Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 750/2019-T
Data da decisão: 2020-04-03  IRS  
Valor do pedido: € 755,53
Tema: IRS – Regime simplificado – árbitro desportivo – aplicação de coeficientes.
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DECISÃO ARBITRAL

I. Relatório

 

1. No dia 8 de Novembro de 2019, o sujeito passivo A..., contribuinte fiscal nº..., apresentou um pedido de constituição do tribunal arbitral singular, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), tendo em vista a declaração de ilegalidade das declarações de IRS nº ... de 2017 e nº ... de 2018.

2. Nos termos do n.º 1 do artigo 6.º do RJAT, o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem designou o árbitro ora signatário, notificando as partes.

3. O tribunal encontra-se regularmente constituído para apreciar e decidir o objecto do processo.

4. As alegações que sustentam o pedido de pronúncia arbitral do Requerente são em súmula, as seguintes:

4.1. O Requerente exerceu no ano de 2017 e 2018 as actividades de Árbitro Federado de Futebol, estando inscrito com o código CAE 93192 (Actividades desportivas).

4.2. O Requerente, na sua declaração de rendimentos, em sede de tributação de IRS da categoria B, dos respectivos anos (2017 e 2018) foi notificado para corrigir uma divergência que consistia em colocar estes rendimentos no campo 403 em vez do campo 404, conforme estava imputado.

4.3. Apresentou a declaração de rendimentos IRS, modelo3, relativa aos anos de 2017 e 2018, incorrectamente, mas tão só, pelo facto de ter sido notificado para a referida rectificação.

4.4. Ora não vemos, que, no sentido referido, que as actividades em causa tenham inequívoca e clara constância e previsão, na referida tabela anexa ao artigo 151º do CIRS, ainda que sejam, ou não, relacionadas com qualquer actividade desportiva, pois, quer uma quer outra, não são, notoriamente, elas próprias actividades desportivas, sem mais.

4.5. Ora como sabe a diferença de tributação é bem diferente consoante os rendimentos sejam imputados numa ou noutra alínea (artigo 31º do CIRS).

4.6. Ou seja, com a imputação errada, por indicação da AT dos valores auferidos pela prática de actividades de Árbitro Federado de Futebol, foi penalizado em cerca de 392,24€, no ano de 2017 e 363,29€, no ano de 2018, perfazendo um total de 755,53€.

4.7. Assim requereu a correcção das referidas notas de liquidação e que seja reposta e devolvida a verdade dos factos e dos valores em questão.

4.8. Acontece que por decisão de 30 de Outubro de 2019, tal pretensão foi indeferida.

5. Por seu turno, a Requerida Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta, na qual se defendeu, em súmula, nos seguintes termos:

5.1. O Requerente, na sua declaração de início de actividade, optou pelo regime simplificado para efeitos de tributação em sede de IRS dos seus rendimentos da categoria B.

5.2. Com referência ao ano de 2017 e 2018, exerceu as actividades classificadas com o CAE 0393192 (Actividades desportivas) e com o Código 1323 – Desportistas, da Tabela de Actividades do artigo 151º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS).

5.3. O requerente entregou as declarações de IRS de 2017 e 2018 em 2018/05/04, e 2019/04/26, respectivamente.

5.4. No campo 404, do anexo “B" das declarações, declarou rendimentos da categoria "B" provenientes da "actividade de desportista" CAE 93193.

5.5. Os rendimentos declarados estão sustentados documentalmente, nos recibos electrónicos, emitidas em cumprimento do disposto no nº 1 alínea a) do artigo 115° do CIRC, nos quais está descrito como actividade exercida "árbitro".

5.6. Perante a actividade declarada foi aberto um "procedimento de divergências", no âmbito do qual a Autoridade Tributária, notificou o Requerente, para corrigir o anexo "B" das declarações de 2017 e 2018, devendo declarar os rendimentos da categoria "B" no campo 403, porque a actividade exercida se insere no código"1323 - desportista" da lista referida no artigo 157° do CIRS.

5.7. Sobre a matéria controvertida divulgou a AT a informação vinculativa proferida em 02/05/2018, com despacho concordante da Sub-Directora Geral de IR.

5.8. Perante o conteúdo da informação vinculativa transcrito e, o disposto no nº 1 do art 68º- A da LGT, os serviços da Autoridade Tributária entenderam ser de manter as liquidações reclamadas e indeferir o pedido de reclamação graciosa em apreço.

5.9. A actividade do Requerente é enquadrada no artigo 3.º, nº 1, alínea b do CIRS, estipula que tributa como rendimentos empresariais e profissionais "os auferidos no exercício, por conta própria, de qualquer actividade de prestação de serviços, incluindo as de carácter cientifico, artístico ou técnico, qualquer que seja a sua natureza, ainda que conexa com actividades mencionadas na alínea anterior”.

5.10. Sendo que, o anexo B da declaração modelo 3 de IRS, destina-se a declarar rendimentos empresariais e profissionais (categoria B), ainda que sujeitos a tributação autónoma, tal como são definidos no artigo 3º do CIRS, que devam ser tributados segundo o regime simplificado, bem como os decorrentes de actos isolados e os referidos no n.º 3 do art. 38.º do mesmo diploma.

5.11. O desacordo do Requerente relativamente ao entendimento, in casu, da Administração Fiscal, reside, fundamentalmente na interpretação da palavra “especificamente”, porquanto considera que um árbitro não pode ser considerado um desportista e, como tal, não se encontra classificado na tabela do artigo 151º do CIRS.

5.12. Ora, com a redacção introduzida para o ano de 2015, restringiu-se a aplicação do coeficiente 0,75 aos “rendimentos das actividades profissionais especificamente previstas na tabela a que se refere o artigo 151º”, pelo que, este termo, esclarece que o coeficiente de 0,75 só se aplicará se a actividade desenvolvida, o serviço concretamente prestado, puder ser enquadrado num dos códigos da citada tabela, tendo sido criado um novo coeficiente de 0,35 para as restantes prestações de serviços.

5.13. Para além de que, para ser aplicado o coeficiente 0,75, não se exige que o prestador de serviços esteja colectado com o respectivo código da tabela a que se refere o artigo 151º do CIRS, pois mesmo que esteja colectado com um código CAE, se o serviço prestado se enquadrar numa das actividades especificamente previstas naquela tabela, será sempre de aplicar o coeficiente 0,75 e de indicar o valor dos serviços prestados no campo 403 do quadro A do anexo B da declaração de IRS.

5.14. A exclusão deste campo dos rendimentos das actividades com o código “1519 – Outros prestadores de serviços” só deve ser efectuada quando o serviço prestado não corresponder a nenhuma das actividades especificamente previstas na tabela a que se refere o artigo 151º.

5.15. Não seria correcta a posição do Requerente de que as actividades cujo serviço prestou, como “árbitro de futebol”, não se encontram previstas especificamente na tabela do artigo 151º do CIRS, por considerar que o código 1323 Desportistas, não se lhe enquadra, pese embora também se encontrar inscrito no CAE 93192 (outras actividades desportistas).

5.16. Entende, pelo contrário, a Requerida que a actividade de árbitro está sempre ligada a uma modalidade desportiva, i.e. à área do desporto, à pratica desportiva, sendo no caso em concreto a modalidade de futebol.

5.17. Na verdade, o que se verifica é que as actividades que o Requerente efectivamente realizou e a natureza do rendimento obtido, foi relacionado com a actividade desportista, a prática desportiva e como desportista, não existindo qualquer dúvida que o código 1323 “Desportistas” se aplica para codificar as actividades que a Requerente exerceu e das quais recebeu rendimento, actividades estas, de árbitro de jogos de futebol, directamente ligadas com a prática desportiva.

5.18. A Administração Fiscal pautou-se pelo cumprimento integral das normas legais aplicáveis aos factos, uma vez que os rendimentos do Requerente só podiam ser inscritos no campo 403, aos quais é aplicável o coeficiente de 0,75 para determinação do rendimento tributável, pois que estes rendimentos, a natureza destes valores recebidos, provieram de serviços prestados relacionados com a prática do desporto, com modalidades desportivas e práticas desportivas.

5.19. Pelo que se mantêm integralmente válidas as liquidações de IRS, relativas ao ano de 2017 e 2018, concluindo-se pela legalidade das mesmas.

6. A 9 de Março de 2020 foi proferido despacho arbitral, dispensando a reunião prevista no art. 18º do RJAT, a menos que as partes o solicitassem.

7. As partes não requereram a realização da reunião prevista no artigo 18º do RJAT.

 

 

II – Factos provados

8. Com interesse para a discussão da causa, julgam-se provados os seguintes factos:

8.1. O Requerente exerceu no ano de 2017 e 2018 as actividades de Árbitro Federado de Futebol, estando inscrito com o código CAE 93192 (Actividades desportivas).

8.2. O Requerente, na sua declaração de início de actividade, optou pelo regime simplificado para efeitos de tributação em sede de IRS dos seus rendimentos da categoria B.

8.3. O requerente entregou as declarações de IRS de 2017 e 2018 em 2018/05/04, e 2019/04/26, respectivamente.

8.4. Nos recibos electrónicos emitidos está descrita a actividade “árbitro”.

8.5. Na liquidação de Imposto Sobre o Rendimentos das Pessoas Singulares (IRS), nº 2018... foi apurado pela Autoridade Tributária imposto a reembolsar de 519,41€, e na liquidação de Imposto Sobre o Rendimentos das Pessoas Singulares (IRS) nº 2019 ... foi apurado pela Autoridade Tributária imposto a reembolsar de 1 066,45€.

8.6. O requerente apresentou, contra as liquidações de IRS referidas em 5. a reclamação graciosa n.º ...2019..., que foi indeferida por despacho de 2019-11-05 da Directora de Finanças de ... .

 

 

III - Factos não provados

9. Não há factos não provados com relevo para a decisão da causa.

 

IV - Do Direito

10. A única questão a apreciar neste processo respeita à ilegalidade das liquidações de IRS, nos termos que forma determinados pela Autoridade Tributária:

Examinar-se-á assim esta questão:

 

DA ILEGALIDADE DAS LIQUIDAÇÕES DE IRS

 

 

O artigo 31º, nº 1, alíneas b) e c) do Código do IRS (na redacção à data dos factos), refere o seguinte:

“1 - No âmbito do regime simplificado, a determinação do rendimento tributável obtém-se através da aplicação dos seguintes coeficientes:

(…)

b) 0,75 aos rendimentos das actividades profissionais especificamente previstas na tabela a que se refere o artigo 151.º;

c) 0,35 aos rendimentos de prestações de serviços não previstos nas alíneas anteriores;”

 

Conforme dispõe o artigo 151º do mesmo diploma:

“As actividades exercidas pelos sujeitos passivos do IRS são classificadas, para efeitos deste imposto, de acordo com a Classificação das Atividades Económicas Portuguesas por Ramos de Atividade (CAE), do Instituto Nacional de Estatística, ou de acordo com os códigos mencionados em tabela de atividades aprovada por portaria do Ministro das Finanças.”

 

Refere o artigo 11º, nº 1, da Lei Geral Tributária:

“Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis.”

 

Conforme dispõe o artigo 9º do Código Civil:

“1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.

2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.

3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.”

 

Relativamente a esta matéria, verifica-se que diverge o entendimento da jurisprudência do CAAD.

Veja-se que o Acórdão nº 510/2017-T, junto aos autos pelo Requerente, consagra o entendimento de que não se poderá considerar enquadrada a actividade de “personal trainer” e árbitro de andebol em nenhuma das actividades especificamente previstas na tabela a que se refere o artigo 151º do Código do IRS (nomeadamente o código 1323 - Desportistas), tendo considerado que as actividades em causa não têm “inequívoca e clara constância e previsão na referida tabela anexa ao artigo 151º do CIRS, ainda que sejam, ou não, relacionadas com qualquer actividade desportiva, pois, quer uma quer outra, não são, notoriamente, elas próprias actividades desportivas, sem mais.”

 

Por outro lado, o Acórdão nº 421/2019-T apresenta uma decisão em sentido contrário, considerando que a actividade de árbitro de futsal se deverá considerar integrada na tabela anexa ao artigo 151º do CIRS (código 1323 - Desportistas).

Consideramos, face ao disposto no artigo 11º, nº 1, da Lei Geral Tributária, e ao disposto no artigo 9º, nº 1 do Código Civil, ser mais correcto este entendimento.

Como bem refere o mencionado Acórdão nº 421/2019-T:

“No entender deste tribunal, a actividade de árbitro desportivo, assim como se enquadra facilmente no conceito de actividade desportiva, constante da Classificação das Atividades Económicas, do Instituto Nacional de Estatística, também se subsume, de forma natural, imediata e logicamente transparente, ao conceito de Desportista, da Tabela de atividades do artigo 151.º do CIRS, Anexo I. É desportista aquele que se dedica a uma actividade desportiva. Se a arbitragem desportiva pode ser considerada uma actividade desportiva, então quem a exerce pode, compreensivelmente, ser designado por desportista, sem qualquer sacrificium intellectus. O conceito “Desportistas” – da Tabela de atividades do artigo 151.º do CIRS - não tem que abranger unicamente os praticantes desportivos propriamente ditos, sejam eles profissionais ou não profissionais, antes podendo designar outros agentes desportivos intimamente ligados à prática competitiva de uma dada modalidade. Isto, à semelhança do que sucede com o conceito de “actividade desportiva”. Na verdade, a arbitragem desportiva assume uma importância decisiva na realização de competições desportivas oficiais, sendo condição sine qua non das mesmas. Acresce que o árbitro de futsal participa activamente na realização da competição desportiva, estando presente no recinto de jogo e interagindo ativamente com os atletas em competição. Cabe-lhe a importante tarefa de acompanhar atentamente todas as incidências concretas da competição e garantir a interpretação e aplicação das normas desportivas, em termos que satisfaçam as elevadas exigências de rigor e uniformidade impostas pelas federações desportivas, não só a nível nacional como também regional e mundial. Para esse efeito, a disciplina do acesso e exercício da actividade de árbitro desportivo, incluindo a respetiva classificação, encontra-se definida e estruturada pelas federações desportivas, sendo uma parte integrante da respetiva atividade, como melhor se verá a seguir. Dos árbitros exige-se o conhecimento pleno e actualizado das normas da modalidade cuja competição os mesmos são chamados a arbitrar, exigindo-se a participação em cursos de formação inicial e contínua e o preenchimento dos requisitos de aptidão física e psicológica necessários ao exercício da actividade. No caso específico do futsal, a atividade de árbitro encontra-se enquadrada na Federação Portuguesa de Futebol, na UEFA e na FIFA. Importa salientar que a Lei de Bases do Sistema Desportivo, no artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 146/93, de 26 de abril, sujeita os árbitros a seguro desportivo obrigatório. O mesmo se diga da Lei de Bases da Atividade Física e do Desporto, a Lei n.º 5/2007, de 16 de janeiro, onde além do mais se dispõe, no artigo 14.º, que as federações desportivas englobam, entre outros, os árbitros, os quais são indissociáveis do desenvolvimento da respetiva modalidade desportiva.  O artigo 40.º, nºs 1 e 4, deste diploma, inserido na secção III respeitante à proteção dos agentes desportivos, faz aplicar aos árbitros, com as devidas adaptações, o regime de acesso à medicina desportiva. Na secção IV, relativa às medidas de apoio para o desporto de alto rendimento, orientado para a procura de resultados de excelência de acordo com padrões internacionais, estabelece-se a possibilidade de as mesmas serem concedidas não apenas ao praticante desportivo como também a técnicos e árbitros. O artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 248-B/2008, que veio estabelecer o Regime Jurídico das Federações Desportivas e as Condições de Atribuição do Estatuto de Utilidade Pública Desportiva, enquadra a actividade de árbitro no conceito de federação desportiva.  O mesmo sucede com o artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 93/2014, de 23 de junho, que procedeu à sua alteração e republicação. Como se refere no artigo 45.º deste diploma, os árbitros estão sujeitos a um regime de formação, coordenação e classificação no seio das federações desportivas.  Em face das considerações aduzidas, a recondução da actividade de árbitro ao conceito “Desportistas”, com o CAE, 1323, da Tabela de atividades do Artigo 151.º do CIRS,  não representa qualquer violação da tipicidade específica ínsita nos princípios da legalidade tributária e da segurança jurídica e proteção da confiança dos cidadãos, que concretizam o princípio constitucionalmente estruturante do Estrado de direito, Trata-se de uma operação conceitual, hermenêutica e metódica cuja razão de ser se afigura inteiramente razoável e inteligível, à luz do regime jurídico da atividade desportiva e das federações desportivas.”

Referindo ainda o mesmo Acórdão:

“O entendimento preconizado pela AT perfila-se como o mais consistente com uma visão unitária do sistema jurídico, enquanto sistema de valores, princípios e regras. Com efeito, ele adequa-se inteiramente ao sentido material que se retira de importantes princípios do sistema fiscal. Assim é, nomeadamente, no que concerne os princípios da justiça fiscal, da igualdade fiscal – horizontal e vertical – e da consideração da capacidade contributiva subjetiva, que têm o seu fundamento último na ordem constitucional (v.g. arts. 1.º, 2.º, 13.º, 103.º e 104.º, da CRP). O princípio da tributação de acordo com a capacidade contributiva (Besteuerung nach der Leistungsfähigkeit) é desde há muito reconhecido como um princípio estruturante do direito fiscal, deduzido dos princípios da justiça e da igualdade tributárias, nomeadamente da igualdade perante os encargos públicos. A tributação de acordo com a capacidade contributiva tem especial relevância no imposto sobre o rendimento. O CIRS deve ser interpretado e aplicado, pela AT e pelos tribunais em conformidade com estes princípios constitucionais, tendo igualmente em conta os fins e os objetivos da tributação (arts. 5.º e 7.º da LGT).   Nesta sede, a aplicação do coeficiente de 0,75 a atletas e árbitros significa que aos mesmos se reconhece uma dedução automática de 25%. A mesma afigura-se inteiramente razoável, na medida em que uns e outros podem normalmente ser chamados a suportar algumas despesas para poderem exercer a sua atividade e obter os correspondentes rendimentos. Se fosse aplicável aos árbitros o coeficiente de 0,35 – diferentemente do que sucede com os praticantes desportivos propriamente ditos –, isso significaria, na prática, o reconhecimento de um direito de dedução automática de despesas no valor de 65% do rendimento auferido, o que se afigura manifestamente desigual, desproporcional e destituído de fundamento racional e material bastante. Uma tal diferenciação de tratamento, aplicando a praticantes desportivos um coeficiente de 0,75 e a árbitros o de 0,35, representaria uma diferenciação dificilmente compatível com a justiça do sistema fiscal, porque violadora dos princípios da capacidade contributiva e proibição do arbítrio, que são subprincípios do princípio da igualdade fiscal. Em face do exposto, deve aplicar-se no caso concreto o CAE 1323 “Desportistas” – da Tabela de atividades do artigo 151.º do CIRS, aplicando-se à atividade de árbitro de futsal o coeficiente 0,75 previsto no artigo 31.º, n.º 1, alínea b) do CIRS, na redação vigente à data dos factos.”

No caso concreto, a actividade praticada pelo Requerente é a de Árbitro Federado de Futebol.

Ora, a função do árbitro, in casu, de futebol, é uma função que implica a condução do jogo e a garantia dos princípios éticos e desportivos dentro do mesmo jogo.

Como tal, a relevância do árbitro, como elemento do desporto, não poderá ser inferior à do jogador, considerando-se este essencial para a actividade desportiva.

Nesse âmbito, e sufragando-se os argumentos apresentados no Acórdão supra citado, é manifesto que terá de se considerar a função de árbitro como integrante do conceito de Desportista, da Tabela de atividades do artigo 151.º do CIRS, Anexo I, e aplicar-se a esta actividade o coeficiente 0,75 previsto no artigo 31.º, n.º 1, alínea b) do CIRS, em consonância com o princípio da igualdade tributária.

Improcede, portanto, o pedido do Requerente de declaração de ilegalidade das declarações de IRS de 2017 e 2018.

 

V – Decisão

 

Julga-se improcedente o pedido de declaração de ilegalidade das declarações de IRS nº ... de 2017 e nº... de 2018.

Fixa-se ao processo o valor de € 755,53 (valor indicado e não contestado) e o valor da correspondente taxa de arbitragem em € 306,00 nos termos da Tabela I do Regulamento de Custas dos Processos de Arbitragem Tributária.

Custas pelo Requerente.

 

 

Notifique.

 

Lisboa, 3 de Abril de 2020

 

 

O Árbitro

 

 

Luís Menezes Leitão