DECISÃO ARBITRAL (consultar versão completa no PDF)
I – Relatório
1. No dia 10.12.2018, a Requerente, A..., S.A., pessoa coletiva n.º..., com sede na ..., n.º ... A, em Lisboa, requereu ao CAAD a constituição de tribunal arbitral, nos termos do art. 10º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, com vista à anulação ato de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) n.º 2018..., praticado com referência ao exercício de 2014, do qual resulta imposto a pagar no valor de € 6.449,58, e, bem assim, no correspondente ato de liquidação de juros compensatórios n.º 2018..., no valor de € 805,04, a que corresponde a Demonstração de Acerto de Contas n.º 2018... (Compensação n.º 2018...), da qual resultou um valor total a pagar de € 7.254,61.
A Requerente, alegando ter pagado o valor em causa, peticiona ainda a condenação da Requerida ao pagamento de juros indemnizatórios desde a data do alegado pagamento.
2. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira.
Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1, do art. 6.º, do RJAT, por decisão do Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicada às partes, nos prazos legalmente aplicáveis, foi designado árbitro o signatário, que comunicou ao Conselho Deontológico e ao Centro de Arbitragem Administrativa a aceitação do encargo no prazo regularmente aplicável.
O Tribunal Arbitral foi constituído em 25 de fevereiro de 2019.
3. Os fundamentos apresentados pela Requerente, em apoio da sua pretensão, foram, sinteticamente, os seguintes:
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
1. Dos atos de liquidação ora contestados, não resulta suficiente a necessária fundamentação, nem de facto, nem de direito, conforme é exigido de acordo com o disposto no artigo 77.º da Lei Geral Tributária (“LGT”) porquanto não são explicitados os fundamentos que determinaram a sua emissão, sendo, apenas, indicado um conjunto de valores, impercetíveis para um destinatário normal e, também, para a ora Requerente.
2. Contra o exposto, não pode ser invocada, sequer, a fundamentação operada por via da remissão, pois não existe qualquer referência a uma eventual remissão, explícita, para um concreto documento externo.
3. Assim, parece curial que se conclua que os atos de liquidação contestados não se mostram fundamentados em termos legalmente adequados, impondo-se a respetiva anulação por violação do disposto nos artigos 103.º, n.º 2 e 268.º, n.º 3, da CRP e 77.º da Lei Geral Tributária (“LGT”).
VIOLAÇÃO DE LEI
4. Em 2017, a ora Requerente foi alvo de um procedimento de inspeção externa, enquanto sociedade individual, de âmbito parcial ao IRC 2014, autuado sob a ordem de serviço n.º OI2017... .
5. Na sequência do referido procedimento de inspeção, a Requerente foi a Requerente notificada do Relatório de Inspeção Tributária, no âmbito do qual foram propostas correções à matéria tributável no montante de €50.901,50, resultantes da desconsideração, para efeitos fiscais, dos gastos com encargos financeiros suportados pela Requerente
6. A sociedade B..., S.A. sociedade participada pela Requerente, foi também alvo de um procedimento de inspeção, também com referência ao exercício de 2014, de âmbito parcial ao IRC 2014, autuado sob a ordem de serviço n.º OI2017..., nos termos do qual foram propostas correções à matéria tributável no valor de € 202.724,29 as quais têm reflexo direto nos atos de liquidação ora impugnados.
7. Mais recentemente, a ora Requerente foi alvo de um procedimento de inspeção externa, enquanto sociedade dominante do grupo, de âmbito parcial ao IRC 2014, autuado sob a ordem de serviço n.º OI2017..., realizado de modo a fazer repercutir as correções referidas na empresa dominante.
8. De acordo com o teor do referido Relatório, a Administração tributária procedeu a correções ao resultado do grupo no montante total de € 253.625,79, o que originou um lucro tributável de € 28.041,64.
9. Tais correções foram, posteriormente, materializadas nos atos de liquidação adicional objeto de presente Pedido de Pronúncia Arbitral.
CORREÇÃO NO MONTANTE DE € 50.901,50 A..., S.A.
10. Não pode a ora Requerente concordar com o entendimento perfilhado pela Administração tributária no âmbito do qual esta veda a dedutibilidade fiscal dos gastos de financiamento líquidos suportados pela Requerente em 2014, porquanto, de acordo com o seu entendimento, os mesmos não contribuíram para a obtenção de rendimentos sujeitos a tributação e, bem assim, consubstanciarem gastos com provisões não aceites fiscalmente e não se encontrarem comprovados documentalmente.
11. Da análise ao teor do Relatório notificado, resulta claro o entendimento sustentado pela Administração tributária de que os gastos de financiamento líquidos suportados pela Requerente, não são aceites, nos termos do artigo 23.º do Código do IRC, porquanto não contribuíram para a obtenção de rendimentos sujeitos a tributação e, bem assim, consubstanciarem gastos com provisões não aceites fiscalmente e não se encontrarem comprovados documentalmente
12. Os investimentos financeiros como a participação na B..., S.A. não deixam de ser ativos geridos no interesse da Requerente, sendo fontes geradoras de rendimentos sujeitos a IRC.
13. No período de 2014, e para o que ora importa, no contexto da gestão das necessidades de financiamento/tesouraria, a Requerente obteve financiamentos da C...- Fundo de Capital de Risco ("C..."), detentora única do seu capital social, e concedeu financiamentos à B... .
14. Tais financiamentos foram obtidos não só com o objetivo de reforçar os meios financeiros da Requerente - uma vez que, no período de 2014, se perspetivava a necessidade de fundos para fazer face a investimentos projetados mas também com o objetivo de assegurar a cobertura adequada das suas necessidades financeiras correntes.
15. Sucede que após a realização dos investimentos perspetivados e da análise quanto às necessidades correntes, a Requerente verificou ter um excedente de tesouraria, no montante de € 800.000,00, o qual foi canalizado para reembolso de parte do financiamento obtido.
16. Neste sentido, não entende a ora Requerente como pode a Administração tributária alegar que os gastos associados a parte dos financiamentos obtidos não são dedutíveis, em sede de IRC, porquanto parte dos financiamentos obtidos se mantiveram na conta à ordem do sujeito passivo até ao momento em que a gestão, de forma diligente, utilizou tais fundos para suprir responsabilidades.
17. No final do período de 2014 a Gestão verificou, novamente, a necessidade de reforçar os meios financeiros disponíveis, tendo o acionista da Requerente dotado a sociedade dos fundos necessários à prossecução da sua atividade.
18. Tal financiamento resultou de uma decisão de gestão, com base nas responsabilidades perspetivadas.
19. Na tomada de decisões por parte dos gestores relativamente às necessidades de fundos é efetuada com base em projeções, as quais têm inerente o ciclo normal de atividade da empresa, como também os investimentos que se perspetivam.
20. Deste modo, é por demais evidente que a Administração tributária não pode, com base no artigo 23.º do Código do IRC, pôr em causa o princípio da liberdade da gestão, sindicando a oportunidade e a adequação das decisões económicas da gestão de qualquer entidade e considerando que apenas podem ser assumidos fiscalmente aqueles gastos que se revelem convenientes para a empresa.
21. Por outro lado, os gastos financeiros reconhecidos no período de 2014, não correspondem a provisões, mas sim a acréscimos de gastos e nos termos do n.º 1 do artigo 18.º da Código do IRC “os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime da periodização económica”.
22. Resulta, portanto, do exposto que, para efeitos fiscais, e ao abrigo do regime de periodização económica, os gastos devem ser considerados relevantes no período em que são suportados, independentemente do seu pagamento.
23. Ora, também quanto a este ponto, não pode a Requerente deixar de manifestar a sua discordância, uma vez que, respeitando os gastos em apreço a um “acréscimo de custos", não pode a Administração tributária simplesmente considerar que os mesmos não são relevantes, em sede de IRC, porquanto não se encontram suportados por documentos extemos, mas sim por documentos internos.
B..., S.A – CORREÇÃO NO MONTANTE DE € 202.724,29
24. Não obstante a Requerente não contestar, especificamente, todas as correções quanto aos seus pressupostos de direito, mesmo aquelas que não são contestadas quanto aos seus específicos pressupostos jurídicos são ilegais na medida em que os atos de liquidação de IRC e de Juros Compensatórios que constituem o objeto do presente pedido de pronúncia arbitral padecem de falta de fundamentação, o que determina, per si, a sua anulação.
25. Relativamente aos gastos financeiros não pode a ora Requerente deixar de contestar os pressupostos em que assenta esta correção.
26. Contrariamente ao que procuram sustentar os SIT, o facto de o contrato para a compra das sociedades D..., SA e E..., celebrado entre a sociedade F..., SGPS, SA e a sociedade B..., S.A., abranger também os suprimentos que tinham sido concedidos às sociedades D..., SA e E... e o facto desta última sociedade apenas suportar um juro de 6% decorrente dos suprimentos que haviam sido atribuídos pela sua anterior accionista (a sociedade F..., SGPS, SA) não permite, evidentemente, desconsiderar, para efeitos do disposto no artigo 23.º, n.º 2, alínea c), do CIRC, o diferencial entre os juros de suprimentos suportados pela ora Requerente em resultado dos contratos de suprimentos (fixado em 15%) e o juro recebido da sociedade E...(fixado em 6%).
27. Deverá, pois, concluir-se que, tendo os capitais aportados através dos suprimentos sido aplicados na aquisição das sociedades D..., SA e E..., não restam quaisquer dúvidas de que os juros suportados são dedutíveis, na sua totalidade, a coberto do disposto no artigo 23.º, n.º 2, alínea c), do CIRC, razão pela qual esta correção é ilegal e não poderá ser mantida.
ACCRUALS
28. Esta correção está relacionada com as faturas n.ºs FT 352/1926, datada de 2015/07/28 – G... (NIF...), no valor de E 10.620,00 + IVA à 23%, no total de € 13.062,60 e Fatura nº FTCLV2212015..., datada de 04/08/2015, emitida pela H... (NIF...), no valor de € 1.000,00 + IVA a 23%, no total de € 1.230. que os SIT consideram que deverão ser imputados a 2015 e não a 2014.
29. Conforme foi explicado pela sociedade B... no decurso do procedimento de inspeção, em 2014, os custos anuais com auditores eram, aproximadamente, de € 12.000, sendo efetuado um accrual na conta 622109 de € 12.000.
30. Em 2015, os gastos em questão foram registados na conta 622103 mas deveriam ter sido registados por conta do accrual da conta 622109 feito em 2014 e ter sido efetuado novo accrual, no valor de € 12.000,00 para o ano de 2015.
31. Relativamente à fatura n.º FTCLI/221201..., emitida pela H..., embora a mesma tenha sido emitida em 04/08/2015 verifica-se que a mesma refere, de forma expressa e inequívoca, que respeita a “Honorários por serviços profissionais, até à data de emissão da presente fatura, no âmbito do exame às demonstrações financeiras da B..., SA, em 31 de dezembro.” pelo que, a própria fatura n.º FTCLI/2212015...esclarece, de forma clara, que a mesma respeita a serviços prestados relativamente às demonstrações financeiras da B..., SA do ano de 2014, razão pela qual é evidente que os serviços em causa respeitam, na verdade, ao ano de 2014 a não de 2015, conforme sustentam os SIT no RIT.
32. Não pode, assim, a ora Requerente conformar-se com estas correções porque ilegais.
DA ILEGALIDADE DAS LIQUIDAÇÕES DE JUROS COMPENSATÓRIOS
33. De acordo com o artigo 35.º, n.º 1, da LGT estabelece que só “(...) são devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária”.
34. Assim sendo, e atento o disposto nos artigos 74.º, n.º 1, da LGT e 342.º, n.º 1, do Código Civil (“CC”), cabe à Administração Tributária demonstrar e provar estes factos constitutivos do direito à liquidação de juros compensatórios, designadamente, a culpa do sujeito passivo no eventual atraso ou retardamento da liquidação do imposto, ou seja, demonstrar o pressuposto da liquidação de juros compensatórios.
35. Ora, esta culpa tem de ser apreciada ou, pelo menos, objeto de ponderação por parte da Administração Tributária e exteriorizada na fundamentação dos atos tributários, o que não aconteceu na situação em apreço, razão pela qual também a liquidação de Juros Compensatórios é ilegal, devendo ser anulada.
4. A Requerida, apresentou Resposta, defendendo-se, por impugnação, em síntese, nos termos seguintes:
1. A R percebeu pormenorizadamente cada correção de que resultaram a final as liquidações agora por si impugnadas uma vez que na PI ao impugnar correção por correção, sociedade por sociedade, e fundamento legal por fundamento legal, fazendo as pertinentes remissões para o Relatório do procedimento inspetivo que é precisamente onde constam os fundamentos das liquidações.
2. Como ressalta do pedido arbitral a R percebeu o percurso cognoscitivo e valorativo podendo concluir-se, com alguma facilidade, que a fundamentação existe e que é suficiente, clara e congruente, não tendo a razão a Requerente ao invocar que os atos tributários padecem de vício de fundamentação insuficiente.
3. No que diz respeito à errada interpretação do artigo 23º do CIRC por entender que a AT não aceitou os mesmos porque “não contribuíram para a obtenção de rendimentos sujeitos a tributação e, bem assim, consubstanciarem gastos com provisões não aceites fiscalmente e não se encontrarem comprovados documentalmente.” também a R não tem razão.
CORREÇÕES EFETUADAS À A..., S.A.
4. Como se refere no Relatório de Inspeção da A... do montante de € 840.000,00 com a casa mãe, Fundo de Capital de Risco C... foi transferido € 50.000,00 para constituição do capital da sociedade B..., SA mas não sendo a atividade principal do sujeito passivo os investimentos financeiros, não estão reunidos os princípios legais do artº. 23º do CIRC, pelo não são de aceitar os encargos financeiros decorrentes deste montante.
5. Quanto ao valor diferencial (€ 790.000,00) manteve-se na conta à ordem do sujeito passivo, sem que tivesse havido necessidade de os movimentar até ao pagamento de 800.000,00 em setembro, pelo que tais gastos não serviram para garantir proveitos nos termos do art.º 23º do CIRC;
6. Quanto ao suprimento de € 560.000,00 o valor deste a uma taxa de juros de 15% serviu para a sociedade efetuar dois depósitos a prazo a taxas bastantes mais baixas (1,75% e 2,00%), ou seja, o SP assume juros a taxa altíssima para receber juros a taxas muito mais baixas, assim tal encargo financeiro não serviu para o sujeito passivo obter rendimentos pelo que de acordo com o artº. 23º do CIRC não são de aceitar os encargos financeiros relativo a este suprimento.
7. Por estas razões expostas no RIT são manter as correções efetuadas à sociedade A... .
8. Com estas correções, ao contrário do sustentado pelo sujeito passivo, A AT não se se imiscuiu em qualquer decisão de gestão da R. pois sendo certo que com a alteração legislativa, resultante da Lei n.º 2/2014, de 16 de Janeiro, a dedutibilidade de gastos e perdas deixou de estar condicionada à indispensabilidade, passou a ser exigido que os gastos e as perdas passassem a ser incorridos ou suportados para “obter ou garantir” os rendimentos sujeitos a IRC.
9. Ademais, face ao disposto do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, estes encargos financeiros não podem ser deduzidos na determinação do lucro tributável da requerente, uma vez que respeitam a passivos utilizados para financiar a atividade de outras sociedades que, além de independentes e autónomas também têm personalidades jurídicas distintas.
10. O sujeito passivo não apresentou documentos comprovativos dos valores contabilizados na conta “6913 – Outros juros de empréstimos obtidos”, pelo que tais gastos não poderiam ser aceites nos termos do artº 23º do CIRC conjugado com o 23- A igualmente do CIRC.
11. Tendo em consideração que a contrapartida da conta de gastos foi a conta “2722131 –C... inerente a acréscimos de gastos, a AT, face ao estipulado no artigo 18º do CIRC analisou tais gastos ao abrigo do artº 39º do CIRC de forma a verificar se os mesmos poderiam subsistir na ótica de provisão, verificando-se que também tal não poderia ser aceite por não estar previsto na referida norma.
CORREÇÕES À SOCIEDADE B..., SA
12. No que diz respeito, à alegada ilegalidade das correções efetuadas sobre os juros de suprimentos realizados pela sociedade B..., SA, também a R não tem razão pois investimentos financeiros na aquisição de sociedades está fora do objeto social da sociedade.
13. Não obstante, parte dos custos suportados pelo sujeito passivo são anulados pelos proveitos pelos juros dos empréstimos concedidos.
14. No entanto, na aquisição da sociedade espanhola, paga juros à taxa de 15%, para obtenção de juros a 6%., ficando a suportar um diferencial de juros de 9%.
15. Isto é, o sujeito passivo suporta encargos financeiros à taxa anual de 15%, nomeadamente juros, resultantes de empréstimos que o mesmo contraiu e de simultaneamente, estar a conceder empréstimos a empresa associada a uma taxa mais bastante mais baixa (6%) resultando uma diferença de 9%.
16. Daqui resulta que a totalidade dos referidos encargos não estão diretamente relacionados com a atividade do sujeito passivo, cujo objeto social, como já anteriormente referido, consiste na "fabricação de perfumes, de cosméticos e de produtos de higiene".
17. Ao não estarem relacionados com a atividade do sujeito passivo, não se mostra cumprido o requisito de dedutibilidade da totalidade dos encargos financeiros contabilizados pelo sujeito passivo, conforme estabelecido no artigo 23º do CIRC.
18. Pelo que, não será de aceitar fiscalmente a totalidade dos juros suportados relativos a empréstimos de suprimentos suportados pelo sujeito passivo, mas apenas parte dos mesmos, pelo que o valor de € 93.205,48 deve ser objeto de acréscimo ao Resultado Líquido do Período (RLP) da Sociedade para determinação da respetiva matéria coletável de IRC.
ACCRUALS
19. Os motivos da não aceitação de gastos cujos suporte documental é o da duplicação de gastos duma mesma fatura em dois anos (2014 e 2015).
20. Não é de aceitar o montante de€ 12.000,00 registado na conta "622109-Outros" referente a accruals nos termos do nº 1 do Artº 18° e nºs 1, 3, 4 6 do 23º do CIRC, pelo que deve ser objeto de acréscimo ao Resultado Líquido do Período (RLP) da Sociedade para determinação da respetiva matéria coletável de IRC.
JUROS COMPENSATÓRIOS
21. Quanto à ilegalidade de juros compensatórios também a R não tem qualquer razão é que como tem vindo sido entendimento uniforme da jurisprudência:
22. No presente caso, a R, devido à sua conduta (ação), pelo menos negligente, isto é pela diminuição do montante de imposto pago, seja pela via interpretativa que desaguou num montante inferior ao legalmente devido, seja de errada contabilização que levou igualmente àquela diminuição de coleta.
5. Verificando-se a inexistência de qualquer situação prevista no art. 18º, nº 1, do RJAT, que tornasse necessária a reunião arbitral aí prevista, foi dispensada a realização da mesma, com fundamento na proibição da prática de atos inúteis.
Foi ainda dispensada a realização de alegações, nos termos do art. 18º, nº 2, do RJAT, “a contrario”.
6. O tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído nos termos do RJAT.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas.
O processo não padece de vícios que o invalidem.
7. Cumpre solucionar as seguintes questões:
1) Ilegalidade do ato tributário de liquidação por vício de violação de lei.
2) Ilegalidade do ato tributário de liquidação por vício de falta de fundamentação.
3) Ilegalidade do ato tributário de liquidação de juros compensatórios.
4) Direito da Requerente a juros indemnizatórios.
II – A matéria de facto relevante
8. Consideram-se provados os seguintes factos:
1. A ora Requerente é uma sociedade anónima de direito português que tem por objeto social a fabricação de perfumes cosméticos, produtos de higiene, sabões, detergentes e glicerina, a compra venda de bens imobiliários e outras atividades de consultoria para os negócios e a gestão encontrando-se sujeita ao regime geral de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, sendo tributada no âmbito do Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades, previsto nos artigos 69.º e seguintes daquele Código, na qualidade de sociedade dominante de grupo fiscal do qual faz parte a sociedade B..., S.A. ( Documentos n.sº 4, 6 e 8 juntos pela Requerente e processo administrativo junto pela Requerida).
2. O FUNDO C...- Fundo de Capital de Risco é o detentor único do capital social da Requerente( Documentos n.º 4 e 6 juntos pela Requerente e processo administrativo junto pela Requerida).
3. Em 2017, a ora Requerente foi alvo de um procedimento de inspeção externa, enquanto sociedade individual, de âmbito parcial ao IRC 2014, autuado sob a ordem de serviço n.º OI2017... ( Documentos n.ºs 4 e 6 juntos pela Requerente e processo administrativo junto pela Requerida).
4. Na sequência do referido procedimento de inspeção, a Requerente foi notificada do Projeto de Relatório de Inspeção Tributária, no âmbito do qual foram propostas correções à matéria tributável no montante de €50.901,50, resultantes da desconsideração, para efeitos fiscais, dos gastos (líquidos) com encargos financeiros suportados pela Requerente, e, bem assim, para, querendo, exercer, no prazo de 15 dias, o seu direito de audição ( Documento n.º 4 junto pela Requerente e processo administrativo junto pela Requerida).
5. Em cumprimento da aludida notificação, a Requerente exerceu, dentro do prazo concedido, o seu direito de audição, no âmbito do qual manifestou a sua discordância com as correções propostas (Documento n.º 5 e processo administrativo junto pela Requerida).
6. Não obstante o exercício do direito de audição, a Administração manteve as correções propostas, tendo notificado a Requerente dessa decisão através do Relatório de Inspeção Tributária, datado de 20 de julho de 2018 (Documento n.º 6 e processo administrativo junto pela Requerida, dando-se por integralmente reproduzido o teor do referido Relatório de Inspeção Tributária).
7. A sociedade B..., S.A. foi, também, alvo de um procedimento de inspeção, igualmente com referência ao exercício de 2014, de âmbito parcial ao IRC 2014, autuado sob a ordem de serviço n.º OI2017..., nos termos do qual foram propostas correções à matéria tributável no valor de € 202.724,29 (Documento n.º 7 e processo administrativo junto pela Requerida dando-se por integralmente reproduzido o teor do referido Relatório de Inspeção Tributária).
8. Posteriormente, a Requerente foi alvo de um procedimento de inspeção externa, enquanto sociedade dominante do grupo, de âmbito parcial ao IRC 2014, autuado sob a ordem de serviço n.º OI2017..., realizado “(…) de modo a fazer repercutir as correções referidas na empresa dominante” , tendo sido notificada do Relatório final de Inspeção Tributária emitido (Documento n.º 8 e processo administrativo junto pela Requerida, dando-se por integralmente reproduzido o teor do referido Relatório de Inspeção Tributária).
9. De acordo com o teor do referido Relatório, a Administração tributária procedeu a correções ao resultado do grupo no montante total de € 253.625,79, o que originou que a Requerente, passasse de um prejuízo fiscal de – € 225.584,15 para um lucro tributável no valor de € 28.041,64 (Documento n.º 8 e processo administrativo junto pela Requerida).
10. A Requerente foi notificada do Relatório final de Inspeção Tributária emitido constando de tal notificação, designadamente, o seguinte:
(Documento n.º 8 junto pela Requerente na petição inicial).
11. Tais correções foram, posteriormente, materializadas nos atos de liquidação objeto do processo (afirmação da Requerente feita na petição inicial, não impugnada pela Requerida na resposta e ainda comprovativo de notificação da liquidação de imposto junto doc. nº 1 junto com a petição inicial).
12. Da notificação da liquidação adicional de imposto consta, designadamente, o seguinte:
(doc. nº 1 junto com a petição inicial).
13. Na liquidação de juros compensatórios está mencionado o número da liquidação base e respetivo período tributário; o valor do imposto liquidado sobre que incidem os juros; A menção de “retardamento da liquidação, arts. 102 CIRC e 35º LGT”; o período a que se aplica a taxa de juro, a taxa de juros e o montante de juros liquidado. (doc. nº 1 junto com a petição inicial).
Com interesse para a decisão da causa, não se provou que a Requerente tenha pagado o valor das liquidações objeto do processo.
9. A convicção do Tribunal quanto à decisão da matéria de facto alicerçou-se nos documentos constantes do processo, acima mencionados por referência a cada facto do probatório, sendo de observar que tais documentos não foram objeto de impugnação por nenhuma das partes.
Relativamente ao facto não provado, a decisão do tribunal resulta da ausência de prova relativamente a tal matéria.
-III- O Direito aplicável
10. Tendo a impugnante invocado a ilegalidade dos atos de liquidação por vício de violação de lei e por vício de falta de fundamentação, há que determinar a ordem do conhecimento dos mesmos, devendo ser observada, como é pacífico, a prevista no art. 124º do CPPT, aplicável por força do art. 29º, nº 1, al. a) do RJAT (Cfr. Jorge Lopes de Sousa, Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, in GUIA DA ARBITRAGEM TRIBUTÁRIA, Coord. Nuno Villa-Lobos e Mónica Brito Vieira, 2017, Almedina, pag. 205).
O vício de violação de lei é aquele que conduzirá à “mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos” na medida em que a sua eventual procedência impedirá a renovação do ato, o que não sucede com a hipotética anulação decorrente do vício de falta de fundamentação dos atos tributários objeto do processo.
Em conformidade, o Tribunal irá apreciar em primeiro lugar do vício de violação de lei.
Vejamos então.
11. Parte considerável do dissídio entre as partes, no que respeita ao vício de violação de lei invocado, prende-se com a dedutibilidade de gastos incorridos pela Requerente e pela sua participada, B..., Lda à luz do artigo 23º, nº 1, do CIRC. Assim, e tendo em conta as diferentes posições das partes sobre a interpretação da norma em causa, afigura-se útil proceder à análise do conceito de gasto dedutível legalmente consagrado, na perspetiva da sua aplicação às várias correções impugnadas, sem prejuízo do que mais especificamente se considerará relativamente a cada correção em concreto.
Nos termos do nº 1, do art. 23º do CIRC:
“Para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.”
Por sua vez o nº 1, do artigo 20º do CIRC, diz-nos que:
“Consideram-se rendimentos e ganhos os resultantes de operações de qualquer natureza, em consequência de uma ação normal ou ocasional, básica ou meramente acessória, (…)” nomeadamente:
(…)
Com a supressão do termo “indispensáveis”, constante da anterior redação do art. 23º, nº 1, do CIRC simplificou-se a interpretação da norma, dispensando-se o esforço inerente à interpretação daquele conceito indeterminado e deslocando-se o foco para a questão de saber se o gasto, objetivamente perspetivado à data da sua ocorrência, visava a obtenção ou garantia dos rendimentos sujeitos a IRC. Consequentemente é decisivo, no entender deste tribunal, saber o que são rendimentos sujeito a IRC pelo que o art. 23º, nº 1, remete parcialmente para o art. 20º que, em boa verdade, nesta medida, faz parte da norma consubstanciada no art. 23º.
Diríamos até que, assim como, economicamente, um rendimento depende, para a sua ocorrência, do(s) gasto(s), o conceito de gasto depende do conceito de rendimento.
Assim, considerando-se rendimentos e ganhos “os resultantes de operações de qualquer natureza, em consequência de uma ação normal ou ocasional, básica ou meramente acessória” são dedutíveis “todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para os obter ou garantir”. Naturalmente com exceção daqueles que a lei expressa e excecionalmente vedar.
Esta conclusão está em sintonia com o art. 3º do mesmo diploma dispõe que:
“1 — O IRC incide sobre:
a) O lucro das sociedades comerciais (…)
2 — Para efeitos do disposto no número anterior, o lucro consiste na diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas neste Código.”
Não há, pois, nesta matéria, no entender deste tribunal, limitação, quer do lado dos rendimentos sujeitos a tributação, quer do lado dos gastos dedutíveis, decorrente do objeto social da sociedade comercial sujeito passivo do imposto, sendo o foco do legislador tributar o acréscimo patrimonial ocorrido no período tributário.
Esta interpretação, além de decorrer inequivocamente da letra da lei, está em perfeita sintonia com teleologia das normas em causa e, também, com princípio capacidade contributiva e com o princípio da tributação do rendimento real das empresas.
Ao invés, entende-se que uma interpretação que faça depender a dedução dum custo (ou simetricamente a relevância dum proveito) à circunstância de ser incorrido no âmbito duma atividade prevista no objeto social inscrito da sociedade, não encontra na letra da lei qualquer apoio, ainda que imperfeitamente expresso, é contrário aos demais elementos de interpretação, além de que é suscetível de conflituar com os mencionados princípios.
De resto, como resulta do artigo 6º, nº 4, do Código das sociedades comerciais “As clausulas contratuais e as deliberações sociais que fixem à sociedade determinado objeto ou proíbem a prática de certos actos não limitam a capacidade da sociedade, mas constituem os órgãos da sociedade no dever de não excederem esse objeto ou de não praticarem esses actos”. Como nota António Menezes Cordeiro “Apesar de, pela inércia, ele ainda surgir em obras da doutrina dos nossos tempos e, como vimos, na própria lei, o princípio da especialidade já não apresenta, hoje, alcance prático, quer na doutrina, quer na jurisprudência. Ele tem, de resto, sido suprimido nas diversas legislações, incluindo a europeia. Com efeito, as sociedades constituem-se livremente, de acordo com o figurino que os particulares interessados lhe queiram imprimir. Podem assumir os diversos fins lícitos, de acordo com o pacto social e as decisões dos seus órgãos. Qualquer limitação de capacidade seria ultrapassada a esse nível, mau grado as inevitáveis dúvidas. Por outro lado, os terceiros que contratem com a sociedade não podem ficar na contingência de ir analisar os “fins” estatutários para, daí, extraírem a validade dos actos. Em rigor: todos os actos podem servir quaisquer fins. Finalmente: o Direito comunitário não admite a invalidação de actos, mercê de restrições internas à capacidade das sociedades”
Em suma, com exceção das situações específicas expressamente previstas na lei, são sujeitos a IRC todos os rendimentos e ganhos “(…) resultantes de operações de qualquer natureza, em consequência de uma ação normal ou ocasional, básica ou meramente acessória” e, simetricamente, são dedutíveis “todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para os obter ou garantir” naturalmente, com exceção daqueles que a lei expressa e excecionalmente vedar.
A expressão “para os obter ou garantir” não pode deixar de significar que o sujeito passivo ao incorrer no custo, visará a obtenção de rendimentos ou ganhos em operações de qualquer natureza, normal ou ocasional, básica ou acessória, o que deve ser aferido objetivamente à luz da racionalidade económica (não se exigindo, naturalmente, a efetiva concretização da obtenção do rendimento, que sempre dependerá da “álea” da atividade empresarial).
Os rendimentos ou ganhos em operações de qualquer natureza, normal ou ocasional, básica ou acessória, que se visa obter com o gasto dedutível pode, no entender deste tribunal, ter uma ligação direta ou indireta com o custo, ou ser um efeito mediato ou imediato do mesmo. Da amplitude do conceito de rendimento ou ganho tributável decorre, necessariamente, que os gastos que contribuíram para a sua ocorrência possam ter ocorrido em exercícios temporalmente afastados.
Do princípio da liberdade de gestão, constitucionalmente consagrado, decorre que não pode a Requerida, nem os tribunais, sindicar a gestão empresarial do sujeito passivos, designadamente, não aceitando os custos inerentes a más decisões de gestão ou que em geral, sejam causadoras de prejuízos em vez dos almejados lucros substituindo, nas palavras de Rui Duarte Morais, que se mantêm atuais apesar da alteração da redação do referido art. 23º, nº 1, do CIRC “(…) o juízo de conveniência e oportunidade dos encargos assumidos, tal como resultaram da decisão dos órgãos sociais, por um outro juízo, também de índole empresarial, feito pela administração fiscal ou pelo tribunais.
Um custo não deixa de o ser (….) pelo facto de numa avaliação à posteriori, se revelar inútil ou ineficaz” Porém, do princípio da liberdade de gestão não decorre, como é bom de ver, a aceitação de custos não incorridos para obter, direta ou indiretamente, imediata ou mediatamente de rendimentos tributáveis.
Estão neste caso, os custos incorridos pelo sujeito passivo que não visem benefícios económicos para o próprio mas para terceiros.
Como escreve ainda Rui Duarte Morais:
“Se à assunção do encargo que origina o custo presidiu uma genuína motivação empresarial -no entendimento dos sócios e/ou gestores da sociedade, os únicos a quem cabe decidir do interesse social-, o custo é indispensável. Quando se deva concluir que o encargo foi determinado por outras motivações (interesse pessoal dos sócios, administradores, credores, outras sociedades do mesmo grupo, parceiros comerciais, etc.), então tal custo não deve ser havido por indispensável”
Descendo ao caso dos autos, apreciemos as várias correções.
12. CORREÇÕES À MATÉRIA SOCIEDADE A..., NO VALOR DE 50.901,50 €.
A Requerida apresenta como motivação das correções em causa vários fundamentos.
Por um lado, entende que os gastos em causa não são subsumíveis ao conceito de gasto previsto no nº 1, do art. 23º do CIRC. Por outro, entende que os gastos não estão devidamente documentados e devem ser desconsiderados face aos nºs 3 e 4 do artigo 23º e à al. C) do nº 1, do artigo 23º-A do mesmo código. Por último, sustenta, ainda, que tais gastos dizem respeito a provisões e que no artº 39º CIRC não estão contemplados os gastos relativos a juros de empréstimos obtidos, pelo não são de aceitar as provisões efetuadas pelo SP.
Começando por analisar este fundamento, adiante-se desde já ser manifesta a improcedência do mesmo uma vez que os juros dos contratos de suprimento em questão não têm a natureza de provisões, correspondendo a gastos certos, em função de obrigações de fonte contratual.
Com efeito, como sobre a conta 2722 do SNC (Credores por acréscimo de gastos) escrevem António Borges, Azevedo Rodrigues e Rogério Rodrigues “Nesta conta regista-se, a crédito por contrapartida da respetiva conta de gastos, o montante de gastos ou perdas atribuíveis ao período em curso, mas cujo vencimento efectivo ou pagamento ocorram em períodos subsequentes.A título de exemplo, podemos citar:
• Gastos de financiamentos, com pagamento postcipado (v.g. juros de empréstimo bancários) a vencer-se em períodos futuros;
(…).”
Também sobre esta temática esta questão, escreve Leonor Fernandes Ferreira:
“Rogério Ferreira, na sua obra intitulada Provisões (Ferreira, 1970) clarificou serem as provisões custos atuais e estimados. E assinalou que as provisões se encaram como custos estimados (de exercício) mas relativos a processamentos futuros de despesas (ou de não receitas), despesas de incerta comprovação futura. Porém, nem sempre se entendeu ser assim. Em tempos idos, chegou mesmo a admitir-se que as provisões incluíssem compromissos ou encargos por pagar, tais como comissões a pagar e juros a pagar, e também autênticas reservas e prejuízos certos já verificados”.
Como também se pode ler no ac. do STA de 28-01-2015, proc. 0652/14 , “as provisões são registos contabilísticos de verbas destinadas a fazer face a um encargo imputável ao exercício, mas de comprovação futura, ou já comprovado mas de montante incerto”.
Ao passo que no caso das “provisões” existe uma incerteza quanto à ocorrência da obrigação, quanto ao seu valor, ou quanto à data da sua ocorrência, no caso do “acréscimo de gastos” não existe qualquer uma destas incertezas, verificando-se, apenas, a não ocorrência do vencimento da obrigação, situação que se verifica no caso dos autos.
Assim, na perspetiva contabilística, a inscrição correta seria inquestionavelmente o registo da mesma na conta de acréscimo de gastos e não na conta de provisões.
Falece, assim, esta argumentação da Requerida.
Quanto à invocada falta de documentação, por tais gastos, alegadamente, estarem suportados apenas por documento interno, também não se afigura que a mesma ocorra.
Com efeito, determina o nº 3, do art. 23º do CIRC que:
“Os gastos dedutíveis nos termos dos números anteriores devem estar comprovados documentalmente, independentemente da natureza ou suporte dos documentos utilizados para esse efeito”
A nível da dedução de gastos é esta, pois, a regra.
Nos casos de aquisição de bens ou serviços, rege o nº 4, que dispõe:
“No caso de gastos incorridos ou suportados pelo sujeito passivo com a aquisição de bens ou serviços, o documento comprovativo a que se refere o número anterior deve conter, pelo menos, os seguintes elementos:
(…)”
No caso em apreço estamos perante gastos incorridos com contrato de suprimento, não sendo um contrato de aquisição de bens ou um contrato de prestação de serviços.
Nesta medida, o nº 4, e, consequentemente, o nº 6, do art. 23º do CIRC são inaplicáveis aos gastos em causa, cuja obrigação de documentação está prevista no nº 3, que exige a comprovação documental, independentemente da natureza ou suporte dos documentos utilizados para esse efeito. No caso, tal comprovação resulta do documento interno alicerçado e justificado pelo contrato de suprimento.
Carece, pois, de suporte legal, também, este fundamento dos atos tributários.
Por último, apreciemos a argumentação da Requerida no sentido de que tais gastos não são dedutíveis por não terem sido incorridos pela Requerente para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.
A Requerida não aceitou como gastos os juros incorridos sobre o valor de 50.000 € que a Requerente transferiu para a B..., S.A., para realização de capital social, invocando para o efeito, que os investimentos financeiros não fazem parte do seu objeto social.
Diga-se, todavia, à luz do acima exposto entendimento deste tribunal arbitral sobre o art. 23º do CIRC, que esta correção carece em absoluto de fundamento. É evidente que os rendimentos que a Requerente possa vir a obter no futuro decorrentes deste investimento são sujeitos a tributação nos termos do artigo 20º do CIRC e, consequentemente, os gastos incorridos para tal obtenção são dedutíveis face ao artigo 23º, nº 1, do mesmo código, independentemente da atividade de investimentos financeiros fazer, ou não, parte do objeto social da Requerente , uma vez que, como já se disse a lei, em linha com o princípio da capacidade contributiva e com o principio da tributação do lucro real, não erige o objeto social em critério de dedutibilidade dos gastos (e, também, simetricamente, para a consideração dos proveitos).
Assim, no que respeita aos juros incorridos com este valor, o ato tributário é ilegal, por vício de violação de lei, o que implica a correspondente anulação parcial da liquidação de imposto e da liquidação de juros compensatórios.
Vejamos agora a desconsideração dos juros respeitantes do valor de 790000 € que a Requerente manteve na sua conta à ordem sem movimentação e aos 560000 € que o sujeito passivo utilizou para efetuar dois depósitos a prazo a taxas de 1,75% e 2%, ao mesmo tempo que pagava ao Fundo Explorar, detentor do seu capital, juros à taxa de 15%.
Alega a Requerente no que respeita à desconsideração dos juros respeitantes do valor de 790000 €, referente aos suprimentos de 2.06.2014, que:
“Conforme acima referido, no período de 2014, e para o que ora importa, no contexto da gestão das necessidades de financiamento/tesouraria, a Requerente obteve financiamentos da C...- Fundo de Capital de Risco ("C..."), detentora única do seu capital social, e concedeu financiamentos à B... .
Tais financiamentos foram obtidos não só com o objetivo de reforçar os meios financeiros da Requerente - uma vez que, no período de 2014, perspetivava-se a necessidade de fundos para fazer face a investimentos projetados -, mas também com o objetivo de assegurar a cobertura adequada das suas necessidades financeiras correntes.
Sucede que após a realização dos investimentos perspetivados e da análise quanto às necessidades correntes, a Requerente verificou ter um excedente de tesouraria, no montante de € 800.000,00, o qual foi canalizado para reembolso de parte do financiamento obtido.”
E nos que respeita aos suprimentos de 19.12.2014, o seguinte;
“No final do período de 2014 a Gestão verificou, novamente, a necessidade de reforçar os meios financeiros disponíveis, tendo o acionista da Requerente dotado a sociedade dos fundos necessários à prossecução da sua atividade.
Tal financiamento resultou de uma decisão de gestão, com base nas responsabilidades perspetivadas.
Na tomada de decisões por parte dos gestores relativamente às necessidades de fundos é efectuada com base em projeções, as quais têm inerente o ciclo normal de atividade da empresa, como também os investimentos que se perspetivam.
Neste sentido, a aplicação de parte dos fundos em depósitos a prazo não é mais do que uma decisão de gestão (…)”
Vejamos.
Desconsideração dos juros respeitantes do valor de 790000 €, referente aos suprimentos de 2.06.2014.
Dos 910.000 € de suprimentos concedidos, 120.000 € foram transferidos para a B... e os restantes 790.000 € mantiveram-se até na conta à ordem do sujeito passivo até ao pagamento ao Fundo C..., em Setembro.
Tais circunstâncias, só por si, não significam, necessariamente, que os gastos com juros aqui em causa, não tivessem sido incorridos com vista à obtenção de rendimentos e está há muito afastada pela doutrina e jurisprudência nacionais a tese de relação de causalidade necessária entre os custos e proveitos para efeitos de aferição da dedutibilidade daqueles, afastamento que resulta hoje claro do texto legal, conforme supra exposto.
Por outro lado, é pacífico que não pode a Requerida nem os tribunais substituir o juízo do gestor pelo seu próprio (para mais à posteriori) relativamente a decisões de gestão.
No entanto, tendo em conta que o sujeito passivo pagou juros a uma taxa de 15% ao Fundo detentor da totalidade do seu capital social , tendo mantido os valores em causa, sem utilização em depósito à ordem (caso dos 790.000 €), ou em depósito a prazo (caso dos 560.000 €) neste caso, com taxa cerca de 7,5 a 8,5 vezes mais baixa do que a paga ao Fundo detentor do seu capital, tais circunstâncias são suscetíveis, segundo as regras da experiência comum de, pelo menos, criar a duvida sobre o propósito lucrativo de tais custos, impondo-se no mínimo, a “explicação da congruência económica da operação” pela Requerente, única entidade com condições, pela natureza das coisas, para dar tal esclarecimento.
E, efetivamente, o Requerente apresentou as suas explicações para estas operações, como já vimos.
No que respeita à desconsideração dos juros respeitantes do valor de 790000 €, referente aos suprimentos de 2.06.2014 é de observar, porém, que a Requerente não concretiza e muito menos prova os alegados investimentos.
Acresce que, mesmo que tenham sido realizados investimentos, resulta da própria alegação da Requerente que após a realização dos mesmos, a Requerente verificou ter um excedente de tesouraria ligeiramente superior ao valor em causa, que se manteve sem utilização na sua conta à ordem, pelo que, os meios financeiros em causa não foram aplicados nos alegados investimentos.
Só por si, esta realidade não impediria que os suprimentos em causa tivessem sido destinados a tal fim, mas que não tivesse ocorrido efetivamente tal aplicação, por desnecessidade superveniente como, por exemplo, uma receita imprevista ou uma redução do custo do investimento em causa.
Só que a Requerente, única detentora da informação adequada para o efeito, não fornece qualquer explicação para a circunstância dos meios financeiros que seriam, alegadamente, necessárias para investimentos, não terem tido qualquer aplicação nos mesmos.
De igual modo, não concretizou a necessidade de reforço de tesouraria e a razão de não utilização do montante em causa uma vez que o montante em causa se manteve depositado em conta à ordem, sem qualquer utilização.
Assim, a explicação da Requerente não é minimamente convincente da congruência económica da operação.
Tendo em conta os factos acima expostos e a circunstância do Requerente não ter dado qualquer explicação racionalmente convincente para a operação, na parte em causa, nem produzido qualquer prova, é de concluir que os gastos não foram incorridos para a obtenção de rendimentos sujeitos a imposto. Pelo contrário, à luz das regras da experiência comum, face aos factos e às explicações dadas pela Requerente é de concluir, presuntivamente, que tais gastos terão sido contraídos para beneficiar o Fundo titular único do capital social da Requerente.
Semelhante conclusão é aplicável aos suprimentos de 19.12.2014, relativamente aos quais a
a Requerente alega “a necessidade de reforçar os meios financeiros disponíveis” mas não concretiza minimamente em que se traduz tal necessidade, carecendo tal alegação de qualquer conteúdo concreto. Tal hipotética necessidade, numa operação com nove dias de duração é, aliás, desmentida pela realidade dos factos carreados para o processo, uma vez que o montante em causa não foi utilizado tendo apenas sido aplicado em depósitos a prazo com taxas substancialmente mais baixas (€ 260.000,00 à taxa de 1,75% e € 300.000,00 à taxa de 2,00%), do que a paga (15%) ao detentor do seu capital social.
Tendo em conta os factos acima expostos e a circunstância do Requerente não ter dado qualquer explicação racionalmente convincente e concreta para a operação, é de concluir que os gastos não foram incorridos para a obtenção de rendimentos sujeitos a imposto sendo, igualmente, de concluir, à luz das regras da experiência comum, face aos factos e às explicações dadas pela Requerente que tais gastos terão sido contraídos para beneficiar o Fundo titular único do capital social da Requerente.
Improcedem, pois, os vícios apontados às liquidações decorrentes destas correções à matéria coletável da Requerente.
13.CORREÇÕES À SOCIEDADE B..., S.A.
JUROS DE SUPRIMENTOS
Relativa a esta correção, no valor de 93.205,48 €, consta das conclusões do RIT, designadamente, o seguinte:
Adiante-se desde já que esta correção, nos termos e com os fundamentos com que foi efetuada, carece de base legal.
Com efeito, determinando o art. 23º-A, nº, 1, al. m), do CIRC, que não são dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável os encargos com “juros e outras formas de remuneração de suprimentos e empréstimos feitos pelos sócios à sociedade, na parte em que excedam a taxa definida por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, salvo no caso de se aplicar o regime estabelecido no artigo 63.º”, tal implica o reconhecimento da dedutibilidade dos gastos com juros e outras formas de remuneração de suprimentos e empréstimos feitos pelos sócios à sociedade, na parte não em que os juros não excedam a taxa definida na portaria, a não ser que a Requerida aplique o regime estabelecido no artigo 63º, o que não foi o caso.
A Requerida, ao fundamentar as correções em causa no art. 23º, nº 1, do CIRC, produziu uma fundamentação manifestamente errada, que o tribunal não pode substituir, aplicando a limitação à dedutibilidade dos gastos em causa prevista no art. 23º-A, nº, 1, al. m), do CIRC pois que, como se decidiu no acórdão do TCA/Norte de 25.05.2010, proc. 0232/01) “no domínio do contencioso de mera legalidade, que é o da impugnação judicial prevista no processo tributário, o tribunal só pode formular o seu juízo sobre a validade do acto à luz da fundamentação contextual integrante do próprio acto, sendo totalmente irrelevantes para esse efeito outros fundamentos que não os que foram oportunamente externados”
Sempre se dirá, porém que, mesmo na ausência da norma especial regulatória do art. 23º-A, nº 1, al. m), como já foi referido, é entendimento deste tribunal que os gastos dedutíveis não estão legalmente limitados aos incorridos no âmbito de atividades compreendidas no objeto social do sujeito passivo, abrangendo todas as atividades de qualquer natureza suscetíveis de gerar rendimentos sujeitos a IRC, como é, manifestamente, o caso de dividendos que o sujeito passivo venha a obter em função dos resultados económicos obtidos pelas suas participadas, não podendo a Requerida intrometer-se nos critérios de gestão do sujeito passivo.
A correção em causa, face à sua fundamentação, padece do vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito, tendo por consequência a sua ilegalidade, o que implica correspondente anulação parcial dos atos tributários de liquidação.
ACCRUALS
Esta correção respeita a gastos contabilizados pela Requerente em 2014, no montante de 12.000 € e que, na sequência de solicitação da Requerida no âmbito do procedimento inspetivo, a Requerente justificou com as seguintes faturas:
i) Fatura n.º FT 352/1926, datada de 2015/07/28 – G... (NIF...), no valor de E 10.620,00 + IVA à 23%, no total de € 13.062,60;
ii) Fatura nº FTCLV2212015..., datada de 04/08/2015, emitida pela H... (NIF ...), no valor de € 1.000,00 + IVA a 23%, no total de € 1.230.
Porém, constatou-se que estas mesmas faturas foram também contabilizadas pela Requerente em 2015 e consideradas gastos deste período tributário.
A Requerente alega que em 2014, os custos anuais com auditores eram, aproximadamente, de € 12.000, sendo efetuado um accrual na conta 622109 de € 12.000 e que em 2015, estes custos foram registados na conta 622103 mas deveriam ter sido registados por conta do accrual da conta 622109 feito em 2014 e ter sido efetuado novo accrual, no valor de € 12.000,00 para o ano de 2015.
A Requerente, alega, portanto, no essencial e para o que aqui importa, que imputou mal estas faturas ao exercício de 2015, devendo, antes, tê-las imputado a 2014.
Será assim? Vejamos.
Relativamente à fatura n.º FTCLI/2212015..., emitida pela H..., emitida em 04/08/2015 verifica-se que a mesma refere que respeita a “Honorários por serviços profissionais, até à data de emissão da presente fatura, no âmbito do exame às demonstrações financeiras da B..., SA, em 31 de dezembro.”
Do descritivo da fatura resulta, assim, que o serviço respeitou a exame às demonstrações financeiras da B...SA prestadas até 4.08.2015, com referência àquelas peças contabilísticas, com data de 31.12.2014.
Dispõe o art. 18º do CIRC que:
“1 — Os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica.
2 — (…)
3 — Para efeitos de aplicação do disposto no n.º 1:
a) (…)
b) Os réditos relativos a prestações de serviços consideram-se em geral realizados, e os correspondentes gastos suportados, na data em que o serviço é concluído, excepto tratando-se de serviços que consistam na prestação de mais de um acto ou numa prestação continuada ou sucessiva, que são imputáveis proporcionalmente à sua execução;
c) (…)”
Respeitando o serviço a exame às demonstrações financeiras da B..., SA prestadas até 4.08.2015, com referência àquelas peças contabilísticas, datadas de 31.12.2014, resulta que os serviços terão sido executados após esta ultima data até 4.08.2015.
Assim, face à al. b), do nº 3, do art. 18º do CIRC, tais serviços só poderão ser imputáveis ao exercício de 2015, e não a 2014 como pretende a Requerente.
iii) Fatura n.º FT 352/1926, datada de 2015/07/28 – G... (NIF ...), no valor de € 10.620,00 + IVA à 23%, no total de € 13.062,60;
Esta fatura, datada de 28.07.2015 não refere a que exercício se reporta, encontrando-se registada na contabilidade em 2015 na conta de gastos 622103-Consultores fiscais e financeiros pelo lançamento contabilístico 70001/2015, diário 41.
Não alegando a Requerente atraso do emitente na emissão da fatura, é de presumir que se reportem a serviços prestados em 2015, tanto mais que a Requerente não provou e nem sequer alegou que tais serviços tivessem sido praticados em 2014.
Nestas circunstâncias, também face à al. b), do nº 3, do art. 18º do CIRC, tais serviços deverão ser imputados ao exercício de 2015, e não a 2014 como pretende a Requerente.
Assim, as duas faturas em causa, face à al. b), do nº 3, do art. 18º do CIRC foram bem consideradas pela Requerente como custos de 2015, não sendo idóneas a justificar os “acruals” de 2014, no valor de 12.000 €, improcedendo, assim, a pretensão da Requerente relativamente a estas correções.
14.VÍCIO DE FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
A requerente invoca, ainda, o vício de insuficiência de fundamentação, legalmente equiparado a falta de fundamentação.
É manifesto, porém, que os atos de liquidação ajuizados se encontram fundamentados nos relatórios de inspeção tributária, como a Requerente indubitavelmente bem entendeu ao refutar exaustivamente as posições da Requerida constantes dos mesmos e referindo mesmo, expressamente, que as correções daqueles constantes foram, posteriormente, materializadas nos atos de liquidação adicional objeto de presente pedido de pronúncia arbitral.
Quanto muito, em resultado do que alega a Requerente poderia ocorrer falta de notificação dos fundamentos do ato tributário, (com as consequências previstas no artigo 37º do CPPT) mas, na verdade, nem tal irregularidade se verificou.
Na verdade, da notificação do relatório final de inspeção feita à Requerente, enquanto sociedade dominante, a fim de fazer repercutir as correções feitas à sociedade, B..., S.A. e a si própria, para efeitos de tributação do grupo, consta o seguinte:
Por outro lado, na notificação da liquidação de imposto objeto do processo efetuada à Requerente consta também que:
Face a estas declarações expressas, e especialmente à conjugação de ambas (numa anuncia-se que -naturalmente em consequência das conclusões do relatório- o sujeito passivo irá ser notificado da “liquidação respetiva”, noutra notifica-se da liquidação referindo-se que a fundamentação já foi remetida), um declaratário normal compreenderá, sem margem para qualquer duvida razoável, como “in casu” a Requerente compreendeu, que a fundamentação da liquidação consta do relatório final de inspeção (que, por sua vez, incorpora os fundamentos dos relatórios finais dos procedimentos inspetivos anteriormente efetuados à Requerente e à sociedade B..., S.A.).
Nesta conformidade, improcede o vício de falta de fundamentação invocado pela Requerente.
15.JUROS COMPENSATÓRIOS
Dispõe o nº 1 do art. 102º do CIRC que:
“Sempre que, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega do imposto a pagar antecipadamente ou a reter no âmbito da substituição tributária ou obtido reembolso indevido, acrescem ao montante do imposto juros compensatórios à taxa e nos termos previstos no artigo 35.º da Lei Geral Tributária.”
Por sua vez, o artigo 35.º, n.º 1, da LGT estabelece que “(...) são devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária”.
No caso dos autos em função das inexatidões relativas à situação tributária do Requerente constantes da declaração fiscal apresentada pelo sujeito passivo à Requerida, (ação subsumível no art. 119º, do regime geral das infrações tributárias), foi retardada a liquidação do imposto devido, pelo que a situação se subsume nos arts.102º, nº 1 do CIRC e 35º da LGT, sendo, consequentemente devidos juros compensatórios.
Relativamente à fundamentação de ato de liquidação de juros compensatórios, decidiu o STA no acórdão proferido no processo 0805/15, de 09-03-2016, em linha com jurisprudência pacífica, o seguinte:
“relativamente ao acto de liquidação de juros, a jurisprudência do STA tem firmado entendimento no sentido de que a fundamentação mínima exigível para esses actos de liquidação (juros) deve indicar a quantia sobre a qual os mesmos incidem, o período de tempo considerado para a liquidação e a taxa ou taxas aplicadas, com menção desses elementos no próprio acto de liquidação ou por remissão para documento anexo (cfr. os acs. do STA, de 21/4/2010, proc. nº 743/09; de 16/10/2010, proc. nº 830/10; de 30/11/2011, proc. nº 619/11; de 29/2/2012, proc. nº 928/11; e de 14/2/2013, proc. nº 645/12).
Por isso, descendo ao caso concreto, entende-se que estão verificados os requisitos exigíveis para a validade do predito acto de liquidação (de juros), pois que, conforme resulta, nomeadamente, da al. H) do Probatório, na liquidação estão explicitados os elementos acima assinalados [o motivo da liquidação (ter havido retardamento da liquidação de parte ou da totalidade do imposto, por facto imputável ao sujeito passivo - arts. 89º do CIVA e 35º da LGT); a indicação do imposto em falta sobre o qual incidem os juros; o período a que se aplica a taxa de juro - de 2000/05/10 a 2000/12/26”.
No caso dos autos, todos estes elementos constam da liquidação do ato pelo que, sufragando-se esta jurisprudência, julga-se improcedente a pretensão anulatória da Requerente de anulação da liquidação de juros compensatórios na parte referente à liquidação de imposto que se mantém na ordem jurídica.
16.JUROS INDEMNIZATÓRIOS
No caso dos autos não resultou provado que a Requerente tivesse procedido ao pagamento do montante de imposto liquidado.
Deste modo, não poderá deixar de improceder o pedido acessório de condenação da Requerida no pagamento de juros indemnizatórios, improcedendo, consequentemente, esta pretensão da Requerida.
-IV- Decisão
Assim, decide o Tribunal arbitral julgar parcialmente procedente o pedido de pronuncia arbitral, decretando-se: a) A anulação parcial da liquidação de imposto objeto do processo, na parte correspondente às correções correspondentes à desconsideração de gastos da Requerente e da sua participada B..., S.A. supra declaradas ilegais;
b) A anulação parcial da liquidação de juros compensatórios na parte correspondente aos juros referentes às correções correspondentes à desconsideração de gastos da Requerente e da sua participada B..., S.A. supra declaradas ilegais;
c) Manter na ordem jurídica os atos tributários nas partes remanescentes.
d) Julgar improcedente o pedido de condenação da Requerida a pagar juros indemnizatórios à Requerente.
Valor da ação: € 7.254,61 (sete mil, duzentos e cinquenta e quatro euros e sessenta e um cêntimos), nos termos do disposto no art. 306º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.
Custas por Requerente e Requerida na proporção de sessenta e dois virgula cinquenta e um por cento e trinta e sete virgula quarenta e nove por cento, respetivamente, nos termos do nº 4 do art. 22º do RJAT.
Notifique-se.
Lisboa, CAAD, 16 de Agosto de 2019.
O Árbitro
Marcolino Pisão Pedreiro