Processo n.º 84/2013-T
Os árbitros Dr. Jorge Manuel Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Prof. Doutor João Sérgio Ribeiro e Prof. Doutor Diogo Leite de Campos, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 21-6-2013, acordam no seguinte:
1. Relatório
A, pessoa colectiva n.º…, com sede em …, representada fiscalmente em Portugal por B Portugal, pessoa colectiva n.º …, com sede na … (doravante designada como “Requerente”, apresentou um pedido de constituição do tribunal arbitral colectivo, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em que é Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, com vista a:
(i) serem anuladas as liquidações de IRC n.ºs 2012 …. e 2012 ….;
(ii) serem reembolsados os custos suportados e a suportar pela Requerente com os honorários e despesas dos seus advogados relativos ao enquadramento jurídico da questão, acompanhamento do procedimento administrativo, preparação do presente processo arbitral e acompanhamento do processo arbitral, bem como outras despesas em que já tenha incorrido ou venha a incorrer com a presente arbitragem, tudo em montante a liquidar futuramente.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 18-04-2013.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, o Prof. Doutor João Sérgio Ribeiro e o Prof. Doutor Diogo Leite de Campos, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 4-6-2013, foram as partes notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 21-06-2013.
A Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA) respondeu, defendendo que deve ser absolvida dos pedidos.
Na sequência de acordo recorrido das Partes, decidiu-se não haver lugar à reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, não se produzir prova testemunhal e não se produzirem alegações.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, é competente para apreciar as questões suscitadas e as partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades.
2. Matéria de facto
2.1. Factos que se consideram provados
a) A Requerente é uma sociedade de direito indiano, residente, para efeitos fiscais, na Índia (artigos 19.º e 20.º do pedido de pronúncia arbitral);
b) A Requerente é dos maiores fabricantes mundiais de …, com instalações de fabrico que se situam na Índia, China e Estados Unidos, abrangendo um mercado alargado de países como a Austrália, Bélgica, Brasil, Canadá, China, Dinamarca, Alemanha, Grécia, Índia, Itália, Portugal, Espanha, Turquia, Países Baixos, Nicarágua e Estados Unidos (Relatório da Inspecção que consta do documento n.º 2, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
c) Em Portugal, a Requerente dispõe de um mero registo para efeitos de Imposto sobre o Valor Acrescentado ("IVA"), que se reporta a 25-1-2008, de onde consta a inscrição da mesma enquanto entidade não-residente em Portugal, sem estabelecimento estável em Portugal (declaração de inscrição cuja cópia constitui o Documento n.º 3, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
d) Em 17-6-2006, a Requerente celebrou um contrato de fornecimento de … e respectivos componentes a entidades do A, designadamente a sociedade C, residente na Dinamarca (doravante “C Dinamarca”) (documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
e) O contrato referido na alínea anterior deu origem, em 2007, à emissão de ordens de compra de … (documento n.º 5, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
f) A C Dinamarca, a D (doravante “D EUA) e a E (doravante “E Espanha”) celebraram, entre 2006 e 2007, contratos de venda de … com clientes finais em Portugal, em Espanha, e nos Estados Unidos da América (Documentos n.ºs 6, 7 e 8, juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
g) A posição contratual da C Dinamarca foi depois cedida à B Portugal (doravante “B Portugal”), que é detida a 100% pela Requerente (Documento n.º 9, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
h) Os componentes dos … ("nacelles" e "hubs") são fornecidos pela Requerente, que na sua maioria os adquire à casa-mãe na índia, salvo os … e … que são adquiridos na Alemanha e na Bélgica (artigo 33.º do pedido de pronúncia arbitral e Relatório da Inspecção a fls. 14 do documento do processo administrativo denominado «PA-1.pdf»;
i) Por motivos de maior proximidade geográfica dos clientes finais do grupo A, a Requerente decidiu proceder à instalação, em Portugal, de determinados componentes …, a saber: … (artigo 33.º do pedido de pronúncia arbitral);
j) A B Portugal, em 4-12-2007, celebrou um contrato misto de disponibilização de espaço e prestação de serviços com a sociedade F (doravante “F”), através do qual esta arrendou àquela um armazém de 4.800 m2 de que é proprietária sito em…, bem como acordou prestar serviços de consultadoria, assessoria técnica e apoio logístico necessários à instalação, pela ora Requerente, dos componentes nos …, (a cópia do contrato consta do Anexo III ao Relatório da Inspecção, a páginas 11 e seguintes do documento do processo administrativo denominado «PA-2.pdf», cujo teor se dá como reproduzido);
k) No contrato referido estabelece-se, além do mais, seguinte:
Na cláusula 2.ª, que as instalações se destinam a «ser utilizadas para efectuar alterações em …»;
Na cláusula 6.ª, o "Fornecimento de alimentação, alojamento e transporte para uma equipa de 20 trabalhadores Indianos";
Na cláusula 7.ª, estabelece-se que "1. Para a realização dos serviços acima mencionados, a Primeira Outorgante (F) fornecerá até um máximo de 720 horas de trabalho semanais a serem efectuadas por trabalhadores não qualificados, nas instalações disponibilizadas à Segunda Outorgante (B) ... o conteúdo das actividades a desempenhar por tais pessoas será transmitido pela Segunda Outorgante à Primeira Outorgante e a sua boa execução constitui obrigação desta última, sendo sua obrigação assegurar o seu bom desempenho pelas pessoas que designar para o efeito";
l) Os trabalhadores indianos referidos na alínea anterior estiveram em Portugal (documentos que constam do Relatório da Inspecção, no Anexo XV páginas 1 a 6, fls. 85 a 90 do documento do processo administrativo “PA-4”);
m) Para o contrato entre a B e a F foi fixado o período de vigência de 10-12-2007 a 30-3-2008 (cláusula 14.ª do contrato, a fls. 20 do documento «PA-2.pdf» do processo administrativo);
n) Do Anexo III ao contrato entre a B e a F consta o documento reproduzido na página 33 do documento do processo administrativo denominado «PA-2.pdf», em que a “pessoa singular 1” declarar aceitar a proposta da F;
o) Para os trabalhos de instalação / montagem dos componentes nos …, adquiridos pela B à ora Requerente, em 25-1-2008, a última subcontratou a própria B para a prestação de, entre outros, serviços de assistência técnica, fornecimento de pessoal não qualificado, serviços logísticos e fornecimento de espaço para a instalação dos componentes dos … e armazenagem das ferramentas necessárias às operações (vide contrato de prestação de serviços celebrado entre a ora Requerente e a B (documento n.º 11, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
p) A Requerente adquiriu as peças que compõem os .. e procedeu à acoplagem das mesmas nas referidas instalações arrendadas a F pela B, de modo a obter o equipamento pronto a ser vendido e utilizado nos parques … pelos seus clientes (Relatório da Inspecção, artigo 34.º do pedido de pronúncia arbitral e documento n.º 10 com ele junto);
q) A B e a F celebraram à posteriori, em 05.06.2008, uma Adenda ao contrato de 4-12-2007, que consta do Anexo III ao Relatório da Inspecção, a páginas 34 e seguintes do documento do processo administrativo denominado «PA-2.pdf», cujo teor se dá como reproduzido, em que, além do mais, no considerando B. que "Na execução prática do Contrato verificaram-se algumas vicissitudes que alteraram parte das condições acordadas, nomeadamente o início previsto de execução e o numero de horas de trabalho", estabelecendo-se o seu início apenas no dia 28-1-2008 e a sua vigência até ao dia 28-9-2008 (Cláusula 1.ª);
r) A Requerente importou da Índia, em 25-1-2008, componentes de … dos tipos referidos (documento n.º 10 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
s) Em 25-1-2008, a Requerente procedeu seu registo para efeitos de IVA em Portugal (artigos 34.º e 35.º do pedido de pronúncia arbitral);
t) Finalizada a instalação / montagem dos componentes dos …, a Requerente procedeu à expedição desses equipamentos para os Estados Unidos, com destino à D EUA, para Espanha, com destino à E Espanha, e para vários locais em Portugal, para o que a Requerente emitiu facturas à B Portugal, à D EUA e à E Espanha, utilizando para o efeito o seu registo de IVA em Portugal e o respectivo número de identificação fiscal (artigos 42.º a 45.º do pedido de pronúncia arbitral);
u) Dos documentos da Requerente relativos a IVA constam as seguintes compras de materiais: (fls. 15 e 16 do documento do processo administrativo denominado «PA-1.pdf»)
v) As vendas declaradas pela Requerente ocorreram de acordo com as seguintes factura, emitidas através do seu registo de IVA em Portugal (fls. 17 do documento do processo administrativo denominado «PA-1.pdf»)
w) As datas de emissão das referidas facturas não coincidem com as datas em que o fornecimento dos aerogeradores foi negociado e contratado entre a Requerente e a D EUA, a E Espanha e a C Dinamarca (após a cessão da posição contratual, a B Portugal) o que ocorreu durante o ano de 2006, mas apenas com o fluxo físico dos equipamentos no âmbito desse contrato de fornecimento de … (artigo 49.º do pedido de pronúncia arbitral, que não é impugnado);
x) No âmbito do acordado na cláusula 5.ª do contrato de 25-1-2008 celebrado entre a Requerente e a B Portugal relativo à montagem / instalação de componentes de …, esta debitou àquela as despesas que pagou a vários fornecedores envolvidos no projecto, tendo sido emitidas as seguintes notas de débito: (fls. 18 do documento do processo administrativo denominado «PA-1.pdf»)
y) No sistema informático de intercâmbio de informações sobre o IVA constatou-se a existência de transacções intracomunitárias para além das declaradas pela Requerente, de acordo com os quadros que seguem: (fls. 19 e 20 do documento do processo administrativo denominado «PA-1.pdf»)
z) A Requerente emitiu em seu nome as facturas seguintes relativas a transmissão de materiais e ferramentas (fls.16 do Relatório da Inspecção, a fls. 21 do documento do processo administrativo denominado «PA-1.pdf»):
aa) As facturas do quadro da alínea anterior, foram identificadas na sequência da análise à contabilidade da B PORTUGAL, onde se encontram contabilizados os custos relativos às exportações a que as mesmas respeitam, designadamente, as facturas do despachante G (NIF …) e do H (… – NIF …); não obstante estes custos estarem emitidos em nome da B PORTUGAL, nos respectivos documentos alfandegários de suporte consta como exportador a Requerente (NIF …), conforme demonstra toda a documentação que consta do anexo XIII ao Relatório da Inspecção, páginas 1 a 64, que consta dos documentos «PA3.pdf» e «PA4.pdf», juntos com a resposta, cujos teores se dão como reproduzidos);
bb) A B Portugal contabilizou ainda como proveitos várias notas de débito emitidas à , como segue: (fls. 22 do documento do processo administrativo denominado «PA-1.pdf»)
cc) Estas notas de débito emitidas à Requerente referem-se ao "… work at F", posteriormente Outubro de 2008, período a partir do qual a Requerente não regista nem declara ou deduz o IVA destas operações, reportando-se estas notas a custos incorridos pela B Portugal que são da responsabilidade da Requerente nos termos da cláusula 5.ª do contrato celebrado em 25-1-2008, relativo à montagem / instalação de … (fls. 22 do documento do processo administrativo denominado «PA-1.pdf»);
dd) Entre os documentos relativos às notas de débito referidas na alínea anterior, incluem-se um documento relativo ao salário do mês de Outubro de I, datado de 31-10-2008; uma factura n.º ….., de 18-11-2008 do fornecedor J relativa ao aluguer de armazém/instalações e utilização de empilhador(es), de Fevereiro a Outubro, para o projecto "…"; a factura n.º … da K, referente a serviços prestados nas instalações da K entre 21.10.2008 e 23.10.2008; a Nota de débito n.º …. de 31.10.2008, L, relativa aos processos de exportação das Facturas n.ºs. 19 e 20/2008 da B, ambas com data de 24.09.2008, mas cuja mercadoria apenas foi expedida a partir do instalações da K em 21/22.10.2008; a factura n.º … do fornecedor M, relativa à passagem aérea do trabalhador indiano “pessoa singular 2”, que viajou a Portugal em 08.12.2008, na qualidade de auditor ("audit purpose") (fls. 22 e 23 do documento do processo administrativo denominado «PA-1.pdf»);
ee) Em paralelo com a instalação de componentes em …, decorreu um processo de reparação e substituição de … já em funcionamento em parques …, que haviam sido adquiridos à Requerente pela B Portugal e por esta comercializados, por terem sido detectadas falhas e defeitos de fabrico, sendo essas reparações efectuadas ao abrigo de garantias contratuais (artigos 157.º a 159.º do pedido de pronúncia arbitral, que não são impugnados);
ff) A B Portugal optou por assumir ela própria a reparação e/ou substituição das … 21 … de parques … em … e …, incorrendo em vários encargos com materiais e subcontratação de serviços de terceiros (artigos 167.º, 170.º, 172.º, 173.º, 174.º, 175.º e 176.º do pedido de pronúncia arbitral, e Relatório da Inspecção, páginas 24-25 do documento do processo administrativo denominado «PA-1»);
gg) Relativamente a esta reparação e/ou substituição de … 21 … de parques … foi celebrado um contrato, em 25-1-2008, entre a Requerente e a B Portugal, que consta do Anexo VIII ao Relatório da Inspecção, cujo teor se dá como reproduzido, a páginas 1 a 16 do documento «PA-3.pdf», junto à resposta, páginas 131 a 145 do processo administrativo);
hh) As operações de reparação e/ou substituição de … de … estavam calendarizadas para Fevereiro a Abril de 2008 (nos termos da cláusula 2.º do contrato referido na alínea anterior), mas em 2-10-2008 foi assinado um Aditamento ao Acordo de Compensação por defeitos nas …, em que é afirmado que nessa data ainda não tinha sido iniciada qualquer operação de reparação / substituição (anexo IX ao Relatório da Inspecção, a fls. 18 a 24 do documento do processo administrativo denominado «PA-3.pdf», cujo teor se dá como reproduzido);
ii) O débito dos custos incorridos pela B Portugal com a operação de reparação / substituição ocorreu entre finais de Outubro e Março de 2009 (nota de débito n.º 44/2008, emitida em 31-3-2009 pela B Portugal à Requerente, cuja cópia consta de fls. 26 do documento do processo administrativo denominado «PA-3.pdf» e extractos, balancete e documentos que constam do referido anexo IX ao Relatório da Inspecção, que se dão como reproduzidos);
jj) Houve envolvimento de técnicos indianos comuns aos projectos de instalação de componentes em … e reparações (artigo 178.º do pedido de pronúncia arbitral, que não é impugnado);
kk) A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou acções de inspecção de âmbito parcial à Requerente, na sequência das Ordens de Serviço n.ºs … e .., em sede de IRC, incidindo sobre os exercícios de 2008 e 2009, respectivamente (Relatório da Inspecção que consta do documento n.º 2, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
ll) Na sequência das acções referidas a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que tinham sido desrespeitadas normas técnicas do CIRC em conjugação com a Convenção para Evitar a Dupla Tributação entre Portugal e a Índia, por existir um estabelecimento estável da Requerente em termos reais nos termos do artigo 5º, n.º 3 do Código do IRC em conjugação com o artigo 5.º da Convenção para Evitar a Dupla Tributação entre Portugal e a Índia, por um período de tempo superior a 9 meses, considerando o seu início a 25-1-2008 e a sua conclusão em 21-6-2009.
mm) Refere-se ainda, nas conclusões do Relatório da Inspecção, o seguinte:
Em face do exposto, conclui-se pela existência de estabelecimento estável em termos reais nos termos do artigo 5.º nº 3 do Código do IRC em conjugação com o artigo 5.º da Convenção para Evitar a Dupla Tributação entre Portugal e a Índia, por um período de tempo superior a 9 meses, considerando o seu início a 25 de Janeiro de 2008 e a sua conclusão em 21 de Junho de 2009.
Sendo evidente a existência da SEL em Portugal a partir de 04.12.2007, para efeitos de enquadramento em sede de IRC optámos por considerar o seu início em 25.01.2008, pois corresponde ao primeiro registo de operações tributáveis, e o seu fim em 21.06.2009, coincidente com a data de confirmação de saída pela Alfândega (...) dos últimos bens/materiais exportados em nome da A (correspondente à factura n.º … de 08.06.2009 identificada no ponto II.3.2.1.2 deste Relatório).
O lucro imputável a este estabelecimento estável em Portugal deve manter-se nos termos dispostos na alínea c) do nº 1 e n.º 3 do artigo 3º do Código do IRC, em conjugação com o artigo 7º da Convenção para Evitar a Dupla Tributação entre Portugal e a Índia, estando o seu valor apurado no ponto 111.3 deste Relatório.( [1] )
nn) Para determinar o lucro tributável a Autoridade Tributária e Aduaneira considerou os seguintes custos e proveitos:
oo) Com base nestes valores a Autoridade Tributária e Aduaneira imputou ao estabelecimento estável da Requerente, que entendeu existir, o lucro tributável de € 3.250.389,33, em 2008, e de € 24.902,07, em 2009, de acordo com o seguinte quadro:
pp) Na sequência do apuramento do lucro tributável referido na alínea anterior, foi elaborada a liquidação de IRC, derrama e juros compensatórios relativa ao ano de 2008, com o n.º 2012 …, datada de 5-12-2012, em que é liquidado o valor de € total de € 982.461,78, sendo € 812.597,33 de IRC, € 48.755,84 de derrama e € 121.108,61 de juros compensatórios, com data limite de pagamento de 16-1-2013 (documento n.º 1, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
qq) Ainda na sequência do referido apuramento do lucro tributável feito no relatório da inspecção, veio a ser elaborada a liquidação n.º 2012 …, relativa ao IRC de 2009, da quantia de 5.543,22, sendo € 4.663,01 de IRC, € 373,53 de derrama e € 506,68 de juros compensatórios, com data limite de pagamento de 16-1-2013 (documento n.º 1, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
rr) Em 16-4-2013, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo (sistema informático do CAAD).
2.2. Factos que se consideram não provados
Não há factos relevantes para decisão que não se tenham provado.
2.3. Fundamentação da matéria de facto provada
Os factos provados baseiam-se nos documentos indicados para cada um dos pontos e nas afirmações da Requerente que não são questionadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
3. Matéria de direito
3.1. Questão da existência de um estabelecimento estável da Requerente em Portugal
3.1.1. Enquadramento
A principal questão a decidir nos presentes autos arbitrais é a de saber se a actividade desenvolvida em Portugal pela Requerente pode ser considerada como dando origem a um estabelecimento estável que permita ao Estado Português tributar os seus lucros.
No caso em apreço, foi celebrada uma Convenção para Evitar a Dupla Tributação entre Portugal e Índia (doravante “CDT”), aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 20/2000, de 6 de Março, e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 8/2000, da mesma data.
Por força do disposto no artigo 8.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, «as normas constantes de convenções internacionais regularmente ratificadas ou aprovadas vigoram na ordem interna após a sua publicação oficial e enquanto vincularem internacionalmente o Estado Português».
Independentemente da solução que se der, em geral, à questão da primazia ou não do direito internacional convencional sobre o direito interno português ( [2] ), relativamente ao conceito de «estabelecimento estável» a referida CDT criou um regime especial que não foi derrogado pela posterior introdução no nosso direito interno de um conceito com a mesma denominação, no artigo 4.º-A do CIRC, aditado pela Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro (actual artigo 5.º), já que não há qualquer indicação de que se tenha pretendido revogar unilateralmente os regimes que constavam de anteriores convenções daquele género e a lei geral só revoga leis especiais quando se demonstrar inequivocamente uma intenção legislativa nesse sentido (artigo 7.º, n.º 3, do Código Civil).
O conceito especial de «estabelecimento estável» que fornece a referida CDT é o seguinte:
Artigo 5.º
Estabelecimento estável
1 – Para efeitos desta Convenção, a expressão «estabelecimento estável» significa uma instalação fixa, através da qual a empresa exerça toda ou parte da sua actividade.
2 – A expressão «estabelecimento estável» compreende, nomeadamente:
a) Um local de direcção;
b) Uma sucursal;
c) Um escritório;
d) Uma fábrica;
e) Uma oficina;
f) Um posto de vendas; e
g) Uma mina, um poço de petróleo ou gás, uma pedreira ou qualquer local de extracção de recursos naturais, incluindo uma instalação ou estrutura utilizada para a prospecção, pesquisa e exploração de recursos naturais, mas apenas por um período superior a 120 dias num ano fiscal.
3 – Um local ou um estaleiro de construção, um projecto de construção, de instalação ou de montagem, bem como as actividades de supervisão em conexão com as mesmas só constituem um estabelecimento estável se a sua duração exceder nove meses.
4 – Não obstante as disposições anteriores deste artigo, a expressão «estabelecimento estável» não compreende:
a) As instalações utilizadas unicamente para armazenar, expor ou entregar bens ou mercadorias pertencentes à empresa;
b) Um depósito de bens ou mercadorias pertencentes à empresa, mantido unicamente para as armazenar, expor ou entregar;
c) Um depósito de bens ou mercadorias pertencentes à empresa, mantido unicamente para serem transformadas por outra empresa;
d) Uma instalação fixa, mantida unicamente para comprar bens ou mercadorias ou reunir informações para a empresa;
e) Uma instalação fixa, mantida unicamente para exercer, para a empresa, qualquer outra actividade de carácter preparatório ou auxiliar;
f) Uma instalação fixa, mantida unicamente para o exercício de qualquer combinação das actividades referidas nas alíneas a) a e), desde que a actividade de conjunto da instalação fixa resultante desta combinação seja de carácter preparatório ou auxiliar.
5 – Não obstante o disposto nos n.ºs 1 e 2, quando uma pessoa – que não seja um agente independente, a que é aplicável o n.º 6 – actue num Estado Contratante por conta de uma empresa do outro Estado Contratante, considera-se que esta empresa possui um estabelecimento estável no primeiro Estado mencionado, se:
a) Tiver e habitualmente exercer nesse Estado poderes para celebrar contratos em nome da empresa, a não ser que as actividades respectivas se limitem, na totalidade, às indicadas no n.º 4; ou
b) Não tiver tais poderes, mas mantiver habitualmente no primeiro Estado mencionado um depósito de bens ou de mercadorias a partir do qual procede a entregas regulares de bens ou de mercadorias em nome da empresa, e se actividades adicionais exercidas nesse Estado em nome da empresa tiverem contribuído para a venda de bens ou de mercadorias.
6 – Não se considera que uma empresa tem um estabelecimento estável num Estado Contratante pelo simples facto de exercer a sua actividade nesse Estado por intermédio de um corretor, de um comissário-geral ou de qualquer outro agente independente, desde que essas pessoas actuem no âmbito normal da sua actividade.
7 – Não obstante as disposições anteriores deste artigo, considera-se que uma companhia seguradora de um Estado Contratante tem um estabelecimento estável no outro Estado Contratante, salvo no que se refere a resseguros, se cobrar prémios no território desse outro Estado ou segurar riscos aí situados por intermédio de uma pessoa que não seja um agente independente a que é aplicável o n.º 6.
8 – O facto de uma sociedade residente de um Estado Contratante controlar ou ser controlada por uma sociedade residente do outro Estado Contratante ou que exerce a sua actividade nesse outro Estado (quer seja através de um estabelecimento estável, quer de outro modo) não é, por si, bastante para fazer de qualquer dessas sociedades estabelecimento estável da outra.
O Protocolo acordado no momento da assinatura da referida CDT, que desta faz parte integrante, esclarece que, no «Ad artigo 5.º», que «para efeitos do n.º 2, considera-se que um armazém utilizado por uma pessoa que presta serviços de armazenagem a outrem constitui um estabelecimento estável».
O conceito de estabelecimento estável não se reporta, independentemente do que parece sugerir a sua formulação, a algo de físico, palpável, com uma existência separada do sujeito passivo a que diz respeito. Este conceito visa tão-só determinar se a actividade de um não residente num determinado sistema fiscal é suficientemente expressiva de modo a justificar que esse não residente seja aí tributado em termos semelhantes àqueles em que são tributados os residentes. Será, portanto, o não residente que detém o estabelecimento estável e não o próprio estabelecimento estável a ser tributado, pois este não tem existência autónoma, sendo unicamente uma presença especialmente relevante do não residente.
Este conceito é desenvolvido pelo artigo 5.º da Convenção Modelo da OCDE (CMOCDE) que, atenta a sua influência, acaba por corresponder ao artigo 5.º da maioria das convenções sobre dupla tributação, incluindo a que foi celebrada entre a República Portuguesa e a República da Índia.
Dela decorrem três testes alternativos para determinar a existência de um estabelecimento estável, assentando um na existência de uma instalação física, outro na de um projecto e outro numa relação de agência.
3.1.1.1. Instalação física
Tradicionalmente o conceito de estabelecimento dizia respeito a uma instalação física, ideia que condiciona muitas vezes a abordagem que se faz do conceito. Existem, como se acabou de salientar, outros testes admissíveis que não pressupõem a existência de uma instalação física, sendo aplicáveis precisamente por esta não existir ou ser de existência duvidosa.
O estabelecimento estável que assenta na existência de uma instalação física é vulgarmente designado por definição geral de estabelecimento estável, até pelo facto de surgir logo no n.º 1 do artigo 5.º da CMOCDE (e da convenção celebrada entre Portugal e a Índia) e pressupõe a verificação cumulativa de vários requisitos.
É necessária não só uma instalação fixa, isto é, com permanência sob o ponto de vista geográfico e temporal, mas também que seja através desse espaço que a actividade é levada a cabo, o que implica necessariamente que essa instalação esteja ao dispor da empresa.
Além disso, como resulta do artigo 5.º, n.º 4, da CMOCDE (e da convenção celebrada por Portugal e a Índia) existem actividades que não constituem, por si, estabelecimentos estáveis, mesmo que sejam levadas a cabo através de uma instalação física. A característica essencial dessas actividades é o seu carácter preparatório ou auxiliar e o facto de serem prestadas unicamente à empresa da qual essa instalação depende, e não a terceiros.
O artigo 5.º, n.º 2, da convenção em análise, em linha com a CMOCDE, enumera uma série de instalações que se podem incluir na noção de estabelecimento estável assente numa instalação física. Todavia estes exemplos são apenas situações em que há correspondência prima facie com a existência de estabelecimentos estáveis, pois, como decorre da própria disposição, é necessário que os requisitos do n.º 1 do mesmo artigo sejam cumpridos.
3.1.1.2. Projecto
Considera-se ainda que estamos em presença de um estabelecimento estável quando existe «um local ou um estaleiro de construção, de instalação ou de montagem, bem como as actividades de supervisão em conexão com as mesmas».
Contudo, só constituem um estabelecimento estável se a sua duração exceder nove meses (artigo 5.º, n.º 3 da CDT). O tempo gasto com os trabalhos preparatórios também é relevante para a contagem desse período.
3.1.1.3. A agência
O estabelecimento estável que decorre da agência pressupõe a verificação de vários elementos para que se sustente a sua existência, que se extraem do n.º 5 do transcrito artigo 5.º.
Em primeiro lugar, é necessária uma pessoa (que será o agente), singular ou colectiva, que actue por conta de uma empresa não residente. O agente, contudo, não tem obrigatoriamente de ser um residente ou ter uma instalação fixa no país onde desenvolve as suas actividades de agente, desde que não seja, obviamente, um agente independente.
Em segundo lugar, é necessário que o agente tenha e habitualmente exerça nesse Estado poderes para celebrar contratos em nome da empresa.
3.1.2. Análise do caso concreto
Feita esta breve resenha acerca dos testes possíveis para determinar se existe ou não estabelecimento estável, importa agora aplicar cada um deles ao caso concreto.
3.1.2.1. Delimitação do objecto do processo
Embora existam várias possibilidades de enquadramento de situações fácticas no conceito de estabelecimento estável, no caso em apreço está apenas em causa a possibilidade de esse conceito ser preenchido à face do n.º 3 do artigo 5.º da CDT.
Na verdade, num contencioso de mera legalidade, como é o previsto no RJAT para os tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, em que se visa apenas a declaração de ilegalidade de actos dos tipos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1 do seu artigo 2.º, tem de se aferir da legalidade do acto impugnado tal como ocorreu, com a fundamentação que nele foi utilizada, não sendo relevantes outras possíveis fundamentações que poderiam servir de suporte a outros actos, de conteúdo decisório total ou parcialmente coincidente com o acto praticado. São, assim, irrelevantes fundamentações invocadas a posteriori, após o termo do procedimento tributário em que foi praticado o acto cuja declaração de ilegalidade é pedida, inclusivamente as aventadas no processo jurisdicional.
Assim, não pode o Tribunal, perante a constatação da invocação de um fundamento ilegal como suporte da decisão administrativa, apreciar se a sua actuação poderia basear-se noutros fundamentos e deixar de declarar a ilegalidade do concreto acto praticado por, eventualmente, existir a possibilidade abstracta um hipotético acto com conteúdo decisório total ou parcialmente idêntico, com outra fundamentação, que seria legal, mas não foi praticado. ( [3] )
Examinado o relatório da inspecção, subjacente à determinação do lucro tributável da Requerente, em que se basearam os actos de liquidação cuja declaração de ilegalidade é pedida, constata-se que a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu, «que nos termos do n.º 3 do artigo 5º do Código do IRC em conjugação com o artigo 5º da Convenção para Evitar a Dupla Tributação entre Portugal e a Índia, o facto da A ter desenvolvido um projecto de montagem, comercialização e reparação de … e seus componentes, bem como as actividades de supervisão conexas com o mesmo, por um período de tempo superior a 9 meses, constitui para esta sociedade a existência de estabelecimento estável» (página 20 do Relatório da Inspecção, digitalizada na página 23 do «Documento 1 e 2.pdf» junto com o pedido de pronúncia arbitral).
Este entendimento é confirmado nas conclusões, em que se refere:
Em face do exposto, conclui-se pela existência de estabelecimento estável em termos reais nos termos do artigo 5.º nº 3 do Código do IRC em conjugação com o artigo 5.º da Convenção para Evitar a Dupla Tributação entre Portugal e a Índia, por um período de tempo superior a 9 meses, considerando o seu início a 25 de Janeiro de 2008 e a sua conclusão em 21 de Junho de 2009.
Sendo evidente a existência da SEL em Portugal a partir de 04.12.2007, para efeitos de enquadramento em sede de IRC optámos por considerar o seu início em 25.01.2008, pois corresponde ao primeiro registo de operações tributáveis, e o seu fim em 21.06.2009, coincidente com a data de confirmação de saída pela Alfândega – documento que passa a constituir o anexo XIX, págs. 1 e 2 ao presente Relatório — dos últimos bens/materiais exportados em nome da A (correspondente à factura n.º … de 08.06.2009 identificada no ponto 11.3.2.1.2 deste Relatório) (páginas 34-35- do Relatório da Inspecção, digitalizadas nas página 37 e 38 do «Documento 1 e 2.pdf» junto com o pedido de pronúncia arbitral).
Embora seja feita uma referência genérica ao artigo 5.º da CDT, que prevê várias possibilidades de enquadramento de situações no conceito de estabelecimento estável, a referência ao artigo 5.º, n.º 3, do CIRC, que estabelece que «um local ou um estaleiro de construção, de instalação ou de montagem, as actividades de coordenação, fiscalização e supervisão em conexão com os mesmos ou as instalações, plataformas ou barcos de perfuração utilizados para a prospecção ou exploração de recursos naturais só constituem um estabelecimento estável se a sua duração e a duração da obra ou da actividade exceder seis meses» revela que se apenas se considerou a possibilidade de enquadramento da situação da Requerente no n.º 3 do artigo 5.º da CDT, que estabelece que «um local ou um estaleiro de construção, um projecto de construção, de instalação ou de montagem, bem como as actividades de supervisão em conexão com as mesmas só constituem um estabelecimento estável se a sua duração exceder nove meses», sendo, assim, a norma correspondente àquele n.º 3 do artigo 5.º do CIRC.
Em face do exposto, a questão da legalidade do acto impugnado, reconduz-se a saber se a situação descrita na matéria de facto, é susceptível de enquadramento no artigo 5.º, n.º 3, da CDT, já que é norma especial sobre o conceito de estabelecimento estável para as situações de dupla tributação entre Portugal e a Índia.
3.1.2.2. Actividades da Requerente e unidade ou pluralidade de estabelecimentos estáveis
De acordo com os factos provados identificam-se duas actividades distintas desenvolvidas pela Requerente em Portugal: uma que diz respeito à instalação dos componentes nos aerogeradores (montagem) e outra que concerne aos projectos de reparação dos …, ao abrigo de garantias contratuais
É manifesta a distinção entre as duas actividades, pois enquanto a actividade de instalação de componentes em … é uma actividade potencialmente geradora de lucros, a relativa às reparações motivadas por falhas e defeitos de fabrico é apenas geradora de encargos.
E impõe-se fazer uma distinção entre os dois tipos de actividades para efeitos de aplicação dos testes para aferir da existência de estabelecimento estável, pois, desde logo, sendo este um conceito criado para tributar os lucros de um não residente no Estado em que exerce a sua actividade (como decorre do artigo 7.º da CDT), não se compreende que relevem para essa aferição actividades que sejam claramente autónomas em relação às actividades lucrativas que, por sua natureza, não proporcionam lucros, mas sim encargos, como é o caso da realização de reparações em cumprimento de deveres resultantes de garantias contratuais.
Assim, a possibilidade de agregar a actividade de reparação à actividade de montagem reconduzindo-as a um mesmo estabelecimento estável não é de aceitar.
Para além disso, como se encontra provado nas alíneas o) e gg), as duas actividades foram prosseguidas ao abrigo de contratos, que, apesar de celebrados na mesma data, são absolutamente distintos e sem qualquer relação entre si, em termos de objecto.
Falta, por conseguinte, entre as duas actividades da Requerente, não só a coerência comercial, mas também, por serem igualmente desenvolvidos em espaços distintos, a coerência geográfica ( [4] ). Ora, sem a verificação destas duas componentes podem, a verificarem-se os respectivos requisitos, surgir dois estabelecimentos estáveis, um referente a cada uma dessas actividades, mas não apenas um abrangendo as duas.
Assim, há um erro subjacente ao acto que determinou o lucro tributável da Requerente mas dele não decorre necessariamente a ilegalidade dos actos de liquidação impugnados, pois isso só sucederá se ele afectou a determinação do lucro tributável.
3.1.2.3. Estabelecimento estável derivado da actividade de instalação e montagem
Como se referiu, em face da fundamentação do acto de determinação do lucro tributável da Requerente, há apenas que considerar a possibilidade de a actividade de instalação e montagem de … constituir um estabelecimento estável à face do n.º 3 do artigo 5.º da CDT.
No caso em apreço, existe uma instalação física correspondente ao armazém de 4800 m2 sito na zona Industrial de …, em …, que, sendo utilizada para levar a cabo a actividade comercial constitui um local de actividade. Sendo de referir que esse espaço, dadas as suas características, goza de permanência sob o ponto de vista geográfico e temporal e existe uma ligação entre ele e um espaço geográfico concreto (o que aliás é confirmado pela requerente no artigo 77.º da petição).
Apesar desse facto, a aplicação do teste do 5.º, n.º 3, dispensa, em rigor, a existência de instalação física, dado que na maior parte das situações o projecto não é verdadeiramente levado a cabo através da instalação física, sendo o espaço físico mais o objecto da actividade do que as instalações físicas através das quais essa actividade é prosseguida.
Porém, estabelece-se no n.º 3 do artigo 5.º que «um local ou um estaleiro de construção, um projecto de construção, de instalação ou de montagem, bem como as actividades de supervisão em conexão com as mesmas só constituem um estabelecimento estável se a sua duração exceder nove meses».
Este período de 9 meses tem início no momento em que a empresa começa a exercer as suas actividades, incluindo os trabalhos preparatórios realizados no país onde vai ser desenvolvido o projecto e cessa no momento em que os trabalhos estejam concluídos ou sejam abandonados em definitivo ( [5] ).
A instalação física constituída pelo referido armazém e período durante o qual se fizeram diligências para o ocupar através de um contrato de arrendamento – refere-se no Relatório da Inspecção subjacente à determinação do lucro tributável da Requerente, que era evidente a existência desta em Portugal a partir de 4-12-2007, através da assinatura de um seu representante no anexo III ao contrato celebrado entre a B Portugal e a F (que consta de fls. 33 do documento do processo administrativo denominado «PA-2.pdf») – são relevantes para fixar o início do estabelecimento estável projecto, por dizerem claramente respeito a trabalhos preparatórios que lhe estão directamente ligados ( [6] ). Isto, independentemente de (i) não se demonstrar sequer que o referido representante alguma vez tenha estado em Portugal, pois o referido documento está datado de 3-12-2007, dia anterior ao da celebração do contrato, e é uma mensagem enviada ao representante da F, manifestando concordância com a sua proposta; (ii) não se encontrar qualquer prova de que, antes de 25-1-2008, data em é feito o primeiro registo de operações tributáveis e em que foram importados os componentes da Índia, tenha havido qualquer ocupação da instalação fixa que a F disponibilizou, nem que tenha sido efectuada qualquer preparação no local antes do início da actividade.
Todavia, apesar de em abstracto poder ser fixada em data anterior a 25-1-2008 o início do período relevante para efeitos de apurar a existência de um estabelecimento estável, no caso concreto esse período não releva. Pois, nas conclusões do Relatório de Inspecção subjacente à determinação do lucro tributável da Requerente, que deu origem às liquidações cuja declaração de ilegalidade é objecto do presente processo, apesar de se dizer que é evidente a existência da Requerente em Portugal a partir de 4-12-2007, para efeitos de enquadramento em sede de IRC, se optou «por considerar o seu início em 25-1-2008» (página 40 do documento do processo administrativo denominado «PA-1.pdf»).
Aliás, nas conclusões do Relatório de Inspecção subjacente à determinação do lucro tributável da Requerente, que deu origem às liquidações cuja declaração de ilegalidade é objecto do presente processo, apesar de se dizer que é evidente a existência da Requerente em Portugal a partir de 4-12-2007, para efeitos de enquadramento em sede de IRC, se optou «por considerar o seu início em 25-1-2008» (página 40 do documento do processo administrativo denominado «PA-1.pdf»).
Por isso, tendo o acto de determinação do lucro tributável da Requerente considerado como pressuposto de facto esta data de 25-1-2008, é com base nela que há que aferir da existência de estabelecimento estável relativamente, entre à actividade de montagem e instalação de componentes de aerogeradores.
No que concerne ao termo da actividade relativa à montagem e instalação de componentes de … a última factura encontrada na contabilidade da Requerente é a n.º ..., de 29-9-2008.
Porém, como se vê pela alínea z) da matéria de facto fixada, foram encontradas várias outras facturas na sequência da análise à contabilidade da B PORTUGAL, emitidas pela Requerente entre 12-1-2009 e 8-6-2009, que demonstram que a sua actividade se estendeu até esta data. Mesmo que se trate de materiais e ferramentas que continuaram no armazém arrendado à F e foram devolvidos, não se pode considerar cessado o projecto antes desta devolução e desocupação das instalações, pois trata-se de actos relacionados com as actividades e inerentes ao projecto de montagem ( [7] ). Isto é, a actividade da Requerente, de natureza temporária, exigia a ocupação das instalações, inclusivamente com as ferramentas necessárias para o exercício da actividade e a posterior desocupação com a retirada das mesmas ferramentas, pelo que tanto as primeiras como as segundas se devem entender como necessárias para o exercício da actividade que só cessa, realce-se, quando os trabalhos no seu todo sejam abandonados ( [8] ).
Por isso, Junho de 2009 será o mês relevante para efeito de termo final contagem do prazo exigido pelo n.º 3 do artigo 5.º da CDT para existência de um estabelecimento estável dos tipos aí previstos.
Isto significa que decorreram mais de 9 meses entre a data inicial e a final relevantes para efeito da existência de um estabelecimento estável, à face desta norma.
3.1.2.4. Estabelecimento estável derivado da actividade de reparação /substituição de … de …
No que concerne à reparação dos …, constata-se que a instalação física considerada, isto é, o armazém, é essencialmente usado para o projecto de montagem, desempenhando no que concerne à actividade de reparação dos geradores um papel meramente auxiliar nos termos descritos no artigo 5.º, n.º 4, da CDT. O armazém não constituirá, por conseguinte, um «estabelecimento estável instalação física» através do qual é desenvolvida a actividade de reparação.
Constata-se, porém, que inexiste qualquer outra instalação fixa que possa servir de base ao primeiro teste («estabelecimento estável instalação física») no que se refere essa actividade de reparação dos …, pois os «hospitais de campanha», além de não quadrarem de forma plena com o conceito de instalação física, não gozavam da permanência temporal exigida (algo que é admitido pela própria Autoridade Tributária e Aduaneira no artigo 45.º da resposta).
Assim, a actividade de reparação dos … apenas poderia dar azo a um estabelecimento estável no âmbito do artigo 5.º, n.º 3 da convenção celebrada entre Portugal e a Índia.
Teste que, segundo a tese dominante e subscrita por este Tribunal, não depende da verificação dos requisitos do artigo 5.º, n.º 1 e, por conseguinte, da verificação de uma instalação física, bastando-se com a existência de um projecto que tenha uma duração superior a 9 meses.
Vejamos se, de acordo com esse segundo teste, a actividade de reparação dá azo a um estabelecimento estável.
Pressupondo que a manutenção e a reparação podem ser reconduzidas ao âmbito do artigo 5.º, n.º 3, como parece ser pacífico ( [9] ), e tendo em conta que o facto de esse projecto não ter sido integralmente levado a cabo directamente pela Requerente, mas essencialmente por uma sociedade subcontratada (a B Portugal), à partida não se porá em causa o eventual cumprimento deste teste ( [10] ).
Determinante, todavia, para que surja um estabelecimento estável no âmbito do artigo 5.º, n.º 3, da CDT será que o projecto tenha uma duração superior a 9 meses.
Este requisito não se cumpriu, podendo isso ser inferido dos factos seguintes: o projecto, inicialmente previsto para ser executado nos meses de Fevereiro a Abril de 2008, acabou por não se iniciar antes de 2-10-2008, revelando a nota de débito dos custos respectivos, emitida pela B Portugal à Requerente em 31-3-2009, que a actividade de reparação/substituição de … de … terá durado no máximo 6 meses (fls. 18 a 24 e 26 do documento do processo administrativo denominado «PA-3.pdf»).
Agregar este projecto ao projecto de montagem dos … para, no âmbito do teste «estabelecimento estável projecto» contar o prazo, não se afigura possível.
Isto porque o critério dos 9 meses aplica-se a cada estaleiro individualmente, não sendo tido em consideração o tempo despendido noutros projectos. A não ser que tais projectos constituam um todo coerente quer a nível comercial quer a nível geográfico. Ora, tendo em conta que a montagem dos … foi feita numa instalação física específica distante do local onde foram realizadas as reparações, isso implica imediatamente a falta de coerência geográfica. A natureza distinta do contrato e a natureza diversa dos projectos em causa (os geradores reparados nada têm a ver com os … montados em Portugal) põe igualmente em causa a coerência comercial, o que se traduz na impossibilidade de os dois projectos serem considerados como uma unidade.
Em boa verdade, mesmo que fosse concebível a unidade, pressupondo obviamente que também a montagem constituiria um estabelecimento estável projecto, os efeitos do projecto de reparação traduzir-se-iam, quando muito, no plano dos gastos do estabelecimento estável, dado que as reparações foram efectuadas ao a abrigo de garantia, o que significa que implicaram encargos e não lucros.
Contudo, entendendo-se, como se entende, este estabelecimento estável como independente do relativo às operações de montagem e instalação de componentes, não poderá com base nele determinar-se qualquer lucro tributável, nem justificar as liquidações impugnadas.
Por isso, estas serão ilegais, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, na medida em que tenham considerado lucros referentes à actividade de reparação/substituição de pás de aerogeradores.
3.2. Imputação de lucros ao estabelecimento estável
A Autoridade Tributária e Aduaneira apurou o valor dos custos e proveitos do estabelecimento estável nos termos referidos nas alíneas nn) e oo) da matéria de facto fixada.
A Requerente censura a este apuramento ter sido efectuado apenas com base nos elementos fornecidos pelo registo de IVA da Requerente e que ele não reflectem os custos de um estabelecimento estável pois há despesas que não estão sujeitas a IVA, designadamente com salários, amortizações e demais custos com pessoal e encargos financeiros.
A Autoridade Tributária e Aduaneira refere que não foi isso que sucedeu, tendo considerado os custos que derivam dos documentos que constam do Anexo XIV ao Relatório da Inspecção.
O artigo 7.º da CDT estabelece o seguinte:
Artigo 7.º
Lucros das empresas
1 - Os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só podem ser tributados nesse Estado, a não ser que a empresa exerça a sua actividade no outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento estável aí situado. Se a empresa exercer a sua actividade deste modo, os seus lucros podem ser tributados no outro Estado, mas unicamente na medida em que forem imputáveis:
a) A esse estabelecimento estável;
b) A vendas realizadas nesse outro Estado de bens ou de mercadorias idênticos ou similares aos bens ou mercadorias vendidos através desse estabelecimento estável; ou
c) A outras actividades comerciais exercidas nesse outro Estado idênticas ou similares às actividades realizadas através desse estabelecimento estável.
2 - Com ressalva do disposto no n.º 3, quando uma empresa de um Estado Contratante exercer a sua actividade no outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento estável aí situado, serão imputados, em cada Estado Contratante, a esse estabelecimento estável os lucros que este obteria se fosse uma empresa distinta e separada que exercesse as mesmas actividades ou actividades similares, nas mesmas condições ou em condições similares, e tratasse com absoluta independência com a empresa de que é estabelecimento estável.
3 - Na determinação do lucro de um estabelecimento estável é permitido deduzir as despesas que tiverem sido feitas para realização dos fins prosseguidos por esse estabelecimento estável, incluindo as despesas de direcção e as despesas gerais de administração, efectuadas com o fim referido, quer no Estado em que esse estabelecimento estável estiver situado quer fora dele, com ressalva do disposto na legislação interna do Estado Contratante em que o estabelecimento estável estiver situado.
4 - Não serão imputáveis lucros a um estabelecimento estável pelo facto da simples compra de bens ou de mercadorias, por esse estabelecimento estável, para a empresa.
5 - Para efeitos dos números anteriores, os lucros imputáveis a um estabelecimento estável serão determinados anualmente, segundo o mesmo método, a não ser que existam motivos válidos e suficientes para proceder de forma diferente.
6 - Quando os lucros compreendam elementos do rendimento especialmente tratados noutros artigos desta Convenção, as respectivas disposições não serão afectadas pelas deste artigo.
De acordo com este artigo 7.º da convenção celebrada entre Portugal e a Índia, na linha da CMOCDE, quando uma empresa indiana tiver um estabelecimento estável em Portugal, como se verificou, os lucros obtidos por essa empresa no nosso país apenas podem ser aqui tributados se forem imputáveis ao estabelecimento estável. Isto é, aqueles lucros que o estabelecimento estável obteria «se fosse uma empresa distinta e separada que exercesse as mesmas actividades ou actividades similares, nas mesmas condições ou em condições similares, e tratasse com absoluta independência com a empresa de que é estabelecimento estável». O que seria feito segundo as condições e os preços correntes no mercado de acordo com o princípio da plena concorrência. Tendo em conta que apenas os lucros resultantes da montagem e supervisão podem ser imputados ao estabelecimento estável (depois de aplicado o princípio da plena concorrência previsto no artigo 9.º da CDT), somente estes poderão ser considerados para efeitos de tributação. Aliás, conforme foi demonstrado, unicamente uma parte da actividade da Requerente foi desenvolvida em Portugal através da instalação física considerada.
É certo que na convenção celebrada entre Portugal e a Índia está previsto o princípio da atracção do estabelecimento estável, que implica que lhe sejam imputados os lucros tanto (a) das vendas realizadas no Estado onde se verifica a existência do estabelecimento estável de bens ou de mercadorias idênticos ou similares aos bens ou mercadorias vendidos através desse estabelecimento estável; como (b) de outras actividades comerciais exercidas no Estado onde se verifica a existência do estabelecimento estável idênticas ou similares às actividades realizadas através desse estabelecimento. Constata-se, porém, que a forma como foi concretizado o princípio da atracção, especialmente no que respeita à alínea a), única relevante para o caso em decisão, não põe em causa a conclusão de que apenas os lucros relativos às operações de montagem e respectiva supervisão podem ser imputados ao estabelecimento estável. Pois as vendas, designadamente de …, feitas pela Requerente em Portugal não têm paralelo na actividade do estabelecimento estável, na medida em que através dele não se fazem operações desse tipo. Fazem-se única e exclusivamente, como já foi sobejamente referido, a montagem de elementos nos aerogeradores e supervisão desses trabalhos.
No que concerne aos custos, o n.º 3 do artigo 7.º da CDT estabelece que é permitido deduzir «as despesas que tiverem sido feitas para realização dos fins prosseguidos por esse estabelecimento estável».
No caso em apreço, no que concerne a remunerações, incluem-se algumas (de I, na página 46 do documento do processo administrativo denominado «PA-4.pdf»; de … e …, na página 57 do documento do processo administrativo denominado «PA-4.pdf»), mas há muitos outros trabalhadores, designadamente os de presumível nacionalidade portuguesa (como se infere dos seus nomes) indicados na lista que consta de página 58 do mesmo documento, relativamente aos quais não é indicada a remuneração, para além dos «elementos da equipa indiana», cuja estadia é referida na página 39 do mesmo documento, sem qualquer indicação da respectiva remuneração.
Para além disso, no n.º 3 do artigo 7.º da CDT Portugal Índia permite-se a dedução, para efeitos de determinado do lucro tributável do estabelecimento estável, das «despesas de direcção e as despesas gerais de administração, efectuadas com o fim referido, quer no Estado em que esse estabelecimento estável estiver situado quer fora dele» e não se vislumbra que essas despesas tenham sido consideradas.
É certo que não haverá na contabilidade da Requerente elementos que permitam calcular exactamente tais custos, mas, a alternativa, quando há a certeza que há mais despesas necessárias para a obtenção dos proveitos que não estão documentadas, é determinar o lucro tributável através de métodos indirectos, como estabelece o artigo 87.º, n.º 1, alínea b), da Lei Geral Tributária, e não fazer o seu cálculo com base nos elementos existentes, como se esses outros custos não existissem.
É de notar que, na parte final do n.º 3 do artigo 7.º da CDT ressalva-se, em matéria de determinação do lucro tributável, o disposto na legislação interna do Estado Contratante em que o estabelecimento estável estiver situado, o que viabiliza a aplicação daquela regra da Lei Geral Tributária.
Por isso, tem de se concluir que as correcções efectuadas enfermam de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, derivado da não aplicação de métodos indirectos, nos termos do artigo 87.º, n.º 1, alínea b), da Lei Geral Tributária e do artigo 7.º, n.º 3, da CDT Portugal Índia, vício este que se repercutiu nas liquidações impugnadas e justifica a sua anulação [artigo 135.º do Código do Procedimento Administrativo, aplicável por força do disposto no artigo 2.º, alínea c), da Lei Geral Tributária].
4. Questão do reembolso dos custos suportados e a suportar pela Requerente relacionados com o presente processo
A Requerente pede que lhe sejam reembolsados os custos suportados e a suportar pela Requerente com os honorários e despesas dos seus advogados relativos ao enquadramento jurídico da questão, acompanhamento do procedimento administrativo, preparação do presente processo arbitral e acompanhamento do processo arbitral, bem como outras despesas em que já tenha incorrido ou venha a incorrer com a presente arbitragem, tudo em montante a liquidar futuramente.
Não se inclui entre as competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD apreciar pedidos deste tipo.
Na verdade, o artigo 2.º do RJAT apenas atribui a estes Tribunais Arbitrais competências para a declarar a ilegalidade dos actos dos tipos aí indicados e a anulação ou declaração de nulidade que são corolário do reconhecimento de ilegalidades.
Para além dessas questões, tem-se entendido, em sintonia com a jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Administrativo, que podem ser apreciados pedidos que podem ser formulados em processo de impugnação judicial (de que os processos arbitrais tributários são alternativa, como se refere no artigo 124.º, n.º 2, da Lei n.º 3-B/2012, de 28 de Abril).
Estão nessas condições os pedidos de condenação no pagamento de juros indemnizatórios (o que tem suporte legal explícito no artigo 61.º, n.º 4, do Código de Procedimento e de Processo Tributário) e de condenação no pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida (o que também tem suporte legal expresso no artigo 171.º, n.º 1, do mesmo Código).
No que concerne a reembolso de despesas derivadas do processo, não se prevê qualquer competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, nem se encontra norma que atribua tal competência aos tribunais tributários em processo de impugnação judicial e, por isso, também não podem ser apreciados no presente processo arbitral.
Termos em que se declara a incompetência em razão da matéria deste Tribunal Arbitral para conhecer deste pedido.
5. Decisão
De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:
a) Julgar procedentes os pedidos de anulação das liquidações de IRC relativas aos anos de 2008 e 2009 n.ºs 2012 … e 2012 … e anular estas liquidações;
b) Julgar este Tribunal Arbitral incompetente, em razão da matéria, para apreciar o pedido de reembolso de despesas derivadas do presente processo, absolvendo da instância a Autoridade Tributária e Aduaneira, quanto a este pedido.
6. Valor do processo
De harmonia com o disposto no art. 315.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 988.005,00.
7. Custas
Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 13.770.00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 31 de Outubro de 2013
Os Árbitros
(Jorge Manuel Lopes de Sousa)
(João Sérgio Ribeiro)
(Diogo Leite de Campos)
( [1] ) A cópia da factura n.º 29/2009, consta da página 22 do documento «PA4.pdf», junto com a resposta.
( [2] ) Sobre as dúvidas que se suscitam quanto à solução desta questão, pode ver-se J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, de 4.ª edição, páginas 260-261.
( [3] ) Essencialmente neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, a propósito de situação paralela que se coloca nos processos de recurso contencioso:
– de 10-11-98, do Pleno, proferido no recurso n.º 32702, publicado em Apêndice ao Diário da República de 12-4-2001, página 1207;
– de 19/06/2002, processo n.º 47787, publicado em Apêndice ao Diário da República de 10-2-2004, página 4289;
– de 09/10/2002, processo n.º 600/02;
– de 12/03/2003, processo n.º 1661/02.
Em sentido idêntico, podem ver-se:
– MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, volume I, 10.ª edição, página 479 em que refere que é «irrelevante que a Administração venha, já na pendência do recurso contencioso, invocar como motivos determinantes outros motivos, não exarados no acto», e volume II, 9.ª edição, página 1329, em que escreve que «não pode (...) a autoridade recorrida, na resposta ao recurso, justificar a prática do acto recorrido por razões diferentes daquelas que constam da sua motivação expressa»;
– MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, Direito Administrativo, Volume I, página 472, onde escreve que «as razões objectivamente existentes mas que não forem expressamente aduzidas, como fundamentos do acto, não podem ser tomadas em conta na aferição da sua legalidade».
( [4] ) Ver Comentário ao art. 5 da Convenção Modelo, §5.1.
( [5] ) Ver Comentário ao art. 5 da Convenção Modelo, § 19.
( [6] ) Klaus VOGEL, Klaus Vogel on Double Taxation Conventions, third edition, Kluwer, Haia, 1997, p. 307, § 77.
( [7] ) Ver Comentário ao art. 5 da Convenção Modelo, § 19.
( [8] ) Ver Comentário ao art. 5 da Convenção Modelo, § 19.
( [9] ) Cfr. Klaus VOGEL, op. cit., p. 288 e p.306, § 73a.
( [10] ) Ver Comentário ao art. 5.º da Convenção Modelo, §24 in fine. Cfr. Klaus VOGEL, op. cit., p. 309.