DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros Fernanda Maçãs (árbitro presidente), Raquel Franco e Artur Maria Silva (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do CAAD para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 03-12-2018, acordam o seguinte:
I. Relatório
1. A..., S.A. pessoa coletiva n.º ..., com sede na Rua..., n.º..., ...-... Lisboa, com o capital social de € 95.542.254,00 (noventa e cinco milhões quinhentos e quarenta e dois mil duzentos e cinquenta e quatro euros), anteriormente chamada B...– SGPS, S.A., doravante designada por “A...” ou “Requerente”, sociedade dominante do Grupo C..., sujeito ao regime especial de tributação dos grupos de sociedades previsto nos artigos 69.º e seguintes do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, abrangida pelos serviços periféricos locais do Serviço de Finanças de Lisboa..., apresentou, ao abrigo dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de Janeiro, e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 Março, pedido de pronúncia arbitral em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.
2. A Requerente solicita (i) que seja declarada a ilegalidade e que sejam anuladas as decisões de indeferimento dos recursos hierárquicos e de indeferimento dos pedidos de revisão oficiosa e da reclamação graciosa; (ii) que seja declarada a ilegalidade dos atos de autoliquidação de IRC do Grupo Fiscal C... dos exercícios de 2010, 2011, 2012 e 2013, no que respeita à indevida desconsideração da dedução de encargos financeiros nos montantes de € 461.414,30 (2010), € 780.399,55 (2011), € 1.062.530,93 (2012) e € 667.968,41 (2013), com a consequente anulação nestas partes, e (iii) que seja declarada a ilegalidade e anulado o imposto reflexo no exercício de 2013 relativo a estes excessos de bases tributáveis (incluindo neste excesso o impacto da dedução dos encargos fiscais nos exercícios anteriores via acréscimo de prejuízos fiscais sobrantes que transitam até ao exercício de 2013), no montante de € 743.078,30, com todas as consequências legais, designadamente o reembolso deste montante de imposto, acrescido de juros indemnizatórios à taxa legal contados, até integral reembolso, desde 30.05.2014.
3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 24-09-2018.
4. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
5. Em 12-11-2018 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
6. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral ficou constituído em 03-12-2018.
7. A fundamentar o pedido de pronúncia arbitral a Requerente alega, em síntese, o seguinte:
a) O excesso das bases tributáveis dos atos de liquidação impugnados, na medida em que desatendem indevidamente a dedução de encargos financeiros nos montantes de € 461.414,30 (2010), € 780.399,55 (2011), € 1.062.530,93 (2012) e € 667.968,41 (2013), com o consequente apuramento de lucro tributável em excesso, utilização de prejuízos fiscais de exercícios anteriores em excesso (exercícios de 2010, 2011, 2012 e 2013), e bem assim com o consequente apuramento reflexo de IRC em excesso no montante de € 743.078,30 (2013).
b) O cálculo do imposto reflexamente liquidado em excesso tem em atenção a solidariedade legalmente prevista entre exercícios, que na situação concreta se manifesta no acréscimo de prejuízos fiscais sobrantes para utilização nos exercícios seguintes, e no acréscimo de PECs sobrantes para utilização no exercício seguinte (conforme doc. n.º 20 que juntou), e que contém um quadro síntese dos prejuízos fiscais e PECs sobrantes para utilização entre os exercícios de 2006 – exercício de constituição do grupo fiscal sujeito ao RETGS, dominado pela requerente – e 2013 – último exercício objeto do pedido, tendo em conta correções promovidas pela AT em sede de inspeção tributária aos exercícios de 2010 a 2013, cujos relatórios a Requerente juntou como docs. n.ºs 21, 22, 23 e 24, decorrente da diminuição da base tributável em cada um dos exercícios supra referidos em razão da citada dedução fiscal de encargos financeiros nos montantes supra referidos.
c) A Requerente sustenta que não constitui aquisição de partes de capital nem a realização de prestações suplementares ou acessórias, nem a cobertura de prejuízos por conversão de prestações acessórias ou suplementares e, como tal, a dedutibilidade dos gastos de financiamento que lhes estiverem associados não se encontra limitada pela regra constante do n.º 2 do artigo 32.º do EBF;
d) Quando no artigo 35.º do Código das Sociedades Comerciais se fala em perda de metade do capital, de modo nenhum se inclui, nem alguma vez alguém intentou interpretação diversa, as prestações suplementares no conceito de capital;
e) O direito comercial, mais concretamente o direito das sociedades comerciais, entende por partes de capital as partes sociais ou participações sociais (vulgo quotas e ações), e nada mais;
f) No direito comercial, a expressão simples “capital” tem o significado inequívoco de “capital social”. Há abundantes exemplos disso mesmo, sendo de citar os artigos 9.º (elementos do contrato), 14.º (expressão do capital), 32.º (limite da distribuição de bens aos sócios), 35.º (perda de metade do capital), 197.º (características da sociedade), 201.º (capital social livre), 202.º (entradas), 213.º (restituição das prestações suplementares), 271.º (características), 272.º (conteúdo obrigatório do contrato), 276.º (valor nominal do capital e das acções), etc., todos do Código das Sociedades Comerciais;
g) Atendendo à identificação entre capital e capital social, a expressão composta “partes de capital” só pode, também por isso, salvo dados legais que apontem em sentido contrário, querer significar “partes de capital social”, vulgo quotas ou ações ou, mais genericamente, identificar-se com a expressão “participações sociais”;
h) A diferença entre prestações suplementares (ou acessórias) e partes de capital encontra-se sobejamente assinalada tanto pela doutrina como pela jurisprudência portuguesas, conforme ensina António Pereira de Almeida ( ) – “as prestações suplementares são outras obrigações dos sócios de entradas em dinheiro para além do capital social (…) [realizadas] naquelas situações em que, no momento da constituição se antevê a possibilidade de o capital se tornar insuficiente para a realização do objeto social”;
i) A Requerente indica ainda jurisprudência sobre esta questão: decisões relativas aos processos n.º 12/2013-T, de 8 de Julho de 2013, n.º 39/2013-T, de 14 de Outubro de 2013, n.º 69/2013-T, de 22 de Outubro de 2013, n.º 80/2013-T, de 10 de Outubro de 2013, n.º 113/2013-T, de 3 de Fevereiro de 2014, n.º 653/2014-T, de 6 de Fevereiro de 2015, e, mais recentemente, decisões relativas aos processos n.º 549/2015-T, de 26 de Janeiro de 2016, n.º 246/2016-T, de 20 de Novembro de 2016, n.º 581/2016-T, de 26 de Abril de 2017, n.º 714/2016-T, de 9 de Junho de 2017, n.º 222/2017-T, de 7 de Novembro de 2017, e n.º 380/2017-T, de 26 de Janeiro de 2018. Sobre a distinção entre partes de capital e créditos por prestações suplementares cita também o Tribunal Constitucional n.º 717/2017, de 15 de Novembro de 2017;
j) A mesma conclusão resulta também dos regimes jurídicos dos direitos e obrigações inerentes à posição de sócio porque titular de parte de capital e da figura de credor das prestações suplementares; se por um lado, no primeiro caso, se consubstancia um conjunto de direitos (ao voto, aos lucros da sociedade) e obrigações (como a participação nas perdas ou o dever de realização das entradas); no segundo caso, o cumprimento das prestações decorre de uma obrigação autónoma do sócio, o qual, em virtude da respetiva concessão, apenas adquire um direito de crédito sobre a sociedade, sem que daí resulte qualquer impacto no que respeita à posição jurídica de sócio que o mesmo ocupa;
k) Por outro lado, como resulta do CSC, o capital social tem um papel fundamental no que respeita à função garantística para com os credores da sociedade. Por isso se prevê no artigo 32.º daquele diploma o princípio da intangibilidade do capital social e no artigo 95.º se dispõe que, para que uma redução de capital social possa ser realizada, a situação líquida da sociedade deverá ficar a exceder em pelo menos 20% o montante do novo capital social;
l) Já o regime das prestações suplementares, apesar de conter alguns condicionalismos, não prevê estas dificuldades quando se fala na sua restituição; assim, como requisitos de restituição das prestações suplementares, a lei comercial (artigo 213.º do CSC) apenas impõe que (i) a situação líquida da sociedade não fique inferior à soma do capital e da reserva legal e (ii) que o sócio que tenha efetuado a prestação já tenha liberado a sua quota;
m) Quanto ao normativo contabilístico, o “capital próprio” é um conceito contabilístico que inclui diversas rubricas, sendo que apenas uma delas representa as “partes de capital” do sócio (a rubrica de capital social), sendo o exemplo mais sintomático a rubrica 596 – Subsídios, que em nada tem que ver com “partes de capital”;
n) Mas se é verdade que as “partes de capital” integram o conceito de “capital próprio”, tal não significa que todas as realidades que figuram no “capital próprio” de uma sociedade constituam “partes de capital”;
o) No entendimento expresso na decisão arbitral referente ao Processo n.º 9/2012-T, de 7 de Setembro (Doc. n.º 27), o capital próprio deve ser considerado como um todo, não constituindo uma coisa ou direito susceptível de ser objecto de transmissão na medida em que nem pode ser qualificado como coisa composta ou universalidade de facto nos termos do artigo 206.º do Código Civil. Ora, no seguimento daquele entendimento, interpretar a expressão “partes” como referindo-se a qualquer das rubricas que constitui a conta referente ao capital próprio seria absurdo, uma vez que esta expressão “tem como significado “quota parte”, “participação” ou “quinhão” e reportar essa expressão a “capital próprio” seria algo que (…) traduziria uma decomposição, inadmissível (…) do capital próprio”;
p) No Código do IRC foi o próprio legislador quem assumiu que partes de capital são uma coisa (participações sociais) e créditos por prestações suplementares coisa distinta, donde o aditamento destas últimas realidades às primeiras (representadas pela expressão “partes de capital”), operada pela Lei do Orçamento do Estado para 2006 (Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro), através do acrescentar da expressão “outras componentes do capital próprio”, incluindo as (os créditos, ou expectativas de reembolso, resultantes da realização de) “prestações suplementares”;
q) Como bem se concluiu na decisão arbitral proferida no processo n.º 69/2013-T, “(...) para esclarecimento da questão de saber se as prestações suplementares são abrangidas no conceito de «partes de capital» há uma norma da qual decorre directamente que aquelas não se englobam neste conceito, que é o n.° 3 do artigo 42.° do CIRC, na redacção introduzida pela Lei n.° 60-A/2005, de 30 de Dezembro (actual artigo 45.°, n.° 3).” (cfr. a pág. 16 da referida decisão arbitral na versão PDF publicada no site do CAAD);
r) Acrescenta, ainda, que uma tentativa de alargamento do âmbito de aplicação daquele preceito do Código do IRC, para que caiam no escopo do n.º 2 do artigo 32.º do EBF as prestações suplementares, estará ferida de ilegalidade, por criação de norma de incidência, âmbito contido na reserva relativa de lei da Assembleia da República – cfr. o n.º 4 do artigo 11.º da LGT, o artigo 10.º do EBF e o artigo 165.º da CRP.
s) À luz da doutrina da AT (Ficha Doutrinária da AT referente ao Processo n.º 2799/2009, despachado em 19 de Novembro de 2011), as partes de capital recebidas na constituição da sociedade ou em aumento de capital não configuram aquisições para efeitos do artigo 32.º, n.º 2 no caso, do EBF, donde que será indevido o afastamento da dedução fiscal de quaisquer encargos alegadamente suportados (na verdade apenas nocionalmente suportados, conforme metodologia da Circular n.º 7/2004) com (a aquisição de) aquelas participações. Aliás, também o n.º 2 do artigo 32.º do EBF se refere, expressamente, a “encargos financeiros suportados com a sua aquisição”.
t) Recentemente, o acórdão arbitral de 7 de novembro de 2017 proferido no processo n.º 222/2017-T (…), pronunciou-se assim: “À luz da doutrina da AT supra citada, as partes de capital recebidas na constituição da sociedade ou em aumento de capital não configuram aquisições para efeitos do artigo 32.º, n.º 2 do EBF, donde que será indevido o afastamento da dedução fiscal de quaisquer encargos alegadamente suportados. Pelo que, em suma, não constitui igualmente aquisição de partes de capital a subscrição de capital em aumento de capital ou na constituição de uma sociedade.” (cfr. a pág. 17 da versão PDF publicada no site do CAAD).
u) Da lei, que é simultaneamente fundamento e limite da atividade da AT e do procedimento de liquidação de imposto, em momento algum resulta, explícita ou implicitamente, que os encargos financeiros a afastar do apuramento do lucro tributável em IRC possam ser outros que não os suportados com a aquisição de partes de capital detidas durante pelo menos um ano. Dito de outro modo, não tendo a lei acolhido qualquer fórmula, as suas disposições só podem ser interpretadas como consagrando o critério natural (à falta de desvio expresso consagrado em fórmula) da afectação real dos encargos financeiros. E a lei em análise não autoriza também que se trate indiferenciadamente as próprias partes de capital em si mesmas: só os encargos financeiros suportados com a aquisição de partes de capital (e entre estas só as detidas durante pelo menos um ano) podem ser afastados do cômputo do lucro tributável em IRC. Ora, a Circular em análise, quando estabelece um método nocional com recurso a proporções assentes no valor dos activos, de determinação dos encargos financeiros supostamente (nocionalmente) suportados com a aquisição de partes de capital, extravasa da base legal aplicável e, com isso, infecta com o vício de violação de lei as liquidações de imposto efectuadas em obediência a tal orientação genérica. O Requerente indica ainda jurisprudência no sentido da posição que sustenta.
v) Prosseguindo, a Requerente defende que a fórmula constante da citada Circular consubstancia uma presunção que não admite contradita que viola o disposto no artigo 73.º da LGT e contraria o princípio constitucional da tributação “fundamentalmente do rendimento real” e, com ele, os princípios da igualdade, da capacidade contributiva e da neutralidade (artigos 2.º – enquanto emanações do Estado de direito democrático – 13.º, 103.º, n.º 1, e 104.º, n.º 2, da CRP), padecendo por isso a norma legal interpretada nesta conformidade – o n.º 2 do artigo 32.º do EBF – de inconstitucionalidade material, inconstitucionalidade esta de que padece também à luz da doutrina que se opõe a presunções inilidíveis no campo dos impostos, estabelecida pelo acórdão do Tribunal Constitucional n.º 348/97, proferido no processo n.º 63/96.
x) Invoca ainda através da evolução das aquisições de partes de capital vis a vis a evolução da dívida, que o método de imputação dos encargos financeiros previsto na Circular n.º 7/2004 não atende à realidade do caso concreto, não admite prova em contrário e desvirtua o disposto no n.º 2 do artigo 32.º do EBF (em vigor à data dos factos).
y) A Requerente conclui pedindo:
- a declaração de ilegalidade e anulação dos indeferimentos dos recursos hierárquicos, dos pedidos de revisão oficiosa e da reclamação graciosa, na medida em que recusaram a anulação dos atos de autoliquidação de IRC relativos aos exercícios de 2010, 2011, 2012 e 2013 com isso violando o princípio da legalidade;
- a declaração de ilegalidade e anulação das autoliquidações de IRC relativas aos exercícios de 2010, 2011, 2012 e 2013, no montante em excesso de € 461.414,30 (2010), € 780.399,55 (2011), € 1.062.530,93 (2012), € 667.968,41 (2013) das suas bases tributáveis, e bem assim a declaração de ilegalidade e a anulação do imposto reflexo no montante de € 743.078,30 referente ao excesso de base tributável do exercício de 2013, incluindo neste excesso o impacto da dedução dos encargos fiscais nos exercícios anteriores via acréscimo de prejuízos fiscais sobrantes que transitam até ao exercício de 2013;
- o pagamento de juros indemnizatórios ao abrigo do artigo 43.º da LGT, calculados sobre o montante de imposto indevidamente pago, no valor de € 743.078,30, e contados desde o seu pagamento em 30.05.2014, até ao integral reembolso do referido montante.
8.A Requerida apresentou resposta pugnando pelo indeferimento do pedido deduzido pela Requerente, alegando sucintamente que:
a) A exceção da incompetência do Tribunal Arbitral para a anulação do imposto no montante apurado de € 743.078,30 do exercício de 2013 e condenação da requerida ao seu reembolso.
b) Para a Requerida não se insere no âmbito das competências do Tribunal Arbitral o pedido de reconhecimento do direito formulado pela Requerente, na parte em que apura e peticiona a devolução do eventual imposto (pago pelo Grupo) correspondente a excesso de bases tributáveis, quantificação que inclui a dedução dos encargos fiscais nos exercícios anteriores via acréscimo de prejuízos fiscais sobrantes (acrescido dos correspondentes juros indemnizatórios).
c) Dado o reconhecimento da indissociabilidade das partes sociais e das prestações suplementares e das prestações acessórias, o legislador fiscal (pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro) sentiu necessidade de consagrar expressamente, no n.º 3 do art.º 45.º do Código do IRC, um tratamento homogéneo para as perdas ou menos-valias decorrentes da alienação das partes do capital social e das “outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares”, porquanto não faria sentido que o legislador deixasse uma porta aberta a opções ditadas por razões exclusivamente fiscais, pois que o recurso às prestações suplementares e prestações acessórias funciona, frequentemente, como substituto do aumento do capital social, e sendo as partes sociais e as prestações transmitidas conjuntamente, o preço de venda poderia ser deslocado para a componente que propiciasse um regime tributário mais favorável.
d) A solução de conferir um tratamento fiscal idêntico aos instrumentos de capital próprio, veio a ser refletida no artigo 51.º-C (aditado ao Código do IRC pela lei n.º 2/2014, de 16 de Janeiro) que estabelece no n.º 2 que o regime enunciado no n.º 1 para as mais-valias e menos-valias realizadas mediante transmissão onerosa de partes sociais “é igualmente aplicável às mais-valias e menos-valias realizadas com a transmissão de outros instrumentos de capital próprio associados às partes sociais aí referidas, designadamente prestações suplementares.”
e) Na perspetiva dos sócios que realizam as prestações suplementares ou acessórias e, tal como refletido na contabilidade, os montantes entregues a esse título correspondem a aumentos do valor da participação detida.
f) Assim, no contexto do Estatuto dos Benefícios Fiscais, os normativos que concedem isenções às mais-valias obtidas na alienação de partes sociais – designadamente os artigos 27.º e 32.º – não consentiriam outra interpretação que não fosse a de que abrangiam a totalidade dos ganhos (e perdas) realizados pelos sócios, sob pena de, na repartição do preço de venda, se atribuir a maior parte à componente mais favorecida fiscalmente. Por conseguinte, se os ganhos ou perdas realizados pelas SGPS na alienação de partes sociais e dos instrumentos de capital próprio associados e transmitidos conjuntamente, detidas durante pelo menos um ano, são abrangidos pelo n.º 2 do art.º 32.º do EBF, forçoso é concluir que também os encargos financeiros suportados com os financiamentos utilizados quer para a aquisição das partes sociais quer para a realização daquelas prestações estão sujeitos à mesma limitação de dedutibilidade para efeitos da determinação do lucro tributável. Não procede assim a tese da Requerente de que a inclusão no âmbito do n.º 2 do art.º 32.º do EBF dos ganhos ou perdas obtidos na alienação de partes sociais e dos instrumentos de capital próprio associados às mesmas constitui uma afronta ao princípio da legalidade e ao art.º 10.º do EBF.
g) Tanto no plano contabilístico como fiscal, as entregas dos sócios para a realização das participações no capital das sociedades, seja no início, aquando da constituição, seja durante a vida sociedades, tem o mesmo tratamento, isto é, integram o valor de aquisição, que irá ser contraposto ao valor de realização para a determinação das mais-valias e das menos-valias, nos termos definidos no n.º 2 do art.º 46.º do Código do IRC. Ou seja, o “valor de aquisição” para efeitos deste normativo é formado pela adição do investimento inicial e dos desembolsos subsequentes realizados com idêntica finalidade, qual seja a de aumentar ou reforçar o capital social. O legislador não forneceu qualquer fórmula especial a utilizar no cálculo das mais-valias e as menos-valias abrangidas pelo n.º 2 do art.º 32.º do EBF, designadamente no que se refere ao “valor de aquisição” das partes de capital, portanto, só treslendo esta norma se torna possível concluir que as entregas feitas pelos sócios para a realização de aumentos de capital não integram o valor de aquisição.
h) O comando que emana do disposto no n.º 2 do art.º 32.º do EBF é claro: são só os encargos financeiros suportados com a aquisição de partes de capital, e entre estes só os suportados com a aquisição de partes de capital detidas durante pelo menos um ano, aqueles cuja dedução fiscal é afastada. Para dar cumprimento a esta prescrição legal, as SGPS que recorrem ao endividamento para financiar quer os investimentos na aquisição de partes de capital cujas mais-valias poderiam beneficiar de isenção, quer para outros fins, estavam obrigadas, por força da obrigação da alínea b) do n.º 3 do art.º 17.º do Código do IRC, a organizar a contabilidade de modo que os resultados das operações e variações patrimoniais sujeitas ao regime geral do IRC possam claramente distinguir-se dos das restantes. Logo, defender que o n.º 2 do art.º 32.º do EBF apenas comporta a aplicação do método direto ou de identificação específica daqueles encargos financeiros e que incumbe à AT, em primeira linha, o ónus de demonstrar os cálculos a efetuar para esse fim, mais não é do que ignorar o carácter impositivo da obrigação estabelecida pela alínea b) do n.º 3 do art.º 17.º do Código do IRC ou, no mínimo, não qualificar o regime previsto no EBF como um regime especial aplicável às mais-valias e menos-valias obtidas pelas SGPS. A metodologia sugerida pela Circular n.º 7/2004, mais não visa do que ultrapassar as eventuais dificuldades que algumas SPGS poderiam enfrentar, por não centrarem a sua atividade na detenção e gestão de partes sociais qualificadas, oferecendo-lhes uma fórmula de quantificação dos encargos financeiros não dedutíveis, sem prejuízo de uma análise casuística quando se revele exequível.
i) Vem a Requerente sustentar que “são contrários à lei, mais concretamente ao n.º 2 do artigo 32.º do EBF, os actos de autoliquidação de IRC aqui em causa, relativos aos exercícios de 2010, 2011, 2012 e 2013, na medida em que afastam a dedutibilidade de encargos financeiros em aplicação da orientação genérica constante da fórmula prescrita na Circular n.º 7/2004” sem, no entanto, fazer prova de que a aplicação do chamado método direto ou de identificação específica conduziria a outros resultados. Em suma, o que a Requerente vem pugnar é pela aplicação do disposto no n.º 2 do art.º 32.º do EBF com um alcance e contornos diferentes daqueles que foram gizados pelo legislador que visou instituir um benefício fiscal assente num regime de neutralidade fiscal dos rendimentos e gastos (encargos financeiros) associados às partes de capital detidas pelo menos um ano.
j) A Requerente não intentou proceder a um ensaio sobre a aplicação do método direto ou de identificação específica de modo a quantificar em termos rigorosos os encargos financeiros associados à aquisição das partes de capital, limitou-se a refinar os valores obtidos com a aplicação da metodologia da Circular, expurgando uma parte, com base em presunções de financiamento das partes sociais construídas sobre uma mera comparação entre as variações anuais dos financiamentos e os acréscimos anuais das participações sociais, excluindo as prestações acessórias e outras realidades.
k) Portanto, não conseguiu provar que seriam mais favoráveis do ponto de vista fiscal os resultados alcançados, em termos de encargos financeiros associados à aquisição de partes de capital abrangidas pelo n.º 2 do art.º 32.º do EBF, com a utilização do método de identificação específica dos encargos financeiros suportados no exercícios de 2010, 2011, 2012 e 2013, na medida em que não procedeu a uma aplicação analítica e discriminada dos seus recursos - capitais alheios e fundos próprios - devidamente definida, documentada e justificada.
l) A AT demonstrou, portanto, a falta de fundamento da argumentação esgrimida pelo Requerente, devendo declarar-se a legalidade das autoliquidações pelas razões de facto e de direito invocadas na Resposta.
m) No que respeita ao direito a juros indemnizatórios, a Requerida sustentou na Resposta que, estando em causa a correção de erro na autoliquidação do contribuinte que promove a sua revisão não é aplicável o disposto no artigo 43.º, n.º 1 da LGT, mas sim na norma especial vertida na alínea c) do n.º 3 do mesmo artigo 43.º, entendimento que tem vindo a ser acolhido pelo pleno do STA, como resulta, por exemplo, do Acórdão, datado de 23-05-2018, proferido no âmbito do processo n.º 01201/17) onde se refere «O artigo 43.º, n.º 3 c) da LGT consagra um regime especial, quanto aos juros indemnizatórios, aplicável apenas em situações de revisão do ato tributário em que os mesmos são devidos decorrido um ano após o pedido de revisão». O aditamento, pela Lei n.º 9/2019, da alínea d) ao n.º 3 do artigo 43.º da LGT não veio a alterar nem revogar as restantes disposições legais constantes do artigo, o qual consagra regimes específicos, designadamente quanto ao momento a partir do qual são devidos os juros indemnizatórios.
9. Por despacho de 27-01-2019, a Requerente foi notificada para responder, querendo, à matéria de exceção deduzida pela Requerida na Resposta, bem como para indicar os factos sobre que pretendia produzir a prova testemunhal.
10. Através de requerimento apresentado a 01-02-2019, a Requerente veio prescindir da prova testemunhal.
11. Por despacho de 08.02.2019, foram as partes notificadas da dispensa da reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, bem como do prazo para apresentação de alegações escritas. Designou-se ainda o dia 02-06-2019 como prazo limite para prolação da decisão arbitral, tendo a Requerente sido advertida para proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente. Prazo este prorrogado por despacho de 30 de Maio de 2019 por mais dois meses.
12. Ambas as partes apresentaram alegações escritas reiterando, no essencial, as respetivas posições jurídicas.
Nas suas alegações, e perante a Resposta da AT, a Requerente re-centrou a questão essencial dos autos no apuramento do ónus de demonstração da pertinência da aplicação dos critérios fixados na Circular n.º 7/2004 (“é já ponto assente na jurisprudência do STA que mesmo no caso de uma autoliquidação que tenha aplicado a Circular n.º 7/2004, o ónus de demonstrar, e de demonstrar sempre por referência às circunstâncias do caso concreto, que não há alternativa ao método formulaico-presuntivo da Circular, recai sobre a AT.”).
Por sua vez, a AT reiterou a diferença entre o contexto de aplicação da Circular e a sua conformidade legal, e confirmou a centralidade da questão da determinação do ónus de prova ao invocar que a Requerente “não conseguiu provar que seriam mais favoráveis do ponto de vista fiscal os resultados alcançados, em termos de encargos financeiros associados à aquisição de partes de capital abrangidas pelo n.º 2 do art.º 32.º do EBF, com a utilização do método de identificação específica dos encargos financeiros suportados no exercícios de 2010, 2011, 2012 e 2013, na medida em que não procedeu a uma aplicação analítica e discriminada dos seus recursos - capitais alheios e fundos próprios - devidamente definida, documentada e justificada.”
II. Saneamento
12. O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é competente.
13.As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do CPPT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
14. O processo não enferma de nulidades.
15. A Requerente sustenta a admissibilidade da cumulação de pedidos que fez, não sendo contestada pela AT nesse ponto. Nos termos do disposto no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, é admitida a cumulação de pedidos desde que a respetiva procedência dependa essencialmente da apreciação das mesmas circunstâncias de facto e da interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito, o que, com efeito, se verifica no presente processo. […].
16. A Requerida invocou a exceção de incompetência do Tribunal Arbitral para a condenação da Requerida ao reembolso do imposto pago. Refere, a este propósito, que, ainda que tal pretensão pudesse decorrer da execução de julgados a efetuar em caso de a decisão arbitral proferida ser de procedência do pedido, não pode ser conhecida no presente processo, porquanto tal pedido (na parte identificada) extravasa a competência que foi consagrada na lei para os tribunais arbitrais tributários.
Assim, entende a Requerida que não se insere no âmbito das competências deste tribunal a apreciação do pedido de reconhecimento do direito formulado pela Requerente, na parte em que apura e peticiona a devolução do eventual imposto (pago pelo Grupo) correspondente a excessos de bases tributáveis, quantificação que inclui a dedução dos encargos fiscais nos exercícios anteriores via acréscimo de prejuízos fiscais sobrantes (acrescido dos correspondentes juros indemnizatórios). Sustenta que decorre do artigo 24.º do RJAT que a definição dos atos em que se deve concretizar a execução de julgados arbitrais compete, em primeira linha, à AT, com possibilidade de recurso aos tribunais tributários para requerer coercivamente a execução, no âmbito do processo de execução de julgados, previsto no artigo 146.º do CPPT e artigos 173.º e seguintes do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
A Requerente, chamada a pronunciar-se sobre a exceção invocada, sustenta que a interpretação defendida pela AT, no sentido de o Tribunal Arbitral estar impedido de anular um concreto montante de imposto e de condenar a AT ao seu reembolso, é inconstitucional, por violação dos princípios do Estado de direito democrático e do princípio da tutela jurisdicional efetiva (artigos 2.º, 20.º, n.ºs 1, 4 e 5, e 268.º, n.º 4, da Constituição).
Sobre esta questão, atenta a compreensão global do pedido e da causa de pedir e a resposta da Requerida, entende este Tribunal que o que a AT invocou como exceção de incompetência não foi propriamente a incompetência do Tribunal Arbitral para a anulação do imposto no montante apurado de €743.078,30 do exercício de 2013. Foi sim que o seu eventual decaimento não poderia implicar uma condenação ao reembolso do indevidamente pago nos termos peticionados pela Requerente.
Além de não ser evidente em que é que a definição da forma de cumprimento dos julgados arbitrais, reconhecida evidentemente à AT, contende com a obrigação que neles seja imposta de reembolsar os montantes indevidamente cobrados, escreveu-se o seguinte na recente Decisão Arbitral proferida no Proc. 552/2018-T:
“4.1. Reembolso das quantias pagas
De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».
Embora o artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».
O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do artigo 61.º, n.º 4, do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».
Assim, o n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.
Por outro lado, como o direito a juros indemnizatórios depende da existência de direito de quantia a reembolsar, dessa competência para decidir sobre o direito a juros indemnizatórios infere-se que ela se estende à apreciação do direito a reembolso.
Devendo ser anulada a liquidação, o Fundo representado pela Requerente tem direito a ser reembolsado da quantia de € 75.000,00, indevidamente paga.”
Demais, uma pesquisa nas recentes decisões do CAAD identificou múltiplas condenações à devolução dos montantes indevidamente pagos; ponto é que se trate de situações em que tal devolução se encontre devidamente identificada através de elementos claros que permitem com certeza a condenação no pagamento de quantia certa.
Não é porém essa a situação no caso em apreço, tendo em conta que na alínea b) do pedido a Requerente pede que seja “declarada a ilegalidade e ser anulado o imposto reflexo no montante de € 743.078,30 referente ao excesso de base tributável do exercício de 2013, incluindo neste excesso o impacto da dedução dos encargos fiscais nos exercícios anteriores via acréscimo de prejuízos fiscais sobrantes que transitam até ao exercício de 2013”,
Afigura-se claro que, nesta situação, o Tribunal não dispõe de elementos que lhe permitam condenar a Requerida na quantia peticionada. Tal como configurada pela Requerente, a determinação da quantia a reembolsar não é evidente, antes pressupõe o conhecimento global da evolução da situação da Requerente, a eventual análise de nova documentação e realização de eventuais correções, no sentido de se apurar a repercussão da eventual anulação das autoliquidações no apuramento do lucro tributável nos exercícios seguintes, tanto mais que a própria Requerente admitiu, nos pedidos subsidiários que formulou perante a AT, que parte dos montantes dos financiamentos por ela contraídos podiam ser imputados à aquisição de participações sociais.
Por conseguinte, na ótica do Tribunal, a AT opõe-se que a obrigação de reembolso seja concretizada do específico modo peticionado pela Requerente, por implicar, no caso, o reconhecimento de um direito ou uma condenação da Requerida a certos comportamentos.
A ser deste modo, nada impede que se reconheça razão à AT, uma vez que a definição dos atos em que se deve concretizar a execução de julgados arbitrais compete-lhe, em primeira linha (artigo 24.º do RJAT).
Por outro lado, o acabado de expor não é, ao contrário da Requerente, inconstitucional por violação dos princípios do Estado de direito democrático e do princípio da tutela jurisdicional efetiva (artigos 2.º, 20.º, n.ºs 1, 4 e 5, e 268.º, n.º4, da CRP).
Com efeito, a orientação sufragada, além de resultar das características do contencioso de anulação e da repartição ínsita no mesmo dos poderes entre os Tribunais e a Administração, não põe em causa o poder de anulação do Tribunal e consequente condenação em reembolso a determinar em sede de execução de sentença, como mais adiante será analisado.
III. Do Mérito
III.1. Matéria de facto
III.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos:
a) A requerente procedeu, em 31 de Maio de 2011, à entrega da declaração Modelo 22 com referência ao período de tributação de 2010 do Grupo de sociedades sujeito ao RETGS do qual era sociedade dominante (cfr. doc. n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral);
b) Em 4 de Julho de 2011, a Requerente entregou uma declaração de rendimentos de substituição (cfr. doc. n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral), na qual foi apurado um resultado fiscal agregado positivo de € 858.461,07;
c) Para aquele lucro tributável concorreu o prejuízo fiscal individualmente apurado pela requerente, no montante de € 5.823.879,36 (cfr. doc. n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral), o qual foi minorado pelo acréscimo positivo à base tributável do montante de € 461.414,30 (cfr. campo 752 do referido doc. n.º 4, e doc. n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral) respeitante a encargos financeiros relativos à aquisição de partes de capital;
d) Em 31 de Maio de 2012, a requerente procedeu à entrega da declaração de rendimentos Modelo 22 por referência ao exercício de 2011 do Grupo de sociedades sujeito ao RETGS de que era sociedade dominante, na qual foi apurado um resultado fiscal agregado positivo de € 6.661.566,22 (Doc. n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral);
e) Relativamente ao mesmo exercício de 2011, a Requerente apurou um prejuízo fiscal individual no montante de € 7.199.405,25 (doc. n.º 7 junto com o pedido de pronúncia arbitral), o qual foi minorado pelo acréscimo positivo à base tributável do montante de € 780.399,55 (cfr. campo 779 do doc. n.º 7, e doc. n.º 5, ambos juntos com o pedido de pronúncia arbitral), relativo a encargos financeiros relacionados com a aquisição de partes de capital;
f) A requerente procedeu, em 31 de Maio de 2013, à entrega da declaração de rendimentos Modelo 22 com referência ao período de tributação de 2012 do Grupo de sociedades sujeito ao RETGS de que era sociedade dominante (doc. n.º 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral), na qual foi apurado um resultado fiscal agregado positivo no montante de € 2.334.061,66;
g) A Requerente apurou, por referência ao exercício de 2012, um prejuízo fiscal individual no montante de € 1.445.133,90 (doc. n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral), o qual foi minorado pelo acréscimo positivo à base tributável do montante de € 1.062.530,93 (cfr. campo 779 do doc. n.º 9 e doc. n.º 5, ambos juntos com o pedido de pronúncia arbitral) relativo a encargos financeiros relacionados com a aquisição de partes de capital;
h) Em 30 de Maio de 2014, a Requerente procedeu à entrega da declaração de rendimentos Modelo 22 com referência ao período de tributação de 2013 do Grupo de sociedades sujeito ao RETGS de que era sociedade dominante (doc. n.º 10 junto com o pedido de pronúncia arbitral), na qual foi apurado um resultado fiscal agregado positivo no montante de € 19.095.185,65.
i) A Requerente apurou, por referência ao período de tributação de 2013, um prejuízo fiscal individual no montante de € 1.143.643,43 (doc. n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral), o qual foi minorado pelo acréscimo positivo à base tributável do montante de € 667.968,41 (cfr. campo 779 do doc. n.º 11, e doc. n.º 5, ambos juntos com o pedido de pronúncia arbitral), relativo a encargos financeiros relacionados com a aquisição de partes de capital.
j) O apuramento dos referidos montantes de € 461.414,30 (2010), € 780.399,55 (2011), € 1.062.530,93 (2012) e € 667.968,41 (2013), relativos aos acréscimos positivos às bases tributáveis de encargos financeiros relacionados com a aquisição de partes de capital teve por base a metodologia prevista na Circular n.º 7/2004, de 30 de Março, da Direcção de Serviços do IRC.
k) Por não concordar com o conteúdo da referida Circular e face à jurisprudência entretanto conhecida sobre o tema, a Requerente contestou as referidas autoliquidações de IRC, tendo apresentado pedidos de revisão oficiosa quanto aos atos de autoliquidação relativos aos exercícios de 2010, 2011 e de 2012, e tendo apresentado reclamação graciosa contra o ato de autoliquidação relativo ao exercício de 2013.
l) Os pedidos de revisão oficiosa dos atos de autoliquidação relativos aos exercícios de 2010, 2011 e 2012 foram objeto de decisão de indeferimento (docs. n.ºs 12, 14 e 16 juntos com o pedido de pronúncia arbitral);
m) A AT indeferiu o pedido da Requerente com referência ao exercício de 2010 através de despacho da Subdiretora-Geral da DSIRC datado de 07/06/2017, com os seguintes fundamentos (cf. pp. 5 e ss. do documento 12 junto com o pedido de pronúncia arbitral):
“(…) com vista ao esclarecimento de dúvidas de interpretação e aplicação surgidas quanto ao regime fiscal das Sociedades Gestoras de Participações Sociais foi publicada a Circular n° 7/2004, de 03.03. da DSIRC.
15. lnterpretando e aplicando a lei, veio a referida Circular preconizar a utilização de um método de rateio, em perfeita sintonia com o pensamento do legislador, embora imperfeitamente expresso na lei. E, em obediência ao disposto no n.° 1 do artigo 12.° da LGT, aplica-se apenas aos factos tributários que se venham a concretizar após 01.01.2003, tal como decorre do n.° 5 do artigo 38.° da Lei n.° 32-8 , de 30.12.
16. O método previsto na Circular n.° 7/2004, de 30.03, permite apurar quais os montantes dos encargos financeiros das SGPS que não são dedutíveis:
17. O n.° 7 da referida Circular estabelece o método a utilizar para efeitos de afetação dos encargos financeiros às participações sociais nos seguintes termos: “(...) dada a extrema dificuldade de utilização, nesta matéria, de um método de afetação directa ou específica e a possibilidade de manipulação que o mesmo permitiria, deverá essa imputação ser realizada com base numa fórmula que atenda ao seguinte: os passivos remunerados da SGPS e SCR devem ser imputados, em primeiro lugar, aos empréstimos remunerados por estas concedidos às empresas participadas e aos outros investimentos geradores de juros, afectando-se o remanescente aos restantes actos, nomeadamente participações sociais, proporcionalmente ao respectivo custo de aquisição.”
18. Revela-se deste modo, que a Circular estabelece um método que permite a afetação dos passivos aos diferentes ativos das SGPS. Primeiro, afetam-se os passivos remunerados das SGPS aos investimentos geradores de juros. Depois, afeta-se o remanescente dos passivos aos restantes ativos, proporcionalmente ao respetivo custo de aquisição.
19. Sendo certo que a alteração introduzida pelo n.° 1 do artigo 38.° da Lei n.° 32-B/2002 de 30.12, no n.° 2 do atual artigo 32.° do EBF, dispõe apenas para o futuro e não tem eficácia retroativa, da conjugação do disposto nesta norma com o artigo 23.° do CIRC, resulta que os encargos financeiros alegadamente suportados pela recorrente no período de 2010, terão de ser acrescidos aos resultados líquidos referentes ao mesmo período, por não poderem concorrer para a formação do lucro tributável na medida em que os proveitos com eles relacionados, as mais-valias também não irão ser tributadas nesse período.
20. E assim decorre na medida em que, não preconizando o legislador quaisquer regimes transitórios, nem no que concerne ao momento da aquisição das participações de cuja alienação resultam as mais e menos-valias que passaram a não afetar os resultados fiscais, nem nada referindo quanto ao momento de celebração dos contratos dos quais decorram os encargos financeiros que igualmente passaram a não ser considerados no apuramento e determinação desses mesmos resultados fiscais então, para garantir o princípio de neutralidade que se pretendeu alcançar com a introdução do novo regime, o artigo 32.° do EBF, terá de ser aplicado a todos os factos tributários que ocorram a partir de 01.01.2003, sejam eles as mais e menos-valias beneficiárias do novo regime de exclusão de tributação, sejam os encargos financeiros incorridos, independentemente de os financiamentos para a aquisição das participações sociais terem sido contratados antes ou depois daquela data.
21. Na mesma medida em que para a desconsideração fiscal das mais e menos-valias não releva a data de aquisição das participações sociais mas a data de concretização do facto tributário, ou seja, a data em que essas mais e menos-valias são obtidas, também a não consideração dos encargos financeiros ocorre no momento em que efetivamente são incorridos/ suportados, independentemente da data de celebração dos contratos que lhe estão subjacentes, pois é nesse momento que os mesmos potencialmente irão afetar os resultados fiscais. A não ser assim, ostensivamente se violaria o princípio da neutralidade que o legislador pretendeu introduzir com este novo regime.
22. Ou seja, a referida Circular limitou-se a fazer a interpretação das novas regras jurídicas introduzidas pelos n° 1 e 5, do artigo 38.° da Lei n° 32-8/2002, de 30.12, no então artigo 31.°, atual artigo 32.° do EBF, ressaltando da sua análise que a mesma traduz um esforço de análise coerente, isenta e objetiva das normas jurídicas que lhe subjazem.
23. Em conformidade com o exposto, não se vislumbra na elaboração da referida Circular quaisquer vícios emergentes das suas instruções. Pois não se verifica qualquer intenção legislativa por parte da DSIRC, mormente pela instituição de quaisquer normas de incidência, de determinação de taxa e de liquidação, as únicas suscetíveis de violação do princípio da legalidade fiscal previsto no n° 1 do artigo 8° da LG, por decorrência dos n°s 2 e 3 do artigo 103° da CRP, nem se retirando das instruções vertidas naquela orientação genérica quaisquer intenções suscetíveis de adulterar ou violar as normas jurídicas que estão na sua génese.
24. Sobre a alegada violação do princípio da tributação segundo o rendimento real pela desconsideração dos encargos financeiros, importa salientar que tal não decorre das instruções emanadas da Circular, mas sim da interpretação que terá que ser dada ao disposto no artigo 32° do EBF, em resultado do quadro normativo- legal que regulamenta o regime de neutralidade aplicável as SGPS.
26. lmporta ainda salientar que por força do disposto no artigo 68°-A da LGT, “a administração tributária está vinculada às orientações genéricas constantes de circulares”. Termos em que, os serviços da inspeção tributária agiram no estrito cumprimento das orientações emanadas pela DSIRC.”
35. A Requerente vem ainda alegar a violação dos princípios da igualdade, neutralidade, capacidade contributiva e do princípio da proporcionalidade.
36. Por sua vez, e tal como refere o Acórdão n° 42/2014, de 09.01 do Tribunal Constitucional, nunca poderia estar violado o princípio da igualdade, na medida em que não poderíamos tratar por igual uma realidade que é desigual. Onde por um lado iria beneficiar da isenção de mais-valias, que seriam tributadas em 50% nas situações normais de IRC e por outro, beneficiaria da dedução dos encargos financeiros para a aquisição de partes de capital.
37. O que seria manifestamente desproporcional e existiria uma discriminação face aos normais regimes fiscais.
38. Com efeito, a ligação umbilical da mais-valia obtida aos encargos tidos em função da sua realização ou da potencialidade de ser realizada, vem consubstanciar uma lógica de neutralidade, o que se revela elementar no sentido de eventuais imputações à indedutibilidade dos juros correlacionados com a aquisição de partes de capital ou eventuais acréscimos do valor da realização da mais-valia em função da integração ou conversão de entradas em partes de capital.
39. Quanto ao argumento da incerteza da realização da mais-valia, e consequentemente da isenção da contribuição para a formação do lucro tributável, não comporta, neste campo valorativo, o resultado que a Requerente lhe atribui. Refere a este propósito o Acórdão n° 42/2014, de 09.01 do Tribunal Constitucional que: “Essa susceptibilidade ... em si mesma portadora de valor e assente numa perspectiva de implícita continuidade da actividade da SGPS.. persiste, ao contrário do que acontece com outros contribuintes, em termos de equilibrar - neutralizar - os encargos financeiros em que incorreu o contribuinte, cabendo na sua margem de determinação económica, no âmbito regular da sua actividade de gestão de participações sociais, a escolha quanto à conveniência e oportunidade da alienação de parte de capital e realização de mais-valias.”
(…)
Nessa medida, não se reputa de excessivo e intolerável o regime que pondere e faça atuar a indedutibilidade de encargos financeiros, em cada período de tributação em que são incorridos, por referência à medida que equilibra, tendo em atenção a preservação da possibilidade de efetiva e futura realização de mais-valias.
41. Tanto mais que a norma em apreço não exclui a eventualidade de correção dos custos não deduzidos em períodos tributários anteriores, caso a alienação de capital não revista os requisitos para aplicação do regime especial de isenção das mais-valias.
(…)
43. No que se refere as referências efetuadas à inconstitucionalidade da norma, cabe referir que nos termos do artigo 266° da Constituição da República Portuguesa (CRP), os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem atuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé.
48. Face ao exposto, não caberá, pois, à Administração Fiscal pronunciar-se sabre a inconstitucionalidade ou não de determinada norma, uma vez que, nos termos do artigo 202° da CRP, “os tribunais são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo”, sendo, o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 221° da CRP, “o tribunal ao qual compete especificamente administrar a justiça em matérias de natureza jurídico-constitucional” e, nos termos do artigo 223° da CRP, “compete ao Tribunal Constitucional apreciar a inconstitucionalidade e a ilegalidade, nos termos dos artigos 277° e seguintes.”
n) A Requerente interpôs recurso hierárquico da decisão proferida sobre o pedido de revisão oficiosa relativo ao exercício de 2010;
o) A AT indeferiu o recurso hierárquico relativo ao exercício de 2010 através de despacho de 27-06-2018 do Diretor-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, ao abrigo de Subdelegação de competências, considerando que “a decisão de indeferimento que recaiu sobre a petição de revisão oficiosa interposta não merece qualquer censura.” (cf. documento 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral);
p) A AT indeferiu o pedido de revisão oficiosa da Requerente relativo ao exercício de 2011 através de despacho da Subdiretora-Geral da AT, datado de 2017-06-08, com base nas seguintes conclusões (cf. pp. 17-18 do documento 14 junto com o pedido de pronúncia arbitral):
“Nos termos do disposto no art. 55° do CPPT, cabe a AT a emissão de orientações genéricas visando a uniformização da interpretação e aplicação das normas tributárias pelos serviços;
A Circular em causa mais não faz do que, em termos genéricos e perante duvidas surgidas, fazer a interpretação das novas regras jurídicas introduzidas pelos n.ºs 1 e 5, do art. 38.º, da Lei n.º 32-B/2002, de 30/12, no então art. 31.º , atual art.º 32.º, do EBF e, não prevendo a norma expressamente os métodos de cálculo para se atingir o seu desiderato acrescido da extrema dificuldade de proceder a uma afetação real/direta segura dos encargos financeiros às respetivas participações sociais, preconizar a utilização de um método de rateio dos custos financeiros a desconsiderar fiscalmente, em perfeita em perfeita sintonia com o pensamento do legislador;
Acresce, nos termos do disposto no artigo 68.º-A, da LGT, a Administração Tributária está vinculada às orientações genéricas constantes de Circulares, as quais configuram orientações genéricas sobre a interpretação e aplicação das normas tributárias, conforme a al. b) do n.º 3 do artigo 59.° da LGT, de onde, não pode a AT proceder de outro que não promover a sua aplicação.
Sem conceder,
Refira-se ainda que os valores apresentados nos quadros constantes na petição não se encontram suportados por documentos comprovativos dos mesmos, mormente documentos contabilísticos (registos e respetivo suporte documental, exceção feita à cópia das atas juntas à petição como documentos 7 e 8);
No tocante em particular às alegadas prestações acessórias, não está provado, nomeadamente, quando foram as mesmas efetuadas, como foram contabilizadas ou se o sócio recorreu, ou não, a financiamento para as efetuar, do qual resultem encargos financeiros na sua esfera.”
q) A Requerente interpôs recurso hierárquico do indeferimento do pedido de revisão oficiosa apresentado com referência ao exercício de 2011;
r) O recurso hierárquico relativo ao exercício de 2011 foi objeto de indeferimento por parte da AT, através de despacho proferido pelo respetivo Diretor-Geral em 28-06-2018, ao abrigo de Subdelegação de competências, considerou que “não se vislumbrando qualquer ilegalidade no despacho recorrido, deve ser mantida a decisão de indeferimento da revisão oficiosa, termos em que a presente petição não merece provimento, propondo-se, deste modo, o indeferimento do presente recurso hierárquico.” (cf. p. 15 do documento 15 junto com o pedido de pronúncia arbitral).
s) A AT indeferiu o pedido de revisão oficiosa da Requerente com referência ao exercício de 2012 através de despacho da Diretora de Serviços da DSIRC de 08-06-2017, com base nos seguintes fundamentos (cf. pp. 19 e ss. do documento 16 junto com o pedido de pronúncia arbitral):
“Nos termos do disposto no art. 55° do CPPT, cabe à AT a emissão de orientações genéricas visando a uniformização da interpretação e aplicação das normas tributárias pelos serviços;
A Circular em causa mais não faz do que, em termos genéricos e perante duvidas surgidas, fazer a interpretação das novas regras jurídicas introduzidas pelos n.ºs 1 e 5, do art. 38.º, da Lei n.º 32-B/2002, de 30/12, no então art. 31.º , atual art.º 32.º, do EBF e, não prevendo a norma expressamente os métodos de cálculo para se atingir o seu desiderato acrescido da extrema dificuldade de proceder a uma afetação real/direta segura dos encargos financeiros às respetivas participações sociais, preconizar a utilização de um método de rateio dos custos financeiros a desconsiderar fiscalmente, em perfeita em perfeita sintonia com o pensamento do legislador;
Acresce, nos termos do disposto no artigo 68.º-A, da LGT, a Administração Tributária está vinculada às orientações genéricas constantes de Circulares, as quais configuram orientações genéricas sabre a interpretação e aplicação das normas tributárias, conforme a al. b) do n.º 3 do artigo 59.° da LGT, de onde, não pode a AT proceder de outro que não promover a sua aplicação.
Sem conceder,
Refira-se ainda que os valores apresentados nos quadros constantes na petição não se encontram suportados por documentos comprovativos dos mesmos, mormente documentos contabilísticos (registos e respetivo suporte documental, exceção feita à cópia das atas juntas à petição como documentos 7 e 8);
No tocante em particular às alegadas prestações acessórias, não está provado, nomeadamente, quando foram as mesmas efetuadas, como foram contabilizadas ou se o sócio recorreu, ou não, a financiamento para as efetuar, do qual resultem encargos financeiros na sua esfera.
No que concerne ao pedido de juros indemnizatórios, entendendo-se não existir erro na autoliquidação resultante da observância do disposto na Circular n.º 7/2004, de 30 de março, resulta prejudicada a análise do mesmo.”
t) A Requerente interpôs recurso hierárquico da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa relativo ao exercício de 2012;
u) A decisão sobre o recurso hierárquico relativo ao exercício de 2012 foi proferida em 20-06-2018 pelo Subdiretor-Geral da AT, ao abrigo de Subdelegação de competências, considerando que “não se vislumbrando qualquer ilegalidade no despacho recorrido, deve ser mantida a decisão de indeferimento da revisão oficiosa, termos em que a presente petição não merece provimento, propondo-se, deste modo, o indeferimento do presente recurso hierárquico.” (cf. p. 16 do documento 17 junto com o pedido de pronúncia arbitral).
v) A reclamação graciosa contra o ato de autoliquidação relativo ao exercício de 2013 foi objeto de despacho de indeferimento proferido a 25-09-2017 pelo Diretor adjunto de Direção de Finanças, ao abrigo de Delegação de competências (doc. n.º 18 junto com o pedido de pronúncia arbitral) com base nos seguintes fundamentos:
“(…) a desconsideração dos encargos financeiros prevista no art. 32.º, n.º 2 do EBF visava contrabalançar o benefício fiscal consubstanciado no tratamento privilegiado das mais-valias obtidas na alienação de participações sociais por parte das SGPS.
Com vista ao esclarecimento desta matéria foi sancionado entendimento na Circular n.º 7/2004, de 30 de março, da DSIRC.
Determina a referida Circular, ora contestada pela Reclamante na sua aplicação ao caso em apreço que, no exercício a que os encargos financeiros disserem respeito, dever-se-á proceder à correção fiscal dos que tiverem sido suportados com a aquisição de participações sociais, suscetíveis de beneficiar do regime do art. 32.º do EBF.
(…)
Quanto à apreciação da constitucionalidade das leis, não cabe em sede de reclamação graciosa, cabendo esta ao Tribunal Constitucional de acordo com a sua Lei Orgânica.
Pelo que se conclui que se nos afigura correta a liquidação n.º 2014..., ora reclamada.
Acrescenta-se ainda que, por não se verificarem in casu os pressupostos do n.º 1 do art. 43.º da LGT, não assiste à reclamante o direito a juros indemnizatórios.”
w) O indeferimento da reclamação graciosa relativa ao exercício de 2013 foi objeto de recurso hierárquico apresentado pela Requerente;
x) O recurso hierárquico foi igualmente objeto de indeferimento através de decisão de 25-06-2018 por parte do Diretor de Serviço Central, ao abrigo de Subdelegação de competências, com os seguintes fundamentos (cf. pp. 27 e ss. do documento 19 junto com o pedido de pronúncia arbitral)
“Nos termos do disposto no art. 55.° do CPPT, cabe à AT a emissão de orientações genéricas visando a uniformização da interpretação e aplicação das normas tributárias pelos serviços.
A Circular em causa mais não faz do que, em termos genéricos e perante dúvidas surgidas, fazer a interpretação das novas regras jurídicas introduzidas pelos n.ºs 1 e 5, do art. 38.º, da Lei n.º 32-B/2002, de 30/12, no então art. 31.º , atual art.º 32.º, do EBF e, não prevendo a norma expressamente os métodos de cálculo para se atingir o seu desiderato acrescido da extrema dificuldade de proceder a uma afetação real/direta segura dos encargos financeiros às respetivas participações sociais, preconizar a utilização de um método de rateio dos custos financeiros a desconsiderar fiscalmente, em perfeita em perfeita sintonia com o pensamento do legislador;
Acresce, nos termos do disposto no artigo 68.º-A, da LGT, a Administração Tributária está vinculada às orientações genéricas constantes de Circulares, as quais configuram orientações genéricas sabre a interpretação e aplicação das normas tributárias, conforme a al. b) do n.º 3 do artigo 59.° da LGT, de onde, não pode a AT proceder de outro que não promover a sua aplicação.
Sem conceder, e no tocante ao pedido subsidiário apresentado pela Recorrente,
Atento o regime jurídico que regula a atividade da Recorrente enquanto Sociedade Gestora de Participações Sociais (que quase limita a obtenção de rendimentos aos dividendos recebidos das participadas e aos rendimentos das eventuais alienações de participações detidas) e os elementos constantes na IES apresentada com referência a 2013, nomeadamente a inexistência de ativos tangíveis de relevo, a existência de financiamentos obtidos em montante avultado, a existência de juros e gastos similares suportados referentes a empréstimos bancários, a inexistência de juros e rendimentos similares obtidos,
Conclui-se não estar demonstrada a inaplicabilidade da Circular n.º 7/2004, de 30 de março, defendida pela Recorrente, antes se afigura estarmos na presença de um caso em que a contingência de uma manipulação de resultados decorrente da extrema dificuldade em determinar com rigor a aplicação específica dos capitais obtidos, em razão da característica fungível própria da moeda, está presente.
Situação que a Circular em questão pretende obviar.
Acresce que a metodologia adotada pela recorrente para apuramento dos encargos financeiros não dedutíveis não explica a razão pela qual a Recorrente apresenta ao longo dos anos saldos avultados de empréstimos bancários contraídos (…);
Por fim, os elementos constantes dos quadros apresentados na p.i. que justificam o pedido subsidiário da Recorrente não se encontram cabalmente suportados por documentos comprovativos dos mesmos;
Sendo que, em particular no tocante às alegadas prestações acessórias, os documentos juntos não logram comprovar o alegado, nomeadamente porque não abarcam a totalidade dos registos contabilísticos concernentes (e bem assim a sua manutenção nas peças contabilísticas de fecho de ano), a que acresce cingirem-se exclusivamente a documentos internos, não tendo sido junta qualquer documentação externa que imprima efetiva força probatória aos primeiros, desde logo documentos externos de comprovação do fluxo financeiro subjacente à realização das alegadas prestações acessórias.
Situação que redunda na inobservância do disposto no artigo 74.º da LGT que estatui que o ónus da prova dos factos constitutivos impende sobre quem os invoca; no caso a Requerente.
In fine, no que tange ao pedido de juros indemnizatórios, entendendo-se não existir erro na autoliquidação resultante da observância do disposto na Circular n.º 7/2004, de 30 de março, resulta prejudicada a análise do mesmo”.
y) As autoliquidações de IRC dos períodos de 2010, 2011, 2012 e 2013 foram integralmente pagas (cfr. docs. n.ºs 2, 3, 6, 8 e 10 e docs. n.ºs 45 a 48 juntos com o pedido de pronúncia arbitral).
III.1.1. Factos não provados
Não se provaram outros factos com relevância para a decisão arbitral.
III.1.2. Fundamentação da matéria de facto
O Tribunal não tem que se pronunciar sobre todos os detalhes da matéria de facto que foi alegada pelas partes, cabendo-lhe o dever de selecionar os factos que interessam à decisão e discriminar a matéria que julga provada e declarar a que considera não provada (cfr. artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).
Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são selecionados e conformados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções para o objeto do litígio no direito aplicável (artigo 596.º, n. 1 do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º, n.º 7 do CPPT, à prova documental que para mais consta do próprio processo administrativo, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.
O Tribunal não formula juízo probatório sobre a forma de aquisição das participações sociais detidas pela Requerida e encargos financeiros por ela eventualmente suportados com a sua aquisição, uma vez que, como melhor será analisado mais adiante, atenta a fundamentação que presidiu às decisões de indeferimento dos recursos hierárquicos, indeferimento do pedido de revisão oficiosa e da reclamação graciosa, a questão colocada é essencialmente de direito e deriva da errada aplicação pela Requerida da Circular n.º7/2004, segundo jurisprudência do STA, em especial no que concerne ao ónus da prova.
III. 2.Do Direito
III.2.1. As questões decidendas
A questão prioritária colocada pela Recorrente ao Tribunal é a do apuramento da legalidade da aplicação dos métodos indiretos estabelecidos na Circular n.º 7/2004, por violação do artigo 32.º do EBF – no dizer da Requerente no seu Pedido de Pronúncia Arbitral (artigos 38.º e 39.º): “a requerente entende que o recurso à fórmula da Circular n.º 7/2004 é ilegal, e mais ilegal ainda quando prescinde à cabeça de uma afectação real e segue directamente para a aplicação da fórmula determinada pela DSIRC” e “Daí que adiante seja abordada em primeiro lugar esta ilegalidade.”
A Requerente suscita ainda as questões de saber o que é que se qualifica como aquisição de partes de capital (para efeitos, designadamente, do artigo 32.º, n.º 2, do EBF), e se os métodos de imputação estabelecidos na Circular são, ou não, legal e constitucionalmente conformes.
III.2.1.1. Ilegalidade da Circular n.º 7/2004, de 30 de Março, da DSIRC, por violação do disposto no artigo 32.º, n.º2, do EBF
Estabelecia o artigo 32.º, n.º 2, do EBF, na redação vigente em 2010 (exercício a que se reporta a autoliquidação de IRC sub judice), que “As mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS, pelas SCR e pelos ICR de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por período não inferior a um ano, e, bem assim, os encargos financeiros suportados com a sua aquisição não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades” – destaques nossos.
Por seu turno, a Circular n.º 7/2004 estabelece no seu ponto 7 o seguinte:
“Método a utilizar para efeitos de afectação dos encargos financeiros às participações sociais
7. Quanto ao método a utilizar para efeitos de afectação dos encargos financeiros suportados à aquisição de participações sociais, dada a extrema dificuldade de utilização, nesta matéria, de um método de afectação directa ou específica e à possibilidade de manipulação que o mesmo permitiria, deverá essa imputação ser efectuada com base numa fórmula que atenda ao seguinte: os passivos remunerados das SGPS e SCR deverão ser imputados, em primeiro lugar, aos empréstimos remunerados por estas concedidos às empresas participadas e aos outros investimentos geradores de juros, afectando-se o remanescente aos restantes activos, nomeadamente participações sociais, proporcionalmente ao respectivo custo de aquisição.”
Quanto à ilegalidade da Circular, por ter sido abordada na Decisão Arbitral proferida a 10 de Abril de 2018, no âmbito do processo n.º 333/2017-T, passamos a reproduzir o que então se escreveu:
“Neste n.º 2 do artigo 32.º do EBF estabelece-se que não concorrem para a formação do lucro tributável os «encargos financeiros suportados com a sua aquisição», reportando-se às partes de capital, pelo que é manifesto que o seu teor literal indica que tão só os encargos financeiros que estejam conexionados com a aquisição de participações sociais são abrangidos pela indedutibilidade que aí se estabelece.
Para além de ser esta a interpretação que resulta do teor literal, ela é corroborada pela explicação para a sua introdução no EBF que foi dada no Relatório do Orçamento do Estado para 2003 (Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro).
Na verdade, como se refere na Circular n.º 7/2004, o regime desta norma foi introduzido no EBF pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2003, então no artigo 31.º, cujo regime passou a constar do artigo 32.º depois da renumeração operada pelo Decreto-Lei n.º 108/2008, de 26 de Junho.
Na Proposta de Lei n.º 28-IX, que veio a dar origem à Lei do Orçamento para 2003, constava esse artigo 31.º, n.º 2, com redacção idêntica à vigente em 2011 (no artigo 32.º, n.º 2), sendo a única diferença o aditamento da referência aos «ICR» (abreviatura de «investidores de capital de risco»), que é irrelevante para a interpretação da norma.
No referido Relatório do Orçamento do Estado para 2003 ( ) anuncia-se a introdução desta norma, tendo em vista o «alargamento da base tributável e medidas de moralização e neutralidade», nos seguintes termos:
«Estabelece-se a desconsideração da dedutibilidade, para efeitos de determinação do lucro tributável, dos encargos de natureza financeira directamente associados à aquisição de partes sociais por parte das SGPS»;
É inequívoco, assim, que se pretendeu que apenas os encargos financeiros directamente associados à aquisição de partes sociais ficassem abrangidos pela indedutibilidade. (…)
Por aquela referência expressa no Relatório à necessidade de os encargos financeiros estarem directamente associados à aquisição de partes sociais (que também está expressa no texto da norma através da referência aos «encargos financeiros com a sua aquisição»), conclui-se que não basta para determinar a indedutibilidade de encargos financeiros o facto de a SGPS ser titular de participações sociais, sendo necessário demonstrar que há uma relação directa entre certos encargos financeiros e a aquisição de determinadas participações sociais.
É corolário desta interpretação, imposta pelo teor literal do artigo 32.º, n.º 2, que, se determinadas participações não foram adquiridas com passivos geradores de encargos financeiros, elas são irrelevantes para efeito da aplicação daquela norma, na parte que se reporta à indedutibilidade de encargos financeiros.
Não há assim suporte legal para afastar a regra da dedutibilidade de encargos financeiros, que consta da al. c) do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, em relação a encargos que não estão directamente associados à aquisição de participações sociais.
Por outro lado, mesmo que se entendesse (como estará subjacente ao ponto 7 da Circular n.º 7/2004, mas também sem apoio no texto da lei) que aquele artigo 32.º, n.º 2, tem ínsita uma presunção de que há associação entre encargos financeiros e a aquisição de participações sociais, essa hipotética presunção sempre admitiria prova em contrário, por força do disposto no artigo 73.º da LGT, que se reporta a normas de incidência em sentido lato, que abrange todas as que «definem o plano de incidência, ou seja, o complexo de pressupostos de cuja conjugação resulta o nascimento da obrigação de imposto, assim como os elementos da mesma obrigação». Neste sentido, são normas de incidência as que determinam os sujeitos activo e passivo da obrigação tributária, as que indicam qual a matéria tributável ou colectável, a taxa e os benefícios fiscais. ( ) (…)
Sendo este o regime que está previsto na lei, ele não pode ser alterado por via regulamentar, pois preceitos criados por actos de natureza legislativa não podem ser, com eficácia externa, interpretados, integrados, modificados, suspensos ou revogados por actos de outra natureza (artigo 112.º, n.º 5, da CRP).
Para além disso, a definição dos pressupostos da tributação é matéria sujeita ao princípio da legalidade, desde logo por força do disposto no artigo 103.º, n.º 2, da CRP que estabelece que «os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes».”
Acontece que, mais recentemente, esta orientação tem obtido acolhimento na jurisprudência do STA, que uniformemente tem reiterado, como se segue, tomando por referência o Acórdão de 24 de Janeiro de 2018, proferido no âmbito do processo n.º 0745/15 , o qual se passa a reproduzir:
“Tal questão foi já decidida nesta Secção do Supremo Tribunal Administrativo nos acórdãos proferidos em 8/03/2017, no proc. nº 0227/16, de 31/05/2017, no proc. nº 01229/15, e de 29/11/2017, no proc. nº 01292/16, nos quais, com fundamentação que merece a nossa adesão, se concluiu no sentido da correcção do julgado, isto é, que estabelecendo um método indirecto e presuntivo, no que diz respeito à afectação de encargos financeiros para efeitos de cálculo do lucro tributável, o nº 7 da Circular nº 7/2004 afronta o princípio da legalidade tributária.
Deste modo, e atendendo também à regra constante nº 3 do art.º 8º do C.Civil – que impõe ao julgador o dever de considerar todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito – bem com à falta de nova argumentação que nos leve a inflectir ou a divergir do entendimento ali firmado, limitar-nos-emos a remeter para a fundamentação que consta do acórdão proferido no proc. nº 0227/16, que aqui se acolhe e subscreve na íntegra.
“«No essencial, a recorrente pede a este Supremo Tribunal que diga se o disposto no ponto 7. da Circular nº 7/2004, de 30.03, da DSIRC - Método a utilizar para efeitos de afectação dos encargos financeiros às participações sociais (7. Quanto ao método a utilizar para efeitos de afectação dos encargos financeiros suportados à aquisição de participações sociais, dada a extrema dificuldade de utilização, nesta matéria, de um método de afectação directa ou específica e à possibilidade de manipulação que o mesmo permitiria, deverá essa imputação ser efectuada com base numa fórmula que atenda ao seguinte: os passivos remunerados das SGPS e SCR deverão ser imputados, em primeiro lugar, aos empréstimos remunerados por estas concedidos às empresas participadas e aos outros investimentos geradores de juros, afectando-se o remanescente aos restantes activos, nomeadamente participações sociais, proporcionalmente ao respectivo custo de aquisição.) - se traduz ou não, num método não conforme à Lei constitucional e ordinária, para efeitos de afectação dos encargos financeiros às participações sociais.
Tanto na sentença recorrida, como nas alegações da recorrente, não há divergência sobre a natureza das regras contidas em tal Circular, trata-se de instruções genéricas que não são mais do que meras orientações administrativas que apenas vinculam a Administração, cfr. artigo 55º do CPPT e 68º-A da LGT.
Ou seja, não têm uma dimensão erga omnes, tal como as leis editadas pelo Parlamento e pelo Governo e, consequentemente, não vinculam os contribuintes e, especialmente, os Tribunais, cfr. nº 3 daquele artigo 55º, estando o seu campo de aplicação obrigatório confinado à actuação da administração tributária que procedeu à sua emissão.
[…]
Da leitura atenta que se faz daquele ponto 7, cuja legalidade vem questionada nos presentes autos, pode-se surpreender com facilidade que o método escolhido pela AT se assume como um método indirecto de afectação dos encargos, em contraposição a um método directo, motivado pela dificuldade de utilização de um método de afectação directa ou específica e pela possibilidade de manipulação que o mesmo permitiria.
Ou seja, a AT, face às dificuldades sentidas de integração do disposto naquele artigo 32º do EBF, desinteressou-se pela obtenção da verdade dos factos, pilar da tributação sobre o rendimento real, cfr. artigo 104º, n.º 2, da CRP, e assumiu como único método aceitável o que parte de uma presunção de que os passivos remunerados das SGPS e SCR devem ser afectos liminarmente e de forma prioritária a empréstimos remunerados a participadas e outros investimentos geradores de juros e, no remanescente, aos demais activos, proporcionalmente ao respectivo custo de aquisição.
Portanto, a recorrente ao seguir as orientações genéricas da AT, a que não estava obrigada, lançou mão de um método indirecto, presuntivo, de afectação de encargos financeiros, mas como bem refere a própria AT na decisão do recurso hierárquico, de nada lhe valeria (à recorrente) fazer de modo diferente porque, caso o fizesse, seria sempre corrigida a sua liquidação nos precisos termos daquelas orientações genéricas existentes, cfr. pág. 39 dos autos, parágrafo 2º.
Aliás, seguindo os contribuintes as orientações da AT, desde que conformes à lei, nas suas autoliquidações, evitam posteriormente dissabores e incómodos no tocante à regularização da sua situação tributária.
Na situação dos autos não vem concretamente explicada a razão pela qual (não) se poderia efectuar a afectação dos encargos financeiros por outro modo (directo), diferente daquele que foi efectivamente utilizado (indirecto), não o explica a recorrente, nem o explica a AT, ambas se limitam a referir que o método utilizado é o determinado pela Circular em questão. E a sentença bastou-se com o facto de a recorrente na autoliquidação ter seguido o método que para si não era obrigatório.
Tratando-se a avaliação indirecta de uma operação sem correspondência com a verdade dos factos, precisamente porque estes não são possíveis de determinar com segurança e certeza, ou porque há indícios muito fortes (a quase certeza) de que os factos evidenciados pelo contribuinte, e que devem servir de fundamento à determinação da matéria tributável, não são verdadeiros, previu o legislador, de forma taxativa, as concretas situações em que é possível o recurso a tais métodos indirectos nos artigos 87º a 90º da LGT.
Portanto, a “norma” emitida pela AT não pode ser considerada de per si, de forma isolada, sem qualquer relação com uma concreta situação de determinado contribuinte, como se tratando de método de afectação ilegal e proibido; se houver razões que justifiquem a sua aplicação, pode tratar-se de método idóneo a efectuar a respectiva afectação, mas se não se verificarem tais razões, trata-se de método inadequado de proceder a essa mesma afectação.
Já vimos que no caso dos autos nada se diz a esse respeito, isto é, nada se diz da possibilidade ou impossibilidade de aplicação de um método de afectação directo, tem-se por bom o método de afectação indirecto, de forma acrítica e sem conexão intima com a situação concreta da contribuinte.
Contudo, não vindo expressamente invocado pela AT que no caso concreto da recorrente se imponha o recurso a um método de avaliação indirecto, o que lhe competia nos termos do disposto no artigo 74º, n.º 3 da LGT, em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação-, não se pode valer da dita “norma administrativa” da Circular em análise para manter a autoliquidação efectuada de acordo com a mesma.
É certo que as “normas administrativas” constantes da circular que se analisa foram emitidas, precisamente, face às dificuldades e dúvidas quanto à possibilidade de utilização de um método de afectação directa e à possibilidade de haver manipulação desse mesmo método por parte dos contribuintes, no entanto a aplicação de métodos indirectos, quaisquer que eles sejam, de forma generalizada e sem ser tida em conta a situação individual concreta de que cada contribuinte está proibida por lei, resultando essa proibição do disposto nos artigos 104º, n.º 2 da CRP, 81º, n.º 1 e 85º da LGT, e, como também já vimos, as ditas “normas administrativas” não prevalecem sobre qualquer um daqueles preceitos legais, cfr. artigo 112º, n.º 5 da CRP.
Temos, assim, que concluir pela razão da recorrente no que toca a pretender que não se aplique à sua situação concreta o disposto naquele n.º 7 da dita Circular 7/2004, mostrando-se afectada por vício de violação de lei a autoliquidação efectuada.
De resto, o facto de a própria recorrente ter procedido à autoliquidação do imposto, segundo as regras estabelecidas pela AT, não implica que tal seja admissível ou lhe seja oponível, desde logo porque aos contribuintes não assiste o direito de apresentar as suas declarações de rendimentos lançando mão de métodos indirectos que não tenham uma correspondência directa e imediata com a sua realidade contabilística, o que se impõe por força dos princípios da tributação das empresas pelo rendimento real e da igualdade, segundo os quais, todos, e cada um, contribuirão coactivamente para a receita do Estado segundo as suas possibilidades e na medida do esforço que lhes possa ser exigido, cfr. artigo 103º, n.º 1, da CRP.
E já vimos que, o uso de tais métodos indirectos, apenas é consentido à AT nas situações enumeradas na lei e segundo os parâmetros legalmente estabelecidos, neste caso, para salvaguarda da receita do Estado, assim se conseguindo a distribuição do sacrifício, na medida do possível, por todos os contribuintes.»”.
Aplicando o exposto ao caso em análise, a Requerente fez aplicação dos critérios da Circular n.º 7/2004 nas suas declarações referentes aos exercícios de 2010 a 2013. Posteriormente apresentou pedidos de revisão oficiosa dos atos tributários de autoliquidação referentes aos exercícios de 2010 a 2012, e de reclamação graciosa do ato tributário de autoliquidação referente ao período de 2013. Em cada um desses pedidos apresentou argumentação tendente a demonstrar, a título subsidiário, que a aplicação dos critérios fixados na Circular não quadrava à evolução da sua carteira de participações sociais e aos montantes do seu endividamento.
Perante o indeferimento dos referidos pedidos de revisão oficiosa e da reclamação graciosa, apresentou os correspetivos recursos hierárquicos em que, após invocar, a título de pedido principal, a ilegalidade e inconstitucionalidade da Circular n.º 7/2004, voltou a invocar, a título de pedido subsidiário, que, ou não tinha havido recurso a crédito para a aquisição de, pelo menos, parte das participações sociais, ou a situação em causa não se reconduzia a isso, razões pelas quais apresentou pedidos subsidiários de redução dos valores desconsiderados.
Acontece que, com mais ou menos ponderação das razões invocadas pela requerente, em todos os casos a AT se considerou obrigada a aplicar os critérios contidos na Circular.
O entendimento da AT – que em todas as situações (indeferimento dos pedidos de revisão oficiosa, de reclamação graciosa, de recurso hierárquico, de resposta ao PPA e de alegações) defendeu a legalidade e adequação dos citérios estabelecidos na Circular n.º 7/2004 – foi o de que na ausência de demonstração por parte da Requerente de que o recurso a tais critérios era inadequado, o seu uso pela AT era legítimo.
A posição final da AT em relação ao pedido subsidiário foi a de que a Requerente “não conseguiu provar que seriam mais favoráveis do ponto de vista fiscal os resultados alcançados, em termos de encargos financeiros associados à aquisição de partes de capital abrangidas pelo n.º 2 do art.º 32.º do EBF, com a utilização do método de identificação específica dos encargos financeiros suportados no exercícios de 2010, 2011, 2012 e 2013, na medida em que não procedeu a uma aplicação analítica e discriminada dos seus recursos - capitais alheios e fundos próprios - devidamente definida, documentada e justificada.”
Concluindo a Requerida que tal “situação redunda na inobservância do disposto no artigo 74.º da LGT, que estatui que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos impende sobre quem os invoca; no caso a recorrente”.
Em sentido oposto, entendeu a Requerente que a legitimidade de aplicação de tais critérios dependia do cumprimento, pela AT, do ónus de prova da impossibilidade de apuramento direto dos valores a considerar, como lhe é imposto pelo artigo 74.º, n.º 3, da LGT: “Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação.” (negrito aditado).
Impõe-se, desta forma, determinar se, no caso de autoliquidação que tenha aplicado a Circular n.º7/2014 o ónus de demonstrar, e sempre por referência às circunstâncias do caso concreto, que não há alternativa ao método presuntivo da Circular recai sobre a Requerente ou sobre a Requerida.
A este propósito importa relembrar os termos do decidido no Acórdão do STA de 24 de Janeiro de 2018, no processo n.º 0745/15:
“Portanto, a recorrente ao seguir as orientações genéricas da AT, a que não estava obrigada, lançou mão de um método indirecto, presuntivo, de afectação de encargos financeiros, mas como bem refere a própria AT na decisão do recurso hierárquico, de nada lhe valeria (à recorrente) fazer de modo diferente porque, caso o fizesse, seria sempre corrigida a sua liquidação nos precisos termos daquelas orientações genéricas existentes, cfr. pág. 39 dos autos, parágrafo 2º. (...)
Contudo, não vindo expressamente invocado pela AT que no caso concreto da recorrente se imponha o recurso a um método de avaliação indirecto, o que lhe competia nos termos do disposto no artigo 74º, n.º 3 da LGT, em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação, não se pode valer da dita “norma administrativa” da Circular em análise para manter a autoliquidação efectuada de acordo com a mesma.
Ou seja, resulta do supra exposto que, ao contrário do alegado pela Requerida, o ónus da prova da impossibilidade de recurso a método directo impendida sobre si e não foi satisfeito, no caso em apreço, acabando por confirmar as autoliquidações fixadas com base no recurso aos métodos indiretos fixados na Circular n.º 7/2004.
Nestes termos, considera este Tribunal que as autoliquidações efetuadas pela Requerente em obediência aos critérios de imputação de financiamentos fixados no ponto 7 da dita Circular não se podem manter.
III.2.1.2. Pedidos prejudicados
O estabelecimento de uma ordem de conhecimento de vícios no contencioso tributário, nos termos previsto no artigo 124.º, tem ínsito o entendimento legislativo que, se for julgado procedente algum vício que confira estável e eficaz tutela dos direitos do contribuinte, fica prejudicado, por inútil, o conhecimento de outros vícios que sejam imputados ao ato impugnado.
Ficam assim prejudicadas as demais questões que supra se enunciaram : saber o que é que se qualifica como aquisição de partes de capital para efeitos do artigo 32.º, n.º 2, do EBF e as questões de inconstitucionalidade suscitadas.
III.2.2. Pedido de reembolso das quantias pagas e juros indemnizatórios
Peticionou a Requerente o pagamento de juros indemnizatórios sobre o montante de imposto indevidamente pago, no valor de € 743.078,30, contados desde o seu pagamento em 30 de maio de 2014, até ao integral reembolso. Invocou, designadamente, que “o erro dos Serviços é uma realidade concreta que vai para além da sua mera imputação legal, tendo assumido a forma de orientação genérica constante da Circular n.º 7/2004 (cfr. artigo 43.º, n.º 2, da LGT), sendo que acresce que a partir do momento em que foram indeferidos os pedidos de revisão oficiosa e reclamação graciosa e posteriormente os recursos hierárquicos este erro imputável aos Serviços agravou-se ainda mais.”
Por sua vez, a AT invocou que “na situação em apreço nos autos o cômputo dos juros indemnizatórios teria como termo inicial a data em que ocorreram as decisões que indeferiram as revisões oficiosas”.
Está em causa, no fundo, a interpretação a dar ao disposto no artigo 43.º da LGT, que dispõe o seguinte sob a epígrafe “Pagamento indevido da prestação tributária”:
1 - São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
2 - Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar de a liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.
3 - São também devidos juros indemnizatórios nas seguintes circunstâncias:
a) Quando não seja cumprido o prazo legal de restituição oficiosa dos tributos;
b) Em caso de anulação do acto tributário por iniciativa da administração tributária, a partir do 30.º dia posterior à decisão, sem que tenha sido processada a nota de crédito;
c) Quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária.
d) Em caso de decisão judicial transitada em julgado que declare ou julgue a inconstitucionalidade ou ilegalidade da norma legislativa ou regulamentar em que se fundou a liquidação da prestação tributária e que determine a respetiva devolução.
(…).
Das várias situações em que são devidos juros indemnizatórios indicadas no artigo 43.º da LGT, haverá lugar aos mesmos se se entender que ocorreu erro imputável aos serviços.
No caso em apreço, os impostos indevidamente pagos foram autoliquidados, pelo que a Autoridade Tributária e Aduaneira não teve qualquer intervenção na prática dos atos em que se baseou o pagamento, sendo à própria Requerente que é imputável a sua prática.
Como se pode ler, entre outros, na Decisão Arbitral proferida no processo n.º 208/2015-T, reproduzida no Processo Arbitral n.º 333/2017-T: “Por isso, quanto ao acto de autoliquidação, não ocorreu erro imputável aos serviços, não havendo, consequentemente direito a juros indemnizatórios derivado da sua prática.
No entanto, o mesmo não sucede com a decisão da reclamação graciosa, pois deveria ter sido acolhida a pretensão da Requerente, quanto à ilegalidade das autoliquidações e o não acolhimento das pretensões é imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira.
Este caso de a Autoridade Tributária e Aduaneira manter uma situação de ilegalidade, quando devia repô-la deverá ser enquadrada, por mera interpretação declarativa, no n.º 1 do artigo 43.º da LGT, pois trata-se de uma situação em que há nexo de causalidade adequada entre um erro imputável aos serviços e a manutenção de um pagamento indevido e a omissão de reposição da legalidade quando se deveria praticar a acção que a reporia deve ser equiparada à acção ( ).”
Sobre o tema Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Vol. I, 6.ª edição, Áreas Editora, Lisboa, p. 537, escreve: “Nas situações em que a prática do acto que define a dívida tributária cabe ao contribuinte (como sucede, nomeadamente, nos referidos casos de autoliquidação (…)) (…) o erro passará a ser imputável à Administração Tributária após o eventual indeferimento da pretensão apresentada pelo contribuinte, isto é, a partir do momento em que, pela primeira vez, a Administração Tributária toma posição sobre a situação do contribuinte, dispondo dos elementos necessários para proferir uma decisão com pressupostos correctos. Será indiferente, para este efeito de imputabilidade do erro, gerador de dívida de juros indemnizatórios, que se trate de caso de impugnação administrativa necessária ou facultativa, pois, em qualquer dos casos, a decisão da impugnação (reclamação graciosa ou recurso hierárquico) é um acto da autoria da Administração Tributária, pelo que o eventual erro ser-lhe-á imputável, a partir do momento em que o praticou”.
As considerações acima mencionadas podem ser transpostas para o caso em apreço com as devidas adaptações.
A responsabilidade a ser imputada à AT só se inicia no momento em que, como ela própria referiu, “ocorreram as decisões que indeferiram as revisões oficiosas” (e, acrescente-se, aquela em que foi indeferida a reclamação graciosa interposta).
Assim sendo, por aplicação da jurisprudência e doutrina atrás referidas, a Requerida teve oportunidade de repor a legalidade e acolher a pretensão da Requerente. Não o tendo feito, deverá entender-se que são devidos juros indemnizatórios a partir das decisões dos pedidos de revisão e de reclamação graciosa dos actos tributários por iniciativa do contribuinte, em consonância com a lógica do artigo 43.º, n.º 3, alínea c), da LGT: “São também devidos juros indemnizatórios nas seguintes circunstâncias: (…) c) Quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária.”
Assim o decidiu recentemente o STA, em 6 de Dezembro de 2017, por Acórdão no Processo 0926/17 : “(…) o princípio da igualdade impõe tratamento semelhante entre o contribuinte cujo pedido de revisão obtém êxito, para além do prazo de um ano, junto da administração, e o contribuinte que obtém idêntico resultado, também para além desse prazo, junto do tribunal. Em qualquer dos casos, a demora de mais de um ano é imputável à administração e deriva da prática de acto ilegal: ou porque tardou a dar razão ao contribuinte ou porque não lha deu e veio a revelar-se que o devia ter feito.”.
No que se refere ao pedido de reembolso, a Requerente tem direito à reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, nos termos do disposto no artigo 100.º da LGT. Pelas razões constantes do ponto II remete-se para a Requerida o cálculo do montante de imposto a reembolsar em sede de execução de sentença.
IV. Decisão
Termos em que acorda o presente Tribunal em:
a) Julgar procedente o pedido arbitral de declaração de ilegalidade das decisões de indeferimento dos recursos hierárquicos, das precedentes decisões de indeferimento dos pedidos de revisão oficiosa (2010, 2011 e 2012), e da reclamação graciosa (2013), na medida em que desatendem o reconhecimento da ilegalidade da supra referida parte das autoliquidações de IRC dos exercícios de 2010 a 2013, inclusive;
b) Anular as autoliquidações de IRC referentes aos exercícios de 2010, 2011, 2012 e 2013 do Grupo Fiscal na estrita medida em que desconsideram a dedução de encargos financeiros nos montantes de € 461.414,30 (2010), € 780.399,55 (2011), € 1.062.530,93 (2012) e € 667.968,41 (2013);
c) Julgar procedente o pedido de juros indemnizatórios, contados desde a data do indeferimento dos pedidos de revisão oficiosa e da reclamação graciosa respetivas;
d) Condenar a Requerida na restituição do imposto indevidamente pago no montante que vier a ser apurado em sede de execução de sentença.
V. Valor do Processo
De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, e 297.º, n.º 2 do C.P.C., do artigo 97.º-A, n.º 1, al. a) do C.P.P.T. e do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 743.078,30.
VI. Custas
De acordo com o previsto nos artigos 22.º, n.º 4, e 12.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem, no artigo 2.º, no n.º 1 do artigo 3.º e nos n.ºs 1 a 4 do artigo 4.º do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, bem como na Tabela I anexa a este diploma, fixa-se o valor global das custas em € 10.710,00 (dez mil setecentos e dez euros), a suportar pela Requerida.
Notifique-se.
Lisboa, 18 de Junho de 2019
Os árbitros,
Fernanda Maçãs (presidente)
Raquel Franco (Vogal)
Artur Silva (Vogal)