DECISÃO ARBITRAL
O árbitro Dr. José Joaquim Monteiro Sampaio e Nora designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa como árbitro singular em 6 de Março de 2019, profere a seguinte decisão arbitral:
I. RELATÓRIO:
A..., S.A. (doravante abreviadamente designada por “Requerente”), titular do número de identificação fiscal ..., com sede na ..., n.º..., ..., ..., ...-... Carnaxide veio, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e nos n.os 1 e 2 do artigo 10.º, todos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (“Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária” ou “RJAT”) e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 Março, requerer a CONSTITUIÇÃO DE TRIBUNAL ARBITRAL para efeitos de obter a declaração de ilegalidade do acto tributário de liquidação do Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (“AIMI”), n.º 2018..., com referência ao ano de 2018, no montante total de € 10.726,19, com fundamento em erro nos pressupostos de facto e de direito, devendo a mesma ser anulada, com todos os efeitos legais, por entender que ao criar o AIMI, o legislador pretendeu tributar apenas os imóveis – imóveis já edificados e terrenos – com fins habitacionais, pelo que é ilegal a tributação em AIMI objecto da liquidação que lhe foi feita pela propriedade de “terrenos para construção” destinados, nos termos das respectivas cadernetas prediais, a fins de “comércio, indústria, serviços” ou “outros”, que, no seu entender não se encontram sujeitos a AIMI, como tem vindo a ser entendido pela AT.
Além disso, não pode o AIMI incidir sobre o património imobiliário das sociedades de mediação imobiliária, pois que constitui o substrato da sua actividade e não pode ser considerado como indiciador da sua capacidade contributiva para efeitos de tributação em AIMI, pois não indicia fortuna ou riqueza.
Na sequência destes fundamentos entende que devem ser desaplicados às sociedades imobiliárias os artigos 135º.-A e 135º.-B do CIMI, por inconstitucionais, por violação dos princípios da igualdade e da igualdade na tributação fiscal, previstos nos artigos 13º. e 104º., nº. 3 da CRP.
Por isso, pede a procedência do presente pedido formulado de anulação da liquidação, com a consequente condenação da AT a devolver ao Requerente o imposto indevidamente liquidado e por ele pago, com a condenação da AT ao pagamento de juros indemnizatórios, à taxa legal, contados até integral reembolso ao Requerente do montante indevidamente pago.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 26-12-2018.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro singular o signatário, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 26-12-2018 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral singular foi constituído em 6-3-2019.
Notificada para responder em 7/3/2019, a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada de AT) apresentou resposta em 18-3-2019, na qual com abundante citação doutrinal e jurisprudencial refuta os argumentos da requerente, entendendo que não há razões para tratamento diferenciado das empresas imobiliárias e, por outro lado, todos os terrenos para construção devem ser objecto de tributação em AIMI, independentemente da finalidade dos prédios que o proprietário se propõe construir nesses terrenos.
Consequentemente, não existe qualquer violação de preceitos constitucionais pela AT na interpretação que faz das normas dos artigos 135º.-A e 135º.-B do CIMI, requerendo que, caso seja entendida existência de inconstitucionalidade, seja a decisão proferida notificada ao Ministério Público, para os efeitos do artº. 280º., nº. 3 da CRP e do artº. 72º., nº. 3 da Lei do Tribunal Constitucional.
Por despacho arbitral de 13-4-2019, foi dispensada a reunião prevista no artigo 18º, do RJAT e facultou-se às partes a possibilidade de, querendo, apresentarem, alegações escritas, podendo o Requerente fazê-lo no prazo de 10 dias, contados da notificação do desse despacho, e a AT no mesmo prazo, contado da notificação das alegações do Requerente, ou da falta de apresentação das mesmas.
Nenhuma das partes usou desta faculdade.
Mais se decidiu que a decisão final seria proferida no prazo de 30 dias após a apresentação de alegações pela Requerida, ou do termo do respectivo prazo, tendo sido notificada a Requerente para dar oportuno cumprimento ao disposto no artigo 4º-3, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, ou seja, pagamento, antes da decisão e pela forma regulamentar, do remanescente da taxa arbitral, o que já fez.
Estando em preparação a sentença final, constatou-se que a requerente não juntou aos autos qualquer documento comprovativo da sua existência registral, ao menos com a indicação do código de Certidão Permanente, incluindo os seus fins enquanto sociedade, o que só por documento podem ser provados (artº. 364º. do Cod. Civil e artº. 75º. do Cod. Registo Comercial), pelo que, por despacho de 11/6/2019, foi notificada a requerente para juntar documento comprovativo da sua existência registral e eventual decisão municipal de aprovação de projecto de construção para o terreno para construção, objecto dos presentes autos e a requerida para juntar aos autos, a declaração Modelo 1 de 26/3/2008, que determinou a inscrição do terreno para construção na matriz predial urbana, bem como o auto de avaliação do terreno referido de 3/5/2008, conforme o referido na caderneta predial junta pela requerente. Em consequência e ao abrigo do disposto no artº. 21º. do RJAT foi prorrogado o prazo para proferir a decisão final por mais 30 dias.
Por requerimento de 17/6/2019 foram juntos pela requerente Certidão Permanente com o código de acesso nº..., a declaração para efeitos de inscrição do terreno para construção objecto do presente processo na matriz predial urbana e os actos avaliativos de fixação de valor patrimonial tributário emitidos pela Autoridade Tributária e Aduaneira no ano 2008 relativamente ao terreno referido.
Notificada a AT desta junção, nada disse.
II. DESPACHO SANEADOR:
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos. 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, é o competente, em razão da matéria, as partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas, não havendo outras excepções ou nulidades de conhecimento oficioso que cumpra conhecer.
III. FACTOS PROVADOS:
Atentos os documentos juntos pela requerente e o acordo das partes, expresso ou por falta de impugnação, consideram-se provados os seguintes factos:
a) A requerente é uma sociedade anónima, com sede na ..., nº..., ..., ..., em Carnaxide e tem o NIPC... .
b) A requerente tem por objecto, a realização de empreendimentos imobiliários, designadamente a compra, a venda, construção civil, reconstrução, urbanização, promoção e arrendamento de imóveis próprios e alheios, incluindo a revenda dos adquiridos para esse fim.
c)Existe inscrito na matriz predial urbana da União de Freguesias de ..., ... e ..., concelho do Porto, um prédio urbano do tipo terreno para construção, que se encontra inscrito sob o artigo matricial n.º..., sendo a requerente titular como proprietária plena desse prédio.
d) O referido prédio constava anteriormente da matriz predial urbana da extinta freguesia de ... sob os artigos matriciais números ..., ... e..., já como terrenos para construção, tendo sido participados como tal em 26-3-2008, no Serviço de Finanças Porto –... .
e) Consta da referida inscrição matricial que o referido terreno para construção foi avaliado como se destinando a serviços, conforme respectiva caderneta predial.
e) Não existe qualquer decisão municipal de aprovação de projecto de construção, nem tendo ainda sido elaborado projecto de construção para o imóvel.
f) A Requerente foi notificada de acto tributário de liquidação de AIMI, referente ao ano 2018, emitida em 30 de Junho de 2018, no montante de € 10.726,19, que deveria ser liquidado no mês de Setembro de 2018.
g) A requerente procedeu ao pagamento do imposto liquidado no prazo que lhe foi assinado.
h) A petição do presente pedido arbitral deu entrada em 22-12-2018.
Com interesse para a decisão dos presentes autos, nenhum outro facto se provou.
IV. QUESTÕES A DECIDIR:
1. Considerando os factos provados e a matéria de direito constante do pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Requerente são duas as questões a decidir:
- por um lado, saber se a requerente por ser uma empresa imobiliária estará isenta de pagamento de AIMI relativamente aos prédios de que é proprietária por força do seu objecto social e com destino futuro a revenda ou transformação em prédios urbanos;
- por outro lado, saber se deverão ou não ser incluídos nos prédios urbanos a que se não aplica o AIMI, aqueles que consistam em terrenos para construção, que matricialmente são referenciados como se destinando a serviços e como tal se referindo o coeficiente de afectação com base no qual foi determinado o valor patrimonial tributário.
- por fim, saber se, em caso de eventual procedência da interpretação preconizada pela requerente, as normas dos artigos 135º.-A e 135º.-B do CIMI não estarão até feridas de inconstitucionalidade, pelo que, além de serem interpretadas nos termos que preconiza a recorrente, não deverão ser mesmo desaplicadas com fundamento nessa mesma inconstitucionalidade.
2. O AIMI – adicional ao imposto municipal de imóveis – foi criado pela Lei nº. 42/2016, de 28 de dezembro e inserido no Código de Imposto Municipal de Imóveis (CIMI), após o adicionamento do Capítulo XV, com a designação de adicional ao imposto municipal sobre imóveis, com a inserção dos artigos 135º.-A a 135º.-M e uma alteração do artº1º. do CIMI.
Conforme consta do nº. 2 do artº. 1º. do CIMI, o presente imposto de AIMI “constitui receita do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social”.
A sua incidência objectiva é definida pelo artº. 135º.-B, nº. 1 que dispõe que “o adicional ao imposto municipal sobre imóveis incide sobre a soma dos valores patrimoniais tributários dos prédios urbanos situados em território português de que o sujeito passivo seja titular”, sendo que o artº. 135º.-A, delimita a sua incidência subjectiva determinando que “são sujeitos passivos do adicional ao imposto municipal sobre imóveis as pessoas singulares ou coletivas que sejam proprietários, usufrutuários ou superficiários de prédios urbanos situados no território português” (nº.1) e esclarecendo o nº. 2 que “para efeitos do n.º 1, são equiparados a pessoas coletivas quaisquer estruturas ou centros de interesses coletivos sem personalidade jurídica que figurem nas matrizes como sujeitos passivos do imposto municipal sobre imóveis, bem como a herança indivisa representada pelo cabeça de casal.”
Verifica-se assim que o AIMI, tal como o IMI, é um imposto de incidência real, tendo por objecto a tributação do património imobiliário, independentemente de quem seja proprietário, usufrutuário ou titular de direitos reais sobre os bens imóveis.
Porém, para efeitos de AIMI, nem todo o património imobiliário pode ser tributado em AIMI, como refere o artº. 135º.-B, nº. 2, dado que “são excluídos do adicional ao imposto municipal sobre imóveis os prédios urbanos classificados como «comerciais, industriais ou para serviços» e «outros» nos termos das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 6.º deste Código”, assim se delimitando negativamente a sua base incidência objectiva, excluindo dessa incidência real ou objectiva, atenta a classificação dos prédios urbanos constante do artº. 6º. do CIMI, apenas os prédios urbanos referidos nas alíneas b) e d) do n.º 1 desse artigo, ou sejam, os prédios urbanos habitacionais e outros, considerando-se estes os “terrenos situados dentro de um aglomerado urbano que não sejam terrenos para construção”.
Mas se o IMI define isenções de natureza pessoal para as entidades de direito público (artº. 11º., nº. 1 do CIMI) e situações especiais de início de tributação de algumas actividades (artº. 9º., al. d) do CIMI), já o mesmo se não passa com o AIMI que apenas tem como apenas como entidades isentas, as citadas entidades de direito público, apenas contemplando de forma indirecta uma situação especial de início de tributação (artº. 135º.-B, nº. 3, al. a) do CIMI.
3. Feita esta apresentação do AIMI, somos chegados à primeira das questões que nos cabe analisar.
A requerente é, sem margem para dúvidas, uma empresa imobiliária, como se conclui dos factos provados 1 e 2, pois que tem por objecto “a realização de empreendimentos imobiliários, designadamente a compra, a venda, construção civil, reconstrução, urbanização, promoção e arrendamento de imóveis próprios e alheios, incluindo a revenda dos adquiridos para esse fim” (facto b) dos factos provados).
Por isso, entende a requerente que, por ser uma empresa imobiliária estará isenta de pagamento de AIMI relativamente aos prédios de que é proprietária por força do seu objecto social e com destino futuro a revenda ou transformação em prédios urbanos.
Na sua argumentação a requerente procura demonstrar que a propriedade dos imóveis é apenas a forma normal de exercer a sua actividade comercial, pelo que essa propriedade não é factor de riqueza, que é o que o AIMI, se propõe tributar, como se escreve na apresentação dos motivos da tributação do AIMI, mas é uma mercadoria da sua actividade económica.
Por isso, há que considerar aqui que é legalmente atribuído relevo à situação fiscal dessas empresas no âmbito interno do IMI. Com efeito, nos casos de aquisição de prédios para revenda e de terrenos para construção, prevê-se nas alíneas d) e e) do n.º 1 do artigo 9.º do CIMI a não sujeição ao IMI durante três e quatro anos, respetivamente, e, por força da alínea a) do n.º 3 do artigo 135.º-C do mesmo diploma, a não sujeição ao AIMI, em relação aos sujeitos passivos que estão coletados para o exercício dessa atividade. Durante o período de «não tributação» não há qualquer efeito tributário a considerar em sede de IMI, não sendo o imóvel uma realidade qualificada como prédio para efeitos fiscais, mesmo para AIMI.
Porém, resulta dos factos provados que a requerente é proprietária dos referidos prédios há mais de 4 anos, pelo que já se encontra tributável em sede de IMI, pelo que já nem da benesse do artº. 135º., nº3, al. c) usufrui.
4. Deste modo, sendo tributável em sede IMI, o será inelutavelmente em sede de AIMI, por falta de fundamento legal para a sua não tributação.
A argumentação expendida pela requerente sobre o facto de os imóveis de que é proprietária serem apenas mercadoria da sua actividade comercial não merece o nosso acolhimento, pois que a disponibilidade dos imóveis é factor de rendimento para a requerente enquanto for proprietária dos imóveis, ainda que os venha a vender.
Acresce que, se tiver na sua disponibilidade um conjunto alargado de imóveis, ainda que tendo em vista a sua transformação futura, por construção de edifícios em terrenos ou tendo em vista a sua revenda desses prédios edificados ou que já adquiriu edificados, confere-lhe a possibilidade de obter financiamentos, que, de outro modo, não conseguiria obter.
Em suma, a maior ou menor extensão do património imobiliário de uma empresa imobiliária é um factor de riqueza dessa empresa pelos rendimentos e vantagens que com esse património consegue obter.
5. Além disso, fazendo uma ponderação entre o critério de afetação do imóvel que a requerente invoca como razão para a exclusão da incidência do AIMI relativamente aos prédios urbanos destinados a comércio, indústria ou serviços, por um lado e as finalidades a que destina a nova tributação, como seja a do financiamento da Segurança Social, assegurado através da consignação de receitas do AIMI ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, previsto no n.º 2 do artigo 1.º do CIMI, na redação da Lei n.º 42/2016, também servirá para responder negativamente à pretensão da requerente.
É que, tendo o princípio da diversificação das fontes de financiamento da Segurança Social, nos termos da respetiva Lei de Bases, o propósito de «redução dos custos não salariais da mão-de-obra» (artigo 88.º da Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro), justifica-se ainda a exclusão da incidência quanto aos prédios urbanos destinados a atividades comerciais, industriais e para serviços pela consideração de que, são essas as tipologias mais frequentemente conexionadas com o funcionamento do tecido empresarial; de outro modo as empresas, já chamadas a suportar o financiamento da Segurança Social na qualidade de empregadores, veriam tendencialmente acrescidos (e não reduzidos como prescreve a Lei de Bases) os custos não salariais da mão de obra com a ampliação das bases de obtenção de recursos financeiros do sistema trazida pela medida fiscal.
Deste modo, constitui fundamento razoável e bastante para que, perante património imobiliário não destinado a tais atividades, cujos titulares não estarão associados com a mesma intensidade ao financiamento da Segurança Social como empregadores, o legislador tenha privilegiado a arrecadação de receita consignada ao mesmo sistema.
E, tal como se concluiu relativamente ao propósito de promoção das estruturas económicas e só nessa medida e com esta interpretação, tem sentido a afirmação da intenção de não sobrecarregar fiscalmente os sujeitos passivos que, por força das suas actividades económicas, detêm imóveis para a prossecução do respectivo objecto social, pois já contribuem para o financiamento do sistema da Segurança Social, pelo que, com esta ponderação pode concluir-se que a nova tributação satisfaz as exigências do princípio da proporcionalidade. Mostra-se adequada à finalidade visada – propicia o aumento de receitas -, é necessária – a diversificação e acréscimo das fontes de financiamento da Segurança Social é condição da sua sustentabilidade – e não se mostra desmedida, seja em função das taxas aplicáveis, designadamente às pessoas coletivas (artigo 135.º-J do CIMI), seja porque o imposto pago é dedutível à matéria tributável em IRC (artigo 135.º-J do CIMI).
6. Por isto mesmo, foi recentemente decidido pelo Tribunal Constitucional “não julgar inconstitucional a norma extraível do artigo 135.º-B, n.ºs 1 e 2, do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, aditado pelo artigo 219.º da Lei n.º 42/2016, de 28.12, no segmento em que sujeita a tributação em adicional ao imposto municipal sobre imóveis (AIMI) a propriedade de prédios destinados à habitação e de terrenos para construção de prédios destinados à habitação, pertencentes a empresas que têm por objeto a comercialização de imóveis.”
Improcede assim a primeira questão suscitada pela recorrente de, pelo facto se ser uma empresa imobiliária, poder estar isenta de pagamento de AIMI relativamente aos prédios de que é proprietária e que destina, por força do seu objecto social, futuramente a revenda ou transformação em prédios urbanos.
Do mesmo modo, não há que desaplicar as normas dos artigos 135º.-A e 135º.-B, ambos do CIMI às empresas que, como a requerente, exercem a actividade imobiliária.
7. Excluída a hipótese de não pagamento do AIMI por razões subjectivas relacionadas com a natureza da actividade económica exercida pela requerente, resta-nos averiguar se objectivamente o imóvel de que é proprietária também poderá beneficiar da isenção incluída no artº. 135º.-B, nº. 2 do CIMI, por a avaliação fiscal do terreno para construção ter considerado o coeficiente de afectação “serviços”.
Convém referir que não foi possível determinar a razão pela qual foi considerado que o terreno para construção propriedade da requerente seria afectado a serviços. Esse destino, para além de não constar da participação matricial da requerente, não é justificado no auto de avaliação junto aos autos.
Acresce que, a afectação a serviços só poderia ocorrer com a construção de qualquer edifício ou estrutura, a qual seria necessariamente objecto de licença municipal que indicaria essa finalidade.
Só que não existe qualquer licenciamento para construção no terreno em causa, nem sequer há um pedido de licença de construção, como reconheceu o requerente.
Portanto, o terreno para construção objecto dos presentes autos também pode vir a ser afectado a fins habitacionais e então já não estaria isento de AIMI.
Por isso, sendo que o objectivo da norma do n.º 2 do artigo 135.º-B do Código do IMI é o de não onerar excessivamente os ativos imobiliários, com função intermediária no seio de organização empresarial do sujeito passivo, quanto aos terrenos para construção esse nexo funcional não se encontra ainda estabelecido com suficiente garantia, uma vez que o seu titular não está em absoluto impedido de alterar a finalidade projetada, de modo a destinar à construção de prédios para habitação terrenos inicialmente licenciados para construção com outras destinações ou até ainda não licenciados. Já no caso dos prédios edificados, com fins de comércio, indústria, serviços ou outros, mesmo que não se possa excluir a possibilidade de vir a existir desconformidade entre a utilização normal e a materializada, mormente nos casos em que não haja licenciamento, ou outra intervenção constitutiva das autoridades municipais ou de outros entes detentores de direitos dos poderes públicos, podemos considerar a probabilidade de um tal desvio ser escassa e, nessa medida, que o risco se mostra insuficiente para colocar em crise a conformação do imposto.
Deste modo, a afectação considerada para efeitos de avaliação não é vinculativa, nem o legislador a elegeu como relevante para efeitos de incidência do AIMI, mesmo nos casos em que já possa haver ou tenha sido requerido licenciamento municipal.
Assim sendo, nem o termo eleito para comparar as situações jurídico-subjetivas – a utilização potencial dos prédios urbanos – comporta relevo no núcleo problemático em equação, nem os titulares das duas tipologias de prédios urbanos postas em confronto – terrenos para construção com fins de comércio, indústria, serviços ou afins, por um lado, e prédios construídos classificados, de acordo com o artigo 6.º do Código de IMI, como «comerciais, industriais ou para serviços» ou «outros», por outro - estão em posição equiparável, de acordo com o facto tributário e a estrutura de incidência objetiva do AIMI, pelo que não se encontra, também neste ponto, fundamento para considerar estes terrenos para construção como isentos de AIMI, por enquadráveis no artº. 135º.- B, nº. 2 do AIMI.
Aliás, não deixa de ser significativo o facto de o artº. 6º., nº. 1 do CIMI ter autonomizado como prédios urbanos os terrenos de construção (al. c) relativamente aos edifícios habitacionais (al. a) e os edifícios comerciais, industriais ou para serviços (al. b), autonomização essa feita sem distinguir qualquer forma projectada ou não de utilização desses terrenos para construção.
Por isso, o facto de se ter utilizado um coeficiente de afectação para serviços na fórmula de avaliação desses terrenos não vincula para efeitos de AIMI, pois o legislador não faz distinções quanto aos terrenos de construção para efeitos de incidência objectiva do AIMI, nem as razões justificativas do lançamento deste tributo já atrás enunciadas e constantes do artº. 1º., nº. 2 do CIMI, ou seja, o financiamento do sistema de Segurança Social justificam tal distinção.
Consequentemente improcede na sua totalidade a argumentação do requerente tendente à demonstração de que o terreno de construção de que é proprietário não é objecto de incidência objectiva do AIMI, pois não devem ser incluídos nos prédios urbanos a que se não aplica o AIMI, aqueles que consistam em terrenos para construção, apenas e tão somente porque matricialmente são referenciados como se destinando a serviços, tendo até sido aplicado o coeficiente de afectação com base no qual foi determinado o valor patrimonial tributário.
Em consequência não se pode considerar inconstitucional a norma que faz sujeitar a AIMI, a propriedade dos terrenos para construção, abstraindo das suas possíveis e eventuais afectações futuras, não só porque essa opção se situa na margem de liberdade de conformação do legislador no exercício do seu pode legiferante, como não se revela essa opção como desproporcional, não havendo qualquer violação do princípio da igualdade, mesmo na sua vertente negativa, pois sujeita todos proprietários de terrenos para construção ao mesmo regime de incidência do AIMI, qualquer que seja a sua intenção futura de edificação naquele terreno concreto.
Por isso, entendemos que a norma do 135º.-B, nº. 2 do CIMI não está ferida de inconstitucionalidade, quando devidamente interpretada, como deixamos exposto, não devendo a mesma ser desaplicada com fundamento em inconstitucionalidade.
8. Falecendo todas as razões e fundamentos invocados pelo requerente, terá de improceder na totalidade o pedido por ele formulado, quer o pedido de declaração da ilegalidade do acto tributário de liquidação de AIMI, com referência ao ano de 2018, no montante global de € 10.726,19, quer o pedido consequente de restituição integral do imposto liquidado e pago, acrescido dos correspondentes juros indemnizatórios, como ainda o pedido subsidiário de desaplicação das normas dos artigos 135.º-A e 135º.-B do Código do IMI, por inconstitucionalidade, por não violarem qualquer princípio ou norma constitucional.
V. DOS JUROS INDEMNIZATÓRIOS:
Face à improcedência do pedido do requerente de anulação da liquidação efectuada e paga, não há lugar à restituição de quaisquer quantias, pelo que improcede também o pedido de condenação no pagamento de juros indemnizatórios
VI - DECISÃO
Nestes termos, e com os fundamentos expostos, o Tribunal Arbitral decide julgar totalmente improcedente o pedido de declaração de ilegalidade da liquidação de AIMI impugnada, com referência ao ano de 2018, no montante global de € 10.726,19, absolvendo a Administração Tributária e Aduaneira dos pedidos formulados pelo requerente, julgando improcedente o pedido subsidiário de desaplicação das normas dos artigos 135.º-A e 135º.-B do Código do IMI, por inconstitucionalidade, por não violarem qualquer princípio ou norma constitucional, condenando-se o requerente nas custas do presente processo, por ser a parte vencida.
Valor do processo: Em conformidade com o disposto no artigo 306.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, 97.º-A, n.º 1 a) do CPPT e artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, o valor do pedido é fixado em euros de € 10.726,19.
Custas: Ao abrigo do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, e nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixo o montante das custas em € 918,00, a cargo da Requerente
Lisboa, 9 de Julho de 2019,
O Árbitro
José Sampaio e Nora
(Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 131.º, n.º 5 do CPC, aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1 alínea e) do RJAT e segundo a antiga ortografia).