Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 180/2019-T
Data da decisão: 2019-08-26  IRS  
Valor do pedido: € 936,54
Tema: IRS - categoria F; dedução de perdas; englobamento; artigos 41º, 55º e 72º do CIRS.
Versão em PDF

DECISÃO ARBITRAL

 

I-RELATÓRIO

 

1. A... e B..., contribuintes fiscais, respectivamente ... e ..., residentes n Rua ..., nº..., ..., ...-... Lisboa (doravante designados por Requerentes), casados entre si, apresentaram em 2019-03-14, pedido de constituição de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº 1 dos artigo 2º, 5º nº 2, alínea a), 6º, nº1 e 10º, nºs 1 e 2, todos do Decreto Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante referido por RJAT)  e dos artigos 1º e 2º da Portaria nº 112-A/2011 de 2 de Março, em que é requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por AT ou Requerida) com vista à declaração de ilegalidade do acto de indeferimento da reclamação graciosa nº ...2018..., e consequentemente da liquidação de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares  nº 2018..., referente ao ano de 2016, no valor a reembolsar de 936,54 €.

 

2.O pedido de constituição do Tribunal Arbitral Tributário foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD, e de imediato notificado à Requerida nos termos legais.

 

3. Nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do nº 2 do artigo 6º do RJAT, por decisão do Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente notificada às partes, nos prazos previstos, foi designado como árbitro o signatário que comunicou àquele Conselho a aceitação do encargo, no prazo previsto no artigo 4º do Código Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa.

 

4.Em 2019-05-06, foram as partes notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11º, nº 3, alíneas a) e b) na redacção que lhes foi conferida pela Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro.

 

5. O tribunal arbitral singular ficou constituído em 2019-05-27 de acordo com a prescrição da alínea c) do artigo 11º do RJT, na redacção que lhe foi conferida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro.

 

6. Devidamente notificada para tanto, através de despacho proferido em 2019-05-07, a Requerida apresentou em 2019-06-25 a sua resposta, tendo, nessa mesma data procedido à junção do processo administrativo (PA).

 

7. Por despacho proferido na última das referidas datas (2019-06-25), devidamente notificado às partes, que fundamentou, para além do mais, a dispensa da reunião a que alude o artigo 18º do RJAT, e a apresentação de alegações finais, foi indicada como data limite previsível para a prolação da decisão final e sua notificação às partes, o dia quinze de Setembro de dois mil e dezanove.

 

8.A fundamentar o seu pedido os Requerentes invocam, em síntese e com relevo para o que aqui importa, o seguinte (que se menciona maioritariamente por transcrição):

 

8.1. Que nos exercícios de 2015 e 2016, as declarações de IRS foram entregues com opção pela tributação conjunta, sem englobamento,

 

8.2. Quanto ao exercício de 2016, e para os rendimentos da categoria F, o sujeito passivo A (A...) apresentou na declaração de IRS um rendimento bruto de 10.148,69 € e despesas de 20.285,29 €,

 

8.3. A AT notificou os Requerentes no sentido de informar que apenas aceitava como despesas dedutíveis o valor de 18.624,50 €,

 

8.4. Em resultado da correcção levada a cabo pela AT, apurou o sujeito passivo A um rendimento líquido negativo de 8.475,81 €,

 

8.5. Com data de 03/10/2018 foram os Requerentes notificados na nota de liquidação nº 2018..., relativa aos rendimentos de 2016, de onde resulta o valor de 1.584,37 € relativo a tributações autónomas, correspondente a 28% do valor do resultado positivo (5.658,45 €) dos rendimentos da categoria F do sujeito passivo B,

 

8.6. Os Requerentes apresentaram reclamação graciosa relativamente à liquidação de IRS do ano de 2016, por não terem sido reconhecidas as perdas na categoria F,

 

8.7. Finalizam os Requerentes o seu pedido de pronúncia arbitral peticionando que seja declarada a “ilegalidade da nota de IRS nº 2018..., corrigindo-se o rendimento tributável dos Requerentes, mediante dedução da perda apurada em 2015 e tributação da diferença positiva à taxa de 28%, com a consequente restituição de IRS indevidamente pago no montante de 936.54 €,

 

8.8. Os Requerentes peticionam ainda o pagamento de juros indemnizatórios.

 

9. Como referido, em 2019-06-25 a Autoridade Tributária e Aduaneira procedeu à junção do PA e apresentou a sua resposta onde, fundamentalmente, em breve síntese, e para o que aqui releva, defende o seguinte (que igualmente se menciona, maioritariamente, por transcrição):

 

9.1. Os Requerentes peticionam a anulação da liquidação aqui em causa sustentando que a mesma é ilegal em virtude de ela não reflectir a perda apurada em 2015 e tributação da diferença positiva à taxa de 28% com a consequente restituição de IRS indevidamente pago e o reconhecimento de perdas do sujeito passivo A no valor de € 8.475,81.(cfr. artº  5 da resposta)

 

9.2. Os Requerentes carecem totalmente de razão porquanto aparentam ter olvidado a opção que tomaram quanto à tributação dos rendimentos aquando da entrega da declaração de IRS subjacente ao ato tributário que agora colocam em crise. (cfr. artº 6º da resposta)

 

9.3. Prescreve o artigo 22º/1 do CIRS que “o rendimento em IRS é o que resulta do englobamento dos rendimentos das várias categorias auferido em cada ano, depois de feitas as deduções e os abatimento nas secções seguintes”. (cfr. artº 7º da resposta)

 

9.4. No entanto, prevê o artigo 22º/3 do CIRS que “não são englobados para efeitos da sua tributação (…) os rendimentos referidos nos artigos 71º e 72º auferidos por residentes em território português, sem prejuízo da opção pelo englobamento neles previsto”. (cfr. artº 8º da resposta)

 

9.5. (…) estabelece o nº 7 do artigo 72º do CIRS que os “rendimentos predais são tributados autonomamente à taxa de 28%”, sendo que dispõe o nº 8 daquele artigo que “os rendimentos previstos nos nºs 4 a 7 podem ser englobados por opção dos respectivos titulares residentes em território português”. (cfr. artº 9º da resposta)

 

9.6. (…) subsumindo as apontadas normas legais e doutrina ao caso vertente verifica-se que: (cfr. artº 12º da resposta)

 

9.7. Em primeiro lugar, os Requerentes expressamente declararam ser residentes no continente português (Modelo 3 do IRS, quadro). [cfr. artigo 13º da resposta]

 

9.8. Em segundo lugar, os Requerentes expressamente declararam não optar pelo englobamento dos rendimentos por eles auferidos (Modelo 3- Anexo F do IRS, quadro 5-campo 11). (cfr. artigo 14º da resposta)

 

9.9. Como aliás, já o haviam feito no período de 2015. (cfr. artigo 15º da Resposta)

 

9.10. Portanto, ao não optarem pelo englobamento os aqui residentes Requerentes escolheram tributar separadamente o rendimento da categoria “F” mediante a aplicação de uma taxa fixa sobre aquele rendimento bruto. (cfr. artigo 16º da resposta)

 

9.11. Ainda que se tenha mantido a obrigação de os mesmos fazerem constar tal rendimento na respectiva declaração de IRS. (cfr. artigo 17º da resposta)

 

9.12. (…) reunindo os Requerentes, como reuniam, o requisito da residência nacional plasmado no artigo 22º/3 do CIRS e tendo optado, com efectivamente optaram, pelo não englobamento dos rendimentos da categoria “F”, naturalmente que lhes está agora vedada a possibilidade de verem reflectido o resultado líquido no valor de € 8,475,81. (cfr. artigo 18º da resposta)

 

9.13. Pois que o reporte de prejuízos é uma operação a jusante que pressupõe a adopção a montante da opção do englobamento – o que, frisa-se, não aconteceu na caso vertente. (cfr. artigo 19º da resposta)

 

9.14. Daí que, não tendo os Requerentes optado pelo englobamento, não podem vir agora- passe a expressão – “obter o melhor de dois mundos”, ou seja:

•             A aplicação de uma taxa fixa aos rendimentos da categoria “F” em detrimento da opção do englobamento; e

•             Simultaneamente o reporte de perdas subjacente e uma opção do englobamento que não foi tomada. (cfr. artigo 20º da resposta)

 

 

9.15. E isto é quanto basta para, sem mais, improceder o pedido arbitral como ele se mostra apresentado, quanto à questão do reporte de perdas, dado que a liquidação sub judice mais não espelha senão o resultado da opção de tributação livremente tomada pelos próprios Requerentes e, por conseguinte, aquilo que verte da lei fiscal (cfr, PA – Reclamação Graciosa) [cfr. artigo 21º da resposta].

 

9.16. Conclui a AT a sua resposta pugnando pela improcedência do pedido de pronúncia arbitral e, consequentemente pela manutenção do acto impugnado na ordem jurídica.

 

10. O Tribunal Arbitral Singular é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2º, nº 1, alínea a), 5º e 6º do RJAT.

 

11. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, e estão devida e legalmente representadas, a AT pelos juristas que designou, e os Requerentes por si próprios (artigos 3º, 6º e 15º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ex vi artigo 29º nº 1, alínea a) do RJAT.

 

12. Não foram suscitadas excepções de que deva conhecer-se

 

II- FUNDAMENTAÇÃO

A. MATÉRIA DE FACTO

A.1. Factos dados como provados

 

Com relevo para a apreciação e decisão da questão suscitada, dão-se como provados e assentes os seguintes factos:

 

1.Os Requerentes, casados entre si, apresentaram a sua declaração Modelo 3 de IRS, relativa ao ano de 2015 em 2016-05-31, validada sob o número ...,

 

2.Tendo apresentado a declaração Modelo 3, relativa ao ano de 2016 em 2017-05-31, validade sob o número ...,

 

3. Em ambas as declarações de rendimentos foi indicada a opção pela tributação conjunta, sem englobamento.

 

4. Os Requerentes após a correcção promovida pela AT, nos termos do disposto no artigo 65º, nº 4 do CIRS, foram notificados da nota de liquidação nº 2018..., relativa ao ano de 2016, com um resultado de valor a reembolsar no montante de 574,35 €.

 

5.Na sobredita nota de liquidação consta o valor de 1.584,37 €, relativo a tributações autónomas calculado à taxa de 28% sobre o montante de 5.658,45, correspondente este ao resultado positivo alcançado pela Requerente “B”.

 

6. Da identificada liquidação, vieram os Requerentes apresentar, por via electrónica, em 2018-10-25, reclamação graciosa junto do Serviço de Finanças de Lisboa ..., a que veia o caber  nº ...2018...,

 

7.Reclamação essa que foi indeferida por despacho de 2018-12-20 notificado aos Requerentes.

 

8.Na proposta de decisão que fundamenta o indeferimento da reclamação graciosa, retira-se o seguinte:

 

 Da análise do pedido

 

“O SP apresenta a presente reclamação graciosa contra a liquidação de IRS do ano de 2016, com o nº 2018/..., alegando para tal que o reporte das perdas apuradas na categoria “F” não depende da prévia opção pelo englobamento dos rendimentos prediais, pelo que solicita a dedução ao resultado apurado das perdas determinadas em 2015.

 

Compulsados os elementos existentes neste serviço de finanças, nomeadamente as aplicações informáticas, verifica-se que o SP reclamante entregou a declaração de IRS do ano de 2015 em 31/05/2016, à qual foi atribuído o nº ...-2015-..., na qual mencionou o estado civil de casado com opção pela tributação conjunta dos rendimentos.

 

Em 31/05/2017, foi entregue a declaração de rendimento do ano de 2016 nos mesmos moldes, ou seja, mencionou o estado civil com opção de tributação conjunta dos rendimentos.

 

De acordo com o disposto no nº 1 do artº 22º do CIRS, o rendimento colectável em IRS é o que resulta do englobamento dos rendimentos das várias categorias auferidas em cada ano, depois de feitas as deduções e os abatimentos previstos nas secções seguintes.

Até à alteração introduzida pelo Orçamento de Estado de 2013, o rendimento líquido da categoria “F” (rendimentos prediais deduzidos das deduções do artº 41º do CIRS), era englobado com os restantes rendimentos para a determinação da taxa geral de IRS a aplicar à totalidade dos rendimentos,

 

Após a referida alteração, os rendimentos prediais deduzidos das despesas elegíveis para efeitos do estabelecido no artº  41º do CIRS, passaram a ser tributados a uma taxa autónoma de 28% (alínea e do nº 1 do artº 72º do CIRS), podendo, todavia, o contribuinte optar pelo respectivo englobamento, nos termos e condições estabelecidas no art.º 22º, nº 3 alínea b) e nº 5 do mesmo diploma legal, assinalando, para o efeito, tal opção no respectivo anexo “F”.

 

Determina o artº 55º do CIRS, que, relativamente a cada titular de rendimentos, o resultado líquido negativo apurado em qualquer categoria só é dedutível aos seus resultados líquidos positivos da mesma categoria, estipulando na sua alínea b) que o resultado líquido negativo apurado em determinado ano na categoria “F” só pode ser reportado aos seis anos seguintes àquela a que respeita.

 

Do que decorre que, não sendo feita a opção pelo englobamento, ou seja, não entrando o rendimento da categoria “F” no cômputo total dos rendimentos líquidos sujeitos a tributação, não possa, em tal situação ser aplicável o mecanismo legal acima referido.

 

Concluindo, a opção pela tributação autónoma dos rendimentos prediais, não permite a dedução de perdas apuradas nos anos anteriores, nem o reporte dos prejuízos determinados no próprio ano em que a opção pela tributação autónoma é exercida, a usufruição daqueles “benefícios” está condicionada à opção pelo englobamento dos rendimentos,

 

Ora, da análise aos anexos “F” que constam das declarações do SP reclamante, referente aos anos de 2015 e 2016, constata-se que não foi exercida a opção pelo englobamento dos rendimentos em causa.”

 

PROPOSTA DE DECISÃO

 

“Analisados os documentos que instruem os autos, bem como as informações do sistema informático, e atendendo à legitimidade do reclamante, atendendo ainda à tempestividade do pedido, sou de parecer que deverá ser proferida decisão de indeferimento da presente reclamação”

 

 

9. Em 2019-03-14 os Requerentes apresentaram junto do CAAD, pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo. (cfr. sistema informático de gestão processual do CAAD).

 

 

A.2. Factos dados como não provados

 

Com relevo para a decisão, não existem factos que devam considerar-se como não provados.

 

A.3. Fundamentação da matéria de facto dada como provada e não provada

 

Relativamente à matéria de facto, o tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. artº 123º, nº 2 do CPPT e artigo 607º, nº 3 do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi artigo 29º, nº 1, alíneas a) e ) do RJAT.

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa, são escolhidos em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da (s) questão (ões) de Direito (cfr. artigo 596º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 29º, nº1, alínea e) do RJAT.

Assim sendo, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes à luz do artigo 110º, nº 7 do CPPT, a prova documental e o PA anexo, consideram-se provados, com relevo para a decisão, os factos supra elencados.

 

B.DO DIREITO

 

- objecto e delimitação

 

Não obstante o pedido de pronúncia arbitral (ppa) não constituir um modelo de perfeição técnico jurídica, apresentando mesmo alguma dificuldade de percetibilidade, a verdade é que, face à posição assumida pelas partes, poderá afirmar-se que a questão a resolver se conduzirá em saber se não tendo os Requerentes, residentes em território português, optado pelo englobamento dos rendimentos prediais (categoria F) nas declarações de IRS, poderão ou não beneficiar do reporte de perdas dos anos anteriores previsto do artigo 55º do CIRS.

 

No caso subjacente a questão a dirimir consistirá na resposta ao seguinte; tendo os Requerentes apurado na categoria F de rendimentos sujeitos a imposto sobre o rendimento das pessoas singulares perdas no valor de 8,475,81 €, relativamente ao ano de 2015 no quadro da categoria F, o reporte de tais perdas, pressupõe a opção pelo englobamento dos rendimentos prediais?

 

 

-O quadro normativo com referência à data dos factos pertinentes (exercício fiscal de 2016)

 

Artigo 8º

Rendimentos da categoria F

“1. Consideram-se rendimentos prediais as rendas dos prédios rústicos, urbanos e mistas pagas os colocadas à disposição dos respetivos titulares, quando estes não optarem pela sua tributação no âmbito da categoria B”.

 

 

 Artigo 41º do CIRS -Deduções) (na redacção introduzida pela Lei nº 82-E/2014, de 31 de Dezembro:

 

 “1. Aos rendimentos brutos referidos no artigo 8º deduzem-se, relativamente a cada prédio ou parte de prédio todos os gastos efetivamente suportados e pagos pelo sujeito passivo para obter ou garantir tais rendimentos, com exceção dos gastos da natureza financeira, dos relativos a depreciações e dos relativos a mobiliário, eletrodomésticos e artigos de conforto ou decoração,”

 

Prescrevendo, por seu turno o artigo 55º do CIRS:

 

Artigo 55º

Dedução de perdas

 

“1.Relativamente a cada titular de rendimentos, o resultado líquido negativo apurado em qualquer categoria só é dedutível aos seus resultados líquidos  positivos da mesma categoria, nos seguintes termos:

(…)

b) O resultado líquido negativo apurado na categoria F só pode ser reportado aos seis anos seguintes àquele a que respeita.

c) A percentagem do saldo negativo a que se refere o nº 2 do artigo 43º só pode ser reportada aos cinco anos seguintes àquele a que respeita.

d) O saldo negativo apurado num determinado ano, relativo às operações previstas nas alíneas b), c), e), f), g) e h) do nº 1 do artigo 10º, pode ser reportado para os para os cinco anos seguintes quando o sujeito passivo opte pelo englobamento.

 

Ora, analisado ainda que sinteticamente o quadro normativo com relevo para a factualidade subjacente, e sem prejuízo do que infra se dirá, poder-se-á desde já avançar, como conclusão parcial, que o artigo 55º, nº 1, alínea b) do CIRS ao estabelecer o regime da dedução de perdas da categoria F, não exige o englobamento dos rendimentos prediais como condição para o reporte de perdas.

 

Quanto a este segmento, perfilha este tribunal o entendimento de que “(…) o artigo 55º, nº 1, alínea b) do CIRS, que estabelece o regime da dedução de perdas da categoria F, não exige o englobamento dos rendimentos prediais como condição para o reporte de perdas, Tal conclusão parece-nos indubitável, atento o facto de o artigo 55º, nº 1, alínea d) do CIRS, pelo contrário dispor expressamente que a dedução de perdas relativamente às mais-valias mobiliárias apuradas nos anos seguintes depende da opção do sujeito passivo pelo englobamento.

Desta forma, caso o legislador pretendesse que o reporte de perdas no âmbito da categoria F dependesse do exercício da opção pelo englobamento, tê-lo-ia dito, tal como fez relativamente às mais e menos-valias mobiliárias.”

 

Em sentido idêntico ao acabo de transcrever, e perante circunstancionalismo fáctico similar ao dos presentes autos, apontam (entre outras) as decisões arbitrais proferidas, sob a égide do CAAD, nos processos números 351/2018-T e 538/2018-T.

 

Retirando-se do primeiro dos citados que data vénia subscrevemos sem qualquer reserva:

 

 “Resulta do preceito transcrito que, que relativamente a cada titular de rendimentos, um resultado líquido negativo apurado na categoria F, num determinado ano, é dedutível aos resultados líquidos positivos da mesma categoria, desde que seja reportado aos cinco anos seguintes àquele a que respeita.

Contrariamente ao que prevê expressamente na alínea d) do nº 1 do artigo 55º do CIRS, relativo às operações previstas nas alíneas b), c), e), f), g) e h) do artigo 10º, o legislador não condiciona a dedutibilidade de perdas apuradas no âmbito da categoria F [prevista na alínea b), do nº 1, do artigo 55º do CIRS] à opção, por parte do titular do rendimento, pelo englobamento, no ano em que pretenda fazer a dedução.”

 

Continuando a decisão que vimos seguindo:

 

 “A tributação dos rendimentos da categoria F, concretiza-se, em regra, por via da aplicação de uma taxa especial (taxa de tributação autónoma) de 28%, conforme previsto no artigo 72º, nº 1, alínea e) do CIRS.

As taxas especiais, previstas no artigo 72º do CIRS, têm natureza distinta das taxas liberatórias, previstas no artigo 71º, com estas não se confundindo.

Com efeito, a aplicação das taxas previstas no artigo 72º do CIRS não de traduz em qualquer retenção na fonte a título definitivo, nem liberta o titular do rendimento do cumprimento das inerentes obrigações fiscais, desde logo a obrigação declarativa.

A taxa de 28% a que se refere o artigo 72º, alínea e), é aplicada ao rendimento líquido da categoria F, isto é, ao valor correspondente ao rendimento bruto (ou ilíquido) subtraído dos montantes correspondentes a deduções específicas e a dedução de perdas, nos termos, respectivamente, dos artigos 41º e 55º, nº 1, alínea b), ambos do CIRS.

O artigo 72º, nº 8 do CIRS prevê a possibilidade de o titular de rendimentos da categoria F optar pelo englobamento, mas não prevê que o exercício desta opção pelo titular do rendimento seja condição sine qua non para a dedutibilidade de eventuais perdas apuradas na mesma categoria.

Também não resulta do artigo 22º do CIRS que apenas sejam admitidas deduções de perdas quanto haja englobamento dos rendimentos.

Aliás, conforme resulta claramente da letra do artigo 55º, nº 1, o legislador não prevê que a dedução de perdas da categoria F seja feita ao rendimento englobado, mas sim ao rendimento líquido apurado na referida categoria.”

 

Face ao exposto, sem necessidade de quaisquer outras considerações, e revertendo à situação aos autos, inexiste base legal que permita à Requerida recusar a dedução de perdas no âmbito da categoria F, na circunstância de os sujeitos passivos não terem exercido a opção pelo englobamento dos rendimentos da categoria F.

 

Procedendo, em consequência, o pedido de pronúncia arbitral formulado pelos Requerentes.

 

III- JUROS INDEMNIZATÓRIOS

 

De conformidade ao disposto na alínea b) do artigo 24º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação, vincula a administração tributária, a partir do termo do prazo para o recuso ou impugnação, devendo esta, nos precisos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo, e até ao termo do prazo para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, "restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessárias para o efeito", o que está em sintonia com o preceituado no artigo 100º da LGT, aplicável ex vi alínea a) do nº 1 do artigo 29º do RJAT, que prevê:

Artigo 100º

Efeitos de decisão favorável ao sujeito passivo

A administração tributária está obrigada em caso de procedência total ou parcial da reclamação, impugnação ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do prazo da execução da decisão.

 

Embora o artigo 2º, nº 1, alíneas a) e b) do RJAT utilize a expressão "declaração de ilegalidade", para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam sob a égide do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), não fazendo menção a decisões condenatórias, deverá entender-se que compreendem nas suas competências, os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se harmoniza e conjuga com o sentido de autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que "o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária".

 

O nº 5 do artigo 24º do RJAT ao afirmar que "é devido o pagamento de juros independentemente da sua natureza, nos termos previstos na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário", deverá ser interpretado n sentido de permitir o conhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral tributário.

 

Os juros indemnizatórios têm uma função reparadora do dano, dano esse que resulta do facto de o sujeito passivo ter ficado ilicitamente privado de certa quantia, durante em determinado período de tempo, visando colocá-lo na situação em que o mesmo estaria caso não tivesse efectuado o pagamento que lhe foi indevidamente exigido.

 

Perante o que vem de expor-se, e face ao sentido decisório quanto ao mérito da causa, já sinalizado, decide este tribunal singular em condenar a Requerida ao pagamento de juros indemnizatórios calculados sobre a data do apuramento do saldo da nota de liquidação nº 2018... até à sua integral devolução.

 

 

IV- DECISÃO

 

Em face do que vem de se expor, decide este Tribunal Arbitral Singular em:

 

- julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral

 

- declarar ilegal a liquidação de IRS nº 2018..., respeitante ao ano de 2016,

 

-declarar a nulidade da decisão de indeferimento da reclamação graciosa nº ...2018...

 

-julgar procedente o pedido de reembolso da quantia de 936,54 €, a que acresce a referente a juros indemnizatórios.

 

- condenar a Requerida no pagamento das custas do processo,

 

 

V- VALOR DO PROCESSO

 

De conformidade ao estatuído nos artigos 296º, nº 1 e 2 do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 47/2013, de 26 de Junho, 97º-A, nº 1, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributária, e artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributário, fixa-se ao processo o valor de 936,54 € (novecentos e trinta e seis euros e cinquenta e quatro cêntimos)   

 

VI- CUSTAS

 

Nos termos do disposto nos artigos 12º, nº2, 22º, nº 4 do RJAT e artigo 2º e 4ç do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem, e Tabela I a este anexa fixa-se o montante de custas em 306,00 € (trezentos e seis euros).                     

 

NOTIFIQUE-SE

 

Texto elaborado em computador, nos termos do disposto no artigo 131º do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 29º, nº 1, alínea e) do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, com versos em branco, e revisto pelo árbitro.

 

[A redação da presente decisão rege-se pela grafia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990, excepto no que respeita às transcrições efectuadas]

 

Vinte e seis de Agosto de dois mil e dezanove

 

O árbitro

(José Coutinho Pires)