|
|
Versão em PDF |
DECISÃO ARBITRAL
I – Relatório
-
A A..., S.A. (doravante, “Requerente”), com o NIPC..., com sede na ..., ..., ..., ...-... Porto Salvo, na qualidade de sociedade gestora e em representação do B...– Fundo Especial de Investimento Imobiliário Fechado, com o NIPC..., apresentou um pedido de constituição de Tribunal Arbitral Colectivo, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante "RJAT"), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante "AT" ou "Requerida").
-
A Requerente vem pedir, em cumulação de pedidos, a pronúncia arbitral sobre a ilegalidade do acto de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa, e consequente anulação, dos actos de liquidação em sede de Imposto do Selo (doravante "IS") ao abrigo do artigo 1.º, 1 do Código do IS (doravante, "CIS") e da Verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (doravante "TGIS"), relativos aos prédios com os artigos ... e ..., sitos na freguesia de ..., concelho da Amadora, distrito de Lisboa, de que a Requerente era então titular, e formalizados nas liquidações n.ºs 2015..., n.º 2015..., n.º 2015... (U-...) e n.º 2015..., n.º 2015... e n.º 2015... (U-...), no valor global de €198.549,50.
-
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou os árbitros do Tribunal Arbitral Colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável, e notificou as partes dessa designação em 03-01-2019.
-
O Tribunal Arbitral Colectivo ficou constituído em 23-01-2019; foi-o regularmente e é materialmente competente, à face do preceituado nos arts. 2.º, n.º 1, alínea a), 5º, 6º, n.º 1, e 11º, n.º 1, do RJAT (com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro).
-
Nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 17º do RJAT, foi a AT notificada, em 23-01-2019, para apresentar Resposta.
-
A AT apresentou a sua Resposta em 21-02-2019.
-
Nessa resposta a AT pugna, em síntese, pela total improcedência do pedido da Requerente.
-
O Despacho Arbitral de 24-02-2019 dispensou a realização da reunião a que alude o art. 18º do RJAT, e facultou às partes a faculdade de apresentarem alegações escritas, o que fizeram, pronunciando-se sobre a prova produzida e reiterando e desenvolvendo as respectivas posições jurídicas
-
O processo não enferma de nulidades e não subsistem mais questões, prévias ou subsequentes, prejudiciais ou de excepção, que obstem à apreciação do mérito da causa, mostrando-se reunidas as condições para ser proferida decisão final.
-
A AT procedeu à designação dos seus representantes nos autos e a Requerente juntou procuração, encontrando-se assim as Partes devidamente representadas.
-
As Partes têm personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade, nos termos dos arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
II – Fundamentação: a matéria de facto
II.A. Factos que se consideram provados e com relevância para a decisão
-
O “Fundo”, aqui representado pela Requerente é, um fundo de investimento imobiliário fechado, cuja constituição de enquadra no Regime Geral dos Organismos de Investimento Colectivo.
-
O “Fundo” é, no âmbito da sua actividade, proprietário de diversos prédios, incluindo prédios habitacionais, comerciais e terrenos para construção, por si adquiridos.
-
Em 2014, o “Fundo” era proprietário dos seguintes prédios urbanos:
-
Prédio urbano (“terreno para construção”) com o artigo matricial ..., da freguesia de ..., concelho da Amadora, distrito de Lisboa, com o VPT de €1.937790,00;
-
Prédio urbano (“terreno para construção”) com o artigo matricial ..., da freguesia de ..., concelho da Amadora, distrito de Lisboa, com o VPT de €17.917.160,00.
-
Em 2014, os prédios urbanos supra referidos estavam inscritos na matriz predial como “terreno para construção”.
-
No ano de 2014, constava das respectivas cadernetas prediais dos prédios urbanos aqui em causa, no item “Tipo de coeficiente de localização: Habitação”.
-
Em 2015, o “Fundo” foi notificado das seguintes liquidações de Imposto do Selo referentes ao ano de 2014 (e correspondentes à repartição do IS por três prestações):
Artigo matricial
|
Nº da liquidação
|
U-...
|
2015 ...
|
2015 ...
|
2015 ...
|
U-...
|
2015 ...
|
2015...
|
2015...
|
Valor total
|
€198.549,50
|
-
As liquidações resultaram da aplicação do art. 1º, 1 do CIS, conjugado com a verba 28.1 da TGIS e com o art. 6º da Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro.
-
O “Fundo” procedeu, tempestivamente, ao pagamento das referidas liquidações de Imposto de Selo.
-
A Requerente apresentou pedido de revisão oficiosa, tendo por objecto as referidas liquidações de Imposto de Selo.
-
A Requerente não foi notificada, até à data da apresentação do pedido arbitral, da decisão do pedido de revisão oficiosa apresentado.
II.B. Factos que se consideram não provados
-
Que, relativamente ao prédio urbano com artigo matricial..., da freguesia de ..., concelho da Amadora, distrito de Lisboa existisse, à data do facto tributário, alvará de loteamento ou alvará de licença de construção, ou projecto aprovado, ou comunicação prévia, ou informação prévia favorável ou documento comprovativo de viabilidade construtiva, que previsse como construção possível a habitação.
-
Que, relativamente ao prédio urbano com artigo matricial..., da freguesia de ..., concelho da Amadora, distrito de Lisboa, existisse, à data do facto tributário, alvará de loteamento ou alvará de licença de construção, ou projecto aprovado, ou comunicação prévia, ou informação prévia favorável ou documento comprovativo de viabilidade construtiva, que previsse como construção possível a habitação.
II.C – Fundamentação dos factos provados e não provados
-
Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).
-
Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
-
Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º/7 do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.
-
Os factos dados como não provados devem-se à ausência ou insuficiência de prova, a eles relativos.
-
Efectivamente, não obstante dos documentos integrantes do PA (fichas de avaliação e cadernetas prediais), constar que os terrenos em causa constituem lotes e, por conseguinte, se possa presumir a existência de um alvará de loteamento, fica-se sem se saber se tal possível loteamento prevê, ou não, e em que medida, a edificação de construção destinada a habitação.
-
Por outro lado, embora dos mesmos referidos documentos conste que o coeficiente de localização utilizado para efeitos da avaliação tenha sido o de habitação, tal não permite, com a segurança suficiente, concluir que o alvará de loteamento eventualmente existente preveja, na sua totalidade, ou, sequer, na sua maior parte, que seja essa a finalidade prevista para a construção autorizada.
-
Assim, embora como refere a Requerida, “a caderneta predial é claríssima ao definir para os lotes de terreno para construção em causa, a respectiva área de implantação do edifício e de construção”, daí não se pode concluir, como se referiu, para lá de qualquer dúvida razoável, se, e em que medida, o eventual alvará de loteamento prevê que os lotes de terreno para construção em causa, na área de implantação do edifício e de construção, têm autorizada a edificação destinada a habitação.
III – Fundamentação: a matéria de Direito
III.A. Posição da Requerente
-
A Requerente começa por alegar que a incidência objectiva da verba 28.1 da TGIS não pode abarcar prédios que, estando inscritos na matriz como "terrenos para construção", não são subsumíveis ao conceito de "prédios com afectação habitacional", aquele conceito que integra a previsão legal.
-
Analisando o contexto da introdução da verba 28 da TGIS, a Requerente enfatiza que, mesmo após as alterações introduzidas pela Lei nº 83-C/2013, de 31 de Dezembro, e que entraram em vigor em 1 de Janeiro de 2014, a tributação continua a cingir-se a situações em que tenha sido autorizada ou prevista uma efectiva edificação no terreno, e que tal edificação se destine a "habitação".
-
Assim, sustenta, não bastará que a mera inscrição matricial de um prédio o identifique como "terreno para construção", sendo necessário, adicionalmente que, caso a caso, e concretamente, se determine se existe todo o processo administrativo associado à construção e, finalmente, uma licença/autorização de construção válidas e um projecto aprovado.
-
Alega a Requerente que as liquidações ora contestadas padecem de ilegalidade por erro sobre os pressupostos de facto, uma vez que assentam no pressuposto errado de que os prédios urbanos tinham, em 2014, uma edificação autorizada ou prevista para “Habitação”.
-
Entende, portanto, a Requerente que os três pressupostos legais cumulativos de que depende a incidência da verba 28.1 da TGIS não estão preenchidos.
-
Refere ainda a Requerente que os imóveis em questão não são utilizados na sua actividade habitual, pelo que a titularidade do direito de propriedade sobre esses imóveis não evidencia uma capacidade contributiva superior.
-
Alega, a Requerente que a tributação especial prevista na verba 28.1 da TGIS, quando interpretada por forma a ser aplicada a “terrenos para construção”, é contrária ao princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da CRP e, em paralelo, contrária ao princípio da igualdade fiscal e da capacidade contributiva, consagrados no artigo 104.º, n.º 3 da CRP.
-
A Requerente alega, por fim, ter pago integralmente as quantias liquidadas, pedindo por isso para ser ressarcida e para lhe serem atribuídos juros indemnizatórios, por ter sido indevido esse pagamento e ser identificável um erro imputável aos serviços.
III.B. Posição da Requerida
-
Na sua Resposta, a Requerida alega que as liquidações impugnadas são legais, sendo que não se verificou qualquer erro dos serviços na sujeição do prédio em causa à norma da Verba 28. 1 da TGIS.
-
Alega a Requerida que, para efeitos de determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção, é clara a aplicação do coeficiente de afectação em sede de avaliação, o que é sintomático que a sua consideração para efeitos de aplicação da verba 28.1 da TGIS não pode ser ignorada.
-
A Requerida lembra que a Requerente não pode desconhecer que a caderneta predial é claríssima ao definir para os lotes de terreno para construção em causa, a respectiva área de implantação do edifício e de construção, pelo que é patente a afectação habitacional do edifício.
-
Quanto à questão da inconstitucionalidade da Verba 28.1 da TGIS levantada pela Requerente, defende a Requerida que o legislador definiu um pressuposto económico constitucionalmente válido, como manifestação da capacidade contributiva exigida para o pagamento deste imposto, não se verificando, portanto, qualquer violação do princípio da igualdade ou da capacidade contributiva.
-
Relativamente aos juros indemnizatórios peticionados pela Requerente, entende a Requerida que as liquidações aqui em causa foram efectuadas com base na lei aplicável, à qual a Administração Tributária está vinculada por força do princípio da legalidade, pelo que não se verificou qualquer erro dos serviços, nos termos do artigo 43.º da LGT.
III.C. Questões a decidir
III.C.1 – Do mérito da causa
A única questão a dirimir nos presentes autos de processo arbitral tributário prende-se com a aplicação da verba 28.1 da tabela anexa ao CIS (Tabela Geral do Imposto do Selo) aos prédios urbanos (“terrenos para construção”) com o artigo matricial ... e..., ambos da freguesia de ..., concelho da Amadora, distrito de Lisboa.
Está, assim, em causa a definição do âmbito de incidência da verba nº 28.l. da TGIS, na redacção dada pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro, mais concretamente determinar se os terrenos para construção em questão no presente processo podem subsumir-se no conceito de “terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI” a que alude a referida verba, tendo em conta que o valor patrimonial é superior a € 1.000.000,00.
A questão coloca-se em virtude da tributação em sede de imposto do selo da propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário, constante da matriz, seja igual ou superior a € 1.000.000, caso em que é devido imposto, à taxa de 1%, sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI, por prédio com afectação habitacional.
Esta questão não é nova, tendo sido objecto de apreciação quer na jurisdição arbitral, quer na jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo; sendo que, no âmbito da redacção do CIS dada pela Lei n° 55-A/2012, de 29 de Outubro, as decisões proferidas foram-no sempre em sentido contrário ao pretendido pela Administração Tributária[1].
A situação sub iudice, todavia, dá-se num quadro jurídico diferenciado, na medida em que os factos deverão ser apreciados à luz da redacção do CIS introduzida pelo Orçamento de Estado para 2014, Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro (artigo 194º, sob a epígrafe - Alteração à Tabela Geral do Imposto do Selo), nos termos do qual a verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, anexa ao Código do Imposto do Selo, aprovado pela Lei n.º 150/99, de 11 de Setembro, passou a ter a seguinte redacção:
«28.1 — Por prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI — 1 %».
Neste novo quadro legal, foram já proferidas decisões em sede arbitral, igualmente em sentido desfavorável ao sustentado pela AT[2].
A referida jurisprudência assenta no entendimento de que se deverá ter como preenchendo os pressupostos da nova verba 28.1 da TGIS:
“no que se refere a terrenos para construção, quer estejam, ou não, localizados dentro de um aglomerado urbano, tal como vem definido no art. 3.º/4 do presente diploma [CIMI], devem, como tal, ser considerados os terrenos relativamente aos quais tenha sido concedida: - licença para operação de loteamento; - licença de construção; - autorização para operação de loteamento; - autorização de construção; - admitida comunicação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção; emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção, bem assim como; - aqueles que assim tenham sido declarados no título aquisitivo, devendo ter-se em atenção que, também para esse efeito, apenas deve relevar o título aquisitivo com a forma preceituada pela lei civil, ou seja, a escritura pública ou o documento particular autenticado referidos no art. 875.º CC.” [vd. ANTÓNIO SANTOS ROCHA / EDUARDO JOSÉ MARTINS BRÁS – Tributação do Património. IMI-IMT e Imposto do Selo (Anotados e Comentados). Coimbra, Almedina, 2015, p. 44].”[3]
Também no acórdão proferido no processo arbitral 142/2016T, já citado, que concluiu, igualmente, pela procedência do pedido ali formulado, se pode ler o seguinte:
“Não há nestas normas da TGIS e do CIMI indicação do que deve entender-se por «edificação prevista», mas, tendo em conta os documentos exigidos para ser efectuada a avaliação de terrenos para construção, indicados no artigo 37.º, n.º 3, do CIMI, conclui-se que apenas se pode falar de construção autorizada ou prevista quando o «edifício a construir», a que se refere o n.º 1 do artigo 45.º, esteja definido em alvará de loteamento ou alvará de licença de construção, ou projecto aprovado, ou comunicação prévia, ou informação prévia favorável ou documento comprovativo de viabilidade construtiva".
Subscreve-se integralmente aqui, o entendimento dos referidos acórdãos, quanto ao que, face à nova redacção do CIS, se deve entender por “terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI”.
Com efeito, de acordo com o CIMI, os terrenos para construção, que, de acordo com o artigo 6.º/1/c) de tal Código, constituem um tipo de prédio urbano, poderão ter como afectação a habitação, conforme decorre do artigo 41.º, também do CIMI, afectação essa que, como resulta, para além do mais, expressamente do artigo 45.º/5 do CIMI, será determinada com base nos elementos a que alude o artigo 37.º do mesmo Código, sendo que o n.º 3 deste artigo se refere que:
“Em relação aos terrenos para construção, deve ser apresentada fotocópia do alvará de loteamento, que deve ser substituída, caso não exista loteamento, por fotocópia do alvará de licença de construção, projecto aprovado, comunicação prévia, informação prévia favorável ou documento comprovativo de viabilidade construtiva”.
A menção da verba 28.1 da TGIS em análise deve ser lida, assim, como remetendo para o conteúdo material do que, face ao CIMI, seja “terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação”, não se bastando com a mera formalidade de a AT – bem ou mal -, em aplicação das normas daquele Código (CIMI), ter qualificado para efeitos matriciais um determinado imóvel como tendo essa afectação, já que se fosse essa a intenção do legislador, dentro da presunção de razoabilidade que lhe subjaz, seguramente que teria utilizado a expressão “terreno cujo tipo de coeficiente de localização utilizado para efeitos de determinação do VPT seja habitação”, ou outra, análoga.
Não está assim em causa qualquer vício do procedimento de avaliação dos imóveis, uma vez que tal procedimento se destina exclusivamente a fixar o valor patrimonial daqueles, que não é posto em causa, mas, unicamente, a aferição da verificação dos pressupostos da verba 28.1 da TGIS, sendo que entre estes não se encontra, manifestamente, o “Tipo de coeficiente de localização” constante das matrizes prediais.
Conclui-se, assim, aqui, como na jurisprudência atrás citada, que deverão considerar-se como “terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI”, aqueles terrenos em que o «edifício a construir» esteja definido como destinado a habitação em alvará de loteamento ou alvará de licença de construção, ou projecto aprovado, ou comunicação prévia, ou informação prévia favorável ou documento comprovativo de viabilidade construtiva.
Este mesmo entendimento foi recentemente ratificado pelo STA, no seu Acórdão de 28-11-2018, proferido no processo 0829/15.5BELLE 01065/16, onde se pode ler, para além do mais, que:
“Assim, no que se refere a terrenos para construção, quer estejam, ou não, localizados dentro de um aglomerado urbano, devem, de acordo com o artº 6º, nº 3 do CIMI, ser considerados como tal os terrenos relativamente aos quais tenha sido concedida: - licença para operação de loteamento; - licença de construção; - autorização para operação de loteamento; - autorização de construção; - admitida comunicação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção; emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção, bem assim como aqueles que assim tenham sido declarados no título aquisitivo.”
Ora, no caso, não se apurou que existisse, à data do facto tributário, alvará de loteamento ou alvará de licença de construção, ou projecto aprovado, ou comunicação prévia, ou informação prévia favorável ou documento comprovativo de viabilidade construtiva, que previsse como construção possível a habitação, relativamente aos prédios urbanos com os artigos matriciais ... e..., da freguesia de ..., concelho da Amadora e distrito de Lisboa.
Recorde-se a redacção da Verba 28.1 da TGIS em vigor à data dos factos, que determinava o seguinte: “28.1 — Por prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI — 1 %”. Daqui, desde logo se conclui que, tendo os terrenos em causa, a que correspondem os artigos matriciais ... e ... um VPT, respetivamente, de €1.937.790,00 e €17.917.160,00, está preenchida a incidência objectiva.
Todavia, não ficou demonstrado através dos elementos de prova carreados para o processo que, à data dos factos, existisse para os prédios em questão alvará de loteamento ou alvará de licença de construção, ou projecto aprovado, ou comunicação prévia, ou informação prévia favorável ou documento comprovativo de viabilidade construtiva, que previsse como construção possível a habitação.
Note-se que, ainda que a destinação da construção prevista deverá ser exclusiva, conforme o STA esclareceu já, no processo 080/18, por acórdão de 06-06-2018, onde se refere que:
“I - Na presente situação em que foi concedido um alvará de loteamento de acordo com o qual os prédios se destinam "a habitação colectiva e comércio/serviços", não está em causa um prédio cujo destino é apenas a habitação.
II - Não estabelece a verba 28 em análise qualquer critério ou necessidade de ponderação sobre a percentagem em que o prédio se destina a habitação ou a comércio/serviços para podermos considerar que o legislador teve em conta tal realidade e, nada havendo dito sobre ela, concluirmos que a pretende dissolver na afectação para habitação.
III - A Lei 83-C/2013, de 31 de Dezembro esclareceu que os anteriormente por ele denominados prédios com afectação habitacional eram, afinal, os prédios urbanos ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação.
IV - Para neste normativo estarem englobados os presentes prédios era absolutamente necessário que houvesse indicação de se são também tributados nesta sede os prédios urbanos ou terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja, predominantemente, para habitação.”
Mais se exara no aresto referido que:
“Na presente situação sabemos que foi concedido um alvará de loteamento pelo Alvará de Loteamento n.º 5/2006, de acordo com o qual os prédios se destinam "a habitação colectiva e comércio/serviços", o que é diverso de se destinarem a habitação. Não estabelece a verba 28 em análise qualquer critério ou necessidade de ponderação sobre a percentagem em que o prédio se destina a habitação ou a comércio/serviços(...)
Também se desconhece qual a frequência e peso específico no volume edificado para o mercado imobiliário da afetação de certas partes dos edifícios, mormente do respetivo rés-do-chão, a fins diversos da habitação, mormente, o comércio e os serviços, precisamente por força de razões económicas, de estratégia financeira, atinentes à rentabilidade e fruição de todos os espaços disponíveis, de que a norma em apreço não dá qualquer nota ou relevo. Existe, mas não sabemos se é significativa e, não podemos considerar que o legislador teve em conta tal realidade e, nada havendo dito sobre ela, concluirmos que a pretende dissolver na afectação para habitação.
Ao invés, cremos que é uma realidade que não foi tida em conta pelo legislador, como antes não havia devidamente ponderado que a lei estabelece uma clara distinção entre prédios urbanos “habitacionais” e “terrenos para construção”, que com a Lei 83-C/2013, de 31 de Dezembro esclareceu que os anteriormente por ele denominados prédios com afectação habitacional eram, afinal, os prédios urbanos ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação. Para neste normativo estarem englobados os presentes prédios era absolutamente necessário que houvesse indicação de se são também tributados nesta sede os prédios urbanos ou terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja, predominantemente, para habitação sob pena de carecermos de uma interpretação extensiva da norma de incidência em tudo desconforme com o disposto no art.º 103.º, n.º 2 e 3 da Constituição da República Portuguesa.”.
Também neste sentido o Acórdão 305/2017-T de 18 de Janeiro de 2018 do CAAD (disponível em www.caad.org.pt)
Face ao exposto, não se poderá considerar-se demonstrado que, relativamente aos terrenos em causa nos presentes autos, os mesmos sejam um “terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI”, não se demonstrando, como tal, preenchida relativamente a eles, a previsão da verba 28.1 da Tabela anexa ao CIS, na redacção aplicável, pelo que enfermarão os actos tributários impugnados que os têm como objecto, de erro sobre os pressupostos de facto, e consequente erro de direito, devendo, como tal, ser anulados, procedendo, nessa parte, o pedido arbitral, e ficando prejudicado o conhecimento das demais questões colocadas pela Requerente.
*
Quanto ao pedido de juros indemnizatórios formulado pela Requerente, o artigo 43.º, n.º 1, da LGT estabelece que são devidos juros indemnizatórios quando se determine, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
No caso, o erro que afecta as liquidações anuladas é imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira, que praticou os actos de liquidação por sua iniciativa, sem o necessário suporte factual e legal.
Tem, pois, direito a ser reembolsada a Requerente das quantias que pagou (nos termos do disposto nos artigos 100.º da LGT e 24.º, n.º 1, do RJAT) por força dos actos anulados e, ainda, a ser indemnizada pelo pagamento indevido através do pagamento de juros indemnizatórios, pela Requerida, desde a data do pagamento das quantias, até reembolso, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1 e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, artigo 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.
IV. Decisão
Em face de tudo quanto antecede, decide-se julgar procedente o pedido arbitral formulado nos presentes autos e, em consequência:
a) Anular as liquidações n.ºs 2015..., n.º 2015..., n.º 2015... (U-...) e n.º 2015..., n.º 2015 ... e n.º 2015 ... (U-...), bem como o indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa que teve as referidas liquidações por objecto;
b) Condenar a Requerida à restituição das quantias indevidamente pagas, por força das liquidações anuladas, bem como ao pagamento dos correspondentes juros indemnizatórios, desde a data do pagamento indevido das quantias, até ao seu reembolso, nos termos acima determinados.
c) Condenar a Requerida nas custas do processo abaixo fixadas.
V. Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em € 198.549,50 nos termos do disposto no art. 97.º-A do CPPT, aplicável ex vi art. 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT e art. 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processo de Arbitragem Tributária (RCPAT).
VI. Custas
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 3.672,00 , nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerida, uma vez que o pedido foi totalmente procedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.
Lisboa, 12 de Abril de 2019.
Os Árbitros
José Pedro Carvalho
(Presidente)
José Coutinho Pires
(Vogal)
Henrique Nogueira Nunes
(Vogal)
[1] Cfr., p. ex., Acórdãos 49/2013-T de 18 de Setembro de 2013, 53/2013-T de 2 de Outubro, 231/2013-T de 3/2/2014, Processo nº 7/2014-T, de 3 de Julho, 56/2014-T de 31 de Julho, 210/2014-T de 30 de Julho, Processo nº 125/2015-T, de 12 de Outubro, todos do CAAD (disponíveis em www.caad.org.pt) e o Acórdão do STA de 9 de abril de 2014, P1870/2013, a que se seguiram vários outros de teor semelhante, disponíveis em http://www.dgsi.pt/jsta.
[2] Cfr., p. ex., as decisões dos processos arbitrais 156/2016T, 142/2016T, 524/2015T, 578/2015T, 467/2015T, 290/2016T e 410/2017T, todas disponíveis em www.caad.org.pt.
[3] Cfr. neste sentido, o acórdão proferido no processo 156/2016T, já citado.
|
|