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Decisão Arbitral
I - Relatório
A -Identificação Das Partes
Requerente: A..., LDA. pessoa coletiva n.º..., com sede na Rua ..., n.º ..., ...-... ...,doravante designado de Requerente ou Sujeito Passivo.
Requerida: Autoridade Tributaria e Aduaneira, doravante designada de Requerida ou AT.
A Requerente, apresentou o pedido de constituição de Tribunal Arbitral em matéria tributária e pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º1 do artigo 2.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, adiante abreviadamente designado por RJAT).
Em 2019-10-16, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral, foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD, e em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66B/2012, de 31 de dezembro, e automaticamente notificado à Autoridade Tributária.
A Requerente, não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico, designou como Árbitra, Rita Guerra Alves, aceite por esta, nos termos legalmente previstos.
Em 2019-12-04, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, e não manifestaram vontade de a recusar, nos termos do artigo 11.º n.º 1, alínea a) e b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7º do Código Deontológico.
O Tribunal Arbitral singular, foi regularmente constituído em 2020-01-07, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, para apreciar e decidir o objeto do presente litígio, e automaticamente notificada a Autoridade Tributaria e Aduaneira, para querendo se pronunciar, conforme consta da respetiva ata.
No dia 5 de março às 14.30h, realizou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e inquiridas as testemunhas arroladas pela Requerente. Nessa mesma reunião foi conferido o prazo de 10 dias a correr em simultâneo, para a apresentação pelas partes de alegações escritas.
As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades.
B – PEDIDO
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A Requerente, deduziu pedido de pronúncia arbitral visando a declaração de ilegalidade dos atos tributários de liquidação adicional em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas relativos aos períodos de tributação de 2015 e 2016, n.º 2018..., de 2018-08-07 e n.º 2018..., de 2018-08-08, que fixou um imposto a pagar de € 30.703,38 (trinta mil setecentos e três euros e trinta e oito cêntimos), e anulação dos respetivos juros compensatórios.
C – CAUSA DE PEDIR
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A fundamentar o seu pedido de pronúncia arbitral, a Requerente alegou em síntese, com vista à declaração de ilegalidade dos atos tributários de liquidação, o seguinte:
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O presente pedido de declaração da ilegalidade da liquidação dos atos tributários de liquidação em sede de IRC e dos juros compensatórios tem como fundamentos: i. preterição de formalidades essenciais por ausência de fundamentação substantiva e consequente ilegal inversão do ónus da prova; ii) erro sobre os pressupostos de facto e de direito; iii) violação dos princípios da legalidade, da justiça e da proibição do arbítrio; iv). inexistência de facto tributário.
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A Requerente desenvolve a sua atividade num imóvel arrendado por contrato verbal e por contrato escrito desde 01 de Julho de 2002.
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Nos termos do contrato as obras de manutenção, conservação ou reparação são da responsabilidade da Requerente.
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As obras de manutenção, conservação ou reparação são correntes, recorrentes e imprescindíveis ao prosseguimento da atividade económica da Requerente no locado quer as mesmas se destinem a manter o imóvel em condições de utilização quer se destinem a cumprir as disposições legais ou regulamentares.
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A Requerente, apresentou despesas em 2015 no valor de 20.222,90€ e em 2016 no valor de 9.290,00€.
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A Requerente entende que os gastos desconsiderados como custos fiscais de cada um dos exercícios em causa, representam, em relação aos gastos totais de conservação e reparação (conta SNC 6226), aos gastos totais com FSE, aos gastos operacionais totais e ao volume de negócio, o seguinte peso relativo:
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Sustenta a Requerente, considerando que se trata de obras em edifícios e em outras construções de propriedade alheia, que pela natureza dos serviços prestados, pela recorrência ao longo dos anos, pela sua “incorporação” no edifício reparado e consequentemente não removíveis, há-de concluir-se que os gastos em causa não reúnem os requisitos legais para serem considerados como “bens do activo fixo tangível ”, como defendeu a AT.
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A Requerente sobre a imparidade para dividas a receber, sustenta o seguinte:
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A requerente comprou material à empresa B..., SA, que utilizou para produzir produtos à empresa C... SA..
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Os produtos fornecidos pela B..., tinham defeitos, pelo que a Requerente teve de corrigir os defeitos dos produtos já entregues à C..., tendo suportados todos os custos, como: o transporte, a retirar a madeira defeituosa, a comprar novo contraplacado, a cortar, a colocar, a acabar e a colocar de novo os produtos substitutos nos locais onde foram levantados os produtos defeituosos.
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Não tendo logrado atingir um acordo sobre a questão, a Requerente foi forçada a deduzir, contra a B..., uma ação judicial pedindo que seja condenada a pagar a Requerente nos custos que teve.
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Com fundamento no pedido de compensação dos gastos incorridos e confiando na sua razão, alicerçada sobretudo nas conclusões do Relatório do LNEC a Requerente ao abrigo do princípio da especialização económica dos exercícios – art. 18.º do CIRC - reconheceu como rendimentos do período o montante dos gastos computados e reclamados.
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A Requerente para suportar o pedido da ação de indemnização emitiu à B... a fatura n.º 25798 de 31/12/2013 do montante de € 94.090,73.
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Os gastos incorridos com a substituição dos artigos defeituosos foram compensados pelo ganho reconhecido com a emissão da fatura à B... .
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A Requerente reconheceu os custos incorridos com a substituição dos artigos defeituosos e reconheceu, como rédito, o valor da compensação que se esperava vir a ser recebida.
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Em 30/03/2015 a B..., S. A. com o NIF/NIPC:..., propôs no Tribunal da Comarca do Porto - Vila Nova de Gaia, Processo Especial de Revitalização (CIRE), com o n.º .../15...VNG, Juízo de Comércio de Vila Nova de Gaia – Juiz ... .
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A Requerente com fundamento na propositura do PER considerou em 2015, como de cobrabilidade duvidosa o crédito detido sobre B... .
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E com esse fundamento contabilizou como gasto do período a perda de imparidade da divida a receber da B... .
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No exercício de 2013 reconheceu gastos com a substituição das cadeiras e das mesas no montante de € 76.496,53 e reconheceu o redito do mesmo montante contabilizando como rendimento o valor da fatura emitida à B..., ou seja, de € 76.496,53 (valor sem iva).
D- DA RESPOSTA DA REQUERIDA
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A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua resposta na qual, em síntese abreviada, alegou o seguinte:
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No período de 2015 a Requerente procedeu ao registo contabilístico na conta SNC # 6511— Perdas por imparidade em dívidas a receber -Clientes, do montante de € 97.209,10, referente à sociedade B..., S.A.
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Concluindo os SIT que «O sujeito passivo deveria ter reconhecido a perda por imparidade em 2013, na sequência da reclamação judicial dos créditos, uma vez que estavam reunidos os pressupostos legais para a constituição da imparidade, a que se refere a alínea b) do n.º 1 do artigo 28. °-B do Código do IRC», pelo que não poderá ser aceite a imparidade no ano económico de 2015.»
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Nos períodos de 2015 a 2016, a Requerente contabilizou em subcontas da conta 6225 - Conservação e Reparação diversos gastos referentes a obras efetuadas nas instalações da empresa.
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Da análise aos documentos de suporte e respetiva descrição das faturas concernentes às obras realizadas, constataram os SIT «tratar-se de obras profundas, destacando-se a substituição de um telhado».
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De onde concluíram que atendendo à natureza dos gastos, e tendo presente o disposto na NCRF 7, nomeadamente a seu § 7 e o disposto nos artigos 29° a 34° do CIRC, bem como no Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, deveriam os gastos em causa ter sido registados como ativo fixo tangível da empresa e não como gastos de um único período nas subcontas da conta 6225 — Conservação e Reparação, como fez a Requerente.
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Em função do que já ficou referido mostra-se inequívoco que os gastos suportados com as obras aqui em causa aumentam o valor real do bem e simultaneamente aumentam o período de utilidade esperada (vida útil), pelo que deverão ser registados no ativo fixo tangível da empresa e não serem reconhecidos como gasto do período».
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No tocante à alegada obrigatoriedade de consideração pela AT de gastos correspondentes às quotas de depreciação naqueles anos, atento o disposto no n.º 3 do artigo 1.° do DR 25/2009, o qual determina que «as depreciações e amortizações só são aceites para efeitos fiscais desde que contabilizadas como gastos no mesmo período de tributação ou em períodos de tributação anteriores (...) não tendo sido contabilizados quaisquer gastos com depreciações e amortizações relativamente aos gastos aqui em análise nos períodos de tributação em causa (2015 e 2016) nem em períodos de tributação anteriores, não poderão agora ser reconhecidos gastos de depreciação com os respetivos ativos».
E- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
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Para a análise das questões submetidas à apreciação do Tribunal, cumpre enunciar a matéria de facto relevante, baseada nos factos que não mereceram impugnação, na prova documental e testemunhal constante dos autos.
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A Requerente é uma sociedade por quotas que resultou da transformação em 1942, da atividade até então exercida, em nome individual, por D..., desde o ano de 1920, de fabricação de camas de ferro, estrados de arame para colchões e lavatórios e mais tarde, reorientada para o fabrico de material hospitalar, com especial destaque para as cadeiras de dentista e mesas de cirurgia e de cadeiras e mesas metálicas para cafés, restaurantes e esplanadas.
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A Requerente está coletada, para efeitos de IRC, pelo exercício da atividade de fabricação de mobiliário metálico para outros fins (CAE 31092).
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Para efeitos de IVA, está inscrita no regime normal de periodicidade mensal.
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Apresentou, com referência ao exercício de 2015, dentro do prazo legal, a declaração modelo 22 exigida nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 117.º e art.º 120.º do CIRC, na qual apurou o lucro tributável do montante de € 123.688,88 e a coleta do montante de € 25.374,66.
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Ao abrigo das ordens de serviços nº. OI 2018... e OI 2018... foi realizado pelos Serviços de Inspeção da Direção de Finanças de ..., o procedimento inspetivo de âmbito parcial (IRC e IVA) aos exercícios de 2015 e 2016, iniciado em 28.05.2018 e concluído em 23.07.2018.
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Em consequência daquele procedimento inspetivo foram efetuadas correções aos lucros fiscais declarados pela Requerente, em cada um dos exercícios de 2015 e 2016, dos montantes seguintes:
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A correção efetuada com referência ao exercício de 2015, respeita aos seguintes factos:
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A correção efetuada com referência ao exercício de 2016, respeita a:
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No exercício de 2016 desconsiderou, para efeitos ficais, os gastos suportados pelos seguintes documentos:
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No exercício de 2015, a AT desconsiderou, para efeitos fiscais, os gastos suportados pelos documentos seguintes:
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No período de 2015, a Requerente procedeu ao registo contabilístico na conta SNC # 6511— Perdas por imparidade em dívidas a receber-Clientes, do montante de € 97.209,10, referente à sociedade B..., S.A., referente a fatura 25798, datada de 3112-2013 e da nota de débito 5/82, datada de 31-12-2013.
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A Requerente desenvolve a sua atividade num imóvel arrendado por contrato verbal e por contrato escrito desde 01 de Julho de 2002.
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A requerente, realizou obras no imóvel em 2015 no valor de 20.222,90 e em 2016 no valor de 9.290,00€, e contabilizou em subcontas da conta 6225 -Conservação e Reparação diversos gastos referentes a obras efetuadas nas instalações da empresa.
F- FACTOS NÃO PROVADOS
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Dos factos com interesse para a decisão da causa, todos objetos de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.
G- QUESTÕES DECIDENDAS
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Atenta a posição das partes, adotadas nos argumentos por cada apresentada, constituem questões centrais a dirimir, as quais cumpre, pois, apreciar e decidir, as seguintes:
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A declaração de ilegalidade dos atos tributários de liquidação, em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas n.º 2018..., de 2018-08-07 e n.º 2018..., de 2018-08-08, relativas ao período de 2015 e 2016, que fixou um imposto a pagar de € 30.703,38 (trinta mil setecentos e três euros e trinta e oito cêntimos);
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Condenação no pagamento de juros indemnizatórios.
I MATÉRIA DE DIREITO
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Atenta a matéria de facto dada como provada, existem duas questões de fundo a apreciar, a primeira, consiste em determinar o enquadramento das perdas por imparidade de crédito de cobrança duvidosa de dividas a receber no valor de 97.209,10€, e a segunda questão, consiste em determinar o enquadramento das despesas incorridas pela Requerente em obras em edifício alheio, em 2015 no valor de 20.222,90 e em 2016 no valor de 9.290,00€.
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Iniciaremos por apreciar o enquadramento das perdas por imparidade de crédito de cobrança duvidosa de dividas a receber no valor de 97.209,10€.
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Assim sendo, temos que a Requerente reconheceu a imparidade, resultante de uma divida de 97.209,10€ da sociedade B..., S.A., no ano de 2015, data em que essa sociedade entrou em PER. Contudo a AT entende que essa imparidade devia ter sido reconhecida em 2013, data em que a Requerente interpôs uma ação judicial de condenação contra essa sociedade no pagamento de custos e indemnização pela venda de produtos defeituosos.
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Atendendo à matéria de fato carreada para os autos, a Requerente interpôs em Dezembro de 2013, uma ação judicial de condenação, contra a Sociedade B..., S.A., pelo incumprimento contratual e reparação de material defeituoso vendido por esta, consubstanciado no pedido de pagamento de custos e indemnização.
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Ora, face à legislação e às normas contabilísticas em vigor à data, vejamos qual o momento em que deveria ter sido reconhecida a imparidade, se em 2013 com a interposição da ação judicial de condenação, ou, em 2015 com a entrada do PER.
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Em primeiro lugar, diz-nos o artigo 18.º do CIRC, quanto à Periodização do lucro tributável, que “1 — Os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica. 2 — As componentes positivas ou negativas consideradas como respeitando a períodos anteriores só são imputáveis ao período de tributação quando na data de encerramento das contas daquele a que deviam ser imputadas eram imprevisíveis ou manifestamente desconhecidas.”
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Sobre as perdas por imparidades, estipula o n.º 1 do artigo 28-A do CIRC: “1- Podem ser deduzidas para efeitos fiscais as seguintes perdas por imparidade, quando contabilizadas no mesmo período de tributação ou em períodos de tributação anteriores: a) As relacionadas com créditos resultantes da atividade normal, incluindo os juros pelo atraso no cumprimento de obrigação, que, no fim do período de tributação, possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade;”
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Deste modo, podem ser deduzidas para efeitos fiscais as perdas por imparidade relacionadas com créditos resultantes da atividade normal. A noção de atividade normal, resulta do objeto social da entidade e das atividades operacionais da mesma, ou seja, no caso presente, a atividade da Requerente está relacionada direta e indiretamente com o exercício da atividade de fabricação de mobiliário metálico para outros fins.
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Com efeito, a Requerente adquiriu matéria-prima para a produção de mobiliário, matéria-prima com defeito, obrigando a Requerente a tomar as medidas necessárias para o solucionar. Deste modo, existe um nexo de causalidade entre o crédito, o produto final vendido e o objeto social da empresa, ie, o crédito aqui em apreço enquadra-se no âmbito da atividade normal da empresa,
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Aliás, caso o crédito, não resultasse da atividade normal da empresa, então o sujeito passivo não poderia reconhecer a divida por imparidade, por não se encontrarem preenchidos os requisitos, do artigo 23.º e 28.º-A, ambos do CIRC.
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Assim sendo, a divida da Sociedade B..., S.A à Requerente resulta da atividade normal da Requerente, e por isso mesmo, o crédito da requerente encontra-se abrangido pelo regime jurídico do disposto no artigo 28.º-A do CIRC.
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Passando de seguida à apreciação, sobre qual o período de contabilização da imparidade, reportemo-nos ao que nos diz o n.º 1 do artigo 28-A do CIRC.
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De acordo com essa norma o período de contabilização deve ser feito no mesmo período de tributação ou em períodos de tributação anteriores;
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E consideram-se créditos de cobrança duvidosa, aqueles em que o risco de incobrabilidade esteja devidamente justificado, conforme o dispõe o artigo 28.º-B n.º 1 alínea b) 1 - Para efeitos da determinação das perdas por imparidade previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, consideram-se créditos de cobrança duvidosa aqueles em que o risco de incobrabilidade esteja devidamente justificado, o que se verifica nos seguintes casos: b) Os créditos tenham sido reclamados judicialmente ou em tribunal arbitral;
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Retomando os autos, temos que a Requerente interpôs uma ação judicial contra a B..., S.A, no ano de 2013, ie, reclamou judicialmente esse crédito.
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Assim, existia já em 2013 a incerteza ou risco de incobrabilidade no pagamento do crédito, caso assim não fosse, a Requerente não teria recorrido à via judicial para ver o seu crédito reconhecido.
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Por conseguinte, em consonância com o princípio da periodização vertido no artigo 18° do CIRC, entendemos estarem preenchidos os requisitos das perdas por imparidade, previstas na moldura jurídico-fiscal dos artigos 28-A n.º 1 e 28-B n.1 al. b), contudo a imparidade deveria ter sido reconhecida no ano de 2013 e não em 2015, uma vez que a dúvida quanto ao seu recebimento estava patente já nesse ano, evidenciada na ação judicial intentada pela Requerente.
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Perante o anteriormente exposto, o pedido da Requerente quanto à imparidade do crédito de cobrança duvidosa (perdas por imparidade em dívidas a receber), é improcedente e o ato de liquidação aqui em apreço, legal.
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Quanto à segunda questão, relativa a despesas incorridas pela Requerente em obras em edifício alheio, diz a Requerente, em suma, que no edifício da sua sede, que detém por arrendamento, efetuou obras em 2015 no valor de 20.222,90€ e em 2016 no valor de 9.290,00€, que contabilizou em subcontas da conta 6225.
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Em concretos, foram apresentadas as seguintes faturas para comprovar os gastos:
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E em 2016, foram apresentadas as seguintes faturas para comprovar os gastos:
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A questão aqui submetida a apreciação prende-se com os referidos gastos se deviam ser registados como um ativo fixo tangível da empresa conforme defende a AT e não como um gasto de período como fez a Requerente.
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Atendendo a descrição das obras realizadas pela Requerente em 2015 e 2016, resulta que as obras estão relacionadas com construção civil em concreto, quanto a reparação dos telhados e fachada, demolição de sanitários, desentupir esgotos, execução de cobertura no espaço e no estacionamento, incluindo substituição de painéis de cobertura.
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Sobre esta questão, vejamos o que diz a legislação em vigor sobre os gastos e perdas previstos no artigo 23.º do CIRC e sobre o Regime das Depreciações e Amortizações, previsto no Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro de 2009, e a Norma Contabilista e de Relato Financeiro 7 (NCRF 7) sobre os ativos fixos tangíveis.
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Começando pela análise das regras de admissibilidades de gastos, diz-nos o artigo 23.º: 1 - Para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.
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Mais noz diz no seu número 2 - Consideram-se abrangidos pelo número anterior, nomeadamente, os seguintes gastos e perdas: a) Os relativos à produção ou aquisição de quaisquer bens ou serviços, tais como matérias utilizadas, mão-de-obra, energia e outros gastos gerais de produção, conservação e reparação; (nosso negrito).
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Em primeiro lugar, compete analisar a primeira parte do artigo 23.º quanto ao critério da indispensabilidade dos gastos, embora a mesma não seja colocada em causa quanto aos custos aqui previstos, compete, contudo, analisar a jurisprudência e doutrina nesta temática.
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Diz-nos a jurisprudência, “ critério da indispensabilidade foi criado pelo legislador, não para permitir à Administração intrometer-se na gestão da empresa, ditando como deve ela aplicar os seus meios, mas para impedir a consideração fiscal de gastos que, ainda que contabilizados como custos, não se inscrevem no âmbito da actividade da empresa, foram incorridos não para a sua prossecução mas para outros interesses alheios. (...) O conceito de indispensabilidade não só não pode fazer-se equivaler a um juízo estrito de imperiosa necessidade, com já se disse, como também não pode assentar num juízo sobre a conveniência da despesa, feito, necessariamente, a posteriori. Por exemplo, os gastos feitos com uma campanha publicitária que se revelou infrutífera não podem, só em função desse resultado, afirmar-se dispensáveis. O juízo sobre a oportunidade e conveniência dos gastos é exclusivo do empresário. Se ele decide fazer despesas tendo em vista prosseguir o objecto da empresa mas é mal sucedido e essas despesas se revelam, por último, improfícuas, não deixam de ser custos fiscais. Mas todo o gasto que contabilize como custo e se mostre estranho ao fim da empresa não é custo fiscal, porque não indispensável. Entendemos, pois, que são custos fiscalmente dedutíveis todas as despesas que se relacionem directamente com o processo produtivo (para o nosso caso, não interessa considerar as de investimento), designadamente, com a aquisição de factores de produção, como é o caso do trabalho. E que, sob pena de violação do princípio da capacidade contributiva, a Administração só pode excluir gastos não directamente afastados pela lei debaixo de uma forte motivação que convença de que eles foram incorridos para além do objectivo social, ou seja, na prossecução de outro interesse que não o empresarial, ou, ao menos, com nítido excesso, desviante, face às necessidades e capacidades objectivas da empresa.» (Cfr. Ac. do STA de 29/03/2006, proferido no processo n.º 01236/05, in www.dgsi.pt).
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E neste mesmo sentido, tem vindo a jurisprudência do CAAD a pronunciar-se, a qual relevamos: «(…) comprovada que esteja a orientação dos gastos para a prossecução da atividade da empresa e, consequentemente, para a obtenção do lucro, entende-se que o critério da indispensabilidade se encontra verificado, estando fora do escopo da Autoridade Tributária e Aduaneira realizar juízos de valor sobre a bondade da gestão empresarial prosseguida pela Requerente.» (Cfr. Ac. do CAAD de 20/07/2017, proferido no processo n.º 79/2017-T, in https://caad.org.pt/tributario/decisoes/), e «[b]asta que sejam actos que possam ser aceites como actos de gestão, actos do tipo dos que uma empresa realize com o objectivo de incrementar os proventos e com tendencial potencialidade para propiciar tal incremento.» (Cfr. Ac. do CAAD de 02/12/2013, proferido no processo n.º 101/2013-T), in https://caad.org.pt/tributario/decisoes/), realçamos igualmente o Ac. do CAAD de 18/01/2018, proferido no processo n.º 90/2017-T.
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Neste mesmo sentido, tal como referido, se tem vindo, igualmente, a pronunciar a doutrina:
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Tomás Maria Cantista de Castro Tavares, «[a] noção legal de indispensabilidade recorta-se, portanto, sobre uma perspectiva económico-empresarial, por preenchimento, directo ou indirecto, da motivação última de contribuição para a obtenção do lucro. Os custos indispensáveis equivalem aos gastos contraídos no interesse da empresa ou, por outras palavras, em todos os actos abstractamente subsumíveis num perfil lucrativo.», ou seja, defende o Autor que a noção «legal de indispensabilidade entre as componentes positivas e negativas do rendimento, pelo contrário, apenas intima uma relação de causalidade económica, no sentido da admissibilidade fiscal dos encargos reputados de indispensáveis pelo órgão de gestão, dado que contribuem, ainda que indirecta ou mediatamente, para a percepção dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora. Ora, este desiderato verifica-se sempre que – por funcionamento da teoria da especialidade do fim das pessoas colectivas – as operações societárias se insiram na sua capacidade, por subsunção no respectivo escopo estatutário e, em especial, desde que se conectem com a obtenção do lucro, ainda que de forma indirecta ou mediata.» (Cfr. Tomás Maria Cantista de Castro Tavares, Da Relação de Dependência Parcial entre a Contabilidade e o Direito Fiscal Na Determinação do Rendimento Tributável das Pessoas Colectivas: Algumas Reflexões ao Nível dos Custos, Lisboa: Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, n.º 396, outubro-dezembro, 1999, p. 167).
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Também José Casalta Nabais refere que «o princípio da livre disponibilidade económica exige que se permita, com a maior amplitude possível, a livre decisão do indivíduo em todos os domínios da vida, e que a limitação dessa liberdade de decisão apenas seja admitida quando, do seu exercício sem entraves, resultem danos para a colectividade, ou quando o estado tenha de tomar precauções para que se possa conservar e manter essa mesma liberdade de decisão.» (Cfr. José Casalta Nabais, O Dever Fundamental de Pagar Impostos: Contributo para a Compreensão Constitucional do Estado Fiscal Contemporâneo, Coimbra: Almedina, 2009, p. 204).
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António Moura Portugal defende que a indispensabilidade «deve ser aferida a partir de um juízo positivo da subsunção na actividade societária. Este, por sua vez, não deve ser sindicado pelo Fisco ou pelos tribunais, porque a isso obriga a liberdade de iniciativa económica.» (Cfr. António Moura Portugal, A dedutibilidade…op. cit., p. 279).
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Na mesma senda, Rui Duarte Morais sustenta que «[o]s sujeitos passivos são, pois, livres nas suas escolhas, nomeadamente para decidirem como gerir as suas empresas, para decidirem quais (na sua espécie e montante) os encargos por eles tidos por convenientes para a prossecução de determinada actividade económica. Temos, como princípio inerente à ideia de Estado Fiscal, a não interferência da administração na gestão das empresas. A invocação da regra da indispensabilidade dos custos nunca pode ser feita para fazer substituir o juízo de conveniência e oportunidade dos encargos assumidos, tal como resultaram da decisão dos órgãos sociais, por um outro juízo, também de índole empresarial, feito pela administração fiscal ou pelos tribunais.», frisa ainda que «[s]e à assunção do encargo que origina o custo presidiu uma genuína motivação empresarial – no entendimento dos sócios e/ou gestores da sociedade, os únicos a quem cabe decidir do interesse social -, o custo é indispensável. Quando se deva concluir que o encargo foi determinado por outras motivações (interesse pessoal dos sócios, administradores, credores, outras sociedades do mesmo grupo, parceiros comerciais, etc.), então tal custo não deve ser havido por indispensável.» (Cfr. Rui Duarte Morais, Apontamentos ao IRC, Coimbra: Almedina, 2007, pp. 85 a 87).
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Não resulta nenhuma dúvida que os gastos aqui apresentados preenchem o critério da indispensabilidade e devem como tal ser aceites nos termos do artigo 23.º n.º 1 do CIRC.
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Agora, sobre o Regime das Depreciações e Amortizações do n.°1 do artigo 29° do CIRC “São aceites como gastos as depreciações e amortizações de elementos do ativo sujeitos a deperecimento, considerando-se como tais: a) os ativos fixos tangíveis.”mas refere o n.º 5 que “São igualmente depreciáveis, nos termos dos números anteriores, os componentes, as grandes reparações e beneficiações reconhecidos como elementos do ativo sujeitos a deperecimento nos termos do n.°1”. (nosso negrito).
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Continuando a analise da moldura jurídico-fiscal, diz o Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro de 2009. De acordo com o artigo 5.º n. 5 “5 – Para efeitos de depreciação ou amortização, consideram-se: a) «grandes reparações e beneficiações» as que aumentem o valor ou a duração provável dos elementos a que respeitem ;b) «obras em edifícios e em outras construções de propriedade alheia» as que, tendo sido realizadas em edifícios e em outras construções de propriedade alheia, e não sendo de manutenção, reparação ou conservação, ainda que de caráter plurianual, não deem origem a elementos removíveis ou, dando-o, estes percam então a sua função instrumental.”(nosso negrito)
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Excluia alínea b), as meras obras de manutenção, reparação ou conservação, entendendo neste caso o legislador que se inserem na regra do artigo 23 n.º 1 e n.2 aliena a) do CIRC.
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E nesse sentido a NCRF 7, define ativos fixos tangíveis: são itens tangíveis que: (a) sejam detido para uso na produção ou fornecimento de bens ou serviços, para arrendamento a outros, ou para fins administrativos; e(b) se espera que sejam usados durante mais do que um período. (nosso negrito)
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Perante a legislação supra exposta, compete agora decidir se os gastos apresentados pela requerente, indispensáveis como já se referiu, constituem meros gastos gerais de produção, conservação e reparação (artigo 23 n.2 al. 1 do CIRC) ou grandes reparações e beneficiações (artigo 5.º n. 5 alínea a) e b) do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de Setembro de 2009).
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Da análise das obras supra referidas, podemos constatar que as mesmas constituem meras obras de manutenção, reparação ou conservação do imóvel arrendado, e não se inserem no conceito de grandes reparações e beneficiações, pois não alteram substancialmente a estrutura global do edifício, pelo que, não constituem ativos tangíveis depreciáveis tal como definidos pela NCRF 7, no n.º 1 e 5 do artigo 29° do CIRC e Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro de 2009.
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Tomando como ponto inicial a letra da lei (artigo 23.º, n.º 1 alínea a) do Código do IRC), que determina que «são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC» e tendo em consideração a doutrina e jurisprudência acima identificadas, consideramos não existir qualquer razão para que o gasto incorrido pela Requente não seja considerado dedutível para efeitos fiscais, i.e., para que o gasto se considere enquadrado no artigo 23.º do Código do IRC.
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Concluindo-se no sentido que as obras aqui em apreço não constituem ativos fixos tangíveis, e não estão sujeitas às regras de depreciações e amortizações, nos termos do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro de 2009.
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Neste sentido, os gastos aqui em analise, inserem-se no disposto pelo artigo 23.º n.º 1 e n.º2 alínea b) do CIRC, e portanto, a Requerente podia ter considerado o gasto como integral nos anos fiscais de 2015 e 2016.
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Perante o exposto o presente Tribunal dá por procedente este pedido da Requerente, sendo o ato de liquidação aqui em apreço, ilegal. As correções, nesta parte, operadas pela AT e contestadas pela Requerente na presente ação arbitral enfermam de erro nos pressupostos de facto, e consequente erro de direito, devendo, como tal ser anulada.
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Nos termos dos arts. 608º, n.º 2, 663º, n.º 2 e 679º do Código de Processo Civil por aplicação do artigo 29.º do RJAMT, o presente Tribunal Arbitral não se encontra obrigado a apreciar todos os argumentos alegados na petição inicial pela Requerente nem na resposta efetuada pela Requerida, quando a decisão fique prejudicada pela solução já dada e que se traduz na ilegalidade das liquidações.
J - DOS JUROS INDEMNIZATÓRIOS.
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Peticiona ainda a Requerente, o pagamento de juros indemnizatórios.
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Perante o exposto, a liquidação na parte abrangida pela anulação, resulta de erro de facto e de direito imputável exclusivamente à administração fiscal, na medida em que, a Requerente cumpriu o seu dever de declaração.
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Na verdade, ficou demonstrado que a Requerente pagou o imposto impugnado na parte superior ao que é devido. Desta forma e por força do disposto nos art.ºs 61.º do CPPT e 43.º da LGT, tem a Requerente direito aos juros indemnizatórios devidos, juros esses que devem ser contabilizados desde a data do pagamento do imposto indevido (anulado) até à data da emissão da respetiva nota de crédito, cujo prazo para pagamento se conta da data de início do prazo para a execução espontânea da presente decisão (art.º 61.º, n.ºs 2.ºa 5, do CPPTRIB), tudo à taxa apurada de harmonia com o disposto no n.º 4.ºdo artigo 43.º da LGT.
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Face a todo o exposto e às invocadas normas legais, decide-se pelo provimento parcial do pedido da Requerente.
H- DECISÃO
Face a todo o exposto, o presente Tribunal Arbitral, decide:
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Julgar parcialmente improcedente o pedido de declaração de ilegalidade dos atos tributários de liquidação em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas n.º 2018... e n.º 2018..., de 2018-0807 do período de 2015, quanto à Imparidade de dividas a receber no valor de 97.209,10€, que fixou um imposto e juros a pagar de 23.556,44€;
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Julgar parcialmente procedente o pedido de declaração de ilegalidade dos atos tributários de liquidação, em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas n.º 2018... e n.º 2018..., de 2018-08-08, de 2018-0807, relativo ao período de 2015 e 2016, quanto às correções no valor de 29.492,90€, referente aos gastos de manutenção, conservação e reparação em propriedade alheia, que fixou um imposto e juros a pagar de 7.146,94€;
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Condenar a Requerida, a restituir à Requerente a quantia de 7.146,94€ indevidamente liquidada e paga, acrescida do pagamento de juros indemnizatórios já vencidos, relativo ao período que mediou entre a data de pagamento do imposto até a sua devolução, bem como, no pagamento dos juros indemnizatórios vincendos a contar da data da notificação da decisão, até, efetivo e integral pagamento, tudo conforme o disposto n.ºs 2.ºa 5.ºdo art.º 61.º do CPPT, à taxa legal apurada de harmonia com o disposto no n.º 4.ºdo art.º 43.º da LGT até integral reembolso.
Fixa-se o valor do processo em 30.703,38€ (trinta mil setecentos e três euros e trinta e oito cêntimos), correspondente ao valor da liquidação, atendendo ao valor económico do processo aferido pelo valor da liquidação de imposto impugnada, e em conformidade fixam-se as custas, no respetivo montante em 1.836,00€ (mil oitocentos e trinta e seis euros), a cargo da Requerente na proporção de 76,723% (1.408,63€) e a cargo da Requerida na proporção de 23.277% (427,37€), de acordo com o artigo 12.º, n.º 2 do Regime de Arbitragem Tributária, do artigo 4.º do RCPAT e da Tabela I anexa a este último. – n.º 10 do art.º 35º, e n.º 1, 4 e 5 do art.º 43º da LGT, art.ºs 5.º, n.º 1, al. a) do RCPT, 97.º-A, n.º 1, al. a) do CPPT e 559.º do CPC).
Notifique.
Lisboa, 18 de março de 2020
A Árbitra
Rita Guerra Alves
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