Decisão Arbitral (consultar versão completa no PDF)
Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Prof. Doutor António Martins e Dr. Marcolino Pisão Pedreiro (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 27-06-2019, acordam no seguinte:
1. Relatório
A..., S.A., pessoa coletiva n.º..., com sede na ..., Lotes..., ...-... ..., ..., (doravante “Requerente” ou “A...” ou “A...SA”), veio, nos termos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), requerer a constituição de Tribunal Arbitral.
A Requerente pretende a declaração de ilegalidade e anulação;
i) da liquidação adicional de IRC n.º 2018..., relativa ao exercício de 2014, bem como das respectivas liquidações de juros compensatórios n.º 2018... e 2018... e da demonstração de acerto de contas n.º 2018...; e
ii) da liquidação adicional de IRC n.º 2018..., relativa ao exercício de 2015, bem como das respectivas liquidações de juros compensatórios n.º 2018..., 2018..., 2018... e 2018... e da demonstração de acerto de contas n.º 2018...;
iii) da liquidação adicional de IRC n.º 2018..., relativa ao exercício de 2016, bem como da respetiva liquidação de juros compensatórios n.º 2018... e demonstração de acerto de contas n.º 2018...;
iv) da liquidação de retenção na fonte de IRC n.º 2018..., relativa ao exercício de 2015.
A Requerente pede ainda o reembolso do IRC liquidado e pago em excesso, acrescido de juros indemnizatórios.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 15-04-2019.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, os Árbitros que inicialmente foram designados pelo Conselho Deontológico comunicaram a aceitação do encargo, no prazo aplicável.
Em 06-06-2019 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 27-06-2019.
A Administração Tributária e Aduaneira apresentou Resposta em que defendeu que o pedido de pronúncia arbitral deve ser julgado improcedente.
Em 04-12-2019, foi realizada uma reunião em que foi produzida prova testemunhal e decidido que o processo prosseguisse com alegações sucessivas.
As Partes apresentaram alegações.
Com as alegações, a Requerente juntou um documento, sobre o qual a Autoridade Tributária e Aduaneira nada veio dizer.
A Requerente juntou ao processo cópia de uma decisão arbitral proferida em 18-12-2019, no processo n.º 275/2019-T.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e é competente.
As Partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades.
2. Questão prévia
Nas suas alegações, a Autoridade Tributária e Aduaneira suscita uma questão prévia relativa à junção pela Requerente de cópia de uma decisão arbitral, proferida em 18-12-2019, no processo n.º 275/2019-T, referindo que essa decisão não transitou em julgado e não constitui precedente obrigatório.
A Requerente nada veio dizer sobre esta questão.
A Requerente não refere que a decisão tenha transitado em julgado nem que tenha valor de precedente obrigatório, pelo que não há um litígio a decidir sobre esta matéria.
Assim, não sendo invocando que o documento junto não corresponda ao teor de uma decisão arbitral proferida no processo n.º 275/2019-T, ele manter-se-á no processo como tal, isto é, como cópia de uma decisão arbitral não transitada em julgado e com o mero alcance de demonstrar que um tribunal arbitral a proferiu.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos:
A) A Requerente foi constituída em Novembro de 2009 e dedica-se à concepção, desenvolvimento e montagem de máquinas CNC (controlo numérico computorizado) de fresagem e perfuração profunda, direcionadas em especial para a indústria dos moldes (documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
B) Inicialmente a Requerente era constituída pelos sócios B... (B...), NIF ..., e C... (C...), NIF..., com quotas representativas de 85% e 15% do capital social;
C) Em Junho de 2011 a Requerente efectuou a transformação em sociedade anónima;
D) Em 2014, ocorreu um processo de fusão, passando a Requerente a integrar a totalidade do património da sociedade D... LDA, NIF..., com data de efeitos reportada a 01 de janeiro de 2014;
E) Após as várias alterações na estrutura acionista verificadas desde a constituição da Requerente com entrada de novos acionistas, E... (E...), NIF ... e F... (F...) NIF ... e sucessivos aumentos de capital, esta era a distribuição do capital social (€360.00,00) pós-fusão da Requerente:
F) Em Dezembro de 2015 a Requerente contratualizou um financiamento de 1,5 milhões de euros junto do Banco G... (PME investe), disponibilizado em partes iguais (em termos líquidos €497.00,00) em Janeiro de 2016, Novembro de 2016 e Dezembro de 2016;
G) Em Janeiro, a Requerente emprestou €242.00,00 a cada um dos acionistas B... e C..., totalizando €484.000,00;
H) Estes empréstimos foram liquidados em Março de 2016, após a concretização da venda de ações detidas por aqueles acionistas à H... SA ocorrida em 18 de Março de 2016;
I) Aquele financiamento bancário veio a ser direcionado para a edificação das novas instalações da Requerente construídas em terrenos adquiridos ao Município de ..., escriturado em Agosto de 2016 por 175.000,00 euros, com sinal de 67.500,00 euros em Janeiro de 2016 e em que as primeiras facturas de gastos incorridos com a construção aparecem registadas contabilisticamente no último trimestre de 2016;
J) Em 08 de Janeiro de 2016 e 18 de Março de 2016, os acionistas E... e F... alienaram, respetivamente, a totalidade das suas participações na sociedade A... aos outros dois acionistas B... e C...;
K) No dia 18 de Março de 2016, os acionistas B... e C... alienaram 80% das suas participações na Requerente à sociedade H... S.A. (H...), NIF ... pelo montante global de €5.274.248,00, alterando a estrutura acionista da Requerente nestes termos:.
L) No ano de 2018, a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma acção inspectiva à Requerente, tendo por objecto os exercícios de 2014, 2015 e 2016;
M) O procedimento de inspeção foi prorrogado por duas vezes consecutivas, nos termos que constam, dos documentos n.ºs 13 e 14 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
N) Nessa inspecção foi elaborado projecto de Relatório da Inspecção Tributária sobre o qual a Requerente se pronunciou no exercício do direito de audição, nos termos que constam do documento n.º 15 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
O) Posteriormente, foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária que consta do documento n.º-12 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
P) A Autoridade Tributária e Aduaneira procedeu ao desreconhecimento de um passivo perante a I..., relativo ao exercício de 2016, no montante de € 15.400,00, com os fundamentos que constam do ponto III.1.1.4 do Relatório da Inspecção Tributária nestes termos:
III.1.1.4 Rendimentos tributáveis - desreconhecimento de passivos
Nos termos do n.º 1 do artigo 20.º do Código do IRC, consideram-se rendimentos e ganhos os resultantes de operações de qualquer natureza, em consequência de uma ação normal ou ocasional, básica ou meramente acessória.
Ora, a análise aos extratos de movimentos e balancetes dos períodos de 2014 a 2016 evidencia que, desde 01 de janeiro de 2014, subsistem saldos nas contas SNC 221120014, SNC 221120122 e SNC 278212, nos montantes de 994.00 euros. 15.400,00 euros e 1.500,00 eu os respetivamente. conforme abaixo:
Importa referir que os movimentos na conta SNC 278212, com os números de lançamento n.º ... e ..., decorrem da transposição dos elementos patrimoniais da D... no âmbito do processo de fusão.
Por sua vez, a análise do balancete final de 2017 evidencia que os saldos credores das referidas contas se mantém inalterados desde o encerramento da contabilidade de 2014, tal como se constata pelo print parcial abaixo:
Perante a antiguidade dos saldos, apenas se poderá concluir que os saldos das contas em causa não respeitam a obrigações do sujeito passivo perante terceiros, impondo-se o desreconhecimento de tais passivos.
Segundo o § 90 da Estrutura Conceptual (EC) do Sistema de Normalização Contabilística (SNC), republicada pelo Aviso n.º 8254/201 S, de 29 de julho, "um rendimento é reconhecido na demonstração dos resultados quando tenha surgido um aumento de benefícios económicos futuros relacionados com um aumento num ativo ou com uma diminuição de um passivo e que possa ser quantificado com fiabilidade. Isto significa, com efeito, que o reconhecimento dos rendimentos ocorre simultaneamente com o reconhecimento de aumentos em ativos ou com diminuições em passivos (por exemplo, o aumento líquido em ativos provenientes de uma venda de bens ou de serviços ou a diminuição em passivos provenientes do perdão de uma divida a pagar" (sublinhado nosso).
Após notificação da AT, solicitando esclarecimento sobre tais saldos, o sujeito passivo limitou-se a remeter para as respetivas faturas e material adquirido, nada esclarecendo sobre a permanência dos mesmos ao longo dos anos em análise.
Contudo, num relatório elaborado pela J..., com data de 19 de fevereiro de 2016 (ver página 40 do Anexo 3). evidencia-se a seguinte afirmação' "da análise ao mapa de antiguidade de saldos facultado pela gestão com referência a Set15A. identificam-se apenas €18k de saldos vencidos há mais de 180 dias -basicamente €15k ao fornecedor I..., sendo que de acordo com os esclarecimentos da gestão este saldo não será pago, uma vez que ocorreram problemas {...). (...) de acordo com a gestão existe um acordo formal com o fornecedor para o não pagamento (...) - contudo, o mesmo ainda não emitiu a respetiva nota de crédito. Os restantes €3k de saldos vencidos há mais de 360 dias respeitam a situações idênticas, de acordo com a gestão.
O mesmo relatório contém na página 46 (ver Anexa 3) a seguinte posição: '(...) saldos vencidos a pagar a fornecedores num total de €18k. sendo que de acordo com os esclarecimentos da gestão os mesmos não serão pagos (...)".
Após reuniões tidas com os responsáveis do sujeito passivo, relativamente ao passivo da I..., foi apresentado um ofício datado de novembro de 2015 (ver Anexo 4), no qual a A... assume que foi efetuado um pagamento de 113.000,00 euros no passado que "liquidaria o valor total em aberto em conta corrente", solicitando um esclarecimento do assunto, uma vez que "não é reconhecida qualquer divida em aberto perante a SP/RS AT. Decorrido um tempo normal de resposta, sem qualquer aditamento do fornecedor sobre o assunto, foi assumido pelo administrador B... ser razoável considerar tal "perdão de divida" no período de 2016, face à ausência de pronúncia por parte da I... .
Assim, no que concerne aos saldos credores das contas SNC 221120014 e SNC 278212, nos montantes de 994,00 euros e 1 500,00 euros, respetivamente, os mesmos não se configuram como obrigações presentes, pelo que tais passivos deveriam ter sido desreconhecidos e implicado o reconhecimento de um rendimento/ganho (perdão de dívida), no período de 2014. Quanto ao saldo da conta SNC 221120122, no montante de 15.400,00 euros, tal rendimento decorrente do perdão de divida será imputável ao período de 2016, pelas razões acima exposta.
Face ao exposto, nos termos do artigo 20º do Código do IRC, importa que o sujeito passivo proceda ao acréscimo dos montantes de 2.494,00 euros (994,00 euros + 1.500,00 euros) e 15.400,00 euros ao campo 752 do quadro 07 das declarações de rendimentos modelo 22 de IRC dos períodos de 2014 e 2016, respetivamente.
Q) A Requerente adquiriu um divisor a I... durante o decorrer do ano 2012 (documento n.º 19, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
R) No âmbito desta relação comercial, a Requerente foi pagando os montantes devidos através de pagamentos parciais, sendo que, em 2016, encontrava-se pendente de pagamento o saldo de € 15.400,00 (Relatório da Inspecção Tributária);
S) Em virtude de tal divida se encontrar pendente de pagamento e de não ter 0 acordo da I... para a anular, a Requerente manteve-a reconhecida no seu balanço enquanto passivo (depoimento da testemunha W...);
T) A I... foi selecionada para circularização em 2016, mas os auditores da Requerente, não obtiveram resposta da I... sobre a existência e atualidade da divida (documento n.º 20 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
U) Em face das informações disponíveis e por razões de prudência documentadas pelos auditores que procederam a certificação legal de contas da Requerente em 2016, a Requerente manteve esta obrigação reconhecida como passivo, porque não dispunha de elementos que lhe permitissem proceder com fiabilidade ao desreconhecimento deste crédito (documento n.º 20 e depoimento da testemunha W...);
V) Só em Novembro de 2018, é que a Requerente obteve a confirmação, por parte do administrador de insolvência da I...), de que este crédito não iria ser reclamado (documento n.º 21 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
W) No ano 2018, a Requerente procedeu a regularização contabilística desta situação através do registo do ganho na conta #788 “Outros ganhos”, com o lançamento contabilístico n.º ... (documento n.º 22 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
X) A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou duas correcções relativas a despesas imputáveis a detentores do capital, nos seguintes valores:
a) Exercício de 2015: EUR “5256,02;
b) Exercício de 2016: EUR 72.853,87.
Y) A fundamentação destas correcções e referida no ponto III.1.1.5 do Relatório da Inspecção Tributária nos seguintes termos:
III.1.1.5. Gastos não aceites - despesas Imputáveis aos detentores do capital
Nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC, para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC. Ou seja, entende-se que terá de existir uma relação causal entre os gastos e perdas e os rendimentos da entidade sujeitos a imposto, para além da necessária correlação com o escopo social da sociedade.
Ora, em finais de 2015 e durante os primeiros meses de 2016, o sujeito passivo considerou como gastos de tais períodos um conjunto de despesas debitadas por empresas de consultoria e escritórios de advogados, todas elas associadas ao processo de salda dos acionistas (E... e F...) e à aquisição da maioria do capital pela sociedade gestora de fundo de investimento, H..., que viria a acontecer em março de 2016.
Os gastos em análise são os que constam do quadro seguinte (ver documentos em Anexo 5):
A análise das faturas emitidas por tais prestadores de serviços permitem antever o âmbito dos trabalhos desenvolvidos, tal como se descreve abaixo:
Ora, a entidade J... foi responsável por uma auditoria à A..., no sentido de apurar situações passíveis de eventuais posteriores litígios entre os administradores que iriam permanecer na empresa, B... e C..., e os administradores que já perspetivavam a salda da estrutura acionista da empresa, E... e F... . Tratou-se, acima de tudo, de um exame efetuado por uma entidade externa, sem participação na revisão legal de contas, e o qual permitia conferir algum conforto aos acionistas dissidentes e àqueles que permaneceram na empresa.
Quer a proposta da J... de novembro de 2015 (15.000,00 euros + despesas, conforme Anexo 6), quer a sua extensão em janeiro de 2016 (3.500,00 euros, conforme Anexo 61. respeitam à prestação de serviços de “due diligence”.
Segundo o contrato, na parte relativa à descrição dos serviços (ver página 3 do Anexo 61. "due diligence é um termo utilizada para descrever o trabalho requerido por um cliente envolvendo inquéritos e análise de certos aspetos específicos respeitantes às contas, organização e atividades da empresa alvo". A "empresa alvo" foi a A... .
No mesmo documento (ver pág. 3 do Anexo 61. a J... afirma que "o nosso cliente solicitou-nos o nosso comentário (...) de assuntos que podem condicionar a vossa negociação", acrescentando que "não nos pronunciaremos sobre o preço a pagar ou outros termos".
Por outro lado, o relatório elaborado pela J..., datado de 19 de fevereiro de 2016 (ver página 5 do relatório em Anexo 31. identifica, claramente, o propósito de tais serviços de "due diligence": "os dois acionistas maioritários da Cheio pretendem adquirir as participações dos restantes dois acionistas na empresa". Ou seja, os acionistas B... e C... pretendiam adquirir as ações detidas pelos acionistas E... e F..., como expressamente previsto na página 5 do relatório em Anexo 3:
Por sua vez, a entidade K... é uma especialista em prestação de serviços em processos de 'compra e venda de empresas, fusões, management buy-outs, operações de capitalização e de obtenção de recursos financeiros' (ver http://... /).
O contrato de prestação de serviços, celebrado em outubro de 20159 entre a K... e a A... (ver Anexo n. aponta para a 'elaboração de um plano de negócios, investimento e financiamentos com a equipa de gestão da Cheio", para 'realização de avaliação financeira da Cheio , sustentados na "elaboração de documento de suporte ao estudo efetuado", pelo qual cobraria 100.000,00 euros (ver ponto 5 dos termos do contrato em página 4 do Anexo n. para além de "acompanhamento e assessoria da empresa na procura e negociação de soluções de apoio financeiro, junto de entidades nacionais e internacionais, à execução do plano de investimentos supra referido", pelo qual cobraria 35.000,00 euros (ver ponto S dos termos do contrato em página 4 do Anexo Ti. conforme página 3 do Anexo 7.
Importa destacar que no ponto 7.4. dos termos do contrato (ver página 4 do Anexo 7). a K... se compromete a "atoar sempre em consonância com as necessidades e prioridades manifestadas pelos acionistas da A... ".
O trabalho efetuado pela K... encontra-se consubstanciado num relatório, datado de dezembro de 2015 (ver Anexo 81. separado em 3 capítulos principais, do qual constam:
• Uma apresentação da A..., com dados históricos onde se inclui a estrutura com os 4 acionistas;
• Um plano de crescimento e expansão, no qual já se prevê a reestruturação interna com a concentração da administração nos 2 acionistas B... e C...;
• Um plano de negócio, onde se perspetivam demonstrações financeiras previsionais para o período 2016-2020.
Ora, os serviços efetivamente prestados pela K... são claramente direcionados para a avaliação da A..., coincidentes temporalmente com os trabalhos da J..., e os quais, em conjunto, permitiram aos acionistas vendedores (B... e C...) e ao comprador H... alcançarem um justo valor para a compra e venda das participações sociais da A..., concretizada em março de 2016.
Para corroborar o acima afirmado, veja-se a notícia publicitada no sítio da K..., disponível em http://... (ver Anexo 9), na qual é descrita a operação de aconselhamento dos acionistas da A... na venda da maioria do capital da empresa ("K… has advised the shareholders of A… n on the sale of a majority stake in the company").
Na mesma notícia, o anterior acionista majoritário e ainda atual CEO da A..., B..., afirma que a K... teve um papel crucial na escolha do parceiro certo ("K... Internationalplayed a crucial role in finding the right partner").
Assim, torna-se óbvio que o papel da K... foi o aconselhamento dos acionistas vendedores das participações, os quais foram os verdadeiros beneficiários pelas mais-valias obtidas no negócio intermediado por tal entidade consultora O sujeito passivo A... é totalmente alheio a este negócio de compra e venda de ações, vendo apenas a sua estrutura acionista alterada
Quanto à sociedade de advogados L..., foi contratada para "a realização de uma auditoria documental (due diligence legal) à sociedade A... (...), tendo a mesma por âmbito a análise jurídica de documentos", conforme documento de novembro de 2015 em Anexo 10. pela qual cobrou a quantia de 15.000,00 euros.
Tratou-se de urna auditoria jurídica, com a natureza de "due diligence", logo direcionada para a deteção de riscos na sociedade alvo, de forma a auxiliar o comprador sobre as condições na tomada de uma decisão de investimento. O relatório de auditora jurídica emitido, em janeiro de 2016, pela sociedade de advogados é perentório quanto ao objetivo da mesma, ao afirmar que "foi elaborado no âmbito de um processo de aquisição de participações no capital social da A... SA" (conforme pág. 9 do relatório em Anexo 11), acrescentando que "teve como finalidade fornecer a informação necessária que permita sustentar uma decisão de adquirir ações representativas do capital social da sociedade" (conforme pág. 9 do relatório em Anexo 11).
A fatura emitida pela sociedade de advogados L... está datada de 30 de março de 2016, ou seja, duas semanas após a concretização da aquisição das ações pela H..., tendo aquele sociedade cobrado 5.000,00 euros pela elaboração dos respetivos contratos (ver fatura em Anexo 31. Por sua vez, a sociedade de advogados M... foi contratada para a "prestação de serviços jurídicos de apoio e auditoria contabilística e legal e regularização de todas as desconformidades formais eventualmente detetadas", conforme consta da proposta de 02 de março de 2016 em Anexo 12.
A faturação de tais serviços foi repartida por duas faturas, sendo uma relativa a "serviços jurídicos de apoio a due diligence" (fatura n.º 2016.00066 de 08 de março de 2016 no valor de 13.750,00 euros em Anexo 3) e outra referente a "serviços jurídicos regularização actas, títulos, livros e registos" (fatura n º 2016 00070 de 18 de março de 2016 no valor de 13,750,00 euros em Anexo 3).
Relativamente à fatura n.º 2016.00070 de 18 de março de 2016 emitida pela sociedade de advogados de M... (em Anexo 3). relativa a "serviços jurídicos regularização actas, títulos, livros e registos", no valor de 13.750,00 euros + IVA. considerar-se-á como sendo imputável ao sujeito passivo A..., Contudo, a fatura n.º 2016.00066 de 08 de março de 2016 no valor de 13.750,00 euros, respeitando a serviços de apoio a "due diligence" respeitará aos interesses dos acionistas envolvidos na operação de transmissão de partes sociais.
Já a entidade H... debitou uma "comissão de negociação no âmbito do investimento do Fundo N... ", a qual foi considerada no âmbito da auditoria de "due diligence" por parte dos responsáveis do sujeito passivo que averbaram tal apontamento na fatura (ver documento em Anexo 3V Ora, esta comissão de negociação, supostamente relacionada com o investimento do "Fundo N... "11, apenas teria fundamento se tivesse ocorrido alguma injeção de meios financeiros na A... por parte da H... ou do referido fundo, o que na verdade não aconteceu.
O "verdadeiro investimento" da H... foi, figuradamente, concretizado nos dois acionistas do sujeito passivo (B... e C...), uma vez que a operação se tratou de uma mera aquisição parcial de ações aos anteriores detentores do capital.
Este tipo de gasto a título de comissão não tem qualquer racionalidade de imputação ao sujeito passivo, na medida em que a participação adquirida pela H..., aos dois acionistas, apenas poderá potenciar a valorização da própria H... (Fundo), em função dos resultados da A... .
Assim, quanto aos serviços das empresas consultoras J... e K... e das sociedades de advogados, inseridos numa auditoria preventiva de "due diligence" e no apoio financeiro-jurídico ao processo de aquisição de ações, toma-se óbvio que se trata de despesas imputáveis ao comprador (H...), por ser o principal interessado nos resultados do exame à empresa, na qual pretendeu passar a deter uma posição acionista significativa, sendo que, algumas de tais despesas, serão também imputáveis aos vendedores das ações.
Aliás, os relatórios de "due diligence" são parte integrante, como anexo II, do contrato de compra e venda de ações, conforme consta da pág. 2 do contrato em Anexo 13. pelo que serviram para a concretização do negócio entre os acionistas.
Contudo, nenhum gasto daquela natureza poderá ser afeto ao sujeito passivo A..., na medida em que nem sequer é parte interveniente ou interessada no processo de compra e venda de ações ocorrido entre a H... e os dois acionistas referidos, sendo estes os verdadeiros interessados nos resultados da prestação de serviços daquelas entidades.
Quanto à "comissão de negociação no âmbito do investimento do Fundo N...” debitado pela H..., também não se antevê qualquer correlação com o sujeito passivo, na medida em que o investimento efetuado pela H..., enquanto sociedade gestora de tal fundo, não teve como destinatário ou beneficiário a H..., nem a A..., mas sim os acionistas B... e C... .
Assim, nos termos do artigo 23º do Código do IRC, importa que o sujeito passivo proceda ao acréscimo dos montantes de 115.256,02 euros e 125.103,87 euros ao campo 752 do quadro 07 das declarações de rendimentos modelo 22 de IRC dos períodos de 2015 e 2016, respetivamente.
Z) As entidades K... (2015), J... [J...] (2015), L... (2016) e H... (2016) emitiram as declarações que constam dos documentos n.ºs 23, 24.25, 26 e 27 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
AA) Nos exercícios de 2016 e 2017, a Requerente registou o crescimento de resultados que consta do documento n.º 29 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido:
BB) A realização destes trabalhos foi necessária para a tomada de uma decisão estratégica de expansão e eventual internacionalização e para conhecer o estado da empresa aquando do processo de saída de dos “acionistas-administradores” E... e F..., permitindo-lhe identificar e resolver problemas e para a obtenção de financiamento bancário (depoimentos das testemunhas O..., P... e Q...);
CC) A Autoridade Tributária e Aduaneira efetuou uma correcção relativa a gastos com comissões bancárias “escrow account”, com os seguintes fundamentos que constam do ponto III.1.1.6 do Relatório da Inspecção Tributária:
III.1.1.6. Gastos não aceites - comissões bancárias "escrow account"
Nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC, para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC. Ou seja, entende-se que terá de existir urna relação causal entre os gastos e perdas e os rendimentos da entidade sujeitos a imposto, para além da necessária correlação com o escopo social da sociedade.
Ora, no âmbito da operação de venda de ações à H... pelos acionistas B... e C..., verificou-se a constituição, na mesma data da operação, de uma conta de "depósito escrow" no R..., conhecida por "escrow account" e que representa uma conta de garantia, conforme contrato em Anexo 13.
Este instrumento de "escrow acount" é frequentemente utilizado em operações de fusões ou aquisições, tratando-se de um mecanismo de segurança para as partes envolvidas no negócio.
Conforme referido por CARLOS NETO [a pág. 202 da Revista Jurídica Luso-Brasileira, Ano 3 (2017), n.º 4], "trata-se de uma conta de depósito em garantia (...) tendo como objetivo essencial a mitigação de (...) ameaças", acrescentando que se pretende "minimizar a possibilidade de que o comprador seja compelido a responder por passivos oriundos de factos anteriores ao fechamento do negócio e que são (...) de responsabilidade exclusiva do vendedor”.
Para MORAIS ANTUNES (a pág. 165 de "Do contrato de Depósito Escrow", 2007, Almedina), o contrato de depósito escrow é uma "convenção pela qual as partes de um contrato bilateral ou sinalagmático acordam em confiar a um terceiro, designadamente um banco, a guarda de bens móveis (tais como dinheiro, valores mobiliários, títulos de crédito e/ou documentos), ficando este irrevogavelmente instruído sobre o destino a dar aos referidos bens, que - em função do modo como vier a evoluir a relação jurídica emergente daquele contrato - poderá passar pela sua restituição ao depositante ou, eventualmente, pela sua entrega ao beneficiário do depósito".
Segundo SÉRGIO BROTEL [citado a pág. 203 por CARLOS NETO em Revista Jurídica Luso-Brasileira, Ano 3 (2017), n.º 4], as vantagens na utilização da "escrow account" são tanto para o comprador, como para o vendedor. Para tal autor, "o comprador não corre o risco de, após ter promovido o pagamento da integralidade do preço, ser obrigado a investigar a existência de bens executáveis do vendedor (caso existam) para receber indemnização referente a contingências da sociedade-alvo que se tomaram dividas ou mesmo passivos não constatados na due diligence e não revelados pelo vendedor".
Por sua vez, "o vendedor fica livre do risco de solvência do comprador, porquanto tem a segurança de que, uma vez transcorrido o prazo convencionado e verificadas as condições de levantamento dos valores depositados, caberá ao banco disponibilizar os valores devidos".
Desta forma, a operação de compra e venda de ações, entre os acionistas B... e C... e a sociedade H..., descrita no ponto III.1.1.5, a pág. 28, envolveu a constituição de uma "escrow account", passando pela abertura de três contas, em nome dos vendedores B... e C..., e da compradora H... (N... Fundo Capital Risco), conforme print parcial de documento bancário emitido pelo R... (ver Anexo 14), relativo a despesas de constituição e comissões de manutenção:
A própria cláusula 6.8 do contrato de compra e venda das ações (ver pág. 11 do contrato em Anexo 13), celebrado entre os acionistas B... e C... e a sociedade H..., prevê a constituição de um contrato de escrow com o R..., no qual são depositadas as ações, com instruções para entregar as mesmas nas condições previstas nas cláusulas 6.4 a 6.7 (ver págs. 10 e 11 do contrato em Anexo 13). relativas a indemnizações por danos e responsabilidades das partes.
A análise do "contrato de depósito escrow" (em Anexo 13) evidencia que o mesmo foi celebrado pelos atuais três acionistas da A... acima identificados.
Conforme resulta dos pontos 2 a 4 da pág. 3 do contrato em Anexo 13. os acionistas celebraram no dia 18 de março de 2016 um contrato de compra e venda de ações e, paralelamente, na mesma data subscreveram o "contrato de depósito escrow" O ponto 3 é esclarecedor quando define que os acionistas se obrigam "a depositar em escrow todas e quaisquer ações que detenham ou possam vir a deter", no âmbito do contrato de compra e venda das ações ("acordo de investimento"), e enquanto vigorar o "acordo parassocial" (ver ponto 4):
Neste sentido, foram abertas três "contas escrow" junto do R... em nome "do Fundo e de B... e de C..., que consistem em contas de títulos associadas às respetivas contas de depósito à ordem tituladas, respetivamente, em nome do Fundo, de B... e de C..., e que apenas poderão ser movimentadas nos termos (do) contrato" (ver ponto 1.1 a pág. 4 do contrato em Anexo 13), e nas quais foram depositadas as respetivas ações de cada um dos titulares (ver ponto 1.2 a pág. 5 do contrato em Anexo 13).
O ponto 1.3 a pág. 5 do contrato em Anexo 13 é clarificador quanto à finalidade da constituição desta "escrow account", tal como se vislumbra pelo seguinte clausulado:
Todas as situações elencadas consubstanciam o "depósito das ações" na referida conta como um "depósito fiduciário", que permite a salvaguarda dos interesses das partes envolvidas no "acordo de investimento" e no "acordo parassocial", perante o clausulado neles estabelecido, para além do estabelecimento prévio de execução de direitos e obrigações, típicas cláusulas de acordos de acionistas (lock-up, opção de venda, tag-along, ratchet, drag-along") em função de condições pré-estabelecidas entre os três acionistas.
O "contrato escrow" prevê, inclusive, no ponto i) da cláusula 1.3 (ver imagem acima), a "execução do direito de aquisição do Fundo como meio alternativo de cumprimento da obrigação de indemnização por Dano, tal como previsto nas cláusulas 6.4 e 7 13 do Acordo de Investimento"". Ora, esta "indemnização por Dano" corresponde à obrigação dos acionistas vendedores (B... e C...) serem responsáveis pelo igual montante dos danos Incorridos pela sociedade A..., "por forma a que o segundo contratante (Fundo) fique na mesma posição em que estaria se o Dano não tivesse ocorrido" (ver cláusula 63 do contrato de compra e venda de ações em Anexo 13). prevendo, ainda, em alternativa ao pagamento da indemnização pelos primeiros contraentes (B... e C...), "a transmissão, pelo preço de € 1,00 (um euro), de ações representativas do capital social da sociedade (A...) de que sejam titulares, em número suficiente para perfazer o montante total do dano em divida" (ver cláusula 6.4 do contrato de compra e venda de ações em Anexo 13). De igual modo. esta salvaguarda aplica-se aos casos previstos nas cláusulas 7.7 a 7.12 (reclamações de terceiros -processo judicial, arbitral, fiscal, administrativo ou outro) do contrato de compra e venda de ações (ver Anexo 11).
Acresce que, conforme ponto 2.6 da pág 10 do "contrato escrow' em Anexo 13, está perfeitamente explicito de que "sempre que haja um pagamento de preço devido a alguma das partes pelas ações nos termos das notificações anexos ao Contrato, serão as mesmas realizadas para as seguintes contas bancárias, consoante o que seja aplicável":
No meio de todo este clausulado do "contrato de depósito escrow" (em Anexo 13], o sujeito passivo A... (designado no contrato por 'sociedade") apenas surge como parte envolvida na parte relativa às "comissões e despesas" (ver pontos 5.1 e 5.2 da pág 12 do contrato em Anexo 13), na medida em que 'pela prestação de serviços de depositário (...) a sociedade pagará, semestralmente, ao Banco, por cada Conta Escrow, o montante de EUR 1.000.00 (...)', para além de, "pela organização e montagem da operação, uma comissão de EUR 1350,00" e "na data em que cessar este contrato, uma comissão de cessação no montante de EUR 750,00 (...)".
Por outro lado, “a sociedade obriga-se ainda a suportar e a reembolsar o Banco de quaisquer despesas, taxas e impostos em que justificadamente vier a incorrer e que forem devidos em virtude da execução do presente contrato ou dos atos praticados na execução do mesmo" (ver ponto 5.2. da pág. 12 do contrato em Anexo 13).
De tal modo, a entidade bancária R... emitiu, ao longo do período de 2016, duas faturas à ordem da A..., as quais foram contabilizados como gastos de tal período na contabilidade do sujeito passivo, conforme lançamentos contabillsticos18 abaixo (ver documentos em Anexo 14):
O gasto de 4.350.00 euros respeita à comissão "pela organização e montagem da operação (...) EUR 1.350.00" e "semestralmente (...) por cada Conta Escrow, o montante de EUR 1.000,00 (...)". Já o montante de 3 000,00 euros corresponde à comissão de manutenção semestral das 3 contas ["semestralmente (...) por cada Conta Escrow, o montante de EUR 1.000,00 (...)"].
Ora, uma vez que a constituição da escrow account pretende apenas salvaguardar os riscos e garantias das partes envolvidas no contrato de compra e venda de ações ao qual a A... é totalmente alheia, não se verifica qualquer possibilidade de aceitação fiscal de tais gastos na esfera do sujeito passivo.
Assim, nos termos do artigo 23º do Código do IRC, importa que o sujeito passivo proceda ao acréscimo do montante de 7.350,00 euros ao campo 752 do quadro 07 das declarações de rendimentos modelo 22 de IRC do período de 2016.
DD) O contrato de “escrow” que foi celebrado pela Requerente, pelos respetivos acionistas e o R... consistiu num “escrow de acções” (documento n.º 30 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
EE) O contrato de “escrow” foi celebrado por ocasião da entrada de novos acionistas no capital da Requerente (depoimentos das testemunhas S... e Q...);
FF) O propósito do contrato de “escrow”, assumido pela gestão da Requerente e seus acionistas, passou por salvaguardar os interesses da sociedade e garantir a estabilidade das operações e a geração de proveitos futures, caso viesse a ocorrer algum conflito entre acionistas, através da manutenção da estabilidade do seu governo (documento n.º 20 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e depoimentos das testemunhas S... e Q...);
GG) O contrato de “escrow” celebrado pela Requerente, seus acionistas e R..., consistiu num mecanismo de prevenção de disputas acionistas, por forma a evitar bloqueios estratégicos a sua atividade que possam prejudicar o seu crescimento (Documento n.º 30 e depoimentos das testemunhas S... e Q...);
HH) A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma correcção ao lucro tributável de 2014 no montante de € 55.159,31 relativa a depreciações não aceites , com os seguintes fundamentos:
III.1.1.8. Gastos não aceites - depreciações não aceites
Nos termos da alínea a) da n.º 1 do artigo 29.º do Código do IRC, são aceites como gastos as depreciações e amortizações de elementos do ativo sujeitos a deperecimento, considerando-se como tais: a) os ativos fixos tangíveis e os ativos intangíveis.
Por sua vez, o n º 4 do artigo 29.º do Código do IRC, estipula que os elementos do ativo só se consideram sujeitos a deperecimento depois de entrarem em funcionamento ou utilização.
Ora, no período de 2014, a A... procedeu à depreciação de um ativo correspondente a uma máquina "... 2000", com custo de construção de 441.274,46 euros, montada pelo próprio sujeito passivo para sua utilização interna, à qual atribuiu o código "2280 Máquinas e Ferramentas Ligeiras" da tabela do Decreto-Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, conforme print parcial abaixo:
A referida máquina “...2000” foi incluída num projeto de investimento QREN SI INOVAÇÃO (projeto n.º...), direcionado para "expansão e crescimento para novas atividades nomeadamente ao nível do desenvolvimento in house de novos processos (fabrico), alavancagem dos processos da inovação e desenvolvimento de novos produtos inovadores para o mercado externo", pretendendo "desenvolver um novo produto inovador a nível mundial aplicando um sistema BTA a máquinas ferramenta de furacão profunda em 5 eixos", conforme consta do processo de candidatura (Aviso 03/SI/2012).
A calendarização do investimento, constante do processo de candidatura, remetia para o início em 01 de maio de 2012 e fim em 30 de abril de 2014, prevendo um Investimento total de 818.786,00 euros, dos quais 665.861,00 euros seriam elegíveis, conforme print parcial seguinte e cláusula primeira do contrato celebrado com o IAPMEI em Anexo 20:
O custo de construção da referida máquina "... 2000", registado pelo sujeito passivo, ascende a 441.274,46 euros, os quais decorrem da capitalização de um conjunto de componentes incluídos na montagem de tal ativo, os quais foram sendo registados, desde 2013, nas contas de Investimento em Curso (SNC 4533113 e SNC 4533213), para além de um componente registado na conta SNC 437111322, conforme quadro resumo seguinte:
Ora, a análise do extraio de movimentos de 2014 relativo às contas SNC 4533113 e SNC 4533213 evidencia que a capitalização de gastos para a formação do custo de construção da referida máquina cessou em abril de 2014, dando cumprimento ao prazo de 24 meses fixado no processo de candidatura, tendo sido registados em maio de 2014 alguns movimentos de meras regularizações, conforme abaixo:
A transferência de Investimentos em Curso (SNC 453) para ativo firme (conta SNC 433113) ocorre em junho de 2014, mediante o lançamento n.º ...0005 do diário de operações diversas, uma vez que o contrato de apoio celebrado com o IAPMEI (contrato n.º 2012/27174 em Anexo 20) obrigava a "contabilisticamente relevar e individualizar todas as despesas afetas a este investimento", conforme mensagem eletrónica de responsável daquele instituto:
A mesma responsável do IAPMEI pressionava a A..., em 31 de julho de 2014, com o desencadeamento de "trâmites de resolução contratual por incumprimento do prazo para entrega do PTRF", caso não fosse cumprido um prazo adicional para certificação das despesas, apresentadas em 08 de julho de 2014, por um Revisor Oficial de Contas:
Por outro lado, o IAPMEI estipula, ainda, que "aquando da verificação física às instalações da empresa, a máquina deverá estar operacional e ser parte integrante do processo produtivo da empresa", conforme mensagem eletrónica acima. Ora, a referida verificação física só ocorreu em 16 de abril de 2015, conforme Decisão de Certificação datada de 16 de junho de 2015 (ver imagem abaixo) e na qual é indicada como "data da última fatura imputável ao projeto (30-04-2014) (ver pág. 1 do Anexo 21).
O facto da verificação física efetuada pelo IAPMEI só ter ocorrido em 16 de abril de 2015 (conforme página 1 do Anexo 21) não será alheia à circunstância da referida máquina só ter sido concluída pouco antes daquela data, conforme se demonstra em seguida.
Segundo o Relatório de Gestão emitido pelo Conselho de Administração, relativo ao período de 2014 (ver Anexo 221. a empresa encontrava-se com condicionalismos em termos de espaço, pelo que decidiu 'arrendar mais um pavilhão com cerca de 300 m2, localizado na freguesia da ..., concelho de ... ", o qual, para além de "colmatar as necessidades de armazenamento ( ) este espaço servirá lambem para instalar a máquina que se encontra em fase de conclusão de montagem e que foi fabricada com o apoio do IAPMEI (sublinhado nosso), conforme páginas 5 e 6 do referido Relatório cujo print parcial se junta abaixo:
Ora, as instalações em causa foram arrendadas pela empresa T... LDA, NIF ..., a partir de março de 2015, conforme consta do primeiro recibo de renda emitido e rececionado na A... no dia 09 de março de 2015 (ver imagem abaixo):
Em resposta a notificação da AT, o sujeito passivo insistiu em afirmar que "a máquina ... 2000 - Centro de ensaios ficou concluída a 30/04/2014" (ver ponto 4 a página 2 do Anexo 19).
Contudo, tal afirmação não corresponde à verdade. Neste sentido, bastará analisar a fatura n.º 58/A emitida pela U... em 29 de abril de 2014, no valor de 86,750,00 euros, relativa a "fornecimento de quadros elétricos de comando e serviço de automação para controlo dos movimentos mecânicos da máquina -adiantamento" (ver Anexo 23). O valor desta fatura foi integralmente capitalizado como parte Integrante do custo inicial do ativo fixo tangível em causa.
Após notificação para apresentação de elementos relativos a tal fatura, o sujeito passivo remeteu proposta de orçamento do fornecedor, datada de 27 de fevereiro de 2014, na qual é indicado um prazo de entrega de 6 a 7 meses após esquema elétrico aprovado" (ver Anexo 24), o que impossibilita que a máquina estivesse concluída em 30 de abril de 2014, conforme tentaram ludibriar os responsáveis do sujeito passivo em resposta à notificação da AT.
Acresce que a encomenda ao fornecedor apenas foi emitida pela A... em 15 de abril de 2014 (ver Anexo 25), o que tendo em conta o prazo de entrega de 6 a 7 meses, apontava para o final do ano de 2014, sem que isso significasse que, ainda assim, estivesse concluída montagem de tal equipamento, mas tão só o fornecimento dos quadros elétricos e serviços de automação.
Esta conclusão é ainda reforçada pelo descrito na pág. 18 do Relatório e Contas de 2014 (ver Anexo 22), onde se refere que "o principal investimento realizado no exercido de 2014 diz respeito à aquisição de alguns componentes que serão incorporados no equipamento que a A... está a desenvolver para uso próprio. Deste modo, fica claro que existiam componentes no final de 2014 que, apesar de já terem sido adquiridos pelo sujeito passiva, ainda nem sequer estavam incorporados no “centro de ensaios".
Assim, conclui-se que a máquina "I...2000", capitalizada pelo sujeito passivo como ativo firme em junho de 2014 e mensurado por um valor de 441.274,46 euros, que respeitam a gastos até 30 de abril de 2014, não se encontrava concluída naquele mês, nem sequer a 31 de dezembro de 2014, conforme atestam as divulgações do próprio Relatório de Gestão subscrito pelo Conselho de Administração.
Em adição ao acima referido, importa realçar as declarações, tomadas em 02 de maio de 2018, de F..., NIF..., na qualidade de administrador à data da sociedade A..., o qual atestou, "sobre a verificação física efetuada pelo IAPMEI relativamente à máquina "Centro de Ensaios", que "acompanhou tal procedimento juntamente com o técnico daquele instituto e que o mesmo ocorreu em 16 de abril de 2015 ainda nas instalações em ..., antes da sua transferência para ..., mas que apenas nestas instalações arrendadas é que ficou operacional para utilização" (ver termos de declarações em Anexo 26).
Assim, apesar de acabado de montar durante os primeiros meses de 2015, para efeitos de verificação física no dia 16 de abril de 2015, o "centro de ensaios” apenas ficou instalado em definitivo e operacional para utilização já nas instalações arrendadas à empresa T... .
Face ao exposto, ter-se-á que concluir, que a empresa cessou antecipadamente a capitalização de gastos para a formação do custo de construção da máquina, para cumprimento do prazo (30 de abril de 2014) imposto pelo IAPMEI quanto à individualização das despesas abrangidas pelo projeto de investimento, tendo incorrido em gastos adicionais até março/abril de 2015 para completar a aquisição de componentes e a montagem da máquina durante aqueles meses, mas os quais a AT não consegue identificar para efeitos de quantificação, apesar da análise efetuada aos centros de custos e dos pedidos de colaboração efetuados aos responsáveis do sujeito passivo.
Assim, uma vez que os elementos do ativo só se consideram sujeitos a deperecimento, para efeitos ficais, depois de entrarem em funcionamento ou utilização (n.º 4 do artigo 29.º do Código do IRC), comprova-se que a depreciação praticada em 2014, no montante de 88.254,89 euros (441.274,46 euros x 20%), não poderá ser aceite fiscalmente.
Assim, nos termos do artigo 29º do Código do IRC, importa que o sujeito passivo proceda ao acréscimo do montante de 88.254,89 euros ao campo 719 do quadro 07 da declaração de rendimentos modelo 22 de IRC do período de 2014.
II) A máquina “... 2000” foi construída pela Requerente ao abrigo de um contrato de apoio celebrado com o IAPMEI, tendo a Requerente solicitado a este o pagamento final do apoio (documentos n.ºs 37 e 38 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
JJ) O contrato de apoio celebrado com o IAPMEI previa que os custos de construção da máquina deveriam ser certificados por um Revisor Oficial de Contas, o que foi exigido pelo IAPMEI (Documento n.º 37);
KK) A Requerente solicitou a um Revisor Oficial de Contas Independente a certificação da conclusão da máquina, que, em 2014, procedeu à verificação presencial desta, atestando que a mesma se encontrava concluída e em funcionamento (documentos n.ºs 39 e 40 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos e depoimento da testemunha GG...);
LL) O IAPMEI concluiu o procedimento de apoio, certificando a elegibilidade do investimento e a existência de todos os documentos necessários (documento n.º 41 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e depoimento da testemunha HH...);
MM) A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma correcção relativa a depreciações excessivas, nos montantes de € 6.183,22 (2014), € 6.183,22 (2015) e € 6.183,22 (2016), com os seguintes fundamentos:
III.1.1.9. Gastos não aceites - depreciações excessivas
Nos termos da alínea a) do n,º 1 do artigo 29.º do Código do IRC, são aceites como gastos as depreciações e amortizações de elementos do ativo sujeitos a deperecimento, considerando-se como tais: a) os ativos fixos tangíveis e os ativos intangíveis.
Segundo o n.º 1 do artigo 30.º do Código do IRC, o cálculo das depreciações e amortizações dos ativos referidos no artigo anterior faz-se, em regra, pelo método da linha reta, atendendo ao seu período de vida útil.
Por sua vez, o n,º 1 do artigo 31.º do Código do IRC estabelece que, no método da linha reta, a quota anual de depreciação ou amortização que pode ser aceite como gasto do período de tributação determina-se aplicando as taxas de depreciação ou amortização definidas no decreto regulamentar que estabelece o respetivo regime, acrescentando o n.º 5 que o período de vida útil do elemento do ativo é o que se deduz das taxas de depreciação ou amortização referidas nos n.ºs 1 e 2.
Ora, no período de 2014, o sujeito passivo procedeu à depreciação contabilística de dois ativos, nomeadamente, a "máquina ... 2000" e um "armazém automático ...", aplicando-lhes um período de vida útil de 5 anos, a que corresponde uma taxa de depreciação de 20%.
As taxas de depreciação aplicadas decorrem das previstas no Decreto-Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, para os códigos eleitos peio sujeito passivo:
• 2200 Máquinas, aparelhos e ferramentas - Aparelhagem e máquinas eletrónicas;
• 2280 Máquinas, aparelhos e ferramentas - Máquinas-ferramentas ligeiras.
Ora, o código 2280 (máquina ligeira) foi atribuído à "máquina ... 2000". que corresponde a uma máquina CNC de furacão profunda e fresagem (similar à da imagem abaixo), com um custo de construção incorrida pelo próprio sujeito passivo de 441.274.46 euros e um peso aproximado de 28 toneladas (ver catálogo em Anexo 2), e que não pode ser considerada como uma máquina ligeira, mas sim como uma máquina pesada (código 2285):
Por sua vez, o código 2200 (aparelhagem e máquinas eletrónicas) foi atribuído ao "armazém automático ..." (... ...250 HSD.K que corresponde a um armazém flexível vertical com um sistema automático de prateleiras rotativas, conforme descritivo da fatura e imagens abaixo:
No caso do "armazém automático", o sujeito passivo atribuiu-lhe o código 2200 pertencente ao "Grupo 3 -Máquinas, aparelhos e ferramentas" do Decreto-Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, no qual se inserem as máquinas operativas. Ora. O “armazém automático" configura-se como um ativo não operacional, relacionado com atividades secundárias, sendo enquadrável no "Grupo 2 - Instalações", mais propriamente no código 2155 (Instalações de armazenagem - metálicas), não podendo ser qualificado no grupo das "máquinas, aparelhos e ferramentas''.
De forma a fundamentar o enquadramento de tal ativo como uma instalação de armazenagem, veja-se o descritivo do próprio fabricante disponível em https://... :
Face ao exposto, conclui-se que o sujeito passivo praticou depreciações com base em taxas de depreciação superiores às previstas nos códigos adequados, contemplados pelo Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, e as quais seriam:
• 2155 Instalações de armazenagem - Metálicas: 8,33%;
• 2285 Máquinas, aparelhos e ferramentas - Máquinas-ferramentas pesadas: 12,5%.
Assim, constata-se um excesso de depreciações anual nos montantes de 33.095.58 euros e 6.183,22 euros, relativamente à "máquina ... 2000" e ao "armazém automático ...", respetivamente. conforme quadro seguinte:
Ora, conforme se verifica pelos mapas de depreciações em Anexo 27. o sujeito passivo utilizou as taxas de 20% ao longo dos períodos de 2014 e 2016 de forma consistente.
Atendendo, ainda, a que no ponto III.1.1.8, a página 43, já se desconsiderou integralmente a depreciação praticada em 2014 sobre a "máquina ... 2000", importará, agora, apenas acrescer o excesso de depreciações praticadas nos períodos de 2015 e 2016. Quanto ao "armazém automático ...", o excesso de depreciações praticadas a acrescer respeitará aos períodos de 2014, 2015 e 2016.
Assim, nos termos dos artigos 29.º a 31.º do Código do IRC, importa que o sujeito passivo proceda ao acréscimo do montante de 6.183,22 euros, 39.278,80 euros (6.183,22 euros + 33.095,58 euros) e 39.278,80 euros (6.183,22 euros + 33.095,58 euros) ao campo 719 do quadro 07 das declarações de rendimentos modelo 22 de IRC dos períodos de 2014, 2015 e 2016, respetivamente.
NN) A máquina ... consiste num sistema elétrico de armazenagem e de gestão de espaço automático, flexível e vertical, que funciona mediante comando eletrónico e é qualificado pelo fabricante como «sistema de armazenamento automatizado» (documentos n.ºs 44, 45 e 46 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
OO) O ... procede, mediante comando eletrónico e automatizado, ao arquivo de equipamentos e exige formação especifica para poder ser manuseado (depoimento da testemunha V...);
PP) O ... é uma máquina apta a desempenhar múltiplas funções, entre as quais, funções de armazenamento, funções de gestão de espaço e funções de gestão de stock (depoimento da testemunha V...);
QQ) O “...” teve um custo de aproximadamente € 53.000,00 e despesas de manutenção anuais de cerca de € 2.000,00 (documentos n.ºs 46 e 47 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
RR) A proposta de orçamento para montagem do ..., inclui um “contrato de manutenção e formação de utilizadores” (documento n.º 46 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e depoimentos das testemunhas V..., W... e X...);
SS) A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou correcções relativas a deduções indevidas à colecta (RFAI), nos montantes de € 75.170,30 em 2014 e de € 23.871,54 em 2015, com os fundamentos que constam do ponto III.2.1. do Relatório da Inspecção Tributária:
III. 1.2.1. Deduções à coleta indevidas - benefícios fiscais (RFAI)
O Código Fiscal do Investimento (CFI), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, estabelece vários benefícios fiscais, entre os quais o Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI - artigos 22.º a 26.º do CFI).
Segundo o n.º 2 do artigo 1.º do CFI, o RFAI constitui regime de auxílio com finalidade regional aprovado nos termos do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014, doravante designado Regulamento, que declara certas categorias de auxilio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado, publicado no Jornal Oficial da União Europeia, n.º L 187, de 26 de junho de 2014.
Conforme § 31 do preâmbulo do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014, os auxílios com finalidade regional destinam-se a contribuir para o desenvolvimento das regiões mais desfavorecidas, apoiando o investimento e a criação de emprego num contexto sustentável.
Ora, segundo o § 41 do artigo 2.º do Regulamento, os "auxílios regionais ao investimento" são os auxílios com finalidade regional concedidos para:
• Um investimento inicial ou
• Um investimento inicial a favor de uma nova atividade económica.
O § 49 do artigo 2.º do Regulamento considera como “investimento inicial":
a) Um investimento em ativos corpóreos e incorpóreos relacionado com:
• A criação de um novo estabelecimento;
• Aumento da capacidade de um estabelecimento existente;
• Diversificação da produção de um estabelecimento para produtos não produzidos anteriormente no estabelecimento; ou
• Mudança fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente; ou
b) Uma aquisição de ativos pertencentes a um estabelecimento que tenha fechado ou teria fechado se não tivesse sido adquirido, desde que seja adquirido por um investidor não vinculado ao vendedor e exclua a mera aquisição das ações de uma empresa.
Por sua vez, o § 51 do artigo 2.º do Regulamento estabelece "investimento inicial a favor de uma nova atividade económica" como:
a) Um investimento em ativos corpóreos e incorpóreos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, ou com a diversificação da atividade de um estabelecimento, na condição de a nova atividade não ser a mesma ou uma atividade semelhante à atividade anteriormente exercida no estabelecimento;
b) A aquisição dos ativos pertencentes a um estabelecimento que tenha fechado ou teria fechado se não tivesse sido adquirido, desde que seja adquirido por um investidor não vinculado ao vendedor, na condição de a nova atividade a efetuar com os ativos adquiridos não ser a mesma atividade ou uma atividade semelhante à anteriormente exercida no estabelecimento antes da aquisição;
Em termos de legislação nacional, importa ainda referir a Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, que veio regulamentar alguns aspetos do RFAI, indo de encontro às regras decorrentes da legislação europeia em matéria de auxílios estatais, nomeadamente do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014, também designado por Regulamento Geral de Isenção por Categoria (RGIC).
Segundo a alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º da Portaria n º 297/2015, de 21 de setembro, os benefícios fiscais previstos no artigo 23.º do Código Fiscal do Investimento (RFAI) apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do § 49 do artigo 2.º do RGIC, considerando-se como tal os investimentos relacionados com:
• A criação de um novo estabelecimento;
• O aumento da capacidade de um estabelecimento já existente;
• A diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento; ou
• Uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.
Ora, no período de 2014, o sujeito passivo procedeu à dedução à coleta de benefício fiscal associado ao RFAI. A análise das despesas consideradas elegíveis pelo sujeito passivo como investimento relevante, em 2014, ascenderam a 396.167,36 euros, conforme print abaixo da listagem constante do processo de documentação fiscal:
Assim, em 2014, nos termos do artigo 23.º do CFI, o sujeito passivo considerou uma dotação do período no montante de 99.041,84 euros (396.167,36 euros x 25%), tendo deduzido à coleta apenas um montante de 75.170,30 euros, transitando para o período seguinte (2015) a quantia de 23.871,54 euros, conforme quadro 10 da declaração de rendimentos modelo 22 de IRC de 2014 e campo 074 do respetivo Anexo D:
Os investimentos considerados pelo sujeito passivo resumem-se aos seguintes:
De forma a aferir a elegibilidade do investimento para efeitos do RFAI, importa proceder ao enquadramento de tais investimentos no âmbito do Regulamento e num dos pontos da alínea a) do § 49 do artigo 2.º do RGIC, nomeadamente:
i A criação de um novo estabelecimento;
ii. O aumento da capacidade de um estabelecimento já existente;
iii. A diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento; ou
iv. Uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.
O primado dos auxílios com finalidade regional, regulamentados pelo RGIC prende-se com o desenvolvimento das regiões mais desfavorecidas, apoiando o investimento e a criação de emprego, conforme já referido, considerando que esse objetivo é alcançável através de auxílios estatais que potenciem o investimento que crie, aumente ou altere fundamentalmente a capacidade produtiva das entidades subvencionadas.
Na verdade, todos os pontos da alínea a) do § 49 do artigo 2.º do RGIC estão direcionados para a potenciação da capacidade de produção de um estabelecimento, na media em que obriga a que os investimentos se relacionem com: i) um novo estabelecimento; ii) aumento de capacidade; iii) produção de novos produtos ou Iv) alteração fundamental do processo de produção.
Ora, durante o procedimento inspetivo, procedeu-se à análise e verificação física da Investimento que foi considerado elegível pela A... para efeitos de RFAI, tendo-se concluído que não se enquadra no espírito do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014, conforme se sustentará em seguida.
• Máquina "... 2000" (centro de ensaios) - 441.274,46 euros
Nos períodos de 2013 e 2014, o sujeito passivo procedeu à aquisição de vários componentes para proceder à montagem de uma máquina “... 2000”, idêntica àquelas que vende aos seus clientes, para sua utilização interna, tendo procedido à capitalização de um conjunto de gastos, conforme já descrito no ponto III.1.1.8, a página 43.
O custo de construção da referida máquina "... 2000", registado pelo sujeito passivo, ascende a 441.274,46 euros, os quais decorrem da capitalização de um conjunto de componentes Incluídos na montagem de tal ativo, os quais foram sendo registados, desde 2013, nas contas de Investimento em Curso (SNC 4533113 e SNC 4533213), para além de um componente registado na conta SNC 437111334, conforme quadro resumo seguinte:
A referida máquina "... 2000" encontra-se, nesta data, nas instalações atuais da A..., localizada ao fundo do lado direito do pavilhão, enquanto a zona de montagem das máquinas para venda aos clientes se situa ao longo do lado esquerdo do pavilhão, conforme imagem abaixo:
Conforme já referido no ponto III.1.1.8, a página 43, a referida máquina foi montada, pela primeira vez, apenas em 2015, conforme se demonstrou no referido ponto. Posteriormente, com a inauguração das novas e atuais instalações, foi ali reinstalada.
Ora, o referido ativo da A... trata-se, afinal, de uma máquina comummente designada pelos funcionários e responsáveis da empresa como "training center" ou "centro de ensaios", porque efetivamente, não se destina à produção, mas sim:
• A investigação e desenvolvimento de novos processos de engenharia e eletrónica para os modelos a fabricar, com a realização de testes que permitem a melhoria continua do produto;
• A demonstração aos potenciais clientes das funcionalidades das máquinas montadas pela A..., os quais podem inclusivamente simular a utilização da máquina para os fins específicos por eles pretendidos, possível pela ligação a software CAD/CAM;
• A formação dos funcionários das empresas clientes, os quais são instruídos por um técnico da A... responsável pela formação.
Afinal, a máquina "... 2000" funcionou, no pavilhão arrendado na ..., e continua a funcionar, nas atuais instalações, como um protótipo permanente, utilizado para investigação, desenvolvimento, testes, demonstrações, simulações e formação.
Conforme se apurou junto dos responsáveis do sujeito passivo e se verificou fisicamente, tal ativo nunca esteve afeto à área operacional da A..., a qual se resume à assemblagem de componentes adquiridos a terceiras, uma vez que nem sequer produz componentes a integrar nas máquinas.
Face ao exposto, a construção da referida máquina para utilização interna não potenciou a capacidade de produção do sujeito passivo, conforme impõe o disposto nos §§ 41 e 49 do artigo 2.º do RGIC.
Face à utilização efetiva dada pela empresa ao ativo em causa, poderia eventualmente, ler sido ponderado pelo sujeito passivo o enquadramento no SIFIDE (Sistema de incentivos fiscais em investigação e desenvolvimento empresarial), previsto nos artigos 35.º a 42.º do CFI, e o qual contempla como aplicações relevantes, entre outras, "aquisições de ativos fixos tangíveis (...) desde que criados ou adquiridos em estado novo e na proporção da sua afetação à realização de atividades de investigação e desenvolvimento" (alínea a) do n.º 1 do artigo 37.º do CFI), dependente de reconhecimento da Comissão Certificadora.
O próprio Relatório e Contas de 2014 (ver pág. 6 do Anexo 22) é perentório ao afirmar que tal máquina servirá para:
• "dar apoio na área de Investigação e Desenvolvimento, permitindo realizar testes e desenvolvimentos de novos processos e sistemas que poderão posteriormente ser incorporados nas nossas máquinas",
• "criar melhores condições de formação para os colaboradores dos nossos clientes, que podem desta forma ter um primeiro contato com este tipo de equipamento, antes mesmo de lhe ser fornecido";
• "fazer com que o arranque da máquina nas instalações do cliente seja mais fácil para o operador, permitindo assim que ao cliente começar a rentabilizar o investimento logo após a sua instalação".
E apesar do mesmo Relatório e Contas de 2014 referir que a máquina "... 2000" ("centro de ensaios") "permitirá uma maior integração do processo produtivo das máquinas A...", a qual se via "forçada a subcontratar um grande parte destes serviços, ficando por isso com algumas limitações, quer em termos de prazo de entrega, quer em termos de controlo do qualidade dos componentes encomendados", na verdade, o referido equipamento nunca foi potenciado para executar maquinações de componentes a integrar nas máquinas montadas pela A.... E mesmo que o tenha feito, de forma residual ou pontual, tal não significaria, per s, um aumento da capacidade do estabelecimento, conforme é exigido peias disposições legais atrás referidas.
Aliás, durante o período de montagem do "centro de ensaios", finalizado nos primeiros meses de 2015, ainda nas instalações sitas em ... verifica-se sim uma redução da capacidade de produção do sujeito passivo, uma vez que implicou uma diminuição da área disponível do pavilhão em causa. No espaço físico onde, antes do início da assemblagem do "centro de ensaios", era possível proceder à montagem de 3 máquinas em simultâneo, passou a ser possível montar apenas 2 máquinas, conforme se atestou aquando da verificação física de tal imóvel no decurso de reunião do dia 31 de julho de 2018.
A reposição da capacidade de produção inicial (anterior ao início da assemblagem do 'centro de ensaios") somente foi reposta aquando da deslocalização do equipamento em causa para as instalações arrendadas sitas em ... a partir de abril de 2015.
Recorde-se que a atividade operacional do sujeito passivo se resume à assemblagem de componentes adquiridos a terceiros, sendo que a forma de potenciar a capacidade de produção passaria pela expansão da área disponível para executar a montagem integral das máquinas, a qual é sempre feita, previamente à expedição, nas instalações da A... em ... . Essa expansão ocorreu em 2017, quando ficou concluída a edificação de um novo estabelecimento, a partir do qual a A... passou a deter uma capacidade de montagem simultânea de 7 máquinas, ao invés das apenas 3 máquinas possíveis nas anteriores instalações em ... .
Por outro lado, durante os períodos de 2015 a 2017, o sujeito passivo incorreu em novos investimentos associados à construção de um novo protótipo, designado ... (inicialmente ...), para o desenvolvimento de um modelo de máquina de furacão e fresagem mais compacto, cujas despesas submeteu em candidatura ao SIFIDE em 2015 e 2016, o que demonstra que o enquadramento correio da máquina "... 2000" seria o mesmo e não o RFAI. Recorde-se, aliás, o aludido no Relatório e Contas de 2014, quanto às funções da máquina: "dar apoio na área de Investigação e Desenvolvimento, permitindo realizar testes e desenvolvimentos de novos processos e sistemas que poderão posteriormente ser incorporados nas nossas máquinas".
Deste modo, o investimento efetuado no "centro de ensaios" não potência a capacidade de produção do sujeito passivo, conforme impõe o disposto nos §§ 41 e 49 do artigo 2.º do RGIC.
Por outro lado, o próprio Código Fiscal do Investimento (CFI) estipula na alínea a) do n.º 2 do artigo 22.º que, para efeitos do regime do RFAI, consideram-se "aplicações relevantes os investimentos nos seguintes ativos, desde que afetos à exploração da empresa: a) ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo".
Esta condição pressupõe a aquisição de ativos a terceiros, não contemplando, deste modo, o enquadramento como investimento elegível dos bens construídos pelas próprias entidades, como foi o caso do "centro de ensaios" da A... .
• Software ... CAD/CAM 2.5 Axis -12.990,00 euros
O software ... CAD/CAM adquirido pela A... em 2014, respeita a um programa que permite elaborar o projeto, design e conceção de peças.
Conforme já mencionado, a máquina "... 2000" (centro de ensaios) da A... possui ligação a software CAD/CAM, instalado num posto de trabalho (workstation) situado numa secretária encostada à referida máquina, possibilitando que os clientes tragam os seus próprios ficheiros CAD/CAM e testem a maquinação das suas peças. Trata-se de um software utilizado para demonstração aos potenciais clientes da máquina em funcionamento.
Assim, também este investimento não potência a capacidade de produção do sujeito passivo, conforme impõe o disposto nos §§ 41 e 49 do artigo 2.º do RGIC.
• Armazém automático ...- 52.999,00 euros
O "armazém automático ..." corresponde, conforme descrito no ponto 111.1.1.9, a página 50, a um sistema de armazenamento flexível vertical com prateleiras rotativas, conforme imagens constantes daquele ponto. Ora, o "armazém automático" configura-se como um ativo não operacional, relacionado com atividades secundárias de armazenamento, no caso, de componentes de dimensões reduzidas ou de equipamentos de medição bastante caros.
Trata-se, obviamente, de outro investimento que não potência a capacidade de produção do sujeito passivo, conforme impõe o disposto nos §§ 4t e 49 do artigo 2.º do RGIC.
• Carros de armazenamento - 2.229,00 euros
Os carros de armazenamento funcionam como um "pequeno armazém avançado1 para parafusos, porcas e similares, para além de outros tipos de pequenos componentes, com vários compartimentos.
Trata-se, obviamente, de outro investimento que não potência a capacidade de produção do sujeito passivo, conforme impõe o disposto nos §§ 41 e 49 do artigo 2.º do RGIC.
• Bastidor, travessão e cavilha - 755,60 euros
Relativamente a este ativo" não foi possível verificar fisicamente a sua localização, tratando-se de componentes integrantes da máquina “...2000”, mas os quais não estarão visíveis.
Trata-se de um investimento de reduzido valor, integrado no “centro de ensaios", que não potência a capacidade de produção do sujeito passivo, conforme impõe o disposto nos §§ 41 e 49 do artigo 2.º do RGIC.
Face ao descrito relativamente aos investimentos considerados pelo sujeito passivo, conclui-se que nenhum se enquadra no âmbito do regime de auxílio com finalidade regional, tal como estabelecido no Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014. Para que tal acontecesse, o Investimento deveria estar diretamente relacionado com um aumento da capacidade produtiva, a qual não decorre dos ativos eleitos pela A....
Constituindo o RFAI, segundo o n.º 2 do artigo 1.º do CPI, um regime de auxilio com finalidade regional aprovado nos termos do referido regulamento, consideram-se ilegítimas as deduções à coleta efetuadas pelo sujeito passivo no quadro 10 da declarações de rendimentos modelo 22 de IRC dos períodos de 2014 e 2015, pelo facto do investimento não se relacionar com: i) um novo estabelecimento; ii) aumento de capacidade; iii) produção de novos produtos ou iv) alteração fundamental do processo de produção.
Deste modo, por falta de enquadramento nos termos dos artigos 1.º e 22.º a 26.º do CFI, Importa que o sujeito passivo proceda à anulação das deduções à coleta Inscritas no campo 355 do quadro 10 das declarações de rendimentos modelo 22 de IRC dos períodos de 2014 e 2015, nos montantes de 75.170,30 euros e 23.871,54 euros, respetivamente.
TT) As máquinas construídas pela Requerente envolvem tecnologia de ponta, sendo muito sofisticadas e de grandes dimensões, com peso de cera de 28 toneladas (documento n.º 48 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e depoimentos das testemunhas Q..., W... e Y...);
UU) No âmbito dos contratos de fornecimento e de venda de equipamentos, a Requerente obriga-se a dar formação aos clientes adquirentes, no que teve papel de grande relevo a máquina “... 2000”, que serve para dar formação em relação as máquinas “... 2000” vendidas e em relação às demais máquinas comercializadas pela Requerente (documentos n.ºs 49 e 51 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos, cujo teor se dá como reproduzido e depoimentos das testemunhas Q..., W... e Y...);
VV) A produção deste equipamento permitiu à Requerente aumentar a sua capacidade de produção máxima (documento n.º 52 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e depoimentos das testemunhas Q... e W...);
WW) Cada máquina necessita de cerca de quatro semanas para ser montada nas instalações da Requerente (depoimentos das testemunhas Q... e W...);
XX) Tanto o ... como os carros de armazenamento em que a Requerente efetuou o investimento potencialmente relevante para o RFAI, dispõem de automaticidade e operacionalidade que permitem consideráveis ganhos de eficiência no processo produtivo (depoimentos das testemunhas Q... e W...);
YY) Todos os investimentos foram realizados com a aquisição de equipamentos e componentes em estado novo a terceiros, inclusivamente as peças utlizadas na construção da máquina ... 2000 (depoimento da testemunha Q...);
ZZ) A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou correcções relativas a Trabalhos para a própria entidade (construção de protótipo ... ou “Coluna Integrada”) referentes a um conjunto de despesas com mão-de-obra, nos montantes de € 19.416,90 em 2015 e de € 37.394,58 em 2016, que entendeu que deviam ter sido capitalizados no valor de um ativo e não considerados gastos, com os fundamentos seguintes:
III.1.1.21. Omissão de rendimentos - trabalhos para a própria entidade (protótipo...)
Segundo o n.º 1 do artigo 18.º do Código do IRC, os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica.
Nos termos do n.º 1 do artigo 20.º do Código do IRC, consideram-se rendimentos e ganhos os resultantes de operações de qualquer natureza, em consequência de uma ação normal ou ocasional, básica ou meramente acessória.
Por sua vez, o n.º 1 do artigo 17.º do Código do IRC estipula que o lucro tributável é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do período e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não refletidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código.
Apesar do atual Sistema de Normalização Contabilística (SNC) não possuir uma nota explicativa especifica para a conta "SNC 74 Trabalhos para a própria entidade", por se tratar de uma temática há muito clarificada, pode-se recorrer às notas explicativas do Plano Oficial de Contas (POC), nomeadamente à anterior conta "POC 75 Trabalhos para a própria empresa" para obter uma definição:
Ora, conforme descrito no ponto III. 1.1.20, a pág. 99, o sujeito passivo procedeu à "capitalização" dos componentes integrantes do "protótipo ..." como inventários a 31 de dezembro de 2015 e 2016, tendo procedido à reclassificação de tal elemento patrimonial de inventários para ativo fixo tangível no final de 2017, conforme foi confirmado por mensagem eletrónica do representante da A... (ver Anexo 71):
A construção do referido protótipo ou "coluna integrada" iniciou-se em 2015, conforme se depreende da análise ao centro de custo 2015.009 (ver ficheiro Excel em Anexo 72) respeitante ao processo interno atribuído à construção própria de tal máquina.
Ora, ao longo dos períodos de 2015, 2016 e 2017, o sujeito passivo incorreu em gastos de mão-de-obra com os seus funcionários, quando afetos à construção e montagem da referida "coluna integrada", os quais concorrem para a formação do custo de produção interna do referido ativo.
Nos termos do §16 da NCRF 7, um ativo deve ser mensurado pelo seu custo, sendo que o custo compreende, entre outros, quaisquer custos diretamente atribuíveis para colocar o ativo na localização e condição necessárias para o mesmo ser capaz de funcionar da forma pretendida (alínea b) do §17 da NCRF 7).
Como exemplos de custos diretamente atribuíveis, a alínea a) do §18 da NCRF 7 identifica os custos de benefícios dos empregados (NCRF 28 - Benefícios dos Empregados) decorrentes diretamente da construção, onde se incluem os benefícios de curto prazo (salários, vencimentos,...), obrigando à sua capitalização por contrapartida do reconhecimento de um rendimento (trabalhos para a própria entidade).
Ora, a análise ao centro de custo 2015.009 (ver ficheiro Excel em Anexo 72] permite constatar que o sujeito passivo imputou gastos mensais de mão-de-obra dos trabalhadores afetos à construção de tal ativo, os quais ascendem aos montantes de 19.416,90 euros e 37.394,58 euros nos períodos de 2015 e 2016, respetivamente (ver listagem anual em ficheiros PDF em Anexo 72).
Deste modo, a A... deveria ter procedido ao reconhecimento de um rendimento, o qual é tributável nos termos do artigo 17.º, 18.º e 20.º do Código do IRC, creditando a conta "SNC 74 Trabalhos para a própria entidade" naqueles montantes e períodos, por contrapartida da capitalização na conta "SNC 45 Investimentos em curso".
Em 2017, a A... acabou por proceder à capitalização de tal "coluna integrada", por reclassificação de inventários para ativo fixo tangível, conforme atrás referido, mas contemplando apenas os componentes de tal ativo. O valor considerado como ativo fixo tangível pelo sujeito passivo ascendeu a 151.452,66 euros (ver print do mapa de depreciações de 2017 abaixo), não incluindo a mão-de-obra aplicada na construção do mesmo, sendo que o centro de custo 2015.009 se cifrava nos 227.936,90 euros no final de 2017 (ver ficheiro Excel em Anexo 73):
Ora, nos termos do artigo 18.º do Código do IRC, os rendimentos, assim como outras componentes positivas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos, de acordo com o regime de periodização económica.
Assim, nos termos dos artigos 17.º, 18.º e 20.º do Código do IRC, importa que o sujeito passivo proceda ao acréscimo dos montantes de 19.416,90 euros e 37.394,58 euros, a título de trabalhos para a própria empresa, ao campo 752 do quadro 07 da declaração de rendimentos modelo 22 de IRC dos períodos de 2015 e 2016.
AAA) Os gastos com mão-de-obra aqui em causa consistiram em gastos gerais de investigação incorridos em 2015 e 2016, 0s quais se relacionaram com a pesquisa associada a um protótipo (documento n.º 53 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e depoimentos das testemunhas X..., Q... e W...);
BBB) Tanto no final de 2015 como no final de 2016, não era possível demonstrar que os referidos gastos com mão-de-obra gerariam um qualquer activo suscetível de ser utilizado, transacionado ou capaz de gerar benefícios económicos futuros (depoimentos das testemunhas X..., Q... e W...);
CCC) A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou correcções relativas a subsídio concedido pelo IAPMEI decorrentes das correcções feitas em relação às “depreciações não aceites” com a “máquina ... 2000”, bem como relativamente à invocadas “depreciações excessivas” da máquina “...”, procedeu a revisão em baixa do montante dos rendimentos;
DDD) A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma correcção relativamente ao exercício desde 2015, aplicando uma tributação autónoma de € 1.558,98, por “despesa não documentada”, com os seguintes fundamentos:
III. 1.2.2.3. Tributação autónoma - despesas não documentadas
Nos termos do n.º 1 do artigo 88.º do Código do IRC, as despesas não documentadas são tributadas autonomamente, à taxa de 50%, sem prejuízo da sua não consideração como gastos nos termos da alínea b) do n º 1 do artigo 23,º-A do Código do IRC.
No processo de documentação fiscal (dossier fiscal) do período de 2015 encontra-se arquivado documento elaborado pelo sujeito passivo (ver imagem abaixo) relativo à conferência do caixa, através de contagem física do "saldo real de caixa a 11-01-2016", com base no qual foi efetuado o acerto (redução) da conta "SNC 111 Caixa Sede", no montante de 3.117,95 euros, para que o saldo a 31 de dezembro de 2015 se cifrasse em 5.188,04 euros:
O sujeito passivo, em resposta a notificação da AT, ainda intentou uma explicação direcionada para "diferenças cambiais acumuladas não registadas nos anos anteriores" (ver ponto 21 da página 6 do Anexo 19), remetendo para um documento de suporte que se resume a uma nota de lançamento contendo o mero averbamento das contas movimentadas (ver Anexo 74). Contudo, a expressão reiterada por 3 vezes no documento acima exibido, aludindo a "saldo real", são esclarecedoras, por contraposição, sobre a não aderência do saldo de caixa à realidade, antes do acerto efetuado no final do período de 2015.
Deste modo, a contabilização de tal gasto no montante de 3.117,95 euros, ainda que tenha sido acrescido ao quadro 07 da declaração de rendimentos modelo 22 de IRC do período de 2015, teve subjacente um exfluxo de meios financeiros do sujeito passivo, de natureza e beneficiários desconhecidos, para os quais a A... não possui documentos de suporte válidos.
Assim, nos termos do artigo 88.º do Código do IRC, importa que o sujeito passivo proceda ao acréscimo do montante de 1.558,98 euros ao campo 365 do quadro 10 da declaração de rendimentos modelo 22 de IRC do período de 2015, a título de tributação autónoma de despesas não documentadas.
EEE) O documento referido na alínea anterior reporta-se a rectificação de diferenças cambiais acumuladas não registadas nos anos anteriores (documento n.º 54 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e depoimentos das testemunhas Q... e Z...);
FFF) Desde 2012, a Requerente comprava moeda estrangeira para utilizar pelos seus colaboradores em viagens internacionais, que não era totalmente gasta, ficando depois em caixa essa moeda estrangeira sem qualquer destrinça em relação à moeda local e sem que fosse efetuado em cada ano o devido apuramento das diferenças cambiais, vindo a separação e apuramento de tais diferenças cambiais feita no encerramento do exercício de 2015, por recomendação do então Auditor da Requerente, a testemunha Q... (depoimento desta testemunha e documento junto com as alegações da Requerente);
GGG) A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma correcção relativa ao exercício de 2015, a título de retenção na fonte a taxa incorreta a entidade não residente, com os seguintes fundamentos:
III.1.3. Retenções na fonte
III.1.3.1. Falta de retenção na fonte - taxa incorreta
O n.º 2 do artigo 4.º do Código do IRC dispõe que as pessoas coletivas e outras entidades que não tenham sede nem direção efetiva em território português ficam sujeitas a IRC apenas quanto aos rendimentos nele obtidos. Para efeitos do disposto no n.º 2, o n.º 6 da alínea c) do n.º 3 do mesmo artigo considera obtidos em território português os rendimentos que a seguir se indicam: c) rendimentos a seguir mencionados cujo devedor tenha residência, sede ou direção efetiva em território português; 6) os provenientes da intermediação na celebração de quaisquer contratos.
Nos termos da alínea g) do n.º 1 do artigo 94º do Código do IRC, o IRC é objeto de retenção na fonte relativamente aos seguintes rendimentos obtidos em território português: g) rendimentos provenientes da intermediação na celebração de quaisquer contratos e rendimentos de outras prestações de serviços realizados ou utilizados em território português, com exceção dos relativos a transportes, comunicações e atividades financeiras.
Segundo o n.º 4 do artigo 94.º do Código do IRC, as retenções na fonte de IRC são efetuadas à taxa de 25% e o n.º 6 do artigo 94.º do Código do IRC estabelece que a obrigação de efetuar a retenção na fonte de IRC ocorre na data da colocação à disposição dos rendimentos, devendo as importâncias retidas ser entregues ao Estado até ao dia 20 do mês seguinte àquele em que foram deduzidas.
Ora, em dezembro de 2015, o sujeito passivo procedeu ao pagamento do valor de 1.509,78 euros, relativo à fatura n.º 12061-B, emitida em 02 de julho de 2013 pela AA... sediada na índia (ver documentos em Anexo 75), conforme abaixo:
Aquando do referido pagamento, o sujeito passivo procedeu à retenção na fonte de IRC (ver documentos em Anexo 75), nos termos do artigo 94.º do CIRC, apesar de ter aplicado uma taxa inferior à devida (15% em vez de 25%), conforme extrato de movimentos da conta SNC 221130196 e lançamento contabilístico n.º ...20024 do diário de pagamentos de dezembro de 2015 (ver abaixo):
Assim, o sujeito passivo procedeu à retenção do montante de 226,47 euros (1.509,78 euros x 15%), em vez da quantia de 377,45 euros (1.509,76 euros x 25%), pelo que, nos termos do artigo 94.º do Código do IRC, se encontra em falta a entrega do valor de 150,98 euros, a título de retenção na fonte de IRC, referente ao período de 2015-12.
HHH) A referida quantia de € 1.509,76 foi paga à entidade indiana AA... Ltd;
III) No presente processo arbitral, a Requerente apresentou o Mod. 21-RFI que consta do documento n.º 55 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, que, em 2018, aquela entidade tinha sede na Índia;
JJJ) Em 18-04-2019, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.
2.2. Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto
Os factos provados baseiam-se no processo administrativo e nos documentos juntos pela Requerente cuja correspondência à realidade e, nos pontos indicados, nos depoimentos das testemunhas.
As testemunhas aparentaram depor com isenção e com conhecimento dos factos que relataram.
Nos processos arbitrais tributários são admitidos os meios gerais de prova, nos termos do artigo 115.º, n.º 1 do CPPT aplicável aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT.
Entre esses meios gerais de prova inclui se a prova testemunhal, como decorre dos artigos 118.º e 119.º do CPPT.
Por outro lado, ao contrário do que defende a Autoridade Tributária e Aduaneira, não existe qualquer prevalência da prova documental sobre a testemunhal, fora dos casos de documentos com força probatória plena. Na verdade, por força do disposto na alínea e) do artigo 16.º do RJAT, os árbitros apreciam livremente os factos, de acordo com as regras da experiência e a livre convicção dos árbitros.
Não se provou que a Requerente tivesse efectuado o pagamento de qualquer das quantias liquidadas.
4. Matéria de direito
A Requerente impugna as liquidações de IRC relativas aos exercícios de 2014, 2015 e 2016 com fundamento em vícios procedimentais e em vícios materiais que se apreciarão separadamente.
4.1. Ilegalidade dos actos de prorrogação do prazo da inspecção
A Autoridade Tributária e Aduaneira prorrogou por duas vezes o prazo da inspecção, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 36.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária e Aduaneira (RCPITA).
A Requerente defende que os despachos de prorrogação não estão fundamentados, o que ofende os artigos 268.º, n.º 3 da Constituição, 36.º, n.º 3 do RCPITA e 77.º, n.º 1 da LGT, e que não se verifica qualquer dos pressupostos previstos naquele artigo 36.º, n.º 3.
Porém, independentemente da ilegalidade ou não dos referidos despachos, dela não decorre a ilegalidade das liquidações.
Na verdade, como vem entendendo uniformemente o Supremo Tribunal Administrativo, os vícios dos despachos de prorrogação da inspecção não têm eficácia invalidante dos actos praticados no procedimento de inspecção nem nos posteriores actos de liquidação, apenas tendo como consequência a cessação do efeito suspensivo do prazo de caducidade do direito de liquidação que é atribuído à inspecção tributária no artigo 46.º, n.º 1, da LGT.
Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo: de 27-02-2008, processo n.º 0955/07; de 07-05-2008, processo n.º 0102/08; e de 25-02-2015, processo n.º 0709/14.
Na linha desta jurisprudência, para cuja fundamentação se remete, improcede o pedido de anulação das liquidações com fundamento em violação das regras sobre prorrogação do prazo da inspecção.
4.2. Violação dos princípios e garantias fundamentais que enformam o procedimento tributário
A Requerente defende, em suma, que a Inspecção Tributária fez insinuações insuficientes para satisfazer as regras de distribuição do ónus da prova, não dando relevância à presunção de boa fé de que gozam as declarações e a contabilidade da Requerente, nos termos do artigo 75.º, n.º 1 da LGT.
A Requerente diz que são afectados por estes vícios as seguintes correcções:
a) Desreconhecimento de passivo a favor da I...;
b) Despesas imputáveis a detentores de capital;
c) Gastos com comissões bancárias “escrow account”; e
d) Depreciações não aceites.
A eventual violação das regras do ónus da prova e presunções estabelecidas e eventual inconsistência da fundamentação substantiva coloca-se relativamente a cada um dos pontos da matéria de facto sobre o qual se deva formular um juízo probatório.
Assim, a alegada violação daquelas regras não tem relevância como vício procedimental, pois, quando se verificar, traduz-se num vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto.
Por isso, aquelas correcções não enfermam dos vícios procedimentais que a Requerente lhes imputa, sem prejuízo de a aplicação daquelas regras e presunção dever ser efectuada relativamente a cada uma das questões de facto cuja resolução for necessária para decisão da causa e poder traduzir-se em vício de erro sobre os pressupostos de facto.
4.3. Desreconhecimento de passivo a favor da I...
No Relatório da Inspeção Tributária (RIT) entendeu-se que a Requerente deveria ter desreconhecido um passivo face à entidade I... no exercício de 2016.
Para tal, funda-se a Inspeção Tributária nos seguintes argumentos:
i. um relatório da J..., de 2016, refere que tal dívida deveria ser desconsiderada; pois, segundo a gestão da A... SA, haveria um acordo de não pagamento ao fornecedor I...;
ii. em reunião entre a Inspecção e o administrador B... este terá afirmado que seria razoável considerar um perdão de dívida em 2016, no seguimento de um ofício datado de Novembro de 2015 no qual a A... SA informou o credor que não existiria qualquer dívida em aberto perante o mesmo.
Alega a Requerente, em suma, o seguinte:
i. Nunca teve o acordo da I... para anular dívida em 2016;
ii. Os auditores da Requente, ao circularizarem os débitos desta perante terceiros, contactaram formalmente a I... e não obtiveram qualquer resposta. Assim, a dívida manteve-se nas contas da requerente e tal procedimento foi validado pela Revisão Oficial de Contas de 2016;
iii. Só em novembro de 2018, encontrando-se a I... numa situação de insolvência, foi a A... SA informada de que o crédito aqui controvertido não iria ser reclamado. Assim, tal foi reconhecido pela A... SA nas contas desse ano e o valor sujeito a tributação em IRC.
Considerando as posições de ambas as partes, e o que foi declarado em prova testemunhal, designadamente pela testemunha W..., o Tribunal formulou a convicção de que a AT não traz ao processo provas concludentes nas quais se possa basear, sem margem para dúvidas, o desreconhecimento da dívida em 2016.
O relatório da J... contém uma recomendação de anulação de dívida, fundada num acordo de não pagamento, que não foi confirmado na circularização de dívidas efetuada pelos auditores da Requerente em 2016.
As declarações do administrador, que a AT refere, também não são de molde a sustentar inequivocamente, face aos argumentos da Requerente, um tal desreconhecimento.
A estrutura concetual do SNC estabelece que:
“59 — Uma característica essencial de um passivo é a de que a entidade tenha uma obrigação presente. Uma obrigação é um dever ou responsabilidade para agir ou executar de certa maneira. As obrigações podem ser legalmente impostas como consequência de um contrato vinculativo ou de requisito estatutário. Este é geralmente o caso, por exemplo, de quantias a pagar por bens e serviços recebidos. As obrigações também surgem, porém, das práticas normais dos negócios, costumes e de um desejo de manter boas relações negociais ou de agir de maneira equilibrada. Se, por exemplo, uma entidade decidir como questão de política rectificar deficiências nos seus produtos mesmo quando estas se tornem evidentes após o período de garantia ter expirado, são passivos as quantias que se espera que sejam gastas respeitantes a bens já vendidos. “
Ora, face a tal enquadramento normativo, e perante os argumentos aduzidos, fica pelo menos a dúvida sobre as efetivas condições para a anulação do passivo em 2016 e o consequente registo de um rendimento pela Requerente.
A dúvida tem de ser processualmente valorada a favor da Requerente, por força do preceituado no artigo 100.º, n.º 1, do CPPT, o que se reconduz a considerar errado o entendimento da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Pelo exposto, procede o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta correcção, que é ilegal, por erro sobre os pressupostos de facto.
4.4. Despesas imputáveis a detentores de capital
Estão em causa quanto a esta correcção, gastos respeitantes a pagamentos efectuados pela A... SA às seguintes entidades: K..., J...; L... e H... .
Nos exercícios de 2015 e 2016 a Requerente suportou gastos com estas entidades, relativos a serviços de consultoria económico-financeira, due diligence e assessoria legal.
A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu no RIT que todos estes gastos estão apenas associados à negociação da saída de dois sócios, pelo que entendeu que não se inscrevem no escopo social da Requerente, sendo puramente de natureza pessoal e nada tendo que ver com a actividade da A... SA.
Por seu turno, a Requerente alega que tais gastos resultam de serviços necessários à empresa, dizendo que eles traduzem-se na elaboração de um business plan - que se revelou necessário para a obtenção de financiamento para expandir a atividade - e na due diligence que se traduziu na validação, através de auditoria, de informação financeira da A... SA.
Alega ainda a Requerente que tais gastos resultam da análise de situações legais que impendiam sobre a empresa e podiam implicar negativamente o processo de reestruturação accionista, e ainda estudos de investimento e estratégia de financiamento da actividade futura da empresa. Para a Requerente não subsistem dúvidas de que tais gastos foram contraídos no seu interesse.
A respeito da condição geral de dedutibilidade dos gastos, dispõe o artigo 23º do CIRC:
Artigo 23.º
Gastos e perdas
1 - Para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.
2 - Consideram-se abrangidos pelo número anterior, nomeadamente, os seguintes gastos e perdas:
(...)
e) Os relativos a análises, racionalização, investigação, consulta e projetos de desenvolvimento
(...)
Da prova documental e testemunhal apresentada conclui o Tribunal que tais gastos tiveram uma relação com a actividade e interesse da Requerente, pelo que, ao invés do que se sustenta no RIT, passam o teste de dedutibilidade constante do artigo 23.º do CIRC.
Com efeito, resulta da matéria de facto fixada que os gastos pagos à K... tiveram como contrapartida a elaboração de estudos de avaliação, apoio à reestruturação da empresa e o desenho de um plano de negócios que foi relevante na obtenção de um financiamento avultado junto do Banco G..., que contribuiu para sustentar a expansão da atividade operacional da A... SA.
Os estudos de due diligence, financeira e fiscal, da J... revelaram-se necessários em face da reorganização da estrutura da empresa. Também do facto de os dois sócios que se mantiveram na estrutura acionista terem formação na área da engenharia, apresentando menor experiência na área administrativa e financeira, e procurarem uma visão clara sobre a real situação económico-financeira da A... SA e da identificação de procedimentos a melhorar no futuro na área da gestão económico-financeira da empresa.
A assessoria legal da entidade L... visou analisar questões estratégicas de captação de parceiros e suas implicações na estrutura societária e no desenvolvimento futuro da empresa.
Por fim, a intervenção da H... foi importante na definição e consolidação de investimentos e financiamentos que suportaram o significativo crescimento da actividade Requerente, documentado nos autos quer no RIT, quer no pedido de pronúncia arbitral, quer por testemunhas. Com efeito, as vendas da empresa passaram de 3 milhões de euros, em 2014, para 10 milhões de euros em 2018, segundo o que o director financeiro da mesma declarou em audiência.
Não subsistem dúvidas de que as operações contratadas e os gastos daí decorrentes se inserem na actividade da empresa, e são típicas de situações em que existe reorganização da estrutura acionista, com impacto nas estratégias de investimento e financiamento, que sustentaram a evolução económica futura da A... SA.
Acresce que o artigo 23.º exige que os gastos tenham um propósito ou intenção de contribuir para a obtenção de rendimento. Ora, os planos de investimento e financiamento então elaborados e realizados, a due diligence legal e financeira e a obtenção de parceiros de capital, constituem fatores inequivocamente ligados à actividade da empresa e não se podem atribuir apenas a puros interesses pessoais dos accionistas.
Os dados que se apresentam no RIT sobre a evolução da empresa mostram que existiu impacto empresarial (em vendas e lucratividade) em resultado das acções tomadas e dos gastos neste ponto analisados.
De resto, também quanto a esta matéria, se houvesse dúvidas sobre o interesse da Requerente, elas seriam fundadas, pelo que se referiu, pelo teriam de ser processualmente valoradas a favor da Requerente, por força do preceituado no artigo 100.º, n.º 1, do CPPT, justificando a anulação da correcção e causa.
Pelo exposto, procede o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta questão.
4.5. Gastos com comissões bancárias “escrow account”
No âmbito da reestruturação accionista, a Requerente suportou gastos com comissões pagas ao R... (R...), no âmbito de um contrato de escrow de títulos.
A Autoridade Tributária e Aduaneira alega no RIT que estas comissões nada têm que ver com a actividade ou interesse da Requerente, nem existe uma relação causal com rendimentos obtidos.
A Requerente sustenta que a conta de escrow (depósito de títulos) visou o interesse da empresa, pois permitiu-lhe colocar-se ao abrigo de conflitos accionistas que poderiam entravar a sua actividade e a prossecução dos seus fins económicos.
Tal contrato de escrow, como resulta da prova documental e testemunhal, visou dar estabilidade jurídico-societária à empresa, num contexto de negociação e transação de títulos representativos do seu capital. Procurou-se, assim, que tal processo não influenciasse negativamente as decisões estratégicas e operacionais que a prossecução do negócio exigia. As possíveis disputas entre accionistas poderiam afectar tais decisões e o contrato de escrow visou colocar a empresa ao abrigo de tal situação.
Diga-se também que, contrariamente ao que se sustenta no RIT, o artigo 23º não impõe, muito menos na sua versão pós 2014, uma relação casual obrigatória entre gastos suportados e rendimentos obtidos. O que dita norma estabelece é uma relação entre os gastos e uma intenção ou propósito de obtenção de rendimento. Ou seja, não tem de se verificar uma demonstrada relação causa-efeito entre gastos e rendimentos, e sim apenas que os gastos, no momento em foram suportados, resultam de decisões racionais de gestão, com perfil associado ao interesse ou actividade da empresa que neles incorre. ( )
No caso vertente, mostra-se que a implementação do plano estratégico da empresa, a obtenção de financiamentos, a entrada de novos parceiros de capital e o crescimento do negócio beneficiaram do facto de as divergências entre os titulares do capital não terem entravado o processo.
A estabilidade da gestão foi positivamente influenciada pela existência da conta escrow, e, por isso, a empresa beneficiou dessa figura contratual, na medida em que pôde, mais facilmente e sem conflitos estratégicos, concretizar uma estratégia de crescimento. Ora, assim sendo, os gastos com as comissões associadas à conta escrow têm uma finalidade societária e não um puro interesse individual dos acionistas.
Pelo exposto, esta correcção enferma de vícios de erro sobre os pressupostos de facto e de direito que justificam a sua anulação nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.
Assim, procede o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta questão.
4.6. Depreciações não aceites
Esta correcção tem a ver com a máquina “... 2000”, construída pela Requerente, que a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que só ficou concluída e apta a funcionar em 2015, pelo que as depreciações sobre ela praticadas em 2014 não se podem considerar como gastos fiscais.
A data de entrada em laboração do equipamento sustenta-a o RIT no que considera a data efetiva (abril de 2015) de verificação física ou inspeção pelo IAPMEI, entidade que cofinanciou esse investimento da A... SA, no Relatório do Conselho de Administração de 2014, em declarações de F... e numa factura da entidade U... .
Sustenta a Requerente que a data do pedido de pagamento final ao IAPMEI, a documentação anexa os autos relativa à instrução desse pedido, a declaração do Revisor Oficial de Contas (ROC) que certificou a data em que a máquina estaria pronta para funcionamento, não deixam dúvidas de que o equipamento estaria apto a iniciar actividade em 2014 e assim aconteceu, devendo por isso as depreciações praticadas ser fiscalmente relevantes.
Como estabelece ao artigo 29º do CIRC:
Artigo 29.º
Elementos depreciáveis ou amortizáveis
1 — São aceites como gastos as depreciações e amortizações de elementos do ativo sujeitos a deperecimento, considerando-se como tais:
a) Os ativos fixos tangíveis e os ativos intangíveis;
b) Os ativos biológicos não consumíveis e as propriedades de investimento contabilizados ao custo de aquisição.
(...)
4 — Salvo razões devidamente justificadas e aceites pela Autoridade Tributária e Aduaneira, os elementos do ativo só se consideram sujeitos a deperecimento depois de entrarem em funcionamento ou utilização.
Da prova documental e testemunhal apresentada ao Tribunal conclui-se que a máquina estava em condições de funcionamento em 2014.
Não só a documentação trocada entre a empresa e o IAPMEI, como as declarações do ROC que certificou o processo por via de controlo documental e físico, são claras quanto ao exercício (2014) no qual se finalizou o investimento e este iniciou a sua atividade produtiva no âmbito da A... SA.
As sucessivas deslocações da máquina entre diversas instalações, devidamente expressas e clarificadas pelas testemunhas ouvidas, permitem ao tribunal afastar a tese, que se sustenta no RIT, segundo a qual só em 2015, em instalações arrendadas, a máquina em questão teria ficado concluída. O facto de a dita máquina ser constituída por diversas peças, máquinas parcelares ou módulos, que se agregam e desagregam, contribui para que ela seja "móvel" e que, estando concluída, possa ser deslocada e novamente montada noutras instalações. Tal não afeta a data da sua conclusão e sua entrada em funcionamento.
Assim, face à prova produzida e às normas legais atendíveis, tem de se concluir que as depreciações de 2014 devem ser aceites com gasto fiscal.
Consequentemente, esta correcção enferma de vícios de erro sobre os pressupostos de facto e de direito que justificam a sua anulação nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.
Assim, procede o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta questão.
4.7. Depreciações excessivas
A questão que é objecto desta correcção é a de qualificar uma máquina eletrónica de armazenamento, designada "...", designadamente saber se deverá qualificar-se como "aparelhagem e máquina eletrónica" ou, como entendeu a Autoridade Tributária e Aduaneira no RIT, como uma "estante metálica", questão que se coloca porque a vida útil dos equipamentos e as taxas de depreciação são distintas .
Quanto a este tema, objeto de discordância entre a AT e o contribuinte, o dissídio centra-se no seguinte: a Requerente depreciou um bem do seu ativo, destinado ao armazenamento de matérias para o fabrico de equipamentos para a indústria de moldes, a uma taxa de 20% (correspondente à designação "Aparelhagem e máquina eletrónica"). Sustenta-se no RIT que tal bem não se inclui nesse grupo de ativos depreciáveis. Deve antes incluir-se no grupo "Estantes metálicas" e ser fiscalmente depreciado a uma taxa de 8,33%.
Como é bom de ver, serão as características técnico-económicas do equipamento de armazenagem que permitirão imputar a sua inserção num ou noutro grupo de ativos depreciáveis e decidir sobre a respetiva taxa anual a aplicar.
A prova documental junta aos autos descreve tal equipamento como um sistema de armazenamento automatizado, o que exibe traços distintos de meras estantes metálicas tradicionais. Também a mesma prova mostra que o seu custo e respectivo contrato de manutenção anual ascendem a valores manifestamente superiores aos que são usuais na aquisição de simples estantes metálicas.
As características técnicas do equipamento permitem-lhe efectuar uma gestão eficiente do espaço, programável, maximizando a capacidade de stockagem e optimizando a relação entre o armazém e as necessidades da produção.
As testemunhas que sobre este tema prestaram declarações foram unânimes em afirmar que não se trata de meras estantes metálicas, mas sim de equipamento operado por um software que permite a sua programação e operacionalização em condições muito diversas (mais eficientes e rentáveis) relativamente a simples estantes metálicas. Além disso, a gestão de stocks (inventários) atinge patamares de flexibilização técnico-produtiva não alcançáveis por estantes metálicas fixas.
O facto de a vida útil do bem se poder estender além de 5 anos não é argumento decisivo.
Em primeiro lugar, por que a taxa de 20% permite uma vida fiscal que varia entre 5 e 10 anos, por via de taxas máximas e mínimas.
Em segundo, porque é no momento da aquisição de um activo fixo que, face às suas propriedades técnico-económicas, se deverá decidir a sua imputação a um grupo de activos depreciáveis, podendo observar-se desvios, para mais ou para menos, da vida útil fiscal que tal classificação implica.
Por fim, e para tomar apenas este exemplo, os automóveis ligeiros de passageiros, que têm uma taxa fiscal de depreciação de 25% e uma vida útil mínima de 4 anos, apresentam, as mais das vezes, vidas úteis efectivas mais longas, sem que tal ponha em causa a respetiva taxa de depreciação fiscal. Apenas sucede que a partir de certo momento deixam de ser depreciáveis, por o seu valor fiscal depreciável ser nulo.
Em suma, a comprovada sofisticação técnica e a eficiência no processo de gestão de stocks permitem ao tribunal concluir que o equipamento de armazenagem em causa se afasta da classificação de estantes metálicas, devendo ser aceite a taxa fiscal praticada pelo contribuinte.
Assim, também esta correcção enferma de erro sobre os pressupostos de facto, que justifica a sua anulação, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.
4.8. Deduções indevidas a colecta (RFAI)
A Requerente efectuou, em 2014 e 2015, no âmbito do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI) deduções à colecta de IRC.
O RFAI vigente em 2014 e 2015, consta do Código Fiscal do Investimento (CFI), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2914, de 31 de Outubro (artigos 22.º a 26.º).
No n.º 2 do artigo 1.º do CFI, «o regime de benefícios fiscais contratuais ao investimento produtivo e o RFAI constituem regimes de auxílios com finalidade regional aprovados nos termos do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado, publicado no Jornal Oficial da União Europeia, n.º L 187, de 26 de junho de 2014 (adiante Regulamento Geral de Isenção por Categoria ou RGIC)».
A Portaria n.º 297/2015, de 21 de Setembro, que veio regulamentar alguns aspectos do RFAI, em sintonia com as regras decorrentes da legislação europeia em matéria de auxílios estatais, designadamente o referido Regulamento (UE) n.º 651/2014.
No artigo 2.º, n.º 1, alínea d) desta Portaria estabelece-se que «os benefícios fiscais previstos no artigo 23.º do Código Fiscal do Investimento apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2.º do RGIC, considerando-se como tal os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente».
No exercício de 2014, a Requerente considerou elegíveis despesas no montante de € 396.167,36, que serviram de suporte a dedução à colecta do montante de € 75.170,30 em 2014, transitando para o período seguinte (2015) a quantia de € 23.871,54.
A Autoridade Tributária e Aduaneira procedeu «à análise e verificação física da investimento que foi considerado elegível pela A... para efeitos de RFAI, tendo-se concluído que não se enquadra no espírito do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014».
Entendeu-se no RIT, em suma, que os elementos "Máquina ... 2000", "Software ...", "Armazém automático ...", "Carros de armazenamento" e "Bastidor, travão e cavilhas", não potenciam a capacidade de produção da Requerente, não se enquadrando no RFAI, devendo por isso ser negadas as deduções à coleta que o contribuinte efectuou.
Uma outra condição que no RIT se considerou não cumprida foi a de que os investimentos deveriam ser adquiridos em estado novo, o que não aconteceria designadamente para a máquina (centro de ensaios) ... 2000.
Contrapõe a Requerente que os investimentos em causa potenciaram a sua capacidade de produção. Menciona ainda que os activos colocados em crise pela AT quanto ao estado de aquisição, foram efectivamente comprados em estado novo a terceiros e depois incorporados pela requerente nos equipamentos em análise.
Da prova produzida resulta que a venda das máquinas produzidas pelo A... SA, essencialmente ao sector dos moldes, implica uma importante e temporalmente relevante actividade de treino dos operadores de máquinas dos clientes. A sofisticação e precisão das máquinas implica essa formação prévia (dada pela A... SA) à sua entrada em funcionamento na linha de produção dos clientes da Requerente.
Assim, o novo equipamento para formação, em especial a máquina ... 2000, permitiu optimizar, encurtando e tornando mais eficiente o tempo de formação dado aos clientes utilizadores das máquinas produzidas pela A... SA. Tal implicou a libertação de espaço e recursos para o incremento da sua produção. Esse aumento está mostrado neste ponto e já se evidenciou relativamente a outros temas em litígio que integram esta decisão arbitral.
É perfeitamente atendível que um novo centro de treino/ensaios, nas instalações da requerente, com tecnologia mais apropriada e avançada, liberte recursos para atividades produtivas, desta forma satisfazendo a condição legal de elegibilidade do RFAI que se traduz no " aumento da capacidade de um estabelecimento já existente".
A prova testemunhal foi congruente neste sentido com a prova documental, apresentando-se, de forma convincente, os efeitos positivos na produção decorrentes da introdução do novo centro de ensaios.
Por outro lado, como resulta também da prova apresentada, as componentes ou parcelas da máquina ... 2000 foram adquiridas em estado novo a terceiros. Tal foi confirmado pela submissão deste investimento ao financiamento do IAPMEI (como já se viu nesta decisão arbitral no ponto 4.6.).
No plano contabilístico a Norma Contabilística e de Relato Financeiro nº 7- Ativos fixos tangíveis, contém, nos seus § 7, 8 e 9 ( ), preceitos que levam a classificar como ativos fixos os componentes da máquina ... 2000, pois podem ser fiavelmente mesurados, deles se esperam benefícios futuros; e pela sua importância técnica e vida útil plurianual podem ser agregados no custo total do ativo representado pela maquina ... 2000.
Ou seja, o elemento mais vasto (máquina ... 2000) é composto por elementos individuais, máquinas e módulos parcelares que, aplicando as definições técnicas do § 8 da NCRF nº 7, e o juízo valorativo do § 9, permitem concluir pela existência de um activo que satisfaz ambas as condições (potenciar o incremento da produção e resulta de aquisição de ativos fixos a terceiros) exigidas no RFAI.
De igual modo, os restantes elementos que o RIT coloca em crise, a saber " Software ...", "Armazém automático ...", "Carros de armazenamento" e "Bastidor, travão e cavilhas", são também, isoladamente ou integrados noutros equipamentos, potenciadores da capacidade de produção da A... SA. Assim, sendo integrados em investimentos que visam tornar a produção e a gestão de stocks mais eficiente, também eles se encontram corelacionados com o aumento da produção da Requerente que ocorreu subsequentemente a tais investimentos.
Pelo exposto, devem ser aceites as deduções à colecta que a Requerente efetuou em 2014 e 2015.
4.9. Trabalhos para a própria entidade
A Requerente, em 2015 e 2016, reconheceu como gastos quantias relativas a despesas com mão de obra incorridas no âmbito de trabalhos para a entidade, referentes à construção do "protótipo ..." ou "Coluna integrada".
A Inspeção Tributária entendeu que tais gastos deveriam ter sido capitalizados, porque em final 2017 ocorreu a capitalização (isto é, o reconhecimento como activo) de gastos que foram integrados no ativo fixo tangível "coluna integrada". Mais se sustenta no RIT que os referidos gastos com pessoal, relativos a 2015 e 2016, também deveriam ser capitalizados - porque associados à construção da dita coluna integrada - e não levados a gastos do exercício, não sendo, pois, dedutíveis nos dois anos mencionados.
Alega a Requerente que, em 2015 e 2016, os gastos controvertidos faziam parte de um processo de pesquisa (investigação) e desenvolvimento de um protótipo. Não existiam condições para os reconhecer como activos, em face da inviabilidade de se estimarem benefícios económicos futuros deles eventualmente decorrentes.
Face à prova documental e testemunhal apresentada, o tribunal está convicto de que se trata de gastos com pessoal incorridos no desenvolvimento de um processo de pesquisa ou desenvolvimento. Estamos, pois, no domínio do designados intangíveis gerados internamente. Não existindo no CIRC regras próprias sobre este tema deve, face ao disposto no artigo 17º deste Código, buscar-se arrimo nas normas contabilísticas.
Ora, a NCRF 6- "Ativos intangíveis" refere, entre outros, nos § 5, 9, 10 e 49 a complexidade no reconhecimento desses ativos gerados internamente. Vejamos:
"5- Esta Norma aplica-se, entre outras coisas, a dispêndios com publicidade, formação, arranque e atividades de pesquisa e desenvolvimento. As atividades de pesquisa e desenvolvimento destinam-se ao desenvolvimento de conhecimentos. Por isso, se bem que estas atividades possam resultar num ativo com substância física (por exemplo, num protótipo), o elemento físico do ativo é secundário em relação ao seu componente intangível, i.e., o conhecimento incorporado no mesmo.
9 - As entidades gastam com frequência recursos, ou incorrem em passivos, pela aquisição, desenvolvimento, manutenção ou melhoria de recursos intangíveis tais como conhecimentos científicos ou técnicos, conceção e implementação de novos processos ou sistemas, licenças, propriedade intelectual, conhecimento de mercado e marcas e objetivos comerciais (incluindo nomes comerciais e títulos de publicações). Exemplos comuns de itens englobados nestes grupos são o software de computadores, patentes, copyrights, filmes, listas de clientes, direitos de hipotecas, licenças de pesca, quotas de importação, franchises, relacionamentos com clientes ou fornecedores, fidelidade de clientes, quota de mercado e direitos de comercialização.
10 - Nem todos os itens descritos no parágrafo 9 satisfazem a definição de um ativo intangível, i.e. identificabilidade, controlo sobre um recurso e existência de benefícios económicos futuros. Se um item que esteja dentro do âmbito desta Norma não satisfizer a definição de um ativo intangível, o dispêndio para o adquirir ou gerar internamente é reconhecido como um gasto quando for incorrido (...)
49 - Por vezes, é difícil avaliar se um ativo intangível gerado internamente se qualifica para reconhecimento por causa de problemas em:
a) Identificar se e quando existe um ativo identificável que gere benefícios económicos futuros esperados; e
b) Determinar fiavelmente o custo do ativo. Em alguns casos, o custo de gerar internamente um ativo intangível não pode ser distinguido do custo de manter ou aumentar o goodwill da entidade gerado internamente ou do decorrer operacional do dia-a-dia.
Por isso, além de se conformar com os requisitos gerais do reconhecimento e mensuração inicial de um ativo intangível, uma entidade aplica os requisitos e orientação dos parágrafos 50 a 65 a todos os ativos intangíveis gerados internamente."
A mesma NCRF é clara quanto aos dispêndios com processos de pesquisa (investigação), dispondo que:
"50 - Para avaliar se um ativo intangível gerado internamente satisfaz os critérios de reconhecimento, uma entidade classifica a formação do ativo em:
a) Uma fase de pesquisa; e
b) Uma fase de desenvolvimento.
Se bem que os termos "pesquisa" e "desenvolvimento" estejam definidos, os termos "fase de pesquisa" e "fase de desenvolvimento" têm um sentido mais amplo para a finalidade desta Norma.
51 - Se uma entidade não puder distinguir a fase de pesquisa da fase de desenvolvimento num projeto interno para criar um ativo intangível, a entidade trata o dispêndio nesse projeto como se fosse incorrido somente na fase da pesquisa.
52 - Nenhum ativo intangível proveniente de pesquisa (ou da fase de pesquisa de um projeto interno) deve ser reconhecido. O dispêndio com pesquisa (ou da fase de pesquisa de um projeto interno) deve ser reconhecido como um gasto quando for incorrido.
53 - Na fase de pesquisa de um projeto interno, uma entidade não pode demonstrar que existe um ativo intangível que irá gerar benefícios económicos futuros prováveis. Por isso, este dispêndio é reconhecido como um gasto quando for incorrido.
54 - Exemplos de atividades de pesquisa são:
a) Atividades visando a obtenção de novos conhecimentos;
b) A procura de, avaliação e seleção final de, aplicações das descobertas de pesquisa ou de outros conhecimentos;
c) A procura de alternativas para materiais, aparelhos, produtos, processos, sistemas ou serviços; e
d) A formulação, conceção, avaliação e seleção final de possíveis alternativas de materiais, aparelhos, produtos, processos, sistemas ou serviços novos ou melhorados."
Ou seja, a NCRF 6 proíbe a capitalização de gastos com investigação.
Vejamos quanto a gastos de desenvolvimento.
"55 - Um ativo intangível proveniente de desenvolvimento (ou da fase de desenvolvimento de um projeto interno) deve ser reconhecido se, e apenas se, uma entidade puder demonstrar tudo o que se segue:
a) A viabilidade técnica de concluir o ativo intangível a fim de que o mesmo esteja disponível para uso ou venda;
b) A sua intenção de concluir o ativo intangível e usá-lo ou vendê-lo;
c) A sua capacidade de usar ou vender o ativo intangível;
d) A forma como o ativo intangível gerará prováveis benefícios económicos futuros. Entre outras coisas, a entidade pode demonstrar a existência de um mercado para a produção do ativo intangível ou para o próprio ativo intangível ou, se for para ser usado internamente, a utilidade do ativo intangível;
e) A disponibilidade de adequados recursos técnicos, financeiros e outros para concluir o desenvolvimento e usar ou vender o ativo intangível; e
f) A sua capacidade para mensurar fiavelmente o dispêndio atribuível ao ativo intangível durante a sua fase de desenvolvimento.
56 - Na fase de desenvolvimento de um projeto interno, uma entidade pode, nalguns casos, identificar um ativo intangível e demonstrar que o ativo gerará prováveis benefícios económicos futuros. Tal acontece porque a fase de desenvolvimento de um projeto é mais avançada do que a fase de pesquisa.
57 - Exemplos das atividades de desenvolvimento são:
a) A conceção, construção e teste de protótipos e modelos de pré-produção ou de pré-uso;
b) A conceção de ferramentas, utensílios, moldes e suportes envolvendo nova tecnologia;
c) A conceção, construção e operação de uma fábrica piloto que não seja de uma escala económica exequível para produção comercial; e
d) A conceção, construção e teste de uma alternativa escolhida para materiais, aparelhos, produtos, processos, sistemas ou serviços novos ou melhorados."
Como se observa, só em situações muito particulares, que no processo em apreço se provou não se encontrarem verificadas em 2015 e 2016, se podem capitalizar gastos de desenvolvimento.
Todavia, pode questionar-se se, ao capitalizar-se o activo em 2017, não deveria tal capitalização retroagir aos gastos com ele relacionados incorridos em 2015 e 2016.
A isso responde o § 69 nos seguintes moldes:
“69 – O dispêndio com um item intangível que tenha sido inicialmente reconhecido como um gasto não deve ser reconhecido como parte do custo de um ativo intangível em data posterior.”
É certo que este § 69 respeita a intangíveis e a A... SA capitalizou, em 2017, um activo tangível. Porém, o mesmo fundamento quanto à impossibilidade de estimar benefícios futuros em 2015 e 2016, relativamente aos gastos controvertidos, impede que, quando tais condições existem (já em 2017) elas não permitem recuperar (capitalizar) os gastos que nos exercícios anteriores foram como tal deduzidos.
Em conclusão, os gastos com pessoal ocorridos em 2015 e 2016, no âmbito do desenvolvimento e construção da Coluna Integrada, não tinham condições para ser capitalizados e devem ser dedutíveis, sendo, pois, ilegal a correção efetuada pela AT.
Assim, também esta correcção deve ser anulada, de harmonia com o disposto no artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.
4.10. Subsídios
Sustenta-se no RIT que, face ao disposto no artigo 22.º do CIRC, a Requerente deve reduzir o montante de subsídios reconhecidos como rendimento tributável em 2015 e 2016.
Trata-se de uma correção a favor da Requerente, que surge no contexto da desconsideração pela AT da depreciação da máquina ... 2000 em 2014 e da correção da taxa de depreciação do Armazém automático ... .
Alega a Requente que sendo ilegais tais correções, então nada haverá que corrigir relativamente aos subsídios recebidos do IAPMEI e que têm no artigo 22 do CIRC a regra de reconhecimento ou imputação temporal.
Com efeito, reza assim a dita norma do CIRC, para o que aqui importa:
“Artigo 22.º
Subsídios relacionados com ativos não correntes
1 - A inclusão no lucro tributável dos subsídios relacionados com ativos não correntes obedece às seguintes regras:
a) Quando os subsídios respeitem a ativos depreciáveis ou amortizáveis, deve ser incluída no lucro tributável uma parte do subsídio atribuído, independentemente do recebimento, na mesma proporção da depreciação ou amortização calculada sobre o custo de aquisição ou de produção, sem prejuízo do disposto no n.º 2;
b) (…)”.
Tendo a Requerente imputado os subsídios recebidos na proporção das depreciações que registou, e tendo o Tribunal validado tal procedimento quanto às depreciações da máquina ... 2000 em 2014 e da taxa de depreciação do Armazém automático ..., deve então concluir-se pela ilegalidade da correção efetuada no RIT relativamente a este ponto.
4.11. Tributação autónoma – - despesas não documentadas
A Autoridade Tributária e Aduaneira aplicou uma tributação autónoma relativa ao exercício de 2015, no valor de € 1.558,98, nos termos do n.º 1 do artigo 88.º do CIRC, com fundamento em despesa não documentada.
Tal despesa, no entendimento da Autoridade Tributária e Aduaneira, resulta do facto de através de contagem física do "saldo real de caixa a 11-01-2016" ter sido efectuado o acerto (redução) da conta "SNC 111 ...", no montante de 3.117,95 euros, para que o saldo a 31-12-2015 se cifrasse em 5.188,04 euros.
A Requerente invocou que tal redução do saldo da conta "SNC 111 ..." tem por base diferenças cambiais acumuladas não registadas nos anos anteriores, remetendo para um documento de suporte que se resume a uma nota de lançamento contendo o mero averbamento das contas movimentadas.
No entanto, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que «a expressão reiterada por 3 vezes no documento acima exibido, aludindo a "saldo real", são esclarecedoras, por contraposição, sobre a não aderência do saldo de caixa à realidade, antes do acerto efetuado no final do período de 2015», pelo que concluiu que «a contabilização de tal gasto no montante de 3.117,95 euros, ainda que tenha sido acrescido ao quadro 07 da declaração de rendimentos modelo 22 de IRC do período de 2015, teve subjacente um exfluxo de meios financeiros do sujeito passivo, de natureza e beneficiários desconhecidos, para os quais a A... não possui documentos de suporte válidos».
A prova testemunhal produzida e o documento junto com as alegações da Requerente corroboram a tese da Requerente, no sentido de que esta comprava moeda estrangeira para ser utilizada pelos seus colaboradores em viagens internacionais, que ficou depois em caixa sem qualquer destrinça em relação à moeda local e sem que fosse efetuado em cada ano o devido apuramento das diferenças cambiais. No final do exercício desde 2015, por recomendação do então Auditor da Requerente, a testemunha Q..., foi feita a separação da moeda estrangeira e da nacional, e apuradas as diferenças cambiais que se cifraram no valor de € 5.188,04.
As afirmações da Requerente, confirmadas pela testemunha Q..., que era auditor da Requerente em 2015, afiguram-se perfeitamente plausíveis, pois é normal que os seus colaboradores que se deslocam ao estrangeiro disponham de dinheiro em moeda dos países a que se deslocam, quando não é idêntica à que circula em Portugal, para pagamento de despesas de pequeno valor, como evidencia o documento junto com as alegações da Requerente. E também é normal que nem toda a moeda estrangeira adquirida seja gasta e seja conservada para ser utilizada em futuras deslocações e que haja variações cambiais com reflexo no valor dessa moeda estrangeira em caixa.
Por outro lado, o único facto em que a Autoridade Tributária e Aduaneira baseia a sua conclusão sobre a existência de «um exfluxo de meios financeiros do sujeito passivo», que é «a expressão reiterada por 3 vezes no documento acima exibido, aludindo a "saldo real", são esclarecedoras, por contraposição, sobre a não aderência do saldo de caixa à realidade, antes do acerto efetuado no final do período de 2015», não pode considerar-se suficiente para retirar-se aquela conclusão, pois, à face da tese da Requerente, o saldo real anterior ao acerto efectuado no final de 2015, não era o real por ser calculado com base no valor da moeda estrangeira nos momentos da aquisição e não no seu valor actualizado.
Isto é, o facto de o saldo não ser real antes do acerto, por não ser calculado com base no valor actualizado da moeda estrangeira, não implica que tenha havido um «exfluxo de meios financeiros do sujeito passivo», pois é compatível com a existência de desvalorização cambial invocada pela Requerente.
Por isso, resultando da prova produzida que o do acerto foi efectuado para determinação do saldo real considerando o valor actualizado da moeda estrangeira, tem de se concluir que não se demonstra a existência de qualquer efluxo de meios financeiros da Requerente, mas sim desvalorização de meios financeiros o que, desde logo, implica que a tributação autónoma aplicada enferme de vício por erro sobre os pressupostos de facto.
Por outro lado, neste contexto factual, não há suporte para a aplicação da tributação autónoma, com base em despesas não documentadas.
Na verdade, o conceito de «despesas» utilizado no artigo 88.º, n.º 8, do CIRC, não é definido neste Código e não coincide com o de «gastos», definido no artigo 23.º do CIRC (que inclui, designadamente, «perdas» e «ajustamentos»), pelo que deverá ser atribuído àquela expressão o alcance que tem na linguagem comum, de saída de dinheiro do património de uma empresa ou « efluxo de meios financeiros», como diz a Autoridade Tributária e Aduaneira).
Assim, as despesas pagas ou devidas a que se refere o artigo 88.º, n.º 8, do CIRC reconduzem-se a saídas de meios financeiros do património da empresa, ficando fora da sua esfera de disponibilidade.
Não foi isso que sucedeu no caso em apreço, pois da prova produzida resulta que a Requerente, antes de depois do acerto em causa, manteve sempre a disponibilidade da moeda que adquiriu, sendo apenas o valor desta que se alterou por efeito de variações cambiais.
Nestas condições, não está preenchido o conceito de «despesas» utilizado no n.º 8 do artigo 88.º do CIRC, pelo que não se justifica a tributação autónoma referida, que, por isso, deve ser anulada, nos termos artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.
4.12. Retenção na fonte de rendimentos pagos a não residente
A Requerente procedeu ao pagamento do valor de 1.509,78 euros, relativo à factura n.º 12061-B, emitida em 02 de julho de 2013 pela AA... sediada na Índia, efectuando retenção na fonte de IRC, com base ena taxa de 15%.
A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma correcção porque, «segundo o n.º 4 do artigo 94.º do Código do IRC, as retenções na fonte de IRC são efetuadas à taxa de 25%» e o «o sujeito passivo procedeu à retenção do montante de 226,47 euros (1.509,78 euros x 15%), em vez da quantia de 377,45 euros (1.509,76 euros x 25%), pelo que, nos termos do artigo 94.º do Código do IRC, se encontra em falta a entrega do valor de 150,98 euros, a título de retenção na fonte de IRC, referente ao período de 2015-12».
A Requerente junto aos autos o RFI que consta do documento n.º 55, que comprova que a AA... tem sede na Índia, o que, de resto, não é questionado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, que baseou a correcção precisamente no facto de esta empresa sede na Índia.
A Requerente defende que a retenção a 15% foi efectuada por lapso, pois nem tinha de ser efectuada qualquer retenção, por força do disposto no artigo 7.°, n.º 1, da Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada com a índia, prescreve-se que "Os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só podem ser tributados nesse Estado, a não ser que a empresa exerça a sita atividade no outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento estável aí situado”.
Defende a Requerente que estão preenchidos os pressupostos formais previstos no artigo 94.º, n.º 2, do CIRC para que seja accionada a referida Convenção para Evitar a Dupla Tributação. ( )
A Autoridade Tributária e Aduaneira, na sua Resposta, vem dizer o seguinte, em suma, que a Requerente não fez prova dos requisitos para aplicação da Convenção para Evitar a Dupla Tributação, designadamente por o Mod. 21-RFI apresentado atestar que a referida empresa indiana estava tributada em IRC apenas no ano de 2018 e não no de 2015.
A Requerente nada disse, nas suas alegações, sobre esta argumentação da Autoridade Tributária e Aduaneira.
O Mod. 21-RFI que a Requerente invoca no presente processo como suporte da não obrigação de retenção não tem esse efeito, pois o afastamento da obrigação de retenção apenas ocorre quando for feita «prova perante a entidade que se encontra obrigada a efetuar a retenção na fonte, até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos das normas legais aplicáveis» (artigo 98.º, n.º 2, do CIRC).
Neste caso, o Mod. 21-RFI reporta-se ao ano de 2018, pelo que, para além de não ter potencialidade para demonstrar os requisitos para aplicação da Convenção para Evitar a Dupla Tributação em 2015, não estava em poder da Requerente quando deveria ter feito a retenção, na data da colocação à disposição dos rendimentos (artigo 94.º, n.º 6 do CIRC).
Pelo exposto, improcede o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta correcção.
4.13. Juros compensatórios
As liquidações de juros compensatórios têm como pressuposto as respectivas liquidações de IRC (artigo 35.º, n.º 8, da LGT), pelo que enfermam dos mesmos vícios que afectam estas, justificando-se também a sua anulação.
Assim, justifica-se a anulação das liquidações de juros compensatórios que têm como pressuposto as liquidações de IRC relativas aos exercícios de 2014, 2015 e 2016.
No que concerne à falta de retenção na fonte não foi efectuada liquidação de juros compensatórios, como se vê pelo documento n.º 10 junto com o pedido de pronúncia arbitral.
5. Reembolso de imposto e juros indemnizatórios
A Requerente pede reembolso de imposto e juros indemnizatórios.
Os direitos a reembolso decorrente de anulação de liquidações e o direito a juros indemnizatórios dependem de ter sido efectuado o pagamento de imposto indevido.
No caso em apreço, não se provou que a Requerente tivesse efectuado o pagamento de qualquer das quantias liquidadas.
Consequentemente, improcedem os pedidos de reembolso e de juros indemnizatórios, sem prejuízo de os direitos respectivos poderem ser reconhecidos em execução do presente acórdão.
6. Decisão
De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:
a) Julgar o procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à declaração de ilegalidade das seguintes liquidações:
i) liquidação adicional de IRC n.º 2018..., relativa ao exercício de 2014, bem como as respectivas liquidações de juros compensatórios n.º 2018... e 2018... e demonstração de acerto de contas n.º 2018...;
ii) liquidação adicional de IRC n.º 2018..., relativa ao exercício de 2015, bem como as respectivas liquidações de juros compensatórios n.º 2018..., 2018..., 2018... e 2018... e a demonstração de acerto de contas n.º 2018...;
iii) a liquidação adicional de IRC n.º 2018..., relativa ao exercício de 2016, bem como a respetiva liquidação de juros compensatórios n.º 2018... e a demonstração de acerto de contas n.º 2018...;
b) Anular as liquidações referidas na alínea anterior;
c) Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à da liquidação de retenção na fonte de IRC n.º 2018..., relativa ao exercício de 2015 e absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira dos pedidos de declaração de ilegalidade e anulação desta liquidação;
d) Julgar improcedentes os pedidos de reembolso e juros indemnizatórios e absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira destes pedidos, sem prejuízo de os respectivos direitos poderem ser reconhecidos em execução do presente acórdão
7. Valor do processo
De harmonia com o disposto nos artigos 296.º, n.º 1, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 257.568,10.
8. Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 4.896,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerente na percentagem de 0,06% e de 99,04% a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 10-02-2020
Os Árbitros
(Jorge Lopes de Sousa)
(António Martins)
(Marcolino Pisão Pedreiro)