Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 426/2018-T
Data da decisão: 2019-02-22  IVA  
Valor do pedido: € 27.095,06
Tema: IVA – Direito à dedução sujeitos passivos mistos.
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DECISÃO ARBITRAL[1]

 

O árbitro, Dra. Sílvia Oliveira, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o Tribunal Arbitral Singular, constituído em 13 de Novembro de 2018, decidiu o seguinte:

 

  1. RELATÓRIO

 

  1. A A..., associação sem fins lucrativos, pessoa colectiva nº..., com sede na Rua ..., nº ... ..., em Lisboa (adiante designada por “Requerente”), apresentou pedido de pronúncia arbitral e de constituição de Tribunal Arbitral Singular, no dia 3 de Setembro de 2018, ao abrigo do disposto no artigo 4º e do nº 2 do artigo 10º do Decreto-lei nº 10/2011, de 20 Janeiro [Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT)], em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por “Requerida”).

 

  1. A Requerente refere que tendo sido “(…) notificada dos actos de liquidação de IVA dos períodos de Maio 2014 a Novembro 2017 nº 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018... e 2018... e da liquidação dos respectivos juros (…)” (liquidações com a mesma identificação das liquidações de imposto acima referidas), veio deduzir pedido arbitral requerendo que este Tribunal Arbitral declare a ilegalidade “(…) das referidas notas de liquidação de IVA, na parte impugnada, e dos respectivos juros com todas as consequências legais, designadamente o acrescido de juros indemnizatório à taxa legal”.

 

1.3.    O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD em 3 de Agosto de 2018 e notificado, na mesma data, à Requerida.

 

1.4.    Dado que a Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 1 do RJAT, foi a signatária designada como árbitro, em 23 de Outubro de 2018, pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, tendo a nomeação sido aceite, no prazo e termos legalmente previstos.

 

1.5.    Na mesma data, foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11º nº 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6º e 7º do Código Deontológico.

 

1.6.    Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 13 de Novembro de 2018, tendo sido proferido despacho arbitral na mesma data no sentido de notificar a Requerida para, nos termos do disposto no artigo 17º, nº 1 do RJAT, apresentar Resposta, no prazo máximo de 30 dias e, caso quisesse, solicitar a produção de prova adicional.

 

1.7.    Adicionalmente, foi ainda referido naquele despacho arbitral que a Requerida deveria remeter ao Tribunal Arbitral, dentro do prazo da Resposta, cópia do processo administrativo.

 

  1. Em 17 de Dezembro de 2018, a Requerida apresentou a sua Resposta, tendo-se defendido por impugnação e concluído que “(…) deverá ser proferida decisão que determine a improcedência do presente pedido de pronúncia arbitral, absolvendo-se a Requerida dos pedidos, com todas as consequências legais”.

 

  1. Na Resposta, a Requerida requereu ainda a dispensa da prova testemunhal, por entender que “(…) as questões a dirimir são no essencial questões de direito (…)”.

 

  1. Na mesma data, a Requerida anexou aos autos o respectivo processo administrativo.

 

  1. Em 18 de Dezembro de 2018, foram ambas as Partes notificadas de despacho arbitral com o seguinte teor:

 

Tendo em consideração:

  1. O facto de não ter sido deduzida, na Resposta apresentada em 17 de Dezembro de 2018, matéria de excepção de que cumpra conhecer;
  2. O facto da posição das Partes estar plenamente definida nos Autos e suportada pelos meios de prova documental juntos;

Neste contexto, afigura-se que não é necessária a prova testemunhal e não se vê utilidade em realizar a reunião prevista no artigo 18º do (…) (RJAT).

Assim, ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal Arbitral na condução do processo, da celeridade, da simplificação e informalidade processuais (artigos 19º, nº 2, e 29º, nº 2, do RJAT), bem como tendo em conta o princípio da limitação de actos inúteis previsto no artigo 130º do Código do Processo Civil (CPC), aplicável por força do disposto no artigo 29º, nº 1, alínea e) do RJAT, decidiu este Tribunal Arbitral:

  1. Dispensar a realização da reunião a que se refere o artigo 18º do RJAT;
  2. Prescindir da inquirição da prova testemunhal apresentada pela Requerente;
  3. Determinar que o processo prossiga com alegações escritas facultativas, a apresentar no prazo sucessivo de 10 dias, a contar da notificação do presente despacho;
  4. Designar o dia 15 de Fevereiro de 2019 para efeitos de prolação da decisão arbitral.

Por último, o Tribunal Arbitral adverte ainda a Requerente que, até à data da prolação da decisão arbitral deverá proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 4º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e comunicar esse pagamento ao CAAD”.

 

  1. A Requerente apresentou alegações escritas, em 4 de Janeiro de 2019, no sentido de renovar “(…) para todos os efeitos legais, o que na p.i. foi dito sobre os factos que se consideram provados (…), bem como sobre a matéria de direito (…)”, concluindo que deve “(…) o pedido da Requerente ser procedente (…)”.

 

  1. A Requerida não apresentou alegações.

 

  1. Tendo em consideração a existência de uma inconsistência entre o valor declarado no pedido arbitral (EUR 27.095,06) e o valor declarado no resumo do pedido que consta no Sistema de Gestão Processual do CAAD (EUR 35.000,00), foi proferido despacho arbitral em 11 de Fevereiro de 2019 (notificado a 12 de Fevereiro de 2019), no sentido de notificar a Requerente para, no prazo de 5 dias, clarificar/corrigir o valor do pedido e a Requerida para, querendo, se pronunciar, no mesmo prazo.

 

  1. Dada a necessidade de decurso do prazo de 5 dias acima referido, no mesmo despacho arbitral remarcou-se a prolação da decisão arbitral para o dia 22 de Fevereiro de 2019.

 

  1. A Requerente veio esclarecer, por requerimento apresentado em 15 de Fevereiro de 2019, que o valor do pedido que deverá ser considerado é o que consta do pedido arbitral (propriamente dito), ou seja, EUR 27.095,06.

 

  1. A Requerida não se pronunciou sobre o teor do despacho arbitral referido no ponto 1.14., supra.

 

  1. CAUSA DE PEDIR

 

2.1.    A Requerente começa por referir que “(…) foi objecto de uma acção de inspecção aos exercícios 2014 e 2015, nºs OI2017... e OI2017...”, da qual “(…) resultaram correcções ao nível do IVA no valor de 81 232,83 euros (2014) e
2 507,03 euros (2015) (…)
”.

 

2.2.    Segundo a Requerente, e de acordo com o Relatório de Inspecção, “o fundamento das correcções respeita à dedução indevida de IVA pelos seguintes motivos:

 

  1. Correcção do valor do crédito de imposto reportado na 1ª declaração de 2014 (…) foi indevidamente incrementado em €19 342,31 (aplicação incorrecta do método de dedução do IVA dos custos da revista ACTA) pelas operações realizadas entre 2008 e 2013 (…), e
  2. Correcção do valor crédito de 58 504,98 (originado entre o período 2004 e 2007) que estava influenciar o valor em crédito da primeira declaração de 2014, foi totalmente desconsiderado pelo facto de o sujeito passivo não ter conservado a contabilidade de prazo superior ao prazo legal 10 anos de arquivamento e, nessa medida, não se encontrar em condições de provar o direito a utilizar o crédito de IVA formado nesse período.
  3. Correcção do crédito em reporte (…) no valor de 5 245,72 euros (2014) e de 2 507,03 euros (2015) por aplicação incorrecta do método de dedução do IVA dos custos da revista ACTA (…)”.

 

2.3.    Esclarece a Requerente que “a presente impugnação incide apenas sobre a parte do valor das liquidações que que traduz a correcção pela não aceitação do método de dedução de IVA praticado (…) com a actividade da revista Acta (…), ou seja, a correcção de 19 342,31 (incremento do crédito que transitou para a 1ª declaração de IVA de 2014 por operações realizadas entre 2008 e 2013) e a correcção do crédito em reporte (no valor de 5 245,72 euros (2014) e de
2 507,03 euros (2015), totalizando o valor de correcção de dedução de IVA no valor 27 095,06 euros que originou as deduções dos períodos das liquidações objecto da presente impugnação (de Maio de 2014 a Novembro de 2017)” (sublinhado nosso).

 

2.4.    Em resumo, segundo a Requerente, no pedido arbitral o que está em causa é “(…) a adopção do método de dedução do IVA (…) nas despesas que incorreu com a produção e distribuição da revista denominada ... (…)”.

 

2.5.    Neste âmbito, esclarece a Requerente que se trata de uma associação de direito privado, sem finalidade lucrativa sendo, para efeitos de IVA, um sujeito passivo misto, ou seja, “na prossecução das suas atribuições estatutárias (…) tem desenvolvido, de uma maneira geral, (i) actividades isentas de IVA (…) e (ii) actividade de prestação serviços de publicidade sujeitos a IVA nas páginas da mencionada revista ACTA”.

 

2.6.    Refere a Requerente que “(…) adoptou o método da afectação real, tendo deduziu apenas o IVA (…) dos custos da revista (…), por entender que estes custos estão na totalidade associados exclusivamente à venda da publicidade na revista por a considerar um instrumento físico da publicidade”.

 

2.7.    Contudo, acrescenta a Requerente, “os serviços de inspecção tributária (SIT), apesar de aceitarem que a actividade da revista tem autonomia para ser isolada, entendem que a A... deveria ter adoptado o todo do pro rata (geral) (…) e apurar a referida percentagem de dedução colocando no numerador os outputs obtidos com a publicidade e no denominador os outputs obtidos com a publicidade e a totalidade das quotas pagas pelos associados”.

 

  1. Com efeito, reitera a Requerente, “assumiram os SIT que a revista é vendida/transmitida (sem IVA) tendo por contrapartida o valor da totalidade das quotas anuais que os associados pagam, pelo que, no entender dos SIT, é este o valor (…) que deve ponderar, a par dos custos com a venda de publicidade, para apuramento do pro rata de dedução do IVA suportado com os custos de produção e distribuição da revista” pelo que “em função do pro rata mensal apurado (…) para os exercícios de 2014 e 2015 os SIT efectuaram a mencionada correcção (…)”.

 

  1. Segundo a Requerente “o (…) (ponto de discórdia ente a A... e a ATA) reside na questão de fazer associar o valor (totalidade) das quotas à actividade da revista” porquanto:

 

  1. A A... entendeu que a distribuição gratuita da revista aos sócios não tinha um valor (…) a ponderar nesta actividade de publicidade/distribuição da revista (…) porque os custos cujo IVA se deduziu (…)“(…) são relativos à impressão e distribuição, ou seja (…)” “(…) custos (…) necessários ao suporte/espaço publicitário que vendeu (…) na revista, sendo adequado a sua dedução integral” e;
  2. Em segundo lugar, segundo a Requerente, “(…) resulta dos estatutos da A... que as quotas dos associados não têm propriamente uma contrapartida, apenas se associa a uma vasta séria de direitos e de deveres de índole financeiro, social, participativo e cultura/cientifico, etc.”.
  3. Ao invés, os SIT entendem que a distribuição da revista aos sócios é (a única) contrapartida da totalidade das quotas (…), devendo, em consequência, ter ponderação (a totalidade das quotas anuais) na percentagem de dedução do IVA”, argumentando ainda “(…) que sem o financiamento das quotas dos associados a revista era economicamente insustentável (…)”, esquecendo-se que “(…) a A... é uma associação sem finalidade lucrativa”.

 

  1. Assim, entende a Requerente que “(…) não assiste razão aos SIT, na medida em que, estando admitido que faz sentido isolar a actividade de publicidade/distribuição da revista, estamos em plena aplicação do nº 2 do artigo 23º que permite a afectação real (…) de uma parte identificável (venda de publicidade na revista) da actividade (…)”.

 

  1. Ainda segundo a Requerente, “como resulta do número 3 do artigo 23° do CIVA (…), devem ser adoptados critérios objectivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços em operações que conferem direito a dedução e em operações que não conferem esse direito” mas “(…) os SIT, apesar de isolarem a actividade da revista, adoptaram o critério do pro rata, com base na regra geral (…) como se fosse o único legalmente aplicável e o mais adequado (…)”.

 

  1. Defende a Requerente que “(…) nada impede, que se adopte da regra do prorata específico (…) de uma forma objectiva desde que este (…) se revele (…) o critério mais objectivo e adequeado relativamente a determinada actividade que se isolou (…)”.

 

  1. Em suma, a A... entendeu que a actividade da revista é uma actividade de canal de distribuição de publicidade”, tendo entendido que “(…) o valor das quotas não releva para a percentagem de dedução do IVA suportado com os custos das revistas” pelo que defende a Requerente que “(…) tem o direito a deduzir o IVA, cuja correcção (…) ora se impugna”, peticionando que seja “(…) declarada a ilegalidade das (…) notas de liquidação de IVA, na parte impugnada, e dos respectivos juros com todas as consequências legais, designadamente o acrescido de juros indemnizatórios à taxa legal” (sublinhado nosso).

 

 

  1. RESPOSTA DA REQUERIDA

 

3.1.    Começa a Requerida por referir que “a A... é uma associação sem fins lucrativos que se rege pelos seus estatutos e disposições legais aplicáveis e está enquadrada, em sede de IVA, no regime normal, de periodicidade mensal, como sujeito passivo misto, dado que realiza operações que conferem o direito à dedução do imposto suportado a montante e, em simultâneo, efectua operações isentas que não conferem o direito a qualquer dedução”.

 

3.2.    Prossegue a Requerida referindo que “no decurso da acção de inspecção realizada, verificou-se que foi deduzida a totalidade do IVA suportado com operações relacionadas com a elaboração e distribuição de uma publicação de cariz científico (…), por aplicação do método da afectação real” mas “(…) por se ter verificado que a actividade desenvolvida (…) era mista, em sede de IVA, foi rectificado o imposto deduzido através da aplicação do método do pro rata”.

 

3.3.    Esclarece ainda a Requerida que “embora a acção de inspecção tenha incidido sobre os exercícios de 2014 e 2015, a requerente vem impugnar as liquidações de IVA referentes aos períodos de maio de 2014 a Novembro de 2017, por as correcções resultantes terem recaído (…) sobre o crédito de IVA em reporte que influenciou períodos subsequentes aos que foram objecto de análise” (sublinhado nosso).

 

3.4.    No que diz respeito à posição assumida pela Requerente, não concorda a Requerida com aquela quando defende que “(…) a venda de publicidade no interior da revista..., se prende com o objeto da atividade desenvolvida sujeita a IVA e classificou a revista, em si, como um mero um instrumento físico da publicidade (…)”, porquanto entende a Requerida que “se a revista fosse, de facto, apenas o instrumento físico da publicidade, então seria distribuída pela publicidade incluída e os conteúdos de cariz cientifico que a caracterizam não seriam necessários e, caso existissem, seriam meros complementos aos referidos anúncios”.

 

3.5.    Com efeito, defende a Requerida que “(…) analisando todos os factos constantes do RIT (…) é imperioso concluir que não existem dúvidas que o objecto da actividade sujeita é a edição e distribuição da revista ... aos sócios (direitos previstos nos Estatutos da A...)” pelo que entende a Requerida que “a venda de espaço publicitários no interior da revista, em face dos elementos contabilísticos apresentados e, especialmente, dos que não foram apresentados no decurso dos atos inspetivos (…), não logrou reunir os requisitos necessários para ser (…), uma área isolável da atividade principal (edição e distribuição da revista) permanecendo, apenas, como uma componente que concorre para formação dos rendimentos totais da mesma” (sublinhado nosso).

 

3.6.    Segundo alega a Requerida, “a venda de publicidade não pode existir sem a edição da revista e o contrário é possível, como aconteceu em 2013, ano em que não foram registados rendimentos sujeitos a imposto e, do mesmo modo, foi deduzido o IVA suportado com os gastos da edição da revista (…)”, porquanto “(…) mesmo sem a venda de publicidade, a revista foi impressa, o que comprova a relação direta entre ambas e demonstra a natureza secundária e meramente complementar dos rendimentos obtidos com a referida publicidade”.

 

3.7.    Mas, segundo a Requerida, “(…) uma outra componente (…) pode concorrer para os rendimentos totais da atividade da mesma forma como a venda de publicidade: a venda de revistas a terceiros”, porquanto “embora, tal não se tenha verificado em 2013 e não seja a principal forma de distribuição da revista, a venda a terceiros já ocorreu e não pode ser desconsiderada por se tratar de uma operação sujeita e não isenta de IVA que gera rendimentos associados à edição da revista, o que reforça o carácter suplementar da venda de publicidade, face à edição da revista”.

 

  1. Segundo defende a Requerida, “a A... adotou, para a dedução do IVA, o método da afetação real (…) deduzindo a totalidade do IVA sempre que o input for consumido numa atividade que concede o direito à dedução (…)” mas, segundo a Requerida, “(…) não foi este o procedimento que foi efetivamente aplicado porque a atividade que esteve na base dos gastos incorridos foi a edição e distribuição da revista que, ao contrário do que é alegado pela A..., não tem como único rendimento, o valor recebido pela venda de publicidade no seu interior”.

 

  1. Com efeito, alega a Requerida que “(…) analisando a contabilidade, é possível verificar que os rendimentos provenientes da venda de publicidade, não geraram meios suficientes para satisfazer os encargos incorridos (…)” pelo que reitera que “(…) para cumprir com as obrigações com os respetivos fornecedores, era obrigatório dispor de outras verbas” o que, segundo a Requerida, “(…) foi o que sucedeu (…)”.

 

  1. Por outro lado, entende a Requerida que “(…) é inegável que a edição da revista e sua distribuição ao sócio estão expressamente previstas como contrapartida do pagamento da quota” “nomeadamente através da informação vertida na sua página da internet (…) onde refere (…)” que “por uma quota de sócio da A... (…) poderá usufruir de todo o tipo de serviços que a A... presta aos seus sócios” entre os quais se destaca “Revista...”.

 

  1. Assim, entende a Requerida que “(…) ficou (…) demonstrado que, ao IVA que foi deduzido na integra pelo sujeito passivo, estiveram associadas operações que originaram a liquidação de IVA (venda de publicidade) mas também, obrigatoriamente, outras, geradores de rendimentos mas sobre as quais não foi liquidado imposto (quotas)” pelo que conclui que “(…) como a adoção do método da afetação real (i) obrigava à existência de uma separação contabilística entre as aquisições de bens e serviços destinados ao sector que confere a dedução integral do IVA e as aquisições que dizem respeito ao sector em que a possibilidade de dedução do IVA se encontra excluída e (ii) pressupunha que todas as operações consideradas na dedução estivessem associadas a uma atividade em que todos os rendimentos obtidos são sujeitos a IVA e não isentos, não poderia o mesmo ser aplicado (…) por falta de cumprimentos dos requisitos elencados” (sublinhado da Requerida).

 

  1. Assim, reitera a Requerida que “foi por este facto que, no relatório de inspeção, foi referido que o método de dedução correto a aplicar nesta situação deveria ter sido o método da percentagem de dedução ou pro rata".

 

  1. Adicionalmente, entende a Requerida que “através dos estatutos e do conteúdo da página da internet da A..., foi possível confirmar que a edição da revista e subsequente distribuição aos sócios é obrigatória mas o benefício de associado é adquirido pelo pagamento de quotas” pelo que “(…) considera-se que é consistente afirmar que a quota, por ser o único pagamento obrigatório para os beneficiários da revista, seja, em parte ou na sua totalidade, afeto à atividade de edição e distribuição da revista”.

 

  1. Assim, entende a Requerida que “considerando que não subsistiam dúvidas de que, pelo menos, parte do valor da quota teria sempre que estar alocado à atividade de edição e distribuição da revista, foram desenvolvidos todos os esforços no sentido de determinar a percentagem de afetação”, “o cálculo deveria ter em consideração, fatores como o número de sócios, o valor pago, o número de revistas impressas e distribuídas, bem como os restantes eventos realizados e custos suportados em cada ano mas, sem a disponibilização dos referidos elementos, não ficaram reunidos os requisitos necessários para apurar a taxa de imputação, pelo que foi considerado o valor integral” (sublinhado nosso).

 

  1. Para a Requerida é manifesto “(…) que o direito à dedução do IVA suportado nos inputs relacionados com a revista não é nem nunca poderia ser dedutível, por[que] para além de inobservar as regras do CIVA e da Directiva, viola frontalmente o princípio da neutralidade (…)”, reiterando que “(…) não tendo a Requerente logrado juntar elementos que permitissem concretizar (…) o direito à dedução, nomeadamente, juntando a informação solicitada pelos SIT com vista a apurar o montante de quotas afecto à produção e distribuição da revista, levaram a cabo os SIT a correcção menos gravosa para a Requerente e que permite ainda assim acautelar o mencionado princípio da neutralidade”, “ou seja, apesar de aceitar a dedutibilidade do imposto relativo à publicidade, não pôde a Requerida deixar de ter em conta a verba relativa ás quotas, porque incontestavelmente as mesmas estão afectas à produção e distribuição da revista (sublinhado nosso).

 

  1. E “não tendo a Requerida logrado demonstrar, como era sua obrigação (art.º 74.º da LGT, 29.º n.º 1 al. g) do CIVA), qual a parte das quotas que estava afecta a tal propósito, teve a Requerida de considerar as quotas na totalidade” pelo que entende a Requerida “(…) que decaem os argumentos invocados pela Requerente no pedido de pronúncia arbitral, aqui expressa e integralmente impugnados, bem como os documentos juntos, por não corresponderem à verdade ou deles não se poder extrair os efeitos jurídicos almejados pela Requerente”, concluindo a Requerida que deverão falecer “(…) integralmente as razões e argumentos expendidas pela Requerente em prol da (…) ambicionada anulação dos actos tributários” (sublinhado nosso).

 

  1. SANEADOR

 

4.1.    O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto na alínea a), do nº 1, do artigo 10º do RJAT.

 

4.2.    O Tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos do artigo 2º, nº 1, alínea a), artigos 5º e 6º, todos do RJAT.

 

4.3.    As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas quanto ao pedido de pronúncia arbitral e estão devidamente representadas, nos termos do disposto nos artigos 4º e 10º do RJAT e do artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.

 

4.4.    Não foram identificadas nulidades no processo.

 

4.5.    Não existem excepções de que cumpra conhecer.

 

  1. MATÉRIA DE FACTO

 

5.1.    Preliminarmente, e no que diz respeito à matéria de facto, importa salientar que o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada [cfr. artigo 123º, nº 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e artigo 607º, nºs 3 e 4, do CPC (aplicáveis ex vi artigo 29º, nº 1, alíneas a) e e), do RJAT].

 

5.2.    Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito.

 

Dos factos provados

 

5.3.    A Requerente é uma associação científica de direito privado, sem fins lucrativos e de utilidade pública, dotada de personalidade jurídica, constituída em 1948, por tempo indeterminado, que se rege pelos seus estatutos e pelas disposições legais aplicáveis e esta enquadrada no CAE 72200 “Investigação e Desenvolvimento das Ciências Sociais e Humanas”.

 

5.4.    A Requerente tem por Missão a protecção e promoção da saúde e do bem-estar da ..., através da excelência e defesa dos cuidados de saúde, da educação, da investigação e do apoio aos sócios.

 

5.5.    A Requerente A... tem por objeto (artigo 3º dos Estatutos):

a)     Fomentar o estudo da saúde da ... e do ... e a promoção e difusão dos progressos da ... nas vertentes assistenciais, pedagógicas e de investigação;

b)      Representar a ... Portuguesa nas relações com Entidades Nacionais e Internacionais que apresentem convergência com os objetivos da A...;

c)       Intervir como parceira ou consultora junto dos poderes públicos e da sociedade civil na promoção da saúde da ... e do ... e na resolução dos problemas pediátricos;

d)      Promover o intercâmbio privilegiado com pares e comunidades de expressão portuguesa”.

 

5.6.    De acordo com os seus Estatutos, na prossecução dos seus objetivos cabe à Requerente, designadamente:

a)     O estudo dos problemas inerentes aos associados enquanto intervenientes na promoção da saúde e bem-estar da ... e dos ...s e sua integração na família e na comunidade;

b)      Promover atividades de formação e informação aos seus associados no âmbito do objeto social;

c)       Colaborar com outros organismos, nacionais e internacionais, promovendo a cooperação de atividades relacionadas com as objetivos estatutários;

d)      Promover a estudo das diferentes áreas específicas da ...;

e)       Prover a captação de recursos financeiros para a concretização das suas ações;

f)       Selecionar e contratar pessoas, singulares e coletivas, de modo a assegurar adequado funcionamento que o âmbito dos seus fins exige”.

 

5.7.    Ainda de acordo com os Estatutos (artigo 5º dos Estatutos), “podem ser associados (…) os …, outros profissionais e instituições diretamente ligados à saúde da ... e do ...”, tendo a Requerente as seguintes categorias de associados:

a)       Efectivos;

b)      Agregados;

c)       Correspondentes;

d)      Honorários;

e)       Beneméritos.

 

5.8.    Os associados efectivos (artigo 5º, nº 3 dos Estatutos), têm o direito, acordo com o disposto no artigo 6º, nº 1 dos Estatutos, de:

a)     Tomar parte nas iniciativas de carater científico da A...;

  1. Participar e votar nas Assembleias Gerais;
  2. Eleger e ser eleitos para os órgãos sociais da A...;
  3. Beneficiar de todas as atividades, iniciativas, serviços e apoios da A...;
  4. Receber as publicações científicas que a A... edita, designadamente a ...;
  5. E participar na zona dedicada a profissionais da página web da A...” (negrito e sublinhado nosso).

 

5.9.    Os associados efectivos, de acordo com o artigo 7º dos Estatutos, têm o dever de:

a)     Contribuir para a A... com a quota fixada em Assembleia Geral e com todas as contribuições votadas por este órgão;

b)      Desempenhar com zelo e diligencia os cargos para que forem eleitos;

c)       Cumprir e fazer cumprir as disposições legais aplicáveis à A..., bem como o Estatutos, Regulamentos Internos e deliberações dos órgãos sociais” (negrito nosso).

 

5.10.  Os associados agregados, correspondente, honorários e beneméritos (artigo 5º, nº 4 dos Estatutos), não têm o direito, de acordo com o disposto no artigo 6º, nº 3 dos Estatutos, de:

a)       Votar nas Assembleias Gerais;

b)      Eleger e ser eleitos para os órgãos sociais da A...;

tendo os restantes direitos elencados para os associados efectivos (vide ponto 5.8., supra)

 

5.11.  Os associados agregados, de acordo com o disposto no artigo 7º, nº 2 dos Estatutos, têm o dever de:

a)     Contribuir para a A... com a quota fixada em Assembleia Geral, e com todas as contribuições votadas por este órgão;

b)      Cumprir e fazer cumprir as disposições leais aplicáveis à A..., bem como os Estatutos, Regulamentos Internos e deliberações dos órgãos sociais”. (negrito nosso).

 

5.12.  Os associados correspondentes, honorários e beneméritos não têm o dever de contribuir para a A... com a quota fixada em Assembleia Geral ou com qualquer outra contribuição votada por este órgão.

 

5.13.  Em matéria de Receitas, de acordo com o previsto no artigo 42º dos Estatutos, “são receitas da A...:

a)      as quotas pagas pelos associados;

b)      o produto dos acordos feitos com sócios, secções e terceiros;

c)       os subsídios, as doações, os donativos, as heranças que lhe advenham e sejam aceites pela A...;

d)      o produto da venda de publicações;

e)       o produto das atividades desenvolvidas, nomeadamente de atividades de formação ou aperfeiçoamento organizadas pela A... para os associados ou terceiros, bem como quaisquer serviços prestados na sua área de intervenção;

f)       o produto de atividades de investigação;

g)      os rendimentos de bens próprios;

h)      outros contributos dos associados ou de terceiros, que sejam legítimos” (sublinhado nosso).

5.14.  Em matéria de enquadramento fiscal, a Requerente está enquadrada, em sede de IRC, como sujeito passivo nos termos das alíneas a) do nº 1 do artigo 2º do Código do IRC e, em sede de IVA, pela actividade que desenvolve, é um sujeito passivo de imposto ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 1º do Código do IVA, estando enquadrado no regime normal com periodicidade mensal.

 

5.15.  Dado que a Requerente desenvolve actividades que englobam operações sujeitas que dão direito à dedução do IVA suportado a montante e, simultaneamente, operações que são isentas de imposto, em matéria de enquadramento fiscal em sede de IVA, a Requerente é um sujeito passivo misto com afectação real de todos os bens.

 

5.16.  No que diz respeito ao método de dedução em IVA, a Requerente adoptou o método da afectação real e os valores considerados incidiram, exclusivamente, sobre as operações relacionadas com a elaboração e distribuição de uma publicação trimestral, de cariz científico, denominada “...”.

 

5.17.  Nos exercícios de 2014 e 2015, a Requerente apresentou os seguintes valores totais nas DP’s de IVA entregues ao longo de cada um dos anos:

 

2014

2015

TOTAL IVA LIQUIDADO

13.410,15

26.771,40

TOTAL IVA DEDUTÍVEL

7.611,85

7.366,77

TOTAL REPORTE PERÍODO ANTERIOR

75.268,10

69.459,80

TOTAL IVA A RECUPERAR

69.459,80

50.025,17

 

 

 

5.18.  A Requerente foi objecto de uma acção de inspecção externa, de âmbito parcial, aos exercícios de 2014 e 2015, em cumprimento das ordens de serviços nº OI2017...e OI2017..., respectivamente, abertas para IVA e IRC, motivadas pelo crédito de IVA que se encontrava em reporte, em períodos sucessivos, sem pedido de reembolso (vide ponto anterior).

5.19.  Os actos inspectivos tiveram início no dia 28 Abril de 2017 e foram concluídos em 23 de Outubro de 2017.

 

5.20.  De acordo com as conclusões apresentadas no projecto de RIT:

5.20.1.   “Em termos de dedução, o sujeito passivo adotou o método da afetação real e os valores considerados incidiram, exclusivamente, sobre as operações relacionadas com a elaboração e distribuição de uma publicação trimestral, de cariz científico, denominada ... que é distribuída gratuitamente pela A..., no âmbito da sua atividade, a qualquer associado, como um dos benefícios por ser sócio e está englobada nas contrapartidas concedidas pelas quotas pagas. (…). O sujeito passivo aplicou o método da afetação real porque considerou que conseguia isolar todas as operações associadas a esta atividade e que todos os rendimentos obtidos eram sujeitos a IVA e não isentos. Analisando esta atividade, verificou-se que a elaboração e distribuição da revista (…), em termos de operações ativas, engloba a venda de espaços publicitários no seu interior, atividade não isenta de imposto mas também as quotas pagas pelos associados (…) que recebem de forma gratuita, como uma das contrapartidas de serem sócios. As quotas pagas (…) são rendimentos sujeitos a IVA mas isentos (…). No que se refere ao imposto deduzido, o sujeito passivo inscreveu no campo 24 (…), o imposto suportado com a aquisição de serviços associados à (…) elaboração da revista (produção gráfica e aquisição de conteúdos técnicos). No entanto, o sujeito passivo apenas considerou como inputs da atividade os recebimentos da publicidade, o que não está correto. (…). A relevância das quotas pagas é evidente e pode ser aferida da mera análise à contabilidade onde os gastos (e IVA deduzido) associados à elaboração e distribuição da revista, superam em muito os rendimentos (e IVA liquidado) obtidos com a publicidade, ou seja, sem o financiamento da A..., através das quotas, a revista não teria viabilidade económica. Assim sendo, (…), o sujeito passivo deveria ter considerado os rendimentos da venda de publicidade, as quotas pagas pelos destinatários da revista e os encargos necessários à sua elaboração e distribuição. Em face do exposto, considerando que estamos perante rendimentos obtidos sujeitos a IVA, isentos e não isentos de imposto, o método de dedução correto a aplicar nesta situação deveria ter sido o método da percentagem de dedução ou pro rata (…) (sublinhado nosso).”

5.20.2.   No que diz respeito ao crédito de imposto reportado de períodos anteriores, “com base nos cálculos efectuados verificou-se que o valor do crédito de imposto reportado em 2014 (no período 1403T) foi indevidamente incrementado em € 19.342,31 pelas operações realizadas entre 2008 e 2013” e “(…) não pode ser aceite a dedução do crédito de imposto apurado nos períodos não documentados (anteriores a 2008), ou seja, a dedução de € 58.504,98”;

5.20.3.   Ao IVA deduzido com a aquisição de outros bens e serviços (2014 e 2015), “pelos motivos identificados na análise do crédito em reporte, (…), tendo em conta a aplicação do pro rata em 2014 e 2015, conforme (…) se explicou para os exercícios de 2008 a 2013 (…)”, foram propostas correcções, quer para o ano 2014, quer para o ano 2015.

 

5.21.  Assim, da referida acção inspectiva resultou um projecto de correcções, em sede de IVA, no valor total de EUR 81.232.83 (ano 2014) e EUR 2.507,03 (ano 2015), com fundamento em dedução indevida de IVA por utilização de método de dedução incorrecto (utilização do método da afectação real).

 

5.22.  A Requerente foi notificada do projecto de correcções do RIT através do Ofício nº..., de 27 de Outubro de 2017 (registo nº RD...PT) bem como para exercer, querendo, o seu direito de audição no prazo de 15 dias.

 

5.23.  A Requerente exerceu o deu direito de audição por escrito, através de carta registada (RH...PT), recebida em 15 de Novembro de 2017 e por correio electrónico, contestando as correcções propostas pelos SIT no que diz respeito ao “método de dedução legalmente adequado”, “correcta metodologia de apuramento de percentagem” e “caducidade do direito à liquidação do imposto”.

 

5.24.  No que diz respeito às correcções relacionadas com o “método de dedução”, entendeu a Requerente no direito de audição que:

5.24.1.   “(…) a actividade de publicidade/distribuição da revista é uma actividade isolável” e que “os SIT também aceitaram esse princípio”;

5.24.2.   “(…) de entre a actividade global da A..., está admitido que é adequado separar (afectar) este sector de actividade, ou seja, na base da correcção dos SIT está um método de afectação real (ainda que parcial)”;

5.24.3.   “A A... entendeu que a distribuição gratuita da revista aos sócios não tinha um valor (…) a ponderar nesta actividade de publicidade/distribuição da revista” mas “(…) os SIT entenderam que a distribuição da revista aos sócios é (a única) contrapartida da totalidade das quotas (…), devendo (…) ter ponderação na percentagem de dedução do IVA”;

5.24.4.   Fazendo sentido para a Requerente “(…) isolar a actividade de publicidade/distribuição da revista” estaremos, segundo a Requerente, “(…) em plena aplicação do nº 2 do artigo 23º que permite a afectação real (…) de uma parte identificável da actividade”.

 

5.25   No que diz respeito à “correcta metodologia de apuramento de percentagem”, reitera a Requerente que:

5.25.1.   “(…) a lei (…) determina a adopção de um (qualquer) critério objectivo (desde que se revele adequado)” e “(…), no pro rata aplicado pelos SIT, estes associaram a totalidade do valor das quotas dos associados como sendo a contrapartida (pagamento) da revista que (…) é distribuída sem pagamento de preço” (sublinhado nosso);

5.25.2.   “Como resulta dos estatutos da A... (…), as quotas dos associados não têm propriamente um contrapartida, apenas se associa a uma série de direitos e deveres de índole financeiro, social, participativo e cultura/científico, etc”, “ou seja, não existe qualquer sinalagma entre o valor (e muito menos o valor total) da quota com o recebimento da revista” (sublinhado nosso);

5.25.3.   “Por falta desta relação directa e imediata, a A... entendeu que o valor das quotas não releva para a percentagem de dedução do IVA suportado com os custos das revistas”.

 

5.26.  No que diz respeito à “caducidade do direito à liquidação do imposto”, dado que no pedido tal matéria não faz parte das correções impugnadas neste processo, aqui só será relevado, no que diz respeito “(…) ao IVA deduzido de 2008 a 2013 (…), que “(…) os SIT aplicaram a mesma regra de cálculo do prorata que adoptaram para os exercícios inspecionados de 2014 e 2015 e consideraram que o crédito de imposto saquele período (…) foi indevidamente incrementado para 2014 no valor de
19 342,31 euros
”, reiterando a Requerente que, para esta correcção, “(…) valem os argumentos tecidos (…) contra o método e cálculo de percentagem de dedução subjacente à correcção proposta para os exercícios inspecionados de 2014 e 2015”;

 

5.27.  Dado terem os SIT constatado que o “Mapa Resumo das Correções Resultantes da Ação de Inspeção (…) para o exercício de 2014, integrado (…) [no] projeto de relatório, não evidenciava a totalidade das correções descritas ao longo do mesmo” e ainda que tenham os SIT proposto a “(…) manutenção das correções identificadas no primeiro projeto de relatório (…)”, no cumprimento do estatuído nos artigos 60º da LGT e do RCPITA, procederam à notificação à Requerente, por carta registada (Ofício nº..., de 18 de Janeiro de 2018), de um segundo “Projecto de Relatório” para que a Requerente, querendo, exercesse novo direito de audição, no prazo de quinze dias.

 

5.28.  No decurso do prazo concedido, foi recepcionado pelos SIT, um segundo direito de audição, mantendo os SIT no RIT emitido os argumentos expostos (anteriormente) na apreciação daquele primeiro direito de audição.

 

5.29.  A Requerente foi notificada da versão final do RIT através do Ofício nº..., de 29 de Março de 2018, no qual os SIT, após terem apreciado os argumentos apresentados pela Requerente no(s) seu(s) direito(s) de audição, concluíram no que a este processo interessa que:

5.29.1.   No que diz respeito ao “método de dedução legalmente adequado”, a Requerida veio reiterar que “(…) sendo as quotas um rendimento isento (…) e a publicidade, uma operação sujeita e não isenta, estamos perante uma atividade mista que (…) permite a dedução do imposto na percentagem correspondente ao montante anual das operações que deem lugar à dedução”;

5.29.2.   No que diz respeito à “correcta metodologia de apuramento de percentagem”, a Requerida veio considerar que “(…) não foram apresentados elementos que coloquem em questão as correcções propostas relativamente ao imposto deduzido em 2014 e 2015, pelo que as mesmas devem ser mantidas (…)”.

 

5.30.  Assim, “(…) por se considerar que não foram apresentados elementos que permitam alterar as correções propostas (…)” entenderam os SIT no RIT que devem ser integralmente mantidas as correcções propostas, ou seja:

i.   (…);

ii.    Imposto deduzido – em 2014 e 2015 foi deduzido IVA que excedeu o limite apurado por aplicação da percentagem pro rata, pelo que deverá ser efetuada uma correção a favor do Estado (campo 41) do imposto deduzido indevidamente”.

 

5.31.  Em consequência, Requerente foi notificada das seguintes liquidações de IVA e de juros, as quais são neste processo parcialmente impugnadas:

 

 

IDENTIFICAÇÃO DAS LIQUIDAÇÕES DE IVA

PERÍODO

LIQUIDAÇÃO

DATA

 

201405

2018 ...

2018-04-05

 

201406

2018 ...

2018-04-05

 

201407

2018 ...

2018-04-05

 

201409

2018 ...

2018-04-06

 

201410

2018 ...

2018-04-06

 

201411

2018 ...

2018-04-06

 

201502

2018 ...

2018-04-10

 

201503

2018 ...

2018-04-10

 

201504

2018 ...

2018-04-10

 

201505

2018 ...

2018-04-10

 

201506

2018 ...

2018-04-11

 

201507

2018 ...

2018-04-11

 

201508

2018 ...

2018-04-11

 

201511

2018 ...

2018-04-11

 

201512

2018 ...

2018-04-11

 

201601

2018 ...

2018-04-13

 

201602

2018 ...

2018-04-13

 

201605

2018 ...

2018-04-13

 

201606

2018 ...

2018-04-14

 

201608

2018 ...

2018-04-14

 

201609

2018 ...

2018-04-14

 

201610

2018 ...

2018-04-14

 

201611

2018 ...

2018-04-17

 

201701

2018 ...

2018-04-17

 

201702

2018 ...

2018-04-17

 

201703

2018 ...

2018-04-17

 

201705

2018 ...

2018-04-17

 

201707

2018 ...

2018-04-17

 

201709

2018 ...

2018-04-18

 

201710

2018 ...

2018-04-18

 

201711

2018 ...

2018-04-18

 

         
 

 

  1. Não obstante as conclusões decorrentes do RIT serem mais abrangentes, e em consequência, também as liquidações que dele resultaram, este pedido arbitral apenas incide sobre a parte das liquidações que se traduzem na correcção resultante da não aceitação do método de dedução de IVA praticado pela Requerente no que diz respeito à actividade da revista “...”, ou seja:
    1. A correcção do montante do crédito de imposto reportado na primeira declaração de 2014, no valor de EUR 19.342,31;
    2. A correcção do crédito em reporte no montante de EUR 5.245,72 (ano 2014) e no montante de EUR 2.507,03 (ano 2015);

totalizando o valor das correcções de IVA impugnadas no pedido arbitral, o montante de EUR 27.095,06.

 

5.33.  Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito do pedido.

 

Motivação quanto à matéria de facto

 

5.34.  No tocante à matéria de facto provada, a convicção do Tribunal Arbitral fundou-se, para além da livre apreciação das posições assumidas pelas Partes (em sede de facto), no teor dos documentos juntos, por ambas as Partes, aos autos, bem como na análise do processo administrativo remetido pela Requerida.

 

Dos factos não provados

 

  1. Não ficou provado que a Requerente tenha pago os montantes associados com as liquidações de IVA e de juros, na parte impugnada neste pedido arbitral.

 

  1. Não se verificaram quaisquer outros factos como não provados com relevância para a decisão arbitral.

 

6.       MATÉRIA DE DIREITO

 

6.1.    Encontrando-se fixada a matéria de facto dada como provada, de seguida importa determinar o direito aplicável aos factos subjacentes, de acordo com as questões a decidir.

 

6.2.    Neste âmbito, no processo arbitral em análise, as questões relativamente às quais Requerente e Requerida apresentam entendimentos opostos consistem em:

 

6.2.1.     Saber se, no apuramento do IVA dedutível, em 2014 e 2015, a Requerente deveria ter considerado os rendimentos da venda de publicidade, as quotas pagas pelos destinatários da revista “...” e os encargos necessários à sua elaboração e distribuição?

6.2.2.     Saber se o método de dedução correcto a aplicar, no que diz respeito à elaboração e distribuição da revista, deveria ter sido o método da percentagem de dedução ou pro rata (como defende a Requerida) e não o método da afectação real (como defende a Requerente)?

6.2.3.     Saber se, em consequência do método de dedução de imposto utilizado pela Requerente (método da afectação real), foi por esta deduziu, em 2014 e 2015, imposto que excedeu o limite apurado por aplicação da percentagem do pro rata?

6.2.4.     Saber se, em consequência, a Requerente deduziu imposto indevidamente?

6.2.5.     Saber se, face às respostas a dar às questões anteriores, os actos de liquidação de IVA e de juros compensatórios, objecto do pedido arbitral, enfermam ou não de ilegalidade de modo a decidir se, em consequência, os referidos actos de liquidação devem ou não ser anulados?

 

6.3.    Quanto à matéria controvertida, como acima vimos, a Requerente defende que sendo, para efeitos de enquadramento em sede de IVA, um sujeito passivo misto [porquanto, “na prossecução das suas atribuições estatutárias (…) tem desenvolvido, de uma maneira geral, (i) actividades isentas de IVA (…) e (ii) actividade de prestação serviços de publicidade sujeitos a IVA nas páginas da (…) revista ACTA”], “nos anos a que se refere a inspecção (…) e anteriores, (…) adoptou o método da afectação real, tendo deduzido apenas o IVA (…) dos custos da revista (…), por entender que estes custos estão na totalidade associados exclusivamente à venda da publicidade (…)”, discordando assim da posição assumida pelos SIT no RIT (e subsequentemente, da posição da AT reiterada na Resposta) no sentido de que“(…) apesar de aceitarem que a actividade da revista tem autonomia para ser isolada [posição, contudo, contestada pela Requerida], entendem que a A... deveria ter adoptado o método do pro rata (geral) (…)” e apurado “(…) a referida percentagem de dedução colocando no numerador os outputs obtidos com a publicidade e no denominador os outputs obtidos com a publicidade e a totalidade das quotas pagas pelos associados” porquanto entenderam que “(…) a revista é vendida/transmitida (sem IVA) tendo por contrapartida o valor da totalidade das quotas anuais que os associados pagam (…)” (sublinhado nosso).

 

6.4.    Assim, no entender dos SIT, deveria ter sido “(…) este o valor (…) que deve ponderar, a par dos custos com a venda de publicidade, para apuramento do pro rata de dedução do IVA suportado com os custos de produção e distribuição da revista” (sublinhado nosso).

 

6.5.    Neste âmbito, a Requerente entende que “o (…) (ponto de discórdia ente a A... e a ATA) reside na questão de fazer associar o valor (totalidade) das quotas à actividade da revista” porquanto “(…) resulta dos estatutos da A... que as quotas dos associados não têm propriamente uma contrapartida, apenas se associa a uma vasta séria de direitos e de deveres de índole financeiro, social, participativo e cultura/cientifico, etc.” pelo que entende a Requerente que “(…) não assiste razão aos SIT (…)”, concluindo que “(…) tem o direito a deduzir o IVA, cuja correcção à dedução ora se impugna” (sublinhado nosso).

 

6.6.    Por outro lado, entende a Requerida que(…) é imperioso concluir que não existem dúvidas que o objecto da actividade sujeita é a edição e distribuição da revista ... aos sócios (direitos previstos nos Estatutos da A...)” pelo que entende a Requerida que “a venda de espaço publicitários no interior da revista, em face dos elementos contabilísticos apresentados e, especialmente, dos que não foram apresentados no decurso dos atos inspetivos (…), não logrou reunir os requisitos necessários para ser, sequer, uma área isolável da atividade principal (edição e distribuição da revista) permanecendo, apenas, como uma componente que concorre para formação dos rendimentos totais da mesma” (sublinhado nosso).

 

6.7.    Assim, segundo a Requerida, embora a Requerente refira que “(…) adotou, para a dedução do IVA, o método da afetação real (…) deduzindo a totalidade do IVA sempre que o input for consumido numa atividade que concede o direito à dedução (…)”, “(…) não foi este o procedimento que foi efetivamente aplicado porque a atividade que esteve na base dos gastos incorridos foi a edição e distribuição da revista que (…) não tem como único rendimento, o valor recebido pela venda de publicidade no seu interior” porquanto, “(…) analisando a contabilidade, é possível verificar que os rendimentos provenientes da venda de publicidade, não geraram meios suficientes para satisfazer os encargos incorridos (…)”.

 

6.8.    E, ficando demonstrado para a Requerida “(…) que outras verbas concorreram para a prossecução da atividade e, ao não serem objeto de liquidação de IVA, inviabilizam de imediato a dedução integral do imposto suportado com os gastos inerentes, por estarem associados a uma atividade mista” posição que reforça ao afirmar que “(…) é inegável que a edição da revista e sua distribuição ao sócio estão expressamente previstas como contrapartida do pagamento da quota” (sublinhado nosso).

 

6.9.    Assim, entende a Requerida que “(…) ficou (…) demonstrado que, ao IVA que foi deduzido na integra pelo sujeito passivo, estiveram associadas operações que originaram a liquidação de IVA (venda de publicidade) mas também (…) outras, geradores de rendimentos (…) sobre as quais não foi liquidado imposto (quotas)pelo que reitera a Requerida que “(…) o método de dedução correto a aplicar nesta situação deveria ter sido o método da percentagem de dedução ou pro rata” (sublinhado nosso).

 

6.10.  Para a Requerida é ainda manifesto “(…) que o direito à dedução do IVA suportado nos inputs relacionados com a revista não é nem nunca poderia ser dedutível (…)” porquanto “(…) viola frontalmente o princípio da neutralidade, que é (…) o alicerce do IVA”, “(…) não tendo a Requerente logrado juntar elementos que permitissem concretizar (…) o direito à dedução (…)”.

 

6.11.  E, para a Requerida, “não tendo a Requerente logrado demonstrar, como era sua obrigação (…), qual a parte das quotas que estava afecta a tal propósito, teve a Requerida de considerar as quotas na totalidade”, concluindo no sentido de “(…) que decaem os argumentos invocados pela Requerente no pedido de pronúncia arbitral (…)” (sublinhado nosso).

 

6.12.  Face às posições, em síntese, acima expostas, terá este Tribunal Arbitral de analisar os argumentos apresentados por cada uma das Partes e decidir a qual delas assiste razão, face ao normativo legal vigente.

 

6.13.  Neste âmbito, no que concerne ao exercício do direito à dedução em IVA, justifica-se tecer algumas considerações prévias, quer sobre a respectiva natureza, quer no que tange ao respectivo exercício por sujeitos passivos mistos.

 

Da natureza e amplitude do exercício do direito à dedução

 

6.14.  O IVA é um imposto que tributa o consumo, sendo que o verdadeiro critério delimitador da base de incidência do mesmo é o conceito de actividade económica, que terá uma importância fulcral na delimitação do direito à dedução dos sujeitos passivos mistos, como é o caso da Requerente.

 

6.15.  Com efeito, como escreve Rui Manuel Pereira da Costa Bastos, “na definição de sujeito passivo de IVA, o legislador nacional optou, desde logo, por não utilizar o conceito de atividade económica, noção autónoma do Direito da EU, sem prejuízo de utilizar, em parte, a sua definição conferida pela Diretiva IVA, utilizando a mesma redundância do legislador comunitário (…), que deverá servir apenas para acentuar o carácter abrangente do campo de incidência deste imposto”.[2]

 

6.16.  E, ainda segundo o mesmo autor, “não obstante estamos na presença de um imposto geral sobre o consumo, dotado de um âmbito de aplicação muito lato (…), constatámos (…) que apenas são abrangidas (…) as atividades que tenham um carácter económico, quando praticadas por um sujeito passivo. Assim sendo, o conceito residual e abrangente de prestação de serviços (…), conforme é enunciado no Código do IVA (…) tem por delimitação o próprio conceito de atividade económica, materializado num ato de consumo, que terá necessariamente de ocorrer”.[3]

 

6.17.  Retomando a caracterização do IVA, refira-se que o princípio da neutralidade constitui a principal característica deste tributo, como corolário que é do princípio jurídico da não discriminação.

 

6.18.  Com efeito, constitui característica nuclear do IVA a neutralidade, quer numa perspectiva interna (consubstanciando-se na sua não influência na formação dos preços, na estrutura do circuito económico), quer na perspectiva externa (nas relações comerciais interestaduais, com a adopção do princípio do destino).

 

6.19.  “O exercício do direito à dedução do IVA consubstancia uma das principais características deste tributo, (…) em conformidade com o regime consagrado na Sexta Directiva de 1977 (Directiva 77/388/CEE, do Conselho, de 17/05/1977), mais exactamente no seu art.º 17º, preceito que consagra as regras do exercício do direito à dedução do imposto, contemplando diversos requisitos objectivos e subjectivos do exercício do mesmo direito à dedução” (sublinhado nosso).[4]

 

6.20.  Ora, mecanismo do direito à dedução permite ao sujeito passivo expurgar do seu encargo o IVA suportado a montante, não o reflectindo assim como custo operacional da sua actividade, retirando o efeito cumulativo e a tributação em cascata que caracterizavam o imposto a que o IVA sucedeu, potenciando a neutralidade económica do imposto.

 

6.21.  Assim, no ordenamento interno, de acordo com o disposto no artigo 19º, nº 1 do Código do IVA (Direito à dedução), “para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzem (…) ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuaram (…)” nomeadamente, “o imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos (…)”, sendo que, nos termos do nº 2 do referido artigo 19º “só confere direito a dedução o imposto mencionado (…) em faturas passadas na forma legal (…)”, em nome e na posse do sujeito passivo de imposto.

 

6.22.  Adicionalmente, o direito à dedução do IVA está circunscrito à afectação, ainda que parcial, das despesas em causa em operações que confiram o direito a dedução, que se encontram elencadas no artigo 20º do Código do IVA e nos artigos 168º e 169 da Directiva 2006/112/CE, do Conselho, de 28 de Novembro de 2006 (adiante designada por Directiva IVA).

 

6.23.  De acordo com o previsto no artigo 20º, nº 1 do Código do IVA (Operações que conferem o direito à dedução), “só pode deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização (…)” nomeadamente de “transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas” e de “transmissões de bens e prestações de serviços que consistam em (…) operações isentas (…)” nos termos legalmente previstos.

 

6.24.  Por outro lado, estabelece a Directiva IVA, no se artigo 173º, nº 1 que, “no que diz respeito aos bens e aos serviços utilizados por um sujeito passivo para efetuar tanto operações com direito a dedução, referidas nos artigos 168º, 169º e 170º, como operações sem direito a dedução, a dedução só é admitida relativamente à parte do IVA proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações” (sublinhado nosso).

 

6.25.  Com efeito, uma entidade poderá, simultaneamente, realizar operações que conferem o direito à dedução a par de outras que não conferem esse mesmo direito, nomeadamente por se encontrarem isentas ou simplesmente não sujeitas, (designadamente, por não se encaixarem no conceito de “actividade económica” acima já referido).

 

Do exercício do direito à dedução por sujeitos passivos mistos

 

6.26.  Neste âmbito, preliminarmente, refira-se que, como escreve Rui Manuel Pereira da Costa Bastos (na obra já citada), “garante da neutralidade, princípio estruturante do sistema comum do (…) (IVA), o direito à dedução encontra-se condicionado à existência de uma relação direta e imediata entre os bens e serviços adquiridos (inputs) e as operações que, inserindo-se no perímetro do conceito de atividade económica, se encontram tributadas. A dedução será, no entanto, parcial caso aqueles inputs sejam mistos, isto é, simultaneamente afetos a operações tributadas ou operações não tributadas por se encontrem isentas de IVA ou, simplesmente, fora do seu campo de incidência. Nestas circunstâncias a dedução do IVA deverá ser proporcional às operações que conferem direito a dedução. Esta proporcionalidade, no caso particular dos vulgarmente denominados “sujeitos passivos mistos”, deverá ser aferida, numa perspetiva ex ante, em função do método da afetação real, assente numa separação contabilística tendo por referência critérios objetivos de repartição dos inputs, ou, numa perpsetiva ex post, no método da percentagem de dedução ou pro rata, que toma como referência os outputs de cada atividade, concretizando, o volume de negócios. (…)” (sublinhado nosso).

 

6.27.  No plano interno, decorre do disposto no artigo 23º, nº 1 do Código do IVA (Métodos de dedução relativa a bens de utilização mista) que, quando um sujeito passivo, no exercício da sua actividade, efectuar transmissões de bens e prestações de serviços, parte dos quais não confira o direito à dedução, o imposto suportado nas aquisições é dedutível apenas na percentagem correspondente ao montante anual das operações que dão lugar a dedução.

 

6.28.  Se confrontarmos a redação anterior do nº 1 do artigo 23º do Código do IVA com a actual redação [introduzida pela Lei nº 67-A/2007, de 31 de Dezembro – Lei do Orçamento do Estado para 2008 (LOE 2008)], verifica-se que foi intenção do legislador clarificar e restringir o âmbito de aplicação dos critérios de repartição do IVA pelas actividades de natureza mista.

 

6.29.  Com efeito, aqui acompanhando o autor e a obra já citados, da anterior redação daquele articulado resultava uma interpretação literal, à luz da qual o âmbito de aplicação do artigo 23º do Código do IVA se estendia a todos os bens e serviços adquiridos por sujeitos passivos mistos, mesmo que de afectação exclusiva a uma ou duas operações, remetendo-se para estas o método da imputação directa.

 

6.30.  Nestes termos, a consideração/limitação da dedutibilidade do IVA contido em despesas afectas exclusivamente a uma não operação (ou seja, operações que não resultam do exercício de uma actividade económica) ou na esfera do exercício de uma actividade económica, a sua afectação exclusiva a uma operação que confere o direito a dedução ou, alternativamente, a uma operação que não confere esse direito, deverá ser equacionada à luz do artigo 20º do Código do IVA, por via de uma imputação directa, e nunca do artigo 23º do mesmo diploma.[5]

 

6.31.  Desta forma, só ultrapassado o filtro do artigo 20º do Código do IVA, e apenas no caso de utilização indistinta de inputs a ambos os tipos de operações retratadas é que será equacionável a aplicação do artigo 23º daquele diploma.

 

6.32.  Neste âmbito, a condição de sujeito passivo misto restringe-se à utilização mista dos bens/serviços e não decorre propriamente do simples facto de determinado sujeito passivo exercer simultaneamente o direito a dedução em contraste com outras que não conferem esse mesmo direito.[6]

 

6.33.  Assim, no que diz respeito às metodologias propostas para efeitos da dedutibilidade do IVA suportado pelos sujeitos passivos mistos, a regra geral prevista, quer no artigo 173º, nº 1 da Directiva IVA, quer no artigo 23º, nº 1 do Código do IVA, aponta no sentido de ser utilizado o método de percentagem de dedução ou prorata a qual pode, contudo, ser afastada por aplicação do disposto no nºs 2 e 3 do artigo 23º do Código do IVA, ou seja, pela aplicação do método da afectação real.[7]

 

6.34.  Este método encontra-se previsto, como acima referido, no nº 2, do artigo 23º do Código do IVA, tendo o artigo 52º da LOE 2008 aditado à redação daquele artigo a expressão “(…) com base em critérios objetivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços em operações que conferem o direito a dedução em operações que não conferem esse direito

 

6.35.  “Nestes termos, este método de dedução coloca como premissa a existência de uma conexão direta e imediata entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução” (sublinhado nosso).[8]

 

6.36.  Assim, “(…) exige-se que a referida relação direta e imediata seja aferida em função do conteúdo objetivo do input (…) suportado, nada impedindo que a causa exclusiva da operação em causa possa também ser tida em conta como critério de determinação do referido conteúdo” devendo, “numa primeira fase, (…) aferir-se se a operação a montante sujeita a IVA apresenta uma relação direta e imediata com uma ou várias operações que confiram o direito a dedução, pressupondo o reporte do custo daquele, no preço de estas” e “subsequentemente, se tal não acontecer, deverá aferir-se se as despesas efetuadas para a aquisição de bens ou serviços a montante fazem parte das despesas gerais ligadas ao conjunto da atividade económica do sujeito passivo (…)”.[9]

 

6.37.  Consequentemente, verifica-se a possibilidade de deduzir a totalidade do imposto suportado na aquisição de bens e serviços destinados a actividades que dão lugar a dedução mas impedindo, simultaneamente, a dedução do imposto suportado nas operações que não conferem esse direito.[10]

 

6.38.  Com efeito, a redação do artigo 23º do Código do IVA é particularmente inovadora porquanto, “por via de uma expressa imposição legal, o IVA contido nos inputa simultaneamente afetos a uma atividade económica e a uma atividade não económica, deverão, obrigatoriamente, ser alvo de um rateio prévio por via da aplicação do método da afetação real (…)”.[11] [12]

 

6.39.  O factor primordial que caracteriza este método e que o distingue do método da percentagem de dedução ou prorata assenta na existência de um critério de aferição da percentagem do IVA dedutível inerente a inputs mistos, que traduza a real afectação destes, independentemente dos outputs associados às actividades que os integram.

 

6.40.  Contudo, nada obsta à utilização do método da afectação real em determinados inputs cuja natureza assim o permita, deixando o método do pro rata para outros consumos em que a aplicação desta metodologia não se mostre eficiente, nomeadamente, por um acréscimo de complexidade e de custos de cumprimento.

 

6.41.  Na verdade, é relevante assinalar que a utilização do método da afectação real exige especificidades de natureza contabilística porquanto é na separação contabilística que assenta o cálculo da proporcionalidade do IVA dedutível (autonomização de actividades, repartição dos custos indirectos, traduzidos em inputs mistos).

 

6.42.  Será assim inquestionável que é o método da afectação real que, potencialmente, melhor deverá transparecer o grau de utilização efectiva de um determinado input ao nível de actividade que conferem o direito à dedução, sem prejuízo de tal método poder representar um acréscimo no esforço de informação a prestar que corrobore os critérios de imputação utilizados e, consequentemente, as exigências de cariz contabilístico.

 

Das correcções efectuadas reflectidas nas liquidações controvertidas

 

6.43.  Neste âmbito, comecemos por referir que, é pacífico que a Requerente é, para efeitos de enquadramento em sede de IVA, um sujeito passivo misto (vide ponto 5.15., supra) porquanto, na prossecução das suas actividades estatutárias desenvolve acções com diferentes enquadramentos em termos de IVA, ou seja, pratica, em simultâneo, operações isentas sem direito à dedução e operações tributadas que conferem direito à dedução

 

6.44.  Como já referido, no âmbito das correcções objecto do pedido arbitral está em causa a adopção do método de dedução do IVA utilizado pela Requerente (método da afectação real) nas despesas que incorreu com a produção e distribuição de uma revista de natureza científica que, trimestralmente, é distribuída de forma gratuita aos seus associados efectivos.

 

6.45.  Com efeito, a Requerente reconhece no pedido arbitral que, tendo adoptado o método da afectação real, deduziu na totalidade o IVA suportado com os custos da revista (gráfica, papel, transporte e distribuição), por entender que estes estão na totalidade associados exclusivamente à venda de publicidade na revista que trimestralmente publica, dado que entende que esta publicação se trata de um instrumento de publicidade, que se traduz numa actividade isolável dentro do contexto da Requerente.

 

6.46.  Os SIT no RIT entenderam que “(…) a elaboração e distribuição da revista (…) em termos de operações ativas, engloba a venda de espaços publicitários no seu interior, atividade sujeita e não isenta de imposto mas também as quotas pagas pelos associados, destinatários da revista (…)” pelo que vieram os SIT e a Requerida defender que, para efeitos do “correto entendimento desta atividade em sede de IVA, o sujeito passivo deveria ter considerado rendimento da venda de publicidade, as quotas pagas pelos destinatários da revista e os encargos necessários à sua elaboração e distribuição”, pelo que concluíram que “considerando que estamos perante rendimento obtidos sujeitos a IVA, isentos e não isentos de imposto, o método de dedução correto a aplicar (…) deveria ter sido o método da percentagem de dedução ou pro rata” (sublinhado nosso).

 

6.47.Neste âmbito, entende este Tribunal Arbitral que assiste razão à Requerente quando refere que “(…) as quotas dos associados não têm (…) uma contrapartida, apenas se associa a uma vasta séria de direitos e de deveres de índole financeiro, social, participativo e cultura/científico (…)” e que, por isso, não faria qualquer sentido associar com a publicação da revista o valor das quotas.

 

6.48.  Com efeito, conforme matéria dada como provada no ponto 5.7., supra, decorre do artigo 6º dos Estatutos da Requerente que todos os associados (efectivos, agregados, correspondentes, honorários e beneméritos) têm direito a um conjunto mais ou menos vastos de direitos e iniciativas promovidas pela Requerente, das quais faz parte “receber as publicações científicas que a A... edita, designadamente ...”.

 

6.49.  Adicionalmente, de acordo com o referido nos Estatutos da Requerente resulta que, quer os associados efectivos, quer os associados agregados têm, entre outras obrigações (conforme decorre do disposto no artigo 7º dos referidos Estatutos), o dever de “contribuir (…) com a quota fixada em Assembleia Geral e com todas as contribuições votadas por este órgão (…)”.

 

6.50.  Contudo, os associados correspondentes, honorários e beneméritos, ainda que tenham direito a receber as publicações científicas que a A... edita (designadamente, a “...”), não estão sujeitos ao dever de “contribuir com a quota fixada em Assembleia Geral e com todas as contribuições votadas por este órgão” (vide ponto 5.12., supra), para além de não terem, tal como os associados agregados, o direito votar nas Assembleias Gerais e de eleger e ser eleitos para os órgãos sociais da A... (vide ponto 5.10., supra);

 

6.51.  Nestes termos, não se pode acompanhar a conclusão apresentada pela Requerida de que a distribuição da revista aos “sócios” (associados) é a (única) contrapartida da totalidade das quotas (devendo ter ponderação na percentagem de dedução do IVA), porquanto não só existem outras “contrapartidas” (direitos) garantidos aos associados, em função da sua natureza de associado, bem como existem associados (os correspondentes, os honorários e os beneméritos) que não pagam quota mas têm direito, de acordo com o referido nos Estatutos, a receber a referida revista.

 

6.52.  Logo, não se pode concluir, de forma directa, como faz a Requerida no artigo 79º da Resposta que “(…) a quota (…) tem como contrapartida o direito a receber a revista” porque há associados que não estão obrigados ao pagamento de quota e, ainda assim, tenham direito a receber a referida publicação (como é o caso, já acima referido, dos associados correspondentes, honorários e beneméritos).

 

6.53.  E, mesmo que assim não fosse, reitere-se, não seria possível considerar a atribuição da revista como única contrapartida do valor das quotas pagas pelos associados efectivos e associados agregados porquanto há outros direitos que, como já referido, lhes são atribuídos de acordo com os Estatutos.

 

6.54.  Assim, face ao acima exposto, acompanha-se a posição da Requerente quando refere que “(…) não existe qualquer sinalagma entre o valor (…) das quotas com o recebimento da revista”, pelo que decai o argumento invocado pela Requerida de que “(…) a edição da revista e subsequente distribuição aos sócios é obrigatória mas o benefício de associado é adquirido pelo pagamento de quotas” (considerando a Requerida que “(…) é consistente afirmar que a quota (…) seja, em parte ou na sua totalidade, afecto à edição e distribuição da revista”, não se vendo motivos para alterar, nos termos propostos pela Requerida, o método de dedução de IVA, de afectação real para pro rata.

 

6.55.  E, não tem razão a Requerida, quando afirma no artigo 83º da Resposta que “não tendo a Requerente logrado demostrar, com era sua obrigação (…) qual a parte das quotas que estava afecta a tal propósito, teve a Requerida de considerar as quotas na totalidade” porquanto, como referido em Acórdão do STA de 15-11-2017 (processo nº 0485/17), “(…) no âmbito do procedimento e do processo tributário o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da AT e dos contribuintes recai sobre quem os invoque (nº 1 do art. 342° do CCivil e nº 1 do art. 74° da LGT). Assim, (…), impende sobre a AT o ónus de provar a factualidade que a leve a proceder a correcções à matéria colectável declarada pelos sujeitos passivos. Ou seja, cabe à AT o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, como factos constitutivos de tal direito, em termos daquele princípio da legalidade, segundo a sua actual compreensão, entendido não como mero limite à actividade da administração mas como fundamento de toda a sua actividade, cabendo, por sua vez, ao contribuinte apresentar prova bastante da ilegalidade do acto, quando se mostrem verificados estes pressupostos. (...)” (sublinhado nosso).

 

6.56.  Nestes termos, sendo negativas as respostas a dar a cada uma das questões enunciadas nos pontos 6.2.1. a 6.2.4., supra, conclui este Tribunal Arbitral que os actos de liquidação de IVA e de juros compensatórios, objecto do pedido arbitral, enfermam de ilegalidade no que diz respeito à parte impugnada no presente pedido, sendo de considerar o pedido arbitral procedente e, nessa medida, serem tais actos parcialmente anulados (questão enunciada no ponto 6.2.5., supra).

 

Do pagamento dos juros indemnizatórios

 

6.57.  A par do pedido de declaração da ilegalidade das notas de liquidação de IVA anexadas ao processo, na parte impugnada, e do pedido de anulação dos respectivos juros, a Requerente peticiona ainda juros indemnizatórios, ao abrigo do disposto no artigo 43º da LGT.

 

6.58.  Não obstante o pedido de juros, a Requerente não fez prova do pagamento das referidas liquidações, nomeadamente, da parte aqui impugnada, ou seja, na parte que dizem respeito às correções efectuadas pelos SIT derivadas da não aceitação do método de dedução de IVA praticado pela Requerente.

 

6.59.Ora, de acordo com o disposto no artigo 43º da LGT, “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em (…) impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido” mas, no caso, não foi provado pela Requerente que tenha suportado esse pagamento (vide ponto 5.35., supra) (sublinhado nosso).

 

6.60.  Nestes termos, julga-se improcedente o pedido de pagamento de juros indemnizatórios.

 

Da responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais

 

6.61.  Nos termos do disposto no artigo 527º, nº 1 do CPC (ex vi 29º, nº 1, alínea e) do RJAT), deve ser estabelecido que será condenada em custas a Parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.

 

6.62.  Neste âmbito, o nº 2 do referido artigo concretiza a expressão “houver dado causa”, segundo o princípio do decaimento, entendendo que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.

 

6.63.  Nestes termos, tendo em consideração o acima exposto, a responsabilidade em matéria de custas arbitrais deverá ser imputada exclusivamente à Requerida.

 

7.       DECISÃO

 

7.1.    Nestes termos, tendo em consideração as conclusões apresentadas nos Capítulos anteriores, decidiu este Tribunal Arbitral Singular:

 

7.1.1.     Julgar procedente o pedido arbitral, na parte que diz respeito ao pedido de declaração de ilegalidade das notas de liquidação, na parte respeitante às correcções efectuadas, nos anos de 2014 e 2015, relativas à não aceitação do método de dedução de IVA praticado pela Requerente, no montante total de EUR 27.095,06;

7.1.2.     Julgar improcedente o pedido de pagamento de juros indemnizatórios;

7.1.3.     Condenar a Requerida no pagamento das custas do presente processo.

 

Valor do processo: Tendo em consideração o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC, artigo 97º-A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor do processo em EUR 27.095,06.

 

Nos termos do disposto na Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor das custas do Processo Arbitral em EUR 1.530,00, a cargo da Requerida, de acordo com o artigo 22º, nº 4 do RJAT.

 

*****

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 22 de Fevereiro de 2019

 

O Árbitro,

 

Sílvia Oliveira

 



[1] A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990, excepto transcrições efectuadas.

[2] Vide “O Direito à Dedução do IVA – O Caso Particular dos Inputs de Utilização Mista”, Cadernos IDEFF, nº 15, Almedina, pág. 86.

[3] Vide obra citada, pág. 87 e 88.

[4] Vide Acórdão do TCAS de 23-03-2017 (processo nº 20018/16.OBCLSB.

[5] Regra geral, nos termos do nº 1 do artigo 20º do código do IVA, para que seja possível o exercício do direito à dedução, é necessário que o imposto a deduzir tenha sido suportado em bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo, para a realização de operações sujeitos a imposto e dele não isentas. Nesta fase, de imputação directa, faz-se uma alocação directa dos inputs às actividades económicas a que se destinam, deduzindo-se a totalidade do IVA se esse input for consumido numa actividade que concede direito à dedução ou não se deduz qualquer parcela de IVA, caso a actividade em que esse input é consumido não confira esse direito. Trata-se portanto de uma regra de tudo ou nada, que deverá ser levada tão longe quanto tecnicamente for possível, como forma de obter resultados mais rigorosos e neutros sem distorções. No entento, podem subsistir alguns inputs utilizados, de forma indistinta ou simultânea, para o exercício de actividade que conferem e outras que não concedem o direito à dedução, casos esse em que não sendo possível estabelecer uma ligação aceitável entre as despesas e os rendimentos, é necessário utilizar a aplicação da norma contida no artigo 23º do Código do IVA [vide Luís Miguel Miranda da Rocha, in “O direito à dedução do IVA dos sujeitos passivos parciais e dos devedores de imposto parciais”, revista TOC 114, de Setembro de 2009 (adaptado).

[6] Esta interpretação foi mesmo objecto de clarificação por parte da AT no Ofício-Circulado nº 30103,
de 23-04, quando refere que “(…) a aplicação do artigo 23º se restringe à determinação do imposto dedutível relativo a bens e/ou serviços se utilização mista, ou seja, bens e/ou serviços utilizados conjuntamente em atividades que conferem o direito a dedução e em atividades que não conferem esse direito” (sublinhado nosso).

[7] De acordo com o teor do Ofício nº 30108, de 30-01-2009 e do Ofício Circulado nº 30103, de 23-04-2008, do Gabinete do Subdirector-Geral da área de Gestão do IVA, citado no Acórdão do STA nº 0485/17, de 15-11-2017, “(…) seguindo as regras do artigo 23° do CIVA, para apurar o imposto dedutível contido em bens e/ou serviços de utilização mista, aplica-se supletivamente o método da percentagem ou pro rata, excepto quando estejam em causa operações não decorrentes de uma actividade económica, caso em que é obrigatória a afectação real. Nos demais casos, a afectação real é facultativa podendo, no entanto, a Administração Tributária impor esse método de imputação quando a aplicação do pro rata conduza a distorções significativas na tributação (n° 3 art. 23°). 3. No caso de utilização da afectação real, obrigatória ou facultativa, e segundo o n° 2 do artigo 23°, o sujeito passivo para determinar o grau de afectação ou utilização dos bens e serviços à realização de operações que conferem direito a dedução ou de operações que não conferem esse direito, deve recorrer a critérios objectivos devendo, em qualquer dos casos, a determinação desses critérios objectivos ser adaptada à situação e organização concretas do sujeito passivo, à natureza das suas operações no contexto da actividade global exercida e aos bens ou serviços adquiridos para as necessidades de todas as operações, integradas ou não no conceito de actividade económica relevante. 4. Os critérios adoptados podem ser corrigidos ou alterados pela DGCI, com os devidos fundamentos de facto e de direito, ou, se for caso disso, fazer cessar a utilização do método, se se verificar a ocorrência de distorções significativas na tributação. (…)”.

[8] Vide autor e obra citada, pág. 160.

[9] Vide autor e obra citada, pág. 80 e 81 e nota de rodapé nº 5 desta decisão.

[10] De acordo com o teor da Informação Vinculativa proferida no âmbito do Processo nº A090 2002005 de 19 de Maio de 2015, “o método de afectação real não levanta quaisquer problemas, uma vez conseguida a identificação e separação de cada um dos tipos de operações”.

[11] Refira-se, neste âmbito, que “conforme jurisprudência do TJUE, as não operações ou operações inseridas fora do conceito de atividade económica são, desde logo, estranhas à Diretiva IVA, pelo que não poderão ter qualquer influência na delimitação do direito à dedução do IVA”.

[12] Neste âmbito, vide também Ofício Circulado nº 30103 de 23-04-2008, nos termos do qual se refere que as alterações ao artigo 23.º do CIVA introduzem elementos novos, essenciais para a determinação do quantum do imposto a deduzir, dos quais se destaca a referência expressa de que as suas regras se aplicam exclusivamente às situações em que os sujeitos passivos pretendem exercer o direito â dedução do imposto suportado na aquisição de bens e serviços de utilização mista”.