Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 287/2019-T
Data da decisão: 2019-12-16  IRC  
Valor do pedido: € 284.843,37
Tema: IRC – Perdas por imparidade. Provisões. Tributação autónoma.
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Decisão Arbitral          (consultar versão completa no PDF)

 

 

                Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. Carlos Alberto Monteiro da Silva e Dr. Rui Ferreira Rodrigues (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 02-07-2019, acordam no seguinte:

 

 

1. Relatório

 

A..., S.A., titular do NIPC..., com sede no ..., ..., ...-... ... (doravante “Requerente”), veio, nos termos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), requerer a constituição de Tribunal Arbitral.

A Requerente pretende a declaração de ilegalidade da liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) e de juros compensatórios n.º 2018..., relativa ao exercício de 2014, e da respetiva demonstração de acerto de contas n.º 2018... .

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 22-04-2019.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, os Árbitros que inicialmente foram designados pelo Conselho Deontológico comunicaram a aceitação do encargo, no prazo aplicável.

Em 11-06-2019 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 02-07-2019.

A Administração Tributária e Aduaneira apresentou Resposta em que defendeu que o pedido de pronúncia arbitral deve ser julgado improcedente.

Em 14-11-2019, foi realizada uma reunião em que foi produzida prova testemunhal e decidido que o processo prosseguisse com alegações simultâneas.

As Partes apresentaram alegações.

                               O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e é competente.

As Partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades.

 

2. Matéria de facto

2.1. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

A)           Foi realizada uma inspecção à Requerente ao exercício de 2014, em que foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária que consta do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:

(...)

II.3.6.1 CONTAS BANCÁRIAS

De acordo com as demonstrações financeiras explanadas nos pontos anteriores e de acordo com a informação retirada da IES de 2014 através do Mapa de Fluxos de Caixa (Quadro n.º 5) a A..., SA, movimenta conta caixa e contas bancos.

No entanto após a análise dos fluxos de caixa e de alguns dos documentos contabilísticos, verificamos que as contas bancárias utilizadas na A..., SA, se encontram em nome de outras entidades, nomeadamente B... e C... (Anexo III). Ambas as empresas têm mesmo administrador, D... (NIF...).

(...)

Assim, no que diz respeito à definição de ativo, as contas bancárias, respeitam a definição de ativo, dai o seu reconhecimento nas demonstrações financeiras, no entanto falta-lhes a forma legal, pois as contas bancárias movimentadas pela A..., SA, encontram-se em nome de outras entidades juridicamente distintas, tendo como elo de ligação o Administrador D... .

Quanto à forma legal à semelhança do § 51 da EC, aquando da elaboração das demonstrações financeiras existem vários pressupostos subjacentes que têm de ser respeitados, nomeadamente a substância sobre a forma, prevista no § 35 da EC, onde é referido " ...a informação deve representar fidedignamente as transações e outros acontecimentos que tenha por fim representar, é necessário que eles sejam contabilizados e apresentados de acordo com a sua substância e realidade económica e não meramente com a sua forma legal. A substância das transações ou de outros acontecimentos nem sempre é consistente com o que é mostrada pela sua forma legal ou idealizada."

Desta forma tendo em conta o SNC, os movimentos contabilísticos, a documentação analisada e os respetivos extratos de contas, concluímos que as contas bancárias utilizadas pelo sujeito passivo A..., SA, são ativo da entidade e nas análises e correções que se seguem são tratados como tal (Anexo III).

 

III.1.2. GASTOS E PERDAS NÃO ACEITES

III.1.2.1 PERDAS POR IMPARIDADE

Do exame à Demonstração de Resultados verificou-se que a rubrica Imparidade de Dívidas a Receber (perdas/reversões) apresenta um saldo no valor de 135.329,77€.

No dia 20 de Junho de 2018 através de notificação pessoal no ponto 2- Imparidades solicitámos: (Anexo IV):

"2.1-... cópia de toda a documentação de suporte ao reconhecimento de imparidades em contas de gastos em 2014 no valor de 135.329.77€.

2.2- Deve ainda indicar de acordo com a NCRF27, quais foram os indícios detetados para o reconhecimento das imparidades, e referir de acordo com o código do IRC, artigos 28.º A e 28.º B, quais são as alíneas aplicadas a cada caso em específico."

Até à data da elaboração do presente projeto de relatório, não foi rececionado qualquer elemento solicitado através da nossa notificação pessoal de 20 de Junho de 2018 (Anexo V).

Com recurso ao ficheiro SAF-T extraímos o lançamento n.º 130008, do diário n.º 60, onde de acordo com o descritivo foi efetuado o lançamento de "Provisão de Clientes Incobráveis", como se pode ver no seguinte quadro:

 

 

De acordo como o preconizado no n.º 1 do artigo 28.ºA do CIRC, apenas podem ser deduzidas para efeitos fiscais perdas por imparidade contabilizadas no mesmo período de tributação ou em períodos de tributação anteriores, nomeadamente, as relacionadas com créditos resultantes da atividade normal que possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade (alínea a); as relativas a recibos por cobrar reconhecidas pelas empresas de seguros (alínea b).

Por forma a validar o cumprimento do disposto nos artigos 28.ºA e 28.ºB do CIRC, solicitaram-se todos os documentos de suporte através de notificação pessoal datada de 20/06/2018, e até à data da elaboração do presente relatório, não foi rececionado qualquer elemento.

Atento o disposto no artigo 28.ºA do CIRC, verifica-se que esse preceito legal estabelece determinadas condicionantes no que toca aos créditos de cobrança duvidosa. Para o efeito, o n.º 1 do artigo 28.ºB do mesmo código, dispõe que para determinação das perdas por imparidade previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 28.ºA do CIRC, consideram-se créditos de cobrança duvidosa aqueles em que o risco de incobrabilidade esteja devidamente justificado, o que se verifica nos seguintes casos: a) O devedor tenha pendente processo de insolvência e de recuperação de empresas ou processo de execução; b) Os créditos tenham sido reclamados judicialmente ou em tribunal arbitrai; c) Os créditos estejam em mora há mais de seis meses desde a data do respetivo vencimento e existam provas objetivas de imparidade e de terem sido efetuadas diligências para o seu recebimento.

Ressalva-se que sobre os créditos em mora há mais de 6 meses (alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º B do CIRC), o n.º 2 do mesmo artigo refere que o montante anual acumulado da perda por imparidade de créditos aí referidos (na alínea o)) não pode ser superior às seguintes percentagens dos créditos em mora: a) 25% para créditos em mora há mais de 6 meses e até 12 meses; b) 50% para créditos em mora há mais de 12 meses e até 18 meses; c) 75% para créditos em mora há mais de 18 meses e até 24 meses; d) 100% para crédito em mora há mais de 24 meses.

Apesar das notificações efetuadas, o sujeito passivo não apresentou qualquer prova (Anexo V) de que cumpriu os requisitos previstos na alínea a) do n.º 1 do artigo 28.ºA do CIRC e no n.º 1 e 2 do artigo 28.º B do CIRC, nomeadamente a sua relação com a atividade e o tempo em que os créditos se encontram em mora, e diligências efetuadas pela A..., SA. Desta forma, não estando reunidos os requisitos que permitem a aceitação do gasto em imparidade, deve ser acrescido ao Q07 da modelo 22 o valor de 135.329,77€.

 

III.1.2.2 PROVISÕES

Do exame à Demonstração de Resultados verificou-se que a rubrica Imparidade de dívidas a receber (perdas/reversões) apresenta um saldo no valor de 172.634,20€.

No dia 20 de Junho de 2018 através de notificação pessoal no ponto 3- Provisões solicitámos: (Anexo IV): "3.1-.... cópia de toda a documentação de suporte ao reconhecimento no período de gastos em provisões para processos judiciais em curso no valor de 172.634.20€.

3.2- Deve ainda fazer prova de acordo com a NCRF21, da existência dos critérios cumulativos, para que seja reconhecido como gasto, e referir o seu enquadramento de acordo com o código do IRC."

Até à data da elaboração do presente relatório, não foi rececionado qualquer elemento solicitado na nossa notificação pessoal de 20 de Junho de 2018 (Anexo V), Com recurso ao ficheiro SAF-T, extraímos a composição da conta 679- Processos judiciais em curso onde se evidência a sua composição:

 

De acordo como o preconizado no n.º 1 do artigo 39.º do CIRC, podem ser deduzidas para efeitos fiscais aí seguintes provisões:

"a) As que se destinem a fazer face a obrigações e encargos derivados de processos judiciais em curso por factos que determinariam a inclusão daqueles entre os gastos do período de tributação;

b) As que se destinem a fazer face a encargos com garantias a clientes previstas em contratos de venda e de prestação de serviços;

c) As provisões técnicas constituídas obrigatoriamente, por força de normas emanadas pelo Instituto de Seguros de Portugal, de carácter genérico e abstracto, pelas empresas de seguros sujeitas à sua supervisão e pelas sucursais em Portugal de empresas seguradoras com sede em outro Estado membro da União Europeia;

d) As constituídas com o objetivo de fazer face aos encargos com a reparação dos danos de caráter ambiental dos locais afetos à exploração, sempre que tal seja obrigatório nos termos da legislação aplicável e após a cessação desta."

 

Ressalva-se que para a constituição das provisões (n.º 2 do artigo 39.º do CIRC), deve ter por base aí condições que existem no final do período de tributação.

No que concerne ao enquadramento contabilístico de acordo com a NCRF 21 parágrafo § 13: ".... uma provisão só deve ser reconhecida quando cumulativamente:

(a) Uma entidade tem uma obrigação presente, legal ou construtiva, como resultado de um acontecimento passado;

(b) É provável que seja exigido um exfluxo de recursos incorporando benefícios económicos ou potencial de serviço para pagar essa obrigação;

(c) Pode ser feita uma estimativa fiável da quantia dessa obrigação."

Apesar das notificações efetuadas, o sujeito passivo não apresentou qualquer prova (Anexo V) de que cumpriu os requisitos na NCRF 21 e os requisitos do artigo 39.º do CIRC. Desta forma, não estando reunidos os requisitos que permitem a aceitação do gasto em provisões, deve ser acrescido ao Q07 da modelo 22 o valor de 172.634.20€.

 

III.1.2.3 E...

No dia 20 de Junho de 2018 através de notificação pessoal no ponto 17 E... solicitamos o seguinte esclarecimento: (Anexo IV):

"Através do lançamento n.º 10006 no diário n.º 60 em 31-01-2014, com a descrição " Sentença do tribunal", foi reconhecido na conta de gastos 626351- Seguros - r. viat- aceite pela, o valor de 40.000€.

17.1- Solicito o documento de apoio ao lançamento contabilístico e a respetiva sentença do tribunal que deu origem ao reconhecimento do gasto.

17.2- Foi reconhecido em anos anteriores, alguma provisão para este gasto? Se foi, solicito cópia do documento contabilístico"

 

 

 

Com recurso ao ficheiro SAF-T, podemos aceder ao extrato de conta da conta ...  E...:

 

Se estamos de facto perante uma sentença do tribunal, o sujeito passivo tem direito a reconhecer uma provisão para processos judiciais em curso, dedutível para efeitos fiscais, nos termos do artigo 39.º nº 1 do IRC. No entanto de acordo com o artigo 18.º do CIRC, "os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica."

Importa ainda salientar que a conta de passivo 293- Provisões para processos judiciais em curso, no ano de 2013 é constituída com o valor de 331.239.36€, e no ano em análise é novamente reforçada em 170.976.20€, apresentando um saldo no final de 2014 de 502.215.56€. Questionamos o sujeito passivo, com o objetivo de validar se o valor de 40.000€ reconhecido em gasto em 2014, não deveria ter sido desreconhecido pela conta 293- Provisões para processos judiciais em curso, por forma a não existir duplicação de gastos, não obtivemos qualquer resposta.

Apesar das notificações efetuadas, o sujeito passivo não apresentou qualquer prova (Anexo V) de que cumpriu os requisitos na NCRF 21 e os requisitos dos artigos 18.º e 39.º do CIRC. Desta forma, não estando reunidos os requisitos que permitem a aceitação do gasto, deve ser acrescido ao Q07 da modelo 22 o valor de 40.000.00 €.

(...)

 

III.1.2.6 DEPRECIAÇÕES NÃO ACEITES

Do exame ao balancete analítico da sociedade observou-se que a conta 642142 Amort. Equip. Transp. NI Aceites Tot. apresenta um valor de €29.296.72, reconhecido como gasto. A conta tem os seguintes movimentos, extraídos do ficheiro SAF-T:

 

De acordo com o Modelo 22 Q07 no campo 719- Perdas por imparidade de ativos não correntes (art.º 31." - B) e depreciações e amortizações (art.º 34.º, n.º 1), não aceites como gasto, o valor acrescido foi de 6812.30€, o que comparado com o valor reconhecido na conta 642142 Amort. Equip. Transp. N/ Aceites Tot. no valor de €29.296.72 apresenta uma diferença no valor de 22.484.42€.

Assim deve ser acrescido ao Q07 no campo 719- Perdas por imparidade de ativos não correntes (art.º 31.º - B) e depreciações e amortizações (art.º 34.º, n.º 1), não aceites como gasto, o valor de 22.484.42€, correspondente a depreciações e amortizações, não aceites com gasto fiscal, de acordo com os cálculos efetuados pelo sujeito passivo.

 

III.1.2.7 C...

No dia 20 de Junho de 2018 através de notificação pessoal no ponto 14 C... solicitámos o seguinte esclarecimento: (Anexo IV)

"14.3- Em 31-12-2014 através do lançamento do doc. N.º 120007 através do diário 60 foi creditada a conta banco ...-C..., por contrapartida da conta 27811008- C..., no montante de 421.976,03€. Solicito cópia do documento que serviu de base ao lançamento contabilístico e explicação por que motivo há a transferência deste valor para uma entidade com sede em ... ."

 

 

No dia 25 de Julho de 2018, para dar cumprimento ao art.º 23.º-A, n. 1 alínea r) e n.º 8 repetimos a notificação pessoal, quanto ao ponto acima referido, onde estipulamos o prazo de entrega de documentação e/ou esclarecimentos para o dia 27/08/2018, no entanto não foi prestado qualquer esclarecimento (Anexo VI).

De acordo com o artigo 23.º-A do CIRC:

"1) Não são dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável os seguintes encargos, mesmo quando contabilizados como gastos do período de tributação: [...]

r)As importâncias pagas ou devidas, a qualquer titulo, a pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português, e aí submetidas a um regime fiscal identificado por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças como um regime de tributação claramente mais favorável, salvo se o sujeito passivo provar que tais encargos correspondem a operações efetivamente realizadas e não têm um caráter anormal ou um montante exagerado.[...]"

A entidade C... com o NIF..., tem o seu domicílio fiscal em ..., ... ,... . Através da consulta à Portaria n.º 150/2004 de 13 de Fevereiro, e lista republicada pela Portaria 292/2011, de 08/11, verificamos que, ... ocupa a 27.ª posição na lista, desta forma podemos concluir que estamos perante pagamentos efetuados a uma entidade com domicílio fiscal num país com regime de tributação privilegiada, claramente mais favorável.

de que cumpriu os requisitos da alínea r) do n. º1 do artigo 23.º-A do CIRC

Apesar das notificações efetuadas, o sujeito passivo não apresentou qualquer prova (Anexo VI), desta forma, não estando reunidos os requisitos mencionados na alínea r) do n.º1 do artigo 23.ºA do CIRC, está sujeito à taxa de tributação autónoma de 35% que corresponde ao valor de 147.691,61€ (421.976.03€ *35%) nos termos do artigo 88 n.º 8 do CIRC.

(...)

 

IX DIREITO DE AUDIÇÃO - FUNDAMENTAÇÃO

Conforme o disposto no art.º 60.º, n.º 4 da Lei Geral Tributária - LGT e art.º 60.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira - RCPITA, foi enviada por carta registada (RH ... PT) nosso ofício n.º..., de 10 de outubro de 2018, para a morada da sociedade A..., SA, a notificação para o exercício de audição sobre as correções propostas no projeto de conclusões do relatório.

No dia 06 de novembro de 2018, deu entrada nestes Serviços de Inspeção Tributaria da Direção de Finanças de Lisboa, n/ entrada n.º 2018..., exposição por parte do SP A..., SA, mediante o qual veio exercer o direito de audição, para o qual se remete e que aqui se dá por integralmente reproduzido, destacando-se, por facilidade de análise:

No documento que concretiza o exercício do direito de audição, o sujeito passivo junta: Anexo n.º I - Previsão de acréscimos de custos anuais de 2014;

Anexo n.º II - Vários recibos de vencimento

Anexo n.º III- Listagem com a descrição: Pagamento Ajudas de Custo de 15 janeiro (15-11-2014 a 15-12-2014);

Anexo n.º IV- Acordo efetuado com F..., SA

Anexo n.º V- Lista com números de processos judiciais em curso e mensuração respetiva.

Anexo n.º VI- Documento emitido pelo G..., RL, com a indicação dos processos relativos a várias entidades, nomeadamente A..., SA, com as seguintes indicações: Nº processo; valor da ação, Autor; Réu; Valor despendido em Documentos Únicos de Cobrança, e Estado atual do processo.

Anexo n.º VIl- Cópia do Relatório da Inspeção aos anos de 2011 a 2013 da A..., SA referente às OI's n.ºs 2014..., 012014... e OI2015..., desta Direção de Finanças.

O direito de audição exercido pela A..., SA, encontra-se organizado da seguinte forma:

 

1º Ponto

1- Os Serviços de Inspeção Tributária de Lisboa propõem as seguintes correções à matéria coletável:

• No que respeita às correções relativas a períodos de tributação anterior no montante de 212.812,07 euros, salientamos o seguinte:

A empresa reconheceu acréscimos de gastos no montante de 300.775,62 euros, referente, ao subsídio de férias e férias de 2014 a pagar em 2015 e as ajudas de custo de dezembro de 2014 processadas no recibo de vencimento de janeiro de 2015. Este saldo é composto da seguinte forma:

 

 

Vencimentos brutos de dezembro de 2014-------    89.315,00 euros

Encargos Segurança Social (23,75%) ----------     21.212,31 euros

Total Acréscimo de férias ------------------------   110.527,31 euros

Vencimentos brutos de dezembro de 2014 -----    89.315,00 euros

Encargos Segurança Social (23,75%) ---------    21.212.31 euros

Total Acréscimo Subsídio de férias ------------   110.527,31 euros

Total Ajudas de Custo (Recibos janeiro 2015) - 79.721,00 euros

Total (Acréscimo de gastos)--------------------   300,775.62 euros

 

Salientamos ainda, que a empresa efetuou o registo deste acréscimo pela diferença entre o saldo final da estimativa de 2013 de férias e subsídio de férias e o valor calculado para 2014, conforme demonstrado em cima.

Em anexo juntamos o processamento salarial de dezembro que serviu de base ao cálculo do subsídio de férias e férias, apresentado em cima (Anexo I), assim como os recibos de janeiro de 2015 (anexo II), que comprovam as ajudas de custo de dezembro de 2014 (Anexo III).

 

2º Ponto

Foi reconhecido na rubrica 626351 (Seguros — R. Viat. Aceite peia Tot.) o montante de 40.000 euros. Este montante diz respeito a um processo judicial (anexo IV) que resultou na condenação da empresa em 2014, e como tal, foi considerado como um gasto do exercício.

O montante inicial da rubrica de provisões, ascendia a 331.239,36 euros, o qual corresponde ao processo AAA... (.../14...T8US). No decorrer de 2014, foram acrescidos 170.976,20 euros correspondentes aos processos que contam do anexo V, ao qual não constam os 40.000 euros.

 

3º Ponto

• Provisões não dedutíveis ou para além dos limites legais (172.634,20 euros)

O montante em causa diz respeito, na sua maioria, ao reconhecimento como gasto de provisões de processos judiciais em curso. No Anexo V, segue a descrição dos processos em causa.

O montante inicial da rubrica de provisões, ascendia a 331.239,36 euros, o qual corresponde ao processo AAA...(.../14...T8LRS). No decorrer, de 2014, foram acrescidos 170.976,20 euros correspondentes aos processos que contam ao anexo V. Aproveitamos para anexar a carta do advogado com todos os processos judiciais em 2014 (anexo VI).

 

4º Ponto

• Perdas por imparidade de ativos não correntes e depreciações e amortizações (22.484,42 euros)

Este montante é relativo à rubrica 642142 Amort. Equip. Transp. N/Aceites Tot. (29.296,72 euros).

A diferença entre o valor em causa e o valor da rubrica (6.812,30 euros) foi acrescido no quadro 7 do modelo 22 de 2014, por se tratar de depreciações não aceites fiscalmente. O valor total da rubrica (29.296,72 euros) foi tributado autonomamente em 35% em 2014.

 

As viaturas em causa foram adquiridas em 2010, de acordo com o art.º 88 do CIRC, o valor aceite fiscalmente era de 40.000 euros, 10.000 euros por cada ano depreciado, tendo a empresa acrescido a diferença (6.812,30 euros).

 

5º Ponto

2- Os Serviços de Inspeção Tributária de Lisboa propõem a seguinte correção (Tributação Autónoma):

• Crédito da conta 12014 – A... em contrapartida da conta 278110008 - A... no montante de 121.976,03 euros. É proposto sujeitar esta transferência a uma taxa de tributação autónoma de 35% que corresponde ao valor de 147.691,61 euros.

Em nosso entendimento a tributação autónoma faz-se pelas faturas e não pelos saldos.

O valor em causa foi tributado no exercício de 2013.

A resolução do respetivo saldo foi acordada com o anterior inspector (ver Anexo VII)

Estamos perante dois critérios diferentes de dois inspetores. A continuar, serão tomadas as providências judiciais necessárias.

 

Análise do direito de audição:

1º Ponto. - O SP vem pela primeira vez explicar a composição da conta 272212- Remunerações a Liquidar.

De acordo com o SNC Explicado, 2722- Credores por acréscimos de gastos- Esta conta serve de contrapartida aos gastos a reconhecer no período, ainda que não tenham documentação vinculativa, cuja despesa só venha a incorrer-se em período ou períodos posteriores." Acrescenta ainda que é creditada "pelas quantias a registar pelos acréscimos de gestos a considerar no período (por débito das respetivas contas de gastos- classe 6). Exemplos: Seguros a liquidar, Remunerações a liquidar...".

Analisada a constituição do saldo da conta 2722- Credores por acréscimos de gastos, validamos o valor de 300.775.62€, que corresponde ao montante que deveria ter sido provisionado em 2014. E que apesar de aquando do processamento de férias e subsídio de férias a conta não ter sido debitada, por contrapartida de gastos (172.812,07€), respeitando assim a regra de movimentação das contas, não houve, duplicação de gastos, pois a estimativa efetuada de gastos de 2014 a pagar em 2015 foi reconhecida apenas pela diferença (127.963.55€).

Termos em que se aceita a justificação do SP quanto à correção proposta no ponto III.1.2.4 do presente relatório no valor de 172.812.07€.

 

2º Ponto:

Ponto 2.1 - O SP vem explicar os motivos pelos quais reconheceu na conta 626351- Seguros - r. viat-aceite pela Tot., o valor de 40.000€ referindo "o processo resultou de uma condenação da empresa em 2014, e como tal, foi considerado como gasto do exercício."

Para auxiliar a análise apresenta-se, um excerto do Acordo que constitui o anexo IV, do exercício do direito de audição:

 

Do Acordo importa salientar os seguintes pontos:

1 - O documento em anexo IV, é um Acordo, onde a A..., S.A, no 1º termo "aceita e confessa dever a A".

2- Não há indicação da data do Acordo, no entanto as referências a datas apenas constam no 3º termo quando diz "dia 08 de junho do ano corrente", na procuração forense datada de "20 de Maio de 2013" e a certificação digital da peça processual com data de "2013.06.03".

3- O Acordo apenas refere o processo nº .../08...TBLNH. Este processo não consta em anexo, nem no exercício do direito de audição é dado a conhecer o seu conteúdo.

Com o confessar de dívida, levanta várias questões:

• A dívida deste passivo já se encontrava registada na contabilidade no ano em que ocorreu?

• Em que ano é que ocorre o passivo e o gasto?

• Se a dívida se encontrava registada, não há direito de reconhecer um gasto com a assinatura do Acordo.

• Se a E... aceitou pagamento com a assinatura do Acordo, no valor de 40.000€ e se já havia sido reconhecido um passivo e um gasto em anos anteriores de montante superior, poderia ainda estar em falta o reconhecimento de um rendimento (pela diferença entre o valor em dívida e o valor efetivamente pago).

Todas estas questões não foram respondidas com o exercício do direito de audição.

De acordo com o 2º ponto do exercício de direito de audição, o sujeito passivo refere que o montante se trata de um processo judicial e diz respeito a uma condenação em 2014. De forma a validar a informação disponibilizada pelo SP verificamos os registos contabilísticos de 2013 e os registos contabilísticos de 2014 através do ficheiro SAF-T.

Em 2013 de encontro com o estipulado no Acordo, houve exfluxo de 1250,00€ mensais a favor da conta de terceiros, e em alguns meses em vez do desreconhecimento do passivo, foi reconhecido novamente um gasto, o que origina duplicação de gastos.

Ainda em 2013 foram efetuados diversos pagamentos nos montantes de 1250,00€ à entidade reconhecida na conta 2782100095- E..., que corresponde à conta utilizada para os pagamentos em 2014.

Em 2014 de acordo com os registos contabilísticos os pagamentos continuam a ser efetuados mensalmente, ver os quadros infra:

 

Verificamos que ao longo dos anos de 2013 e 2014 os lançamentos esporadicamente foram reconhecidos na conta de gastos, o que não é correto, pois o SP está a duplicar ou triplicar gastos, e não respeita o princípio da especialização.

Conclusão:

No 1º termo do Acordo o SP confessa que tem uma dívida, o que não significa necessariamente que tem um gasto. De acordo com o princípio da especialização, este passivo (dívida) já deveria estar registada no balanço quando ocorreu.

Apesar das várias notificações nunca foi provado, nem mesmo com o exercício do direito de audição, que o reconhecimento deste gasto cumpria os requisitos do art.º 23.º do IRC, e desta forma era um gasto dedutível para efeitos fiscais.

Com os factos explanados nos pontos anteriores, é dado como provado que o Acordo Judicial é referente ao ano de 2013. Caso o gasto cumprisse os requisitos para ser aceite fiscalmente, dados não provados pelo SP, este seria em 2013 e não em 2014 de acordo com o princípio da especialização do art.º 18 do IRC.

Face à resposta e aos elementos apresentados no exercício do direito de audição, mantém-se a correção proposta no ponto III.1.2.3 do presente relatório no valor de 40.000,00€, em sede de IRC, de acordo com a NCRF 21 e os requisitos dos artigos 18.º, 23.º e 39.º do CIRC

3º Ponto - O SP vem explicar a composição da rubrica provisões. Junta como anexo (Anexo IV do Direito de audição) uma carta de uma sociedade de advogados, enviada ao ROC, referente às entidades detidas pelo acionista D ... Como Anexo V (do direito de audição). Junta ainda um documento onde valoriza a composição da conta Provisões.

Na análise dos anexos IV e V (ambos do exercício do direito de audição), importa salientar os seguintes pontos:

• Anexo IV (do direito de audição), contém as seguintes informações: valor da ação, autor, réu, valor despendido em documentos únicos de cobrança e o estado atual do processo. Quanto ao conteúdo do processo, risco associado e parecer técnico é omisso. Ainda na pagina 37 do mesmo, reforça, "No que respeita às acções judiciais em curso, cumpre-nos informar que, atenta a natureza dos processos pendentes e as questões de facto e de direito que neles se discutem, não é possível afirmar, com um grau de probabilidade razoável, a qual a estimativa final de responsabilidades, incluindo custas judiciais e outros encargos," [negrito nosso]. Com a análise deste parágrafo, verifica-se que não estão reunidas as condições previstas na NCRF 21, no parágrafo 13, quanto à estimativa e probabilidade.

• O documento contém informações de processos relativos às seguintes entidades: A..., SA, H...- Sucursal em Portugal, I..., B..., SA e J... .

«Nos processos em que a A... SA, é Réu junto com outras entidades, não é indicado qual o montante da obrigação de cada entidade. E em comparação com o documento que consta como anexo V (do exercício do direito de audição), verificamos que a A..., SA, reconhece como provisão a totalidade do valor indicado pelos advogados como valor da ação. Nomeadamente os processos n.ºs 2012 .../12... TTTVD, 2013 .../13... TTTVD, 2013 .../13...TTLRS.

• O Modelo 30- MAPA DE PROVISÕES, PERDAS POR IMPARIDADE EM CÉDITOS E AJUSTAMENTOS EM INVENTÁRIOS, que deveria constar no dossier fiscal, nunca foi disponibilizado pelo sujeito passivo. Importa salientar que apesar de ser imprescindível em matéria de provisões, não consta em nenhum dos anexos apresentados no exercício do direito de audição.

Conclusão:

Apesar do exercício do direito de audição conter dois anexos relacionados com provisões, nenhum deles demonstra e prova que foi respeitado o artigo 39.º, 40.º e 23.º do CIRC e a NCRF 21. Assim não estão reunidos os requisitos que permitem o reconhecimento de um gasto em provisões dedutível para efeitos fiscais, mantém-se a correção de 172.634,20€, prevista no ponto III.1.2.2. deste relatório.

4º Ponto - O SP vem explicar a composição da rubrica 642142 Amort. Equip. Transporte N/Aceites Tot, através de um quadro onde indica o ano de aquisição de cada viatura que compõe a rubrica, a vida útil, a amortização praticada, o valor que entende ser dedutível e o montante que indica como sendo não aceite para efeitos fiscais, indica que efetuou depreciações às viaturas ..., ... e ..., perfazendo um total de 29.296,72 e acresceu ao modelo 22 o montante de 6.812,30 que considera não ser aceite para efeitos.

Com análise da informação disponibilizada no exercício do direito de audição, importa salientar os seguintes pontos:

• Indica que o ano de aquisição das viaturas é em 2010, no entanto não indica o mês;

• É omisso quanto à data de início e fim da depreciação das viaturas;

• Indica que a vida útil definida são 4 anos, que de acordo com o sujeito passivo são 2010, 2011, 2012 e 2013, assim, não haveria lugar ao reconhecimento de gasto pois a vida útil terminou em 2013;

• Não juntou as fichas individuais e respetivas faturas de cada viatura, por forma a validar as informações prestadas;

• O Modelo 32- MAPA DE DEPRECIAÇÕES E AMORTIZAÇÕES, que deve constar no dossier fiscal, não foi disponibilizado, conforme solicitado nas várias notificações, nem consta como anexo no exercício do direito de audição;

Conclusão:

Apesar do exercício de direito de audição conter alguma informação relativa às viaturas em análise, a mesma mostra-se insuficiente, pois o SP não provou que o gasto reconhecido respeita os artigos 23.º, 29.º a 31.º e 34.º do CIRC, conjugado com o Decreto Regulamentar (DR) 25/2009.

Não estando reunidos os requisitos que permitam o reconhecimento de um gasto dedutível para efeitos fiscais, mantém-se a correção no valor de 22.484,42€ conforme ponto III.1.2.6 deste relatório.

5º Ponto - O SP vem afirmar que não concorda com a aplicação da tribulação autónoma e junta em anexo VII - Cópia do Relatório da Inspeção aos anos de 2011 a 2013 da A..., SA referente às Ol's n.ºs 012014..., OI2014... e OI2015..., desta Direção de Finanças.

Com análise da informação disponibilizada no exercício do direito de audição, importa salientar os seguintes pontos:

O sujeito passivo foi notificado em 20 de Junho de 2018 através de notificação pessoal no ponto 14 C..., solicitámos esclarecimento sobre as transferências de dinheiro para uma entidade com sede em ... . Como não obtivemos qualquer resposta no dia 25 de Julho de 2018, para dar cumprimento ao art.º 23.º- A, n.º 1, alínea r) e n.º 8 repetimos a notificação pessoal, da qual também não foi obtida resposta.

• O sujeito passivo no exercício do direito de audição indica:

1-" ...Em nosso entendimento a tributação autónoma faz-se pelas faturas e não pelos saldos..."

2- "A resolução do respetivo saldo foi acordada com o anterior inspetor (Ver Anexo VII) ..."

3- " Estamos perante dois critérios diferentes de dois inspetores. A continuar, serão tomadas as providências judiciais necessárias"

Quanto ao subponto 1, "...Em nosso entendimento a tributação autónoma faz-se pelas faturas e não pelos saldos..." importa salientar que;

De acordo com o artigo 23.º A do CIRC:

"1) Não são dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável os seguintes encargos, mesmo quando contabilizados como gastos do período de tributação: [...]

r)As importâncias pagas ou devidas, a qualquer titulo, a pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português, e ai submetidas a um regime fiscal identificado por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças como um regime de tributação claramente mais favorável, salvo se o sujeito passivo provar que tais encargos correspondem a operações efetivamente realizadas e não têm um caráter anormal ou um montante exagerado[...]" [NEGRITO NOSSO]

E nos termos do artigo 88.º n.º 8:

"São sujeitas ao regime do n.º 1 ou do n.º 2, consoante os casos, sendo as taxas aplicáveis, respetivamente, 35 % ou 55 %, as despesas correspondentes a importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável, tal como definido nos termos do Código, salvo se o sujeito passivo puder provar que correspondem a operações efetivamente realizadas e não têm um caráter anormal ou um montante exagerado. [NEGRITO NOSSO].

Com a transcrição dos artigos que se aplicam ao caso em concreto, constatamos que a tributação não se faz nem pelas faturas nem pelos saldos, mas sim pelas " importâncias pagas ou devidas".

Quanto ao subponto 2 " A resolução do respetivo saldo foi acordada com o anterior inspetor (Ver Anexo VII) ...", importa referir que:

- O saldo da conta 278110008- C..., em 01/01/2014 corresponde a 0.006, conforme se pode validar no seguinte quadro, retirado do ficheiro SAF-T de 2014:

 

Assim podemos afirmar que não existia qualquer saldo pendente de 2013, e o que estamos a sujeitar a tributação autónoma nos termos do artigo 88.º n.º 8 do CIRC, é o valor transferido em 31/12/2014 que corresponde ao movimento contabilístico n.º 120007 do diário 60.

Quanto ao subponto 3, "Estamos perante dois critérios diferentes de dois inspetores. A continuar, serão tomadas as providências judiciais necessárias":

Não cabe neste Relatório de Inspeção pronunciarmo-nos acerca períodos de inspeção distintos do ano objeto da presente ação - OI2015... do de ordens de serviço referentes a ano 2014.

Conclusão:

O sujeito passivo não apresentou prova de que as transferências "correspondem a operações efetivamente realizadas e não têm um caráter anormal ou um montante exagerado" (art 88.º n.º 8 CIRC), desta forma mantemos a correção referente a imposto/ tributação autónoma, no valor de 147.691,61€ conforme ponto III.1.2.7 do presente relatório.

No que concerne às restantes correções propostas em projeto de relatório, a A..., SA não faz qualquer referência em direito de audição.

X CONCLUSÃO

MATÉRIA COLETÁVEL

Tendo presente os factos e fundamentos que estiveram na origem das correções propostas e após análise dos pontos apresentados em sede de direito de audição, será de atender à pretensão do sujeito passivo apenas quanto à correção do ponto III.1.2.4 do presente relatório no valor de 172.812,07€, mantendo-se a restante correção aritmética à matéria tributável no valor de 422.948,39€, de acordo com o seguinte quadro:

 

TRIBUTAÇÃO AUTÓNOMA

Tendo presente os factos e fundamentos que estiveram na origem das correções propostas e após análise dos pontos apresentados em sede de direito de audição, não será de atender à pretensão do sujeito passivo mantendo-se a correção do ponto III.1.2.7 que totaliza € 147.691,61 de imposto.

 

B)           Na sequência da inspecção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação de Imposto de IRC e tributações autónomas que consta do documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

C)           Em 31-12-2014, a Requerente registava um saldo de €135.329,77 na rubrica Imparidade de Dívidas a Receber, 31 de Dezembro de 2014;

D)           Os procedimentos da Requerente relativamente a tais créditos eram os seguintes: passada a data de vencimento das faturas (normalmente, 2 meses), a Contabilidade pedia ao sector de Tráfego (trabalhadores da empresa que têm contacto mais directo com os Clientes e, entre outras funções, angariam Clientes e transportes para a Requerente) para contactar os devedores, solicitando o pagamento dos valores em dívida (depoimentos das testemunhas K..., L... e M...);

E)            Quando os trabalhadores do Tráfego não conseguiam que o pagamento fosse realizado, davam essa informação à Contabilidade, que se encarregava depois de passar os processos para o Contencioso (depoimentos das testemunhas K..., L... e M...);

F)            A maioria dos contactos com os devedores era realizada telefonicamente, não existindo prática de enviar cartas registadas aos devedores (depoimentos das testemunhas K..., L... e M...);

G)           Quase todos os valores em dívida eram depois enviados para cobrança judicial se os devedores não estivessem insolventes (depoimentos das testemunhas K..., L... e M...);

H)           No presente processo a Requerente apresentou documentos relativamente aos seguintes créditos que estão subjacentes ao referido valor de perdas por imparidade, relativamente aos quais as respectivas empresas foram declaradas insolventes:

i. N..., Lda. (€ 12.900,00)

Os valores em causa respeitam a faturas emitidas entre 29/09/2010 e 25/11/2010, todas com prazo de vencimento de dois meses.

Em Maio de 2011, a sociedade foi declarada insolvente, sendo que em Abril de 2012 o processo foi encerrado por insuficiência da massa insolvente (Documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

 

ii. O..., SA (€ 6.890,64)

 Os valores em causa respeitam a faturas emitidas entre 30/06/2008 e 30/11/2009, todas com prazo de vencimento de dois meses.

Em Maio de 2011, o processo de insolvência foi encerrado por insuficiência da massa insolvente (Documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

 

iii. P..., Lda (€ 10.010,00)

Os valores em causa respeitam a faturas emitidas entre 27/02/2009 e 13/05/2009, todas com prazo de vencimento de dois meses.

Em Abril de 2011, o processo de insolvência foi encerrado por insuficiência da massa insolvente (Documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

 

iv. Q... (€ 2.040,00)

O valor em causa respeita a uma fatura emitida em 28/01/2009, com prazo de vencimento de 2 meses.

Em Maio de 2011, o processo de insolvência foi encerrado por homologação de plano de insolvência (Documento n.º 7 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

 

v. R...(€ 2.607,80)

O valor em causa respeita a faturas emitidas em 24/01/2012 e em 13/03/2012, com prazo de vencimento de 2 meses.

A empresa viria a ser declarada insolvente em Novembro de 2016, por insuficiência da massa insolvente, em processo iniciado em 2015 (Documento n.º 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

 

vi. S..., Lda. (€ 1.080,00)

Os valores em causa respeitam a faturas emitidas em Abril de 2009, com prazo de vencimento de dois meses.

A sociedade devedora foi declarada insolvente e foi apenas em Junho de 2017 que foi encerrado o processo, iniciado em 2012, por ter sido elaborado o rateio final (Documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

 

vii. T..., Lda. (€ 18.120,00)

Os valores em causa respeitam a faturas emitidas em Março e Abril de 2010, com prazo de vencimento de dois meses.

A sociedade devedora foi declarada insolvente em abril de 2014 (Documento n.º 10 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

 

viii. U..., Lda (€ 4.110,00)

O valor em causa respeita a faturas emitidas entre 31/03/2010 e 23/04/2010, com prazo de vencimento de 2 meses.

Em Março de 2011, a sociedade devedora foi declarada insolvente (Documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral);

 

ix. V..., Lda. (€ 2.029,25)

O valor em causa respeita a faturas emitidas entre 09/02/2011 e 21/03/2011, com prazo de vencimento de 2 meses.

Em Novembro de 2013, a sociedade devedora foi declarada insolvente (Documento n.º 12, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

 

x. W..., Lda. (€ 3.856,50)

O valor em causa respeita a faturas emitidas entre 25/11/2010 e 28/02/2011, com prazo de vencimento de 2 meses.

Em Fevereiro de 2013, a sociedade devedora foi declarada insolvente (Documento n.º 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

 

xi. X..., Lda. (€ 3.567,00)

O valor em causa respeita a faturas emitidas entre 04/01/2011 e 07/01/2011, com prazo de vencimento de 2 meses.

Em processo iniciado em 2012, a sociedade devedora foi declarada insolvente, antes de 11-03-2013 (Documento n º 14 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

 

xii. Y... SL (€ 2.200,00)

O valor em causa respeita a faturas emitidas em Março de 2012, com prazo de vencimento de 2 meses.

Em 2013, a sociedade devedora foi declarada insolvente (Documento n.º 16, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

 

xiii. Z... (€ 1.700,00)

O valor em causa respeita a faturas emitidas em setembro de 2011, com prazo de vencimento de 2 meses.

Durante 2014, a sociedade devedora foi declarada insolvente (Documento n.º 17, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

 

 

I)             No presente processo a Requerente apresentou documentos relativamente aos seguintes créditos que estão subjacentes ao referido valor de perdas por imparidade, relativamente aos quais foram apresentadas injunções:

                i. AA... (€ 7.294,83) ( )

O valor em causa respeita a faturas emitidas em junho de 2012, com prazo de vencimento de 2 meses.

Em 24-10-2014, a Requerente formulou um pedido de injunção com o intuito de receber o montante em dívida da sociedade devedora (Documento n.º 18 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

 

ii. BB... (€3.848,88)

O valor em causa respeita a faturas emitidas em Abril de 2010, com prazo de vencimento de 2 meses.

Em 24-02-2015, a Requerente apercebeu-se da dificuldade em liquidar a respetiva dívida, devido à dificuldade de cobrabilidade, e fez um pedido de injunção em 2015 com o intuito de receber o montante em dívida da sociedade devedora (Documento n.º 19 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido)

 

J)            Relativamente às seguintes empresas foram realizadas diligências tendo em vista a cobrança de facturas indicadas no documento n.º 20 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido:

             CC..., Lda (€264,00)

             DD..., S.A. (€ 8.630,51)

             EE..., Lda (€ 1.650,00)

             FF... (€ 300,00)

             GG... (€ 592,9o)

             HH... (€ 605,00)

             II..., S.A, (€ 6.630,80)

             JJ..., S.A. (€ 250,58)

             KK..., Lda (€ 624,00)

             LL..., SA (€ 1.287,93)

             MM..., Unipessoal, Lda (€ 1.798,88)

             NN..., Lda (€ 8.773,02)

             OO..., SA (€ 4.939,50)

             PP..., Lda (€ 1.137,75)

             QQ... (€ 4.400,00)

             RR… BV (€ 3.600,00)

             SS... SL (€ 440,00)

             TT... (€ 3.100,00)

             UU..., SA (€ 650,00)

             VV..., SL (€ 1.900,00)

             WW..., SL (€ 600,00)

             XX..., SL (€ 500,00)

             YY..., SL (€ 400,00);

K)           Todas as dívidas relativamente às quais foram registadas perdas por imparidade se reportam à actividade normal da empresa;

L)            A Requerente registou sempre lucro tributável, nos anos anteriores a 2014;

M)          A lista de processos judiciais em curso em 31-12-2014 consta do documento n.º 21 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;

N)           A Requerente efectuou provisões com base nos valores dos processos judiciais referidos (documentos n.ºs 23 a 33, 34, 35, 36, 38 e 39 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);

O)           Em 31-12-2014, foi creditada a conta banco #32014- C..., por contrapartida da conta #27811008-C..., no montante de €421.976,03;

P)           A Requerente utilizou uma conta da empresa C..., domiciliada em ... para pagar despesas da própria Requerente, que utilizou como se fosse da própria Requerente, inclusivamente efectuando na sua contabilidade os lançamentos correspondentes à movimentação dessa conta;

Q)           Nessa conta a Requerente recebeu quantias pagas pelos seus clientes, pagou aos seus trabalhadores, pagou rendas dos seus veículos, pagou combustíveis e demais despesas da empresa;

R)           A Requerente, nas datas em que utilizou a conta da C... tinha as suas contas bancárias penhoradas por um cliente estrangeiro, na sequência de um processo judicial que correu termos na Alemanha e cuja sentença foi declarada executória em Portugal (Processo nº 4.../14....T8LRS, cuja decisão consta do documento n.º 22 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

S)            Não foi recebida pela Requerente, no período em causa, qualquer factura emitida pela empresa C... nem ocorreu a emissão de facturas àquela entidade;

T)            Em 18-04-2019, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.

 

 

2.2. Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto

 

Os factos provados baseiam-se no processo administrativo e nos documentos juntos pela Requerente cuja correspondência à realidade e, nos pontos indicados, nos depoimentos das testemunhas.

As testemunhas aparentaram depor com isenção e com conhecimento dos factos que relataram.

Não se provou relativamente a alguma das empresas declaradas insolventes, os seus sócios se tenham comprometido a pagar os valores em dívida. Embora a Requerente alegue isso, não foi apurada qualquer situação concreta em que isso tenha sucedido.

 

3. Matéria de direito

 

A Requerente impugna a liquidação quanto a cinco correcções:

 1) Perdas por imparidade

2) Provisões

3) Gasto relativo à E...

4) Depreciações não aceites

5) Tributação autónoma

 

3.1. Questão das perdas por imparidade

 

Os artigos 28.º-A e 28.º-B do CIRC estabelecem o seguinte, no que aqui interessa:

 

 

Artigo 28.º-A

 

Perdas por imparidade em dívidas a receber

 

1 - Podem ser deduzidas para efeitos fiscais as seguintes perdas por imparidade, quando contabilizadas no mesmo período de tributação ou em períodos de tributação anteriores:

 

a) As relacionadas com créditos resultantes da atividade normal, incluindo os juros pelo atraso no cumprimento de obrigação, que, no fim do período de tributação, possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade;

Artigo 28.º-B

 

Perdas por imparidade em créditos

 

1 - Para efeitos da determinação das perdas por imparidade previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, consideram-se créditos de cobrança duvidosa aqueles em que o risco de incobrabilidade esteja devidamente justificado, o que se verifica nos seguintes casos:

a) O devedor tenha pendente processo de execução, processo de insolvência, processo especial de revitalização ou procedimento de recuperação de empresas por via extrajudicial ao abrigo do Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (SIREVE), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 178/2012, de 3 de agosto;

b) Os créditos tenham sido reclamados judicialmente ou em tribunal arbitral;

c) Os créditos estejam em mora há mais de seis meses desde a data do respetivo vencimento e existam provas objetivas de imparidade e de terem sido efetuadas diligências para o seu recebimento

 

2 - O montante anual acumulado da perda por imparidade de créditos referidos na alínea c) do número anterior não pode ser superior às seguintes percentagens dos créditos em mora:

 

a) 25 % para créditos em mora há mais de 6 meses e até 12 meses;

b) 50 % para créditos em mora há mais de 12 meses e até 18 meses;

c) 75 % para créditos em mora há mais de 18 meses e até 24 meses;

d) 100 % para créditos em mora há mais de 24 meses.

 

A Inspecção Tributária constatou que a rubrica Imparidade de Dívidas a receber (perdas/reversões) apresentava um saldo no valor de € 135.329,77 e notificou a Requerente para juntar a respectiva documentação de suporte e «ainda indicar de acordo com a NCRF27, quais foram os indícios detetados para o reconhecimento das imparidades, e referir de acordo com o código do IRC, artigos 28.º A e 28º B, quais são as alíneas aplicadas a cada caso em específico».

Na sequência da falta de resposta da Requerente, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que «o sujeito passivo não apresentou qualquer prova (Anexo V) de que cumpriu os requisitos previstos na alínea a) do n.º 1 do artigo 28.ºA do CIRC e no n.º 1 e 2 do artigo 28.º B do CIRC, nomeadamente a sua relação com a atividade e o tempo em que os créditos se encontram em mora, e diligências efetuada pela A..., SA. Desta forma, não estando reunidos os requisitos que permitem a aceitação do gasto em imparidade, deve ser acrescido ao Q07 da modelo 22 o valor de 135.329,77€».

No presente processo, a Requerente apresentou facturas relativas a várias dívidas e a Autoridade Tributária e Aduaneira defendeu, além do mais, que parte delas deveriam ter sido imputadas a outros exercícios.

O princípio da especialização dos exercícios está previsto no artigo 18.º do CIRC, a que não é feita qualquer referência no Relatório da Inspecção Tributária, quanto a esta correcção relativa a perdas por imparidade (sendo feita quanto a outras correcções).

Assim, a referência que no Relatório da Inspecção Tributária se faz ao «tempo em que os créditos se encontram em mora» como obstáculo à aceitação das perdas por imparidade tem de ser interpretada como repostando-se apenas aos requisitos de tempo previstos no artigo 28.º-B do CIRC.

Sendo assim, a invocação do princípio da especialização dos exercícios não pode ser relevante neste contexto, pois trata-se de fundamentação a posteriori.

Na verdade, num contencioso de mera legalidade, como é o previsto no RJAT para os tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, em que se visa apenas a declaração de ilegalidade de actos dos tipos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1 do seu artigo 2.º, tem de se aferir da legalidade do acto impugnado tal como ocorreu, com a fundamentação que nele foi utilizada, não sendo relevantes outras possíveis fundamentações.

Por outro lado, sendo o conhecimento da fundamentação necessário para assegurar com efectividade o direito de impugnação contenciosa de actos lesivos, assegurado pelo artigo 268.º, n.º 4, da CRP, para aferir da suficiência da fundamentação tem de se atender apenas ao teor do acto impugnado e às remissões que dele constem expressamente, como impõe o n.º 3 do mesmo artigo, em que se estabelece que «os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos».

Assim, como é jurisprudência pacífica, a fundamentação relevante é apenas a contemporânea do acto, que antecede ou acompanha o acto e que dele conste directamente ou por remissão, sendo irrelevante a fundamentação a posteriori, inclusivamente a que é invocada no processo de impugnação contenciosa.

Assim, tendo sido invocados como específicos fundamentos da não aceitação da relevância fiscal das perdas por imparidade o não cumprimento dos «requisitos previstos na alínea a) do n.º 1 do artigo 28.ºA do CIRC e no n.º 1 e 2 do artigo 28.º B do CIRC, nomeadamente a sua relação com a atividade e o tempo em que os créditos se encontram em mora, e diligências efetuadas» (parte final do ponto III.1.2.1 do Relatório da Inspecção Tributária), será à face destes fundamentos que é de apreciar esta questão.

Neste contexto é de notar que, embora aqui se faça referência ao «tempo em que os créditos se encontram em mora», a Autoridade Tributária e Aduaneira não estava a reportar-se ao princípio da especialização dos exercícios que invoca na sua Resposta, pois não é feita qualquer referência ao artigo 18.º do CIRC, a propósito das perdas por imparidade.

 

3.1.1. Provas objectivas de imparidade

 

A exigência de provas objectivas de imparidade que se faz na alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º-A do CIRC, foi introduzida no anterior artigo 36.º do CIRC pela redacção do Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho, não existindo na correspondente redacção anterior do artigo 35.º que, na alínea c) do n.º 1, referia quanto a este requisito da provisão para créditos de cobrança duvidosa apenas que «os créditos estejam em mora há mais de seis meses desde a data do respectivo vencimento e existam provas de terem sido efectuadas diligências para o seu recebimento».

O Decreto-Lei n.º 159/2009 concretizou a adaptação das «regras de determinação do lucro tributável às normas internacionais de contabilidade tal como adoptadas pela União Europeia, bem como aos normativos contabilísticos nacionais que visam adaptar a contabilidade a essas normas» (como se sintetiza no respectivo sumário).

Assim, não sendo incluído no CIRC qualquer conceito próprio de «provas objectivas de imparidade», a introdução deste conceito, utilizado nas normas contabilísticas sobre imparidade e incobrabilidade de activos financeiros, visou aplicar no âmbito das perdas por imparidade de créditos para efeitos de determinação do lucro tributável o conceito contabilístico, que é utilizado, nomeadamente, na IAS 39 e na NCRF 27.

De resto, por força do disposto no artigo 17.º, n.ºs 1 e 3, do CIRC, as regras de normalização contabilística são aplicáveis na determinação do lucro tributável, quando não há regras especiais deste Código que as afastem, pelo que também por esta via se conclui é de fazer apelo àquelas normas.

Nas referidas normas contabilísticas diz-se, além do mais, o seguinte, sobre esta matéria:

 

IAS 39

§ 59. Um activo financeiro ou um grupo de activos financeiros está com imparidade e são incorridas perdas por imparidade se, e apenas se, existir prova objectiva de imparidade como resultado de um ou mais acontecimentos que ocorreram após o reconhecimento inicial do activo (um «acontecimento de perda») e se esse acontecimento (ou acontecimentos) de perda tiver um impacte nos fluxos de caixa futuros estimados do activo financeiro ou do grupo de activos financeiros que possa ser fiavelmente estimado. Pode não ser possível identificar um único e discreto acontecimento que tenha causado a imparidade. Pelo contrário, o efeito combinado de vários acontecimentos pode ter causado a imparidade. As perdas esperadas como resultado de acontecimentos futuros, independentemente do grau de probabilidade, não são reconhecidas. A prova objectiva de que um activo financeiro ou um grupo de activos está com imparidade inclui dados observáveis que chamam a atenção do detentor do activo acerca dos seguintes acontecimentos de perda:

(a) significativa dificuldade financeira do emitente ou do obrigado;

(b) uma quebra de contrato, tal como um incumprimento ou relaxe nos pagamentos de juro ou de capital;

(c) o mutuante, por razões económicas ou legais relacionadas com as dificuldades financeiras do mutuário, oferece ao mutuário uma concessão que o mutuante de outra forma não consideraria;

(d) torna-se provável que o mutuário vá entrar em processo de falência ou outra reorganização financeira;

(e) o desaparecimento de um mercado activo para esse activo financeiro devido a dificuldades financeiras;

ou

(f) dados observáveis indicando que existe um decréscimo mensurável nos fluxos de caixa futuros estimados de um grupo de activos financeiros desde o reconhecimento inicial desses activos, embora o decréscimo ainda não possa ser identificado com os activos financeiros individuais do grupo, incluindo:

(i) alterações adversas no estado de pagamento dos mutuários do grupo (por exemplo, um número crescente de pagamentos atrasados ou um número crescente de mutuários de cartão de crédito que atingiram o seu limite de crédito e estão a pagar a quantia mínima mensal);

ou

(ii) as condições económicas nacionais ou locais que se correlacionam com os incumprimentos relativos aos activos do grupo (por exemplo, um aumento na taxa de desemprego na área geográfica dos mutuários, um decréscimo nos preços das propriedades para hipotecas na área relevante, um decréscimo nos preços do petróleo para activos de empréstimo a produtores de petróleo, ou alterações adversas nas condições do sector que afectem os mutuários do grupo).

 

NCRF 27

§ 25 – Evidência objetiva de que um ativo financeiro ou um grupo de ativos está em imparidade inclui dados observáveis que chamem a atenção ao detentor do ativo sobre os seguintes eventos de perda:

a) Significativa dificuldade financeira do emitente ou devedor;

b) Quebra contratual, tal como não pagamento ou incumprimento no pagamento do juro ou amortização da dívida;

c) O credor, por razões económicas ou legais relacionados com a dificuldade financeira do devedor, oferece ao devedor concessões que o credor de outro modo não consideraria;

d) Torne-se provável que o devedor irá entrar em falência ou qualquer outra reorganização financeira;

e) O desaparecimento de um mercado ativo para o ativo financeiro devido a dificuldades financeiras do devedor; ou

f) Informação observável indicando que existe uma diminuição na mensuração da estimativa dos fluxos de caixa futuros de um grupo de ativos financeiros desde o seu reconhecimento inicial, embora a diminuição não possa ser ainda identificada para um dado ativo financeiro individual do grupo, tal como sejam condições económicas nacionais, locais ou sectoriais adversas.

26 – Outros fatores poderão igualmente evidenciar imparidade, incluindo alterações significativas com efeitos adversos que tenham ocorrido no ambiente tecnológico, de mercado, económico ou legal em que o emitente opere.

 

 

3.1.2. Provas de terem sido efectuadas diligências

 

A alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º-B do CIRC permite considerar «créditos de cobrança duvidosa aqueles em que o risco de incobrabilidade esteja devidamente justificado», considerando-se como tal, além do mais, «os créditos estejam em mora há mais de seis meses desde a data do respetivo vencimento e existam provas objetivas de imparidade e de terem sido efetuadas diligências para o seu recebimento».

Esta alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º-B do CIRC exige provas «de terem sido efectuadas diligências» para recebimento dos créditos em mora, mas afigura-se que não limita os meios de prova da realização de diligências, designadamente não exigindo prova documental.

Na verdade, se é certo que quanto à imparidade se justifica a referência a «provas objectivas», por ser um conceito definido nas normas contabilísticas, também não haverá qualquer justificação aceitável para uma limitação dos meios de prova da realização de diligências de cobrança.

Desde logo, a regra geral em sede de procedimento tributário e processo de impugnação judicial é a da admissibilidade de qualquer meio de prova admitido em direito (artigos 72.º da LGT e 115.º do CPPT) e não se vislumbra qualquer razão atinente ao específico facto a provar que possa justificar limitação dos meios de prova, quando é manifesto que é normal que se façam diligências de cobrança através de contacto pessoal (será mesmo, provavelmente, o meio mais eficiente) e, por outro lado, nesta específica situação, nem sequer se trata de matéria que assuma relevância essencial a nível da definição dos direitos tributários que reclame especiais cautelas probatórias.

Com efeito, a realização de diligências de cobrança é um requisito de reconhecimento de perdas por imparidade de natureza manifestamente secundária (a perda, que é o facto tributário relevante, não deixa de ser suportada pelo facto de não existirem diligências de cobrança) que, à face das regras da experiência comum, só excepcionalmente não se verificará, pois é de presumir que os credores actuem tendo em vista a satisfação do seu próprio interesse diligenciando no sentido de procurarem cobrar os seus créditos em mora.

Aliás, a própria Autoridade Tributária e Aduaneira, a propósito da expressão semelhante que consta da alínea a) do n.º 2 do artigo 78.º-A do CIVA (na redacção da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de Dezembro), publicitou uma orientação genérica no sentido de que a exigência de objectividade das provas se reportar apenas à imparidade e não às diligências. (   )

De qualquer forma, se se interpretasse a referência a «provas objectivas», que consta daquela alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º-B do CIRC, como proibindo aos Tribunais a utilização de prova testemunhal e através de presunções para prova da realização de diligências de cobrança, esta norma seria materialmente inconstitucional, por violação dos princípios do direito à tutela judicial efectiva e da proporcionalidade (   ), já que não se pode afastar a possibilidade de existirem situações em que não seja possível prova documental e, por outro lado, nesta específica situação, nem sequer se trata de matéria que assuma relevância essencial a nível da definição dos direitos tributários que reclame especiais cautelas probatórias.

Neste caso, a realização de diligências para cobrança dos créditos subjacentes às perdas por imparidade foi assegurada pela prova testemunhal produzida, não havendo qualquer razão para duvidar da correspondência à realidade das afirmações feitas, pois, como se disse, até de presumir, à face das regras da experiência comum, que os credores diligenciem no sentido de procurarem cobrar os seus créditos.

 

3.1.3. Dívidas de clientes declarados insolventes

 

A Requerente indica no artigo 33.º do pedido de pronúncia arbitral as dívidas relativamente às quais foram reconhecidas perdas por imparidade por os devedores terem sido declarados insolventes.

Trata-se, em todos os casos, de dívidas relativas a facturas emitidas antes de 2012 e não é questionado que se trata de dívidas resultantes da actividade normal da Requerente.

As seguintes empresas foram declaradas insolventes ou tinham processos de insolvência pendentes em 31-12-2014, como se infere dos números dos processos judiciais referidos nos documentos juntos pela Requerente:

             N..., Lda. (€ 12.900,00) (processo n.º .../11...TBLRA)

             O..., SA (€ 6.890,64) (processo n.º .../09...TYLSB)

             P..., Lda (€ 10.010,00) (processo n.º .../10...TYVNG)

             Q... (€ 2.040,00) (processo n.º .../10...TBSRE)

             S..., Lda. (€ 1.080,00) (processo n.º .../12...TBTND)

             T..., Lda. (€ 18.120,00) (processo n.º .../12...TBBNV)

             U..., Lda (€ 4.110,00) (processo n.º .../10...TBLRA)

             V..., Lda. (€ 2.029,25) (processo n.º.../13...TBEVR)

             W..., Lda. (€ 3.856,50) (processo n. .../12...TBLRA)

             X..., Lda. (€ 3.567,00) (processo n.º .../12...TBFLG)

             Z... (€ 1.700,00) (procedimento n.º .../2012)

 

Relativamente à R... (€ 2.607,80), constata-se que o número do processo judicial indicado no documento n.º 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral, é .../15...T8STR, pelo que se infere que terá sido instaurado em 2015. Por isso, não se verifica em relação a este crédito o requisito previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 28.º-B do CIRC.

Quanto à empresa Y... SL (€ 2.200,00), o documento n.º 16 junto com o pedido de pronúncia arbitral não permite concluir que tivesse qualquer processo de insolvência pendente em 31-12-2014, pois não lhe faz qualquer referência.

Assim, procede o pedido de pronúncia arbitral quanto a créditos no valor global de € 66.303,39 e improcede quanto a créditos no valor de € 4.807,80.

 

3.1.4. Dívidas de clientes relativamente aos quais foram instaurados processos de injunção

 

Provou-se que relativamente aos seguintes clientes da Requerente AA... (€ 7.294,83) e BB... (€3.848,88), foram apresentados processos de injunção, pelo que se verifica o requisito de relevância fiscal das perdas por imparidade previsto na alínea b) do artigo 28.º-B do CIRC.

A Autoridade Tributária e Aduaneira refere na sua Resposta como obstáculo à relevância a não constituição das imparidades nos períodos em que se constatou o risco de incobrabilidade e a falta de prova de realização de diligências de cobrança.

No entanto, como se disse, a não observância do princípio da especialização dos exercícios não pode ser relevante como fundamento para a não aceitação da relevância fiscal por não ter sido invocado no Relatório da Inspecção Tributária e a exigência de prova de diligências de cobrança está prevista na alínea c) e não na alínea b) do n.º 1 do artigo 28.º-B. Aliás, a apresentação de requerimentos de injunção consubstancia, em si mesma, diligências de cobrança.

Procede, assim, o pedido de pronúncia arbitral quanto a estas perdas por imparidade, no valor global de € 11.143,71.

 

3.1.5. Dívidas de clientes relativamente aos quais foram realizadas diligências de cobrança

 

Relativamente às seguintes empresas foram realizadas diligências tendo em vista a cobrança de facturas indicadas no documento n.º 20 junto com o pedido de pronúncia arbitral, como foi referido pelas testemunhas inquiridas:

             CC..., Lda (€264,00)

             DD..., S.A. (€ 8.630,51)

             EE..., Lda (€ 1.650,00)

             FF... (€ 300,00)

             GG... (€ 592,90)

             HH... (€ 605,00)

             II..., S.A, (€ 6.630,80)

             JJ..., S.A. (€ 250,58)

             KK..., Lda (€ 624,00)

             LL..., SA (€ 1.287,93)

             MM..., Unipessoal, Lda (€ 1.798,88)

             NN..., Lda (€ 8.773,02)

             OO..., SA (€ 4.939,50)

             PP..., Lda (€ 1.137,75)

             QQ... (€ 4.400,00)

             RR… BV (€ 3.600,00)

             SS... SL (€ 440,00)

             TT... (€ 3.100,00)

             UU..., SA (€ 650,00)

             VV..., SL (€ 1.900,00)

             WW..., SL (€ 600,00)

             XX..., SL (€ 500,00)

             YY..., SL (€ 400,00)

 

Os obstáculos que a Autoridade Tributária e Aduaneira coloca à relevância fiscal destas perdas por imparidade são a falta de prova de diligências de cobrança e os créditos não terem sido registados contabilisticamente como créditos de cobrança duvidosa quando se tornou evidente que existia o risco de incobrabilidade.

Como se referiu, da prova testemunhal resulta que em relação a todas as dívidas foram realizadas diligências tendo em vista a cobrança.

Por outro lado, como se referiu a eventual inobservância do princípio da especialização dos exercícios não foi invocada no Relatório da Inspecção Tributária, pelo que não é atendível.

Procede, assim, o pedido de pronúncia arbitral quanto a estas perdas por imparidade no valor global de € 53 074,87.

 

3.2. Provisões

 

Para artigo 39.º do CIRC permite, além do mais, a dedução para efeitos fiscais de provisões «que se destinem a fazer face a obrigações e encargos derivados de processos judiciais em curso por factos que determinariam a inclusão daqueles entre os gastos do período de tributação».

«A determinação das provisões referidas no número anterior deve ter por base as condições existentes no final do período de tributação» (n.º 2 do mesmo artigo).

Nos pontos em que não se estabelece um regime especial no CIRC, são aplicáveis nesta matéria as normas contabilísticas, como decorre do artigo 17.º, n.ºs 1 e 3, do CIRC.

A Autoridade Tributária e Aduaneira durante o procedimento de inspecção tributária notificou a Requerente para apresentar «cópia de toda a documentação de suporte ao reconhecimento no período de gastos em provisões para processos judiciais em curso no valor de 172.634.20€».

Não tendo a Requerente apresentado qualquer documentação, a Autoridade Tributária e Aduaneira não aceitou o gasto.

Considerou a Autoridade Tributária e Aduaneira no Relatório da Inspecção Tributária que, nos termos do § 13.º da NCRF 21, «uma provisão só deve ser reconhecida quando, cumulativamente: a) Uma entidade tenha uma obrigação presente, legal ou construtiva, como resultado de um acontecimento passado; b) Seja provável que um exfluxo de recursos que incorporem benefícios económicos será necessário para liquidar a obrigação; e c) Possa ser feita uma estimativa fiável da quantia da obrigação».

No presente processo, a Requerente apresentou o documento n.º 21 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, de que consta uma «informação relativa a litígios e importâncias envolvidas, até 31 de Dezembro de 2014, das empresas A... S.A., H...- Sucursal em Portugal e I...— Unipessoal, B..., S.A, J...».

Juntou ainda a Requerente os documentos n.ºs 23 a 36, 38 e 39 que se reportam a processos judiciais.

A Autoridade Tributária e Aduaneira, na sua Resposta, defende que não se prova que estejam reunidos os requisitos para a relevância fiscal das provisões, por várias razões.

Uma das razões invocadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira é a falta de uma estimativa fiável para o montante indicado.

Com efeito, na carta da sociedade de advogados que consta do documento n.º 21, refere-se que «não é possível afirmar, com um grau de probabilidade razoável, qual a estimativa final de responsabilidades, incluindo custas judiciais e outros encargos».

Com base nesta informação a Requerente reconheceu provisões relativamente à totalidade dos valores de todos os processos e respectivas custas pagas inicialmente, como confirma no artigo 44.º das suas alegações.

Nos §§ 24 e 25 da NCRF 21 refere-se o seguinte, sobre a «estimativa fiável da obrigação»:

 

24 — O uso de estimativas é uma parte essencial da preparação de demonstrações financeiras e não prejudica a sua fiabilidade. Isto é especialmente verdade no caso de provisões, que pela sua natureza são mais incertas do que a maior parte de outros elementos do balanço. Exceto em casos extremamente raros, uma entidade será capaz de determinar uma gama de desfechos possíveis e pode por isso fazer uma estimativa da obrigação que seja suficientemente fiável para usar ao reconhecer uma provisão.

25 — No caso extremamente raro em que nenhuma estimativa fiável possa ser feita, existe um passivo que não pode ser reconhecido. Esse passivo é divulgado como um passivo contingente (vide o Apêndice)

 

                À face destas regras contabilísticas, afigura-se que não é permitido reconhecer provisões relativas a possíveis obrigações derivadas de processos judiciais sem que seja uma estimativa sobre os desfechos possíveis e pode por isso fazer uma estimativa da obrigação que seja suficientemente fiável, o que afasta, desde logo, a possibilidade de reconhecer provisões correspondentes à totalidade dos valores de processos judiciais e respectivas custas, sem qualquer estimativa os seus possíveis desfechos.

                O critério utilizado pela Requerente, reafirmado no artigo 44.º das suas alegações, de que «quando se é réu numa ação, será legitimo provisionar, pelo menos, o valor peticionado pelo autor da ação, acrescido das custas pagas inicialmente», sem qualquer estimativa sobre os possíveis desfechos das acções, não se sintoniza com as referidas regras contabilísticas e, por isso, não tem suporte legal.

                Aliás, a própria Requerente, no artigo 59.º do pedido de pronúncia arbitral, afirma, quanto a outro processo judicial contra si interposto que «na altura em que foi apresentada a petição inicial, a A... decidiu não provisionar o respetivo valor, na medida em que tinha a expectativa de ganhar o processo judicial», o que demonstra que, afinal, é possível fazer uma estimativa das possibilidades de êxito ou não de processos judiciais.

                De qualquer forma, a corresponder à realidade o que a Requerente afirma no artigo 41.º das suas alegações, de que «não é possível aos Advogados indicar a estimativa final de responsabilidade», a solução prevista no referido § 25.º é o não reconhecimento da provisão.

                Pelo exposto, não se demonstrou que estejam reunidas as condições de que depende a relevância fiscal de provisões, pelo que não se justifica a anulação desta correcção.

 

3.3. Questão da E...

 

A Inspecção Tributária notificou a Requerente sobre o valor de € 40.000,00 reconhecido em gasto em 2014, não deveria ter sido desreconhecido pela conta 293- Provisões para processos judiciais em curso, por forma a não existir duplicação de gastos, mas a Requerente não deu qualquer resposta.

A Requerente no presente processo refere que «no âmbito de um processo judicial movido pela F..., S.A. contra a Requerente, havia sido exigido a esta última o pagamento do valor de 668.939,97 (Documento n.º 40)», que «na altura em que foi apresentada a petição inicial, a A... decidiu não provisionar o respetivo valor, na medida em que tinha a expectativa de ganhar o processo judicial» e que, «posteriormente, a Requerente acabou por, mediante acordo com a F..., S.A., colocar termo à ação através de transação, tendo ficado acordada a redução do pedido para € 40.000»..

A Requerente não juntou ao presente processo, o invocado documento n.º 40, tendo apenas com o exercício do direito de audição, juntado cópia de um requerimento de homologação de acordo (anexo IV que consta da parte 6 do processo administrativo).

Como refere a Autoridade Tributária e Aduaneira, para estarem comprovados os requisitos da dedutibilidade deste valor como gasto do exercício de 2014, era necessário demonstrar em que ano é que ocorre o passivo e o gasto.

Como nota a Autoridade Tributária e Aduaneira na sua Resposta, o referido requerimento de homologação foi apresentado em 03-06-2013, como se vê pela data que consta da assinatura electrónica (fls. 31 da parte 6 do processo administrativo).

Por isso, os únicos elementos que constam dos autos apontam no sentido de, a tratar-se de um gasto, não dever ser reconhecido contabilisticamente em 2014, por força do princípio da especialização dos exercícios, enunciado no artigo 18.º n.º 1, do CIRC.

Improcede, assim o pedido de pronúncia arbitral quanto a este gasto no valor de € 40.000,00.

 

3.4. Depreciações não aceites (€ 22.484,42)

 

Estão em causa quanto a esta correcção, depreciações relativas a três viaturas com as matrículas ..., ... e ..., perfazendo um total de 29.296,72, do qual a Requerente acresceu à declaração modelo 22 o montante de € 6.812,30, que considerou não ser aceite para efeitos.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que «apesar do exercício de direito de audição conter alguma informação relativa às viaturas em análise, a mesma mostra-se insuficiente, pois o SP não provou que o gasto reconhecido respeita os artigos 23.º, 29.º a 31.º e 34.º do CIRC, conjugado com o Decreto Regulamentar (DR) 25/2009».

A Requerente, nas suas alegações, vem dizer que «as viaturas aqui em causa foram adquiridas Junho e Outubro de 2010 e, uma vez que (conforme demonstrado documentalmente e confirmado pelas testemunhas K... e ZZ...) se registavam as depreciações com base num sistema de duodécimos, as viaturas apenas começaram a ser depreciadas no mês do início da utilização, o qual coincidia com o mês da aquisição».

No entanto, como diz a Autoridade Tributária e Aduaneira na sua Resposta, «a Requerente continua a não apresentar o Modelo 32 - Mapa de Depreciações e Amortizações e continuamos a ignorar o mês de aquisição das viaturas e a data de início e de fim da depreciação das mesmas, factos importantes atendendo que tendo as viaturas sido adquiridas em 2010, significa que em 2014 já poderiam estar totalmente amortizadas, caso tivesse sido considerada a amortização total correspondente a um ano completo, no primeiro ano de vida das mesmas» e «embora a requerente mencione o documento 41 que supostamente prova a tributação autónoma do valor aqui em causa, verifica-se que esse "documento interno" constituído por vários quadros com os encargos com viaturas em 2010, 2011 e 2012, não permite saber a que viaturas dizem respeito aqueles encargos».

A determinação das amortizações e depreciações imputáveis a cada exercício depende de um conjunto de factores, designadamente a data de início e de fim, devendo a sua demonstração ser efectuada através de um mapa, exigido pelo artigo 21.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de Setembro, que se afigura imprescindível para determinar se as referidas amortizações podiam ou não ser efectuadas, nos montantes em que o foram.

A falta de apresentação do mapa referido, cuja elaboração é dever do Sujeito Passivo e está na sua plena disponibilidade, não pode ser suprida por prova testemunhal, designadamente por meras afirmações genéricas de que se registavam as depreciações com base num sistema de duodécimos e em informações não documentadas sobre os factos relevantes para esse efeito.

A Requerente tem o dever de elaborar e apresentar a documentação legalmente exigida para demonstração das amortizações e depreciações, pelo que, não havendo impossibilidade prática de ela ser apresentada, não podem os Tribunais, sem violar a lei, dar como provados os factos que devem ser documentados.

Pelo exposto, improcede o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta correcção.

 

3.5. Tributação autónoma (€ 147.691,61)

 

O artigo 88.º, n.º 8, do CIRC, na redacção vigente em 2014, estabelece o seguinte:

 

8 - São sujeitas ao regime do n.º 1 ou do n.º 2, consoante os casos, sendo as taxas aplicáveis, respetivamente, 35 % ou 55 %, as despesas correspondentes a importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável, tal como definido nos termos do Código, salvo se o sujeito passivo puder provar que correspondem a operações efetivamente realizadas e não têm um caráter anormal ou um montante exagerado.

 

Em 31-12-2014, foi creditada a conta banco #32014- C..., por contrapartida da conta #27811008- C..., no montante de €421.976,03.

Da prova produzida resulta que a Requerente utilizou uma conta da empresa C..., domiciliada em ... para pagar despesas da própria Requerente, que utilizou como se fosse da própria Requerente, recebendo quantias pagas pelos seus clientes, pagando aos seus trabalhadores, pagando rendas dos seus veículos, pagando combustíveis e demais despesas da empresa e efectuando na sua contabilidade os lançamentos correspondentes à movimentação dessa conta.

Como resultou da prova testemunhal, tal utilização foi motivada pelo facto de a Requerente ter sido condenada a pagar à empresa AAA..., S.A, a quantia que consta do documento n.º 22 junto com o pedido de pronúncia arbitral, e as quantias que estivessem depositadas na sua conta bancária serem alvo de penhora.

Não foi recebida pela Requerente, no período em causa, qualquer factura emitida pela empresa C... nem ocorreu a emissão de faturas àquela entidade.

Nestas condições, afigura-se que não se está perante uma situação enquadrável no n.º 8 do artigo 88.º do CIRC, por não haver «despesas correspondentes a importâncias pagas ou devidas» à C... .

Na verdade, o conceito de «despesas» utilizado no artigo 88.º, n.º 8, do CIRC, não é definido neste Código e não coincide com o de «gastos», definido no artigo 23.º do CIRC (que inclui, designadamente, «perdas» e «ajustamentos»), pelo que deverá ser atribuído àquela expressão o alcance que tem na linguagem comum, de saída de dinheiro do património de uma empresa.

Assim, as despesas pagas ou devidas a que se refere o artigo 88.º, n.º 8, do CIRC reconduzem-se a saídas de meios financeiros do património da empresa, ficando fora da sua esfera de disponibilidade.

Não foi isso que sucedeu no caso em apreço, pois da prova produzida resulta que, embora fosse utilizada da conta da C..., a disponibilidade das quantias transferidas nunca saiu da esfera patrimonial da Requerente, que continuou a utilizá-las como sendo suas e a dar-lhes a respectiva relevância fiscal como estando incluídas no seu património.

Foi isso mesmo que concluiu a AT no Relatório da Inspecção Tributária ao dizer que «desta forma tendo em conta o SNC, os movimentos contabilísticos, a documentação analisada e os respetivos extratos de contas, concluímos que as contas bancárias utilizadas pelo sujeito passivo A..., SA, são ativo da entidade e nas análises e correções que se seguem são tratados como tal» (página 16 do Relatório da Inspecção Tributária; negrito nosso)

Nestas condições, não está preenchido o conceito de «despesas» utilizado no n.º 8 do artigo 88.º do CIRC, pelo que não se justifica a tributação autónoma referida, que, por isso, deve ser anulada, nos termos artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.

 

 4. Juros compensatórios e moratórios

 

A liquidação de juros compensatórios tem como pressuposto a liquidação de IRC (artigo 35.º, n.º 8, da LGT) pelo que enferma dos mesmo vícios que esta.

Por isso, se justifica a anulação da liquidação de juros compensatórios na parte correspondente à procedência do pedido de pronúncia arbitral.

No que concerne aos juros de mora, não se demonstrou que os que foram liquidados tenham por fundamento qualquer das correcções cuja legalidade é questionada no presente processo, pelo que não se justifica a anulação da liquidação.

 

5. Decisão

 

De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:

a)            Julgar parcialmente o procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto a créditos no valor global de € 130 521,97 (€ 66.303,39 + € 11.143,71+ € 53.074,87), relativos a perdas por imparidade, nos termos dos pontos 3.1. a 3.1.5. deste acórdão;

b)           Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral quanto às questões das provisões, da E... e das depreciações não aceites;

c)            Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à questão da tributação autónoma;

d)           Anular a liquidação de IRC n.º 2018..., relativa ao exercício de 2014, e da respetiva demonstração de acerto de contas n.º 2018..., na parte correspondente às correcções referidas nas alíneas a) e c), bem como a liquidação de juros compensatórios na parte correspondente;

e)           Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à liquidação de juros de mora.

 

6. Valor do processo

 De harmonia com o disposto nos artigos 296.º, n.º 1, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de €284.843,37.

 

7. Custas

                Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 5.202,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

A anulação da liquidação na parte respectiva às correcções referidas na alínea a) do ponto 5 deste acórdão é imputável à Requerente, pois não apresentou à Autoridade Tributária e Aduaneira antes da emissão da liquidação os documentos que foram juntos no presente processo arbitral.

Assim, apenas é imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira a anulação da liquidação quanto à tributação autónoma no valor de € 147.691,61.

Nestes termos fixam-se as responsabilidades pelas custas do processo em 48,15% a cargo da Requerente e 51,85% a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

               

Lisboa, 16-12-2019

Os Árbitros

 

(Jorge Lopes de Sousa)        

(Carlos Alberto Monteiro da Silva)

(Rui Ferreira Rodrigues)