DECISÃO ARBITRAL
1 - Relatório
1.1 –A..., S. A., que anteriormente girou sob a firma “B..., S.A.”, com o número de identificação fiscal ... e com sede na Avenida ..., n.º..., em ..., na qualidade de sociedade gestora e em representação do “C...”, com sede na ..., n.º..., em Lisboa, doravante designada por «Requerente», com o número de identificação fiscal ..., vem, ao abrigo dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.ºs 1 e 2, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária), doravante apenas designado por «RJAT» e artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, requerer a constituição de tribunal arbitral singular, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante “Requerida” ou “AT”).
1.2 - O pedido de pronúncia arbitral, apresentado em 31 de dezembro de 2018, tem por objeto a declaração de ilegalidade do despacho de indeferimento do pedido de revisão oficiosa n.º ...2016..., proferido pelo Diretor de Finanças Adjunto de Lisboa, em 24 de setembro de 2018, ao abrigo de competência subdelegada, e consequente anulação da liquidação do imposto do selo (verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo – TGIS) com o n.º 2014..., emitida pela “AT” em 20-03-2015, com referência ao ano de 2014, no montante 13 380,50 € (treze mil, trezentos e oitenta euros e cinquenta cêntimos), a que respeitam as notas de cobrança n.ºs 2015..., 2015... e 2015..., a primeira no montante de 4 460,18 € e cada uma das restantes no de 4 460,18 €, com data limite de pagamento nos meses de abril, julho e novembro do ano de 2015, respetivamente.
1.3 – Os Requerentes optaram por não designar árbitro.
1.4 - O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e notificado à AT em 03 de janeiro de 2019.
1.5 - O signatário foi designado pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD como árbitro do tribunal arbitral singular, nos termos do disposto no artigo 6.º do RJAT, e comunicada a aceitação do encargo no prazo aplicável.
1.6 - Em 15 de fevereiro de 2019, as Partes foram notificadas dessa designação, não se tendo oposto à mesma, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.
1.7 - Assim, em conformidade com o preceituado no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, o tribunal arbitral singular ficou constituído em 07 de março de 2019.
1.8 - A AT foi notificada, por despacho arbitral de 07 de março de 2019, nos termos do artigo 17.º, n.º 1 do RJAT, para, no prazo de 30 dias, apresentar Resposta, querendo, e solicitar a produção de prova adicional.
1.9 - Mais foi notificada para, no mesmo prazo, apresentar o processo administrativo (PA) referido no artigo 111.º do CPPT.
1.10 – Em 08 de abril de 2019 a AT requereu a prorrogação do prazo para apresentação da Resposta, por um período de quinze dias.
1.11 O que foi deferido por despacho da mesma data, proferido nos termos do n.º 2 do artigo 19.º do RJAT e n.º 5 do artigo 569.º do CPC, este aplicável por força da alínea e), n.º 1 do artigo 29.º daquele diploma.
1.12 - Em 07 de maio de 2017, a Requerida apresentou a sua Resposta, defendendo-se por exceção (caducidade do direito de ação por intempestividade do pedido de constituição do tribunal arbitral, cfr. artigo 27.º do articulado) e impugnação, pugnando pela improcedência do pedido de pronúncia arbitral, por não provado, mantendo-se na ordem jurídica o ato tributário de liquidação impugnado com a consequente absolvição da Requerida do pedido.
1.13 - Na mesma data juntou aos autos o respetivo PA.
1.14 - Considerando que as Partes não requereram a produção de qualquer prova, para além da documental junta ao processo, o Tribunal Arbitral, face aos princípios da autonomia na condução do processo, da celeridade, da simplificação e informalidades processuais, ínsitos nos artigos 16.º e 29.º, n.º 2, do RJAT, por despacho de 07 de maio de 2019, dispensou a realização da reunião prevista no artigo 18.º do mesmo diploma, tendo ainda decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas, facultativas, no prazo de 10 dias, de forma sucessiva para a Requerida.
1.15 - Pelo mesmo despacho foi determinado que a decisão arbitral seria proferida até ao termo do prazo a que alude o artigo 21.º, n.º 1 do RJAT, ou seja, até 09 de setembro de 2019, por força do disposto na alínea e) do artigo 279.º do Código Civil, uma vez que o dia 8 do mesmo mês é dia não útil (domingo).
1.16 – As Partes não apresentaram alegações.
1.17 – Em 12 de junho de 2019 e tendo em vista o princípio do contraditório, face à exceção invocada pela Requerida (caducidade do direito de ação por intempestividade do pedido de constituição do tribunal arbitral), foi proferido despacho, na mesma data notificado à Requerente, a fim desta se pronunciar, querendo, no prazo de dez dias, tendo, contudo, optado pelo silêncio.
Posição das Partes
Da Requerente -
Sustenta o seu pedido de pronúncia arbitral, sinteticamente, da seguinte forma:
Que é proprietária de um prédio urbano com o artigo ... da freguesia da ..., concelho de Lisboa, inscrito na matriz como terreno para construção, sobre o qual a AT procedeu à liquidação do imposto do selo do ano de 2014, respeitante à verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), a que correspondem as notas de cobrança n.ºs 2015..., 2015 ... e 2015..., no montante total de 13 380,50 €.
Que a referida verba da TGIS, na sua última redação introduzida pela Lei n.º 83.º-C/2013, de 31 de dezembro, em vigor desde 01 de janeiro de 2014, previa a tributação de “terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação” cujo valor patrimonial tributário fosse igual ou superior a 1 000 000,00 €.
Deste modo, no que respeita a terrenos para construção, o facto tributário relevante para a referida tributação assentava na titularidade de um direito real - “propriedade, usufruto ou direito de superfície”-, sobre um terreno para construção que, tendo um valor patrimonial igual ou superior a 1 000 000,00 €, tivesse uma edificação para habitação “autorizada ou prevista”, com a consequente existência do respetivo processo administrativo associado à construção e a necessária licença/autorização de construção e respetivo projeto aprovado.
Assim o direito a construir não está ínsito no direito de propriedade, mas só nasce de novo no património do proprietário quando um ato administrativo da entidade pública competente o reconhece e autoriza, o que não acontece com o prédio em causa, uma vez que o mesmo não tinha, em 2014, uma edificação, autorizada ou prevista para habitação.
Sendo a liquidação impugnada manifestamente ilegal, por erro nos pressupostos de facto e de direito, devendo ser anulada.
Refere ainda que, face à atividade que exerce, os imóveis de que é proprietária destinam-se ao arrendamento, pelo que, também nestes termos, a liquidação afigura-se manifestamente ilegal por erro nos pressupostos de facto e de direito, devendo ser anulada.
Mais refere, a título subsidiário, a inconstitucionalidade da verba 28.1 da TGIS, por violação dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva, consagrados nos artigos 13.º e 104.º, n.º 3, respetivamente, da Constituição da República Portuguesa, quando interpretada por forma a ser aplicada a terrenos para construção, uma vez que o ato de liquidação é suscetível de originar um tratamento diferenciado e uma desigualdade injustificada entre os contribuintes.
Termina pugnando pela procedência do pedido de pronúncia arbitral e por via disso pela anulação do despacho de indeferimento proferido no procedimento instaurado nos termos do pedido de revisão oficiosa n.º ...2016... e anulação da liquidação impugnada, no montante de 13 380,50 €, com todas as consequências previstas na lei, nomeadamente o reembolso do montante indevidamente pago, acrescido dos correspondentes juros indemnizatórios.
Da Requerida -
Defendendo-se por exceção, invoca os seguintes argumentos:
Que o pedido de pronúncia arbitral é manifestamente intempestivo, face ao prazo previsto no artigo 10.º, n.º 1 do RJAT, pelo que ocorre a exceção dilatória a que se refere a alínea h), do n.º 1 do artigo 89.º do CPTA e alínea e), do n.º 1 do artigo 287.º do CPC (pensamos que por lapso foi referido este preceito do CPC/61 em vez do artigo 277.º do CPC/2013), o que determina a sua absolvição da instância.
Defendendo-se por impugnação, invoca os seguintes argumentos:
Que a liquidação impugnada não enferma de qualquer erro nos pressupostos de facto e de direito, pelo que deverá manter-se.
É que, ao contrário do que sustenta a Requerente, o prédio em causa não é um terreno para construção, mas antes um prédio em propriedade total, sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente. Com efeito, de acordo com a Certidão de Teor do Prédio, a Ficha da 1.ª Avaliação realizada em 2013, e prints de elementos do prédio extraídos do sistema informático da AT, que integram o Processo Administrativo (PA) junto aos autos, o prédio urbano em causa encontra-se inscrito sob o artigo ... da matriz predial da freguesia da ..., estando constituído no regime antes referido com um VPT de 1 338 050,00 €.
Com efeito, em todas as declarações modelo 1 de IMI apresentadas pela Requerente bem como nas respetivas fichas referentes às avaliações efetuadas, nunca foi mencionado que o prédio em causa é um terreno para construção, mas antes um prédio em propriedade total, sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, destinado a habitação.
O VPT do prédio em causa à data do facto tributário (31-12-2014) era de 1 338 050,00 €, face à avaliação realizada em 27-01-2014, resultante da declaração modelo 1 de IMI apresentada em 28-12-2013, sendo esse o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de imposto do selo, cfr. parte final da verba 28 da TGIS e o disposto no artigo 113.º/1 do CIMI, aplicável por força do artigo 67.º/2 do CISelo.
Assim a liquidação em causa foi efetuada por referência à verba 28.1 da TGIS pelo facto de se tratar de prédio habitacional com VPT igual ou superior a 1 000 000,00 €, pelo que, sendo o VPT do prédio em causa de 1 338 050,00 € e a taxa de 1%, o imposto foi liquidado no montante de 13 380,50 € (1 338 050,00 € x 1%).
Termina pugnando pela total improcedência do pedido de pronúncia arbitral e absolvição da Requerida, mantendo-se na ordem jurídica o ato tributário impugnado, uma vez que a liquidação controvertida consubstancia uma correta interpretação e aplicação do direito aos factos, não padecendo de vício de violação de lei por erro nos pressupostos.
2. Saneamento
2.1 - Porque a exceção perentória invocada poderá importar a absolvição total do pedido, cfr. artigo 576.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (CPC), deverá a mesma ser oficiosa e prioritariamente conhecida (artigo 579.º do CPC).
Refira-se, desde já, que a caducidade do direito de ação por intempestividade do pedido de constituição de tribunal arbitral, configura uma exceção perentória e não dilatória, que importa a absolvição total ou parcial do pedido, cfr. acórdãos do STA de 17-06-2015 (Proc. 0194/15) e 22-05-2013 (Proc. 0340/13).
Assim:
Para a AT, a Requerente deveria ter apresentado o pedido de pronúncia arbitral no prazo de 90 dias contados da data limite de pagamento voluntário da liquidação, face ao disposto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT, conjugado com o artigo 102.º, n.º 1, alínea a) do CPPT.
Pelo que, tendo o último dia do prazo para pagamento voluntário ocorrido em 30 de novembro de 2015, cfr. artigo 120.º, n.º 1, alínea c) do CIMI, aplicável ex vi do artigo 67.º, n.º 2 do CISelo, bem como doc. 4 junto pela Requerente, o pedido de pronúncia arbitral seria manifestamente intempestivo por o mesmo haver sido apresentado em 31 de dezembro de 2018, ou seja, em data posterior a 29 de fevereiro de 2016, por força do disposto no artigo 279.º, alínea e) do Código Civil, uma vez que o dia 28 do mesmo mês (último dia do prazo foi domingo).
Ocorrendo, deste modo, «(…) a excepção dilatória a que se refere a al h), do n.º 1, do artigo 89 do CPTA, e al e), do n.º 1 do 287.º do CPC, aplicável ex vi do art.º 2.º do RJAT, o que determina a absolvição da Requerida da instância».
Em 12-06-2019 a Requerente foi notificada para em dez dias, responder, querendo, à referida exceção, o que não logrou fazer nem apresentou alegações para as quais também foi notificada.
*
Porém o pedido de constituição do tribunal arbitral foi apresentado em 31 de dezembro de 2018, na sequência da notificação do despacho de indeferimento de pedido de revisão oficiosa do ato de liquidação ora impugnado, apresentado pela Requerente em 21 de dezembro de 2016, ao abrigo do disposto no artigo 78.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT), e tramitado na Direção de Finanças de Lisboa com o n.º ...2016... .
O referido despacho de indeferimento foi proferido pelo Diretor de Finanças Adjunto de Lisboa, em 24 de setembro de 2018, ao abrigo de competência subdelegada, e notificado à Requerente em 01 de outubro de 2018, nos termos e pela forma constante do n.º 10 do artigo 39.º do CPPT, ou seja, no 5.º dia posterior ao registo de disponibilização da notificação na caixa postal eletrónica da Requerente, cfr. alínea n) do probatório, tendo o seguinte teor: “Visto. Atendendo aos pareceres e propostas que antecedem, ao teor, conteúdo e fundamentos da informação prestada infra considero que o pedido não merece provimento, convolando-se em definitivo o projeto de indeferimento do pedido, uma vez que, segundo o informado, não se verificam os pressupostos legais previstos para a Revisão solicitada. Diligências necessárias”.
Na informação de 21-08-2018, na qual o despacho de indeferimento se baseou, nos termos do artigo 77.º, n.º 1 da LGT, é colocada em causa a idoneidade do meio e tempestividade do pedido de revisão oficiosa, sendo referido no ponto 6.3: “Neste sentido, verifica-se que o pedido efetuado por requerimento, que se considera apresentado em 2016-12-20 (fls. 18), nos termos do n.º 2 do artigo 26.º do CPPT, se afigura manifestamente INTEMPESTIVO, na medida em que a data limite de pagamento data a 2015”.
Diga-se de passagem que, caso a decisão se tivesse limitado à apreciação da tempestividade do pedido de revisão do ato tributário, e não também à legalidade do mesmo, como efetivamente ocorreu e consta da referida informação, o meio de reação seria a ação administrativa prevista no artigo 37.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e não a impugnação ou o pedido de pronúncia arbitral.
Com efeito, para Jorge Lopes de Sousa , a competência dos tribunais arbitrais “restringe-se à atividade conexionada com atos de liquidação de tributos, ficando fora da sua competência a apreciação da legalidade de atos administrativos de indeferimento total ou parcial ou de revogação de isenções ou outros benefícios fiscais, quando dependentes de reconhecimento da Administração Tributária, bem como de outros atos administrativos relativos a questões tributárias que não comportem apreciação do ato de liquidação, a que se refere a alínea p) do n.º 1 do art. 97.º do CPPT”.
A apreciação da competência do tribunal arbitral envolve um juízo sobre a adequação ao caso sub judice do meio processual da ação administrativa ou do processo de impugnação judicial, em atenção ao disposto naquele artigo, que procede à definição dos respetivos campos de aplicação, distinguindo a “impugnação dos atos administrativos em matéria tributária que comportem a apreciação da legalidade do ato de liquidação” (alínea d) do n.º 1) e o “recurso contencioso do indeferimento total ou parcial ou da revogação de isenções ou outros benefícios fiscais, quando dependentes de reconhecimento da administração tributária, bem como de outros atos administrativos relativos a questões tributárias que não comportem apreciação da legalidade do ato de liquidação” (alínea p) do n.º 1), sendo que, nos termos do n.º 2 do artigo 97.º, o “recurso contencioso dos atos administrativos em matéria tributária, que não comportem a apreciação da legalidade do ato de liquidação, da autoria da administração tributária, compreendendo o governo central, os governos regionais e os seus membros, mesmo quando praticados por delegação, é regulado pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos”.
Para concretizar tal distinção entre o âmbito de aplicação destes meios processuais, que, por força da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT, possui relevo na definição da competência dos tribunais arbitrais tributários, constitui orientação jurisprudencial consolidada que “a utilização do processo de impugnação judicial ou do recurso contencioso (atualmente ação administrativa especial, por força do disposto no artigo 191.º do CPTA) depende do conteúdo do ato impugnado: se este comporta a apreciação da legalidade de um ato de liquidação será aplicável o processo de impugnação judicial e se não comporta uma apreciação desse tipo é aplicável o recurso contencioso/ação administrativa especial” (cfr. acórdão do STA de 25.06.2009, proc. n.º 0194/09).
Tal o entendimento, consolidado, da jurisprudência dos Tribunais Arbitrais, que funcionam no âmbito do CAAD (cfr. acórdãos n.ºs 148/2014-T, de 19-09-2014; 236/2013-T, de 22-04-2014; e 244/2013-T, de 06-05-2014, entre outros).
Também a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo se vem pronunciando no mesmo sentido, cfr. acórdãos de 14-05-2015 (P. 01958/13), 18-06-2014 (P. 01752/13) e 28-05-2014 (Proc. P. 01263/13), entre muitos outros.
Deste modo mostra-se absolutamente necessário aferir da idoneidade e tempestividade do pedido de revisão oficiosa bem como do pedido de constituição do tribunal arbitral:
Quanto à tempestividade do pedido de revisão do ato tributário impugnado -
Com efeito refere o n.º 1 do artigo 78.º da LGT: “A revisão dos actos tributários pela entidade que os praticou pode ser efectuada por iniciativa do sujeito passivo, no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade, ou, por iniciativa da administração tributária, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços”.
A liquidação em causa com o n.º 2014..., no montante de 13 380,50 €, respeita ao ano de 2014 e foi efetuada com referência à Verba 28.1 da TGIS, em 20 de março de 2015.
Assim, a sua revisão deveria ocorrer, se efetuada por iniciativa da Requerente, no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade, ou no prazo de quatro anos após a liquidação, se efetuada por iniciativa da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Porém, vem sendo entendimento da jurisprudência que a revisão do ato tributário por iniciativa da administração tributária pode ser efetuada a pedido do contribuinte, como resulta do artigo 78.º, n.º 1, da LGT e do artigo 86.º, n.º 4, alínea a), do CPPT, no prazo de quatro anos contados da liquidação (ou a todo o tempo, no caso de o tributo não ter sido pago), ficando com isso investido de um direito a uma decisão sobre o pedido formulado. E o “erro imputável aos serviços” a que alude o artigo 78.º, nº 1, in fine, da LGT compreende não só o lapso, o erro material ou o erro de facto, como, também, o erro de direito, e essa imputabilidade aos serviços é independente da demonstração da culpa dos funcionários envolvidos na emissão da liquidação afetada pelo erro. - - -
No mesmo sentido Jorge Lopes de Sousa e outros quando referem: “(…) De qualquer forma, o dever de a Administração concretizar a revisão de actos tributários, a favor do contribuinte, quando detectar uma situação desse tipo por sua iniciativa ou do contribuinte, existe em relação a todos os tributos, pois os princípios da justiça, da igualdade e da legalidade, que a administração tributária tem de observar na globalidade da sua actividade (art. 266.º, n.º 2, da CRP e 55.º da LGT), impõem que sejam oficiosamente corrigidos todos os erros das liquidações que tenham conduzido à arrecadação de tributo em montante superior ao que seria devido à face da lei (…). Assim, é de concluir que, o facto de ter transcorrido o prazo de reclamação graciosa e de impugnação judicial do acto de liquidação, não impede o contribuinte de pedir a revisão oficiosa e impugnar contenciosamente o acto de indeferimento desta”.
Deste modo, considerando que a liquidação impugnada foi efetuada em 20 de março de 2015 e que o pedido de revisão foi apresentado na entidade competente em 21 de dezembro de 2016, ter-se-á de concluir pela sua tempestividade, uma vez que não foi excedido o prazo de quatro anos referido no n.º 1 do artigo 78.º da LGT, cfr. o disposto na alínea c) do artigo 279.º do Código Civil.
Quanto à tempestividade do pedido de constituição do tribunal arbitral -
Nos termos do artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT, o pedido de constituição de tribunal arbitral é apresentado no prazo de 90 dias, contado a partir dos factos previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), quanto aos atos suscetíveis de impugnação autónoma e, bem assim, da notificação da decisão ou do termo do prazo legal de decisão do recurso hierárquico.
Embora a revisão do ato tributário a pedido do contribuinte se reconduza a um meio administrativo, e não contencioso, de impugnação, ele abrirá o acesso à via contenciosa, pois a decisão que recair sobre o pedido de revisão é suscetível de impugnação direta nos termos do artigo 97.º, n.º 1, alínea d) e artigo 102.º, n.º 1, alínea e), ambos do CPPT, correspondendo por conseguinte à notificação do despacho de indeferimento proferido no pedido de revisão do ato tributário.
Deste modo, considerando que a Requerente foi notificada do respetivo despacho de indeferimento, proferido no procedimento de revisão do ato tributário, em 01 de outubro de 2018, que constituirá o termo inicial ou dies a quo para a apresentação do pedido de constituição do tribunal arbitral, cfr. alínea n) do probatório; e
Que o pedido de constituição do tribunal arbitral foi apresentado em 31 de dezembro de 2018, o mesmo é tempestivo, uma vez que foi observado o prazo de 90 dias previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, conjugado com o disposto na alínea e) do artigo 279.º do Código Civil, contado nos termos do artigo 102.º, n.º 1, alínea e) do CPPT,
julga-se improcedente a invocada exceção deduzida pela Requerida, de caducidade do direito de ação, por intempestividade na dedução do pedido de constituição do tribunal arbitral.
2.2 As Partes têm personalidade e capacidades judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
2.3 - O processo não enferma de nulidades.
2.4 - Não se verificam quaisquer outras circunstâncias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
2.5 - Não se verificam quaisquer outras circunstâncias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
3. Matéria de Facto
3.1 Factos provados
Com relevo para a apreciação e decisão das questões suscitadas, dão-se como assentes e provados os seguintes factos:
a) Em 19 de fevereiro de 2005, na matriz predial urbana da freguesia de ..., concelho de Lisboa, encontrava-se inscrito, sob o artigo ..., um prédio em propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, sito na Rua de ..., n.ºs .../.., com a superfície coberta de 580,00 m2; descoberta de 47,00 m2; e jardim com 1 200,00 m2, com a seguinte descrição: “Prédio com 4 pavimentos, sendo 1 c/v. e outro águas-furtadas. Destina-se a habitação (palacete). Tendo dependências e jardim que o serve. Composto de c/v, com 17 divisões; r/c, com 14 divisões; 1.º andar com 16 divisões; águas-furtadas com 5 divisões” (cfr. página 12 do Processo Administrativo (PA) junto aos autos pela Requerida e que aqui se dá por integralmente reproduzido).
b) Em 08 de maio de 2008, o referido prédio, descrito na ... Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número..., e com o valor patrimonial de 186 639,99 €, foi adquirido por “D..., S.A.”, contribuinte n.º..., cfr. escritura pública de compra e venda celebrada naquela data no Cartório Notarial de E..., sito na Rua ..., n.º...-..., em Lisboa (cfr. pp. 15 a 21 do PA junto aos autos pela Requerida e que aqui se dá por integralmente reproduzido).
c) Em 11 de junho de 2008 a proprietária do imóvel apresentou no ... Bairro Fiscal de Lisboa, uma declaração modelo 1 do CIMI, à qual foi atribuído o n.º..., por motivo de ter ocorrido a 1.ª transmissão na vigência do IMI, nos termos do artigo 15.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro, tendo declarado tratar-se de um prédio em propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, destinado a habitação, com quatro pisos e 52 divisões e anexado as plantas do imóvel (cfr. pp. 11, 13 e 22/28 do PA junto aos autos pela Requerida e que aqui se dá por integralmente reproduzido).
d) A avaliação do imóvel, a que correspondeu a ficha n.º..., foi efetuada em 28-07-2008, como prédio urbano destinado a habitação, em propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, sendo o VPT determinado em 1 364 680,00 € (cfr. página 10 do PA junto aos autos pela Requerida e que aqui se dá por integralmente reproduzido).
e) Por motivos relacionados com a divisão administrativa da cidade de Lisboa, o prédio, com inscrição matricial no ano de 1977, ficou a pertencer à freguesia da ... (...) e inscrito na respetiva matriz sob o artigo ... (cfr. pp. 108/109 do PA junto aos autos pela Requerida e que aqui se dá por integralmente reproduzido).
f) Em 28 de dezembro de 2013 a Requerente apresentou uma declaração modelo 1, à qual foi atribuído o n.º..., nos termos do artigo 130.º, n.º 3, al. a) do CIMI (VPT desatualizado), tendo declarado tratar-se de um prédio em propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, com 76 anos, destinado a habitação, com quatro pisos e 52 divisões (cfr. pp. 2/3 do PA junto aos autos pela Requerida e que aqui se dá por integralmente reproduzido).
g) A avaliação, a que correspondeu a ficha n.º..., foi efetuada em 27-01-2014, como prédio urbano destinado a habitação, em propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, sendo o VPT determinado em 1 338 050,00 € (cfr. pp. 7/8 do PA junto aos autos pela Requerida e que aqui se dá por integralmente reproduzido).
h) Em 31 de dezembro de 2014, o prédio urbano inscrito na matriz urbana da freguesia da ..., concelho de Lisboa, sob o artigo ..., era um prédio em propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, destinado a habitação, com o VPT de 1 338 050,00 € (cfr. pág. 61 do PA junto aos autos pela Requerida bem como documentos n.ºs 2 a 4 juntos com o pedido de pronúncia arbitral e que aqui se dão por integralmente reproduzidos).
i) Em 20 de março de 2015, a Requerida procedeu à liquidação do imposto do selo, a que respeita a verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, com o n.º 2014..., com referência ao ano de 2014, no montante 13 380,50 € (treze mil, trezentos e oitenta euros e cinquenta cêntimos), a que respeitam as notas de cobrança n.ºs 2015..., 2015... e 2015..., a primeira no montante de 4 460,18 € e cada uma das restantes no de 4 460,18 €, com data limite de pagamento nos meses de abril, julho e novembro do ano de 2015, respetivamente (cfr. documentos n.ºs 2 a 4 juntos com o pedido de pronúncia arbitral e que aqui se dão por integralmente reproduzidos).
j) Em 17 de março de 2016, a Requerente apresentou uma declaração modelo 1 do IMI, à qual foi atribuído o n.º..., nos termos do artigo 13.º, n.º 1, al. d) do CIMI, tendo declarado que as áreas do prédio foram calculadas através das plantas que apresentou, que o prédio, que se destinava a habitação, tinha quatro pisos e 45 divisões, e que ia entrar em obras, pelo que necessitava de nova avaliação quando as mesmas se concluíssem (cfr. pp. 22 a 28, 60 e 108/109 do PA junto aos autos pela Requerida e que aqui se dão por integralmente reproduzidos).
k) A avaliação, a que correspondeu a ficha n.º..., foi efetuada em 19-06-2016, como prédio urbano em propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, destinado a habitação, sendo determinado o VPT de 1 552 520,00 € (cfr. pp. 22 a 28, 60 e 108/109 do PA junto aos autos pela Requerida e que aqui se dão por integralmente reproduzidos).
l) Em 21 de dezembro de 2016 a Requerente apresentou pedido de revisão oficiosa da liquidação efetuada, nos termos do artigo 78.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária, o qual foi tramitado na Direção de Finanças de Lisboa com o n.º ...2016... (cfr. documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral e pp. 29/54 do PA junto aos autos pela Requerida, que aqui se dão por integralmente reproduzidos).
m) Por despacho do Diretor de Finanças Adjunto de Lisboa, de 24 de setembro de 2018, proferido ao abrigo de competência subdelegada, o referido pedido de revisão oficiosa foi indeferido, nos seguintes termos: “Visto. Atendendo aos pareceres e propostas que antecedem, ao teor, conteúdo e fundamentos da informação prestada infra considero que o pedido não merece provimento, convolando-se em definitivo o projeto de indeferimento do pedido, uma vez que, segundo o informado, não se verificam os pressupostos legais previstos para a Revisão solicitada. Diligências necessárias (cfr. documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral e pp. 100/103 do PA junto aos autos pela Requerida, que aqui se dão por integralmente reproduzidos).
n) Em 01 de outubro de 2018 a Requerente foi notificada do referido despacho de indeferimento, nos termos e pela forma constante do n.º 10 do artigo 39.º do CPPT (cfr. documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral e pág. 99 e 105 do PA junto aos autos pela Requerida, que aqui se dão por integralmente reproduzidos).
o) Em 31 de dezembro de 2018 a Requerente apresentou pedido de constituição de Tribunal Arbitral, ao abrigo da alínea a) do número 1 do artigo 2.º e do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.
3.2 Factos não provados
Não há factos relevantes para a decisão da causa que devam considerar-se não provados.
3.3 Motivação
Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem o dever de se pronunciar sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor [(cfr. artigos 596º, nº 1 e 607º, nºs 2 a 4 do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 29º, nº 1, alíneas a) e e) do RJAT)] e consignar se a considera provada ou não provada (cfr. artigo 123º, nº 2 do CPPT).
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento das pessoas (cfr. artigo 607.º, n.º 5 do CPC). Somente quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (e.g. força probatória plena dos documentos autênticos, cfr. artigo 371.º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
Assim, a convicção do Tribunal fundou-se no acervo documental junto aos autos bem como nas posições assumidas pelas Partes. Quanto ao facto constante da alínea h) do probatório, na qual se considera provado que, em 31 de dezembro de 2014, o prédio urbano inscrito na matriz urbana da freguesia da ..., concelho de Lisboa, sob o artigo ..., era um prédio destinado a habitação, em propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, e não um terreno para construção, tal resulta, também, do facto de o prédio assim se encontrar descrito na matriz desde a sua inscrição no ano de 1977 e assim continuar até 16-04-2019, pelo menos, data da certidão de teor do prédio (pp.108/109 do PA), tendo sido a própria Requerente a mencionar tal descrição nas diversas declarações modelo 1 do IMI pela mesma apresentadas em 11-06-2008, 28-12-2013 e 17-03-2016, tendo em vista a determinação do VPT e assim considerado pelo perito avaliador que, inclusivamente, se socorreu das plantas apresentadas pela Requerente, claramente esclarecedoras do tipo de prédio em causa, cfr. pp. 22/28 do PA. Por outro lado o VPT de 1 338 050,00 €, determinado pela avaliação efetuada em 27-01-2014, na sequência da declaração modelo 1 de IMI apresentada em 28-12-2013, é o mesmo que consta da matriz em 31-12-2014, como consta dos documentos n.ºs 2 a 4 juntos pela Requerente, o que só por si indicia a inexistência de qualquer outra alteração à descrição do prédio e consequente avaliação entretanto ocorrida, tanto mais que dos autos não consta ter sido apresentada qualquer reclamação da matriz por indevida inclusão do prédio, nos termos do artigo 130.º, n.º 2, alínea b) do CIMI.
4 - Matéria de Direito (fundamentação)
Objeto do litígio
A questão que constitui o thema decidenduum reconduz-se a saber se o prédio inscrito na matriz urbana da freguesia da..., concelho de Lisboa, sob o artigo..., reúne os pressupostos objetivos para sujeição a imposto do selo de acordo com o disposto na Verba 28.1 da TGIS, na redação introduzida pelo artigo 194.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro.
Questões a decidir:
- Da (i)legalidade da liquidação impugnada; e
-Do pedido de pagamento de juros indemnizatórios.
Da (i)legalidade da liquidação impugnada -
Nos termos do artigo 1.º, n.º 1 do Código do Imposto do Selo (CIS) o imposto do selo incide sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos ou situações jurídicas previstos na Tabela Geral (TGIS), incluindo as transmissões gratuitas.
Segundo a verba 28 desta tabela, a propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a 1 000 000,00 €, encontra-se sujeita a imposto do selo, incidindo sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI.
Por sua vez a verba 28.1 da mesma tabela, na redação introduzida pelo artigo 194.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, refere: “Por prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI” será aplicada a taxa de 1%”.
Segundo o n.º 6 do artigo 1.º do CIS, o conceito de prédio, para efeitos deste código, é o definido no CIMI, ou seja, o previsto no artigo 6.º deste código, que prevê as seguintes espécies de prédios urbanos:
“1 - Os prédios urbanos dividem-se em:
a) Habitacionais;
b) Comerciais, industriais ou para serviços;
c) Terrenos para construção;
d) Outros.
2 - Habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins.
3 - Consideram-se terrenos para construção os terrenos situados dentro ou fora de um aglomerado urbano, para os quais tenha sido concedida licença ou autorização, admitida comunicação prévia ou emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção, e ainda aqueles que assim tenham sido declarados no título aquisitivo, exceptuando-se os terrenos em que as entidades competentes vedem qualquer daquelas operações, designadamente os localizados em zonas verdes, áreas protegidas ou que, de acordo com os planos municipais de ordenamento do território, estejam afectos a espaços, infra-estruturas ou equipamentos públicos”.
Nos termos do artigo 2.º, n.º 4 do CIS, são sujeitos passivos do imposto os referidos no artigo 8.º do CIMI, ou seja, o proprietário do prédio em 31 de dezembro do ano a que o imposto respeitar.
Refere o artigo 23.º, n.º 7 do CIS (redação em vigor à data do facto tributário), que nas situações previstas na verba 28 da TGIS, o imposto é liquidado anualmente, em relação a cada prédio urbano, pelos serviços centrais da Autoridade Tributária e Aduaneira, aplicando-se, com as necessárias adaptações, as regras contidas no CIMI.
Assim, por força do n.º 1 do artigo 113.º deste código, o imposto é liquidado com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios e em relação aos sujeitos passivos que constem das matrizes em 31 de dezembro do ano a que o mesmo respeitar, sendo a liquidação efetuada nos meses de fevereiro e março do ano seguintes, cfr. n.º 2 do mesmo artigo.
Nos termos do artigo 46.º, n.º 5, do CIS, o documento de cobrança é emitido nos prazos, termos e condições definidos no artigo 119.º do CIMI, com as devidas adaptações.
Refere finalmente o artigo 67.º, n.º 2, que às matérias não reguladas no CIS respeitantes à verba 28 da TGIS se aplica, subsidiariamente, o disposto no CIMI.
Apreciando:
Para a Autoridade Tributária e Aduaneira a liquidação ora impugnada foi efetuada de acordo com a Lei, nomeadamente a verba 28.1 da TGIS, na redação introduzida pelo artigo 194.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, já que o prédio em causa encontra-se matricialmente inscrito como prédio em propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, destinado a habitação.
Porém a Requerente entende que a liquidação impugnada enferma de ilegalidade por vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito, uma vez que o referido prédio é um terreno para construção para o qual inexiste qualquer edificação autorizada ou prevista para habitação.
Assim o busílis da questão consiste em saber se o prédio urbano sito na Rua de..., n.º..., em Lisboa, inscrito na matriz da freguesia da ... sob o artigo ..., concelho de Lisboa, à data do facto tributário, ou seja, 31 de dezembro de 2014, era um prédio habitacional, como refere a Requerida, ou um terreno para construção, como alude a Requerente e, neste caso, se a edificação, autorizada ou prevista, era para habitação.
Compulsada a certidão de teor do referido prédio, emitida em 16-04-2019, resulta à evidência que o mesmo, inicialmente inscrito na matriz da freguesia das ..., concelho de Lisboa, sob o artigo ..., não é um terreno para construção, mas um prédio em propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, com quatro pisos e 45 divisões, destinado a habitação, cfr. pp. 108/109 do PA (alínea j) do probatório).
Com efeito em todas as declarações modelo 1 de IMI apresentadas pela Requerente no período compreendido entre 11 de junho de 2008 e 17 de março de 2016, em número de três, a primeira por motivo de, em 08-05-2008, ter ocorrido a 1.ª transmissão na vigência do CIMI (artigo 15.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro); a segunda, apresentada em 28-12-2013, por considerar o VPT desajustado (artigo 130.º, n.º 3, al. a) do CIMI); e a terceira por motivos de obras de melhoramento (artigo 13.º, n.º 1, al. d) do CIMI), sempre a mesma declarou tratar-se de um prédio, destinado a habitação, em propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente. Declarou ainda que as áreas foram calculadas através das plantas que apresentou, cfr. pp. 22 a 28 do PA, perfeitamente esclarecedoras do número de pisos do prédio (cave, r/chão, 1.º andar e sótão) com diversas divisões (cinquenta e duas, nas declarações apresentadas em 11-06-2008 e 28-12-2013 e quarenta e cinco, na de 28-12-2013), que o prédio se destinava a habitação e ia entrar em obras, pelo que necessitava de nova avaliação quando as mesmas se concluíssem (referência feita na declaração de 17-03-2016).
É de referir, ainda, que os peritos, nomeados nos termos do artigo 63.º/1 do CIMI, que procederam à avaliação fiscal, confirmaram os elementos declarados pela Requerente.
Deste modo, sendo o prédio habitacional e em propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, em 27-01-2014 e 19-06-2016, datas das avaliações efetuadas por força da apresentação das declarações modelo 1 de IMI, de 28-12-2013 e 17-03-2016, respetivamente, não se vislumbram motivos para, em 31-12-2014, o prédio ser um terreno para construção.
Assim, inexistem quaisquer dúvidas para este Tribunal Arbitral que o prédio inscrito na matriz urbana da freguesia da ..., concelho de Lisboa, sob o artigo ..., à data do facto tributário (31 de dezembro de 2014) era um prédio destinado a habitação, em propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, com quatro pisos e 52 divisões, tanto mais que dos autos não consta ter sido apresentada qualquer reclamação da matriz por indevida inclusão do prédio, nos termos do artigo 130.º, n.º 2, alínea b) do CIMI.
A título subsidiário, entende a Requerente que a tributação especial prevista na verba 28.1 da TGIS, quando interpretada por forma a ser aplicada a “terrenos para construção” é contrária ao princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e, em paralelo, contrária aos princípios da igualdade fiscal e da capacidade contributiva consagrados no artigo 104.º, n.º 3, do mesmo diploma, pelo que requer a desaplicação da referida norma da TGIS.
Considerando que o prédio em causa não é um terreno para construção, mas um prédio em propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, não tem o Tribunal Arbitral de se pronunciar sobre tal inconstitucionalidade. Em todo o caso sempre se dirá que, concordamos em absoluto com o Tribunal Constitucional (Plenário), conforme acórdão n.º 378/2018, de 04-07-2018, para o qual remetemos, que decidiu “não julgar inconstitucional a norma constante da Verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do selo, aprovada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro, e alterada pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, na parte em que impõe a tributação anual sobre a propriedade de terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a €1.000.000,00”.
No mesmo sentido foi entendido nos acórdãos n.ºs 605/2018 e 568/2016, do mesmo Tribunal, respetivamente de 14-11-2018 e 19-10-2016.
Também quanto à inaplicabilidade da verba 28.1 da TGIS na tributação de prédios urbanos com afetação habitacional que façam parte do substrato económico da atividade da Requerente, o Tribunal Constitucional vem julgando pela constitucionalidade daquela norma de incidência, conforme, entre outros, os acórdãos n.ºs 247/2016, 83/2016, 590/2015 e 568/2016 supra referido, respetivamente de 04-05-2016, 04-02-2016, 11-1-2015 e 19-10-2016, com os quais concordamos e para os argumentos dos quais remetemos.
Deste modo a liquidação impugnada não merece qualquer censura, devendo manter-se na ordem jurídica, assim como o despacho de indeferimento, de 24-09-2018, proferido no pedido de revisão do ato tributário a que se refere o procedimento n.º ...2016..., uma vez que foram observados os pressupostos ínsitos nas verbas 28 e 28.1 da TGIS, nomeadamente a espécie de prédio (prédio habitacional); o sujeito passivo (a Requerente, enquanto proprietária do prédio à data do facto tributário, ou seja, em 31-12-2014; o VPT na mesma data (1 338 050,00 €) e à taxa aplicada (1%).
Do pedido de condenação no pagamento de juros indemnizatórios
A Requerente pede ainda que lhe sejam pagos juros indemnizatórios, por erro dos serviços, nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT.
Porém, face à solução jurídica do caso, fica prejudicado o pedido de reembolso das importâncias pagas a título de imposto do selo e a condenação no pagamento de juros indemnizatórios (artigo 608.º, n.º 2, do CPC).
**
5 - Decisão
Em face do exposto, decide-se:
a) Julgar improcedente a exceção perentória de caducidade do direito de ação invocada pela Requerida;
b) Julgar improcedente o pedido de revogação do despacho do Diretor de Finanças Adjunto de Lisboa, por subdelegação, de 24-09-2018, proferido no processo n.º ...2016... respeitante ao procedimento de revisão oficiosa previsto no artigo 78.º da Lei Geral Tributária, mantendo-o na ordem jurídica;
c) Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral relativamente à liquidação do imposto do selo (verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo – TGIS) com o n.º 2014..., emitida pela Autoridade Tributária e Aduaneira em 20-03-2015, com referência ao ano de 2014, no montante 13 380,50 € (treze mil, trezentos e oitenta euros e cinquenta cêntimos), com a consequente absolvição da Autoridade Tributária e Aduaneira do pedido; e
d) Condenar a Requerente no pagamento das custas arbitrais do processo.
Valor do Processo
De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT), fixa-se ao processo o valor de 13 380,50 €.
Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4 do RJAT, fixa-se o montante das custas em 918,00 €, nos termos da Tabela I, anexa ao RCPAT, a cargo da Requerente.
Notifique.
Lisboa, 29 de julho de 2019.
O Árbitro,
(Rui Ferreira Rodrigues)
Texto elaborado em computador, nos termos do disposto no artigo 131.º, n.º 5, do CPC, aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT.