Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 499/2018-T
Data da decisão: 2019-04-30  IMI  
Valor do pedido: € 24.422,15
Tema: Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis
Versão em PDF

DECISÃO ARBITRAL

 

I – RELATÓRIO

 

1 – A..., S.A., titular do número de identificação fiscal..., com sede social na ..., n.º..., ..., Sala ..., em Lisboa, tendo como serviço de periférico local o Serviço de Finanças de Lisboa ..., apresentou em 08/10/2018 um pedido de constituição do Tribunal Arbitral, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº1 do artigo 2º,do nº 1 do artigo 3º e da alínea a) do nº 1 do artigo 10º, todos do RJAT , sendo requerida a ATA , com vista à declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação de AIMI , referente ao ano de 2017,a que foi atribuído o n.º de liquidação 2017..., no montante de EUR 24.422,15 com fundamento nos artigos 135º-A e seguintes do CIMI  e da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa, notificada por ofício datado de 04.07.2018, que correu termos no Serviço de Finanças de Cascais -... .

2- O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi feito sem exercer a opção de designação de árbitro, vindo a ser aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD  e automaticamente notificado à ATA em 09/10/2018.

3- Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 6.º do RJAT, por decisão do Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicada às partes, nos prazos legalmente aplicáveis, foi designado o árbitro singular Arlindo José Francisco, que comunicou ao Conselho Deontológico e ao CAAD a aceitação do encargo no prazo regularmente estipulado.

4 - O Tribunal foi constituído em 20/12/2018 de harmonia com as disposições contidas na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro.

5 – Com o seu pedido, visa a requerente, como já se disse, a declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação em causa, no montante de € 24.422,15 e da decisão de indeferimento da reclamação referida, que teve como objeto a referida liquidação de AIMI.

6- Fundamenta o seu ponto de vista, em síntese, no facto da requerente entender haver erro sobre os pressupostos de Direito por aplicação de uma norma ilegal, com fundamento na violação do Princípio da Igualdade previsto no artigo 55.º da LGT , no artigo 13.º e no n.º 4 do artigo 103.º ambos da CRP .

7 – Haver também erro sobre os pressupostos de Direito por aplicação de uma norma ilegal, com fundamento na violação do Princípio da Justiça previsto no artigo 55.º da LGT e no n.º 2 do artigo 266.º da CRP.

8 – E ainda erro na interpretação do artigo 135.º-B do CIMI ao sujeitar a AIMI terrenos para construção com imóveis cuja utilização potencial é para serviços, concluindo a requerer, a final, a declaração de ilegalidade quer do ato de liquidação quer do ato de indeferimento da reclamação graciosa já referida e a consequente anulação de tais atos, nos termos do número 1 do artigo 163.º do CPA .

9 – Na resposta a ATA, também em síntese, sustenta que não assiste qualquer fundamento válido à pretensão da requerente, que ponham em causa os aludidos atos que deverão permanecer válidos na ordem jurídica.

 10 – Para além de citar basta jurisprudência arbitral, entende que a lei, clara e inequivocamente, estabelece a incidência do imposto sobre os '' terrenos para construção", e isto, independentemente da afetação potencial que a estes venha a caber, uma vez que não constam da delimitação negativa de incidência, ou seja, o legislador não estabeleceu o afastamento da norma de incidência fiscal dos terrenos para construção por motivos relacionados com a sua afetação potencial.  

11 – Finalmente considera que, a tributação do património imobiliário da requerente não afronta o princípio da igualdade tributária e da capacidade contributiva apenas porque a titularidade de bens imóveis constitui o próprio objeto da sua atividade pois, que a incidência de AIMI sobre os imóveis da titularidade de empresas que exercem a sua atividade no setor imobiliário, nomeadamente de terrenos para construção adquiridos com o intuito de neles promover edificações destinadas a venda, seja discriminatória ou que estas empresas devam merecer um tratamento mais vantajoso do que o concedido à generalidade dos proprietários de prédios urbanos.

 

II - SANEAMENTO

 

O tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, de acordo com o artigo 2.º do RJAT.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas de harmonia com os artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

Junta aos autos, em 01/02/2019, a resposta da ATA, o Tribunal proferiu despacho que se transcreve:” Não é requerida prova testemunhal e, não há exceções a apreciar, deste modo, consideramos desnecessária a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT.

Assim, ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal Arbitral na condução do processo, da celeridade, da simplificação e informalidade processuais (artigos 19.º, n.º 2, e 29.º, n.º 2, do RJAT) dispensa-se a realização da aludida reunião e determina-se que o processo prossiga com alegações escritas facultativas por um período de 10 dias, iniciando-se com a notificação do presente despacho o prazo para alegações da Requerente e com a notificação da apresentação das alegações da Requerente o prazo para alegações da Requerida. Indica-se o dia 30-04-2019 para prolação da decisão arbitral. Até essa data, o Requerente deverá fazer prova, junto do CAAD, do pagamento da taxa de justiça subsequente”.

Em 18/03/2019 a requerente apresentou alegações com as quais pretende reforçar os seus pontos de vista já explanados na petição inicial.

Em 26/03/2019 a requerida produziu alegações mantendo o que já havia exposto na resposta e reforçado com decisões sumárias recentes dos Tribunais Arbitrais, no sentido do seu ponto de vista.

Tudo visto e não enfermando o processo de nulidades cumpre decidir.

 

III- FUNDAMENTAÇÃO

 

1 – As questões a dirimir, com interesse para os autos, são as seguintes:

 

a)            Declarar ou não a ilegalidade da liquidação de AIMI 2017..., no montante de EUR 24.422,15 e da decisão de indeferimento da reclamação graciosa contra a mesma dirigida.

b)           Caso venha a declarar-se a ilegalidade dos atos tributários referidos, com a consequente anulação e restituição do imposto, saber se esta deverá ser acompanhada do pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º da LGT.

 

2 – Matéria de Facto

A matéria de facto relevante e provada com base nos elementos juntos aos autos é a seguinte:

a)            A requerente é uma sociedade anónima, sedeada em território nacional, sendo proprietária dos imóveis constantes na nota de liquidação junta aos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais e da qual constam dois terrenos para construção; artigo ... da União de freguesias de ... e..., concelho de Cascais, distrito de Lisboa e ... da União de freguesias de ..., ... e..., concelho e distrito do Porto, ambos destinados a serviços.

b)           Tem como objeto social, a compra, designadamente para revenda, a venda, a construção e o arrendamento de prédios rústicos ou urbanos ou frações autónomas, incluindo a constituição e a negociação de imóveis em regime propriedade horizontal, a gestão de imóveis próprios, a promoção e a negociação de projetos de loteamento e a urbanização e a administração de propriedades, a prestação de serviços relativos a quaisquer outros investimentos imobiliários e de consultoria no âmbito das atividades referidas

c)            A requerente, apesar de ter apresentado reclamação graciosa contra a liquidação 2017..., que veio a ser indeferida, conforme notificação de 09/07/2018 efetuou oportunamente o seu pagamento, no montante de EUR 24.422,15.

Estes são os factos considerados provados com relevo para a decisão da causa e resultam dos elementos juntos aos autos pelas partes e não contestados por nenhuma delas.

Não existem factos relevantes para a decisão que não tenham sido dados como provados.

 

3 – Matéria de Direito

 

Pela Lei n.º 42/2016, de 28 de Dezembro, Lei do Orçamento do Estado para 2017, foi criado o AIMI, regulado pelos artigos 135.º- A a 135.º- K do CIMI, capítulo XV deste diploma legal.

A incidência subjetiva consta do artigo 135.º-A, interessando-nos para o caso concreto, os seus n.ºs 1,2 e 3, que se transcrevem:

1 - São sujeitos passivos do adicional ao imposto municipal sobre imóveis as pessoas singulares ou coletivas que sejam proprietários, usufrutuários ou superficiários de prédios urbanos situados no território português.

2 - Para efeitos do n.º 1, são equiparados a pessoas coletivas quaisquer estruturas ou centros de interesses coletivos sem personalidade jurídica que figurem nas matrizes como sujeitos passivos do imposto municipal sobre imóveis, bem como a herança indivisa representada pela cabeça de casal.

3 - A qualidade de sujeito passivo é determinada em conformidade com os critérios estabelecidos no artigo 8.º do presente Código, com as necessárias adaptações, tendo por referência a data de 1 de janeiro do ano a que o adicional ao imposto municipal sobre imóveis respeita.

O artigo 135.º-B trata da incidência objetiva e que também transcrevemos, a redação ao tempo aplicável:

“Artigo 135.º-B (*)

Incidência objetiva

1 - O adicional ao imposto municipal sobre imóveis incide sobre a soma dos valores patrimoniais tributários dos prédios urbanos situados em território português de que o sujeito passivo seja titular.

2 - São excluídos do adicional ao imposto municipal sobre imóveis os prédios urbanos classificados como «comerciais, industriais ou para serviços» e «outros» nos termos das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 6.º deste Código”.

De anotar a exclusão dos prédios urbanos a que aludem as alíneas b) e d) do nº 1 (que se transcreve) do artigo 6º do CIMI:

“Artigo 6.º

Espécies de prédios urbanos

1 – Os prédios urbanos dividem-se em:

a) habitacionais;

b) comerciais, industriais ou para serviços;

c) terrenos para construção;

d) outros.”

Sendo este o quadro legal, sintetizamos que o entendimento de ilegalidade apontado pela requerente quer quanto ao ato de liquidação quer quanto ao ato de indeferimento da reclamação graciosa, ambos praticados pela ATA, assenta essencialmente em considerar a existência de erros sobre os pressupostos de facto e de direito nos referidos atos, ao aplicar uma norma ilegal, violadora do princípio da igualdade previstos no artigo 55º da LGT e artigos 13.º e n.º 3 do 104.º, ambos da CRP, na medida em que a requerente sendo uma empresa que tem como atividade a compra para revenda, a venda, a construção e o arrendamento de prédios rústicos ou urbanos ou frações autónomas, incluindo a constituição e a negociação de imóveis em regime propriedade horizontal, a gestão de imóveis próprios, a promoção e a negociação de projetos de loteamento e a urbanização e a administração de propriedades, a prestação de serviços relativos a quaisquer outros investimentos imobiliários e de consultoria no âmbito das atividades, sendo os imóveis por si detidos matéria-prima ou mercadoria, a tributação em causa penaliza e discrimina a requerente relativamente a outras empresas que não necessitam de deter terrenos para construção ou imóveis com afetação habitacional, tornando-se claro que a discriminação negativa que resulta da aplicação do artigo 135.º-B do CIMI é violadora dos normativos referidos. Considera também, haver violação do princípio da Justiça, que decorre do artigo 55.º da LGT e n.º 2 do artigo 266.º da CRP, sustentando o seu ponto de vista em jurisprudência do TC  e do TCA  do Sul, entendendo que a ATA se deveria ter abstido de emitir a liquidação em causa, por respeito ao princípio de justiça e da não discriminação, uma vez, que é evidente ter o legislador a intenção de excluir da tributação os imóveis afetos à atividade produtiva e ainda ter havido erro na interpretação do artigo 135º-B do CIMI, ao sujeitar a AIMI os terrenos para construção com imóveis a construir com destino potencial a serviços, como é o caso dos terrenos para construção detidos pela requerente, citando decisões do CAAD, que consideraram tal procedimento violador da lei, por consubstanciar erros sobre os pressupostos de facto e de direito ao aplicar uma norma materialmente inconstitucional devendo, por isso, o ato de liquidação e o ato de indeferimento da reclamação graciosa, serem anulados nos termos do n.º 1 do artigo 163.º do CPA;

Por sua vez a requerida considera não assistir razão nem qualquer fundamento à pretensão da requerente, na medida em que o legislador não estabeleceu o afastamento da norma de incidência dos terrenos para construção, independentemente da sua afetação potencial, apontando nesse sentido, jurisprudência do STA , nomeadamente os seus Acórdãos, 18/11/2009, rec.765/09, 20/4/2016, rec.824/15, Acórdãos TCA SUL, 9/02/2017 proc.5366/12  Proc. n.º 907/07.9, de 11.16.2017. Entende que na delimitação da incidência real e da exclusão de incidência, fica patente que o critério utilizado pelo legislador, teve por base os tipos de prédios a que alude o artigo 6º do CIMI e que a mera detenção de património imobiliário de valor elevado, independentemente da afetação ou não à atividade económica é por si só reveladora de elevada capacidade contributiva, superior, relativamente à detenção de património de reduzido VPT . Cita várias decisões arbitrais que vão no sentido por si propugnado de que a titularidade de um património imobiliário de valor elevado, evidencia uma especial capacidade económica que lhe permite contribuir para o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social a que está consignada a receita de AIMI, não vislumbrando que a tributação em causa colida com os princípios da igualdade, da justiça e da capacidade contributiva, nem acarreta uma discriminação negativa e injustificada aos titulares de património que, como a requerente, se dedicam à compra e venda de imóveis.

Apreciadas, ainda que em síntese, a posição das partes e considerando que o Tribunal entende que o AIMI é um adicional ao IMI , que foi criado, como já se viu, pela Lei n.º 42/2016, de 28 de Dezembro, Lei do Orçamento do Estado para 2017 e que a receita ficou consignada ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, satisfazendo, deste modo, um objetivo do programa do governo de alargar a base de financiamento da Segurança Social, ao mesmo tempo que se introduz um imposto que recai sobre os detentores de maiores patrimónios imobiliários, reforçando a progressividade global do sistema, ao tributar de forma mais elevada os patrimónios mais avultados, será nesta ótica que avaliaremos a questão concreta, tendo em conta também a jurisprudência maioritária do CAAD, nomeadamente a decisão proferida no Processo 420/2018, que acompanhamos e que, com a devida vénia, se transcreve na parte que aprecia o eventual erro sobre os pressupostos de direito por aplicação de uma norma ilegal que, no entender da requerente será violadora do princípio da igualdade previsto no artigo 55.º da LGT, no artigo 13.º e no n.º 3 do artigo 104.º da CRP, da violação do princípio da justiça previsto no artigo 55.º da LGT e no n.º 2 do artigo 266.º da CRP e de erro na interpretação do artigo 135.º-B do CIMI, ao sujeitar a AIMI terrenos para construção com imóveis cuja utilização potencial é para serviços.

Transcrição:

“A redacção do artigo 135.º-B do CIMI que veio a ser aprovada não afasta a incidência do AIMI sobre imóveis afectos à habitação e terrenos para construção utilizados pelas pessoas colectivas no âmbito da sua atividade económica.

A preocupação legislativa de «evitar o impacto deste imposto na atividade económica» foi anunciada na Proposta de Lei do Orçamento do Estado para 2017 e era concretizada, em alguma medida, através da exclusão do âmbito de incidência dos «prédios urbanos classificados na espécie “industriais”, bem como os prédios urbanos licenciados para a atividade turística, estes últimos desde que devidamente declarado e comprovado o seu destino» e da dedução ao valor tributável do montante de «€ 600 000,00, quando o sujeito passivo é uma pessoa coletiva com atividade agrícola, industrial ou comercial, para os imóveis diretamente afetos ao seu funcionamento». No entanto, não foi com base na actividade a que estão afectos os imóveis que veio a ser definida a exclusão de incidência, pois na redacção que veio a ser aprovada definiu-se a não incidência apenas com base nos tipos de prédios indicados no artigo 6.º do CIMI, sem qualquer alusão à afectação ao funcionamento das pessoas colectivas.

São conceitos distintos a afectação de um imóvel, que pressupõe uma utilização, e o fim a que está destinado, o «destino normal», subjacente às classificações dos imóveis, a que se refere o n.º 2 do artigo 6.º do CIMI. Se tivesse sido mantida, na redacção final do Orçamento, a intenção legislativa de afastar a incidência sobre os imóveis diretamente afectos ao funcionamento das pessoas colectivas, decerto teria sido mantida a referência a esta afectação que constava da proposta e que expressava claramente essa opção legislativa. Assim, tendo sido suprimida essa alusão à afectação dos imóveis, não há suporte legal para concluir que os prédios habitacionais e os terrenos para construção afectos à actividade das pessoas colectivas não relevem para a incidência do AIMI. Por isso, é de concluir que a afectação dos imóveis às actividades económicas de pessoas colectivas não afasta a tributação em AIMI (fora dos casos em que se trate de prédios que no anterior tenham estado isentos ou não sujeitos a tributação em IMI, que não são contabilizados para efeitos de AIMI, nos termos do n.º 3 do artigo 135.º-B do CIMI). A detenção de património imobiliário de valor elevado, independentemente da afectação ou não a actividade económica, é tendencialmente reveladora de elevada capacidade contributiva, superior à que é de presumir existir quando seja detido património de valor reduzido ou quando ele não exista, pelo que, em princípio, tem justificação a limitação da tributação às primeiras situações. Porém, não resultam explicitamente do Relatório do Orçamento para 2017 nem da sua discussão parlamentar as razões que estarão subjacentes à distinção, para efeitos de tributação em AIMI, entre os valores patrimoniais dos prédios classificados como habitacionais ou terrenos para construção (independentemente da sua efectiva afectação a esses fins) e os dos prédios urbanos que têm outras classificações, à face do artigo 6.º do CIMI. Relativamente aos prédios que têm a classificação de «outros» à face do artigo 6.º, n.ºs 2, alínea d), e 4, do CIMI, poderá ver-se uma razão para distinção no facto de se tratar essencialmente de prédios que não têm como finalidade actividades geradoras de rendimentos, designadamente os terrenos situados em aglomerados urbanos que não reúnem os requisitos necessários para a sua classificação como terrenos para construção

nem estão a ser utilizados para fins agrícolas ou silvícolas e os edifícios destinados a espaços ou infra-estruturas ou equipamentos públicos. No que concerne ao afastamento da tributação relativamente aos prédios destinados a comércio, indústria ou serviços poderá entrever-se uma explicação na finalidade invocada para a criação desta nova tributação, que é ao financiamento da Segurança Social, assegurado através da consignação de receitas do AIMI ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, prevista no n.º2 do artigo 1.º do CIMI, na redacção da Lei n.º 42/2016, de 28 de Dezembro. Não se pretende com o AIMI onerar a tributação de imóveis de luxo, como se visava primacialmente com averba 28.1 da TGIS, pois o património imobiliário de valor avultado pode ser constituído por uma pluralidade de imóveis de reduzido valor, mas sim criar mais uma via de subsidiação do sistema de segurança social, que é uma das incumbências constitucionais do Estado, prevista no artigo 63.º, n.º 2, da CRP. A sustentabilidade e estabilidade da Segurança Social, sempre em dúvida, é uma preocupação permanente que tem justificado plúrimas iniciativas, bem evidenciadas nas Grandes Opções do Plano para 2017 (Lei n.º 41/2016, de 28 de Dezembro,) e para 2018 (Lei n.º 113/2017, de 29 de Dezembro) entre as quais se inclui a diversificação das fontes de financiamento, que constitui um princípio há muito adoptado nas Leis de Bases  da Segurança Social (artigo 78.º da Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto, artigo 107.º da Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro e artigo 88.º da Lei n.º 4/2007, de 16 de Janeiro).

A essência do princípio da diversificação das fontes de financiamento da Segurança Social consiste na ampliação das bases de obtenção de recursos financeiros, tendo em vista, designadamente, a redução dos custos não salariais da mão-de-obra (artigo 79.º da Lei n.º 17/2000, artigo 108.º da Lei n.º 32/2002, e artigo 88.º da Lei n.º 4/2007, de 16 de Janeiro), o que pode explicar que não seja aplicada a nova tributação do AIMI às pessoas colectivas detentoras de prédios destinados a actividades comerciais, industriais e serviços, por a detenção de prédios desses tipos por pessoas colectivas estar normalmente associada ao exercício dessas actividades, com o correspondente pagamento de contribuições para Segurança Social, como entidades empregadoras [artigo 92.º, alínea b), da Lei n.º 4/2007, e artigos 3.º, alínea a), e 14.º, alínea a), do Decreto-Lei n.º 367/2007, de 2 de Novembro]. Desta perspectiva, em que o legislador, carente de financiamento para a Segurança Social, privilegia a veste de cobrador de impostos à preocupação com o equilíbrio da tributação das empresas, poderá vislumbrar-se algum fundamento para distinguir entre a titularidade de património imobiliário por pessoas que, presumivelmente, desenvolverão actividades conexionadas com o financiamento da Segurança Social (que já contribuirão para esse financiamento) e a detenção de imóveis não destinados a essas actividades, cujos titulares, tendencialmente, não estarão associados da mesma forma a esse financiamento, pelo menos com a mesma intensidade. O artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa proclama o princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei. Como vem sendo uniformemente entendido pelo Tribunal Constitucional, o princípio da igualdade, como limite à discricionariedade legislativa, não exige o tratamento igual de todas as situações, mas, antes, implica que sejam tratados igualmente os que se encontram em situações iguais e tratados desigualmente os que se encontram em situações desiguais, de maneira a não serem criadas discriminações arbitrárias e irrazoáveis, porque carecidas de fundamento material bastante. O princípio da igualdade não proíbe que se estabeleçam distinções, mas sim, distinções arbitrárias, desprovidas de justificação objectiva e racional.

Pelo que se referiu, não será completamente desprovida de explicação objectiva e racional a criação de uma tributação especial de património de valor elevado destinada a assegurar o financiamento da Segurança Social limitada ao património imobiliário que não estará já tendencialmente conexionado com esse financiamento. Por outro lado, a criação do AIMI, como tributo complementar sobre o património imobiliário, que visou introduzir na tributação «um elemento progressivo de base pessoal, tributando de forma mais elevada os patrimónios mais avultados» (Relatório do Orçamento para 2017, página 60),compagina-se com o objectivo de a tributação do património dever contribuir para a igualdade entre os cidadãos, afirmado no n.º 3 do artigo 104.º da CRP, pois a progressividade tem como corolário, tendencialmente, impor maior tributação a quem tem maior capacidade contributiva. A capacidade contributiva das pessoas colectivas empresariais, relevante a aferição da aplicação do princípio da igualdade tributária, não é evidenciada apenas pelos rendimentos, designadamente pelos resultados da actividade a que se destinam os imóveis. Na verdade, «o património proporciona ao seu titular uma capacidade contributiva especial, vantagens que pela sua natureza escapam ao imposto sobre os rendimentos pessoais: assim, a titularidade do património facilita a angariação de crédito, reforça a posição negocial do seu titular na celebração de contratos vários, torna mais fácil multiplicar a riqueza permitindo-lhe arriscar aí onde em princípio não o faria. Nesta óptica, o imposto sobre o património é visto como algo mais do que um prolongamento do imposto sobre os rendimentos pessoais -não se trata de sobrecarregar aqui rendimentos que já lhe estão sujeitos mas de atingir manifestações de capacidade contributiva que na verdade lhe escapam»(...) Os impostos sobre o património justificar-se-ão por permitirem transferir recursos em benefício da classe trabalhadora, instituindo uma "progressividade qualitativa" complementar da progressividade em quantidade dos impostos sobre o rendimentos pessoais». Por outro lado, se é certo que os diferentes destinos dos imóveis não implicam necessariamente distinção de nível de capacidade contributiva, a exclusão de tributação dos prédios especialmente vocacionados para a actividade produtiva, designadamente os «comerciais, industriais ou para serviços», encontrará outra justificação (para além do já referido presumível maior contributo destas actividades para a Segurança Social por via das contribuições), pois reconduz-se, em última análise, a favorecimento destas actividades, que se harmoniza (e, por isso, terá fundamento constitucionalmente aceitável) com a obrigação de o Estado promover o aumento do bem-estar económico, que pressupõe bom funcionamento das actividades criadoras de riqueza e constitui uma das suas incumbências prioritárias no âmbito económico [artigo 81.º, alínea a), da CRP]. Sendo esta uma incumbência constitucionalmente considerada prioritária, a primeira elencada nesta norma, decerto que não será incompatível com a CRP dar-lhe protecção preferencial quando confrontada com os deveres constitucionais do Estado em matéria de habitação indicados no artigo 65.º da CRP, que, obviamente, também são protegidos através do bom funcionamento das actividades criadoras de riqueza. Assim, se é certo que o regime do AIMI cria situações de discriminação da tributação de empresas com a mesma capacidade contributiva evidenciada pelo património, no pressuposto de que há necessidade de dinheiro e tem de se encontrar novas formas de o arrecadar (como se refere no Relatório do Orçamento para 2017), haverá alguma justificação para que seja imposta a tributação a umas empresas e não a outras com a mesma ou maior capacidade contributiva inerente ao património, sobretudo à luz da jurisprudência maioritária constitucional citada pela Autoridade Tributária e Aduaneira que revela que é tolerável constitucionalmente que os interesses do Estado cobrador de impostos (neste caso, a sustentabilidade da Segurança Social, reclamada pelos princípios da confiança e segurança) se sobreponham ao respeito rigoroso do princípio da igualdade. Por outro lado, não sendo objectivo legislativo a tributação da habitação de luxo mas sim obter mais um meio de financiamento da Segurança Social, em sintonia com a opção política de diversificação, através de “um imposto que recai sobre os detentores de maiores patrimónios imobiliários, reforçando a progressividade global do sistema” (página 57 do relatório do Orçamento do Estado para 2017),é em função destes objectivos que há que apreciar se ocorre violação do princípio da proporcionalidade. Desta perspectiva, afigura-se que esta nova tributação não é incompaginável com o princípio da proporcionalidade, pois é adequada ao fim em vista (propicia o aumento de receitas que se pretende obter),é necessária(à face da opção legislativa de aumentar as receitas da Segurança Social com diversificação de fontes) e não é ultrapassada uma medida razoável, designadamente quanto às pessoas colectivas, pois as taxas do novo imposto não são elevadas(e são menores para as pessoas coletivas do que para as pessoas singulares, nos termos do artigo 135.º-F), o imposto pago é dedutível a matéria tributável de IRC (artigo 135.º-J), são deduzidos valores consideráveis ao valor tributável (artigo 135.º-C) e não está demonstrado, nem há razão para crer, que os montantes arrecadados ultrapassem o que é necessário para a finalidade de reforçar a sustentabilidade e estabilidade da Segurança Social”.

Comungando desta perspetiva o Tribunal, não perscrute que na tributação aqui posta em crise, tenha sido praticado erro sobre os pressupostos de direito por considerar não terem sido violados os princípios da igualdade e da justiça aludidos no artigo 55.º da LGT, no artigo 13.º, no n.º3 do artigo 104.º e nº2 do artigo 266.º da CRP, respetivamente, ao mesmo tempo que também não houve erro na interpretação do artigo 135.º-B do CIMI ao sujeitar a AIMI terrenos para construção com imóveis cuja utilização potencial é para serviços, tal como o decidido no Acórdão cuja parte se acabou de transcrever.

Como se alcança do artigo 135º-B não ficou afastada a tributação dos imóveis afetos à habitação e terrenos para construção utilizados pelas pessoas coletivas no âmbito da sua atividade económica, a exclusão da incidência apenas teve por base a espécie de prédios a que alude o artigo 6º do CIMI, precisamente os referidos nas alíneas b) e d) do seu nº 1 e não outros, não havendo, no entender do Tribunal, má interpretação do citado artigo.

A tributação em AIMI não se pode comparar com a tributação prevista na revogada verba 28 da TGIS, na medida em que o legislador criou uma designação e uma sistemática da tributação com remissão expressa para os critérios próprios do CIMI, não podendo ser transportadas para o AIMI critérios ou decisões tomadas no âmbito daquela revogada norma, conforme se deduz da argumentação usada pela requerente.

Assim quer a liquidação em causa quer o indeferimento da respetiva reclamação graciosa, não padecem dos erros apontados pela requerente, improcedendo assim o pedido.

 

4. Pedido de Pagamento de Juros Indemnizatórios

 

Tendo em conta o referido no ponto 3, fica sem interesse a apreciação da questão dos juros indemnizatórios.

 

IV – DECISÃO

 

Face ao exposto, o tribunal decide o seguinte:

a)            Declarar improcedente o pedido de pronúncia arbitral contra a liquidação de AIMI com o n.º 2017..., no montante de EUR 24.422,15 e contra a decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa notificada por ofício datado de 04.07.2018, que correu termos no Serviço de Finanças de Cascais -..., mantendo-se ambos os atos válidos na ordem jurídica.

b)           Fixar o valor do processo em € 24 422,15 de harmonia com as disposições contidas no artigo 299º, nº 1, do CPC , artigo 97º-A do CPPT , e artigo 3º, nº2, do RCPAT .

c)            Custas a cargo da requerente, ao abrigo do nº4 do artigo 22º do RJAT, fixando-se o respetivo montante em € 1 530,00 de acordo com o disposto na tabela I referida no artigo 4º do RCPAT.

 

Notifique.

 

Lisboa, 30 de Abril de 2019

 

Texto elaborado em computador, nos termos, nos termos do artigo 131º, nº 5 do CPC, aplicável por remissão do artigo 29º, nº1, alínea e) do RJAT, com versos em branco e revisto pelo tribunal.

 

O árbitro singular,

Arlindo Francisco