Decisão Arbitral (consultar versão completa no PDF)
Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente, designado pelos outros Árbitros), Prof.ª Doutora Clotilde Celorico Palma e Dr. Emanuel Vidal Lima, designados pela Requerente e pela Requerida, respectivamente, para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 16-01-2020, acordam no seguinte:
1. Relatório
A..., LDA., (doravante a “Requerente”), pessoa colectiva n.º..., com sede na Rua do ... n.º ..., ...-... ..., ... veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral nos termos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), tendo em vista:
– a anulação das liquidações adicionais de IVA nºs..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ...e ... relativas a 2014, no valor total de € 330.791,99;
– a anulação das demonstrações de acerto de contas n.ºs 2018..., 2018 ... e 2018...;
– a restituição do valor de € 33.173,38, bem o valor total de € 281, relativo a custas de processo executivo.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante “AT”).
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 17-10-2019.
Em 16-12-2019, o Senhor Presidente do CAAD informou as Partes da designação dos Árbitros, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 7 do artigo 11.º do RJAT.
Assim, em conformidade com o preceituado no n.º 7 artigo 11.º do RJAT, decorrido o prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do RJAT sem que as Partes nada viessem dizer, o Tribunal Arbitral Colectivo ficou constituído em 16-01-2020.
A AT apresentou resposta em que suscitou as exceções de incompetência material por inidoneidade do meio processual e incompetência material e da intempestividade para a impugnação direta dos atos de liquidação e defendeu que deve julgar-se improcedente o pedido de pronúncia arbitral.
Por despacho de 19-02-2020 foi decidido dispensar a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e alegações, prosseguindo o processo com possibilidade de a Requerente responder às excepções suscitadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
A Requerente não se pronunciou sobre as excepções.
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas.
O processo não enferma de nulidades.
Importa apreciar prioritariamente as excepções suscitadas.
2. Questão da incompetência material por inidoneidade do meio processual
A Autoridade Tributária e Aduaneira defende o seguinte, em suma:
– o pedido de pronúncia arbitral tem por objecto imediato a decisão de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa e, por objecto mediato as liquidações adicionais de IVA e juros;
– esgotados os prazos de Reclamação Graciosa e/ou de Impugnação Judicial), a Requerente apresentou junto da AT pedido de revisão oficiosa, que foi objecto de indeferimento tácito;
– não foi apreciada a legalidade dos actos tributários de liquidação;
– estamos perante um ato administrativo em matéria tributária que, por não apreciar ou discutir a legalidade do acto de liquidação, não pode ser sindicável através de impugnação judicial, nos termos previstos na alínea a) do n.º 1 do artigo 97.º do CPPT;
– a apreciação da competência do tribunal arbitral envolve um juízo sobre a adequação ao caso sub judice do meio processual da acção administrativa especial ou do processo de impugnação judicial, em atenção ao disposto no artigo 97.º do CPPT;
– não sendo apreciada a legalidade de acto de liquidação, o processo de impugnação judicial e o pedido de pronúncia arbitral não são meio adequado de impugnação do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa.
2.1. Apreciação da excepção
A competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é, em primeiro lugar, limitada às matérias indicadas no artigo 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT).
Refere-se nesta norma que a competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões:
a) A declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta;
b) A declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de valores patrimoniais; (redacção da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro)
Para além da apreciação directa da legalidade de actos deste tipo, o facto de a alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT fazer referência aos n.ºs 1 e 2 do artigo 102.º do CPPT, em que se indicam os vários tipos de actos que dão origem ao prazo de impugnação judicial, inclusivamente a reclamação graciosa, deixa perceber que serão abrangidos no âmbito da jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD todos os tipos de actos passíveis de serem impugnados através processo de impugnação judicial, abrangidos por aqueles n.ºs 1 e 2, desde que tenham por objecto um acto de um dos tipos indicados naquele artigo 2.º do RJAT.
Aliás, esta interpretação no sentido da identidade dos campos de aplicação do processo de impugnação judicial e do processo arbitral é a que está em sintonia com a referida autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, concedida pelo artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, em que se revela a intenção de o processo arbitral tributário constitua «um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária» (n.º 2).
Mas, resulta do teor do artigo 2.º do RJAT que a arbitragem tributária não foi implementada quanto às matérias susceptíveis de serem objecto de acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo, pois é manifesto que não se enquadram em qualquer das situações previstas.
De qualquer forma, extrai-se também da referida autorização legislativa, designadamente da alínea a) do n.º 4 do referido artigo 124.º, ao fazer referência aos «actos administrativos que comportem a apreciação da legalidade de actos de liquidação», que não se pretendeu estender o âmbito da arbitragem tributária à apreciação de actos que, nos termos do CPPT, não podem ser objecto de impugnação judicial. Na verdade aquela expressão tem ínsita a exclusão dos «actos administrativos que não comportem a apreciação da legalidade de actos de liquidação» e das alíneas d) e p) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 97.º do CPPT infere-se a regra de a impugnação de actos administrativos em matéria tributária ser feita, no processo judicial tributário, através de impugnação judicial ou acção administrativa (que sucedeu ao recurso contencioso, nos termos do artigo 191.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos) conforme esses actos comportem ou não comportem a apreciação da legalidade de actos administrativos de liquidação. ( [1] )
Porém, como excepção a esta regra de delimitação dos campos de aplicação do processo de impugnação judicial e da acção administrativa poderão considerar-se os casos de impugnação de actos de indeferimento de reclamações graciosas, independentemente do seu conteúdo, pelo facto de a utilização do processo de impugnação judicial ter sido prevista numa norma especial, que é o n.º 2 do artigo 102.º do CPPT, actualmente revogado, de que se pode depreender que a impugnação judicial é sempre utilizável. ( [2] ) ( [3] )
No caso em apreço, a Requerente apresentou uma reclamação graciosa, mas sim um pedido de revisão oficiosa que não foi apreciado no prazo previsto no artigo 57.º, n.º 5, da LGT, pelo que se formou indeferimento tácito.
Nos casos de indeferimento tácito não há, obviamente, apreciação expressa da legalidade de acto de liquidação, mas, tratando-se de uma ficção de acto destinada a assegurar a impugnação contenciosa em meio processual que tem por objecto um acto de liquidação, o meio de impugnação adequado depende do conteúdo ficcionado.
No caso de impugnação administrativo directa de um acto de liquidação (através de reclamação graciosa ou pedido de revisão oficiosa), com fundamento na sua ilegalidade, o conteúdo ficcionado é de indeferimento do pedido que foi formulado, de anulação do acto de liquidação. Isto é, ficciona-se que o pedido foi indeferido por ter sido dada resposta negativa a todas as questões de legalidade colocadas pelo Sujeito Passivo. Por isso, presume-se o indeferimento tácito de meio de impugnação administrativa (reclamação graciosa ou pedido de revisão oficiosa) que tem por objecto directo acto de liquidação se baseia em razões substantivas e não por razões formais. ( [4] )
Diferente é a situação nos casos em que se está perante o indeferimento tácito de um recurso hierárquico, pois este não tem por objecto directo um acto de liquidação, mas sim um anterior acto de indeferimento da impugnação administrativa (reclamação graciosa ou pedido de revisão oficiosa). Se o acto expresso proferido na impugnação administrativa não conheceu da legalidade de acto de liquidação (por ter entendido existirem obstáculos formais, como a ilegitimidade ou a intempestividade), o indeferimento tácito presume-se ter mantido o acto anterior e, por isso, se este não comporta a apreciação da legalidade de acto de liquidação, o indeferimento tácito do recurso hierárquico também não a comporta. ( [5] )
Com efeito, nos casos de recurso hierárquico, em que é impugnado um anterior acto expresso, existe já um anterior acto impugnável, pelo que, no caso de indeferimento tácito do recurso hierárquico, é esse anterior acto expresso e não o indeferimento tácito o objecto da impugnação, como resulta do preceituado no artigo 198.º, n.º 4, do Código do Procedimento Administrativo, subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT: o decurso do prazo para decisão do recurso hierárquico «sem que haja sido tomada uma decisão, conferem ao interessado a possibilidade de impugnar contenciosamente o acto do órgão subalterno ou de fazer valer o seu direito ao cumprimento, por aquele órgão, do dever de decisão». Assim, o acto do subalterno, que se presume confirmado tacitamente no caso de o recurso hierárquico não ser decidido no prazo legal, é o relevante para aferir a idoneidade do meio processual. É neste sentido a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo sobre o indeferimento tácito de recurso hierárquico (à face do artigo 175.º, n.º 3, do Código do Procedimento Administrativo de 1991, que, para este efeito, tem alcance substancialmente idêntico ao artigo 198.º, n.º 4, do Código do Procedimento Administrativo de 2015), como pode ver-se pelo acórdão de 21-11-2007, processo n.º 0444/07, em que se entendeu: «Nos casos de indeferimento tácito de recurso hierárquico considera-se indeferido o recurso (art. 175.º, n.º 3, do CPA), pelo que, quando a decisão da reclamação graciosa impugnada conheceu da legalidade de acto de liquidação (no caso, deferindo parcialmente a pretensão formulada), aquele indeferimento tácito considera-se também ter por objecto a legalidade do acto de liquidação cuja legalidade foi apreciada na decisão da reclamação.»
De harmonia com o exposto, no caso em apreço, estando-se perante indeferimento tácito de um pedido de revisão oficiosa, que tem por objecto directo acto de liquidação, é de considerar que o acto ficcionado conhece da legalidade de acto de liquidação e, por isso, o meio processual adequado para a sua impugnação contenciosa é o processo de impugnação judicial, nos termos das alíneas d) e para) do n.º 1 do artigo 97.º do CPPT, de que é meio alternativo o por arbitral.
Neste sentido, tem vindo a decidir uniformemente o Supremo Tribunal Administrativo, como pode ver-se pelos seguintes acórdãos:
– de 6-10-2005, processo n.º 01166/04: «o indeferimento tácito de um pedido de revisão oficiosa de acto de liquidação, baseado na sua ilegalidade, deve considerar-se, para efeito das alíneas d) e p) do n.º 1 do art. 97.º do CPPT, como um acto que comporta a apreciação da legalidade de acto de liquidação»;
– de 02-02-2005, processo n.º 01171/04, de 08-07-2009, processo n.º 0306/09, de 23-09-2009, processo n.º 0420/09, de 12-11-2009, processo n.º 0681/09: «o meio processual adequado para reagir contenciosamente contra o acto silente atribuído a director-geral que não decidiu o pedido de revisão oficiosa de um acto de liquidação de um tributo é a impugnação judicial».
Assim, na linha desta jurisprudência, é de entender que o acto ficcionado quando ocorre indeferimento tácito de pedido de revisão oficiosa é um acto que comporta a apreciação da legalidade do acto de liquidação cuja revisão foi pedida, dando resposta negativa aos fundamentos invocados, pelo que o meio contencioso adequado para o impugnar é o processo de impugnação judicial e o processo arbitral.
Nestes termos, improcede a excepção invocada.
3. Questão da incompetência material e da intempestividade para impugnação directa dos actos de liquidação de IVA
Os actos de liquidação de IVA são, manifestamente, «actos de liquidação de tributos», pelo que se enquadram, sem qualquer dúvida razoável, na previsão do artigo 2.º, n.º 1, alínea a), do RJAT.
Por isso, o Tribunal Arbitral é competente para apreciar a legalidade daqueles actos, mantidos pelo indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa.
No que concerne à tempestividade, é claro que, quando foi apresentado o pedido de pronúncia arbitral, estava há muito ultrapassado o prazo de 90 dias para impugnação directa dos actos de liquidação, contado da sua notificação, previsto no artigo 10.º, n.º ,1 alínea a) do RJAT.
Mas, como decorre do mesmo artigo 10.º do RJAT, é admissível a impugnação através de processo arbitral de actos de segundo grau que tenham por objecto actos de liquidação, em prazo a contar da notificação da decisão expressa ou indeferimento tácito, nos termos das alíneas d) e e) do n.º 1 do artigo 102.º do CPPT, para que remete aquele artigo 10.º.
No caso em apreço, verificou-se a presunção de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa, que tinha por objecto actos de liquidação, pelo que se está perante a situação prevista na alínea d) do n.º 1 daquele artigo 102.º, em que se prevê a respectiva impugnação em prazo contado dessa presunção.
O pedido de revisão oficiosa foi apresentado em 20-03-2019, como se vê pelo documento n.º 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral, pelo que a presunção de indeferimento tácito se formou quatro meses depois, em 20-07-2019, por força do disposto no artigo 57.º, n.ºs 1 e 5, da LGT.
Assim, é a partir desta data de 20-07-2019 que se conta o prazo de 90 dias previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT, para a apresentação de pedido de constituição do tribunal arbitral.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi apresentado em 16-10-2019, pelo que foi observado o referido prazo de 90 dias.
Pelo exposto, improcedem as excepções de intempestividade e de incompetência material do Tribunal Arbitral para apreciar a legalidade dos actos de liquidação que foram objecto do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa.
4. Matéria de facto
4.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos:
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A Requerente tem como objecto social o trânsito, armazenagem, carga, descarga, depósito, conservação, custódia, manipulação, embalagem, recolha, distribuição, seguro, despacho e transporte, combinado ou intermodal, com meios próprios ou alheios, por via aérea, marítima, fluvial e terrestre, no país e no estrangeiro, de toda a espécie de mercadorias e produtos, bem como a prestação de serviços auxiliares ou complementares e aquisição, exploração e alienação de bens imóveis.;
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Foi realizada uma inspecção tributária à Requerente relativa ao ano de 2014;
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No Relatório da Inspecção Tributária elaborado na referida inspecção tributária refere-se, além do mais, o seguinte:
III.3.2 - Operações conexas com importação / Inconformidades
No decorrer da análise efetuada, detetamos fragilidades de controlo que indiciam uma não conformidade das faturas emitidas com as disposições legais em vigor para efeitos de IVA, nomeadamente, relacionadas com a aplicação da isenção em operações conexas com a importação extracomunitária de bens por via marítima.
Assim, na amostra selecionada foram identificadas diversas operações conexas com a importação por via marítima com desalfandegamento em território nacional onde não foi liquidado IVA na fatura, tendo sido consideradas como isentas de IVA.
Nestas, a sociedade, na condição de intermediária, apesar de deduzir o IVA liquidado nas faturas emitidas pelos subcontratados, não liquidou IVA ao seu cliente final, invocando o disposto na alínea f), do n.º 1, do artigo 13.ºdo CIVA.
Nestas circunstâncias, foram essencialmente identificados como serviços subcontratados, os prestados pelo despachante oficial, os serviços de transporte interno dos bens (com origem e destino em território nacional) e os serviços de armazenagem após as mercadorias estarem desalfandegadas.
Por outro lado, foram ainda identificados outros serviços faturados pela A..., designadamente, despesas de descarga, carga, paralisação de contentores, manuseamento, desconsolidação, levante, embalagem, pesagem, despesas de terminal, taxas de uso de porto e paletização, também consideradas isentas ao abrigo do mesmo dispositivo legal.
Relativamente a todos estes serviços, a aplicação da referida isenção de IVA está intimamente relacionada com o momento em que estes são realizados, ou seja, serão de isentar desde que tenham sido efetuadas antes do desalfandegamento dos bens e apenas se o correspondente valor do serviço estiver englobado no valor tributável na importação (para efeitos de cálculo de IVA e direitos aduaneiros), sendo incorporado no DAU, quer através da sua inclusão no total das despesas (campo 44 ou 45), quer através da utilização da Tabela Optativa.
O quadro seguinte evidencia, por período de imposto, o montante da base tributável inscrito no campo 8 das declarações periódicas de IVA entregues pela sociedade, apenas relativas a operações conexas com a importação de bens, consideradas isentas ao abrigo da alínea f), do n.º 1, do artigo 13º do Código do IVA.
III.4- Base legal de isenção nas operações conexas com a importação
Atente-se que a disposição utilizada pela sociedade para isentar as operações relacionadas com a importação de bens é a constante da alínea f), do n º 1, do artigo 13º do CIVA, que se transpõe.
Assim, a alínea b), do n.º 2, do artigo 17.º do Código do IVA, define as despesas que poderão ser incluídas no valor tributável das importações de bens, nomeadamente:
Ou seja, genericamente, desde que o valor faturado pelos serviços prestados pela sociedade A..., esteja incluído no valor tributável da importação de bens introduzidos no Documento Administrativo Único (DAU), deve ser aplicada a isenção prevista pelo artigo 13º do Código do IVA, evitando a sua dupla tributação, na medida em que este já foi tributado para o efeito pelos Serviços Aduaneiros.
A exceção a esta regra que, no entanto, não foi identificada na amostra selecionada, apenas acontecerá no caso de, no documento de transporte, estar definido que o primeiro local de destino dos bens dentro do território nacional é o armazém do comprador (Incoterm: "DAT" ou "DDP").
Neste caso, o valor dos serviços prestados até ao armazém do comprador final está incorporado na fatura comercial emitida pelo vendedor do bem, e, como tal, incluído no DAU, para efeitos de apuramento de IVA e de eventuais direitos aduaneiros.
De notar que, em caso algum, estamos perante uma não sujeição de IVA, isto é, todas as operações relacionadas com a importação de bens são sujeitas a IVA, divergindo apenas o local onde este vai ser liquidado, se na Alfândega, se posteriormente, através da entrega da declaração periódica de IVA pela entidade prestadora dos serviços (neste caso a A...).
III.5 - Prova de suporte da Isenção de IVA
Perante o disposto, foi solicitado à sociedade a demonstração, fazendo prova, de que, efetivamente, o valor dos serviços que isentou na fatura emitida ao abrigo da disposição constante da alínea f), do n.º 1, do art.º 13º do CIVA, reúne, de facto, as condições necessárias para o efeito, ou seja, a sua inclusão no valor tributável declarado no DAU da importação.
Para o efeito, a sociedade apresentou um conjunto de processos de importação, compostos por uma série de documentos, contendo entre outros, faturas, declarações diversas, correspondência, mapas comerciais internos, não numerados e sem qualquer organização aparente.
Para além dos referidos documentos, disponibilizou ainda um mapa que supostamente apoia o cálculo dos valores considerados no campo 8 das DP de IVA, que nos merece os seguintes comentários:
1.º) O mapa apenas permite validar matematicamente se os valores inseridos nas DP de IVA foram corretamente calculados de acordo com o somatório das faturas e o respetivo IVA. No fundo, trata-se de uma listagem com a identificação do número da fatura, o seu valor de base, o montante do IVA liquidado e o valor total da fatura;
2.º) Não permite apurar claramente os serviços que foram sujeitos a IVA, bem como os considerados isentos, especificando a respetiva disposição legal invocada;
3.º) Não identifica quais os serviços prestados em cada uma das faturas, não discriminando se estes foram prestados antes ou após desalfandegamento;
4.º) Não permite chegar a qualquer conclusão ou sequer aferir da carreta aplicação da isenção do IVA na operação.
Posteriormente, a sociedade procedeu à entrega de um 2.º mapa de apoio, onde acrescentou a identificação das faturas incluídas no campo 8 das DP de IVA, discriminando por linha de fatura, o tipo de serviço prestado, continuando, no entanto, a não permitir apurar clara e inequivocamente a aplicação da isenção de IVA nas operações, referindo-se, a título exemplificativo, o caso da aplicação de IVA na margem de lucro do serviço de frete refaturada pela A... ao seu cliente, tratando-se de uma operação sujeita a IVA e dele não isenta a não ser que tenha sido incluída na base tributável declarada para efeitos aduaneiros.
III.6 - Conclusões da análise à amostra
Após a análise integral efetuada, concluímos pela existência de falhas documentais indispensáveis à necessária verificação da aplicação de isenções de IVA, designadamente, do respetivo Documento Administrativo Único (DAU) validado pela Alfândega, onde consta o valor tributável da importação e que, sem o qual, não pode ser validada a respetiva aplicação da isenção ao abrigo do art.º 13º do CIVA.
Mais ainda, apurámos que a sociedade não procede a um controlo eficaz das operações de forma a assegurar o correio pagamento do imposto, evitando a fraude e a evasão fiscal.
Resulta ainda que, da análise documental efetuada verificou-se, entre outros aspetos, a existência de irregularidades na emissão das faturas. nomeadamente:
• Não contêm explicitamente as quantidades, e/ou
• Não contêm os valores unitários dos serviços prestados, e/ou
• Referem, apenas, uma menção genérica do tipo de serviços prestados.
Contrariando, em qualquer dos casos, o que prescreve o n.º 5 do Artº 36.º do CIVA. inviabilizando deste modo, o enquadramento da operação e o apuramento do imposto.
Com efeito, não basta à sociedade proceder a uma mera apresentação dos documentos de suporte contabilístico, para a AT conhecer, de modo claro e inequívoco, os elementos necessários ao cálculo do imposto e a controlar o preenchimento da declaração periódica efetuada pelo sujeito passivo.
III.7 - Análise de processos de Importação Marítima
No sentido de corroborar as conclusões da análise anterior, foi selecionada nova amostra, desta vez apenas relacionada com importação marítima, atendendo às fragilidades constatadas, não sendo retirada conclusão distinta da anterior, ou seja, não é possível efetuar a validação da isenção aplicada às operações de importação com desalfandegamento em Portugal.
A amostra contempla 15 processos, constituídos por um total de 35 documentos (faturas/notas de crédito emitidas pela sociedade), num universo de 3.281 processos de Importação de Mercadorias com desalfandegamento em PT
No quadro infra, encontra-se representado, por processo de importação, a fatura emitida e o seu valor, discriminado por sujeito ou isento de IVA, bem como os valores registados nos campos 44 e 45 do DAU.
Dos 15 processos supra, 9 manifestam irregularidades para efeitos de apuramento de IVA e/ou indícios que conduzem à impossibilidade de uma correta análise do enquadramento dado e que permita a aplicação da isenção de IVA concedida, conforme mapas seguintes.
1 – Processo A... referência LIS/...
Observações / Irregularidades:
• Observações
1. A exceção da "Taxa de Porto" todos os serviços subcontratados foram sujeitos a IVA.
2. Não consta arquivado o DAL) relativo à importação.
• Irregularidades
1. A exceção do "Transporte Contentor", todos os serviços faturados pela A... foram isentos de IVA ao abrigo da alínea f), nº1, do Artº 130 do CIVA.
2. Não consta arquivado o DAU relativo à importação.
2 – Processo A... referência LIS/...
Observações / Irregularidades:
• Irregularidades
1. O serviço faturado com a designação "Adicional são 3 contentores" foi isento de IVA, constando na fatura emitida isento ao abrigo da alínea f), do nº1, do artigo 13º do CIVA e da alínea p), do nº1, do artigo 14º do mesmo diploma.
3 – Processo A... referência LIS/...
Observações / Irregularidades:
• Observações
1. Nas faturas emitidas não existe qualquer referência a despesas locais, ou pelo menos com uma designação que permita presumir que se tratam destas.
2. Não consta do processo qualquer despesa relacionada com o despacho das mercadorias.
• Irregularidades
1. Na fatura emitida a designação 'Documentação" que pode corresponde1" aos gastos com o despacho foi isenta de IVA ao abrigo da alínea f), do nº 1 do artigo 13º do CIVA e da alínea p), do nº1, do artigo 14º do mesmo diploma.
2. A fatura de "Armazenagem1 (efetuada na Bobadela conforme fatura do subcontratado) também foi isenta de IVA abrigo da alínea f), do nº1, do artigo 13º do CIVA e da alínea p), do nº1, do artigo 14º do mesmo diploma.
4- Processo A... referência LIS/...
Observações / Irregularidades
• Irregularidades
1. Nas faturas emitidas, o valor correspondente ao "Despacho Aduaneiro" não foi sujeito a IVA, tendo sido isento ao abrigo da alínea f), do nº1, do artigo 13º do CIVA e da alínea p), do nº1, do artigo 14º do mesmo diploma, quando na fatura do Despachante, correspondente ao mesmo serviço, foi liquidado IVA.
5 - Processo A... referência OPO/...
Observações / Irregularidades
• Observações
1. Não consta do processo, além do serviço de transporte terrestre da mercadoria após desalfandegamento, qualquer outra fatura dos serviços subcontratados.
6 - Processo A... referência OPO/...
Observações / Irregularidades
• Incorreções
1. Não foi liquidado IVA sobre o "Inland" (transporte terrestre da mercadoria após desalfandegamento), tendo o mesmo serviço sido sujeito a IVA na fatura emitida pela subcontratado.
7 – Processo A... referência OPO/...
Observações / Irregularidades
• Irregularidades
i. Nas faturas emitidas, o valor correspondente ao "Despacho Aduaneiro" não foi sujeito a l VA, tendo sido isento ao abrigo da alínea f), do nº1, do artigo 13º do CIVA e da alínea p), do nº1, do artigo 14º do mesmo diploma, quando na fatura do Despachante, correspondente ao mesmo serviço, foi liquidado IVA.
8 - Processo A... referência OPO/...
Observações / Irregularidades
• Irregularidades
1. Nas faturas emitidas, o valor correspondente ao "Despacho Aduaneiro" não foi sujeito a IVA, tendo sido isento ao abrigo da alínea f), do nº1, do artigo 13" do CIVA e da alínea p), do nº1, do artigo 14º do mesmo diploma, quando na fatura do Despachante, correspondente ao mesmo serviço, foi liquidado IVA.
2. As 3 faturas emitidas com a designação "Demora" foram isentas de IVA nos termos da alínea f), do nº1, do artigo 13º do CIVA e da alínea p), do nº1, do artigo 14º do mesmo diploma.
8 - Processo A... referência OPO/...
Observações / Irregularidades
• Irregularidades
1. Não foi liquidado IVA sobre o "Inland" (transporte terrestre da mercadoria após desalfandegamento), tendo o mesmo serviço sido sujeito a IVA na fatura emitida pela subcontratado.
2. Nas faturas emitidas, o valor correspondente ao "Despacho Aduaneiro não foi sujeito a IVA. tendo sido isento ao abrigo da alínea f), do nº1 do artigo 13º do CIVA e da alínea p), do nº1, do artigo 14º do mesmo diploma, quando na fatura do Despachante, correspondente ao mesmo serviço, foi liquidado IVA.
3. O valor que consta no campo 44 (VDA) do DAU não comporta a totalidade do valor de "Despesas de Companhia mais "Validação"
• Observações
1. Constam do processo físico outras despesas faturadas à A..., associadas a serviços contratados do mesmo processo, cujos valores e designação não têm correspondência em fatura emitida pela A... .
9 - Processo A... referência OPO/...
Observações / Irregularidades
• Irregularidades
1. Nas faturas emitidas, o valor correspondente ao "Despacho Aduaneiro" não foi sujeito a IVA, tendo sido isento ao abrigo da alínea f), do nº1, do artigo 13º do CIVA e da alínea p), do nº1, do artigo 14º do mesmo diploma, quando na fatura do Despachante, correspondente ao mesmo serviço, foi liquidado IVA.
2. O valor faturado pela A..., correspondente à designação "Armazenagem, não tem correspondência com qualquer serviço subcontratado que conste do processo físico, sendo que este valor foi considerado isento IVA pela A..., nos termos da alínea f), do nº1, do artigo 13º do CIVA e da alínea p), do nº1, do artigo 14º do mesmo diploma.
Assim, atendendo à análise efetuada, constatámos que não foi efetuado o devido enquadramento das operações ativas faturadas pela sociedade, não satisfazendo os requisitos necessários para a sua consideração como operação isenta para efeitos de IVA, ao abrigo dos aludidos artigos.
III.8 - Conclusões Preliminares
Assim, atendendo a que:
> A falta de programa de faturação certificado pela AT, a falta de comunicação eletrónica dos elementos das faturas e a Incapacidade" do sujeito passivo, que apresenta um volume de negócios significativo e é considerado como um operador de referência no setor onde opera, de cumprir com as suas obrigações fiscais, coloca em causa a credibilidade da sua contabilidade, afetando a análise dos elementos apresentados;
> Os elementos disponibilizados para análise (processos físicos/dossiers), selecionados através de amostra, carecem de uma organização que permita, inequivocamente, identificar o tipo de operação, o seu enquadramento em sede de IVA e todos os documentos indispensáveis para a sua análise. Para além disto, nos processos relativos a importação de mercadorias com desalfandegamento em PT, além da patente desorganização, verificamos a ausência da totalidade dos elementos indispensáveis à completa verificação da aplicação da isenção consagrada na alínea f), do n.º 1, do art.º 13ºdoCIVA.
Concluímos:
1. A sociedade não cumpriu o disposto no artigo 44º do Código do IVA, constatando-se a falta de organização da contabilidade que possibilite o conhecimento claro e inequívoco dos elementos necessários ao cálculo do imposto, bem como permita o seu controlo, comportando todos os dados necessários ao preenchimento da declaração periódica do imposto;
2. Esta falta traduz-se numa impossibilidade de verificação da conformidade na aplicação das isenções nas faturas emitidas, para efeitos da alínea f), do n.º 1, do art.º 13º do CIVA;
Ainda, constituindo as isenções aplicadas, parte integrante do crédito de imposto apurado em sede de IVA para cada período de tributação, não é possível determinar se o valor de crédito de IVA existente a favor do sujeito passivo foi corretamente apurado, no cumprimento das respetivas disposições fiscais.
III.9 - Notificações efetuadas
III.9.1 - Notificação efetuada em 17 de Fevereiro de 2017
Nesta data, foi efetuada notificação cujo teor abaixo se reproduz:
Na medida em que os elementos colocados à disposição no decurso das diligências inspetivas efetuadas, não permitem, nos termos do disposto no artigo 44º do Código do IVA, o conhecimento claro e inequívoco dos elementos necessários ao controlo do cálculo do imposto (IVA), concretamente no que concerne à validação dos valores inscritos no Campo 8 - "Operações Isentas com direito a dedução", das Declarações Periódicas de IVA, do ano de 2014, e considerando que:
• os valores inscritos no Campo 8 incluem operações isentas conexas com a importação de mercadorias;
' as operações foram isentas ao abrigo da alínea f), do número 1, do artigo 13º do CIVA:
• conjugados com a alínea f), do n.º 1, do art.º 13º e alínea b), do n.º 2, do art.º 17º, ambos do CIVA, é necessário validar que as isenções efetuadas estão de acordo com as condições exigidas fiscalmente:
notificamos a sociedade, no dia 17 de fevereiro de 2017, na pessoa do seu gerente, B..., para apresentar, no local da sua sede, no prazo de 20 dias, os elementos que comprovam clara e inequivocamente que os valores inscritos no campo 8 das DP de IVA de 2014, relativos a operações conexas com a importação, reúnem os requisitos que permitem a sua isenção para efeitos de IVA: bem como. a definição dos critérios que justificam o enquadramento das operações isentas ao abrigo da alínea f), do n.º 1, do artigo 13º do CIVA, como prestações de serviços conexas com as importações, e a sua desagregação por valores parcelares (tratados como isentos) que integram cada fatura
A sociedade não cumpriu com a notificação tendo, no entanto, enviado parcelarmente e via e-mail, 5 ficheiros em formato "Excel", contendo listagens de faturas e que designou por:
. "Detalhe Campo 8 IVA Jan14 por conceito e Produto 13032017.xlsx";
. "Detalhe Campo 8 IVA Fev14 por conceito e Produto "5032017.xlsx";
. "Detalhe Campo 8 IVA Mar14 e Abr14 por conceito e Produto 22032017.xlsx";
. "Detalhe Campo 8 IVA Mai14 e Jun14 por conceito e Produto 26032017.xlsx"; e
. "Detalhe Campo 8 IVA Jul14 e Dez14 por conceito e Produto 03042017.xlsx"
Os ficheiros enviados complementam a informação que foi colocada ao nosso dispor no início da ação inspetiva, relativa à identificação de todas as faturas emitidas pela sociedade, o seu valor total e o valor isento/não sujeito.
Da sua análise, concluímos que:
1. A sociedade apresenta cerca de 140 diferentes tipos de designações para nomear os serviços por esta prestados, continuando a não permitir, através desta identificação, saber se estes ocorrem antes nacional;
2. No entanto, pela mera observação destas designações, conseguimos identificar serviços que foram considerados isentos para efeitos de IVA, mas que nunca o poderiam ser, na medida em que apontam para que tenham sido prestados após o desalfandegamento dos bens, nomeadamente, serviços de "despacho", "transporte interno" e "armazenagem".
Além disto, mesmo para os serviços que eventualmente tenham sido prestados antes do desalfandegamento dos bens e, portanto, passíveis de aplicação da isenção de IVA, nunca poderão ser validados sem o recurso ao respetivo DAU, nomeadamente, os valores nestes incluídos.
III.9.2 - Notificação efetuada em 1 de Agosto de 2017
Para efeitos de conclusão do procedimento inspetivo, e após todas as diligências efetuadas não se mostrarem suficientes para a análise a efetuar, recorremos a nova notificação, efetuada por via postal, através do Ofício n.º 2017..., datado de 1 de agosto de 2017, nos seguintes termos:
(...)
a) Na medida em que os elementos colocados à disposição no decurso das diligências inspetivas efetuadas, não permitem, nos termos do disposto no artigo 44º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA), o conhecimento claro e inequívoco dos elementos necessários ao controlo do cálculo do imposto (IVA);
b) Da análise até agora efetuada, os valores inscritos no Campo 8 das declarações periódicas incluem operações conexas com a importação de mercadorias, isentas ao abrigo da alínea f), do n.º 1, do artigo 13º do CIVA;
c) Existe a necessidade de verificar o cumprimento das condições exigidas que viabilizam as mencionadas isenções, nos termos do n.º 1, da alínea f), do artigo 13º, conjugado com o n.º 2, do artigo 17º ambos do CIVA;
d) O valor de crédito de IVA acumulado pela sociedade, à data de 2014-12-31, ascende ao montante de €463.051,07, pelo que subsiste a necessidade de fundamentação para o crédito de imposto acumulado na referida data.
Através desta, solicitamos a exibição, no local da sua sede, no dia 16 de agosto de dois mil e dezassete, dos seguintes elementos:
1. Elementos que comprovam clara e inequivocamente que, os valores inscritos no campo 8 das declarações periódicas de IVA, referentes ao ano de 2014, relativos às operações conexas com a importação desalfandegadas em território nacional, reúnem os requisitos que permitem a sua isenção para efeitos de IVA; especificando os critérios que justificaram o seu enquadramento de isenção ao abrigo da alínea f), do n.º 1, do artigo 13º do CIVA;
2. Da justificação do crédito de imposto acumulado e dos elementos que o comprovam e que validam o valor inscrito no campo 94, da declaração periódica de IVA referente ao mês de dezembro de 2014.
3. Do(s) ficheiro(s) SAF-T(PT) integrado, sistema de faturação e contabilidade, com referência ao ano de 2014, a que se refere o nº 8, do artigo 123º do Código do IRC e Portaria n.º 321-A/2007, de 26 de março, atendendo às posteriores alterações introduzidas por Portaria.
A não apresentação dos elementos referidos no prazo fixado ficará sujeita à penalidade prevista e punível no artigo 117º do Regime Geral das Infrações Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de junho, bom como à possibilidade de liquidação do IVA, relativamente aos valores inscritos no campo 8 das declarações periódicas de IVA de todos os períodos referentes ao exercício de 2014. bem como a possibilidade de desconsideração do valor de crédito de IVA acumulado mencionado no campo 94. da declaração periódica de IVA referente ao mês de Dezembro de 2014.
No dia 16 de agosto de 2017, comparecemos no local da sede da sociedade comprovando que a sociedade não cumpriu com o solicitado na notificação, tendo apenas entregue de uma folha com um quadro resumo das declarações periódicas de IVA, discriminadas por campos, dos períodos de novembro de 2007 a dezembro de 2014.
III.10 - Conclusões Finais
Segundo o disposto na alínea f), do n.º 1, do artigo 13.º do CIVA, "estão isentas de imposto as prestações de serviços conexas com a importação cujo valor esteja incluído no valor tributável das importações de bens a que se refiram, conforme o estabelecido na alínea b), do n.º 2, do artigo 17º do CIVA", ou seja, "as despesas acessórias, tais como despesas de comissões, embalagem, transportes e seguros, verificadas até ao primeiro lugar de destino dos bens em território nacional, ou outro lugar de destino no território da Comunidade se este for conhecido no momento em que ocorre o facto gerador na importação, com exclusão das despesas de transporte a que se refere a alínea t), do n.º 1, do artigo 14º do CIVA" (transporte de mercadorias entre as ilhas que compõem as regiões autónomas dos Açores e da Madeira bem como o transporte de mercadorias entre estas regiões e o continente, ou qualquer outro Estado-Membro, ou vice-versa).
Considera-se assim determinado que a Administração Tributária (aduaneira) liquida IVA sobre o Valor Tributável nas importações, devendo incluir este, todas as despesas conexas com a importação ocorridas até ao 1.º lugar de destino dos bens na Comunidade
O nº 3 do Art.º 17º do CIVA define lugar de destino como "(...) aquele que se encontre documentalmente comprovado perante os serviços aduaneiros ou, na falta dessa indicação, o lugar em que ocorra a primeira rutura de carga, se esta se efetuar no interior do pais, ou, caso tal não se verifique, o lugar da importação."
Até aqui, diremos que, a liquidação do IVA nas importações assenta, em valor, nos elementos declarados pelo contribuinte na declaração de importação (declaração que dará lugar ao DAU). Ou seja, a AT integra no Valor Tributável os valores declarados e definidos (incluindo transportes e outras despesas acessórias) apenas até ao 1º lugar de destino.
A maior parte das situações relativas à amostra colhida, referem como 1.º lugar de destino o lugar de desalfandegamento e, não incluem, então, despesas dos despachantes, despesas em terra, custo de transporte após desalfandegamento e outros suportados após o dito 1º lugar de destino.
Tanto assim, que o sujeito passivo recorre frequentemente à subcontratação destes serviços e sobre o valor destes incide IVA que o SP deduz com toda a legitimidade. Contudo, subsequentemente não o repercute nos valores debitados aos seus clientes.
Por seu turno, o artigo 44.º do CIVA (Requisitos da Contabilidade) estabelece o seguinte:
" 1 - A contabilidade deve ser organizada de forma a possibilitar o conhecimento claro e inequívoco dos elementos necessários ao cálculo do imposto, bem como a permitir o seu controle comportando todos os dados necessários ao preenchimento da declaração periódica do imposto.
2 - Para cumprimento do disposto no nº 1, deverão ser objeto de registo, nomeadamente:
a) As transmissões de bens e prestações de serviços efetuadas pelo sujeito passivo;
b) As importações de bens efetuadas pelo sujeito passivo e destinadas às necessidades da sua empresa;
c) As transmissões de bens e prestações de serviço efetuadas ao sujeito passivo no quadro da sua atividade empresarial.
3 - As operações mencionadas na alínea a) do número anterior devem ser registadas de forma a evidenciar:
a) O valor das operações não isentas, liquidas de imposto, segundo a taxa aplicável;
b) O valor das operações isentas sem direito à dedução;
c) O valor das operações isentas com direito à dedução;
d) O valor do imposto liquidado, segundo a taxa aplicável, com relevação distinta do respeitante às operações referidas nas alíneas f) e g) do nº 3 do artigo 3.º e nas alíneas a) e b) do nº 2 do artigo 4º, bem como dos casos em que a respetiva liquidação compete, nos termos da lei, ao adquirente.
4-As operações mencionadas nas alíneas b) e c) do nº 2 devem ser registadas de forma a evidenciar:
a) O valor das operações cujo imposto é total ou parcialmente dedutível, liquido deste imposto;
b) O valor das operações cujo imposto é totalmente excluído do direito à dedução;
c) O valor das aquisições de gasóleo, gases de petróleo liquefeitos (GPL), gás natural e biocombustíveis;
d) O valor do imposto dedutível, segundo a taxa aplicável."
Donde decorre que, enquanto naquela alínea f) do nº 1 do art.º 13.º, se descrevem os condicionalismos de que depende a aplicação da isenção nas operações, o art.º 44.º impõe algumas das obrigações contabilísticas que o legislador considera necessárias no sentido de viabilizar uma eficaz fiscalização e assegurar a cobrança correta do imposto, evitando a fraude e evasão fiscal, designadamente a nível do seu registo na contabilidade
Com efeito, se para efeitos de aplicação de isenção às "prestações de serviços conexas com a importação", o legislador impõe que o seu valor esteja incluído no valor tributável das importações de bens a que se refiram, incluindo, na medida em que nele não estejam compreendidos, as despesas acessórias verificadas até ao primeiro lugar de destino de bens em território nacional, expresso num documento designado por Documento Administrativo Único (DAU) (o meio mais importante e cabal de fazer prova), certo é, também, que o legislador adotou regras relativas à sua fiscalização, impondo obrigações contabilísticas e de registo de forma a possibilitar o conhecimento claro e inequívoco de todos os elementos necessários ao controle e cálculo do imposto dedutível
Por isso, a alínea g), do n.º 1, do artigo 29.º do CIVA dispõe que os sujeitos passivos são obrigados a dispor de contabilidade adequada ao apuramento e fiscalização do imposto, e o artigo 44.º do CIVA impõe um conjunto de regras que devem ser observadas tendo em vista determinar com precisão, relativamente a cada operação e a cada período de liquidação, o montante total de IVA repercutido aos clientes, o montante de IVA suportado pelo sujeito passivo e o IVA que este tem direito a deduzir
Esta exigência de adequados registos contabilísticos justifica-se se atentarmos nas necessidades, nomeadamente:
1.º) de apurar, de forma clara e inequívoca, o valor do imposto a entregar nos cofres do Estado (ou a recuperar no caso de constatação de uma situação de crédito). Isto porque, o IVA é um imposto cuja construção qualitativa e quantitativa é efetuada, unicamente, pelo sujeito passivo, a quem compete, por equação do binómio "Imposto liquidado vs Imposto dedutível" proceder ao cálculo do "imposto apurado" ("a entregar" ou "a recuperar") Também, a consideração de isenções (ou não sujeições) das operações a imposto é decisão do sujeito passivo.
2 º) de o sujeito passivo efetuar o preenchimento da declaração periódica de forma clara e inequívoca ou de outro modo, fácil e cómoda, e bem assim da declaração anual e dos mapas recapitulativos de clientes e de fornecedores e, quando for caso disso, do anexo recapitulativo relativo às transmissões intracomunitárias isentas;
3.º) de a AT poder, em qualquer altura, confirmar ou infirmar os montantes declarados pelo sujeito passivo.
Sem esses registos obrigatórios não é possível aferir e efetuar o controlo das declarações periódicas (e do consequente apuramento do imposto), posto que o seu preenchimento tem de ser feito com base nos valores transpostos dos registos contabilísticos e da contabilidade (os quais, por sua vez, têm por base os respetivos documentos de suporte), representando esta, a matriz da tributação tanto em sede de IVA como em sede de IRC, razão por que a contabilidade se reveste da maior importância em sede de inspeção, por constituir um mecanismo de controlo da veracidade dos valores declarados à Administração Fiscal.
Razão por que não basta a mera apresentação dos documentos de suporte contabilístico para justificar perante a AT o cumprimento dos condicionalismos da isenção. Esta tem o dever/obrigação de indagar sobre o enquadramento das operações e seu registo contabilístico em face da documentação que lhe serve de suporte, tendo para o efeito de consultar os registos referidos no art.º 44.º do CIVA de forma a conhecer, de modo claro e inequívoco, os elementos necessários ao cálculo do imposto e a controlar o preenchimento da declaração periódica efetuada pelo sujeito passivo.
Só através da análise a todos os registos que a lei exige e impõe, conjugados com a apresentação dos respetivos documentos de suporte, será possível levar a efeito uma fiscalização eficaz, que permita analisar da conformidade dos dados e valores apurados pelo sujeito passivo e transpostos para as declarações periódicas.
Ora, para justificar os valores declarados e inscritos nas declarações periódicas de IVA comunicadas à Administração Fiscal, concretamente os que constam do campo 8 - "Operações isentas ou não tributadas que conferem o direito à dedução" e/ou os que foram declarados no campo 61 - "Excesso a reportar do período anterior" (por supostamente dizerem respeito a crédito acumulado), não basta a mera apresentação dos documentos que serviram ou serviriam de suporte aos registos contabilísticos que integram a contabilidade (que o sujeito passivo tão pouco exibiu), já que a AT não só tem o poder de auditar toda a documentação como os ditos registos (contabilidade) que espelham a construção (apuramento) do imposto a entregar (ou a recuperar) pelo sujeito passivo, como tem o dever de o fazer. Com efeito, a AT deve questionar sobre os registos contabilísticos e em face da documentação que lhe serve de suporte, nos termos do art.º 44.º do CIVA, de forma a conhecer, clara e inequivocamente, os elementos necessários ao cálculo do imposto e a auditar o preenchimento da declaração periódica efetuada pelo sujeito passivo.
Não exibidos: (i) os registos referidos no art.º 44.º do CIVA, que; (ii) conjuntamente com os documentos que lhe servem de suporte; (iii) bem como os comprovativos e demais elementos correlacionados com os enquadramentos e/ou opções tomadas pelo SP relativos à concessão de isenções ou não sujeições, elementos estes que, no seu todo, integram um universo incindível designado contabilidade, conduz à desconsideração dos valores de IVA a recuperar e à liquidação dos valores inscritos no Campo 8 das DP apresentadas no período alvo do procedimento.
Além dos aspetos atrás mencionados, constatámos que o sistema de registo exibido pelo sujeito passivo, mais não é que um mero arrolamento de documentos com o objetivo de apurar o valor do IVA em cada um dos períodos relativos ao ano de 2015, sendo certo que nem assim tal se encontra devidamente relevado, já que não foram exibidos os documentos e/ou explicados os valores relativos aos registos que constam do dito arrolamento" e os lançamentos de apuramento do imposto.
III.11 - Correções para efeitos de IVA
III.11.1 -Falta de liquidação de IVA - 2014
No ano de 2014, a sociedade declarou valores no campo 8 das declarações periódicas de IVA entregues sem, contudo, comprovar o cumprimento dos condicionalismos para a aplicação da isenção de IVA nas operações, conforme determina a alínea f), do n.º 1, do artigo 13º do Código do IVA.
Deste modo, existe a falta de liquidação de imposto, à taxa normal vigente neste exercício, no montante de €553.632,47, conforme dispõe o n.º 1, do artigo 18º do Código do IVA, discriminado por período conforme quadros seguintes.
(...)
IX-DIREITO DE AUDIÇÃO
Em 02-11-2017, foi entregue nesta Direção de Finanças, com n.º de entrada 2017..., datado de 03-11-2017, o exercício do direito de audição manifestado pela sociedade, e que, por economia processual, apenas transcrevemos trechos que consideramos ilustrativos da temática abordada, mas cujo teor se dá por inteiramente reproduzido para efeitos legais, e que nos merecem os comentários seguintes.
Alegações apostas ao Direito de Audição:
Nos pontos 1 a 11, a Exponente caracteriza a atividade da sociedade, abordando a temática do enquadramento das operações ativas para efeitos de IVA, citando, nomeadamente, a alínea f), do n.º 1, do artigo 13º, e as alíneas p), q) e t), do n.º 1, do artigo 14º do Código do IVA (CIVA) e as prestações de serviço não sujeitas nos termos da alínea a), do n.º 6, do artigo 6º também do CIVA, bem como das operações passivas, assumindo que o IVA incorrido é sempre suscetível de dedução.
Derivado deste enquadramento, evoca que a sociedade se encontra sistematicamente em situação de crédito de IVA, nunca tendo solicitado o seu reembolso por, "durante um período de tempo significativo", não conseguir comunicar à AT, as faturas emitidas, inviabilizando assim o pedido de reembolso.
Mais ainda, declara que o programa de faturação da sociedade que deveria estar apto à produção do ficheiro SAF-T, não está em conformidade com as exigências legais.
Resposta ao direito de audição:
Com efeito, a análise ao histórico das declarações periódicas de IVA entregues pela sociedade, revela a existência de uma permanente situação de crédito de IVA, nunca tendo sido solicitado o seu reembolso apesar do valor do crédito de IVA constante da declaração periódica relativa ao período 2017.09, atingir o montante de €676.626,29
O facto de não ter solicitado reembolso, poderá efetivamente estar associado ao não cumprimento do estipulado no artigo 3º do Despacho Normativo n.º 18-A/2010, de 01 de julho, conforme afirma, uma vez que só no decorrer do ano de 2017 iniciou o procedimento de comunicação, por transmissão eletrónica, das faturas emitidas (E-fatura),
Confirma-se também que, atualmente, a sociedade não cumpre com as exigências legais no que respeita ao ficheiro SAF-T, infringindo reiteradamente as disposições legais que a isso a obrigam.
Conforme referimos no projeto de relatório, a falta de programa de faturação certificado pela AT, a feita de comunicação eletrónica dos elementos das faturas e a "incapacidade" do sujeito passivo, que apresenta um volume de negócios significativo e é considerado como um operador de referência no setor onde opera, de cumprir com as suas obrigações fiscais, não só coloca em causa a credibilidade da sua contabilidade, como afeta a análise dos elementos apresentados pela sociedade, não permitindo o seu controlo, aferição e eventualmente, o correto apuramento do imposto, nomeadamente, o apuramento do IVA.
. Capítulo "II. DO PROJETO DE RELATÓRIO"
Alegações:
Nos pontos 12 a 17, a Exponente resume os argumentos apresentados no Projeto de Relatório, e do qual deriva o valor da correção proposta, pela aplicação da taxa de IVA de 23% a uma base tributável de €2 407,097,71, e que ascende ao montante de €553.632,47.
Resposta ao direito de audição:
Não acrescenta qualquer elemento factual relevante que coloque em causa as conclusões constantes do Projeto de Relatório.
. Capítulo "III. DO ENTENDIMENTO DA EXPONENTE
1. "DOS SERVIÇOS PRESTADOS - NATUREZA DAS OPERAÇÕES E REGIME DE IVA"
Nos pontos 18 a 26, a argumentação apresentada começa referindo que a "Exponente aplica a isenção de IVA prevista no artigo 13º, n.º 1, alínea f) do CIVA aos serviços realizados antes do desalfandegamento dos bens, sendo a isenção aplicada à totalidade do valor faturado" e que esta "isenção não é aplicada nos serviços acessórios que são realizados após desalfandegamento da mercadoria", para, imediatamente a seguir, assumir que existiram lapsos, uma vez que constataram que "alguns destes serviços beneficiaram da isenção de IVA", e que se prontificam a regularizar através da entrega de declarações de substituição de IVA, tendo elaborado um quadro, que juntam em anexo, com o detalhe dos valores a ser corrigidos.
Finalizam este ponto reafirmando que, "todos os serviços realizados antes do desalfandegamento beneficiam de isenção de IVA prevista no artigo 13º (...) não sendo de acolher os argumentos apresentados pela AT', conforme argumentam nos pontos seguintes.
Resposta ao direito de audição:
Com efeito, derivado da presente ação inspetiva e respetiva análise efetuada, a sociedade conclui que foram cometidas irregularidades na aplicação da isenção prevista no artigo 13º do CIVA, relacionadas com prestações de serviços nas quais, de forma alguma, seria de aplicar a referida isenção, uma vez que ocorreram após o desalfandegamento dos bens.
O "controlo" agora efetuado pela Exponente, apurou que foi irregularmente aplicada a isenção prevista no artigo 13º do CIVA, em serviços prestados mencionados em, aproximadamente, 5 centenas de faturas emitidas, e que totalizam o montante de €86.528,58, ascendendo a um IVA não liquidado no montante de €19.901,57.
Em conformidade, a sociedade procedeu à entrega de declarações periódicas de IVA de substituição, corrigindo os montantes suprarreferidos, conforme quadro seguinte.
Não se tratou, por conseguinte, de um erro pontual ou inadvertido na emissão de uma fatura, denotando mais uma falta organizativa que decorre da própria inércia da sociedade na ótica do controlo interno.
Ainda assim, para além destes valores apurados/regularizados, consideramos que existem outras prestações de serviços em que foi aplicada a isenção prevista no artigo 13º do CIVA, mas que reportam a serviços efetuados após desalfandegamento, e que não foram englobados no quadro de apuramento.
No fundo, para a elaboração do quadro de apuramento, a sociedade partiu de centenas de descritivos que apõe nas faturas emitidas, agregando-os (pensamos que homogeneamente), e redenominando-os por descritivos mais esclarecedores do tipo de serviço prestado, tais como, "Inland" (transporte em território nacional), "Demurrage" (sobrestadia, montante que a contratante paga quando o contentor permanece em seu poder mais do que o prazo acordado), "Despacho" da mercadoria e "Armazenagem após desalfandegamento.
No entanto, verificamos que, para além destes, existem outros serviços prestados que ocorreram após desalfandegamento e que não fazem parte do referido quadro de apuramento, tendo sido faturados com aplicação da isenção prevista no art.º 13º do CIVA, tais como "custos administrativos", "documentação" "adicional", "transporte", "entrega/entrega mercadoria/entrega contentor", mencionados em centenas de faturas, e que a sociedade não englobou para efeitos de apuramento das incorreções.
Todo este contexto apenas manifesta, e atesta, a falta de organização que caracteriza a sociedade, conforme foi patenteado no Projeto de Relatório elaborado, onde se descreve que "os elementos disponibilizados para análise (processos físicos/dossiers), selecionados através de amostra, carecem de uma organização que permita, inequivocamente, identificar o tipo de operação, o seu enquadramento em sede de IVA e todos os documentos indispensáveis para a sua análise. Para além disto, nos processos relativos a importação de mercadorias com desalfandegamento em PT, além da patente desorganização, verificamos a ausência da totalidade dos elementos indispensáveis à completa verificação da aplicação da isenção consagrada na alínea f), do n.º 1, do art.º 13º do CIVA".
Desta forma, a organização da contabilidade não possibilita o conhecimento claro e inequívoco dos elementos necessários ao cálculo do imposto, não permitindo o seu controlo, uma vez que não comporta todos os dados necessários ao preenchimento da declaração periódica do imposto, infringindo, assim, o disposto no artigo 44º do Código do IVA.
2. "DO NORMATIVO LEGAL APLICÁVEL"
i. "Ordenamento jurídico comunitário"
Alegações:
Nos pontos 27 a 34, a Exponente discorre sobre as disposições legais comunitárias contidas na Diretiva 2006/112/CE ("Diretiva IVA"), nomeadamente, abordando o disposto no artigo 144º, que acolhe a isenção referente às prestações de serviços relacionadas com a importação de bens e cujo valor se encontra incluído no valor tributável, em conformidade com a alínea b), do n.º 1, do artigo 86º, conjugado com o artigo 85º, do mesmo diploma legal.
Invoca a legislação aduaneira comunitária, recorrendo ao Código Aduaneiro da União (CAU), nomeadamente, à conjugação dos artigos 70º e 71º, n.º 1, alínea e), deste diploma legal, pretendendo definir o que deverá ser incluído no valor tributável, nomeadamente, e para além do preço dos bens, as despesas de transporte e de seguro das mercadorias importadas, bem como as despesas de carga e manutenção conexas com o transporte destas, quando estas sejam incorridas até ao local onde as mercadorias são introduzidas no território aduaneiro da União.
Estas despesas, de acordo com o n.º 2, do artigo 71º do CAU, deverão basear-se, exclusivamente, em dados objetivos e quantificáveis, podendo, não obstante, e nos termos do artigo 73º do CAU, ser determinados com base em critérios específicos, quando não sejam quantificáveis à data da aceitação da declaração aduaneira.
Resposta ao direito de audição:
Embora apenas relacionando legislação comunitária, importa referir que:
1.º) O Código Aduaneiro da União (CAU) e os seus regulamentos implementados, apenas entraram em vigorem 1 de Maio de 2016, pelo que, no ano objeto (2014), a legislação aduaneira regia-se pelo Código Aduaneiro Comunitário (CAC) e as Disposições de Aplicação do Código Aduaneiro Comunitário (DACAC).
Esta alteração legislativa em nada modificou o entendimento respeitante à isenção referente às prestações de serviços relacionadas com a importação de bens e cujo valor se encontra incluído no valor tributável, sua natureza e forma de cálculo.
2.º) De acordo com o articulado aduaneiro, o valor das despesas previstas na alínea e), do n.º 1, do art.º 71º do CAU deve basear-se exclusivamente em dados objetivos e quantificáveis e, apenas na sua ausência ou não quantificação à data de aceitação da declaração aduaneira, poderão ser determinados com base em critérios específicos (tabelas optativas).
Conforme alega seguidamente (vide ponto 56), a Exponente envia, por regra, ao despachante a fatura emitida ao cliente com a descrição das despesas acessórias e frete (quando aplicável), sendo este envio anterior ao preenchimento do DAU.
Assim sendo, o valor das despesas previstas na alínea e), do n.º 1, do art.º 71º do CAU, a constar do valor tributável do DAU, é passível de ser calculado com base em dados objetivos, uma vez que tais despesas são conhecidas na data da aceitação da declaração aduaneira, não se considerando a possibilidade da utilização das tabelas optativas.
ii. "Ordenamento jurídico interno"
Nos pontos 35 a 37, a Exponente versa novamente sobre a alínea f), do n.º 1, do art.º 13º do CIVA, conjugando-o com a alínea b), do n.º 2, do art.º 17º, do mesmo diploma legal, incidindo na já abordada composição do valor tributável dos bens importados.
Identifica o Regulamento (UE) n.º 952/2013, de 9 de outubro de 2013, que estabelece que o Código Aduaneiro da União é diretamente aplicável por todos os Estados-Membros desde a sua entrada em vigor, sem que tenha de ser objeto de um ato nacional de transposição.
Resposta ao direito de audição:
Não acrescenta elementos factuais relevantes que coloquem em causa as conclusões constantes do Projeto de Relatório.
III. “Jurisprudência comunitária e nacional"
Alegações:
Nos pontos 38 a 43, a Exponente refere jurisprudência comunitária, nomeadamente, o recente Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia ("TJUE"), datado de 4 de Outubro de 2017, no âmbito do Processo n.º C-273/16 - Federal Express Europe Inc., e em que o TJUE foi chamado a interpretar as condições para a aplicação da isenção prevista no art.º 144º da Diretiva, a prestações de serviço: acessórias à importação de bens que qualificam como remessas de pequeno valor, as quais beneficiam de uma isenção de IVA na importação.
Alegam que, de acordo com o TJUE, "as despesas de transporte relativas à importação definitiva de bens devem estar isentas do IVA, na medida em que o seu valor está incluído no valor tributável, ainda que estes não tenham sido sujeitos ao IVA para efeitos aduaneiros no momento da importação".
Referem a conclusão do TJUE que foi no sentido de que "o artigo 144.º da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, lido em conjugação com o artigo 86º, n.º 1, alínea a), da mesma diretiva, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal, que prevê, para a aplicação da isenção do imposto sobre o valor acrescentado às prestações acessórias, incluindo os serviços de transporte, não apenas que o seu valor esteja incluído no valor tributável, mas também que essas prestações tenham sido efetivamente sujeitas ao imposto sobre o valor acrescentado para efeitos aduaneiros no momento da importação."
Assim, conclui a Exponente que, no caso em apreço, o Tribunal decidiu no sentido de que não pode uma legislação nacional impor como condição da aplicação da isenção de IVA do artigo 144.º da Diretiva 2006/112/CE, que os transportes respeitem a uma importação de bens que tenha sido efetivamente tributada.
No ponto 44, a Exponente refere a jurisprudência nacional, nomeadamente do Acórdão 13891, de 7 de fevereiro de 1996, do Supremo Tribunal Administrativo, sobre a aplicabilidade da isenção de IVA prevista no art.º 13º, n.º 1, al. f), do CIVA, ao valor do transporte de bens importados e o ónus da prova da inclusão do valor desse transporte no valor tributável da importação tendo concluído que:
"A isenção estabelecida no artigo 13º, n.º 1, alínea f) do CIVA não corresponde a uma verdadeira isenção de imposto, mas a uma definição do elemento objetivo quântico do facto tributário traduzido na importação de bens";
. "(...) cabe à Administração, a quem compete a prática do acto tributário (do registo da liquidação) a prova de que o não considerou na liquidação originária, assim fundamentando a liquidação adicionar,
. "(...) sempre caberá a respetiva prova à entidade competente para a liquidação, por, então, ela ter de ser considerada uma isenção pura e automática ou absoluta.";
"O valor do transporte dos bens importados tem necessariamente de ser considerado pelos Serviços aduaneiros aquando da prática do acto do registo de liquidação, coetâneo do desembaraço alfandegário."
Resposta ao direito de audição:
1º) Relativamente à jurisprudência comunitária, é de referir que este pedido de decisão judicial foi apresentado no âmbito de um litígio que opôs a Administração Fiscal italiana à Federai Express Europe Inc ("FedEX"), filial Italiana do grupo "FedEx Corporation", a respeito da sujeição a IVA das despesas de transporte relacionadas com a importação de bens isentos do IVA, mais especificamente, por o valor dos bens ser inferior à franquia de direitos à importação de mercadorias de valor insignificante ou sem caráter comercial Como resulta do próprio ponto 44 do Acórdão. "O Tribunal de Justiça já reconheceu que as franquias de direitos aduaneiros à importação de mercadorias de valor insignificante visam uma simplificação administrativa dos procedimentos aduaneiros (v., neste sentido, o acórdão de 2 de julho de 2009. Har Vaessen Douane Service, C-78, EU:C:2009:417, n.º 33)."
Ora, a tentativa de aplicação ao ordenamento jurídico nacional daquela jurisprudência comunitária passaria exclusivamente pelas situações previstas no Decreto-Lei n.º 398/86, de 26 de dezembro, que estabelece o regime relativo às isenções fiscais aplicáveis à importação de mercadorias objeto de pequenas remessas sem carácter comercial, provenientes de países terceiros, o que manifestamente não se subsume ao caso concreto.
Como decorre da análise efetuada, as insuficiências organizativas dos processos do contribuinte não podem confundir-se com as situações residuais, que justificam, segundo aquela jurisprudência, a simplificação administrativa naquele caso específico.
2.º) Relativamente à jurisprudência nacional - Acórdão do STA, tirado no Recurso n.º 13891, de 7 de fevereiro de 1996 - cumpre salientar que o mesmo se refere a factos tributários ocorridos entre 1986 e 1987, quando o funcionamento da liquidação de IVA associado ao valor aduaneiro se processava em moldes diferentes, pelo que não é viável uma adesão acrítica ao teor daquela jurisprudência.
Conforme o suprarreferido, a Exponente envia, por regra, ao despachante, a fatura emitida ao cliente com a descrição das despesas acessórias e frete (quando aplicável), sendo este envio anterior ao preenchimento do DAU (segundo diz).
Assim, atualmente, o DAU materializa a autoliquidação de tributos, estando o preenchimento da declaração periódica de IVA associada a esse elemento, também enquadrada no mecanismo de autoliquidação, pelo que se impõe a aplicação do disposto no artigo 75º da Lei Geral Tributária (LGT), que não vigorava à data dos factos relatados no acórdão citado.
Nos termos do n.º 1, do artigo 75º da LGT, presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações do contribuinte que estiverem em conformidade com os elementos constantes da sua contabilidade e desde que esta se mostre organizada nos termos da lei e não se verifiquem erros, inexatidões, ou outros indícios fundados de que ela não corresponde à realidade.
Portanto, vigora, no nosso sistema fiscal, o princípio da verdade declarativa, que coloca na esfera de atuação dos contribuintes a iniciativa no procedimento de apuramento, fixação e pagamento dos impostos. A administração fiscal está vinculada a liquidar os tributos com base na declaração do contribuinte, sem prejuízo do direito que lhe é concedido de proceder, a posteriori, ao controlo dos factos declarados.
Essa possibilidade de controlo dos factos declarados está na génese dos fins do procedimento inspetivo, definidos no n.º 1, do artigo 12º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (que também não existia à data dos factos tributários subjacentes ao acórdão proferido), consistindo essencialmente na verificação e comprovação da situação tributária dos contribuintes, com vista à confirmação do cumprimento das suas obrigações.
Quando, na prossecução destes fins, a inspeção tributária deteta as situações enunciadas no n.º 2, do artigo 75º da LGT, como sucedeu no presente procedimento, a consequência definida pelo corpo do n.º 2 daquele normativo, conduz à cessação da presunção de verdade das declarações entregues.
Assim, quer as insuficiências da contabilidade da Exponente, que impede o conhecimento da matéria tributária real do sujeito passivo, quer o não cumprimento dos deveres de esclarecimento cabal da situação face às sucessivas notificações para apresentação dos elementos em falta, tipificam comportamentos previstos nas alíneas a) e b) daquele n.º 2, que determinam o fim da presunção de verdade das declarações entregues e que materializavam a isenção aqui em causa.
Com a cessação daquela presunção, é devolvido ao contribuinte o ónus de demonstrar o direito à isenção associada às operações realizadas, que materializa um facto constitutivo de direitos, por força da distribuição do ónus da prova enunciado no n.º 1, do artigo 74º da LGT, e importa destacar que, nas situações abaixo identificadas, em que a Exponente demonstrou cabalmente os pressupostos da isenção, a mesma será reconhecida pela inspeção tributária, com a força probatória inerente ao disposto no artigo 76º da LGT.
Nestes termos, enquanto na jurisprudência citada estava em causa a possibilidade de liquidar adicionalmente imposto, no presente processo o que se exigia era a prova do direito à isenção que não foi satisfeito, e que conduziu à queda da presunção da verdade constante das declarações com a consequente inversão do ónus probatório.
3. "DA APLICAÇÃO DA ISENÇÃO DO ARTIGO 13.º, N.º 1, ALÍNEA F) DO CIVA AOS SERVIÇOS PRESTADOS PELA EXPONENTE'
Alegações:
Nos pontos 45 a 66, a Exponente acolhe que "todos os serviços de transporte relacionados com a importação de mercadorias que sejam efetuados antes do desalfandegamento dessas mercadorias têm enquadramento na isenção de IVA prevista o artº 13º, n.º 1, al. f), do CIVA".
Alegam que esta isenção "é de aplicação automática, não dependendo da verificação de qualquer condição que não seja o do cumprimento dos artigos 70º e 71º, n.º 1, alínea e) do CAU na determinação do valor tributário aduaneiro".
Sendo a determinação do valor tributário aduaneiro, efetuada pela AT, no momento da importação, refere a Exponente que "compete a esta verificar que estão incluídos no valor tributável, o frete e as respetivas despesas acessórias, exigindo a apresentação das faturas de suporte respetivas".
Logo, entende que "o CIVA não faz depender os efeitos da isenção do artigo 13º, nº 1, alínea f), do CIVA à apresentação de qualquer meio de prova por parte da Exponente".
Conclui que, "ainda que, por lapso, o valor tributável aduaneiro apurado no momento do desalfandegamento tenha sido inferior ao devido, uma verificação à posteriori apenas pode constituir fundamento de liquidação adicional de IVA na esfera do importador das mercadorias, por se tratar de IVA devido na importação".
Aludindo ao entendimento constante do Acórdão do STA 13891, refere que não caberia "ao contribuinte o ónus da prova da existência dos elementos positivos do facto tributário, consubstanciados na inclusão do valor do transporte no valor tributável dos bens importados, mas antes à Administração que verificava a existência dos factos tributários, aquando da prática do acto de liquidação, para o que teria de exigir a exibição do respetivo documento comprovativo do valor do transporte".
Propõe a Exponente que, "para garantir a efetiva tributação em IVA da totalidade das despesas acessórias faturadas pela Exponente, a qual deve ocorrer no momento da importação, deveria a AT nesse momento ter exigido aos despachantes a apresentação da documentação de suporte aos montantes declarados nas casas 44 e 45 do DAU".
Com efeito, afirma que, "a Exponente envia, por regra, ao despachante a fatura emitida ao cliente com a discriminação das despesas acessórias e frete (quando aplicável), sendo este envio anterior ao preenchimento do DAU".
Relativamente à atuação dos despachantes, entende que "apesar da disponibilização da fatura pela Exponente, verifica-se que é prática reiterada de alguns despachantes, desconsiderar esta fatura no que respeita aos valores das despesas acessórias e comunicar as mesmas à alfândega com recurso aos valores médios optativos, resultantes das tabelas optativas. "
A Exponente "não goza de qualquer possibilidade de intervenção, ou poder decisório relativamente aos montantes que são declarados pelo despachante para efeitos de preenchimento do DAU, terminando a sua intervenção com a disponibilização da fatura dos serviços de transporte, para efeitos de cálculo do valor tributável aduaneiro".
Nessa medida, "não pode a AT vir exigir à Exponente a apresentação do DAU como elemento necessário à comprovação da isenção nem exigir a liquidação de IVA que deveria ter ocorrido na importação das mercadorias a um sujeito passivo distinto."
Termina declarando "o DAU não está na posse da Exponente nem deverá estar na medida em que, o mesmo constitui a declaração aduaneira de importação que pertence ao importador das mercadorias, ou seja, ao cliente da Exponente".
Por tudo isto, a Exponente entende que "a isenção de IVA foi corretamente aplicada aos fretes e às despesas acessórias respetivas, por estes fazerem sempre parte do valor tributável da importação por aplicação do disposto no artigo 17º, n.º 2, alínea b), do CIVA".
Resposta ao direito de audição:
A Exponente assegura que cumpriu com todos os condicionalismos que lhe permitem a aplicação da isenção prevista na al. f), do n.º 1, do art.º 13º do CIVA nas faturas emitidas relacionadas com as prestações de serviços conexas com a importação de bens.
Com efeito, de acordo com este articulado, é condição indispensável para a sua aplicação assegurar que estes valores estejam incluídos no valor tributável das importações de bens a que se refiram, determinado no DAU.
No entanto afirma no ponto 56, que "a Exponente envia, por regra, ao despachante, a fatura emitida ao cliente com a discriminação das despesas acessórias e frete (quando aplicável), sendo este envio anterior ao preenchimento do DAU" (sublinhado nosso).
Afirma também, vide pontos 57 a 61, que verificou que é prática reiterada de alguns despachantes, desconsiderar esta fatura no que respeita aos valores das despesas acessórias e comunicar as mesmas à Alfândega com recurso aos valores médios optativos, resultantes das tabelas optativas, não gozando a Exponente de possibilidade de intervenção ou poder decisório relativamente aos montantes que são declarados pelo despachante. Bem assim, termina declarando que o DAU não está na sua posse, nem deverá estar na medida que este pertence ao importador das mercadorias, ou seja, ao cliente da Exponente.
Ora se:
a) a fatura é emitida em data anterior à do preenchimento do DAU relativo à importação, documento que serve de base ao cálculo do valor tributável das importações de bens;
b) a sociedade verificou que existem despachantes que desconsideram as suas faturas para efeitos de preenchimento dos DAU:
c) não goza de qualquer possibilidade de intervenção ou poder de decisório relativamente aos montantes que são declarados pelo despachante no DAU,
d) não está na posse do DAU.
Como poderá a Exponente assegurar e garantir que cumpre os condicionalismos para a aplicação da isenção da alínea f), do n º 1, do art.º 13º do CIVA nas faturas por si emitidas, se:
a) No momento da emissão da fatura, o valor tributário ainda não foi calculado, não existindo DAU;
b) A sociedade tem conhecimento que os critérios objetivos e quantificáveis que servem de base à determinação do valor tributável aduaneiro (faturas) não estão a ser cumpridos por determinados despachantes;
c) Não tem possibilidade de intervenção relativamente aos montantes declarados pelos despachantes para efeitos de preenchimento do DAU, tornando-se ainda de menor comprovação nos casos em que o despachante não é por si contratado, ou até se o despacho é realizado noutro Estado-Membro;
d) Não tem na sua posse os respetivos DAU que mencionam o valor tributável aduaneiro, a partir do qual foi calculado o respetivo IVA e direitos aduaneiros.
Assim, concluímos que a sociedade emite as suas faturas relacionadas com os serviços conexos com a importação de bens sem qualquer rigor nem consideração pela sua conformidade com as regras fiscais, assumindo que o que está relacionado com a importação de bens está indiscriminadamente isento de IVA.
Apesar de todos estes condicionalismos operacionais que a Exponente descreve relacionados com a elaboração do DAU, a sociedade nunca chega a validar a isenção concedida na fatura emitida, despreocupando-se com este facto e desobrigando-se de o fazer, na medida em que assume que a sua intervenção termina com a disponibilização da fatura dos serviços de transporte.
Não se trata, por conseguinte, de aferir do cálculo do valor tributável aduaneira, efetuando uma liquidação adicional de imposto (sendo caso disso), mas sim, confirmar o cumprimento de um condicionalismo expresso no artigo invocado pela sociedade para a aplicação da isenção na fatura emitida.
4. "DO ÓNUS DA PROVA DA CORRETA APLICAÇÃO DA ISENÇÃO DO ART.º 13º, N.º 1, ALÍNEA F) DO CIVA"
Nos pontos 67 a 88, a Exponente, reafirmando que não está obrigada a apresentar os respetivos DAU para aplicação da isenção na fatura ao abrigo do art.º 13º do CIVA, diligenciou junto dos Despachantes Oficiais que subcontratou, no sentido de reunir cópia dos DAU, por forma a demonstrar que o valor do transporte internacional relacionado com a importação de mercadorias está incluído nos DAU, juntando ficheiro em formato excel, no qual constam todas as faturas para as quais a AT vem propor correção ao IVA, identificando aquelas para as quais conseguiu reunir os respetivos DAU.
No tratamento dado aos elementos agora recolhidos, a Exponente acaba por identificar divergências entre o montante global dos valores apurados no campo 44 e 45 e o declarado nas faturas, conforme resumiram no quadro seguinte que se apresenta seguidamente.
Assim, garante a Exponente que, apesar destas divergências apuradas, "em circunstância alguma, existem situações em que tenha existido valor faturado sem que tenha sido considerado um valor adicional no DAU, para além do preço das mercadorias, para efeitos de cálculo do valor aduaneiro da importação".
Acrescenta ainda que, "em todos os casos, caberia à alfândega de importação, enquanto entidade competente para a liquidação do IVA na importação, determinar se o valor declarado corresponde ao efetivamente devido, no momento dessa liquidação".
Termina afirmando que "ainda que, hipoteticamente a AT considerasse ter direito a liquidar IVA adicionalmente por valores não incluídos no valor aduaneiro da importação, apenas poderia liquidar adicionalmente o IVA que respeita à diferença entre valores faturados pela Exponente e valores declarados nos DAU".
Resposta ao direito de audição:
Das diligências agora efetuadas, a Exponente conseguiu reunir cópia de parte dos DAU relacionados com as faturas por si emitidas onde aplicou a referida isenção de IVA.
Do tratamento dado pela Exponente aos documentos agora recolhidos, resultaram divergências que veio a apurar, e que apresenta no quadro supra constante do direito de audição, tratando de apresentar as suas conclusões como um todo, abordando as isenções concedidas em conjunto, e que, no nosso entender, o não podem ser.
A aplicação da referida isenção de IVA terá obrigatoriamente de ser tratada, operação a operação, fatura a fatura, tendo sempre por base a imposição apontada no normativo, ou seja, a inclusão do montante isento na fatura, no valor tributário da importação (DAU).
Analisados os documentos agora apresentados em sede de direito de audição, entendemos que foram comprovados os seguintes valores:
CONCLUSÕES:
Atendendo ao exposto, e apesar da Exponente afirmar que não está obrigada a apresentar os respetivos DAU para justificar a aplicação da isenção da alínea f), do n.º 1, do art.º 13º do CIVA, na fatura por si emitida, o certo é que não é esse o nosso entendimento.
Com efeito, não antevemos outra forma de verificar o condicionalismo aposto no normativo nomeadamente, a comprovação de que os montantes isentos na fatura por si emitida foram incluídos no valor tributável da importação, sem ter acesso ao respetivo DAU.
Segundo o pensamento da Exponente, a obrigação do cumprimento do formalismo inerente à aplicação da isenção, não é da sua responsabilidade, mas sim
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Do Despachante, por ser este ser o responsável pela entrega do DAU, sendo este por si subcontratado ou até mesmo não o sendo; e/ou
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Dos Serviços alfandegários, na medida em que não comprovaram os documentos que serviram de suporte à elaboração do DAU; e/ou
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Do importador das mercadorias, cliente da Exponente, na medida em que este é o devedor do IVA das mercadorias importadas.
Na verdade, gostaríamos de atestar que a Exponente cumpre com todas as suas obrigações, no que toca às isenções aplicadas nas faturas por si emitidas, mas não o conseguimos fazer, nem através da contabilidade da Exponente, que se mostra totalmente desadequada para o seu apuramento, não demonstrando perentoriamente a aplicação da lei, nem tão pouco através dos documentos apresentados, que se mostram desorganizados e/ou ausentes.
Mesmo após terem sido concedidos prazos alargados para cumprimento das lacunas detetadas em sede de procedimento inspetivo, a Exponente não conseguiu comprovar a totalidade das isenções aplicadas, dada a manifesta insuficiência ou ausência de organização contabilística e documental
Não assumindo o seu papel de intermediário na operação, nem a responsabilidade pela emissão de faturas que titulam a aplicação de isenções de imposto, a Exponente assume que:
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o DAU foi corretamente elaborado pelo Despachante, incluindo neste os valores isentados na fatura para efeitos de calculo do valor tributável da importação;
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os Serviços Alfandegários verificam todos os DAU apresentados, solicitando os respetivos comprovativos;
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uma análise, à posteriori, que demonstrasse incoerências no cálculo do valor tributável da importação (DAU) seria da única e exclusiva responsabilidade do importador das mercadorias.
Com efeito, a Exponente crê em todas as entidades com que se relaciona e demais intervenientes no processo de importação, sem se preocupar em defender-se de alguma irregularidade que possa estar a ser cometida e que, no nosso entender, é da sua responsabilidade.
Assim, conforme afirma no exercício do direito de audição, abdica deste exercício (de controlo) no momento da emissão da fatura, assumindo que a sua responsabilidade aqui termina.
Ponto 2:
Conforme a análise agora efetuada pela Exponente às faturas emitidas em que aplicou a isenção prevista na alínea f), do n.º 1, do art.º 13º do CIVA, da qual fez reporte em sede de direito de audição, apurou que existem serviços acessórios que foram realizados após desalfandegamento da mercadoria, em que exponente indevidamente aplicou a referida isenção, que totalizam o montante de €86.528,58, ascendendo a um IVA não liquidado no montante de €19.901,57.
Em conformidade, procedeu à entrega de declarações periódicas de IVA de substituição, corrigindo os montantes suprarreferidos deduzindo-os no campo 8, e inscrevendo-os nos campos 3 e 5 da DP, conforme quadro seguinte.
Não considerando estes factos como meros erros pontuais, denotando sim faltas organizativas que decorrem da ausência de controlo interno por parte da sociedade, pretenderam agora corrigir as situações flagrantes detetadas, ainda que, a nosso ver, de forma incompleta, uma vez que detetamos outras prestações de serviços efetuadas após o desalfandegamento, em que foi aplicada a isenção prevista no artigo 13º do CIVA e que não foram englobados no quadro de apuramento, não sendo corrigidas, como por exemplo, as identificadas como "custos administrativos", "documentação", "adicional", "transporte", "entrega/entrega mercadoria/entrega contentor", mencionados em centenas de faturas, omissos à regularização.
Ponto 3:
Apenas em sede de direito de audição, a Exponente conseguiu carrear para o processo, parte dos elementos necessários à validação da aplicação da isenção concedida nas faturas emitidas, e que no mereceu o devido tratamento e o respetivo ajustamento das correções apuradas.
Mais uma vez, reforçamos a ideia que o presente caso não se reporta a um apuramento a posteriori do correto preenchimento do DAU, mas sim, à verificação do cumprimento da lei, nomeadamente, a obrigação de comprovar que os montantes que a Exponente considerou como isentos nas faturas por si emitidas, nos termos do referido normativo, foram devidamente aplicadas.
Não basta para o efeito que se invoque a alínea f), n.º 1, art.º 13º do CIVA, por oposição desta norma na fatura, para que os serviços conexos com uma importação de bens sejam considerados isentos de imposto, mas sim, a demonstração que estes serviços foram já sujeitos a IVA, encontrando-se incluídos no valor tributável calculado no DAU.
Ora, se a sociedade emite a fatura em tempo anterior à definição do valor tributável, como alega, desde logo cai por terra que este consiga garantir que o valor isento estará incluído no valor tributário do DAU, do qual, como também afirma, não depende de si e ainda não foi apurado.
Conforme temos vindo a referir no decorrer da presente informação, a questão que se nos coloca no âmbito deste procedimento inspetivo, é a aferição dos valores declarados nas DP de IVA entregues pela sociedade relativa ao ano de 2014, com especial enfoque nos valores declarados no respetivo campo 8.
Para esse controlo ser efetuado, há necessidade de verificar o cumprimento dos condicionalismos para a aplicação da referida isenção nas faturas emitidas, pelo que, para além solicitados por diversas vezes no âmbito do procedimento externo, foram ainda objeto de notificação, aliás, de duas notificações efetuadas, onde a sociedade não só foi alertada para a falta de organização da contabilidade, como também para a falta documental existente, que não permitia validar os montantes inscritos nas DP de IVA.
Apesar destas diligências, que se arrastaram por um período temporalmente extenso, a sociedade manteve a sua "posição", não manifestando esforço no sentido de satisfazer as lacunas que se manifestaram, e que resultaram na impossibilidade de validação das isenções aplicadas nas faturas emitidas e, por conseguinte, na validação dos montantes inscritos no campo 8, das DP de IVA.
Ponto 4:
Em resultado do exposto, no ano de 2014, a sociedade declarou valores no campo 8 das declarações periódicas de IVA entregues sem, contudo, comprovar o cumprimento dos condicionalismos para a aplicação da isenção de IVA nas operações, conforme determina a alínea f), do n.º 1, do artigo 13º do Código do IVA.
Face ao exposto, tendo em conta os elementos agora apresentados, foram efetuados ajustamentos aos valores apurados de acordo com o quadro seguinte.
Deste modo, existe a falta de liquidação de imposto, à taxa normal vigente neste exercício, no montante de €330.791,97, conforme dispõe o n.º 1, do artigo 18º do Código do IVA, discriminado por período conforme quadro seguinte.
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Na sequência da inspecção foram efectuadas correcções em sede de IVA e emitidas as respectivas liquidações no valor global de € 330.791,99, conforme se sintetiza no quadro que segue (documentos n.ºs 1 a 12 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos):
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Dos acertos efectuados pela AT à conta corrente de IVA da Requerente em 2014 resultaram ainda as liquidações e respectivas demonstrações de acerto de contas n.ºs 2018..., 2018...e 2018... no valor total de € 33.173,38, relativas a IVA de 2014 e juros compensatórios (Documentos n.ºs 14, 15 e 16 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos)
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Em 9 de Julho de 2018, o valor € 33.173,38 foi pago pela Requerente em sede dos processos de execução fiscal n.ºs ...2018..., ...2018... e ...2018..., ao qual acresceu custas de processo no valor total de € 281,89 (Documentos n.ºs 17, 18 a 19 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
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A Requerente, no ano de 2014, efectuou transportes de mercadorias entre as ilhas das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, que se referem nas páginas 1 a 18, 21 a 23, 25 a 43, 45 e 46 do documento n.º 21, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
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Em 16-10-2019, o Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo.
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Factos não provados e fundamentação da fixação da matéria de facto
Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos pela Requerente.
A Autoridade Tributária e Aduaneira não apresentou processo administrativo.
Não se provou se o valor das prestações de serviços a que a Requerente aplicou o regime da alínea f) do n.º 1 do artigo 13.º do CIVA foi incluído no valor tributável das importações com que estavam conexionados.
Quanto às facturas que constam das páginas 19, 20, 24 e 44 do documento n.º 21 junto com o pedido de pronúncia arbitral, não se considerou provado que se refiram a transportes «entre as ilhas que compõem as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, bem como o transporte de mercadorias entre estas regiões e o continente, ou qualquer outro Estado membro, e vice-versa», pois das facturas não constam qualquer elemento que permita concluir que se trata de transportes de qualquer dos tipos referidos e, inclusivamente, nem sequer se faz referência à alínea t) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA, que a Requerente diz ter aplicado.
5. Matéria de direito
A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma acção inspectiva à Requerente em que entendeu existirem «fragilidades de controlo que indiciam uma não conformidade das faturas emitidas com as disposições legais em vigor para efeitos de IVA, nomeadamente, relacionadas com a aplicação da isenção em operações conexas com a importação extracomunitária de bens por via marítima», designadamente, operações conexas com a importação por via marítima com desalfandegamento em território nacional onde não foi liquidado IVA na factura, tendo sido consideradas como isentas de IVA. A Requerente actuou na condição de intermediária, deduziu o IVA liquidado nas facturas emitidas pelos subcontratados, e não liquidou IVA ao seu cliente final, invocando o disposto na alínea f), do n.º 1, do artigo 13.ºdo CIVA.
Na sequência da inspecção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu as liquidações impugnadas, no valor global de € 330.791,99.
A Requerente defende que há erro das liquidações quanto ao valor global de € 3.298,76, por respeitarem a serviços de transporte abrangidos pela alínea t) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA, [para além de também estarem abrangidos pela alínea f) do n.º 1 do artigo 13.º do CIVA], e erro quanto ao valor de € 327.493,23 por respeitarem a serviços de transporte abrangidos pela alínea f) do n.º 1 do artigo 13.º do CIVA.
5.1. Questão do IVA relativo a serviços de transportes abrangidos pela alínea t) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA
De harmonia com o disposto na alínea t) do n.º 1, do artigo 14.º do CIVA, está isento do imposto «o transporte de mercadorias entre as ilhas que compõem as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, bem como o transporte de mercadorias entre estas regiões e o continente, ou qualquer outro Estado membro, e vice-versa».
Como se refere na alínea G) da matéria de facto fixada, a Requerente apresentou com o pedido de pronúncia arbitral facturas que constam das páginas 1 a 18, 21 a 23, 25 a 43, 45 e 46 do documento n.º 21, que se referem a transportes enquadráveis naquela alínea t).
A Autoridade Tributária e Aduaneira nada diz no presente processo sobre esta matéria.
Assim, beneficiando de isenção os transportes a que se referem aquelas facturas, as liquidações referentes aos meses de Fevereiro, Março, Julho, Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro de 2014, enfermam de vício de violação de lei, nas partes em têm por fundamento os seguintes valores:
– Fevereiro de 2014: € 60,00 (páginas 2 e 3 do documento n.º 21);
– Março de 2014: € 154,53 (páginas 5 a 8 do documento n.º 21);
– Julho de 2014: € 80,34 (página 4 do documento n.º 21);
– Setembro de 2014: € 205,00 (páginas 9 a 13 do documento n.º 21);
– Outubro de 2014: € 165,32 (páginas 14 a 18 do documento n.º 21);
– Novembro de 2014: € 198,71 (páginas 21 a 23 do documento n.º 21);
– Dezembro de 2014: € 700,25 (páginas 25 a 43 e 45 e 46 do documento n.º 21).
De harmonia com o disposto no artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT, estes vícios justificam a anulação das liquidações referentes aos meses de Fevereiro, Março, Julho, Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro de 2014, nas partes em que assentam nos referidos valores.
Procede, assim, o pedido de pronúncia arbitral nas partes respectivas.
5.2. Questão do IVA abrangido pela alínea f) do n.º 1 do artigo 13.º do CIVA
5.2.1. Posições das Partes
O artigo 144.º da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, estabelece que «os Estados-Membros isentam as prestações de serviços relacionadas com a importação de bens e cujo valor se encontre incluído no valor tributável em conformidade com a alínea b) do n.º 1 do artigo 86.º».
«Nas importações de bens, o valor tributável é constituído pelo valor definido para efeitos aduaneiros pelas disposições comunitárias em vigor» e «inclui os seguintes elementos, caso não estejam já incluídos: (...) b) As despesas acessórias, tais como despesas de comissão, de embalagem, de transporte e de seguro, verificadas até ao primeiro lugar de destino dos bens no território do Estado-Membro de importação, bem como as despesas decorrentes do transporte para outro lugar de destino no território da Comunidade, se este lugar for conhecido no momento em que ocorre o facto gerador do imposto» .[artigos 85.º e 86,º, n.º 1, alínea b), da Directiva n.º 2006/112/CE].
Em sintonia com estas normas o CIVA estabelece no artigo 13.º, n.º 1, alínea f), que «estão isentas do imposto (...) as prestações de serviços conexas com a importação cujo valor esteja incluído no valor tributável das importações de bens a que se refiram, conforme o estabelecido na alínea b) do n.º 2 do artigo 17.º» e no artigo 17.º, n.ºs 1 e 2, que «o valor tributável dos bens importados é constituído pelo valor aduaneiro, determinado de harmonia com as disposições comunitárias em vigor» e «inclui, na medida em que nele não estejam compreendidos (...) as despesas acessórias, tais como despesas de comissões, embalagem, transportes e seguros, verificadas até ao primeiro lugar de destino dos bens em território nacional, ou outro lugar de destino no território da Comunidade se este for conhecido no momento em que ocorre o facto gerador na importação, com exclusão das despesas de transporte a que se refere a alínea t) do n.º 1 do artigo 14.º».
A Requerente efectuou no ano de 2014 serviços de transporte que considerou operações conexas com importações a que aplicou a isenção prevista no artigo 13.º, n.º 1, alínea f), do CIVA.
Na sequência de uma inspecção efectuada ao ano de 2014, a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou correcções no valor global de € 330.791,99.
No essencial, a posição da Autoridade Tributária e Aduaneira assumida no Relatório da Inspecção Tributária, definida após o exercício do direito de audição, baseia-se no seguinte entendimento:
– da alínea b) n.º 2 do artigo 17º do CIVA, para que remete o seu artigo 13.º, n.º 1, alínea f), conclui-se que a aplicação da isenção ao prestador dos serviços depende da prova de que o seu valor foi incluído no valor tributável dos bens importados;
– a contabilidade da Requerente apresenta irregularidades e não permitia apurar se o valor dos serviços a que foi aplicada a isenção foi incluído no valor tributável dos bens importados, designadamente por a Requerente não possuir os respectivos DAU [abreviatura do documento administrativo único, previsto nas Disposições de Aplicação do Código Aduaneiro Comunitário aprovadas no Regulamento (CEE) n.º 2454/93, da Comissão, de 02-07-1993];
– «A aplicação da referida isenção de IVA terá obrigatoriamente de ser tratada, operação a operação, fatura a fatura, tendo sempre por base a imposição apontada no normativo, ou seja, a inclusão do montante isento na fatura, no valor tributário da importação (DAU);
– «não antevemos outra forma de verificar o condicionalismo aposto no normativo nomeadamente, a comprovação de que os montantes isentos na fatura por si emitida foram incluídos no valor tributável da importação, sem ter acesso ao respetivo DAU»;
– essa falta dos DAU, documentos de suporte dos registos contabilísticos relativos às operações em causa, constitui uma deficiência da contabilidade da Requerente, em face do preceituado no nos artigos 29.º, n.º 1, alínea g) e 44.º do CIVA, pelo que, força do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 75.º da LGT, cessa a presunção de veracidade das declarações e contabilidade da Requerente, prevista no n.º deste artigo 75.º, passando a ser sobre a Requerente que recai o ónus da prova dos pressupostos da isenção.
A Requerente defende o seguinte, em suma:
– o artigo 144.º da Diretiva 2006/112/CE (“Diretiva IVA”) estabelece que os Estados-Membros devem isentar “as prestações de serviços relacionadas com a importação de bens e cujo valor se encontre incluído no valor tributável em conformidade com a alínea b) do n.º 1 do artigo 86.º”;
– a legislação da União Europeia não impõe qualquer condição para aplicação da isenção de IVA às prestações de serviços relacionadas com a importação de bens, incluindo as prestações de serviços de transporte até ao destino do local da importação;
– ao fazerem referência a que o valor das prestações de serviços de transporte “se encontre incluído no valor tributável” da importação, a Directiva IVA e o Código do IVA estão a atribuir à entidade que realiza a importação (e não às entidades que prestam os serviços anteriores à importação – o caso da Requerente) o ónus legal de declarar no valor tributável da importação o valor dos serviços relacionados com essa mesma importação;
– não é pelo facto de a entidade que realiza a importação não ter declarado (erroneamente) no valor tributável da importação o valor dessas prestações de serviços, que as prestações de serviços relacionadas e anteriores à importação passam a ser sujeitas e não isentas de IVA;
– as prestações de serviços realizadas antes da importação são isentas de IVA porque o respectivo valor vai, ou deve ser, por força da lei, declarado no valor tributável da importação;
– a isenção do artigo 13.º n.º 1 alínea f) do Código do IVA é de aplicação automática, não dependendo da verificação de qualquer condição que não seja a do cumprimento do artigo 32.º n.º 1 alínea e) do CAC (atualmente artigos 70.º e 71.º n.º 1 alínea e) do CAU) na determinação do valor tributável aduaneiro;
– cabe aos serviços aduaneiros da AT, no momento da importação e perante o importador, verificar se os serviços de transporte e respectivas despesas acessórias que precederam a importação estão de facto incluídos no valor tributável dessa importação, exigindo para o efeito a apresentação das respetivas facturas;
– retirar do âmbito da isenção prevista no artigo 13.º n.º 1 alínea f) do Código do IVA os serviços de transporte e respectivas despesas acessórias anteriores à importação, apenas porque o prestador de serviços não tem (nem tem de ter) na sua posse o DAU que é um documento do importador e cuja disponibilização à Requerente está dependente da vontade desse mesmo importador, é limitar sem fundamento legal a aplicação da isenção referida;
– o Código do IVA não faz depender a aplicação da isenção prevista no artigo 13.º n.º 1 alínea f) da apresentação de qualquer meio de prova por parte da Requerente;
– ainda que o valor tributável da importação apurado no momento do desalfandegamento não tenha em consideração o valor dos serviços de transporte, uma verificação a posteriori pela AT apenas pode constituir fundamento de liquidação adicional de IVA na esfera do importador dos bens, por se tratar de IVA devido na importação, e nunca na esfera da entidade que prestou os serviços em momento anterior à importação;
– na interpretação das normas de incidência fiscal e, também necessariamente e por maioria de razão, das correspondentes normas de isenção, deve atender-se primordialmente à substância económica dos factos tributários, em detrimento do estrito formalismo;
– ainda que a exigência do DAU, por parte da AT, para aplicar a isenção de imposto prevista no artigo 13.º n.º 1 alínea f) do Código do IVA não tenha fundamento legal, durante a acção de inspeção, a Requerente diligentemente reuniu esforços junto dos seus clientes e dos despachantes que subcontrata, tendo obtido parte dos DAU relativos às importações de bens, por forma a demonstrar que (i) o valor dos serviços de transporte internacional relacionados com a importação de bens está incluído nos DAU e que, em consequência (ii) uma correcção de IVA nos termos propostos pela AT é ilegal porquanto é geradora de uma duplicação na tributação;
– uma vez que a disponibilização do DAU está dependente da vontade de terceiros (despachante ou importador), um documento que única e exclusivamente lhes pertence, a Requerente não conseguiu obter a totalidade dos DAU correspondentes às prestações de serviços de transporte efectuadas em 2014;
– o ónus de provar de que o valor dos serviços de transporte foi sujeito a IVA por via da sua inclusão no valor tributável da importação cabe à AT e não à Requerente, nos termos do artigo 74.º, n.º 1, da LGT, uma vez que é a AT que tem o dever de assegurar / confirmar a título oficioso que o imposto devido foi efetivamente liquidado e pago;
– a Requerente não goza de qualquer possibilidade de intervenção ou poder decisório relativamente aos valores que são declarados pelo despachante / importador no DAU (e validados pela AT), terminando a sua intervenção com a disponibilização da factura dos serviços de transporte prestados antes da importação dos bens;
– mesmo que se entendesse que o ónus da prova cabia à Requerente, este ficou cumprido por parte da Requerente com a identificação dos clientes e das respectivas prestações de serviços de transporte de bens realizadas antes da importação em sede de inspecção tributária, permitindo assim à AT verificar oficiosamente se tais valores foram incluídos no valor tributável da importação, através do DAU que está na sua posse, nos termos do artigo 74.º n.º 2 da LGT;
– o Manual da Declaração Aduaneira de Importação (versão 1 / Março 2007), estabelece que os DAU documentos deverão permanecer arquivados junto dos serviços aduaneiros da AT;
– a actuação da AT neste processo, para além de não ser conforme com a lei, não cumpriu com os princípios do inquisitório, da verdade material e da justiça;
– cabe à AT proceder à realização de diligências de prova que, no exercício dos seus poderes de autoridade, lhe permite obter documentação de terceiros (DAU), de forma a verificar se o valor dos serviços de transporte foi efectivamente incluído no valor tributável da importação;
– não obstante, a AT já ter no seu próprio arquivo os DAU, esta tem ainda poderes, ao abrigo da lei fiscal, de exigir essa mesma informação aos despachantes / clientes da Requerente, o que no caso concreto simplesmente não fez;
– a Requerente não pode exigir que lhe sejam disponibilizados os DAU pois, para além de estes pertencerem ao despachante / importador, podem conter informação não só em relação à Requerente, mas também em relação a terceiros (outros prestadores de serviços do cliente), tendo, portanto, natureza sigilosa;
– as liquidações adicionais de IVA emitidas pela AT, sem que esta anteriormente verificasse se os serviços de transporte foram ou não incluídos no valor tributável da importação e aí sujeitos a tributação, poderão constituir uma clara violação do princípio da não dupla tributação, e em consequência uma violação do princípio fundamental da justiça consagrado no artigo 266.º n.º 2 da CRP;
–o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 07-02-1996, proferido no processo n.º 13891) e o acórdão do TJUE de 04-10-2017 do TJUE, proferido no processo n.º C-273/16, corroboram as posições da Requerente, bem como o acórdão arbitral de 10-12-2018, proferido no processo n.º 352/2018-T.
Na sua Resposta ao pedido de pronúncia arbitral, a Autoridade Tributária e Aduaneira reafirma a posição assumida no Relatório da Inspecção Tributária e diz ainda o seguinte, em suma:
– a aplicação da isenção, não depende mera referência ao artigo 13.º, n. 1, alínea f) do CIVA nas facturas, mas antes e sim, da verificação do seu pressuposto objectivo, de que o valor se encontre incluído no valor tributável da importação;
– isto porque, pretendendo a isenção em apreço, evitar a dupla tributação, tal também não pode resultar, na ausência de tributação, o que, manifestamente é contra o Princípio da neutralidade do imposto, já para não repetir que é também contrário às referidas normas do CIVA e da Directiva IVA;
– a verificação daquele pressuposto, e a respectiva demonstração, compete à Requerente, nos termos do previsto no art.º 74.º da LGT, sendo também à Requerente que incumbe ter a contabilidade organizada, por forma a permitir o apuramento do imposto (art.º 44.º do CIVA);
– o que pretende a Requerente nos presentes Autos, é que independentemente da inclusão do valor dos serviços em apreço, no valor tributável da importação, estes sejam isentos, o que é, manifestamente contrário quer à Directiva IVA, quer ao CIVA;
5.2.2. Questão do ónus da prova
As regras do ónus da prova no procedimento tributário constam do artigo 74.º da LGT, que estabelece o seguinte:
Artigo 74.º
Ónus da prova
1 - O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.
2. Quando os elementos de prova dos factos estiverem em poder da administração tributária, o ónus previsto no número anterior considera-se satisfeito caso o interessado tenha procedido à sua correcta identificação junto da administração tributária.
3. Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação.
A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que, existindo irregularidades na escrita da Requerente, cessa a presunção de veracidade que estabelece o artigo 75.º, n.º 1, da LGT, por força da alínea a) do seu n.º 2.
No caso em apreço, a Requerente defende que, a recair sobre si o ónus da prova, ele ficou satisfeito, à face do preceituado no n.º 2 do artigo 74.º da LGT, por ter identificado todos os importadores a quem prestou serviços e a Autoridade Tributária e Aduaneira ser possuidora dos DAU relativos a todas as importações.
De facto, a Autoridade Tributária e Aduaneira tem acesso à generalidade dos DAU, como resulta do Manual da Declaração Aduaneira de Importação publicado pela Autoridade Tributária e Aduaneira ( [6] ). Designadamente da página 101 «Arquivo».
Aliás, nem é apenas nesta orientação administrativa divulgada pela Autoridade Tributária e Aduaneira que resulta a disponibilidade da generalidade dos DAU, pois nas Disposições de Aplicação do Código Aduaneiro Comunitário (vigente em 2014) inclui-se o Anexo 37, «Instruções de Utilização do Documento Administrativo Único», em que se estabelece, no Título I - Observações gerais, A. Apresentação geral, alínea c) que «o exemplar n.º 6, que é conservado pelas autoridades do Estado-Membro em que são cumpridas as formalidades de importação».
Assim, tem de se concluir que, ao identificar os importadores/despachantes que emitiram os DAU, a Requerente deu satisfação ao previsto no n.º 2 do artigo 74.º da LGT, pois «os elementos de prova dos factos» estavam «em poder da administração tributária», obrigada a conservar o exemplar 6, e a Requerente procedeu «à sua correcta identificação junto da administração tributária».
Por isso, satisfeito pela Requerente a obrigação probatória referida no n.º 2 do artigo 74.º da LGT, cabia à Autoridade Tributária e Aduaneira, com base no conteúdo dos DAU que tem (ou devia ter) em seu poder, demonstrar que os valores dos serviços em causa não tinham sido incluídos no valor tributável, pois esta não inclusão é um pressuposto das liquidações.
Por isso, sendo sobre a Autoridade Tributária e Aduaneira que recai o ónus da prova, as dúvidas que possam subsistir sobre a inclusão ou não do valor dos serviços no valor tributável que foi considerado na importação têm de ser valoradas processualmente a favor da Requerente e não contra ela, o que se reconduz, em termos processuais, a uma situação equivalente à de ter feito a prova de que o valor dos serviços foi incluído no valor tributável da importação.
Assim, as liquidações impugnadas enfermam de vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de direito, relativamente às quais não foi apresentado o DAU.
Por isso, as liquidações impugnadas deverão ser anuladas, na medida em que enfermam deste vício.
5.2.3. Questão da não exigibilidade do IVA ao transportador quando o valor dos serviços não for incluído no valor tributável da importação
De qualquer forma, afigura-se que a Requerente também tem razão quanto à questão de saber se, no caso de as prestações acessórias não terem sido incluídas no valor tributável, o IVA indevidamente não liquidado ser exigível ao importador e não ao prestador de serviços que deveriam ser incluídos no valor tributável.
Na verdade, nos termos do artigo 85.º da Directiva n.º 2006/112/CE, «nas importações de bens, o valor tributável é constituído pelo valor definido para efeitos aduaneiros pelas disposições comunitárias em vigor».
Em 2014, vigorava o Código Aduaneiro Comunitário, aprovado pelo Regulamento (CEE) n.º 2913/92 do Conselho (doravante “CAC”)( [7] ), que estabelecia no seu artigo no seu artigo 29.º, n.º 1, que «o valor aduaneiro das mercadorias importadas é o valor transaccional, isto é, o preço efectiva mente pago ou a pagar pelas mercadorias quando são vendidas para exportação com destino ao território aduaneiro da Comunidade, eventual mente, após ajustamento efectuado nos termos dos artigos 32.º e 33.º».
Nos termos do artigo 32.º, n.º 1, alínea e) do CAC «para determinar o valor aduaneiro por aplicação do artigo 29.º, adiciona-se ao preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias importadas: (...) e) i) as despesas de transporte e de seguro de mercadorias importadas e ii) as despesas de carga e manutenção conexas com o transporte das mercadorias importadas, até ao local de entrada das mercadorias no território aduaneiro da Comunidade».
Como judiciosamente diz a Requerente,
– «ao fazer referência a que o valor das prestações de serviços de transporte “se encontre incluído no valor tributável” da importação, a legislação da União Europeia está a atribuir à entidade que realiza a importação (e não às entidades que prestam os serviços anteriores à importação – o caso da Requerente) o ónus de declarar no valor tributável da importação o valor dos serviços relacionados com essa mesma importação»;
– «não é pelo facto de a entidade que realiza a importação não ter declarado (erroneamente) no valor tributável da importação o valor dessas prestações de serviços, que as prestações de serviços relacionadas e anteriores à importação passam a ser sujeitas e não isentas de IVA»;
– «as prestações de serviços realizadas antes da importação são isentas de IVA porque o respetivo valor vai, ou deve ser, por força da lei, declarado no valor tributável da importação»;
– «a imposição por parte da AT de uma condição – cujo preenchimento está dependente de uma entidade terceira – para aplicar a isenção de imposto aos serviços de transporte prestados antes da importação, é desprovida de sentido, uma vez que o valor tributável da importação é apurado pelos próprios serviços aduaneiros da AT mediante informação a prestar pelo importador, não sendo por conseguinte suscetível de não ser escrupulosamente cumprida»;
– «cabe aos serviços aduaneiros da AT, no momento da importação e perante o importador, verificar se os serviços de transporte e respetivas despesas acessórias que precederam a importação estão de facto incluídos no valor tributável dessa importação, exigindo para o efeito a apresentação das respetivas faturas»;
– «retirar do âmbito da isenção prevista no artigo 13.º n.º 1 f) do Código do IVA os serviços de transporte e respetivas despesas acessórias anteriores à importação apenas porque o prestador de serviços não tem (nem tem de ter) na sua posse o DAU que é um documento do importador e cuja disponibilização à Requerente está dependente da vontade desse mesmo importador, é limitar sem fundamento legal a aplicação da isenção prevista no artigo 13.º n.º 1 f) do Código do IVA»;
– «ainda que, por lapso, o valor tributável da importação apurado no momento do desalfandegamento não tenha em consideração o valor dos serviços de transporte, uma verificação a posteriori pela AT apenas pode constituir fundamento de liquidação adicional de IVA na esfera do importador dos bens, por se tratar de IVA devido na importação, e nunca na esfera da entidade que prestou os AT em momento anterior à importação».
São correctas estas afirmações da Requerente, pois, como resulta das citadas Disposições de Aplicação do Código Aduaneiro Comunitário, nenhum dos vários exemplares do DAU é destinado ao prestador de serviços anteriores ao desalfandegamento, o que afasta a sua exigência como elemento de apoio contabilístico.
Por outro lado, justifica-se a conclusão da Requerente de que o IVA em falta, no caso de indevida omissão de inclusão no DAU do valor das prestações acessórias no valor tributável, deve ser exigido ao importador, pois é a este que a lei impõe a inclusão do valor dos serviços acessórios no valor tributável e o pagamento do IVA correspondente ao valor desses serviços, sendo o importador, assim, o sujeito passivo nesta situação, nos termos do artigo 18.º, n.º 3, da LGT, por ser este que «está vinculado ao cumprimento da prestação tributária».
Para além disso, devendo a liquidação de IVA ser efectuada pelo prestador de serviços na factura, nos termos do artigo 37.º, n.º 1, do CIVA, este deve emitir a factura sem liquidação de IVA, nos casos em que é aplicável isenção, não havendo qualquer fundamento legal para lhe exigir o pagamento do imposto (fora das situações especiais de responsabilidade solidária previstas no artigo 80.º do CIVA, que têm subjacente situações fraudulentas).
As normas da Directiva n.º 2006/112/CE sobre importações não são incompatíveis com este regime, pois «o facto gerador ocorre e o imposto torna-se exigível no momento em que é efectuada a importação de bens» (artigo 70.º) e no valor tributável do facto gerador do imposto são incluídas as despesas acessórias, designadamente de transporte, por força do disposto no artigo 86.º, n.º 1, alínea b). Por isso, é manifesto que também à face da Directiva n.º 2006/112/CE o sujeito passivo do imposto é o importador, sendo a ele que pode ser exigido o pagamento do imposto, inclusivamente o respeitante ao valor das despesas acessórias.
Sendo claro que a responsabilidade pelo pagamento do imposto não pode ser imputada à Requerente, é irrelevante para decisão da causa esclarecer se «a aplicação da isenção deve operar, mesmo quando o valor dos serviços não foi incluído no valor tributável da importação».
Pelo exposto, procede o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta questão.
5.3. Questões de conhecimento prejudicado
Procedendo o pedido de pronúncia arbitral por este fundamento, fica prejudicado, por ser inútil (artigos 130.º e 608.º, n.º 2, do CPC), a apreciação dos vícios procedimentais invocados pela Requerente, por violação dos princípios do inquisitório e da verdade material, bem como os vícios invocados com base nos princípios da legitimidade da justiça.
6. Reembolso do imposto pago
A Requerente pagou a quantia de € 33.173,88, resultante das demonstrações de acerto de contas elaboradas em execução das liquidações impugnadas, bem como a quantia de € 281,00 de custas dos processos executivos n.ºs ...2018..., ...2018... e ...2018..., instaurados para cobrança coerciva daquela quantia.
Como decorre do exposto, as liquidações enfermam de vícios que justificam a sua anulação.
A anulação das liquidações impugnadas, com fundamento em vício de violação de lei, tem como corolário a anulação das demonstrações de acerto de contas elaboradas com base nelas e consequente a restituição das quantias pagas com fundamento nestas, por tal ser essencial para «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», como impõe a alínea b) do n. 1 do artigo 24.º do RJAT, em sintonia com o artigo 100.º da LGT .
Assim, a Requerente tem direito ao reembolso da quantia que pagou, no montante total de € 33.454,88 (€ 33.173,88 + € 281,00).
7. Decisão
De harmonia com o exposto acordam neste Tribunal Arbitral em:
-
Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
-
Anular as liquidações adicionais de IVA nºs ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e..., bem como as demonstrações de acerto de contas n.ºs 2018..., 2018... e 2018...;
3.610,34;
-
Julgar procedente o pedido de reembolso da quantia de € 33.454,88 e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a efectuar o seu pagamento.
8. Valor do processo
De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 330.791,99.
Lisboa, 12-03-2020
Os Árbitros
(Jorge Lopes de Sousa)
(Clotilde Celorico Palma)
(Emanuel Vidal Lima)
( [1] ) No conceito de «liquidação», em sentido lato, englobam-se todos os actos que se reconduzem a aplicação de uma taxa a uma determinada matéria colectável e, por isso, também os actos de retenção na fonte (para além dos de autoliquidação e pagamento por conta, que não interessam para a decisão do presente processo).
( [2] ) Neste sentido, pode ver-se o acórdão do STA de 2-4-2009, processo n.º 0125/09.
( [3] ) Outras excepções àquela regra poderão encontrar-se em normas especiais, posteriores ao CPPT, que expressamente prevejam o processo de impugnação judicial como meio para impugnar determinado tipo de actos.
( [4] ) Essencialmente neste sentido podem ver-se os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 2-2-2005, processo n.º 1171/04; de 8-7-2009, processo n.º 306/09; de 23-9-2009, processo n.º 420/09; e de 12-11-2009, recurso n.º 681/09.
( [5] ) É a uma situação desse tipo, em que foi impugnado um indeferimento tácito interposto de um acto que não apreciou a legalidade de acto de liquidação, que foi objecto do processo que se reporta a decisão arbitral proferida no processo n.º 387/2019-T, que a Autoridade Tributária e Aduaneira cita, confundindo essa situação com a do indeferimento tácito de pedido de apreciação da legalidade de acto de liquidação.
Na verdade, nestes casos, tendo o indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa por objecto os próprios actos de liquidação e não sendo seu objecto qualquer acto de segundo grau que não tenha comportado a apreciação da legalidade de acto de liquidação, não há qualquer fundamento para ficcionar um acto que não conheceu da legalidade de acto de liquidação.
[7] O Regulamento (UE) n.º 952/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, estabeleceu que o Código Aduaneiro da União e é aplicável a partir de 01-05-2016.