sistema de leilão ao investimento público (CLIP).
Com a Lei n.º 2/92, de 9 de Março, foi aditada uma alínea h) ao n.º 2 do artigo 120.º-A, com a seguinte redacção:
h) As comissões relativas a garantias de financiamento à exportação;
Como Decreto-Lei n.º 162/94, de 4 de Junho, foi alterada esta alínea b) do artigo 120.º-A que ficou com a seguinte redacção:
b) Os juros devidos por instituições de crédito ou sociedades financeiras a entidades da mesma natureza e, bem assim, as operações cambiais realizadas entre as mesmas, umas e outras domiciliadas em território português;
A Lei n.º 24/94, de 18 de Julho, alterou o n.º 2 do artigo 120.º-A da TGIS, passando a referir na alínea b):
b) os juros devidos por instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas a instituições, sociedades ou a entidades da mesma natureza, umas e outras domiciliadas em território português.
De igual isenção beneficiam as operações cambiais realizadas entre as mesmas entidades ou entre estas e outras da mesma natureza domiciliadas no estrangeiro, bem como a venda de moeda estrangeira a sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, a empresas públicas e a empresários em nome individual com contabilidade organizada, destinadas ao pagamento de bens e serviços importados, no âmbito da sua actividade»;
Como resulta da evolução legislativa que se reproduziu em matéria de isenções relativas a operações financeiras, até à Lei n.º 150/99, de 11 de Setembro, a que aprovou o primeiro Código do Imposto do Selo (em substituição do anterior Regulamento do Imposto do Selo, aprovado pelo Decreto n.º 12700, de 20 de Novembro de 1926), relativamente a comissões, apenas se previam isenções para as «incidentes sobre garantias bancárias e as fianças constituídas para garantir direitos aduaneiros e outras imposições relativamente a mercadorias importadas sob regimes aduaneiros suspensivo» (§ único do artigo 4.º da TGIS) e as «relativas a garantias de financiamento à exportação» [alínea h) do n.º 2 do artigo 120.º-A, aditada pela Lei n.º 2/92, de 9 de Março.
Com o Código do Imposto do Selo de 1999, as isenções relativas a comissões relacionadas com operações financeiras passaram a estar previstas nas alíneas e) e f) do artigo 6.º, nestes termos:
Artigo 6.º
Outras isenções
1 - Ficam também isentos do imposto:
(...)
e) Os juros cobrados e a utilização de crédito concedido por instituições de crédito e sociedades financeiras a instituições, sociedades ou entidades cuja forma e objecto preencham os tipos de instituições de crédito e sociedades financeiras previstas na legislação comunitária, umas e outras domiciliadas nos Estados membros da União Europeia, ou em qualquer Estado cumpridor dos princípios decorrentes do Código de Conduta aprovado pela Resolução do Conselho da União Europeia, de 1 de Dezembro de 1997;
f) As comissões cobradas por instituições de crédito a outras instituições da mesma natureza ou entidades cuja forma e objecto preencham os tipos de instituições de crédito previstos na legislação comunitária, domiciliadas nos Estados membros da União Europeia, ou em qualquer Estado cumpridor dos princípios decorrentes do Código de Conduta aprovado pela Resolução do Conselho da União Europeia, de 1 de Dezembro de 1997;
Houve, assim, uma ampliação da isenção relativa a comissões cobradas pelas instituições de crédito a outras instituições da mesma natureza e entidades previstas nesta alínea f) que passou a abranger quaisquer comissões, independentemente de estarem ou não relacionadas com a concessão de crédito.
A Lei n.º 30-C/2000, de 29 de Dezembro, veio alterar aquelas alíneas e) e f) do n.º 1 do artigo 6.º e alterar o seu n.º 2, nestes termos:
Artigo 6.º
Outras isenções
1 - Ficam também isentos do imposto:
e) Os juros cobrados e a utilização de crédito concedido por instituições de crédito e sociedades financeiras a instituições, sociedades ou entidades cuja forma e objecto preencham os tipos de instituições de crédito e sociedades financeiras previstas na legislação comunitária, umas e outras domiciliadas nos Estados membros da União Europeia, ou em qualquer Estado, com excepção das domiciliadas em territórios com regime fiscal privilegiado a definir por portaria do Ministro das Finanças;
f) As comissões cobradas por instituições de crédito a outras instituições da mesma natureza ou entidades cuja forma e objecto preencham os tipos de instituições de crédito previstos na legislação comunitária, domiciliadas nos Estados membros da União Europeia, ou em qualquer Estado, com excepção das domiciliadas em territórios com regime fiscal privilegiado a definir por portaria do Ministro das Finanças.
2 - O disposto nas alíneas e) e f) apenas se aplica às operações financeiras directamente destinadas à concessão de crédito, no âmbito da actividade exercida pelas instituições e entidades referidas naquelas alíneas.
Este n.º 2 veio, assim, introduzir uma explícita restrição do âmbito da isenção referida na alínea f), pois passou a aplicar-se apenas «às operações financeiras directamente destinadas à concessão de crédito», no âmbito da actividade exercida pelas instituições de crédito e outras instituições e entidades aí referidas.
Na verdade, a natureza interpretativa que a Autoridade Tributária e Aduaneira defende ter este n.º 2 não tem qualquer suporte normativo, pois o texto da alínea f) na redacção da Lei n.º 150/99 não dava margem para qualquer interpretação restritiva.
Por outro lado, para além de a Lei n.º 30-C/2000 não aludir a qualquer intenção de atribuir natureza interpretativa nem ser conhecida qualquer controvérsia jurisprudencial sobre o alcance daquela alínea f) na redacção inicial, o Relatório do Orçamento para 2001 ( ), explica o alcance destas alterações de forma a afastar qualquer intenção de clarificação, quanto ao âmbito das comissões abrangidas:
Em matéria de isenções, procura-se clarificar o alcance das normas do artigo 6º, nº1, alíneas e) e f), revendo a identificação dos Estados onde se encontrem domiciliadas tais entidades para uma portaria do Ministro das Finanças, à semelhança, aliás, da redacção proposta para o art.º 57º- A do Código do IRC. Tendo havido dificuldades por parte dos operadores económicos em apurar quais os Estados cumpridores dos princípios decorrentes do Código de Conduta, e havendo consenso em que a isenção deve abranger todos os Estados, com excepção daqueles que vulgarmente são designados como “paraísos fiscais”, afigura-se esta a melhor solução
Exclui-se ainda de isenção os juros e as comissões cobrados, bem como o crédito concedido, nas situações em que o crédito em causa não se destine directamente a novas concessões de crédito. Sendo o crédito obtido por instituições de crédito junto de outras instituições da mesma natureza destinado a novas concessões de crédito, justifica-se a isenção para tais operações financeiras pois que de outra maneira ocorreria uma dupla tributação económica, com reflexos negativos, designadamente, ao nível da concorrência. Tal justificação já não colhe, porém, nas situações em que tais instituições recorram ao crédito para outros fins. ( )
Como se vê por esta exposição de motivos, apenas quanto à «identificação dos Estados onde se encontrem domiciliadas tais entidades» se afirma a intenção de clarificação.
Quanto às comissões abrangidas não se refere qualquer intenção de clarificação, mas sim de excluir «de isenção os juros e as comissões cobrados, bem como o crédito concedido, nas situações em que o crédito em causa não se destine directamente a novas concessões de crédito», o que, obviamente, tem ínsito que estas comissões que passam a estar excluídas não estavam excluídas anteriormente.
Por isso, o contributo interpretativo deste Orçamento do Estado para 2000 é precisamente no sentido contrário ao defendido pela Autoridade Tributária e Aduaneira, pois ficou esclarecido, antes, que a isenção relativa a comissões não se aplicava apenas «às operações financeiras directamente destinadas à concessão de crédito».
A Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, veio alterar a alínea e) do n.º 1 do artigo 6.º, que foi reformulada de forma a abranger as isenções anteriormente previstas nas alíneas e) e f) e eliminou o n.º 2, que havia sido introduzido pela Lei n.º 30-C/2000, passando os nºs 3 e 4 da anterior redação a ser os nºs 2 e 3 da nova redacção:
e) Os juros e comissões cobrados e, bem assim, a utilização de crédito concedido por instituições de crédito e sociedades financeiras a sociedades de capital de risco, bem como a sociedades ou entidades cuja forma e objecto preencham os tipos de instituições de crédito e sociedades financeiras previstos na legislação comunitária, umas e outras domiciliadas nos Estados membros da União Europeia, ou em qualquer Estado, com excepção das domiciliadas em territórios com regime fiscal privilegiado a definir por portaria do Ministro das Finanças;
2 - (Anterior n.º 3)
3 - (Anterior n.º 4)
Assim, como bem se conclui no acórdão proferido no processo arbitral n.º 348/2016-T:
– «a referida nova alínea e), resultante da fusão das anteriores alíneas e) e f) passou a isentar de imposto os juros e comissões cobradas, bem como a utilização do crédito concedido por instituições de crédito e sociedades financeiras a sociedades de capital de risco, bem como a sociedades cuja forma e objeto preenchessem os tipos de instituições de crédito e sociedades financeiras previstos na legislação comunitária, umas e outras domiciliadas nos Estados membros da União Europeia ou em qualquer Estado, com exceção das domiciliadas em territórios com regime fiscal privilegiado, a definir por portaria do Ministro das Finanças»;
– «tal norma legal ampliaria, assim, em primeiro lugar, a isenção do imposto do selo, então limitada ao crédito, incluindo os respetivos juros, concedido por instituições de crédito e sociedades financeiras a entidades da mesma natureza ao crédito, incluindo os respetivos juros concedidos por instituições de crédito e sociedades financeiras às sociedades de capital de risco, então reguladas pelo Decreto-Lei nº 319/2002, de 29 de Dezembro»;
– «a isenção seria ampliada, em segundo lugar, às comissões cobradas por instituições de crédito e sociedades financeiras a sociedades financeiras e sociedades de capital de risco»;
– «foi, assim, expressamente e não apenas tacitamente eliminada a limitação da isenção às operações diretamente destinadas à concessão de crédito, no âmbito da atividade desenvolvida pelas instituições de crédito e sociedades financeiras».
No pressuposto, que se tem de presumir por forma do n.º 3 do artigo 9.º do Código Civil, de que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, é óbvio que a eliminação do n.º 2 da redacção anterior tem o alcance de eliminar a restrição e não de a manter.
A letra da nova alínea e) também aponta neste sentido, como se refere no acórdão arbitral proferido no processo n.º 348/2016-T, «a expressão “bem como”, que quer dizer “igualmente”, “também” e “do mesmo modo”, utilizada na nova redação da alínea e) quer dizer claramente a isenção dos juros e comissões cobradas se aplicar em termos idênticos à utilização do crédito. Chama a atenção para a uniformidade dos pressupostos da isenção de imposto do selo do crédito concedido e dos juros cobrados com o das comissões cobradas, em operações em que fossem exclusivamente intervenientes instituições de crédito e sociedades financeiras, não tendo qualquer alcance restritivo».
Com o Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, o regime daquela alínea e) do n.º 1 do artigo 6.º, passou a constar da alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS.
A Lei n.º 107-B/2003, de 31 de Dezembro, alterou a redacção desta alínea e), estendendo a isenção às garantias prestadas:
e) Os juros e comissões cobrados, as garantias prestadas e, bem assim, a utilização de crédito concedido por instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras a sociedades de capital de risco, bem como a sociedades ou entidades cuja forma e objecto preencham os tipos de instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras previstos na legislação comunitária, umas e outras domiciliadas nos Estados membros da União Europeia ou em qualquer Estado, com excepção das domiciliadas em territórios com regime fiscal privilegiado, a definir por portaria do Ministro das Finanças;
Não houve qualquer alteração legislativa desta isenção até 2016, pelo que é este o regime aplicável no ano de 2014 a que se reportam as liquidações impugnadas.
As normas que prevêem benefícios fiscais têm a natureza de normas excepcionais, como decorre do teor expresso do artigo 2.º, n.º 1, do EBF, pelo que devem ser interpretadas, em princípio, nos seus precisos termos, sem ampliações ou restrições, de forma a abrangerem todos os casos nelas literalmente previstos e apenas esses, como é jurisprudência pacífica sobre a interpretação desse tipo de normas ( ), sem prejuízo de eventuais ampliações ou restrições que permitam concluir com segurança que o legislador não exprimiu adequadamente a intenção legislativa, designadamente trabalhos preparatórios ou textos explicativos.
Isto é, as normas sobre benefícios fiscais devem ser interpretadas em termos estritos e não restritos.
No caso em apreço, nem o teor literal da norma, nem a evolução legislativa nem qualquer trabalho preparatório ou explicativo (como preâmbulo de diploma ou exposição de motivos ou discussão parlamentar) permitem a interpretação restritiva propugnada pela Administração Tributária.
Assim, à face do regime legal vigente no ano de 2014 é de concluir que a generalidade das comissões cobradas por instituições de crédito a outras instituições de crédito, designadamente entre bancos, eram enquadráveis nesta norma e não apenas as «diretamente relacionadas com a concessão de crédito entre eles», como entendeu a Administração Tributária.
3.2.2.2. Questão da aplicação do n.º 7 do artigo 7.º do CIS, aditado pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março
É certo que, posteriormente, a Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, veio aditar ao artigo 7.º do CIS um n.º 7 com a seguinte redacção:
7 - O disposto na alínea e) do n.º 1 apenas se aplica às garantias e operações financeiras diretamente destinadas à concessão de crédito, no âmbito da atividade exercida pelas instituições e entidades referidas naquela alínea.
O artigo 154.º desta Lei n.º 7-A/2016 atribuiu a este n.º 7 do artigo 7.º do CIS natureza interpretativa.
Porém, pelo que se referiu, esta restrição não constava da redacção da alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS, pelo que se está perante uma norma de natureza inovadora.
Assim, este artigo 154.º manifesta uma interpretação de aplicação retroactiva, aditando uma nova restrição à referida isenção, que é incompaginável com a proibição constitucional da retroactividade das normas criadoras de impostos, que consta do artigo 103.º, n.º 3, da CRP, como vem entendendo reiteradamente o Tribunal Constitucional, relativamente àquele artigo 154.º ( ) e à norma semelhante do artigo 135.º da Lei n.º 7-A/2016. ( )
Por isso, tem de ser recusada a aplicação desta norma do artigo 154.º da lei n.º 7-A/2016 (artigo 204.º da CRP) a factos tributários ocorridos antes da sua entrada em vigor, designadamente no ano de 2014 a que se reportam as liquidações impugnadas.
3.2.2.3. Conclusão
Assim, verificam-se todos os pressupostos previstos na alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS, pelo que as comissões cobradas pela Requerente a título de taxa multilateral de intercâmbio e comissões cobradas sobre operações efectuadas com cartões em caixas automáticos estavam isentas de IS, pelo que as liquidações impugnadas são ilegais, nas partes respectivas, o que justifica a sua anulação, nos termos do artigo 134.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo de 1991 (vigente em 2014) subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.
3.3. Decisão do recurso hierárquico
A decisão do recurso hierárquico que manteve as liquidações impugnadas enferma dos mesmos vícios que afectam estas, pelo que também se justifica a sua anulação.
4. Restituição das quantias pagas e juros indemnizatórios
A Requerente pede a restituição da quantia de € 739.703,54, correspondente à anulação parcial das liquidações de IS (€ 674.995,89) e juros compensatórios (€ 64.707,65), acrescida de juros indemnizatórios.
De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».
Embora o artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária». O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do artigo 61.º, n.º 4 do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».
Assim, o n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.
Como os juros indemnizatórios dependem da existência de um montante a reembolsar, insere-se também na competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD determinar a restituição de quantias indevidamente pagas, como consequência da anulação de actos de liquidação.
Cumpre, assim, apreciar os pedidos de restituição das quantias pagas acrescidas de juros indemnizatórios.
4.1. Restituição de quantias pagas
Em 16-01-2017, a Requerente efectuou o pagamento das quantias liquidadas.
Procedendo o pedido de pronúncia arbitral quanto às partes das liquidações de Imposto do Selo e juros compensatórios que são impugnadas, deve ser restituída à Requerente a quantia de € 739.703,54 que pagou indevidamente.
4.2. Juros indemnizatórios
O regime substantivo do direito a juros indemnizatórios é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, o seguinte:
Artigo 43.º
Pagamento indevido da prestação tributária
1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
Os erros que afectam as liquidações de Imposto do Selo e de juros compensatórios são imputáveis à Autoridade Tributária e Aduaneira, que as efectuou por sua iniciativa.
Consequentemente, a Requerente tem direito a juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º do CPPT.
Os juros indemnizatórios são calculados com base no valor de € 739.703,54, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1, e 35.º, n.º 10 da LGT, do artigo 24.º, n.º 1, do RJAT, do artigo 61.º, n.ºs 3 e 4, do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril (ou outra ou outras que alterem a taxa legal), desde a data do pagamento (16-01-2017) até ao integral reembolso.
5. Decisão
Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
b) Anular parcialmente a liquidação de Imposto do Selo (IS) n.º 2017..., quanto ao valor de € 674.995,89 e as liquidações de juros compensatórios n.ºs 2017..., 2017..., 2017..., 2017..., 2017..., 2017..., 2017..., 2017..., quanto ao montante global de € 64.707,65;
c) Anular a decisão de indeferimento do recurso hierárquico n.º ...2018...;
d) Julgar procedentes os pedidos de restituição da quantia paga, quanto ao valor de € 739.703,54, e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a efectuar o seu pagamento à Requerente;
e) Julgar procedente o pedido de juros indemnizatórios e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar à Requerente esses juros calculados sobe a quantia de € 739.703,54, nos termos referidos no ponto 4.2. deste acórdão.
6. Valor do processo
De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 739.703,54.
7. Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 10.710,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
8. Comunicação ao Ministério Público
Uma vez que foi recusada, com fundamento em inconstitucionalidade, a aplicação do artigo 154.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, bem como da nova redacção da verba 17.3.4., que introduziu na TGIS, comunique-se à Excelentíssima Senhora Procuradora-Geral da República, para os fins do artigo 280.º, n.º 5, da CRP.
Lisboa, 30-09-2020
Os Árbitros
(Jorge Lopes de Sousa)
(Rui Ferreira Rodrigues)
(Carla Almeida Cruz)