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Decisão Arbitral
Município de A... (doravante designado por “Requerente”), com o número de identificação fiscal ..., com sede na ..., ...-..., em ..., apresentou nos termos do disposto nos artigos 2.º n.º 1 a) e 10.º n.º 1 a) do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária ou “RJAT”), e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, pedido de constituição de Tribunal Arbitral, com vista a obter a pronúncia sobre o indeferimento da reclamação graciosa n.º ...2018... e obter a consequente anulação do acto tributário de liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”) n.º..., no valor global de €19.283,84.
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Ex.mo Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 29 de Outubro de 2018.
A AT respondeu, defendendo que o pedido deve ser julgado improcedente.
Foi dispensada a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT, em face do teor da matéria contida nos autos, tendo as Partes sido notificadas para apresentar alegações finais (facultativas).
O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas e estão representadas (artigo 4.º, e n.º 2 do artigo 10 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112/2011, de 22 de Março).
Não ocorrem quaisquer nulidades, excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento imediato do mérito da causa.
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MATÉRIA DE FACTO
Com base nos elementos que constam do processo e do processo administrativo junto aos autos, consideram-se provados os seguintes factos:
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O Requerente é uma pessoa colectiva pública que prossegue o interesse público e, nesse âmbito, são-lhe cometidas diversas atribuições e actividades, quer estritamente de gestão pública, quer também actividades que podem concorrer com o sector privado ou de gestão privada;
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O Requerente é um sujeito passivo misto de IVA, praticando simultaneamente operações isentas de imposto e operações sujeitas e não isentas, enquadrado no regime normal de periodicidade trimestral;
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No decurso do ano de 2015, o Requerente implementou um sistema de dedução de IVA, com base no critério da percentagem de dedução (pro rata) relativamente a inputs de utilização mista;
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Em consequência da referida revisão do método de dedução do IVA, o Requerente constatou que o exercício do direito à dedução efectuado nos anos 2012, 2013 e 2014 havia sido inferior ao que legalmente tinha direito.
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O Requerente procedeu à dedução dos montantes de IVA resultantes, essencialmente, de imposto incorrido relacionado com a implementação do critério pro rata, por inclusão dos mesmos no campo 40 da Declaração Periódica de IVA (“DP”) referente ao quarto trimestre de 2014;
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Na DP referente ao período 201412T, o Requerente requereu o reembolso integral do crédito acumulado no montante de €98.455,48;
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A Requerida deferiu parcialmente o reembolso solicitado pelo Requerente, tendo indeferido o reembolso solicitado correspondente aos períodos de 2012 e 2013;
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O Requerente procedeu à rectificação e substituição da DP referente ao período 201412T, excluindo desta os montantes relativos a 2012 e 2013, tendo sido solicitado o reembolso e objecto de pagamento o montante remanescente;
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No que concerne especificamente ao valor apurado com respeito ao exercício de 2013, seguindo as indicações dos serviços de inspecção tributária (SIT), o Requerente procedeu, em 16 de Setembro de 2015, à submissão de uma DP de substituição para o período 201312T, na qual, por inclusão do valor de €19.814,01 de imposto incorrido e ainda não deduzido, apurou um montante de dedução adicional de €43.797,32 – por contraposição ao valor anteriormente relevado de €23.983,31;
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No que se refere ao período 201503T (no qual se apurou imposto a entregar ao estado no valor de €832,63), foi emitida uma nova liquidação no montante de €18.981,38, resultante da diferença entre o imposto a pagar anteriormente apurado (€832,63) e o excesso a reportar (de período anterior) resultante da submissão da DP de substituição do período 201312T (€19.814,01);
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Em 23 de Outubro de 2017, os SIT derem início a novo procedimento inspectivo junto do Requerente, de que resultou a correcção ao valor incluído no campo 40 da DP de substituição do período 201312T, entregue a 14 de Setembro de 2015, no montante de €19.283,84;
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De acordo com o Relatório de Inspecção Tributária não é possível efectuar a dedução de IVA nos termos do art.º 23.º do CIVA relativamente aos anos de 2012 e 2013”, sendo a dedução das regularizações do prorata apenas possível até à entrega da ultima DP do ano em causa, não sendo aplicável neste casos os prazos previstos no n.º 2 do art.º 98 do CIVA e no n.º 1 do art. 78.º da LGT, nem sequer o prazo de dois anos previsto no n.º 1 do art. 131 do CPPT ou no n.º 6 do art. 78.º do CIVA.”;
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O Requerente apresentou, em 4 de Maio de 2018 reclamação graciosa, tendo por objecto a liquidação adicional de IVA n.º ... emitida pelo valor total de €19.283,84, referente ao período 12/2013;
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A 27 de Junho de 2018, o Requerente foi notificado da decisão definitiva indeferindo a reclamação apresentada;
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A 18 de Janeiro de 2018, o Requerente pagou o IVA resultante do acto liquidação de IVA n.º... .
FACTOS PROVADOS E MOTIVAÇÃO
Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de Direito, nos termos do artigo 596.º do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
Com relevo para a decisão não existem outros factos que devam considerar-se não provados.
No que se refere aos factos provados, a convicção do Tribunal fundou-se na análise crítica da prova documental junta aos autos.
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MATÉRIA DE DIREITO
A principal questão que se coloca nos presentes autos prende-se com saber se o acto de liquidação adicional de IVA, objecto da presente petição, é ou não ilegal, discutindo-se se é aplicável o prazo previsto no n.º 6 do artigo 23.º ou no n.º 2 do artigo 98.º do Código do IVA ao exercício do direito à dedução de IVA pretendido pelo Requerente.
A este propósito alega o Requerente, em síntese, o seguinte:
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O montante de dedução adicional de IVA aqui em causa, reembolsado ao Município no âmbito da DP do período 201512T e, entretanto, objecto de correcção materializada na entrega a favor do Estado de um montante de €18.981,38, já havia sido objecto de análise e validação no escopo da acção inspectiva conduzida pelos SIT ao reembolso solicitado na DP do período 201412T, submetida no dia 6 de Fevereiro de 2015;
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Em consequência, o Requerente pugna pela reposição de uma situação que já havia sido objecto de aturada análise e validação pela AT – trata-se, portanto, de uma segunda análise –, anulável por violação da lei, o que atenta contra o princípio da segurança jurídica em matéria fiscal e, em boa verdade, coloca em cheque o princípio da colaboração (e boa fé) na actuação da administração tributária (cf. disposto no artigo 59.º da LGT).
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A AT assenta a sua posição na incorrecta interpretação do disposto no n.º 6 do artigo 23.º e 22.º n.º 2 do Código do IVA;
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A regra é clara: quando os sujeitos passivos apurem o montante de IVA dedutível de acordo com os métodos de afectação real e/ou pro rata – este último, como no caso sub judice – utilizados provisoriamente, deverão, na DP do último período do ano corrigir a sua dedução provisória, em função dos valores apurados no final do ano.
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De facto, permitindo-se ao sujeito passivo proceder à dedução com base em critérios provisórios (como o próprio adjectivo indica, não definitivos) seria sempre necessário que fosse estabelecido um período temporal para fazer a passagem para os dados definitivos, período este que o legislador português entendeu dispor como o último período do ano.
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Tal limitação temporal indicia, também, um momento a partir do qual uma dedução, efectuada com base num critério provisório, terá de ser rectificada de acordo com os dados efectivos produzidos pela actividade do sujeito passivo ao longo do ano em causa,
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Contudo, utilizar adicionalmente o presente artigo para privar um sujeito passivo da dedução de imposto que é devida considerando os critérios à sua disposição, prejudica de forma muito vincada a neutralidade do IVA, que é um princípio basilar do mesmo e constitui uma outra prescrição, praeter inscrita no n.º 6 do artigo 23.º do Código de IVA.
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Na verdade, o n.º 6 do artigo 23.º do Código do IVA não regula o prazo limite (de caducidade) para o exercício do direito à dedução, mas sim o artigo 98.º, n.º 2 do Código do IVA;
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Importa assim realçar desde já o entendimento vertido pelo STA no seu Acórdão de 28 de Junho de 2017, proferido no processo n.º 01427/14, segundo o qual: “o prazo aplicável para reclamar do IVA entregue, em excesso, numa situação enquadrável no denominado erro de direito é de quatro anos, nos termos previstos no artigo 98.º, n.º 2 do CIVA”;
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Por todo o exposto, fácil se torna verificar que as conclusões que originam a liquidação em apreço não possuem qualquer suporte ou sustentação no Código do IVA, designadamente na invocada disposição e que, neste sentido, inquinam a própria liquidação;
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Não obstante, conforme já referido, o Requerente pretende, não só rebater as conclusões que motivaram a emissão desta liquidação de IVA, mas também demonstrar como o procedimento realizado está em conformidade com o Código do IVA e jurisprudência nacional e comunitária, assim como, que a interpretação dos SIT é um atentado aos mais basilares princípios que norteiam o IVA. Por último, pretende ainda realçar que o valor de crédito a reportar relevado pelo Requerente na DP 201512T resulta de uma informação prestada pela própria Direcção Distrital de Finanças.
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Na verdade, nos termos do artigo 22.º, que versa sobre o momento e modalidades do exercício do direito à dedução, estabelece, ipsis verbis, no seu n.º 2, que “a dedução deve ser efectuada na declaração do período ou de período posterior àquele em que se tiver verificado a recepção das facturas ou de recibo de pagamento do IVA que fizer parte das declarações de importação”;
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A utilização da preposição “de”, ao invés “do” – este último, contracção da preposição “de” com o artigo definido “o”, indica uma referência precisa e determinada[1] – visa o propósito do legislador em não definir qual o período de imposto a que se refere, mas antes a um período de imposto, no caso, posterior;
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Nem outra interpretação faria sentido, porquanto de outro modo haveria um conflito com o sentido prescritivo (de sentido permissivo, com ressalva de disposições especiais de que é exemplo o n.º 6 do artigo 78.º do Código do IVA) contido no artigo 98.º, n.º 2, do CIVA, que ficaria esvaziado de alcance ou sentido algum;
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Neste contexto, os sujeitos passivos não são obrigados a deduzir o IVA incorrido na declaração de imposto do período em que recebem a factura correspondente nem no período imediatamente subsequente. O artigo 22.º, n.º 2, do Código do IVA consagra uma permissão de dedução em período posterior, não impondo qualquer prazo para que os sujeitos passivos exerçam tal direito;
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A imposição desse prazo encontramo-la depois no n.º 2 do artigo 98.º do Código do IVA, o qual se encontra, aliás, em consonância com as regras gerais de caducidade dos impostos, vertidas na LGT, que naturalmente ressalva as disposições (prazos) especiais de que é exemplo a constante no artigo 78.º, n.º 6, do Código do IVA para a situação específica aí prevista (que aqui não está em causa, concordam AT e Requerente).
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O prazo que é aplicável ao Requerente para efectivar o seu direito à dedução de forma plena é o de quatro anos estabelecido no n.º 2 do artigo 98.º do Código do IVA, porquanto não se afigura aplicável nem o prazo especial previsto no n.º 6 do artigo 78.º do mesmo compêndio tributário, uma vez que a incorrecta dedução por si efectuada não se deveu a um “erro material ou de cálculo” (e nisto estão de acordo Impugnante e AT), nem o prazo estabelecido no n.º 6 do artigo 23.º, por não se estar perante uma correcção da percentagem de dedução provisória para a definitiva, ao abrigo de um mesmo método de dedução, mas sim perante uma situação enquadrável no denominado erro de direito;
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Assim, considera a Impugnante que o vertido no n.º 2 do artigo 98.º do Código do IVA tem aplicação automática e independente de qualquer outra regra procedimental – estando tão-somente condicionado à existência desse mesmo direito, nos termos enunciados nos artigos 19.º a 26.º daquele compêndio tributário, e à eventual aplicabilidade de disposição especial que em concreto o afaste (inexistente no caso), como o próprio texto legal salvaguarda expressamente;
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De acordo com o artigo 98.º do Código do IVA, é aplicável o prazo de quatro anos para “o direito à dedução ou ao reembolso do imposto pago em excesso”, devendo o direito à dedução do IVA incorrido pelo Requerente ser respeitado, até porque, no Relatório de Inspecção Tributária, não é contestada a justeza do valor do imposto deduzido pelo Requerente, tendo os SIT validado material e formalmente a sua legitimidade;
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A este propósito atente-se nas duas decisões do CAAD: (1) o Acórdão de 7 de Outubro de 2015, prolatado no processo n.º 01455/12 e (2) o Acórdão de 28 de Junho de 2017, proferido no processo n.º 01427/14;
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Cabe referir também o Acórdão de 7 de Outubro de 2015, prolatado no processo 01455/12, nos termos do qual sustentou o STA que “todas as restrições ao direito de dedução devem ser interpretadas de forma restritiva e reduzidas ao mínimo”;
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Neste âmbito, assinalou-se que “sendo certo que os Estados-Membros não estão impedidos de estabelecer prazos de caducidade para o exercício do direito à dedução (porque assim o exige o princípio da segurança jurídica, que exige que a situação fiscal do sujeito passivo, atentos os seus direitos e obrigações face à Administração fiscal, não seja indefinidamente susceptível de ser posta em causa), não pode esse prazo tornar praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício do direito à dedução (princípio da eficácia) (Entre muitos outros, os acórdãos – de 27 de Fevereiro de 2003, C-327/00, n.º 55; – de 30 de Março de 2006, C-184/04, n.º 45; – de 11 de Outubro de 2007, C-241/06, n.º 52)”;
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Por fim, atente-se, também, no importantíssimo entendimento vertido pelo STA no seu Acórdão de 28 de Junho de 2017, proferido no processo n.º 01427/14, nos termos do qual, relativamente à determinação do prazo aplicável à revisão de acto tributário de autoliquidação de IVA em situações que o contribuinte não procedeu à dedução do IVA permitida, através do método do pro rata, sustentaram Juízes Conselheiros do STA que “[a] aplicação dos métodos de dedução relativos a bens de utilização mista é juridicamente complexa pelo que o erro decorrente da aplicação deste regime jurídico não constitui nem erro material nem erro de cálculo”;
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Nesta sequência de eventos, referiram os Juízes Conselheiros que “(…) a Autoridade Tributária e Aduaneira, através da Direcção de Serviços do Imposto sobre o Valor Acrescentado, [no Ofício Circulado n.º 30081/2015, de 17 de Novembro] separou, nitidamente, o que considerou serem erros materiais ou de cálculo circunscrevendo-os, basicamente, a operações mecânicas (erros de transcrição ou de registo na declaração periódica) das não mecânicas, ou seja, das que implicam interpretação da lei para a utilização dos métodos de dedução do IVA (designadamente alteração do método de dedução do imposto nos sujeitos passivos mistos, ou apuramento prorata)”;
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Ademais, concluíram os Juízes Conselheiros, peremptoriamente, que “o prazo aplicável para reclamar do IVA entregue, em excesso, numa situação enquadrável no denominado erro de direito é de quatro anos, nos termos previstos no artigo 98.º, n.º 2 do CIVA”;
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Assim, a dedução efectuada pelo Requerente na DP de 201312T, correspondente ao exercício de 2013, no montante global de €43.797,39, afigura-se tempestiva nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 98.º do Código do IVA, devendo ser consequentemente declarada a ilegalidade e anulada a liquidação de IVA, que repousam na conclusão oposta (intempestividade da dedução) formulada pelos SIT.
A AT alega, por sua vez, sinteticamente, o seguinte:
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O Requerente considerou o IVA suportado nos inputs, alegadamente de utilização mista, um gasto, porquanto entendia que o mesmo não era dedutível;
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Nas próprias palavras do Requerente “(…)a dedução adicional de IVA (…) resultou da implementação do critério da percentagem de dedução (pro rata) relativamente a inputs de utilização mista, cujo cálculo efectuado nos termos do nº4 do artigo 23º do CIVA (…)” (cfr artigo 13.º do ppa);
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Deste modo, como concluiu a Inspecção Tributária, “uma vez que surgiram duvidas sobre a dedução de regularizações do pró rata fora do respectivo ano, ou seja, sobre a possibilidade da dedução do imposto prevista no artº 23º do CIVA, poder ser aplicada às regularizações respeitantes aos anos de 2012 e 2013, e atendendo ao previsto no nº 6 do artº 78º do CIVA, oficio – circulado nº 30082/2005 informação nº 1842/2012 e opiniões da comunidade do IVA questionamos os Serviços do IVA se a dedução relativa à aplicação do pró rata aos anos de 2012 e 2013 tem cabimento no previsto no nº 6 do artº 78º do CIVA ou noutro normativo legal. A reposta dos serviços do IVA à questão colocada vem no sentido de não ser possível efectuar a dedução do IVA nos termos do artº 23º do CIVA relativamente aos anos de 2012 e 2013, pelos motivos que a seguir transcrevemos da informação nº 1405 de 22/05/2015 do SIVA: “19 - “não é aplicável o prazo de quatro anos previsto no nº 2 do artº 98º do CIVA e no nº 1 do artº 78º da LGT, nem sequer o prazo e dois anos previsto no nº 1 do artº 131º do CPPT ou no nº 6 do artº 78º do CIVA.20- A situação descrita, de omissão de dedução de imposto suportado com custos comuns, não configura um erro, mas uma opção ou prática legítima e comum entre sujeitos passivos mistos. De facto, é frequente que os sujeitos passivos mistos não deduzam qualquer imposto relativo a custos comuns, evitando assim os custos administrativos, económicos, técnicos e logísticos necessários ou inerentes à indagação do imposto passível de dedução. 21- Essa é uma opção que se encontra no âmbito da autonomia de actuação permitida pelo imposto e é materializada na autoliquidação efectuada pelo sujeito passivo. Desta forma, nestes casos, não é legitimo que o sujeito passivo venha invocar um erro quando não deduziu IVA que podia eventualmente deduzir. 22- Aliás, o oficio-circulado nº 30.082/2005 di-lo, no ponto 8, ao ressalvar que os mecanismos previstos no artº 78º não poderão ser utilizados em situações e “alteração de dedução do imposto nos sujeitos passivos mistos”, deduzindo-se que tais situações são enquadráveis no artº 23º do mesmo Código. 23- Este entendimento foi veiculado no já citado parecer do CEF nº 41/2013, de 2013- 10-04, da autoria da Drª Cidália Lança, designadamente nos pontos 18 e 20, com despacho concordante do Diretor do CEFA de 2013-10-08. 24- Nesse parecer foi entendido que a alteração do método de dedução de imposto e a aplicação retroativa de um método de dedução não encontram tutela nem no nº 6 do artº 78º, nem em qualquer outra norma do CIVA, na medida em que essa opção só pode ser feita nas condições do nº 1 do artº 20, do nº 1 do artº 22º e do artº 23 do CIVA 25- Apesar de ser um entendimento mais favorável do que aquele expresso neste parecer, tem vindo a admitir-se que a aplicação retroactiva do método de dedução possa ser realizada nos termos do nº 6 do artº 23º do CIVA, isto é, até à declaração do ultimo período do ano a que respeita, sem que seja viável a reclamação graciosa prevista no nº 1 do artº 131º do CPPT, atenta a inexistência de um erro de autoliquidação. 26- Apesar do nº 6 do artº 23º do CIVA se referir literalmente à correcção das percentagens (pró rata) e dos critérios de dedução (afectação real) calculados provisoriamente, admite-se que os sujeitos passivos, nessa declaração periódica, procedam à aplicação ou alteração do método de dedução, assumindo-se uma provisoriedade global da dedução relativa a bens mistos até à apresentação da ultima declaração periódica do ano. 27- Nestes termos, submetendo este entendimento aos factos descritos pela Direcão de Finanças de Vila Real, apenas pode ser aplicada a percentagem de dedução relativa a bens de utilização mista relativamente ao ano de 2014, ao abrigo do disposto no nº 6 do artº 23º do CIVA. Não é possível a utilização de tais métodos relativamente aos anos de 2012 e 2013 com base na declaração periódica do período 2014-12T.”;
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De acordo com o referido na alínea d) do ponto 3.3 do capítulo II do Relatório Inspectivo, o sujeito passivo deduziu no período 2013.12T, através de uma declaração de substituição entregue em 14.09.2015, o valor de €19.283,84 relativo a regularizações do pro rata e ainda €530,17 que dizem respeito a deduções de aquisição de bens cuja dedução de IVA é a 100%;
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Ora, conforme apresentado anteriormente, e de acordo com a informação prestada pela Direcção de Serviços do IVA, a dedução das regularizações do pró rata são apenas possível até à entrega da última DP do ano em causa, não sem aplicável nestes casos os prazos previstos no n.º 2 do artigo 98.º do Código do IVA e no n.º 1 do artigo 78.º da LGT, nem sequer o prazo e dois anos previsto no n.º 1 do artigo 131.º do CPPT ou no n.º 6 do artigo 78.º do Código do IVA;
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Pelos motivos apresentados no articulado anterior, o SIT procedeu à correcção do valor do campo 40 da DP de 2013.12T de substituição, entregue em 14.09.2015, no montante de €19.283,84, sendo que após as correcções efectuadas vai resultar no campo 40 da DP apenas o valor de €622,13.
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O entendimento da AT, com apoio na doutrina e na jurisprudência, é o de que a alteração do método de dedução do imposto e a aplicação retroactiva de um método de dedução não encontram qualquer suporte legal, sendo que a escolha pelo método de dedução só pode ser efectuada no momento em que se constitui o direito à dedução nas condições previstas no n.º 1 do artigo 20.º, n.º 1 do artigo 22.º e no artigo 23.º do Código do IVA;
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Pelo que os sujeitos passivos devem deduzir o IVA incorrido "na declaração do período ou de período posterior àquele em que se tiver verificado a recepção das facturas ou de recibo de pagamento do IVA que fizer parte das declarações de importação" até "ao decurso de quatro anos após o nascimento do direito à dedução", pretendendo, assim, fazer-se valer, no caso sub judice, do prazo de quatro anos para proceder à correcção do IVA liquidado em excesso, o qual decorre, em seu entender, do artigo 98.º do Código do IVA;
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Determina-se no n.º 1 do artigo 98.º do Código do IVA que, “quando, por motivos imputáveis aos serviços, tenha sido liquidado imposto superior ao devido, procede-se à revisão oficiosa nos termos do artigo 78.º da Lei Geral Tributária”;
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Porém, dispõe-se no n.º 2 daquele preceito legal que “sem prejuízo de disposições especiais, o direito à dedução ou ao reembolso do imposto entregue em excesso só pode ser exercido até ao decurso de quatro anos após o nascimento do direito à dedução ou pagamento em excesso do imposto, respectivamente”;
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Assim, não só o Requerente não formulou qualquer pedido de revisão oficiosa, mas também, conforme ressalvado pelo próprio artigo 98.º do Código do IVA, a possibilidade de aplicabilidade do mecanismo de revisão oficiosa não prejudica as especificidades inerentes ao funcionamento do próprio imposto;
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Efectivamente, apesar de o n.º 2 do artigo 98.º do IVA estabelecer que, sem prejuízo de disposições especiais, o direito à dedução pode ser exercido até ao limite de quatro anos, o sujeito passivo de IVA não tem liberdade para determinar o momento de exercício desse direito, limitando-se aquela norma a fixar, apenas, um limite máximo de carácter geral, a partir do qual aquele direito não pode já ser exercido;
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No caso dos autos, o Requerente não pretende exercer o direito à dedução, porque esse já foi exercido em devido tempo nas respectivas declarações periódicas, tendo por base documentos de suporte que já se encontravam registados na contabilidade, nem sequer pretende a regularização do imposto por existir qualquer erro, mas antes que lhe seja reconhecida a possibilidade de retroactivamente modificar o método de dedução utilizado na qualidade de sujeito passivo misto;
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Pois o que efectivamente se passou foi que o sujeito passivo procedeu à aplicação retroactiva do pro rata aos anos de 2012 e 2013, efectuando a sua regularização, através da sua inscrição no Campo 40 da declaração periódica de IVA referente ao ultimo trimestre de 2014, não cumprindo assim o prazo estipulado no n.º 6 do artigo 23.º do Código do IVA, não sendo aplicável a regra do artigo 98.º do mesmo Código.
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Em suma, se, porventura, o presente Tribunal decidir pela aplicação do artigo 98.º do Código do IVA ao caso concreto, não pode, sem mais, decidir pela liquidação de IVA em excesso, conforme peticiona o Requerente nas alíneas b) e c) do pedido final;
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Neste sentido, atenta a circunstância de o conhecimento desta questão ter ficado prejudicado pela decisão tomada em sede inspectiva, deve o Tribunal determinar que o processo seja devolvido à Autoridade Tributária e esta se pronuncie pela regularização peticionada.
Face ao exposto, relativamente à posição das Partes e aos argumentos apresentados, para determinar se o acto de liquidação de IVA é ou não ilegal, importar verificar qual é o prazo legal aplicável para o exercício do direito à dedução, no caso concreto.
Vejamos o que deve ser entendido.
O IVA é um imposto geral sobre o consumo, em que se tributam as transmissões de bens, as prestações de serviços, as importações e as aquisições intracomunitárias de bens, recaindo sobre a despesa.
No regime geral, o IVA é um imposto sobre o consumo em que o montante da dívida de cada sujeito passivo é apurado através do chamado método de dedução do imposto, do crédito do imposto ou método indirecto subtractivo.
Nos termos do artigo 19.º do Código do IVA, “para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzirão, nos termos dos artigos seguintes, ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuaram”, o imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos.
De acordo com o n.º 1 do artigo 20.º do mesmo Código só poderá deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização das operações referidas nas suas alíneas a) e b), nomeadamente, “transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas”.
Por sua vez o artigo 22.º, n.º 1 e 2 do Código do IVA determinam o seguinte:
“1 - O direito à dedução nasce no momento em que o imposto dedutível se torna exigível, de acordo com o estabelecido pelos artigos 7.º e 8.º, efectuando-se mediante subtracção ao montante global do imposto devido pelas operações tributáveis do sujeito passivo, durante um período de declaração, do montante do imposto dedutível, exigível durante o mesmo período.
2 - Sem prejuízo do disposto no artigo 78.º, a dedução deve ser efetuada na declaração do período ou de período posterior àquele em que se tiver verificado a receção das faturas ou de recibo de pagamento do IVA que fizer parte das declarações de importação. (Redacção do D.L. nº 197/2012, de 24 de Agosto, com entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2013)”
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Resulta, assim, dos artigos referidos que o direito à dedução do IVA deve ser efectuado na declaração do período ou de período posterior àquele em que se tiver verificado a recepção dos documentos, sem prejuízo do disposto no artigo 78.º do Código do IVA.
Estatui o artigo 78.º do Código do IVA, sob a epígrafe Regularizações, o seguinte:
“1 - As disposições dos artigos 36.º e seguintes devem ser observadas sempre que, emitida a fatura, o valor tributável de uma operação ou o respetivo imposto venham a sofrer retificação por qualquer motivo. (Redação do D.L. nº 197/2012, de 24 de agosto, com entrada em vigor em 1 de janeiro de 2013)
2 - Se, depois de efectuado o registo referido no artigo 45.º, for anulada a operação ou reduzido o seu valor tributável em consequência de invalidade, resolução, rescisão ou redução do contrato, pela devolução de mercadorias ou pela concessão de abatimentos ou descontos, o fornecedor do bem ou prestador do serviço pode efectuar a dedução do correspondente imposto até ao final do período de imposto seguinte àquele em que se verificarem as circunstâncias que determinaram a anulação da liquidação ou a redução do seu valor tributável.
3 - Nos casos de facturas inexactas que já tenham dado lugar ao registo referido no artigo 45.º, a rectificação é obrigatória quando houver imposto liquidado a menos, podendo ser efectuada sem qualquer penalidade até ao final do período seguinte àquele a que respeita a factura a rectificar, e é facultativa, quando houver imposto liquidado a mais, mas apenas pode ser efectuada no prazo de dois anos.
4 - O adquirente do bem ou destinatário do serviço que seja um sujeito passivo do imposto, se tiver efectuado já o registo de uma operação relativamente à qual o seu fornecedor ou prestador de serviço procedeu a anulação, redução do seu valor tributável ou rectificação para menos do valor facturado, corrige, até ao fim do período de imposto seguinte ao da recepção do documento rectificativo, a dedução efectuada.
5 - Quando o valor tributável de uma operação ou o respectivo imposto sofrerem rectificação para menos, a regularização a favor do sujeito passivo só pode ser efectuada quando este tiver na sua posse prova de que o adquirente tomou conhecimento da rectificação ou de que foi reembolsado do imposto, sem o que se considera indevida a respectiva dedução.
6 - A correcção de erros materiais ou de cálculo no registo a que se referem os artigos 44.º a 51.º e 65.º, nas declarações mencionadas no artigo 41.º e nas guias ou declarações mencionadas nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 67.º é facultativa quando resultar imposto a favor do sujeito passivo, mas só pode ser efectuada no prazo de dois anos, que, no caso do exercício do direito à dedução, é contado a partir do nascimento do respectivo direito nos termos do n.º 1 do artigo 22.º, sendo obrigatória quando resulte imposto a favor do Estado.
7 - Os sujeitos passivos podem deduzir ainda o imposto respeitante a créditos considerados incobráveis:(Redação dada pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril)
a) Em processo de execução, após o registo a que se refere a alínea b) do n.º 2 do artigo 717.º do Código do Processo Civil; (Redação dada pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro)
b) Em processo de insolvência, quando a mesma for decretada de caráter limitado, após o trânsito em julgado da sentença de verificação e graduação de créditos prevista no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas ou, quando exista, a homologação do plano objeto da deliberação prevista no artigo 156.º do mesmo Código; (Redação dada pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro)
c) Em processo especial de revitalização, após homologação do plano de recuperação pelo juiz, previsto no artigo 17.º-F do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas; (Redação dada pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro)
d) Nos termos previstos no Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (SIREVE), após celebração do acordo previsto no artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 178/2012, de 3 de agosto. (Aditada pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro)
8 - Os sujeitos passivos podem igualmente deduzir o imposto respeitante a outros créditos desde que se verifique qualquer das seguintes condições:
a) O valor do crédito não seja superior a (euro) 750, IVA incluído, a mora do pagamento se prolongue para além de seis meses e o devedor seja particular ou sujeito passivo que realize exclusivamente operações isentas que não confiram direito a dedução;
b) Os créditos sejam superiores a (euro) 750 e inferiores a (euro) 8000, IVA incluído, quando o devedor, sendo um particular ou um sujeito passivo que realize exclusivamente operações isentas que não conferem o direito à dedução, conste no registo informático de execuções como executado contra quem foi movido processo de execução anterior entretanto suspenso ou extinto por não terem sido encontrados bens penhoráveis; (Redação da Lei n.º 64-A/2008 de 31 de dezembro)
c) Os créditos sejam superiores a (euro) 750 e inferiores a (euro) 8000, IVA incluído, tenha havido aposição de fórmula executória em processo de injunção ou reconhecimento em acção de condenação e o devedor seja particular ou sujeito passivo que realize exclusivamente operações isentas que não confiram direito a dedução;
d) Os créditos sejam inferiores a (euro) 6000, IVA incluído, deles sendo devedor sujeito passivo com direito à dedução e tenham sido reconhecidos em acção de condenação ou reclamados em processo de execução e o devedor tenha sido citado editalmente.
e) Os créditos sejam superiores a (euro) 750 e inferiores a (euro) 8000, IVA incluído, quando o devedor, sendo um particular ou um sujeito passivo que realize exclusivamente operações isentas que não conferem direito a dedução, conste da lista de acesso público de execuções extintas com pagamento parcial ou por não terem sido encontrados bens penhoráveis no momento da dedução. (Aditada pela Lei n.º 64-A/2008 de 31 de Dezembro)
9 - O valor global dos créditos referidos no número anterior, o valor global do imposto a deduzir, a realização de diligências de cobrança por parte do credor e o insucesso, total ou parcial, de tais diligências devem encontrar-se documentalmente comprovados e ser certificados por revisor oficial de contas, devendo este certificar, ainda, que se encontram verificados os requisitos legais para a dedução do imposto respeitante a créditos considerados incobráveis nos termos do n.º 7 deste artigo. (Redação dada pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro)
10 - A certificação por revisor oficial de contas a que se refere o número anterior deve ser efectuada por cada um dos períodos em que foi feita a regularização e até ao termo do prazo estabelecido para a entrega da declaração periódica ou até à data de entrega da mesma, quando esta ocorra fora do prazo.
11 - No caso previsto no n.º 7 e na alínea d) do n.º 8 é comunicada ao adquirente do bem ou serviço, que seja um sujeito passivo do imposto, a anulação total ou parcial do imposto, para efeitos de retificação da dedução inicialmente efetuada, devendo esta comunicação identificar as faturas, o montante do crédito e do imposto a ser regularizado, o processo ou acordo em causa, bem como o período em que a regularização é efetuada. (Redação dada pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro)
12 - Nos casos em que se verificar a recuperação dos créditos, total ou parcialmente, os sujeitos passivos são obrigados a proceder à entrega do imposto, no período em que se verificar o seu recebimento, sem observância, neste caso, do prazo previsto no n.º 1 do artigo 94.º.
13 - Quando o valor tributável for objecto de redução, o montante deste deve ser repartido entre contraprestação e imposto, aquando da emissão do respectivo documento, se se pretender igualmente a rectificação do imposto.
14 - Nos casos em que a obrigação de liquidação e pagamento do imposto compete ao adquirente dos bens e serviços e os correspondentes montantes não tenham sido incluídos na declaração periódica, originando a respectiva liquidação e dedução ou o tenham sido fora do prazo legalmente estabelecido, a liquidação e a dedução são aceites sem quaisquer consequências desde que o sujeito passivo entregue a declaração de substituição, sem prejuízo da penalidade que ao caso couber.
15 - O disposto no número anterior é igualmente aplicável aos sujeitos passivos que tenham o direito à dedução parcial do imposto, nos termos do disposto no artigo 23.º, sem prejuízo da liquidação adicional e pagamento do imposto e dos juros compensatórios que se mostrem devidos pela diferença.
16 - Os documentos, certificados e comunicações a que se referem os n.os 7 a 11 devem integrar o processo de documentação fiscal previsto nos artigos 130.º do Código do IRC e 129.º do Código do IRS. (Redação dada pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro)
17 - O disposto no n.º 8 não é aplicável quando estejam em causa transmissões de bens ou prestações de serviços cujo adquirente ou destinatário constasse, no momento da realização da operação, da lista de acesso público de execuções extintas com pagamento parcial ou por não terem sido encontrados bens penhoráveis. (Aditado pela Lei n.º 64-A/2008 de 31 de dezembro)”
Assim com relevo para a apreciação do caso sub judice, resulta do mencionado artigo que a correcção de erros materiais ou de cálculo só pode ser efectuada no prazo de 2 anos. Tem sido entendido que são erros materiais ou de cálculo designadamente erros aritméticos nas operações de cálculo do montante a deduzir, na determinação do montante do IVA dedutível, na própria declaração ou em algum dos documentos em que ela se baseou (Cfr. Acórdão do STA, processo n.º 1427/14, de 28.06.2017, Decisão do CAAD, processo n.º 138/2018-T, de 3.09.2018, Decisão do CAAD, processo n.º 252/2017, de 20.11.2017, Decisão do CAAD, processo n.º 117/2013-T, de ).
Deste modo, um erro de enquadramento quanto existência do direito à dedução do IVA incorrido na aquisição de recursos comuns (por aplicação de prorata), bem como na aquisição de bens e serviços directamente afectos a operações tributadas, não constitui nem erro material nem erro de cálculo, mas sim um erro de direito (Cfr. Acórdão do STA, processo n.º 1427/14, de 28.06.2017, Decisão do CAAD n.º 649/2017, de 28.05.2018) pelo que é manifesto que não pode ser-lhe aplicado o regime do referido n.º 6 do artigo 78.º do Código do IVA.
Na verdade, o erro do Requerente constitui um erro de direito, isto é, um erro que se reporta à existência e às condições de aplicação das normas aplicáveis. Como ensinam Afonso Arnaldo e Tiago Albuquerque Dias, in “Afinal qual o prazo para deduzir IVA?, Cadernos IVA, 2014, Coimbra, Almedina, 2014) são enquadráveis como erros de direito, a título exemplicativo, “ as situações em que há um incorrecto apuramento do pro rata, motivado por uma inexacta subsunção no normativo aplicável das operações que influenciam o cálculo, nomeadamente, no que concerne ao enquadramento de uma operação como tributada quando a mesma é isenta, (…) em que o sujeito passivo, desenvolvendo várias actividades, efectua a dedução por recurso ao pro rata num primeiro momento e passa a utilizar o método da afectação real para efectuar a dedução do imposto exclusivamente afecto a determinada actividade, pretendendo corrigir a dedução que efectuou no passado com base no método pro rata.”
Assim, não sendo aplicável o regime do referido artigo 78.º, n.º 6 do Código do IVA, que se reporta a erros materiais ou de cálculo, importa verificar se existe alguma base legal que estabeleça o limite temporal para o exercício do direito à dedução com fundamento em erro de direito.
Neste contexto, verifica-se que o artigo 98.º do Código do IVA, sob epígrafe Revisão Oficiosa e prazo do exercício do direito à dedução, determina o seguinte:
“1 - Quando, por motivos imputáveis aos serviços, tenha sido liquidado imposto superior ao devido, procede-se à revisão oficiosa nos termos do artigo 78.º da lei geral tributária.
2 - Sem prejuízo de disposições especiais, o direito à dedução ou ao reembolso do imposto entregue em excesso só pode ser exercido até ao decurso de quatro anos após o nascimento do direito à dedução ou pagamento em excesso do imposto, respectivamente.
3 - Não se procede à anulação de qualquer liquidação quando o seu valor seja inferior ao limite previsto no n.º 4 do artigo 94.”
Seguindo as regras aplicáveis à interpretação das normas jurídicas, verifica-se que, não havendo base legal especial aplicável ao exercício do direito à dedução, em caso de erro de direito, a norma constante do n.º 2 do artigo 98.º do Código do IVA surge como a base legal aplicável.
É assim de 4 anos o prazo para o exercício do direito à dedução, após o nascimento do direito à dedução.
Em consonância com a jurisprudência já produzida sobre esta quaestio (Acórdão do STA, processo n.º 966/10, de 18.05.2011, Acórdão do STA, processo n.º 1427/14, de 28.06.2017, Decisão do CAAD n.º 117/2013, Decisão do CAAD n.º 649/2017, de 28 de Maio de 2018, Decisão do CAAD n.º 138/2018, de 3 de Setembro de 2018), entende-se que será aplicável o regime geral sobre esta matéria que consta do artigo 98.º, n.º 2, do Código do IVA que fixa um limite máximo de quatro anos que não pode ser excedido em nenhum caso.
Também à luz da jurisprudência comunitária, outro sentido não parece ser possível extrair das normas em análise, conquanto, o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) tem-se pronunciado a favor da prevalência do princípio da neutralidade fiscal na interpretação das regras incidentes sobre a caducidade do direito à dedução. A este propósito decidiu o TJUE no Acórdão Biosafe, processo C-8/17, de 12 de Abril de 2018 que o sistema comum de IVA, bem como o princípio da neutralidade opõem-se à legislação de um Estado-Membro, nos termos do qual “o benefício do direito à dedução é recusado com o fundamento de que o prazo previsto na referida legislação para o exercício deste direito se conta a partir da data de emissão das referidas facturas iniciais e expirou.” Na verdade, o TJUE tem-se tendencialmente pronunciado no sentido de ser contrário à Directiva IVA a imposição de prazos legais que obstem ao exercício do benefício do direito à dedução do IVA pelos contribuintes.
Em suma: a dedução do IVA reclamado pelo Requerente, resultando de um erro de direito, pode ser efectuada no prazo de 4 anos, nos termos do disposto no artigo 98.º, n.º 2 do Código do IVA.
Termos em que se conclui que o indeferimento da reclamação graciosa apresentada pelo Requerente com fundamento na caducidade do direito à dedução é ilegal, por erro sobre os pressupostos de direito, devendo, em consequência, ser anulado o acto de liquidação adicional de IVA n.º..., sendo devidos juros indemnizatórios resultante do erro imputável à Requerida, na apreciação e subsunção dos factos ao direito aplicável.
O Tribunal Arbitral não se encontra obrigado a apreciar todos os argumentos alegados pelo Requerente ou pela Requerida, quando a decisão fique prejudicada pela solução já proferida, como é o caso dos autos, motivo pelo qual ficam prejudicadas para a apreciação as restantes questões submetidas a pedido arbitral.
IV. DECISÃO
Termos em que acordam neste Tribunal Arbitral em:
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Julgar procedente o pedido de declaração de ilegalidade da decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º ...2018... e consequente acto de liquidação de IVA n.º...;
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Condenar a Requerida no pagamento de juros indemnizatórios;
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Condenar a Requerida nas custas do presente processo, por ser a parte vencida.
V. VALOR DO PROCESSO
De harmonia com o disposto nos artigos 315.º n.º 2, do CPC e 97º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de €19.283,84.
VI. CUSTAS
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em €1.224, a cargo da Requerida, nos termos da Tabela I do mencionado Regulamento, dada a procedência integral do pedido.
Lisboa, 29 de Março de 2019
A Árbitro,
(Magda Feliciano)
(O texto da presente decisão foi elaborado em computador, nos termos do artigo 131.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, da alínea e) do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT) regendo-se a sua redacção pela ortografia anterior ao Acordo Orto
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