Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 368/2018-T
Data da decisão: 2019-04-11  IMI  
Valor do pedido: € 5.843,24
Tema: AIMI - Opção pela tributação conjunta
Versão em PDF

 

DECISÃO ARBITRAL

 

1. Relatório

Em 02-08-2018, A..., contribuinte n.º..., residente em ..., ..., Sevilha, Espanha, doravante designado por Requerente, submeteu ao Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) o pedido de constituição de tribunal arbitral com vista, de forma imediata, à declaração de ilegalidade do ato de indeferimento da reclamação graciosa, e de forma mediata, à declaração de ilegalidade do ato de liquidação de Adicional do Imposto Municipal sobre Imóveis (AIMI) n.º 2017..., do ano de 2017, no valor de 5.843.24 €.

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Ex.mo Senhor Presidente do CAAD em 03-08-2018 e notificado à Requerida na mesma data.

O Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6º n.º 2 alínea a) do RJAT, foi designado como árbitro a Sra. Doutora Suzana Fernandes da Costa, pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, em 21-09-2018, tendo a nomeação sido aceite, no prazo e termos legalmente previstos.

Na mesma data foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos do disposto no artigo 11º, nº 1, alíneas a) e b) do RJAT, conjugado com os artigos 6º e 7º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c), do nº 1, do artigo 11º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 12-10-2018.

Em 15-10-2018, foi proferido despacho a ordenar a notificação da Requerida para, no prazo de 30 dias, apresentar resposta e, caso quisesse, solicitar a produção de prova adicional e remeter ao tribunal arbitral cópia do processo administrativo dentro do prazo de apresentação da resposta.

Em 12-11-2018, a Requerida apresentou a sua resposta e juntou aos autos o processo administrativo.

Em 15-11-2018, foi proferido despacho no sentido de notificar o Requerentes para, em 10 dias, se pronunciar se estaria ou não de acordo com a dispensa da reunião prevista no artigo 18º do RJAT, e com a dispensa da apresentação de alegações. O Requerente veio aos autos, em 26-11-2018, informar que estava de acordo com a dispensa da reunião, mas que deveria haver lugar à apresentação de alegações.

Em 03-01-2019, foi proferido despacho a dispensar a reunião, tendo em conta a posição das partes, ao abrigo do disposto nos artigos 16º alínea c) e 19 do RJAT, e atendendo também aos princípios da economia processual e da proibição da prática de atos inúteis. No mesmo despacho, foi ordenada a notificação das partes para, querendo, apresentarem alegações escritas, no prazo de 20 dias. Designou--se ainda o dia 28-03-2019 para a prolação da decisão, e advertiu-se o Requerente para juntar aos autos, até essa data, o comprovativo do pagamento da taxa arbitral subsequente.

O Requerente apresentou alegações escritas em 08-01-2019, tendo também nessa data junto aos autos o comprovativo do pagamento da taxa arbitral subsequente. A Requerida juntou as suas alegações em 28-01-2019.

Em 28-01-2019, a Requerente veio aos autos juntar a decisão arbitral do processo n.º 367/2018-T.

No dia 28-03-2019, foi proferido despacho a prorrogar o prazo para a decisão para o dia 11-04-2019, tendo com conta a complexidade da questão e por não estar ainda concluída a análise da questão de fundo e jurisprudência existente.

Em 08-04-2019, a Requerente veio aos autos juntar a decisão arbitral do processo n.º 344/2018-T.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (artigos 4º e 10º n.º 1 e 2 do RJAT e artigo 1º da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 de março).

O pedido arbitral é tempestivo, nos termos do artigo 10º n.º 1 alínea a) do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de janeiro e do artigo 102º n.º 1 alínea a) do Código do Procedimento e do Processo Tributário.

O processo não enferma de nulidades e não foram suscitadas questões prévias.

2. Causa de pedir

O Requerente começa por referir que foi notificado, em agosto de 2017, da liquidação de AIMI do ano de 2017, com imposto a pagar no valor de 5.84324 €, liquidação essa que incidiu sobre o valor patrimonial tributário global dos prédios urbanos destinados à habitação de que o Requerente é proprietário, no montante de 1.304.324,31 €.

O Requerente refere que entregou tempestivamente, a 28-09-2017, conjuntamente com o seu cônjuge, uma declaração de opção pela tributação conjunta para efeitos de AIMI, e que requereu a anulação da liquidação de AIMI entretanto notificada e a correspondente emissão de uma nova liquidação de AIMI, em consonância com a opção pela tributação conjunta efetuada.

O Requerente entende que com a opção pela tributação conjunta, o valor do imposto devido em sede de AIMI seria de zero euros, por o valor patrimonial tributário dos imóveis não ultrapassar o montante de 1.200.000 €.

Uma vez que não recebeu qualquer notificação de anulação da liquidação de AIMI em causa, o Requerente refere que apresentou reclamação graciosa da liquidação, por entender que a mesma deveria ser anulada. Esta reclamação graciosa foi expressamente indeferida.

Quanto à decisão de indeferimento da reclamação graciosa, o Requerente refere que a mesma incorre em vício de forma por falta de fundamentação e por fundamentação incongruente.

No entender do Requerente, a AT indeferiu a reclamação sem fundamentar a decisão tomada, ou fazendo-o de forma manifestamente insuficiente, em violação dos artigos 268º n.º 3 da Constituição da República Portuguesa (CRP) e 77º n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT).

Para além da falta de fundamentação, o Requerente alega que a AT invoca, erradamente, que o Requerente estaria obrigado a apresentar uma declaração no prazo alegadamente estabelecido na lei – 1 de abril a 31 de maio – para poder beneficiar da opção pela tributação conjunta.

Para o Requerente, no artigo 135º-D n.º 1 do Código do IMI o legislador limitou-se a prescrever que a tributação conjunta pode ser efetuada por opção dos sujeitos passivos casados ou unidos de facto, sem contudo, determinar de que modo ou em que prazo devem estes contribuintes proceder à mesma opção.

No entendimento do Requerente, a AT confunde o regime previsto no artigo 135º-D n.º 1 do Código do IMI, aplicável ao caso, com o regime previsto no artigo 135º-D n.º 2 do Código do IMI (prazo de 1 de abril a 31 de maio), o qual nunca se poderia aplicar ao caso uma vez que a Requerente não é casado no regime da comunhão de bens.

O Requerente alega, assim, que não resulta da lei nem o modo nem o prazo para proceder à opção pela tributação conjunta, não podendo, portanto, aceitar o argumento da AT segundo o qual o Requerente terá exercido intempestivamente o respetivo direito de opção pela tributação conjunta.

O Requerente menciona que ainda que se considerasse ser o disposto no n.º 3 do artigo 135º-D do Código do IMI aplicável à opção pela tributação conjunta, sempre se deve referir que este se limita a estabelecer que não sendo efetuada a declaração no prazo estabelecido, o AIMI é liquidado sobre cada um dos cônjuges sobre a soma dos valores dos prédios que já constavam da matriz na respetiva titularidade.

Para o Requerente, da lei não resulta que fica precludido o direito do sujeito passivo de exercer a respetiva opção pela tributação conjunta à posteriori. Refere que o entendimento exposto pode até ser confirmado pela jurisprudência dos tribunais superiores relativamente à opção pela tributação conjunta ou separada em sede de IRS a qual é digna de menção, a título de lugar paralelo, não obstante se tratar de um imposto diferente, atenta a similitude das questões de direito em causa.

Conclui o Requerente afirmando que não estando expressamente consagrado na lei a preclusão de um determinado direito por exercício intempestivo ou a irreversibilidade de uma opção do sujeito passivo, não pode a AT arguir essa preclusão ou irreversibilidade, por estar vinculada ao princípio da legalidade.

O Requerente alega que uma norma que cria uma obrigação de opção, a qual apenas não será exercida por lapso ou desconhecimento do sujeito passivo, é suscetível de violar o princípio da confiança constitucionalmente protegido.

3. Resposta da Requerida

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta alegando a conformidade legal do ato tributário objeto do pedido arbitral.

A AT começa por referir que não concorda com o entendimento do Requerente de falta de fundamentação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, já que no entender da AT não é possível afirmar que determinado ato se encontra infundamentado quando a motivação contextual permitiu ao seu destinatário ficar a saber as razões de facto e de direito que levaram a AT a tomar a decisão em causa, com aquele sentido e conteúdo.

Quanto à liquidação em causa, a AT refere que está em causa a aplicação do artigo 135º-D do Código do IMI, sendo que a opção pela tributação conjunta apenas foi efetuada pelos sujeitos passivos em momento posterior à notificação da liquidação de AIMI impugnada.

A AT entende que a norma prevista no n.º 4 do artigo 135º-D é aplicável às situações consagradas no n.º 1 do mesmo artigo, não obstante o vocábulo “declaração” apenas surgir nos números 2 e 3.

A AT alega que para que pudesse proceder atempadamente à emissão da liquidação considerando a tributação conjunta, sempre teria de haver informação nesse sentido, prestada pelos sujeitos passivos do imposto e com base na qual a liquidação seria efetuada. Assim, para a AT a opção pela tributação conjunta tinha necessariamente de constar de uma declaração apresentada pelos conjugues ou unidos de facto, num determinado prazo, conforme resulta do artigo 135º-D do Código do IMI.

A Requerida alega que a interpretação do Requerente não pode colher por força da Portaria n.º 90-A/2017 de 01-03, que refere no artigo 1º que os modelos declarativos se aplicam à opção pela tributação conjunta prevista no n.º 1 do artigo 135º-D do Código do IMI.

Refere também a AT que o prazo previsto no n.º 4 do artigo 135º-D do Código do IMI tem aplicação na situação em questão, e sendo de natureza substantiva, está sujeito ao regime de caducidade previsto nos artigos 298º e 328ºe seguintes do Código Civil.

Em conclusão, a AT refere que a liquidação de AIMI em questão é juridicamente válida, uma vez que o Requerente e o cônjuge não expressaram atempadamente, ou seja, dentro do prazo legalmente previsto para o efeito, as suas vontades no sentido de lhes ser aplicável o regime de tributação conjunta nesse ano.

4. Matéria de facto

4. 1. Factos provados:

Analisada a prova documental produzida e a posição das partes constante das peças processuais, consideram-se provados e com interesse para a decisão da causa os seguintes factos:

  1. Em agosto de 2017, o Requerente foi notificado da liquidação de AIMI n.º 2017..., do ano de 2017, no valor de 5.843,24 €, conforme documento 3 junto ao pedido arbitral.
  2. A liquidação em causa incidiu sobre o valor patrimonial tributário global dos prédios urbanos destinados à habitação de que o Requerente é proprietário, no valor de 1.304.324,31 €.
  3. O Requerente é casado com B..., contribuinte n.º... .
  4. O Requerente e o seu cônjuge não são casados no regime da comunhão de bens.
  5. Em 29-09-2017, o Requerente e o seu cônjuge entregaram no Serviço de Finanças de Lisboa ..., uma declaração na qual indicavam a opção pela tributação conjunta em sede de AIMI, conforme documento 4 junto ao pedido arbitral.
  6. Em virtude da opção feita, foi ainda solicitada pelo Requerente e pelo seu cônjuge, a anulação da liquidação do AIMI notificada e a emissão de uma nova liquidação de AIMI refletindo a opção pela tributação conjunta.
  7. O Requerente apresentou, em 02-01-2018, reclamação graciosa da liquidação de AIMI acima identificada, conforme documento 2 junto ao pedido arbitral.
  8. Em 01-07-2018, o Requerente foi notificado da decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada, conforme documento 1 junto ao pedido arbitral.
  9. Consta do projeto de decisão da reclamação graciosa, para o qual a decisão da reclamação remete, que: “(…) a AT dá iniciativa oficiosa aos procedimentos de liquidação com base nos dados inscritos nas matrizes prediais e com efeitos à data do facto tributário – 1 de janeiro do ano a que respeita o imposto – recorrendo aos valores patrimoniais tributários e aos sujeitos passivos nela averbados como titulares dos direitos reais de gozo dos imóveis (incidência subjetiva).

Porém, o AIMI admite que as pessoas singulares casadas ou em união de facto, podem, nos termos previstos no art.º 135-D do CIMI, configurar o lançamento do imposto, mediante a declaração de ambos que manifeste a vontade na realização da tributação conjunta.

Foi, desta forma, consagrada a opção pela tributação conjunta, que deve ser exercida, mediante declaração, entre 1 de abril e 31 de maio (n.º 1 e 4 do art.º 135-D do CIMI).

A lei exige a declaração expressa e formal da vontade de cada um dos cônjuges ou unidos de facto para a opção pela tributação conjunta do AIMI (procedimento a identificar no portal das finanças).

Não se constata que o reclamante tenha exercido a referida opção, pelo que se mostra caducado o referido direito de opção pela tributação conjunta do AIMI”.

  1. O Requerente apresentou o presente pedido pronúncia arbitral em 02-08-2018.

Não se provaram outros factos com relevância para a decisão da causa.

4.2. Factos não provados

Não se verificaram quaisquer factos que não tenham sido provados.

4.3. Fundamentação da matéria de facto provada:

A convicção do árbitro fundou-se nos documentos juntos aos autos pelo Requerente e na posição das partes demonstrada nas peças processuais produzidas.

5. Matéria de direito:

5.1. Objeto e âmbito do presente processo

As questões essenciais de direito que se colocam neste processo são as seguintes:

- saber se a liquidação de AIMI em questão incorre ou não em vício de violação da lei, em virtude da opção pela tributação conjunta exercida em 29-09-2017, pelo Requerente e pelo seu cônjuge;

- saber se a decisão de indeferimento da reclamação graciosa incorre em vício de forma por falta de fundamentação e por fundamentação incongruente. 

De harmonia com o disposto no artigo 124.º do CPPT, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, do RJAT, não sendo imputados aos atos impugnados vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade, nem indicada uma relação de subsidiariedade, a ordem de apreciação dos vícios deve ser a que, segundo o prudente critério do julgador, se mostre mais estável ou eficaz à tutela dos interesses ofendidos.

 No caso em apreço, apreciaremos, em primeiro lugar, os vícios de natureza procedimental invocados pelo Requerente (falta de fundamentação e fundamentação incongruente), e depois a questão de fundo que é a ilegalidade da liquidação de AIMI.

 

5.2. Do vício de forma por falta de fundamentação e por fundamentação incongruente

 O Requerente alega que a AT indeferiu a reclamação graciosa por si apresentada, contra a liquidação do AIMI sem fundamentar a decisão tomada, ou fazendo-o de forma manifestamente insuficiente.

Com efeito, a fundamentação é uma exigência dos atos tributários em geral, sendo uma imposição constitucional (artigo 268º da CRP) e legal (artigo 77º da LGT).

É hoje pacífico na doutrina e na jurisprudência nacionais que a fundamentação exigível tem de reunir as seguintes características:

  1. Oficiosidade: deve partir sempre da iniciativa da administração, não sendo admissíveis fundamentações a pedido;
  2. Contemporaneidade: deve ser coeva da prática do ato, não podendo haver fundamentações diferidas;
  3. Clareza: deve ser compreensível por um destinatário médio, evitando conceitos polissémicos ou profundamente técnicos;
  4. Plenitude: deve conter todos os elementos essenciais e que foram determinantes da decisão tomada. Esta característica desdobra-se em duas exigências, a saber: o dever de justificação (normas legais e factualidade – domínio da legalidade) e de motivação (domínio da discricionariedade ou oportunidade, quando é preciso uma valoração).

Ora, se a fundamentação é, nos termos referidos, necessária e obrigatória, tal não pode nem deve ser entendido de uma forma abstrata e/ou absoluta, ou seja, a fundamentação exigível a um ato tributário concreto, deve ser aquela que funcionalmente é necessária para que aquele não se apresente perante o contribuinte como uma pura demonstração de arbítrio.

Esta será a pedra de toque do cumprimento do dever de fundamentação: quando, perante um destinatário médio colocado na posição do destinatário real, o ato tributário se apresente, sob um ponto de vista de razoabilidade, como um produto do puro arbítrio da Administração, por não serem discerníveis os motivos de facto e/ou de direito em que assenta, o ato padecerá de falta de fundamentação.

O artigo 77.º n.º 1 da LGT refere, assim, que: “a decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária”.

A AT invoca, no que respeita à fundamentação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, que “um homem médio colocado na posição do destinatário consegue apreender o sentido da informação prestada no procedimento”.

Concluindo a AT, assim, que “a fundamentação é suficientemente clara e inequívoca, tanto mais que o Requerente, por via do presente ppa, admite e demonstra, em face dos argumentos por si explanados ao longo do seu articulado, ter cabalmente compreendido o quadro fáctico e legal em que assentou a decisão da Requerida, já que tenta rebater a sua actuação”.

 Com efeito, para a AT a decisão de indeferimento da reclamação graciosa encontra-se devidamente fundamentada.

A fundamentação em questão consta do projeto de decisão da reclamação graciosa. E do mesmo consta o seguinte:

“(…) a AT dá iniciativa oficiosa aos procedimentos de liquidação com base nos dados inscritos nas matrizes prediais e com efeitos à data do facto tributário – 1 de janeiro do ano a que respeita o imposto – recorrendo aos valores patrimoniais tributários e aos sujeitos passivos nela averbados como titulares dos direitos reais de gozo dos imóveis (incidência subjetiva).

Porém, o AIMI admite que as pessoas singulares casadas ou em união de facto, podem, nos termos previstos no art.º 135-D do CIMI, configurar o lançamento do imposto, mediante a declaração de ambos que manifeste a vontade na realização da tributação conjunta.

Foi, desta forma, consagrada a opção pela tributação conjunta, que deve ser exercida, mediante declaração, entre 1 de abril e 31 de maio (n.º 1 e 4 do art.º 135-D do CIMI).

A lei exige a declaração expressa e formal da vontade de cada um dos cônjuges ou unidos de facto para a opção pela tributação conjunta do AIMI (procedimento a identificar no portal das finanças).

Não se constata que o reclamante tenha exercido a referida opção, pelo que se mostra caducado o referido direito de opção pela tributação conjunta do AIMI”.

Como se refere no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 02-07-2014 do processo n.º 01074/13, “a Administração Tributária tem o dever de fundamentar os actos de liquidação oficiosa de tributos, em conformidade com o princípio plasmado no art. 268º da CRP, acolhido nos arts. 125º do CPA e 77 º da LGT. O acto estará suficientemente fundamentado quando o administrado, colocado na posição de um destinatário normal – o bonus pater familiae de que fala o art. 487º nº 2 do Código Civil – possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, por aceitar ou não o acto”.

De acordo com o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 30-01-2013 do processo n.º 0105/12, “não ocorre vício formal de falta de fundamentação se a própria impugnante expressamente revela ter compreendido perfeitamente o processo lógico e jurídico que conduziu à decisão de tributação, reconhecendo ter percebido os pressupostos concretamente levados em conta pelo autor do acto e as razões por que foram alcançados os valores tributados, denunciando o percurso cognoscitivo e valorativo percorrido (…)”.

A nosso ver, a decisão da reclamação graciosa encontra-se suficientemente fundamentada, sendo percetível pelo teor do pedido arbitral que o Requerente compreendeu o processo lógico e jurídico da decisão de indeferimento da reclamação graciosa.

Será assim de concluir, como concluiu a decisão arbitral do processo n.º 344/2018-T, que a AT cumpriu cabalmente o seu dever de fundamentação, improcedendo nesta parte a posição do Requerente.

 

5.3. Do vício de violação da lei

 

No entendimento do Requerente, a liquidação de AIMI em causa incorre em vício de violação da lei, em virtude da opção pela tributação conjunta exercida tempestivamente, por si e pelo seu cônjuge.

Já a AT refere que o prazo para exercer a referida opção pela tributação conjunta em sede de AIMI decorreu entre 1 de abril e 31 de maio, e tendo o Requerente enviada a declaração de opção em 29-09-2017, fê-lo intempestivamente.

O Requerente alega que a Requerida confunde o regime previsto no artigo 135º-D n.º 1 do Código do IMI, aplicável ao caso, com o regime previsto no artigo 135º-D n.º 2 do Código do IMI (prazo de 1 de abril a 31 de maio), o qual nunca se poderia aplicar ao caso uma vez que a Requerente não é casado no regime da comunhão de bens.

O Requerente alega, assim, que não resulta da lei nem o modo nem o prazo para proceder à opção pela tributação conjunta, não podendo, portanto, aceitar o argumento da AT segundo o qual o Requerente terá exercido intempestivamente o respetivo direito de opção pela tributação conjunta.

Vejamos os termos da lei em vigor à data dos factos, aplicável ao caso concreto.

A Lei n.º 42/2016 de 28-12 aditou o capítulo XV, com a epígrafe “Adicional do Imposto Municipal sobre Imóveis”, que integrou os artigos 135º-A a 135º-K.

O artigo 135º-A n.º 1 do Código do IMI refere que:

“1. São sujeitos passivos do adicional ao imposto municipal sobre imóveis as pessoas singulares ou coletivas que sejam proprietários, usufrutuários ou superficiários de prédios urbanos situados no território português”.

E o artigo 135º-C do Código do IMI determina o seguinte:

1. O valor tributável corresponde à soma dos valores patrimoniais tributários, reportados a janeiro do ano a que respeita o adicional ao imposto municipal sobre imóveis, dos prédios que constam nas matrizes prediais na titularidade do sujeito passivo.

2. Ao valor tributável determinado nos termos do número anterior são deduzidas as seguintes importâncias:

a) € 600 000, quando o sujeito passivo é uma pessoa singular;

b) € 600 000, quando o sujeito passivo é uma herança indivisa”.

E o artigo 135º-D do Código do IMI dispõe que:

“1. Os sujeitos passivos casados ou em união de facto para efeitos do artigo 14.º do Código do IRS podem optar pela tributação conjunta deste adicional, somando-se os valores patrimoniais tributários dos prédios na sua titularidade e multiplicando-se por dois o valor da dedução prevista na alínea a) do n.º 2 do artigo anterior.

2 - Os sujeitos passivos casados sob os regimes de comunhão de bens que não exerçam a opção prevista no número anterior podem identificar, através de declaração conjunta, a titularidade dos prédios, indicando aqueles que são bens próprios de cada um deles e os que são bens comuns do casal.

3 - Não sendo efetuada a declaração no prazo estabelecido, o adicional ao imposto municipal sobre imóveis incide, relativamente a cada um dos cônjuges, sobre a soma dos valores dos prédios que já constavam da matriz na respetiva titularidade.

4 - A declaração, de modelo a aprovar por portaria e a apresentar exclusivamente no Portal das Finanças, deve ser efetuada de 1 de abril a 31 de maio.

5 - A declaração apresentada nos termos do n.º 2 atualiza a matriz quanto à titularidade dos prédios. 

6 - A opção a que se refere o n.º 1 é válida até ao exercício da respetiva renúncia”.

Tendo em conta estes artigos, concluímos que a lei estabelece o exercício da opção pela tributação conjunta para os sujeitos passivos casados ou em união de facto (n.º 1 do artigo 135º-D do Código do IMI), e o envio da declaração conjunta da titularidade dos prédios para os sujeitos passivos casados sob os regimes da comunhão de bens (n.º 2 do artigo 135º-D do Código do IMI).

A lei determina que, quanto à declaração conjunta da titularidade dos imóveis, a mesma deve ser apresentada entre o dia 1 de abril e o dia 31 de maio (n.º 4 do artigo 135º-D do Código do IMI).

Assim, entendemos que o prazo que consta do n.º 4 do artigo 135º do Código do IMI (de 1 de abril a 31 de maio) se refere à declaração conjunta da titularidade dos prédios qu3e pode ser apresentada pelos sujeitos passivos casados sob regimes de comunhão de bens, com o objetivo de identificar os imóveis que são bens próprios de cada um deles e os que são bens comuns, declaração essa prevista no n.º 2 do artigo 135º-D do Código do IMI.

Efetivamente, a lei não determinou o prazo para efeitos de exercício da opção pela tributação conjunta, para os sujeitos passivos casados ou em união de facto, opção essa prevista no n.º 1 do artigo 135º-D do Código do IMI.

De igual forma, a lei não prevê qual o modo de exercício dessa opção pela tributação conjunta por aqueles sujeitos passivos.

A Requerida alega que a interpretação do Requerente não pode colher por força da Portaria n.º 90-A/2017 de 01-03, que refere no artigo 1º que os modelos declarativos se aplicam à opção pela tributação conjunta prevista no n.º 1 do artigo 135º-D do Código do IMI.

No entanto, tal raciocínio viola o princípio da legalidade, dado que se a Portaria aplicasse o prazo a ambas as situações (tributação conjunta e declaração conjunta), contrariando o disposto na lei, estaríamos perante uma portaria com caráter inovatório, violando assim o princípio da legalidade a que a AT se encontra vinculada, tal como decidiram as decisões arbitrais dos processos n.º 367/2018-T e 344/2018-T.

Entendemos, portanto, que tem razão o Requerente ao alegar que a lei não determinou o modo nem o prazo para o exercício da opção pela tributação conjunta, em sede de tributação de AIMI, não se podendo considerar que o Requerente e o seu cônjuge exerceram a opção intempestivamente.

Por outro lado, o Requerente alega que da lei não resulta que fica precludido o direito do sujeito passivo de exercer a respetiva opção pela tributação conjunta à posteriori.

Caso ficasse precludido o direito à tributação conjunta em sede de AIMI por o Requerente ter apresentado a opção fora de prazo, tal implicaria um aumento injusto do imposto devido, e comportaria uma sanção fiscal para o Requerente, sendo que tal preclusão não resulta da lei.

Com efeito, a sanção para os sujeitos passivos que enviam declarações fiscais fora de prazo é a aplicação de um a coima em processo de contraordenação, e não o agravamento do imposto.

Assim, ainda que se considerasse que o Requerente exerceu a opção intempestivamente, nunca estaria precludido o direito do Requerente ser tributado em sede de AIMI com base na tributação conjunta.

Em conclusão, concluímos como as decisões arbitrais dos processos n.º 367/2018-T e 344/2018-T, que a decisão de indeferimento da reclamação graciosa está ferida de ilegalidade, devendo ser anulada, assim como deve ser anulação a liquidação de AIMI em causa nos autos, por vício de violação da lei.

6. Decisão

 

Em face do exposto, determina-se:

  1. Julgar totalmente procedente o pedido formulado pelo Requerente, quanto à ilegalidade da liquidação de AIMI n.º 2017..., do ano de 2017, no valor de 5.843.24 €;
  2. Condenar a Requerida no pagamento das custas do presente processo.

 

7. Valor do processo:

De acordo com o disposto no artigo 306º, n.º 2, do CPC e 97º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 3º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se o valor da ação em 5.843,24 €.

 

8. Custas:

Nos termos do artigo 22º, n.º 4, do RJAT, e da Tabela I anexa ao Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em 612 €, a cargo da Requerida, de acordo com o artigo 22º n.º 4 do RJAT.

Notifique.

Lisboa, 11 de abril de 2019.

Texto elaborado por computador, nos termos do artigo 138º, n.º 5 do Código do Processo Civil (CPC), aplicável por remissão do artigo 29º, n.º 1, alínea e) do Regime de Arbitragem Tributária, por mim revisto.

O árbitro singular

 

Suzana Fernandes da Costa