DECISÃO ARBITRAL
I. RELATÓRIO
A..., S.A., titular do número único de matrícula e de pessoa colectiva..., com sede em ..., freguesia de ... (...), concelho de ..., Distrito de Coimbra, veio, nos termos do artigo 10.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico de Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado RJAT), requerer a constituição de Tribunal Arbitral singular, em que é requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante AT ou Requerida, com vista à declaração de ilegalidade e consequente anulação do acto tributário de liquidação de Imposto sobre os Produtos Petrolíferos (ISP) n.º 2018/..., identificado nos autos, no valor de €18.636,44 relativo ao ano 2015.
Nos termos do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Tribunal Arbitral singular foi constituído em 18 de Fevereiro de 2019.
A AT respondeu, defendendo que o pedido deve ser julgado improcedente.
Em face do teor da matéria contida nos autos, foi dispensada a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT e a realização de alegações finais.
O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas e estão representadas (artigo 4.º, n.º 2 do artigo 10 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112/2011, de 22 de Março).
Não ocorrem quaisquer nulidades, excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento imediato do mérito da causa.
II. MATÉRIA DE FACTO
Com base nos elementos que constam do processo e do processo administrativo junto aos autos, com relevância para a presente decisão, consideram-se provados os seguintes factos:
A. No âmbito de uma acção de natureza inspectiva (Processo n.º OI2017...) efectuado à empresa A..., S.A., com o número de pessoa colectiva ... pela Alfândega de ..., foi realizada uma avaliação da regularidade da comercialização de gasóleo colorido e marcado (GCM) pela Requerente;
B. Através da referida acção constatou-se ter sido efectuada uma transmissão de GCM, no período em análise, de um quantitativo de 52.733,55 litros distribuído por 300 abastecimentos;
C. Em cada um desses 300 abastecimentos de GCM, a transmissão formal da propriedade do GCM, por via da emissão de factura, não se efectuou entre a Requerente e as entidades beneficiárias das taxas reduzidas de ISP, nos termos previstos no n.º 5 do artigo 93.º do Código dos IEC;
D. A Requerente foi notificada em 11.01.2018, do projecto de relatório da acção inspectiva para se pronunciar em sede de audição prévia, nos termos dos artigos 60.º da Lei Geral Tributária e do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária e Aduaneira, o que fez;
E. No período em análise, a facturação da venda de GCM pela Requerente efectuou-se nos termos do programa de fidelização de clientes gerido pela sociedade B..., SA (B...);
F. A B... subscrevia com os seus clientes o denominado “Protocolo de cedência e utilização de cartão cliente nacional”, nos termos do qual a B... “emitirá a fatura correspondente a cada mês de abastecimentos, a qual deverá ser paga através do Sistema de Débitos Diretos ao décimo quinto dia após a data de emissão da fatura.”.
G. Todos os abastecimentos efectuados por titulares de cartão frota foram facturados pela Requerente à B...;
H. Com base no despacho proferido pelo Director da Alfândega de ... datado de 22.10.2018, a Requerente foi notificada para proceder ao pagamento da divida apurada de €18.636,44 correspondentes a €10.594,17 referente a ISP/Gasóleo, €5.853,42 referente a CSR/Gasóleo, €2187,05 referente a juros compensatórios e €1,80 relativo a impressos;
I. Tendo sido notificada em 07.11.2018 para pagar o imposto em dívida, a Requerente não efectuou o pagamento e impugnou o acto tributário subjacente através da apresentação do pedido arbitral.
O Tribunal não considerou provados os seguintes factos:
Não se provou que as vendas de gasóleo colorido e marcado efectuadas pela Requerente, objecto do presente processo arbitral, tenham sido facturadas pela Requerente aos titulares do cartão electrónico, na qualidade de adquirentes de GCM.
Este tribunal firmou a sua convicção na consideração dos documentos juntos aos autos.
III. MATÉRIA DE DIREITO
A principal questão que se coloca nos presentes autos prende-se com saber se o GCM transmitido pela Requerente pode ou não beneficiar das taxas reduzidas de ISP, atentas as condições legais previstas no n.º 5 do artigo 93.º do Código dos Impostos Especiais sobre o Consumo (CIEC) e na Portaria n.º 361-A/2008, de 12.05.
A este propósito defende a Requerente, sinteticamente, o seguinte:
1. O Relatório Final da inspecção refere, no âmbito do ponto A., número 2., alínea a.) que “A transmissão, (…), de um quantitativo global de 57.733,55 litros de GCM distribuído por 300 abastecimento, em que não se constatou a formal transmissão de GCM entre a entidade inspecionada e a entidade beneficiária de GCM adquirente.”, para mais adiante mencionar que “(…) Importa notar que a ratio subjacente a tal factualidade reside na existência de um programa de fidelização de clientes (vulgo cartão frota), no âmbito do qual tais transmissões ocorreram”, finalizando por referir, ainda, que “Releva ainda precisar que, até 31-12-2015 era a sociedade “B..., S.A.” (..) que assumia a gestão de tal programa de fidelização, sendo que no restante período analisado foi a própria entidade inspecionada a assumir a gestão de tal programa, (…).”
2. Tal como resulta do acima exposto, a gestão do referido programa de fidelização era à data em causa gerido pela sociedade B..., a qual subscrevia com os seus clientes o denominado “Protocolo de …………”, cujo contrato tipo se juntou em sede de audiência prévia como Anexo II.
3. Nos termos do referido protocolo, no seu ponto “4. FATURAÇÃO, 4.1 A EMITENTE – entenda-se a participada da expoente, B...– emitirá a fatura correspondente a cada mês de abastecimentos, a qual deverá ser paga através do Sistema de Débitos Diretos ao décimo quinto dia após a data de emissão da fatura.”.
4. Acresce o ponto 7.2 do referido protocolo que estabelece e define que “7.2 A EMITENTE obriga-se a enviar ao TITULAR a fatura correspondente a todas as aquisições efetuadas com o Cartão Cliente Nacional com uma periodicidade mensal e a disponibilizar, na área de clientes do site da EMITENTE, após validação do código de utilizador e respetiva palavra-chave enviados inicialmente pela EMITENTE aquando do envio do cartão, um resumo das operações com a informação individualizada relativa às aquisições efetuadas com cada cartão.”.
5. Face ao exposto, o procedimento adoptado pela Requerente e a sua participada, decorrente da celebração do referido protocolo, consistia em que todos os abastecimentos efectuados por titulares de cartão frota serem facturados pela Requerente à B..., facturação esta consubstanciada nos consumos efectuados pelo cliente frota da agrupada B..., S.A., tal como resulta da documentação que se juntou em sede de audiência prévia sob Anexo III;
6. É ainda referido no relatório de inspecção que deu origem à liquidação aqui posta em crise que não foi acolhida a alegação da Requerente relativa à “(…) Identificação de um diferencial entre a quantidade inventariada e a quantidade inferida, no quantitativo de 970,84 litros de GCM”.
7. O procedimento adoptado pela Requerente e a sua participada, decorrente da celebração de protocolo, consistia em que todos os abastecimentos efectuados a titulares de cartão frota fossem facturados pela Requerente à B...;
8. A referida facturação consubstanciava-se nos consumos efectuados pelo cliente frota da agrupada B..., S.A., pelo que deverá ser reformulada a conclusão de que “… não se constatou a formal transmissão de GCM entre a entidade inspecionada e a entidade beneficiária de GCM adquirente.”.
Por sua vez a AT alega, em síntese, o seguinte:
1. Para a análise do presente caso, releva, de modo fulcral, o artigo 93.º do Código dos IEC, relativo ao benefício fiscal consubstanciado na aplicação de taxas reduzidas de ISP, quanto à utilização de produtos petrolíferos, designadamente o GCM em situações específicas, que dispõe, no que aqui importa, o seguinte no n.º 5: “O gasóleo colorido e marcado só pode ser adquirido pelos titulares do cartão eletrónico instituído para efeitos de controlo da sua afetação aos destinos referidos no n.º 3, sendo responsável pelo pagamento do montante de imposto resultante da diferença entre o nível de tributação aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa aplicável ao gasóleo colorido e marcado, o proprietário ou o responsável legal pela exploração dos postos autorizados para a venda ao público, em relação às quantidades que venderem e que não fiquem devidamente registadas no sistema eletrónico de controlo, bem como em relação às quantidades para as quais não sejam emitidas as correspondentes faturas com a identificação fiscal do titular de cartão.”;
2. A Portaria n.º 117-A/2008, de 8 de Fevereiro (alterada pela Portaria n.º 762/2010, de 20 de Agosto) regula as formalidades e os procedimentos aplicáveis ao reconhecimento e controlo das isenções e das taxas reduzidas do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, actualmente previstas no n.º 1 do artigo 89.º e no artigo 93.º do Código dos IEC.
3. Prevê-se na referida Portaria o seguinte: “5.º Os benefícios fiscais concretizados através da utilização de gasóleo colorido e marcado são efetuados obrigatoriamente através da utilização de um cartão de microcircuito, previsto no n.º 5 do artigo 74.º do CIEC, o qual é emitido pela Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural (DGADR) e remetido aos requerentes pela entidade competente para o reconhecimento do benefício fiscal em causa»; “6.º Os cartões referidos no número anterior são pessoais e intransmissíveis, sendo os respetivos titulares responsáveis pela sua regular utilização”.“11.º Constituem fundamento para a revogação da autorização do benefício fiscal, sem prejuízo de instauração de processo por infração tributária nos termos previstos no Regime Geral das Infrações Tributárias, a violação dos pressupostos do benefício bem como a inobservância imputável ao beneficiário das condições exigidas no n.º 2.º”; “12.º Em caso de violação dos pressupostos do benefício fiscal, é ainda liquidado o imposto que se mostre devido”; “13.º Para efeitos do disposto no número anterior, considera-se que há violação dos pressupostos do benefício fiscal, designadamente, em caso de: a) Utilização de produtos, sem reconhecimento prévio do benefício fiscal; b) Utilização dos produtos autorizados em fim diferente do declarado; c) Utilização de produtos em equipamentos não autorizados.”
4. Pelo seu lado, a Portaria n.º 361-A/2008, de 12 de Maio, estabelece as regras de comercialização do GCM e os respectivos mecanismos de controlo, tendo em vista a correcta afectação do produto aos destinos que beneficiam de isenção ou de aplicação de taxas reduzidas do ISP nos termos previstos no Código dos IEC (n.º 1), prevendo o seguinte: “3.º O gasóleo colorido e marcado só pode ser fornecido ou vendido a titulares de postos de abastecimento devidamente licenciados que sejam detentores de terminais point of sale (POS)”; “5.º O gasóleo colorido e marcado só pode ser vendido nos postos de abastecimento aos beneficiários de uma isenção ou redução de taxa de ISP que sejam titulares de cartões de microcircuito emitidos para o efeito pela DGADR, através dos quais são registadas todas as transações de gasóleo colorido e marcado no sistema informático gerido pela Sociedade Interbancária de Serviços (SIBS); 6.º As vendas a que se refere o número anterior são obrigatoriamente registadas nos terminais POS no momento em que ocorram”; “8.º O registo no sistema informático, através dos terminais POS, de cada abastecimento efetuado, não dispensa a emissão da respetiva fatura ou documento equivalente, emitida em nome do titular do respetivo cartão de microcircuito”;”9.º Os registos das transações referidas no n.º 5.º são enviados em suporte informático pela SIBS à DGADR, a qual, para além das funções de coordenação nacional que lhe incumbem, gere a base de dados relativa ao gasóleo colorido e marcado e é responsável pela emissão, suspensão ou cancelamento dos cartões”; “11.º O gasóleo colorido e marcado só pode ser abastecido aos equipamentos previstos no n.º 3 do artigo 74.º do CIEC, após a verificação, pela entidade competente, dos pressupostos e das condições exigíveis nos termos da legislação aplicável e a atribuição aos respetivos beneficiários do cartão referido no n.º 5.º; 12.º Em caso de erros de digitação ou outras anomalias verificadas na utilização dos terminais POS, devem os mesmos ser imediatamente comunicados, por escrito, preferencialmente por correio eletrónico, à DGADR, a fim de serem efetuadas as respetivas correcções”.
5. A comercialização deste tipo de produto obedece às especificidades descritas, em virtude da isenção ou da taxa reduzida de imposto de que beneficia, nos termos do artigo 93.º do Código dos IEC, por isso esta sujeita às seguintes exigências:
- o GCM seja adquirido por titulares do cartão eletrónico instituído para efeitos de controlo da sua afetação aos destinos legalmente previstos (primeira parte do n.º 5 do artigo 93.º do CIEC, n.º 5.º da Portaria n.º 117-A/2008 e n.º 5 da Portaria n.º 361-A/2008);
- o GCM seja vendido nos postos de abastecimento aos beneficiários que sejam titulares de cartões de microcircuito através dos quais são registadas todas as transacções de GCM no sistema informático gerido pela SIBS (n.º 5 da Portaria n.º 361-A/2008).
- as vendas sejam obrigatoriamente registadas nos terminais POS no momento em que ocorram (n.º 6 da Portaria n.º 361-A/2008).
6. Na verdade, as taxas reduzidas do ISP previstas no artigo 93.º do Código dos IEC constituem benefícios fiscais (artigo 2.º, n.ºs 1 e 2 do Estatuto dos Benefícios Fiscais – EBF), pelo que, em conformidade com princípios elementares aplicáveis neste âmbito (artigos 7.º e 12.º do EBF), o direito aos benefícios fiscais depende da reunião dos respectivos pressupostos, isto é, da verificação das circunstâncias e condições de facto de que depende a sua atribuição;
7. E o artigo 4.º do Código dos IEC relativo à incidência subjectiva, prevê, no n.º 2 das alíneas e) e h), como sujeitos passivos de imposto: “pessoa que detenha os produtos sujeitos a imposto ou qualquer outra pessoa envolvida na sua detenção, em caso de detenção irregular”, bem como pessoas singulares ou colectivas que introduzam no consumo, vendam ou utilizem produtos sujeitos a imposto, nas demais situações de irregularidade”;
8. No âmbito dos abastecimentos de GCM é determinante a emissão da factura da venda do produto ao adquirente;
9. Como a aplicação da taxa reduzida do ISP se encontra dependente do cumprimento desta condição, não tendo a mesma sido observada, não se mostram preenchidos os pressupostos exigidos para o benefício fiscal de redução da taxa aplicável ao consumo de GCM;
10. Em suma, a Requerente não observou as formalidades essenciais exigidas para a comercialização do GCM, pelo que, não tendo cumprido as condições normativamente impostas, não se verificam os pressupostos necessários à concretização do benefício fiscal;
11. De acordo com o disposto no n.º 5 do artigo 93.º do Código dos IEC, incide sobre a Requerente, como entidade com a exploração do POS, a responsabilidade do pagamento no montante de imposto resultante da diferença entre o nível de tributação aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa aplicável ao gasóleo colorido e marcado relativo às quantidades de 52.733,55 litros de GCM, distribuídos por 300 abastecimentos, em que não se constatou a formal transmissão de GCM entre a entidade Requerente e a entidade beneficiária adquirente de GCM.
Vejamos o que deve ser entendido.
- Da Interpretação do n.º 5 do artigo 93.º do Código dos IEC
O artigo 93.º do Código dos IEC, sob a epígrafe “Taxas Reduzidas” determina a tributação do GCM à taxa reduzida, fixando-se os fins elegíveis de utilização do referido produto, e no n.º 5, na redacção dada pela Lei n.º 114/2017, de 29.12.2017, estatui-se o seguinte:
“O gasóleo colorido e marcado só poderá ser adquirido pelos titulares do cartão electrónico instituído para efeitos de controlo da sua afectação aos destinos referidos no n.º 3, sendo o proprietário ou o responsável legal pela exploração dos postos autorizados para a venda ao público responsabilizado pelo pagamento do montante de imposto resultante da diferença entre o nível de tributação aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa aplicável ao gasóleo colorido e marcado, em relação às quantidades que venderem e que não fiquem devidamente registadas no sistema electrónico de controlo, bem como em relação às quantidades para as quais não sejam emitidas as correspondentes faturas com a identificação fiscal do titular do cartão.”
Resulta, assim, da norma supra transcrita que a responsabilidade do proprietário ou responsável legal pela exploração dos postos autorizados pode operar quando as vendas de GCM não fiquem devidamente registadas no sistema electrónico de controlo, bem como em relação às quantidades para as quais não sejam emitidas as correspondentes facturas com a identificação fiscal do titular do cartão.
Tendo em conta que o artigo 93.º do Código dos IEC estabelece, assim, um benefício fiscal consubstanciado na redução das taxas aplicáveis à transmissão de GCM, importa na sua análise atender, também, aos propósitos que servem à criação de benefícios fiscais.
Na verdade, logo no artigo 2.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) se estabelece que os benefícios fiscais são "medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem."
As taxas reduzidas aplicáveis ao GCM previstas no artigo 93.º do Código dos IEC visam beneficiar a utilização de GCM em fins específicos como o aquecimento, a iluminação e outros fins essencialmente agrícolas.
Conforme ensina A. Brigas Afonso, in Código dos Impostos Especiais de Consumo Anotado, 2.º edição, pp. Pág. 171, “A nova redacção dada ao n.º 5 vem criar especiais responsabilidades para os proprietários ou responsáveis legais pela exploração de postos de abastecimento, relativamente ao cumprimento das disposições regulamentares previstas para o abastecimento de gasóleo colorido e marcado”.
De acordo com o n.º 2 do artigo 14.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), os benefícios fiscais condicionados, como os previstos no actual artigo 93.º do Código do IEC caducam pela inobservância das obrigações impostas que seja imputável ao beneficiário.
Assim, resulta da resenha legal que a violação das obrigações impostas pelo n.º 5 do artigo 93.º do Código dos IEC, nomeadamente: i) a obrigação do GCM ser adquirido pelos titulares do cartão electrónico instituído para efeitos de controlo da sua afectação, ii) a obrigação das quantidades vendidas ficarem devidamente registadas no sistema electrónico de controlo e iii) a obrigação de facturação com a identificação fiscal do titular do cartão, responsabilizam o proprietário ou o responsável pela exploração dos postos pelo pagamento do montante de imposto resultante da diferença.
Até à alteração do n.º 5 do artigo 93.º do Código do IEC pela Lei n.º 82-B/2014, de 31.12.2014 (Lei do OE 2015) podia entender-se que aquele artigo não constituía base legal válida à liquidação adicional de ISP com fundamento na não identificação das facturas correspondentes.
Na verdade, o referido normativo estabelecia a responsabilidade do proprietário ou responsável legal pela exploração dos postos autorizados pelo pagamento do imposto em relação às quantidades que venderem e que não fiquem devidamente registadas no sistema informático subjacente aos cartões electrónicos atribuídos.
Não existia, portanto, qualquer base legal válida que fundamentasse a liquidação adicional de ISP em situações de não existência de factura identificável, mas apenas para situações que não ficassem devidamente registadas nos cartões electrónicos (Cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 176/2010, P.º 400/09, de 5.05.2010).
Com a redacção da Lei do OE 2015, a norma passou a prever a responsabilidade do proprietário ou responsável legal pela exploração dos postos autorizados pelo pagamento do imposto em relação às quantidades que venderem e que não fiquem devidamente registadas no sistema electrónico de controlo, bem como em relação às quantidades para as quais não sejam emitidas as correspondentes faturas em nome do titular do cartão.
Conclui-se, por isso, que foi intenção do Legislador, a partir da Lei do OE 2015, condicionar a concessão do benefício fiscal previsto no artigo 93.º do Código dos IEC à emissão pelos proprietários ou responsáveis legais pela exploração dos postos autorizados das facturas relativas à transmissão de GCM em nome do titular do cartão.
- Do caso concreto
Resulta dos factos e documentos carreados para os autos que a Requerente não facturou as vendas de GCM aos beneficiários/adquirentes do GCM.
Na verdade, ficou evidenciado que a Requerente apenas facturou a transmissão de GCM à sua participada (B...), não se encontrando, por isso, cumpridas as obrigações legais previstas no n.º 5 do artigo 93.º do Código dos IEC, nomeadamente, a obrigação do GCM ser adquirido pelos titulares do cartão electrónico instituído para efeitos de controlo da sua afectação à Requerente, nem a obrigação de facturação pela Requerente com a identificação fiscal do titular do cartão.
Sendo a participada da Requerente uma entidade diferente da Requerente não é possível considerar que a facturação da participada à Requerente é equivalente à facturação directa da Requerente aquando da transmissão do GCM aos titulares do cartão electrónico.
Não obstante o protocolo estabelecido entre a Requerente e a sua participada relativamente à facturação, a facturação “indirecta” das transmissões de GCM pela Requerente, através da sua participada, não parece ser legalmente enquadrável no normativo actualmente vigente.
Também atendendo à ratio do regime instituído não é possível desvalorizar a violação de tal condição formal, pois, os objectivos subjacentes ao benefício fiscal e o mercado específico em causa, impõem um controlo apertado da transmissão do produto, conquanto o GCM é um produto de venda condicionada, sujeito a uma isenção condicionada.
Conclui-se, por isso, pela improcedência do pedido arbitral apresentado.
IV. DECISÃO
Assim, o Tribunal decide julgar improcedente a petição arbitral, por considerar não provado o pedido relativamente ao acto de liquidação de ISP identificado nos autos
V. VALOR DO PROCESSO
Em conformidade com o disposto no artigo 306.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, 97.º-A do CPPT e artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária o valor do pedido é fixado em €18.636,44.
VI. CUSTAS
Nos termos do disposto nos artigos 12.º, n.º 2 do RJAT, e no artigo 4.º, n.º 4 do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor da taxa de arbitragem em €1.224, nos termos da Tabela I do mencionado Regulamento, a cargo da Requerente.
Notifique-se.
Lisboa, 15 de Maio de 2019
A Árbitro,
Magda Feliciano
(O texto da presente decisão foi elaborado em computador, nos termos do artigo 131.º, n.º 5, do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, da alínea e) do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT) regendo-se a sua redacção pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.)