DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros Carlos Fernandes Cadilha (árbitro-presidente), Amândio Silva e Álvaro Caneira (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o presente Tribunal Arbitral, acordam o seguinte:
I. Relatório
1. A... e B..., contribuintes fiscais números ... e ..., residentes em ..., London ..., Reino Unido, apresentaram, em coligação, pedido de constituição de Tribunal Arbitral em matéria tributária e pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto na alínea a) do artigo 3.º, alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º, todos do Decreto-Lei n.º10/2011, de 20 de Janeiro - Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), visando a declaração de ilegalidade das decisões de indeferimento das reclamações graciosas n.ºs ...2018... e ...2018..., proferidas pela Chefe de Divisão de Justiça Administrativa da Direcção de Finanças de Lisboa (Docs. 1 e 2) bem como das liquidações de IRS n.ºs 2017..., correspondente ao acerto de contas 2017..., e n.º 2017..., correspondente ao acerto de contas n.º 2017... .
Os Requerentes pedem também a devolução do imposto indevidamente cobrado, acrescido dos correspondentes juros indemnizatórios contados nos termos legais.
É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT).
2. Como fundamento do pedido, apresentado em 15-04-2019, os Requerentes alegam, em síntese, que as referidas decisões de indeferimento parcial das reclamações graciosas interpostas, bem como os atos tributários que constituem o respetivo objeto, se encontram feridas de ilegalidade, porquanto, respeitando à tributação de mais-valias imobiliárias realizadas por residentes noutro Estado-Membro da União Europeia, foi a correspondente base tributável determinada, com fundamento na norma do n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS (CIRS), considerando o valor total da mais-valia.
3. No entender dos Requerentes, a circunstância de não ter sido considerado como base de tributação o valor de 50% do saldo as mais-valias realizadas no ano a que respeita o tributo em causa, conforme decorre da regra geral aplicável aos contribuintes residentes em território português, constitui violação dos princípios da não discriminação e da livre circulação de capitais, consagrados nos artigos 18.º e 63.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).
4. Em resposta ao solicitado, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) pronunciou-se no sentido da improcedência do presente pedido de pronúncia arbitral, considerando dever manter-se na ordem jurídica os atos tributários impugnados e, em conformidade, decidindo-se pela absolvição da entidade requerida.
5. Considera, ainda, a AT, que, caso assim não entenda, o Tribunal “deverá suspender a presente instância arbitral e sujeitar a questão ao Tribunal de Justiça, nos termos previstos no instituto do reenvio prejudicial (artigo 267.º do TFUE), a que o Estado Português se vinculou nos termos do TFUE.” Ou, em alternativa, se “suspenda a instância até à prolação de uma decisão por parte do Tribunal de Justiça da União Europeia, no processo 598/2018-T “.
6. O pedido de constituição do tribunal arbitral, apresentado em 15-04-2019, foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira.
7. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20/01, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31/12, o Conselho Deontológico designou como árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo os ora signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
8. Devidamente notificadas dessa designação, as partes não manifestaram vontade de recusar a designação dos árbitros nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
9. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31/12, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 03-06-2019.
10. Regularmente constituído o tribunal arbitral é materialmente competente, face ao preceituado no artigo 2.º, n.º 1, alínea a), do RJAT.
11. As partes, devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigos. 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT, e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22/03).
12. Atento o conhecimento que decorre das peças processuais juntas pelas Partes, que se julga suficiente para a decisão, o Tribunal, considerando que o “processo não se mostra especialmente complexo no plano da tramitação processual, não foram suscitadas exceções de que caiba conhecer preliminarmente, nem há irregularidades a suprir” e que “a matéria de facto relevante para a decisão da causa poderá ser fixada com base na prova documental, tornando-se desnecessária a realização de outras diligências instrutórias”, e “em aplicação dos princípios da autonomia do tribunal na condução do processo, e da celeridade, simplificação e informalidade processuais (artigos 19.º, n.º2 e 29.º, n.º 2 do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária), por despacho de 18-06-2019, decidiu dispensar a reunião a que se refere o artigo 18.º do referido Regime.
13. Pelo mesmo despacho, foi determinada a notificação das Partes para apresentarem alegações escritas facultativas pelo prazo sucessivo de quinze dias, sendo, ainda, indicada como data limite para prolação da decisão arbitral o dia 03-12-2019.
14. A decisão mereceu concordância das Partes, que, dentro do prazo assinalado, apresentaram alegações escritas reafirmando, no essencial, as posições já anteriormente expressas no pedido de pronúncia arbitral e correspondente resposta.
II. Matéria de facto
15. Com relevância para a apreciação da questão suscitada, destacam-se os seguintes elementos factuais, que, com base no acervo documental junto aos autos, mormente o processo administrativo e documentos que o integram, se consideram provados:
15.1. O prédio urbano correspondente ao lote número ..., situado em ..., ..., Concelho de..., inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ..., sob o número ..., de 11 de Julho de 2007, foi propriedade de B..., contribuinte fiscal n.º..., falecido em 7 de Dezembro de 2006.
15.2. Sucederam-lhe, como únicos e universais herdeiros, os filhos A... e B..., ora Requerentes, tendo-lhes sido outorgada em 27 de Fevereiro de 2007, em Lisboa, no Cartório Notarial da C..., a competente habilitação de herdeiros (Doc. 8, anexo à reclamação graciosa)
15.3. Na sequência da transmissão ocorrida por óbito de B..., foi efetuada, em 25 de Maio de 2007, a respetiva participação, para efeitos de liquidação de Imposto do Selo, que veio a ser efetuada em 18 de Fevereiro de 2008, sendo considerado para o efeito e com referência ao imóvel supra identificado o valor tributável de € 256.540,00. (Doc. 9, anexo à reclamação graciosa), cabendo a cada um dos sucessores o valor tributável de € 128 270,00.
15.4. Por escritura notarial de 1 de Agosto de 2016, cada um dos Requerentes alienou a metade do imóvel que lhe coube na herança de seu pai, efetivando-se a alienação pelo valor total de € 925 000,00, correspondendo, assim, a cada um dos alienantes a importância de € 462 500,00 (Doc.10, anexo à reclamação graciosa).
15.5. Em 31 de Maio de 2017 cada um dos ora Requerentes apresentou a respetiva declaração periódica de rendimentos respeitante ao ano de 2016 e às mais-valias realizadas com a alienação do imóvel em causa.
15.6. Das referidas declarações, complementadas com o respetivo Anexo G, é identificado o prédio transmitido, a data da sua aquisição e assinalados, nos campos próprios, a qualidade de não residente do declarante bem como a opção por tributação pelo regime geral, sendo declarados os seguintes valores:
Declarante Valor de Realização Valor de Aquisição Despesas e Encargos
A... € 475 000,00 € 128 270,00 € 23 370,00
B... € 475 000,00 € 128 270,00 € 23 616,01
15.7. Com base nos elementos declarados foi desencadeado o procedimento de liquidação de IRS sendo apurados os montantes de € 86.230,92 a pagar pela Requerente A...– Liquidação n.º 2017 ... - e € 86.162,04 – Liquidação n.º 2017 ...- pelo Requerente B... .
15.8. Ainda com base nesses valores declarados e considerando a atualização do valor de aquisição por via da aplicação do coeficiente de correção monetária de 1,12, previsto na Portaria n.º 316/2016, de 14/12, as referidas liquidações têm por base um rendimento global de € 307 967,60 – Liquidação efetuada a Requerente A...– e de € 307 721,59 – Liquidação ao Requerente B...– a que é aplicada a taxa especial de 28%, nos termos da alínea a) do nº 1 do artigo 72.º do Código do IRS.
15.9. Às liquidações em causa, correspondem, respetivamente, as Notas de Cobrança 2017..., de 22 de Junho de 2017 e 2017..., de 22 de Agosto de 2017. oportunamente regularizadas em sede de cobrança voluntária (Cf. Informação constante do processo de reclamação graciosa).
15.10. Em 12 de Dezembro de 2017 foram promovidas liquidações oficiosas, corrigindo o valor de realização e excluindo a dedução relativa a despesas e encargos relativos à alienação do imóvel, sendo, assim, apurados os valores de € 89 325,21 de imposto imputado à Requerente A... e € 89 326,26, ao Requerente B... .
Declarante Valor de Realização Valor de Aquisição Despesas e Encargos
A... € 462 500,00 € 128 270,00 -
B... € 462 500,00 € 128 270,00 -
15.11. Em consequência da correção e liquidação oficiosas, são emitidas notas de cobrança pela diferença entre o valor apurado nas liquidações corretivas e iniciais, sendo emitidas as Notas de Cobrança n.ºs 2017..., de 21 de Dezembro de 2017, no valor de € 3 094,29, e 2017..., de 20 de Dezembro de 2017, no valor de € 3 164,32, tendo como destinatários os Requerentes A... e B..., respetivamente. Estes valores adicionais foram objeto de oportuna regularização em sede de cobrança voluntária.
15.12. Em 30 de Maio de 2018, os Requerentes, em coligação, deduziram reclamação graciosa, contra os atos de liquidação efetuados pela AT, alegando encontrarem-se os mesmos feridos de ilegalidade e, em consequência, peticionando a sua anulação parcial, na parte em que foram desconsideradas as despesas e encargos declarados bem como na parte em que foi considerada como base de tributação das mais-valias mais de 50% do seu valor.
15.13. Foi, ainda, solicitado o reembolso das importâncias indevidamente cobradas acrescidas dos correspondentes juros indemnizatórios.
15.14. Os serviços da administração tributária, considerando não se verificarem os necessários pressupostos legais da coligação de reclamantes, optaram por autonomizar as reclamações, cabendo à petição da Requerente A... a reclamação identificada sob o n.º ...2018... e à do Requerente B... a reclamação com o n.º ...2018... .
15.15. Por despachos de 18 de Dezembro de 2018, da Chefe de Divisão de Justiça Administrativas da Direcção da Finanças de Lisboa, proferidos no uso de subdelegação de competência, foram as reclamações objeto de deferimento parcial.
15.16. De acordo com as informações e despacho que sobre as mesmas recaiu – juntas ao presente processo - em tudo idênticas no seu conteúdo, a decisão de deferimento parcial fundamenta-se na circunstância de ter sido feita prova pelos reclamantes de que as despesas e encargos relativos à alienação do prédio que gerou o rendimento sujeito a tributação, no valor de € 21 033,00, respeitam a comissão de mediação imobiliária, enquadrando-se no âmbito da norma da alínea a) do artigo 51.º do Código do IRS.
15.17. No tocante à tributação da mais-valia realizada com base em 50% do seu valor, a reclamação foi indeferida, com o fundamento de que a norma do n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS respeita ao saldo positivo ou negativo dos ganhos inerentes a transmissões realizadas por sujeitos passivos residentes em território português, de onde decorre, “a contrario sensu que o mesmo saldo, sendo apurado por não residentes é considerado em 100%, sobre o qual recai uma taxa especial de 28%, prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 72.º do CIRS.”
15.18. Como fundamento da decisão é, ainda, invocada a norma do n.º 9 (atual n.º 13) do artigo 72.º do mesmo Código, que faculta aos sujeitos passivos residentes noutro Estado-membro da União Europeia a possibilidade de serem sujeitos a tributação em termos idênticos aos dos residentes, optando pela mesma taxa de tributação que, de acordo com a tabela prevista no n.º 1 do artigo 68.º do CIRS, lhes corresponderia caso fossem residentes em Portugal, possibilitando-lhes, assim, o englobamento de apenas 50% do saldo das mais-valias.
15.19. Concluindo, a decisão de indeferimento, proferida sobre cada uma das reclamações, suporta-se na consideração de que “No caso em apreço, a requerente não acionou a referida opção na declaração (designadamente nos campos 08,09 e 11 do Quadro 8B da folha de rosto) nem declarou a totalidade dos rendimentos obtidos no estrangeiro, pelo que na liquidação aqui controvertida, mais não se fez do que aplicar a taxa especial de 28% prevista na mencionada alínea a) do n.º 1 do artigo 72.º do CIRS.
Pelo exposto não se vislumbra, assim, motivo para concluir que haja qualquer ilegalidade da liquidação de IRS em sindicância, na medida em que a mesma, conforme resulta supra, se encontra em consonância com o declarado, ou seja, com a tributação do regime geral.”
15.20. A decisão de deferimento parcial das reclamações foi comunicada aos Requerentes através de ofícios datados de 18 de Dezembro de 2018.
15.21. Na sequência do deferimento parcial das reclamações, os serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira elaboraram declarações oficiosas em nome de cada um dos ora Requerentes vindo, em cada uma das quais, a ser considerado o montante de despesas e encargos de € 21.033,00. Considerando esse valor dedutível foram efetuadas em 22 de fevereiro de 2019 as liquidações de IRS números 2019... (em nome da Requerente A...) e 2019... (em nome do Requerente B...), respetivamente (cfr. pontos 10 e 11 da Resposta da AT).
16. A matéria de facto dada como provada assenta na prova documental apresentada, designadamente a constante do processo administrativo junto pela Requerida.
17. Não existem factos relevantes para a decisão que não se tenham provado.
IV. Matéria de direito
18. No pedido de pronúncia arbitral, os Requerentes submetem à apreciação deste tribunal a legalidade dos atos de indeferimento parcial das reclamações graciosas interpostas contra os atos de liquidação de IRS do ano de 2016, solicitando, consequentemente, a declaração de ilegalidade desses atos.
19. O pedido formulado tem como base o entendimento de que a AT ao considerar a totalidade da mais-valia realizada por cada um dos Requerentes, aplicou o disposto no artigo 43.º, n.º 2, do Código do IRS, norma que, conforme entendimento jurisprudencial do Tribunal Europeu, acolhido na jurisprudência nacional, viola as disposições dos artigos 18.º e 63.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).
20. Em resposta, a AT considera que em função do deferimento parcial das reclamações “10 ...os serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira elaboraram declarações oficiosas em nome de cada um dos ora requerentes de pronúncia arbitral relativamente ao ano de 2016, vindo, em cada uma das quais, a ser considerado o montante de despesas e encargos de € 21.033.
11. Com base nas mesmas, viriam a ser efetuadas em 22-02-2019 as liquidações de IRS números 2019 ... (em nome da Requerente A...) e 2019 ... (em nome do Requerente B...), respetivamente.
12. Contudo, as liquidações colocadas em crise no presente pedido de pronúncia arbitral são as efetuadas em 15-12-2017 sob os números 2017... (em nome do contribuinte B...) e 2017 ... (em nome da contribuinte A...), as quais foram produzidas sem que fosse tido em conta qualquer montante referente àquele tipo de despesas e encargos.
13. Ora, no PPA os Requerentes não efetuam menção a qualquer pretensão relativa a despesas e encargos com as operações de aquisição e/ou alienação do imóvel supra identificado.
14. Pelo que, é possível concluir que os Requerentes concordam com o valor considerado a este título pela AT (€ 21.033 relativamente a cada Requerente).
15. Nesta circunstância, vai a apreciação a efetuar pela Requerida cingir-se à pretensão relativa ao saldo das mais-valias com a alienação de 50% do imóvel inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ..., concelho de ..., sob o artigo... .
21. Assim delimitado o objeto do presente pedido de pronúncia arbitral, sustenta a Requerida, em síntese, que na sequência do acórdão C-443/06 (Hollmann) do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) de 11-10-2007, que declarou a norma do artigo 43.º n.º 2 do Código do IRS incompatível com o direito comunitário por instituir um tratamento fiscal discriminatório para os não residentes, o legislador procedeu à adaptação do sistema fiscal nacional com vista a conformá-lo com a referida decisão.
22. Essa adaptação, efetivada através da Lei n.º 67-A/2007, de 31/12, traduziu-se no aditamento ao artigo 72.º do Código do IRS dos números 7 e 8 (atuais n.sº 13 e 14), normas que “ passaram a prever uma limitação da tributação a 50% das mais-valias realizadas, já não APENAS para os residentes em Portugal, mas TAMBÉM para os não residentes, desde que residentes noutro Estado membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu.“
23. No entender da Requerida, “a alteração introduzida ao artigo 72º do Código do IRS pela Lei n.º 67-A/2007, de 31/12, sanou o vício de que padecia a legislação nacional, nos termos julgados pelo referido Acórdão” porquanto “ a alteração operada por via da introdução dos atuais n.º 9 e 10 (atuais n.ºs 13 e 14) do artigo 72.º, do Código do IRS, veio permitir que, tanto residentes como não residentes, beneficiem do regime previsto no artigo 43.º, n.º 2 (consideração do saldo da mais-valia em apenas 50% do seu valor), do mesmo Código, desde que OPTEM pelo englobamento dos rendimentos obtidos tanto em Portugal como fora deste território.”
24. No quadro normativo referido passaram a estar previstas “duas situações/possibilidades/alternativas de tributação do saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, resultantes da diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição por alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis.
Assim, por um lado, os Requerentes podiam ter optado pela tributação desses rendimentos (mais-valias) à taxa que, de acordo com a tabela prevista no n.º 1 do artigo 68.º do Código do IRS, seria aplicável no caso de serem auferidos por residentes em território português, sendo que a determinação da taxa teria em conta todos os rendimentos incluindo os obtidos fora deste território, nas mesmas condições que são aplicáveis aos residentes, o que não fizeram.
Por outro lado, os Requerentes podiam ter optado, como o fizeram, pela taxa autónoma de 28%, conforme previsto no artigo 72.º, n.º 1, alínea a) do Código do IRS.”
25. Conclui, assim, a Requerida, que com a alteração ao artigo 72.º do Código do IRS operada pela Lei n.º 67-A/2007, de 31/12, após a decisão do Acórdão Hollmann, a legislação nacional se adequou plenamente ao direito comunitário, pronunciando-se no sentido de ser proferida decisão que julgue improcedente o pedido de pronúncia arbitral e consequentemente ser absolvida, com as legais consequências.
26. Porém, sustenta a Requerida que, caso assim não se entenda, deve ser analisada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia a alteração legislativa operada após a decisão do Acórdão Hollmann por via do reenvio prejudicial.
27. Em alternativa ao reenvio prejudicial, a Requerida solicita que “... se suspenda a instância até à prolação de à prolação de uma decisão por parte do Tribunal de Justiça da União Europeia, no processo arbitral n.º 598/2018-T.”
28. De acordo com a Requerida, o Tribunal Arbitral decidiu no referido processo “ 1 - Submeter ao Tribunal de Justiça da União Europeia, ao abrigo da alínea a) do artigo 267.º do TFUE, a seguinte questão prejudicial necessária ao julgamento da causa:
Questão:
As disposições conjugadas dos artigos 12.º, 56.º, 57.º e 58.º do Tratado da Comunidade Europeia [atuais 18.º, 63.º, 64.º e 65.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia] devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional, como a que está em causa no presente processo (n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442.º-A/88, de 30 de novembro, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 109-B/2001, de 27 de dezembro), com as alterações introduzidas pela Lei n.º 67.º-A/2007, de 31/12, com aditamento dos n.ºs 7 e 8 (atuais 9 e 10) ao artigo 72.º do Código do IRS, por forma a permitir que as mais-valias resultantes da alienação de imóveis situados num Estado-Membro (Portugal), por um residente de um outro Estado-Membro da União Europeia (França) não fiquem sujeitos, por opção, a uma carga fiscal superior à que incidiria, em relação a este mesmo tipo de operação, sobre as mais-valias realizadas por um residente do Estado onde estão situados os imóveis?
2 - Suspender a presente instância até à decisão a proferir pelo Tribunal de Justiça Europeu, nos termos que antes se solicita. “
29. Face às questões colocadas importa, antes de mais, analisar-se o quadro normativo aplicável à tributação das mais-valias imobiliárias realizadas por sujeitos passivos residentes noutro Estado-membro da União Europeia, nas vertentes relativas à incidência tributária, determinação da base tributável e taxa aplicável.
Da incidência tributária
30. Nos termos do artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do artigo 10.º, do Código do IRS, “constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de (...) alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis...”.
31. Esses rendimentos, desde que resultantes da transmissão de direitos reais relativos a imóveis situados em território português consideram-se aqui obtidos (CIRS, art. 18.º, n.º1, al. h), ficando, assim, abrangidos pela incidência deste tributo quando auferidos por titulares não residentes (CIRS, arts.13.º, n.º 1 e 15.º, n.º 2).
32. Conforme resulta do artigo 10.º, n.º 4, do Código do IRS, o ganho sujeito a tributação é constituído pela diferença positiva entre o valor de realização e o valor de aquisição, sendo este valor atualizado pelo coeficiente de correção monetária e acrescido de encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos 12 anos e bem assim das despesas necessárias e efetivamente praticadas inerentes à aquisição e alienação, nos termos dos artigos 50.º e 51.º do mesmo Código.
33. O valor dos rendimentos qualificados como mais-valias, integrando a Categoria G do IRS, é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, conforme prevê o artigo 43.º, n.º1, do citado Código.
34. No entanto, segundo o n.º 2 do mesmo artigo, na redação em vigor à data da ocorrência do facto tributário a que se reporta o presente pedido de pronúncia arbitral,
o referido saldo, positivo ou negativo, quando respeitante a mais-valias imobiliárias, é apenas considerado em 50% do seu valor, quando “respeitante às transmissões efetuadas por residentes”
35. Quando auferidos por sujeitos passivos residentes esses rendimentos são sujeitos a englobamento e, em conjunto com outros rendimentos auferidos no mesmo ano pelos respetivos titulares, sobre eles incidem as taxas gerais previstas no artigo 68.º do Código do IRS.
36. Diversamente, se esses rendimentos forem auferidos por titulares não residentes em território português, são sujeitos a tributação autónoma, incidente à taxa especial de 28% sobre a totalidade das mais-valias, nos termos do artigo 72.º, n.º 1, alínea a), do mesmo Código.
37. A assinalada desigualdade de tratamento fiscal no que respeita à tributação de mais-valias entre os sujeitos passivos residentes e não residentes foi submetida à apreciação do Tribunal de Justiça da União Europeia, por via de um pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Supremo Tribunal Administrativo (Ac. de 28-09-2006, Proc.439/06).
38. Respondendo à questão colocada, o Tribunal de Justiça, em acórdáo de 11-10-2007, proferido no Proc. C-443/06 (Hollmann), declarou que “ O artigo 56º CE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no litígio no processo principal, que sujeita as mais-valias resultantes da alienação de um bem imóvel situado num Estado-Membro, no caso vertente em Portugal, quando essa alienação é efectuada por um residente noutro Estado-Membro, a uma carga fiscal superior à que incidiria, em relação a este mesmo tipo de operação, sobre as mais-valias realizadas por um residente do Estado onde está situado esse bem imóvel.”
39. Na sequência da referida decisão, o Supremo Tribunal Administrativo, em acórdão de 16-01-2008, proferido naquele Processo 439/06, veio igualmente a decidir que “ O n.º 2 do artigo 43º do Código do IRS, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, que limita a incidência de imposto a 50% das mais-valias realizadas apenas para residentes em Portugal, viola o disposto no art. 56º do Tratado que Institui a Comunidade Europeia, ao excluir dessa limitação as mais-valias que tenham sido realizadas por um residente noutro Estado membro da União Europeia.”
40. A orientação referida tem vindo a ser invariavelmente seguida pelo Supremo Tribunal Administrativo conforme se pode verificar dos acórdãos de 22-03-2011- Proc. 01031/10, de 10-10-2012, Proc. 0533/12, de 30 -04-2013, Proc. 01374/12, de 18-11-2015, Proc. 0699/15, de 03-02-2016, Proc. 01172/14 e, mais recentemente, de 20-02-2019, Proc. 0901/11.
41. Porém, o legislador nacional, por via da Lei n.º 67-A/2007, de 31/12, procurou obviar o tratamento discriminatório dos residentes comunitários e do Espaço Económico Europeu, facultando-lhes, em termos opcionais, a possibilidade de tributação das mais-valias imobiliárias em condições similares às aplicáveis aos residentes em território português, aditando ao artigo 72.º do Código do IRS os números 7 e 8 (n.ºs 9 e 10 à data dos factos, na renumeração operada pela Lei n.º 66-B/2012, de 31/12, a que correspondem os atuais n.ºs 13 e 14), com a seguinte redação:
“9 - Os residentes noutro Estado membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, desde que, neste último caso, exista intercâmbio de informações em matéria fiscal, podem optar, relativamente aos rendimentos referidos nas alíneas a) e b) do n.º 1 e no n.º 2, pela tributação desses rendimentos à taxa que, de acordo com a tabela prevista no n.º 1 do artigo 68.º, seria aplicável no caso de serem auferidos por residentes em território português.
10 - Para efeitos de determinação da taxa referida no número anterior são tidos em consideração todos os rendimentos, incluindo os obtidos fora deste território, nas mesmas condições que são aplicáveis aos residentes.”
42. Contrariamente ao entendimento da Requerida, o regime opcional acima referido não veio sanar o regime discriminatório que se mantém em vigor e foi aplicado às liquidações de IRS ora questionadas.
43. Após a alteração legislativa acima referida ficaram a vigorar, na área da tributação dos rendimentos qualificados como mais-valias originadas pela transmissão onerosa de direitos reais sobre bens imóveis situados em território português, dois regimes distintos, aplicáveis a não residentes: um regime geral, aplicável a quaisquer sujeitos passivos não residentes, traduzido na tributação desses rendimentos à taxa especial de 28% incidente sobre a totalidade do rendimento e um regime especificamente aplicável a residentes noutro Estado-membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, equiparável ao regime de que beneficiam os sujeitos passivos residentes.
44. Este regime específico de equiparação aos residentes é opcional, não afastando, contudo, o carácter discriminatório da norma do artigo 43.º, n.º2, conforme, aliás, tem vindo a ser decidido em diversas decisões arbitrais.
45. Com efeito, esta matéria, já na decorrência de situações posteriores à alteração legislativa acima referida, tem vindo a ser objeto de diversas decisões arbitrais tendo-se firmado jurisprudência, largamente maioritária, no sentido de que a opção em causa, constitui um ónus suplementar comparativamente aos residentes insuscetível de excluir a discriminação em causa.
46. Nesse sentido, pode ler-se na decisão arbitral de 22-05-2019, Proc.74/2019-T, “Sucede que a existência deste regime não afasta a invalidade do regime discriminatório ainda em vigor e que foi aplicado à liquidação de IRS em causa.
De facto, atualmente, em matéria de tributação dos rendimentos resultantes das mais-valias provenientes da alienação de direitos reais sobre imóveis situados em Portugal, por não residentes neste território, mas residentes noutro Estado membro da União Europeia ou Espaço Económico Europeu, resulta do disposto nos n.ºs 1 e 8 do artigo 72.º do Código do IRS que, coexistem dois regimes fiscais:
i. O regime que sujeita os rendimentos a uma taxa especial de 28% e
ii. O regime equiparado ao que vigora para os sujeitos passivos residentes em território português, segundo o qual, os mesmos rendimentos são sujeitos à taxa que, de acordo com a tabela prevista no n.º 1 do artigo 68.º, seria aplicável no caso de serem auferidos por residentes em território português, tomando-se em consideração, neste regime, todos os rendimentos, incluindo os auferidos fora de Portugal, mantendo-se em vigor a disposição constante do nº 2 do citado artigo 43.º do Código do IRS.
Porém, a previsão deste regime facultativo faz impender sobre os não residentes um ónus suplementar, comparativamente aos residentes, não sendo a opção de equiparação suscetível de excluir a discriminação em causa.
Na realidade, o regime de equiparação atualmente previsto no artigo 72.º do Código do IRS não afasta o caráter discriminatório do artigo 43.º, n.º 2 do Código do IRS, não podendo o contribuinte achar-se na circunstância de ter que optar por dois regimes, um legal e outro ilegal.
Neste sentido, o TJUE considerou, no Acórdão Gielen, de 18/03/2010 (Processo C-440/08), num caso de evidente paralelismo (ainda que naquele acórdão estivesse em causa a violação do artigo 49.º), o seguinte:
a. «a opção de equiparação permite a um contribuinte não residente, (...) escolher entre um regime fiscal discriminatório e um outro regime supostamente não discriminatório», frisando que essa escolha não é passível de excluir os efeitos discriminatórios do primeiro desses dois regimes fiscais.».
b. «o reconhecimento de um efeito dessa natureza à referida escolha teria por consequência (...) validar um regime fiscal que continuaria, em si mesmo, a violar o artigo 49.° TFUE em razão do seu carácter discriminatório».
c) O Tratado «se opõe a uma regulamentação nacional que discrimina os contribuintes não residentes na concessão de um benefício fiscal (...) apesar de esses contribuintes poderem optar, no que se refere a esse benefício, pelo regime aplicável aos contribuintes residentes”.
47. No mesmo sentido, considerou-se, em decisão arbitral de 14-05-2013, Proc. 127/2012-T que “(...) a opção que é dada a um sujeito passivo residente na União Europeia ou espaço económico europeu entre um regime que continua a ser discriminatório, por violação do disposto art. 63.º da TFUE e um outro alegadamente não discriminatório, equiparando-os com os residentes no território português, para além de terem a obrigação de optar e de declarar os rendimentos auferidos fora daquele território, não exclui nem neutraliza os efeitos discriminatórios do primeiro daqueles dois regimes. Concluindo aquele aresto que «ao se reconhecer que os referidos efeitos não são eliminados, estar-se-á a admitir que a referida opção valida um regime fiscal que continua em si mesmo a violar o artigo 63.º do TFUE, pelos motivos acima enunciados, o que não se coaduna com o direito comunitário.
48. É, pois, esta a orientação que tem vindo a ser acolhida na jurisprudência arbitral do CAAD, não só nas decisões acima citadas, como em muitas outras, designadamente as proferidas nos processos 748/2015-T, 89/2017-T, 520/2017-T, 617/2017-T, 644/2017-T, 370/2018-T,583/2018-T, 596/2018-T 600/2018-T e 613/2018-T, não se suscitando quaisquer dúvidas sobre a incompatibilidade do atual quadro normativo em causa com o direito comunitário, em especial com o artigo 63.º do TFUE.
49. Também dúvidas se não suscitaram ao Supremo Tribunal Administrativo que, em acórdão de 20-02-2019, proferido no Proc. 0901/11.0BEALM.0692/17 – reportando-se a mais-valias realizadas em 2010, portanto já na vigência das alterações introduzidas pela Lei n.º 67-A/2007 - se pronunciou sobre a matéria em causa nos seguintes termos: “12. O Estado Português, através da Lei 3-B/2010 de 28-04, instituiu um regime opcional, ex vi n.os 7 e 8 do artigo 72.º do CIRE, com vista à equiparação dos não residentes aos residentes, permitindo àqueles a opção de englobamento dos rendimentos obtidos por mais-valias imobiliárias e, assim, serem tributados em condições similares às dos residentes.
13. Tratando-se de um regime opcional e mantendo-se o regime geral discriminatório, a sua apreciação foi objecto do Acórdão Gielan de 18-03-2010 do TJUE, que veio a manter as anteriores conclusões referidas no Acórdão Hollmann.
14. E no caso sub judice foi a Autoridade Tributária que determinou a forma de tributação, através da correcção da liquidação, não validando os elementos declarados pelos Impugnantes na sua declaração anual de IRS, não dando hipótese do exercício desta opção aos Impugnantes.
15. Mesmo assim, tal regime opcional não vem sanar a discriminação entre as normas do n.º 2 do artigo 43.º do CIRS e o artigo 56.º do Tratado sobre o funcionamento da União Europeia, já que a norma anterior se manteve como geral, apenas sendo criada uma outra opcional.
16. Na verdade, já este STA se pronunciou em situação similar à presente - acórdão de 03-02-2016, Proc. 01172/14 – negando provimento a um recurso e decidindo no sentido de que tributação em sede de mais valias imobiliárias apuradas por um não residente, devem ser consideradas apenas em 50%, evitando assim a situação discriminatória que a Fazenda Pública pretende ver aqui reconhecida.
17. Concluindo que a aplicação do nº 2 do artigo 43 do CIRS, que discrimina negativamente a tributação dos não residentes face aos residentes, é incompatível com o direito comunitário, porque limita os movimentos de capitais que o artigo 56 do Tratado CE consagra”
50. Acompanhando, sem reservas, a jurisprudência do CAAD e do STA acima referidas, considera o Tribunal que se não suscitam dúvidas quanto a incompatibilidade com o direito comunitário das normas aplicadas às liquidações impugnadas, concluindo-se pela desnecessidade de reenvio prejudicial e, pela mesma razão, não se vendo justificação para a suspensão dos presentes autos conforme pretensão da Requerida.
51. Nestes termos, julga-se incompatível com o direito comunitário a norma do n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS, na medida em que prevê uma limitação da tributação a 50% das mais-valias realizadas apenas para os residentes em Portugal, não extensiva aos não residentes, constituindo, por isso, uma restrição aos movimentos de capitais, proibida pelo artigo 63 do TFUE. Consequentemente, os atos de liquidação em causa, desconsiderando aquela limitação, encontram-se feridos de ilegalidade devendo ser anulados. Restringindo-se a ilegalidade apenas àquele excesso de tributação, e nela se centrando em exclusivo o objeto do presente pedido de pronúncia arbitral, devem esses atos ser parcialmente anulados.
Do direito a juros indemnizatórios
52. A par da anulação dos atos de liquidação, e consequente reembolso das importâncias indevidamente cobradas, os Requerentes solicitam ainda que lhes seja reconhecido o direito a juros indemnizatórios, ao abrigo do artigo 43.º da LGT.
53. Com efeito, nos termos da norma do n.º 1 do referido artigo, serão devidos juros indemnizatórios "quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido." Para além dos meios referidos na norma que se transcreve, entendemos que, conforme decorre do n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, o direito aos mencionados juros pode ser reconhecido no processo arbitral e, assim, se conhece do pedido.
54. O direito a juros indemnizatórios a que alude a norma da LGT supra referida pressupõe que haja sido pago imposto por montante superior ao devido e que tal derive de erro, de facto ou de direito, imputável aos serviços da AT.
55. No caso dos autos, é manifesto que, na sequência da ilegalidade dos atos de liquidação, pelas razões que se apontaram anteriormente, a Requerente efetuou o pagamento de importâncias manifestamente indevidas.
56. Resulta, também, dos autos, que a ilegalidade dos atos de liquidação objeto do presente processo é diretamente imputável à Requerida, que, por sua iniciativa, os praticou sem suporte legal, padecendo de errada aplicação das normas jurídicas ao caso concreto.
57. Reconhece-se, assim, à Requerente o direito aos juros indemnizatórios peticionados, contados, à taxa legal, sobre os montantes indevidamente cobrados, desde a data do respetivo pagamento até ao momento do efetivo reembolso (cfr. LGT, art. 43.º, n.º 1 e CPPT, art. 61.º).
V. Decisão
Nos termos, e com os fundamentos expostos, o Tribunal Arbitral decide julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e, consequentemente:
a) Revogar os atos de indeferimento das Reclamações Graciosas interpostas pelos Requerentes dos atos tributários impugnados (reclamações graciosas n.ºs ...2018... e ...2018...);
b) Determinar a anulação parcial dos atos de liquidação impugnados, na parte correspondente ao acréscimo de tributação resultante da consideração total da mais-valia imobiliária, com o consequente reembolso das importâncias indevidamente cobradas, acrescidas dos correspondentes juros indemnizatórios contados nos termos legais.
Valor do processo: Fixa-se o valor do processo em € 83 385,29 nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT, aplicável por remissão do artigo 29.º, n,º1, alíneas a) e b), do RJAT e artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
Custas: Ao abrigo do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, e nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixo o montante das custas em € 2 754,00, a cargo da Requerida (AT).
Lisboa, 16 de outubro de 2019,
O Árbitro Presidente
(Carlos Fernandes Cadilha)
O Árbitro Vogal,
(Amândio Silva)
O Árbitro Vogal,
(Álvaro Caneira)