Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 324/2018-T
Data da decisão: 2019-01-22  IMI  
Valor do pedido: € 1.803,58
Tema: AIMI– Artigo 135.º-B, n.º 1 do CIMI - Inconstitucionalidade material.
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Decisão Arbitral

 

 

 

            O árbitro singular Dr. José Rodrigo de Castro, designado pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD para formar o Tribunal Arbitral Singular, que foi constituído por seu despacho de 19-09-2018, acorda no seguinte:

 

 

I - Relatório

 

A...- SOCIEDADE IMOBILIÁRIA, SA, Pessoa Coletiva n.º..., com sede na ..., ...-..., ...-... Porto, vem requerer a constituição de tribunal arbitral nos termos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”) e da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

O pedido apresentado pela Requerente foi aceite em 10/7/2018.

Não tendo indicado árbitro, o Tribunal Arbitral designou como árbitro, em 23/07/2018, o Dr. José Rodrigo de Castro.

Por Despacho do Senhor Conselheiro Presidente do Conselho Deontológico, de 19/09/2018, foi constituído o Tribunal Arbitral.

 

A Requerente pretende:

  1. a anulação do ato tributário de liquidação do AIMI - Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis com o nº... do ano de 2017, no valor global de € 1.803,58,
  2. a anulação do ato de indeferimento da Reclamação Graciosa apresentada contra aquela liquidação,

 

por se encontrar, em seu entender, ferida de ilegalidade, por inconstitucionalidade material do artigo 135.º-B, n.º 1, do CIMI, por violação dos princípios constitucionais da igualdade e da capacidade contributiva, vício que fundamenta.

Notificada a Requerida em 19/09/2018, para responder, nos termos do n.º 1 do artigo 17.º do RJAT, a AT fê-lo em 22/10/2018, que foi notificado à Requerente.

Na Resposta, a AT defende, como adiante se verá, a impossibilidade de desaplicação da norma legal em causa, apesar da invocada inconstitucionalidade.

Por despacho de 23/10/2018, o tribunal dispensou a reunião a que se refere o artigo 18º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), por entender desprovida de utilidade e as partes convidadas a alegar por escrito, facultativamente, no prazo de 10 dias, de forma sucessiva, Requerente e Requerida, tendo o Tribunal designado o dia 31/12/2018 para prolação da decisão.

O Tribunal procedeu à notificação do referido Despacho, quer à AT quer à Requerente, em 23/10/2018, não tendo qualquer das partes apresentado alegações até final do prazo concedido.

SANEAMENTO

Assim sendo, porque:

O Tribunal Arbitral é materialmente competente e foi regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º e 6.º, n.º 1, do RJAT, por decisão de 19-09-2018, do Presidente do Conselho Deontológico do CAAD;

As partes são legítimas e gozam de personalidade e capacidade judiciárias (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas;

Por despacho de 23-10-2018 foi dispensada a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT e decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas, querendo.

É suscitada a impossibilidade de a AT aplicar uma norma legal com fundamento na sua inconstitucionalidade material (em concreto do artigo 135.º-B, n.º 1, do CIMI), na medida em que viola o princípio da igualdade tributária consagrado nos artigos 13.º e 104.º, n.º 3 da CRP, ou seja, defende a Requerente que aquela norma deve ser desaplicada, mas não com a natureza de exceção perentória, o que importará oportunamente esclarecer.

Este Tribunal tem competência e encontra-se, portanto, em condições de apreciar qualquer vício que a Requerente suscite, inclusive, o da ilegalidade do ato de tributação em causa, por inconstitucionalidade da norma aplicável.

O processo não enferma de nulidades.

II – OS FACTOS

II – 1 – Factos provados

Os factos dados como provados são os seguintes:

a) A Requerente A... é uma sociedade anónima que desenvolve a sua atividade no setor imobiliário[1].

b) Detém nos seus ativos, à data de 29/08/2017, os seguintes prédios, cf. Doc. 2, alegadamente destinados exclusivamente ao exercício da sua atividade económica:

            1. Prédio urbano em Propriedade Total, sem andares nem divisões suscetíveis      de utilização independente, inscrito na matriz da freguesia de ..., concelho de ..., distrito do Porto, sob o artigo ..., com o VPT atual de € 11.421,33.

            2. Prédio urbano em Propriedade Total, sem andares nem divisões suscetíveis      de utilização independente, inscrito na matriz da freguesia de ..., concelho de ..., distrito do Porto, sob o artigo ..., com o VPT atual de € 8.435,63.

            3. Prédio urbano em Propriedade Total, sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, inscrito na matriz da freguesia de ..., concelho de ..., distrito do Porto, sob o artigo ..., com o VPT atual de € 17.523,38.

            4. Terreno para Construção, com a área total de 5.448,000 m.2 e área bruta de construção de 2.040,000m.2, inscrito na matriz urbana da freguesia de ..., concelho de..., distrito do Porto, sob o artigo ..., com o VPT atual de € 135.225,63, com tipo de coeficiente de localização: indústria[2].

            5. Parcela de Terreno destinada a Construção Urbana, com a área total de     7.132,000 m.2 e área bruta de construção de 3.566,000m.2, inscrito na matriz     urbana da freguesia de ..., concelho de ..., distrito do Porto, sob o artigo..., com o VPT atual de € 225.910,00, com tipo de coeficiente de localização: Habitação[3].

            6. Prédio urbano em Propriedade Total, sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, inscrito na matriz da freguesia de ..., concelho e distrito do Porto, inscrito na matriz sob o artigo..., com o VPT atual de € 52.380,00.

c) O VPT total dos imóveis antes descritos é de € 450.895,97, a que aplicada a taxa de 0,40 do artigo 135-F, n.º 1 do CIMI, na redação dada pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, resultou uma liquidação com o n.º 2017 ...e com a data de 30-07-2017, no valor de AIMI de € 1.803,58.

d) Apenas o Terreno para construção referido em 4. tem como tipo de coeficiente de localização: a indústria[4].

e) A Requerente foi notificada, presuntivamente em 30/08/2017, para pagamento do imposto durante o mês de setembro, sendo também informada de que poderia reclamar ou impugnar nos termos e prazos estabelecidos no art.º 129.º do CIMI e art.ºs 70.º e 102.º do CPPT, cf. doc. 3.

f) A Requerente procedeu ao respetivo pagamento em 29/09/2017, cf. doc. 3.

g) Em data não precisada nos autos, a Requerente apresentou Reclamação Graciosa, que foi objeto de apreciação, tendo sido proferido Projeto de Despacho de Indeferimento, que lhe foi notificado em 5/03/2018, para o exercício do direito de audição prévia, nos termos do artigo 60.º da LGT, conforme ofício n.º 2018... .

h) Por não ter exercido o seu direito de audição, foi proferido despacho definitivo de indeferimento da Reclamação Graciosa em 29/03/2018, pelo Chefe de Finanças do ..., por deleção do Senhor Diretor de Finanças do Porto, conforme despacho n.º .../2017, publicado no DR n.º 62, II Série, de 28/03/2017.

i)  Do referido despacho de indeferimento definito, foi a Requerente notificada por carta registada com AR, datada de 6/04/2018, na pessoa do seu mandatário, informando-o de que poderia recorrer hierarquicamente no prazo de 30 dias nos termos do n.º 2 do art.º 66.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) ou impugnar judicialmente no prazo de três meses, como previsto ao art.º 102.º, também do CPPT, a contar da data em que se concretizou a notificação, nos termos do n.º 3 do art.º 39.º do CPPT. Foi-lhe remetida a fundamentação da decisão, nos termos do art.º 77.º da Lei Geral Tributária (LGT), tudo conforme doc. 1. anexo à PI.

j) Com data de 09/07/2018, foi a petição de impugnação arbitral enviada ao Tribunal Arbitral, que a aceitou em 10/07/2018, pelo que se considera atempadamente apresentada, face ao disposto nos artigos 38.º, 3 e 39.º, n.º 1 da LGT e, bem assim da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT.  

 

II – 2 – Fundamentação do julgamento sobre os factos provados

Os factos dados como provados resultam da convicção do tribunal, assente no exame crítico dos documentos juntos ao processo, o que tudo aqui se dá por reproduzido

 

III - DO DIREITO

 

III.1 Da impossibilidade de desaplicação pela AT de norma legal com fundamento em inconstitucionalidade

 

1. Alega a Requerente que nos casos em que se faça incidir o AIMI sobre a propriedade de imóveis destinados ao exercício de uma atividade económica, e na medida em que a norma de incidência se encontra destituída de qualquer fundamento bastante, deve ser desaplicado o artigo 135.º-B. n.º 1 do CIMI por inconstitucionalidade material, na medida em que viola o princípio da igualdade tributária consagrado nos artigos 13.º 104.º, n.º 3 da CRP.

2. Mais alega que esta tributação não atende à diferente capacidade contributiva dos proprietários dos prédios sobre os quais incide, atingindo indiscriminadamente contribuintes com e sem força contributiva necessária para o suportar.

3. Sobre esta questão argumenta a Requerida que, independentemente dos vícios de eventual inconstitucionalidade assacados pela Requerente, a AT encontra-se obrigada a atuar, nos termos do n.º 2 do artigo 266.º da CRP, em conformidade com o princípio da legalidade.

4. E que este princípio se mostra concretizado a nível infraconstitucional no n.º 1 do artigo 3.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA).

5. Este princípio determina que a AT (e outros órgãos da Administração Pública) "devem atuar em obediência à lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhe estejam atribuídos e em conformidade com os fins para que os mesmos poderes lhes foram conferidos".

6. Suscitando-se dúvidas de constitucionalidade de uma ou mais normas, compete aos Tribunais, nos termos do artigo 204.º da CRP, a fiscalização da inconstitucionalidade invocada ou detetada, no âmbito da fiscalização difusa e concreta de normas cuja conformidade constitucional sejam chamados a verificar.

7. Trata-se de matéria suficientemente esclarecida através de vários Pareceres da PGR, designadamente os citados pela Requerida, e, por todos, o Parecer n.º 16/92, segundo o qual: "sendo a declaração de inconstitucionalidade de uma norma com força obrigatória geral da competência do Tribunal Constitucional, a Administração deve obediência à norma enquanto tal vício não for declarado".

 

Assim sendo, também este Tribunal entende que a Administração Tributária não tem, em princípio, competência para aferir da constitucionalidade ou não de qualquer norma fiscal, e muito em particular no caso em apreço, por se tratar de matéria exclusiva dos Tribunais, como Órgão de um Estado de Direito, a quem compete dirimir os conflitos de interesses públicos e privados e, portanto, fazer Justiça, no âmbito do seu poder jurisdicional.

Donde, ainda que possam oferecer-se-lhe dúvidas de constitucionalidade, não pode a Autoridade Tributária recusar a sua aplicação, porquanto está sujeita ao princípio da legalidade, conforme disposto nos artigos 266.º, n.º 2 da CRP,  3 n.º 1 do CPA e 55.º da LGT, não sendo, por isso, que a liquidação do AIMI em causa se mostra ferida de ilegalidade.

 

III.2 - DOS FUNDAMENTOS EM GERAL DA REQUERENTE:

 

1. Alega a Requerente na sua PI, que a liquidação de AIMI viola "dois princípios basilares da Constituição Portuguesa, padecendo o artigo 135-º-B, n.º 1 do CIMI de inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade, na sua vertente da capacidade contributiva, bem como por violação do princípio da proporcionalidade".

2. Tal como se tratou em III.1, mais refere a Requerente que, em face disso, "o artigo 135.º-B n.º 1 do CIMI deverá ser desaplicado pela AT, atenta a sua inconstitucionalidade material, com os sobreditos fundamentos, na medida em que incide sobre imóveis detidos por empresas que prosseguem uma atividade imobiliária…".

3. E ainda que assim não se entendesse, mormente caso não se divisasse uma inconstitucionalidade material do referido preceito, com a incidência sobre imóveis detidos por empresas que prosseguem uma atividade imobiliária, afigura-se-lhe que seria clara e incontornável a inconstitucionalidade material, sob os mesmos pressupostos e com os mesmos fundamentos, "na medida em que se aplicasse a terrenos para construção, em face da isenção de prédios urbanos classificados como 'comerciais'".

4. A Requerente faz também uma retrospetiva histórico-legislativa da criação deste imposto (desde o Imposto do Selo ao atual AIMI) e dos seus fundamentos, designadamente a intenção do legislador de tributação da acumulação de património imobiliário habitacional de muito elevado valor, conforme Proposta do OE/2017, com a finalidade de alargar a base de financiamento da Segurança Social, a quem o imposto é consignado.

5. Donde resultou o aditamento dos artigos 135º-A a 135.º-K ao Código do IMI, no qual se mostra vertido o regime do AIMI, e a criação portanto deste imposto, com a configuração de um imposto complementar ao IMI, com o fito de tributar a "acumulação de património imobiliário habitacional de muito elevado valor".

 6. Na sua PI, a Requerente salienta que o disposto no n.º 2 do artigo 135.º-B do CIMI, que estabelece que: "são excluídos do adicional ao imposto municipal sobre imóveis os prédios urbanos classificados como 'comerciais', industriais ou para serviços' e 'outros', nos termos das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 6.º deste Código".

7. E conclui que do aludido preceito decorre que o "AIMI incide sobre os imóveis com afetação habitacional, bem como os terrenos para construção, independentemente da sua afetação - na medida em que os mesmos não constam expressamente na norma de delimitação negativa da incidência". (artigo 17.º da PI)

8. A Requerente faz alusão à anterior tributação do património imobiliário de luxo, em sede do Imposto do Selo, que continha muitas falhas e padecia de alguns vícios, que, em seu entender, continuam a verificar-se no AIMI, sobretudo relativamente aos imóveis essenciais na obtenção de rendimento no âmbito da atividade económica.

9. E entende que, em face disso, a norma do AIMI do n.º 2 do artigo 135.º-B do CIMI viola o princípio da igualdade, concretizado na sua vertente da capacidade contributiva, conforme Jurisprudência já firmada (no âmbito da tributação em Imposto do Selo e agora em AIMI).

10. Realça a este respeito que a AT, ciosa de obtenção de receita, propôs o aditamento à lei de uma norma de incidência do Imposto do Selo sobre "terrenos para construção".

11. E considera que o legislador pretendeu tributar, desde logo, em sede de Imposto do Selo, tão só "os prédios urbanos habitacionais", ou seja, as edificações de elevado valor patrimonial.

12. E é por força desta desvirtuação legal que a tributação, segundo a Requerente, deixou de ser justa e equitativa, para passar a ser, "injusta e profundamente desigual", por "violação dos mais basilares cânones da igualdade, proporcionalidade e capacidade contributiva".

13. E é pelo facto de violar o princípio da igualdade, segundo a Requerente, diretamente decorrente do texto constitucional e paradigma do Estado de Direito, que a tributação em causa é inconstitucional.

14. Cita o Acórdão do Tribunal Constitucional  n.º 590/2015, para realçar o princípio da igualdade, como limite à discricionariedade legislativa, defendendo que não exige tratamento igual de todas as situações, implicando que sejam tratados igualmente os que se encontrem em situações iguais e desigualmente os que se encontram em situações desiguais, de maneira a não serem criadas discriminações arbitrárias e irrazoáveis, porque carecidas de fundamento material bastante.

15. Remete também para os n.ºs 1 e 2 do artigo 5.º da LGT - Lei Geral Tributária, que concretiza o princípio da igualdade, e de que dele se retira a conclusão de que este princípio proíbe o estabelecimento de distinções desprovidas de uma justificação objetiva e racional.

16. Daí que, no entender da Requerente, todo o referido implica, necessariamente, avaliar a legalidade do AIMI, ponderando a admissibilidade desta tributação à luz dos princípios fundamentais que regem o sistema fiscal.

17. E conclui no sentido de que, no caso das sociedades comerciais deste tipo, a propriedade dos terrenos para construção, consiste no "substrato patrimonial da sua actividade económica" e na possibilidade de gerar rendimento, falhando, deste modo, o pressuposto da manifestação de uma acrescida capacidade contributiva, que, por si só, "deva ser sujeita a ablação pela via tributária".

18. E destaca, em abono da sua tese, o seguinte excerto da Decisão Arbitral n.º 507/2015-T:

  "É inequívoco que as empresas que se dedicam à comercialização de terrenos para construção ficam com uma oneração adicional significativa em relação à generalidade das empresas, com base num hipotético índice de capacidade contributiva que não tem necessariamente correspondência com a realidade, pois a imposição da tributação não tem qualquer relação com o rendimento real da atividade desenvolvida pela empresa e onera-as mesmo que tenham resultados negativos, acentuando-se a tributação, cumulada anualmente, precisamente em situações em que, por inêxito da actividade de comercialização, os terrenos são detidos por vários anos          e, por isso, menos justificação haveria para a imposição de uma tributação adicional, privativa deste tipo de empresas.

Por isso, também desta perspetiva, o AIMI materializa uma discriminação negativa injustificada das empresas comercializadoras de terrenos paraconstrução, o que implica a sua inconstitucionalidade material, por ofensa ao        princípio da igualdade."[5]

19. A Requerente realça também que é isso que acontece com a sua atividade económica, mantendo os terrenos para construção que detém no seu ativo circulante, durante vários anos, por razões de diversa ordem (mercado, financiamento, obtenção de licenças, etc.), até neles poder incorporar as edificações.

20. E enquanto isso não acontece, a tributação ora feita em AIMI, durante vários anos, provoca um efeito agravado de descapitalização, com deterioração, porventura decisiva, das condições económicas da sua empresa.

21. E realça também que, "o que é especialmente mais gravoso, sem que exista qualquer nexo da causalidade percetível e materialmente justificado entre a capacidade contributiva manifestada pela propriedade desses terrenos, e o pagamento de um imposto que, de forma vaga e genérica, diz reforçar a 'progressividade global do sistema'."

22. E esta situação cria uma gritante desigualdade no plano material entre empresas que prossigam uma atividade económica, umas com detenção de terrenos para construção e outras não.

23. Segundo a Requerente, "mais do que isso, estão legalmente criadas para a constituição de manifestas situações de desigualdade material entre a impugnante e empresas que, detendo bens imóveis, prossigam nos mesmos uma atividade comercial, industrial ou de prestação de serviços".

24. E põe em evidência o facto de que "com o ato tributário em causa, o sector da construção é o único sector de atividade tributado pela propriedade dos bens que estão no seu inventário", com a agravante de que "o valor considerado para aplicação do imposto não é um custo efetivo de produção, apurado e registado na contabilidade, mas sim o VPT determinado para efeitos fiscais".

25. Para além de que os imóveis detidos pelas empresas que prosseguem atividades imobiliárias "não correspondem a um qualquer património imobiliário de luxo", mas a bens que podem ser vendidos ou eventualmente destinados a construção.

26. Mais refere que a Exposição de Motivos que configurou a versão final deste imposto, visava assegurar a ausência de impacto na atividade económica.

27. E que é nessa medida que "a tributação em causa constitui uma violação dos princípios da capacidade contributiva, da igualdade e da proporcionalidade - na medida em que o facto de a impugnante ter no seu inventário imóveis para construção ou venda, em nada exterioriza uma relevante capacidade contributiva digna de ser (diferente e autonomamente) tributada".

28. São citados ainda excertos de outros dois Processos Arbitrais, em reforço da sua tese.

29. Assim, cita a Decisão Arbitral n.º 150/2017-T, na parte em que nela se refere que:

"Ao reunir na mesma verba a tributação de casas de luxo e de terrenos para construção, no pressuposto de que ambos se subsumem genericamente à categoria de bens imóveis de elevado valor patrimonial tributário, a norma cuja validade se discute confundiu manifestações de riqueza com fatores de produção dessa mesma riqueza.

Ora, na verdade, não pode com seriedade formular-se um juízo sobre a   capacidade contributiva de uma empresa que prossegue uma atividade económica na base dos fatores de produção nela empregues. É nítida a intenção legislativa de incrementar no esforço de consolidação orçamental o contributo dos mais favorecidos, dos que evidenciam uma maior capacidade contributiva. Não reside neste aspeto a censura constitucional. Ela existe, sim, quando o legislador encara o processo produtivo de uma empresa, mais propriamente os fatores de produção, como manifestação dessa capacidade contributiva".[6]

30. Remete também para o processo arbitral n.º 668/2017-T, do CAAD, citando a seguinte  passagem do Ilustre Senhor Conselheiro Jorge Lopes de Sousa:

"(…) a adoptar-se uma interpretação literal desta norma, com o sentido de todos os terrenos para construção estarem abrangidos pela incidência do        AIMI, ela será materialmente inconstitucional, sendo incompaginável com oprincípio da igualdade (artigo 13.º da CPR), ao considerar facto tributário a titularidade de terrenos para construção de prédios destinados a serviços e não a titularidade dos prédios neles construídos, por consubstanciar um          tratamento desprivilegiado dos contribuintes que se encontram na primeira situação, sem justificação material, pois é necessariamente menor a capacidade contributiva indiciada pelo património imobiliário nessa situação, que terá de estar presente, e com aumento, na segunda".           

31. E em reforço da sua tese, a Requerente cita ainda, da decisão proferida no Processo Arbitral n.º 507/2015-T, o seguinte excerto:

"…não se pode considerar que exista indício seguro de superior capacidade contributiva quando se está perante a titularidade de direitos sobre edifícios ou frações destinados ao exercício de atividades económicas (comerciais, industriais, prestação de serviços ou afins), pois eles têm de ser adequados ao funcionamento das respetivas empresas, não sendo a sua dimensão e correlativo valor um indício de nível de riqueza correspondente aos 'padrões mais elevados da sociedade portuguesa'."

32. Donde, conclui a Requerente, que "ao incidir sobre a propriedade de imóveis destinados ao exercício de uma atividade económica, e na medida em que se encontra completamente destituída de qualquer fundamento bastante, deve ser desaplicado o artigo 135.º-B, n.º 1 do CIMI por inconstitucionalidade material, na medida em que viola o princípio da igualdade tributária consagrado nos artigos 13.º e 104.º, n.º 3 da CRP".

E que, portanto, devem ser declaradas ilegais a decisão proferida na Reclamação Graciosa e a liquidação impugnada.

33. E fundamenta-se ainda, em reforço da sua tese, na Jurisprudência do Tribunal Constitucional[7] quando refere que:

"(…) só podem ser censuradas, com fundamento em lesão do princípio da igualdade, as escolhas de regime feitas pelo legislador ordinário naqueles casos em que se prove que delas resultam diferenças de tratamento entre as pessoas que não encontrem justificação em fundamentos razoáveis,percetíveis ou inteligíveis, tendo em conta os fins constitucionais que, com a medida de diferença, se prosseguem".

34. Argumenta a Requerente que é o que acontece no caso dos autos, em razão de não existir "qualquer fundamento material minimamente percetível, racional e razoável para propugnar uma discriminação negativa, a nível fiscal, das empresas proprietárias de terrenos para construção, que utilizam os mesmos na prossecução da sua atividade, relativamente a outras empresas proprietárias de imóveis com o mesmo ou superior valor e isentas de tributação porque afetas a outra atividade".

35. E conclui, face a toda a argumentação expendida, que a liquidação ora em apreciação viola o princípio da igualdade fiscal previsto no artigo 13.º da CRP e o princípio da capacidade contributiva previsto no artigo 104.º da CRP,

36. Porquanto:

            - se baseia numa norma que trata de forma bem diferente contribuintes que se encontram em situações idênticas, não sendo a medida da diferença aferida pela sua real capacidade contributiva; e

            - se baseia numa norma arbitrária e desprovida de fundamento material percetível ou racional e

37. Que, por tudo isso, em seu entender, o artigo 135.º-B n.º 1 do CIMI deverá ser desaplicado pelo Tribunal, atenta a sua inconstitucionalidade material.

38. Para além de que, se afigura à Requerente, ser clara e incontornável, pelo menos, a inconstitucionalidade material do preceito, sob os mesmos pressupostos e com os mesmos fundamentos, na medida em que se aplicasse a terrenos para construção, em face da isenção de prédios urbanos classificados como comerciais,

            - determinando a anulação da liquidação impugnada. 

 

III.3 - DA FUNDAMENTAÇÃO EM GERAL DA REQUERIDA

1. A AT em sede de Resposta, confirma os factos, designadamente a propriedade dos de todos os prédios antes descritos, no total de seis, conforme discriminação feita no Ponto II.I, lembrando que apenas o terreno para construção inscrito na matriz da freguesia de ... sob o artigo..., tem um coeficiente de localização inerente à indústria.

2. Assim sendo e face à tipologia dos prédios em causa, diz a Requerida que "todos cabem no âmbito da incidência objectiva consagrada no n.º 1 do artigo 135.º-B do Código do IMI, não lhes sendo aplicável a exclusão constante do n.º 2[8] do mesmo preceito".

3. E porque se constata, segundo a Requerida "que os prédios em causa não estiveram isentos de IMI no ano de 2016, os respetivos valores patrimoniais tributários são contabilizados para a soma referida no n.º 1 do artigo 135.º-B, conforme assim dispõe o n.º 3 do artigo 135.º-C".

4. Donde, ainda segundo a AT, "considera-se que a liquidação do AIMI em causa observa todos os condicionalismos legais à sua validade jurídica".

5. Relativamente ao que concerne ao AIMI incidente sobre prédios urbanos, de que sejam proprietários pessoas coletivas e estruturas equiparadas (Artigo 135.º-A, nº2 do CIMI), defende a Requerida que o imposto assume a natureza de imposto real, na medida em que a modelação do quantitativo a pagar abstrai da dimensão económica das entidades e não atinge a totalidade do património líquido.

6. A Requerida AT, reforça a sua fundamentação com um excerto da seguinte parte da obra de José Maria Pires:

"Assim, relativamente a pessoas colectivas, o AIMI não se destina, na verdade,   a tributar as entidades com mais elevados índices de riqueza, porque se tributam todos os valores patrimoniais sujeitos, sem limite mínimo nem qualquer dedução. Também, por essa razão, o AIMI que incide sobre as pessoas colectivas se aproxima mais de um imposto geral sobre o património          imobiliário." (cf. JOSÉ MARIA PIRES, in O Adicional ao IMI e a tributação pessoal do património, Almedina, 2017, p.42)".

 7. É, por isso, argumenta a Requerida, que no respeitante às pessoas coletivas, o AIMI tem natureza de tributação real, "reflectindo, desta forma a ideia de que os elementos integrantes do património imobiliário detido por estas entidades desempenham, em regra, uma função económica, não representado, por isso, uma mera acumulação de riqueza."

8. E a Requerida afirma que o enquadramento em que se moveu o legislador, ao configurar o âmbito da incidência subjetivo e objetivo, balizando as suas opções também com a finalidade de mitigar o impacto desta imposição sobre o exercício empresarial das atividades económicas em geral, através da exclusão dos prédios urbanos com fins industriais, comerciais e de serviços, e "outros" (…) "com o propósito de não onerar em termos fiscais a competitividade das empresas, especialmente, nos mercados internacionais (…) (cf. JOSÉ MARIA PIRES, O Adicional ao IMI e a tributação pessoal do património, Almedina, 2017, p. 50)."

9. Sobre a alegada violação dos princípios constitucionais da igualdade e da capacidade, a Requerida responde nos termos e com os fundamentos que se seguem.

10. Concorda a AT ser o princípio da igualdade um dos princípios estruturantes do sistema constitucional, consagrado genericamente no art.º 13.º da CRP, que cita.

11. No entanto, refere que a vinculação das autoridades administrativas a este princípio da igualdade encontra consagração no art.º 266.º, n.º 2 do mesmo diploma fundamental.

12. Por outro lado, realça que o disposto no art.º 104.º, n.º 3, também da CRP, que dispõe que "A tributação do património deve contribuir para a igualdade dos cidadãos".

13. Ainda relativamente ao referido preceito constitucional, diz a Requerida que "a doutrina previne que o princípio da igualdade, no que concerne ao património, tem de ser interpretado com restrição, no sentido de que não envolve um particular e autónomo conteúdo jurídico do princípio da igualdade".

14. E em reforço do conteúdo doutrinal, a Requerida cita os seguintes autores:

a) Américo Brás Carlos, in Impostos- Teoria Geral, 4.ª edição, Coimbra, 2014, p.172:

"…como não se concretiza o instrumento a usar para prosseguir a tal igualdade, nem a igualdade tributária é sempre sinónimo de aplicação de progressividade ou de outro mecanismo específico, a norma não tem utilidade."

b) Xavier de Basto, in "A constituição e o sistema fiscal, revista de Legislação e Jurisprudência, ano 138 (2009), p. 282, lembra que:

"[o] n.º 3 do art.º 104.º sobre tributação do património é hoje totalmente inócuo, não mais de que uma declaração de princípio, nem sequer muito sonora".

c) José Casalta Nabais, in Direito Fiscal, Almedina; 2012, 7.ª Edição, pág. 155, para além de fundamentar e ter como corolário o princípio da capacidade contributiva, também se projeta no princípio da justiça:

"[…] o princípio da igualdade fiscal tem sempre ínsita sobretudo a ideia de generalidade ou universalidade, nos termos da qual todos os cidadãos se encontram adstritos ao cumprimento do dever de pagar impostos, e da uniformidade, a exigir que semelhante dever seja aferido por um mesmo critério - o critério da capacidade contributiva. Este implica assim igual imposto para os que dispõem de igual capacidade contributiva (igualdade horizontal) e diferente imposto (em termos qualitativos e quantitativos) para  os que dispõem de diferente capacidade contributiva na proporção dessa diferença (igualdade vertical)".

d) E cita também Sérgio Vasques, in Manual de Direito Fiscal, Almedina, 2011, p. 248, que adverte o seguinte a este mesmo propósito:

"Como sucede noutros domínios, o princípio da igualdade tributária pode resumir-se na fórmula segundo a qual se deve 'tratar de modo igual o que é igual e de modo diferente o que é diferente', sendo esta uma fórmula que se decompõe        em dois elementos essenciais: (a) a igualdade ou diferença das realidades a tratar e (b) a igualdade ou diferença do tratamento que lhes é dispensado. O segundo elemento, o da igualdade de tratamento, possui conteúdo meramente       descritivo e é o mais simples de concretizar, podendo dizer-se que há igualdade de tratamento quando duas situações ficam sujeitas à mesma estatuição legal. O primeiro elemento, o da igualdade de situações, encerra já conteúdo normativo e mostra-se sempre difícil de concretizar, visto que a relação de igualdade entre duas situações exige um juízo de comparação e a escolha de um critério             distintivo relevante para o efeito."

E acrescenta ainda este autor:

"[…] 'o tratar de modo igual o que é igual' possui um significado diverso conforme as categorias dos tributos públicos a que nos refiramos. Assim sendo, o princípio da igualdade tributária há-de concretizar-se olhando aos contornos das diferentes espécies tributárias e identificando os critérios derepartição que melhor se lhes adequam, isto é, confrontando o objecto e o critério de repartição, sendo que o critério de repartição que se afigura materialmente adequado ao efeito é o critério da capacidade contributiva".

E a Requerida volta a este autor, que remete ainda, a pág. 253 do Manual referido, a propósito da comparação de capacidades contributivas, em ordem a determinar a observância do princípio da igualdade tributária, que pressupõe apelar, no âmbito da tributação do património, para um imposto geral ou sintético sobre o património, um indicador que, segundo este autor:

"pode espelhar a força económica dos contribuintes",

Acrescentando que:

"[…] o melhor indicador da força económica dos contribuintes está no seu rendimento e não tanto no património, como sucedia noutros tempos. E nos sistemas fiscais contemporâneos são os impostos sobre o rendimento que melhor          permitem atender à condição pessoal dos contribuintes […]. Um dos corolários elementares do princípio da capacidade contributiva está, por isso, na exigência de que os impostos pessoais sobre o rendimento constituem o centro do sistema             fiscal, uma ideia espelhada na ordem pela qual se enunciam os diferentes impostos no artigo 104.º da Constituição Portuguesa."

e) Neste âmbito dos doutrinadores, a Requerida cita também J.L. SALDANHA SANCHES (Manual de Direito Fiscal, Coimbra Editora, 2007, 3.ª edição, p. 212: que afirma:

"Da escolha de certos objectos como factos tributários pode resultar o arbítrio   fiscal. Isto porque esta escolha pode implicar a oneração excessiva de um determinado grupo de contribuintes ou o privilégio fiscal com a desoneração efectiva de outros grupos - tudo como resultado direto da previsão legal ou, então, como resultado prático da sua aplicação."

 E a respeito do princípio da igualdade afirma ainda este autor:

" Não significa isto que a lei deve garantir, na sua aplicação, um resultado igual para cada um dos destinatários: significa antes que a diferenciação dos resultados deve corresponder à efectiva diferença existente entre os destinatários. A diferenciação dos resultados deve ser uma função da situação concreta de cada contribuinte e constituir, deste modo, uma diferenciação que é objecto de tutela específica pela ordem jurídica."

15. Entende a Requerida, a propósito da invocação da inconstitucionalidade do regime do AIMI pela Requerente, por violação do princípio da igualdade (art.º 13.º da CRP) e da capacidade contributiva (art.º 104.º, n.º 3 da CRP), com fundamento na discriminação negativa das empresas que se dedicam à atividade imobiliária relativamente às demais empresas, que a Requerente não tem qualquer fundamento legal para tal.

16. E ainda quanto à invocação da Requerente, (cf. artigos 135.º e 136.º da PI), da dita inconstitucionalidade por o AIMI incidir sobre todos os terrenos para construção, mesmo que estejam destinados a fins comerciais, industriais e de serviços,

17. A Requerida argumenta que, "por várias ordens de razão, das normas consagradas não resultam diferenças injustificadas de tratamento entre contribuintes ao arrepio daqueles princípios constitucionais",

Justificando, em primeiro lugar:

18. Com o antes exposto relativamente à aplicação dos princípios constitucionais invocados, decorre, à luz dos mesmos, que as escolhas subjacentes à delimitação da incidência objetiva do AIMI, são efetuadas dentro da margem de "liberdade de conformação legislativa".

19. Invoca a Requerida a teleologia do imposto, segundo a qual se interpreta, face a tudo o que se vem expondo, que o AIMI visa, primeiramente, "atingir uma parcela do património dos respectivos sujeitos passivos, incidindo sobre os bens imóveis  constitutivos de um património, reconhecível juridicamente como capital de uma determinada entidade (singular ou colectiva), independentemente de o mesmo estar afecto a qualquer processo produtivo ou gerador de rendimentos".

20. E sublinha que "o legislador optou no n.º 2 daquele preceito[9] por uma delimitação negativa da incidência, excluindo do AIMI imóveis que, pela sua potencial afectação, podem ser economicamente reconhecidos como factores de produção, a título de capital, ou seja, como bens intermediários que, conjugados com os demais factores de produção, produzem novas utilidades - bens económicos que satisfazem necessidades".

21. E mais refere que, "para o efeito, recorreu a um critério que convoca a estrutura de tipologias de prédio urbano previstas no artigo 6.º do Código do IMI e que opera através da subtracção ao AIMI dos prédios urbanos que, fruto do licenciamento de utilização declarado pelos municípios ou, na sua falta, do respectivo destino normal, são reconhecidos às tipologias das alíneas b) e d)[10] do n.º 1 daquele preceito".

22. Donde, segundo a Requerida, "o universo de prédios urbanos sujeitos a AIMI é apurado por recurso às restantes duas tipologias constantes do n.º 1 do artigo 6.º, i.e. prédios urbanos habitacionais e terrenos para construção".

23. Argumenta que "o diferente tratamento dado pelo legislador que, por razões económicas e sociais, decidiu, no âmbito da sua liberdade conformadora, afastar da incidência os imóveis destinados a outros fins que não os habitacionais".

24. Donde, entender que "é, pois, inequívoco que se está perante uma norma de incidência objectiva de carácter geral e abstracta, aplicável de forma indistinta a todos os casos em que se preencham os respectivos pressupostos de facto e de direito".

25.  É, pois, uma tributação parcelar do património total dos contribuintes, não sendo, por isso, normativamente adequado proceder a uma comparação entre o valor global do património de outros contribuintes.

26. E é por isso que ao pôr-se em confronto uma tributação geral ou sintética do património com outra específica que apenas visa tributar prédios urbanos para fins habitacionais e de terrenos para construção, dela resultarão conclusões distorcidas.

27. Para além disso, este imposto (AIMI) não visa especificamente empresas, pois compreende toda a espécie de sujeitos passivos que sejam titulares daqueles patrimónios reais, independentemente da natureza empresarial ou não por que se caraterizem - sociedades, fundações associações ou pessoas singulares.

28. A Requerida vem ainda reforçar a sua tese com um excerto do douto Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 846/2014, de 3/12, em que se refere o seguinte:

"A doutrina e a Jurisprudência constitucional têm sido firmes no sentido de concluir que o exercício, por parte do Estado, do poder de tributar não pode ser concebido como uma afetação ou restrição de direitos fundamentais, face à qual seja legítimo invocar o regime dos requisitos ou exigências que valem, constitucionalmente, para as leis restritivas de direitos, liberdades e garantias. Isto mesmo decorre, desde logo, da existência da (impropriamente) chamada           'constituição fiscal', na qual se definem as garantias dos contribuintes, os princípios formais e materiais que conformam o conceito constitucional de imposto, e a configuração deste último não como afetação de um direito mas   antes como obrigação pública de todos os cidadãos, quando constituída nos termos do artigo 103.º da CRP".

29. Assim sendo, conclui a Requerida, contrariamente ao que a Requerente pretende, que não é possível invocar a inconstitucionalidade de uma norma fiscal com base simplesmente em que a mesma possui influência significativa nas decisões económicas dos contribuintes, já que isso acontece por força da aplicação das normas em causa.

30. E relativamente ao argumento da Requerente de que os prédios em causa são o fruto da atividade, afirma a Requerida que, muito embora isso seja verdade e também que numa empresa imobiliária a propriedade dos imóveis constitui um pressuposto essencial ao exercício da sua atividade económica, também é verdade que "se está perante bens com valor económico e de mercado e valor económico intrínseco que advém de diferentes fatores, como a localização, aptidão construção e, até, da sua tendencial escassez".  

31. E enfatiza que os prédios em causa não são meramente instrumentais ao exercício da atividade, na medida em que integram o núcleo da atividade económica, sendo, para além disso, bens autónomos, que têm sempre um valor intrínseco e, normalmente, cotação no mercado imobiliário.   

32. E ainda que se trata de bens que evidenciam uma específica abastança face aos demais proprietários. São fator de produção, mas também significam uma peculiar riqueza com capacidade para suportar uma contribuição adicional como é o caso do AIMI.

Justificando, agora, em segundo lugar, a Requerida entende que:

33. Quanto ao facto de os terrenos para construção poderem constituir uma afetação potencial a comércio, indústria ou serviço, tal não é relevante, como pretende a Requerente, porquanto o AIMI incide sobre terrenos para construção, mesmo quando exista essa potencial afetação. E este argumento não implica uma violação do princípio da igualdade, (cf. art.os 135.º e 136.º da PI).

34. Relativamente à questão da inconstitucionalidade invocada pela Requerente relativamente aos terrenos para construção, a Requerida defende que o Tribunal apenas poderia discutir a questão da legalidade da liquidação, na parte em que os mesmos possam vir a ter potencial afetação a outros fins que não habitacionais - e nesta situação encontra-se apenas um dos prédios tributados.

35. E explicita que, nos demais casos, "está vedada a discussão da legalidade, por a mesma ser abstrata, uma vez que não tem conexão efetiva com a factualidade que deve ser dada como provada pelo Tribunal".

36. É que, continua a Requerida, "sem tal nexo de dependência entre a matéria de litígio e os fundamentos do juízo de inconstitucionalidade da norma em jogo, tudo se limita a uma valoração abstrata do confronto entre a norma ou o princípio constitucional e a norma ordinária, portanto, sem conexão direta e efetiva com o 'feito submetido a julgamento' (art.º 204.º da CRP), com a consequência de se determinar a desaplicação de uma norma por inconstitucionalidade com base em fundamentos inaplicáveis à matéria de litígio".

37. E que, assim sendo, determina, em seu entender, a incompetência do Tribunal Arbitral para conhecer da questão peticionada.

38. De qualquer modo, "não procede o entendimento de que é inconstitucional, por infração aos princípios da igualdade e da capacidade contributiva, a tributação dos terrenos para construção sem atender ao tipo de prédios que nestes poderá vir a ser edificado" - "tal como tem sido entendido quase unanimemente pela jurisprudência arbitral, de que são exemplos os acórdãos proferidos nos processos n.ºs 654/2017-T e 664/2017-T".

39. E mesmo que se verifique potencial afetação de um dos terrenos a outros fins que não habitacionais, é improcedente a tese da Requerente, "sob pena de o Tribunal efetuar um juízo (vedado) 'de inconstitucionalidade parcial vertical' (consabidamente, aquela que reside na aplicabilidade da norma a certas situações ou categorias não autonomizadas no conteúdo normativo - cfr. acórdão do TC n.º 124/84, de 8 de fevereiro)."

40. E não faz sequer sentido, nem tem conformidade com o princípio da igualdade,  fazer qualquer discriminação dos terrenos para construção, somente porque um deles pode vir a ser afeto a serviços, após eventual edificação futura, porque a tributação é feita em função na natureza dos bens em causa no momento da sua tributação (facto gerador) e não em função de uma capacidade contributiva futura e eventual[11] - "já que isso constituiria um arrepio frontal com os princípios basilares do nosso ordenamento jurídico".

41. E a Requerida volta a realçar que este princípio da igualdade, como decorre da doutrina e da jurisprudência, tem como premissa tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida das suas diferenças, para além de que a comparação errónea que a Requerente faz relativamente aos terrenos para construção com afetação não habitacional, "respeita a meras abstrações virtuais de situações não constituídas".

42. E lembra que após a edificação que ocorra nos terrenos, originará um novo facto tributário, um novo VPT e, portanto, uma realidade jurídico-tributária que terá, no momento da sua verificação o seu tratamento próprio, em sede de tributação em consonância com essa nova realidade.

43. Daí que "estando vedado um juízo de "inconstitucionalidade parcial vertical", não cabe aqui, refere a Requerida, "qualquer hipótese de julgamento de inconstitucionalidade do AIMI, com base na violação do princípio da igualdade, partindo-se de premissas que se baseiam numa comparação entre situações incomparáveis (…)" .

44. Realça ainda, que "atento todo o exposto, não pode, por conseguinte, haver no presente excurso, qualquer censura sobre a conformidade jurídico-constitucional do AIMI".

A Requerida, destaca, em terceiro lugar:

45. A jurisprudência dos tribunais arbitrais e do Tribunal Constitucional, para o que cita alguns excertos de acórdãos, em reforço da sua tese.

46. Assim, quanto ao acórdão proferido no processo arbitral n.º 664/2017-T, realça a seguinte passagem:

"A Requerente destaca ainda a inconstitucionalidade resultante da discriminação operada pela norma do artigo 135.º-B do Código do IMI, no tocante aos terrenos para construção, por desconsideração da potencial afectação desses terrenos aos fins do comércio, indústria ou serviços, tomando como ponto de referência os prédios classificados como comerciais, industriais ou para serviços que se encontram excluídos da tributação por força do estatuído naquela disposição.

Neste plano de análise, deve ter-se em linha de conta que estamos perante factos tributários diversos. Num caso, a lei sujeita a tributação terrenos urbanizáveis          que constituem um activo económico por efeito da sua aptidão para a     construção. Noutro caso, a lei exclui do imposto o património edificado que desempenha uma função instrumental relativamente à actividade produtiva.

Não há uma necessária conexão entre essas duas realidades. O terreno para construção tem um valor patrimonial próprio que constitui, em si, um indicador de capacidade contributiva que é susceptível de ser objecto de um imposto autónomo sobre o património, independentemente da sua eventual e futura utilização através da implantação de edifício para fins comerciais, industriais ou    serviços. O património já construído que encontre classificado como imóvel comercial, industrial ou para serviços tem já uma função instrumental relativamente a uma certa actividade produtiva que o legislador, dentro da sua margem de livre conformação, pode pretender salvaguardar no quadro das suas incumbências de incremento do desenvolvimento económico e social, que têm         assento constitucional (artigo 81.º da Lei Fundamental).

É possível descortinar, por conseguinte, um fundamento material bastante para distinguir entre esses diferentes factos tributários para efeito da tributação do património". (cfr. pág. 14 do mesmo)

47. Por sua vez, continua a Requerida, no acórdão proferido no processo arbitral n.º 654/2017-T, entendeu-se que:

"[…] crê-se que não se verifica a identidade de situações à luz dos critérios juridicamente relevantes, necessária a operar a referida extensão da cláusula de exclusão da sujeição objectiva, ou seja, não se afigura que os terrenos paraconstrução se encontrem numa situação idêntica à dos prédios construídos, do ponto de vista da teleologia daquela cláusula de exclusão.

De um ponto de vista teleológico, tal cláusula terá subjacente, em primeira linha[12], o propósito de não onerar com o AIMI os prédios afectos, ou susceptíveis       de afectação imediata, a processos produtivos, não se revestindo os terrenos            para construção, de tais características, dado que enquanto um prédio construído estará, ou será susceptível de ser imediatamente afectado a processos produtivos, os terrenos para construção não se encontram em tal situação". (cfr. pág. 14 e 15 do mesmo)

E prosseguindo, realça que no mesmo acórdão se explicita ainda que:

"Efectivamente, os prédios já construídos possuem uma realidade material correspondente à tipologia que lhes cabe. Ou seja, a um prédio construído e licenciado para, ou que tenha como destino normal, o comércio, a indústria ou serviços, corresponderá a uma realidade material adequada a tais finalidades e, para o que interessa, objectivamente distinta de um prédio construído e licenciado, ou com destino normal, para habitação.

Os terrenos para construção, por seu lado, distinguem-se dos restantes terrenos num plano meramente jurídico, ou seja, em função de uma actuação de um ente público (concessão de licença ou autorização, admissão de comunicação prévia      ou emissão de informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção - cfr. art.º 6.º/3 e 37.º/3 do CIMI) ou dos proprietários (declaração de finalidade no título aquisitivo; cfr. art.º 6.º/3 do CIMI) às quais a Lei atribui determinados efeitos jurídicos.

Deste modo, em função da apontada diferenciação material, a alteração da afectação de um terreno para construção, do pondo de vista das notas relevantes para a problemática em causa, poderá ser simples, bastando, por exemplo, uma mera declaração no título aquisitivo, a apresentação e admissão de uma comunicação prévia, ou a apresentação e aprovação de um pedido de      informação prévia.

Já a alteração da finalidade de um edifício construído, de habitação para comércio/indústria/serviços, ou vice-versa, implicará, sob um ponto de vista da normalidade, a realização de obras mais ou menos profundas (e necessários licenciamentos).

Acresce ainda que um prédio construído tem incorporado um valor significativo correspondente à construção que, mesmo nos casos em que não esteja      concretamente afectado à utilização intendida, constituirá um incentivo natural        à sua exploração económica uma vez que, sempre de um ponto de vista da             normalidade, um imóvel construído não só não gerará rendimentos, como se desvalorizará (em função da sua degradação) pela sua não utilização.

Já um terreno para construção, não só não incorpora, de per si, qualquer incentivo natural para a sua edificação e subsequente afectação a uma actividade produtiva, como, também de um ponto de vista de normalidade, poderá ocorrer precisamente o contrário, ou seja, em função de determinadas      condições de mercado que criem expectativas de ganhos meramente especulativos, poderão existir incentivos para os respectivos proprietários       manterem a sua condição de terrenos não edificados.

            […]

Ora, à luz da teleologia surpreendida à norma interpretada, atrás exposta, o certo é que tal impacto até poderá ser positivo, na mediada em que a tributação dos terrenos para construção poderá constituir um incentivo à sua edificação, acelerando-se, assim, a efectiva utilização dos imóveis em actividades produtivas.

Tudo o que se expôs, julga-se, justificará uma distinção de tratamento, em linha com o regime legalmente consagrado, e em contralinha com a extensão da cláusula de não sujeição objectiva por via da extensão interpretativa". (cfr. pág.s      16 e 17 do mesmo).

E ainda no mesmo acórdão, já na apreciação da questão da inconstitucionalidade, nele se afirma que:

"A resposta a tal questão, como também se viu já, vai no sentido de existir uma   diferença substancial entre os terrenos para construção e os edifícios já construídos, sendo que estes são susceptíveis de estar, ou de serem imediatamente afectados às actividades a que se destinem, ao contrário daqueles.

Deste modo, ao contrário da Requerente, não se crê que 'Ao fazer aquela distinção - além de atentar contra o espírito da lei, acima já demonstrado - estaríamos a distinguir realidades que não podem ser distinguidas para este efeito: por um lado, i) prédios comerciais, industriais, para serviços ou outros já    edificados e por outro, ii) terrenos para construção com destino a comércio, indústria, serviços ou outros.' não se verificando a arguida violação do princípio da igualdade.

            […]

A este propósito, como também se viu já, a capacidade contributiva visada é a    mesma do IMI, a que é adicionado o AIMI, sendo que o legislador optou por consagrar taxas de tributação mais ligeiras para as pessoas colectivas, em relação às pessoas singulares.

Quanto à oneração fiscal do sector imobiliário, em relação a outros sectores, note-se, desde logo, que dentro do sector económico em causa, as sociedades são tratadas igualmente, e que se contém dentro do âmbito da liberdade de actuação            do legislador, sendo, de resto, prática comum e aceite, a interferência nas actividades económicas, incentivando fiscalmente umas, e onerando fiscalmente outras.

Acresce ainda que, no caso, ao contrário do que aponta a Requerente não estamos perante uma oneração, mas perante uma não desoneração.

É que, bem vistas as coisas, a estrutura normativa criada para o AIMI consiste   numa abrangência geral daquele[13], sobrepondo-se aos imóveis sujeitos sujeitos a IMI, seguida do afastamento da incidência relativamente a determinado tipo de prédios.

Deste modo, não é a Requerente - ou os imóveis por si detidos e sobre os quais foi liquidado imposto - que se encontram, ao serem tributados, perante uma         situação excepcional de oneração, mas antes a não oneração pretendida - por via da exclusão subjectiva ou objectiva - que, a reconhecer-se, se reverteria de carácter excepcional." (cfr. págs. 21 e 22 do mesmo).  

48. E finalmente, em termos de Jurisprudência, remete para o acórdão do Plenário do Tribunal Constitucional n.º 378/2018, que revoga o acórdão do mesmo TC n.º 250/2017, embora já neste acórdão se tenha julgado que "não será de retirar consequências da Jurisprudência do TC em apreço, em sede constitucionalidade das normas do AIMI, aplicadas ao caso, nomeadamente no que diz respeito à violação das normas da Constituição apontadas pela Requerente, improcedendo por isso, também nesta parte, o pedido arbitral". (cf. páginas 23 a 25 da mesma).

49. Daí que importe mencionar agora e finalmente, o que se explicita no aludido e recente Acórdão do Plenário do Tribunal Constitucional n.º 378/2018, de 4/7, a respeito da inconstitucionalidade das normas ainda do Imposto do Selo, sobre esta mesma problemática:

"Não cabe ao Tribunal Constitucional equacionar a possibilidade (abstracta) de existirem situações ou hipóteses que, em atenção à natureza do sujeito visado ou ramo de actividade por este desenvolvido, poderiam justificar diferentes soluções tributárias. e, com base nisso, decidir pela inconstitucionalidade da solução adoptada pelo legislador, quando, como é caso, a sua inclusão no âmbito de incidência da norma tributária, a par de todas as outras hipóteses abrangidas, de variável configuração factual, não constitui solução arbitrária ou        racionalmente infundada, por assentar em indícios seguros, embora não infalíveis, de especial ou acrescida capacidade contributiva, como ficou       demonstrado.

Por isso, não se afigura que as razões invocadas pela decisão recorrida, com base em tais ponderações, possam determinar um juízo de inconstitucionalidade, por ofensa, do princípio da igualdade tributária." (páginas 14 e 15 do mesmo).

E seguidamente, explicita ainda o Douto Acórdão que:

"Considerando uma tal homogenia de conceitos jurídico-tributários, é claro que, para o efeito da aplicação do Código do Imposto do Selo, tal como para efeito da aplicação do CIMI, um terreno para construção não é igual a um prédio  urbano, seja ele para habitação ou para outros fins, tal como se afirma da decisão recorrida. Mas, precisamente porque assim é, não é possível fazer          actuar retroactivamente, mesmo que para efeitos de mera análise ou construção jurídica, critérios tributários que apenas se aplicam depois da construção do edifício, não antes dela.[14]

Como se salientou, o que releva para efeitos de aplicação da verba 28.1 é a situação jurídico-patrimonial existente à data do vencimento da obrigação do pagamento do  imposto, sendo, pois, por referência ao facto tributário concreto existente nessa data que se deverá avaliar a existência, ou não, de um fundamento racional ou razoável para justificar as consequências jurídico-        tributárias que dele imediatamente emergem.

As transformações juridicamente relevantes que o objecto da propriedade vier a sofrer no decurso do tempo, a partir desse momento, decorrentes, designadamente, da eventualidade de vir a ser construído num terreno para construção de valor patrimonial superior a € 1.000.000,00 uma edificação constituída por fracções autónomas de valor inferior, configuram hipóteses de verificação e conteúdo incerto, mesmo considerando a existência de um         licenciamento nesses termos, que pode vir a ser alterado ou nem sequer utilizado não podem, por isso, relevar decisivamente na avaliação da constitucionalidade de normas, ou segmentos delas, que, em virtude da sua ocorrência, deixarão de ser aplicáveis[15].

O único dado certo que, no enquadramento legal aplicável, pode e deve ser ajuizado, no plano constitucional, é a titularidade, no momento do vencimento da obrigação em causa, de direitos reais de gozo sobre um terreno para construção de valor patrimonial tributário igual ou superior a € 1.000.000,00,       cuja edificação, autorizada ou prevista, se destina a habitação.

Ora, na perspetiva juridicamente relevante da demonstração de riqueza, os terrenos destinados à construção de habitações, independentemente da estrutura jurídica e tipologia que estas últimas vierem a assumir, não são equiparáveis a prédios constituídos em fracções autónomas.

            […]

É que, relevando, para efeitos tributários, apenas o VPT de cada fracção autónoma - que, como se viu, constitui uma unidade económico-jurídica legalmente qualificada como constituindo um único prédio - não vale comparar        a situação patrimonial do titular de um prédio para habitação, já construído, cujas fracções sejam de valor patrimonial tributário inferior a € 1.000.000,00, com a do proprietário de um terreno para construção de valor igual ou superior a esse montante, ainda que este tenha autorização para nele construir um prédio com tais características:

            […]   

Como impressivamente se afirma em declaração de voto constante do Acórdão   n.º 250/2017:

"(…) não é a circunstância de a construção prevista num dado terreno se reconduzir a uma habitação de luxo ou a prédio em propriedade horizontal com diversas fracções de reduzido ou médio valor que permite questionar a efectiva concretização do propósito de tributação de específicas manifestações de             riqueza. Quer o correspondente titular deseje edificar uma habitação dotada de todo o género de ostentação, um imóvel em propriedade horizontal com dezenas de fracções ou uma singela vivenda, a realidade é que, no momento da verificação do facto tributário, estamos invariavelmente em face de terreno cuja edificação prevista se dirige a habitação e que se assume um VPT superior a € 1.000,000,00.    E é a titularidade de tal terreno - e já não a específica habitação           que se deseja edificar - que permite referenciar o respectivo proprietário como dotado de particular abastança.

Se, não obstante as múltiplas possibilidades que tem ao seu dispor, o proprietário se decide pela implementação de construção que não ascenda a tal grandeza - nomeadamente por esta se apresentar em propriedade horizontal, a importar uma tributação das fracções autónomas e já não do edifício global tal não invalida a constatação de que, enquanto terreno, aquele imóvel se    apresentava, por si só, como especial manifestação de riqueza"[16]. (cfr.     páginas 16 a 19 do mesmo).

Donde, a Requerida propugnar que a decisão deva ser proferida no seguinte sentido:

"(1) Deve o presente pedido de pronúncia arbitral ser julgado improcedente por não provado e, consequentemente, absolvida a Requerida de todos os pedidos, nos termos acima peticionados, tudo com as devidas e legais consequências.

   "(2) …

 

 

IV - DA APRECIAÇÃO DOS ARGUMENTOS DAS PARTES E DA FUNDAMENTAÇÃO DO TRIBUNAL

 

Apreciando agora, em síntese, os fundamentos de ambas as parte antes expostos, este Tribunal, à luz dos factos já anteriormente dados como provados e do direito aplicável, refere o seguinte:

a) A Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro (OE para 2017) aditou o capítulo XV ao CIMI - Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, nele se incluindo os artigos 135.º-A a 135.º-K, que constituem o regime do Adicional ao referido Imposto Municipal sobre Imóveis (AIMI), com entrada em vigor em 1/1/2017.

b) Das referidas normas, citamos as aplicáveis à liquidação de AIMI em análise, que constituem a incidência subjetiva e objetiva, as quais se mostram consagradas no artigo 135.º-A e no n.º 1 do artigo 135.º-B do Código do IMI, aditado pela Lei n.º 42/2016, de 28 de Dezembro,  sendo também relevantes os artigos 135.º-C, 135.º-F e artigo 6.º, todos do Código do IMI, que são do seguinte teor:

"Artigo 135.º-A

(Incidência subjetiva)

1 - São sujeitos passivos do adicional ao imposto municipal sobre imóveis, as pessoas singulares ou coletivas que sejam proprietários, usufrutuários ou superficiários de prédios urbanos[17] situados em território português.

2- Para efeitos do n.º 1, são equiparadas a pessoas coletivas […).

3 - A qualidade de sujeito passivo é determinada em conformidade com os critérios estabelecidos no artigo 8.º do presente Código, com as necessárias adaptações, tendo por referência a data de 1 de janeiro do ano a que o adicional ao imposto municipal sobre imóveis respeita.

4 - Não são sujeitos passivos […] as empresas municipais."

"Artigo 135.º-B

(incidência objetiva)

1 - O adicional ao imposto municipal sobre imóveis incide sobre a soma dos valores patrimoniais tributários dos prédios urbanos situados em território português de que o sujeito passivo seja titular.

2 - São excluídos do adicional ao imposto municipal sobre imóveis os prédios urbanos classificados como "comerciais, industriais ou para serviço" e "outros" nos termos das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 6.º deste Código.[18]"

 

Citam-se, também, por relevantes os seguintes artigos, todos do Código do IMI:

"Artigo 135.º-C

Regras de determinação do valor tributável

1 - O valor tributável corresponde à soma dos valores patrimoniais tributários, reportados a 1 de janeiro de cada ano a que respeita o adicional ao imposto municipal sobre imóveis, dos prédios que contam nas matrizes prediais na titularidade do sujeito passivo.

2 - Ao valor tributável determinado nos termos do número anterior são deduzidas as seguintes importâncias:

a) [euro) 600.000,00, quando o sujeito passivo é uma pessoa singular;

b) [euro) 6000.000,00, quando o sujeito passivo é uma herança indivisa.

3 - Não são contabilizados para a soma referida no n.º 1 do artigo 135.º-B:[19]

a) O valor dos prédios que no ano anterior tenham estado isentos ou não sujeitos a IMI;[20]

b) O valor dos prédios que se destinem exclusivamente à construção de habitação social ou a custos controlados cujos titulares sejam cooperativas de habitação e construção ou associações de moradores.[21]

c) …

d) …"

"SECÇÃO III[22]

Artigo 135.º-F

Taxa

1 - Ao valor tributável determinado nos termos do artigo 135.º-C e após aplicação das deduções aí previstas, quando existam, é aplicada a taxa de 0,4% às pessoas coletivas e de 0,7% às pessoas singulares e heranças indivisas.

2 - Ao valor tributável, determinado nos termos do n.º 1 do artigo 135.º-C, superior a um milhão de euros, ou o dobro deste valor quando seja exercida a opção prevista no n.º 1 do artigo 135.º-D, é aplicada a taxa marginal de 1% quando o sujeito passivo seja uma pessoa singular.

3 - O valor dos prédios detidos por pessoas coletivas afetos auso pessoal dos titulares do respetivo capital, dos membros dos órgãos sociais ou de quaisquer órgãos de administração, direção, gerência ou fiscalização ou dos respetivos cônjuges, ascendentes e descendentes, fica sujeito à taxa de 0,7%, sendo sujeito à taxa marginal de 1% para a parcela que exceda um milhão de euros.

4 - Para os prédios que sejam propriedade de entidades sujeitas a um regime fiscal mais favorável, a que se refere o n.º 1 do artigo 63.º-D da Lei Geral Tributária, a taxa é de 7,5%.

6 - Os prédios referidos no n.º 3 devem ser identificados no anexo à declaração periódica de rendimentos prevista no Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas. (Aditado pela Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro)".

 

 

"Artigo 6.º

Espécie de prédios urbanos

1 - Os prédios urbanos dividem-se em:

a) Habitacionais;

b) Comerciais, industriais ou para serviços;

c) Terrenos para construção;

d) Outros.

2 - Habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções [23] para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins.

3 - Consideram-se terrenos para construção ou terrenos situados dentro ou fora de um aglomerado urbano, para os quais tenha sido concedida licença ou autorização, admitida comunicação prévia ou emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção, e ainda aqueles que assim tenham sido declarados no título aquisitivo, excetuando-se os terrenos em que as entidades competentes vedem qualquer daquelas operações, designadamente os localizados em zonas verdes, áreas protegidas ou que, de acordo com os planos municipais de ordenamento do território, estejam afetos a espaços, infraestruturas ou equipamentos públicos.

4 - Enquadram-se na previsão da alínea d) do n.º 1 os terrenos situados dentro de um aglomerado urbano que não sejam terrenos para construção nem se encontrem abrangidos pelo disposto no n.º 2 do artigo 3.º e  ainda os edifícios e construções licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal outros fins que não os referidos no n.º 2 e ainda os da exceção do n.º 3.

 

As demais normas respeitantes ao AIMI são de natureza não determinante para a situação em análise.

 

b) - Como é referido no artigo 4.º da PI e dado como provado, o montante do imposto devido a título de AIMI corresponde à aplicação da taxa de 0,4%, de acordo com o estatuído no n.º 1 do artigo 135.º-F do Código do IMI, à soma dos Valores Patrimoniais Tributários (VPT) dos prédios antes descritos, constantes das matrizes prediais em nome da Requerente A... - SOCIEDADE IMOBILIÁRIA, S.A., Pessoa Coletiva n.º ... .

c) As questões controvertidas prendem-se com as seguintes problemáticas:

1. A da invocada inconstitucionalidade material do n.º 1 do art.º 135.º-B do CIMI, nomeadamente no que se refere à interpretação no sentido da tributação de todos os terrenos para construção de que são proprietárias empresas imobiliárias, por violação do princípio da igualdade e da capacidade contributiva;

2. A da inaplicabilidade desta norma pela AT; e

3. A da exclusão da tributação dos terrenos para construção propriedade de empresas, como é o caso da Requerente, que desenvolvam uma atividade comercial, industrial ou de prestação de serviços.

d) A Requerente chama à colação o regime anteriormente vigente em sede de Imposto do Selo, Verba 28. e realça as diferenças e a finalidade da tributação deste património.

e) Ao Tribunal interessa esta génese do ponto de vista histórico-sistemática e teleológica, na medida em que traz luz ao regime atualmente em vigor em sede de AIMI, embora hoje se encontre a questão controversa, suficiente clarificada, quer doutrinária, quer Jurisprudencialmente, designadamente pelo próprio Tribunal Constitucional, pelo menos em certas questões trazidas ao processo.

f) É cero que existem alguns acórdãos com diferentes decisões, ao longo de todo o regime do Imposto de Selo e até do AIMI, mas a Jurisprudência mostra-se hoje bastante mais clarificadora.

Vejamos, então por partes, cada uma das questões:

1. A da invocada inconstitucionalidade material do n.º 1 do art.º 135.º-B do CIMI, nomeadamente no que se refere à interpretação no sentido da     tributação de todos os terrenos para construção de que são proprietárias empresas imobiliárias, por violação do princípio da igualdade e da capacidade contributiva;

g) A Requerente, a este respeito, remete para a distinção que existia, em sede de conceitos e, portanto da sua tributação ou não, em sede do Imposto do Selo, entre prédios urbanos habitacionais e terrenos para construção.

h)  E entende que a atual norma de incidência, no âmbito do CIMI, teve por finalidade maximizar a receita fiscal, ainda que, em seu entender, com violação dos princípios constitucionais da igualdade, proporcionalidade e capacidade contributiva, o que tornaria o regime do AIMI contrário à Constituição da República Portuguesa.  

i) De facto, em sede de Imposto do Selo, a decisão proferida pelo Acórdão do STA, de 29/10/2014, no processo n.º 505/14-30, foi a de que:

"Não tendo o legislador definido o conceito de prédio urbano com afectação habitacional mas resultando do artigo 6.º do CIMI uma clara distinção entre prédios urbanos habitacionais e terrenos para construção, não podem estes ser considerados para efeitos de incidência do Imposto de Selo como prédios urbanos com afectação habitacional.

E concluiu que:

"Assim, atendendo a que um terreno para construção - qualquer que seja o tipo e a finalidade da edificação que nele será, ou poderá ser, erigida - não satisfaz, só por si, qualquer condição para como tal ser licenciado ou para se poder definir como sendo a habitação o seu destino normal, e referindo-se a norma de incidência do imposto do selo a prédios urbanos com "afectação habitacional", sem que seja estabelecido qualquer conceito específico para o efeito, não pode dela extrair-se que na mesma se contenha uma potencialidade futura, inerente a um distinto prédio que porventura venha a ser   edificado no terreno.

Tendo, então, tomado a seguinte Decisão:

"Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso".[24]

j) Porém, mesmo que se considere, sem conceder totalmente, que o legislador de então não tenha pretendido tributar em AIMI a propriedade dos terrenos para construção destinados à habitação, a verdade é que as novas normas e, em especial, os artigos 135.º-B, 135.º-C  e 135.º-F e art.º 6.º todos do Código do IMI, com a redação dada pela Lei n.º 42/2016, de 28/12, com entrada em vigor em 1/1/2017, não deixam agora menor margem para dúvidas sobre o sentido e alcance da atual lei.

k.  Pode a Requerente considerar que a nova Lei é injusta e profundamente desigual e violadora dos princípios Constitucionais, particularmente da igualdade, por entender que foram cridas distinções desprovidas de uma justiça objetiva e racional.

l. E que, portanto, a AT não poderia nem deveria aplicá-la, designadamente atendendo à situação específica da impugnante, face à sua atividade económica, que mantém no seu ativo circulante, terrenos para construção destinados a edificação ou a revenda.

m) E que, face à atividade económica que desenvolve, a nova lei criou, no entender da Requerente, condições para a constituição de manifesta desigualdade material entre a impugnante e as empresas que detendo bens imóveis, prossigam nos mesmos uma atividade comercial, industrial ou de prestação de serviços.

n) E sustenta que a nova lei não se encontra minimamente justificada face à finalidade da medida fiscal adotada e que, portanto, nunca existiu qualquer fundamento material para sustentar a tributação de imóveis destinados ao exercício da atividade imobiliária, como é a que desenvolve.

o) Certo é que, segundo o Acórdão do Plenário do Tribunal Constitucional, n.º 378/2018, ainda que tratando de tributação de terrenos para construção em sede de Imposto do Selo, entre outras coisas refere que:

" …Como se sublinhou, o que se discutia especificamente neste aresto era a questão da inconstitucionalidade da solução normativa, adoptada pela Lei n.º 83-C/2013, de alargar a incidência do tributo previsto na norma da verba 28 da            TCIS, na redação introduzida pela Lei n.º 55.º-A/2012, de 29 de outubro,             sujeitando à sua aplicação, não apenas a propriedade de prédio habitacional de valor patrimonial igual ou superior a € 1.0000.000,00, mas também a propriedade de "terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (doravante "CIMI"), cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a essa quantia.

Decidiu-se concretamente no referido acórdão[25]que a norma que impõe a tributação anual sobre a propriedade de terrenos para construção, com as            descritas características, viola o princípio da igualdade tributária, consagrado nos artigos 13.º e 104.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa.

Em síntese das razões do juízo da inconstitucionalidade, considerou-se, por um lado, que a referida norma "não respeita a diferente capacidade contributiva dos        proprietários dos prédios sobre os quais incide, atingindo indiscriminadamente contribuintes com e sem força contributiva necessária para suportar o imposto"; e, por outro, que "as diferenciações que [a mesma] introduz entre os quais são          abrangidos e excluídos do seu âmbito de incidência não são proporcionais, sendo inadequadas para satisfazer o fim visado pela norma, que é o de tributar de forma agravada os patrimónios imobiliários de maior valor em termos que             satisfaçam "o princípio da equidade social na austeridade".

p) O acórdão recorrido entendia que:

 "há de facto, um pecado original na verba 28.1 da TGIS, tal como ela foi concebida pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro, e que, […] a Lei n.º 83-C/2013 agravou com o aditamento dos terrenos para construção à mencionada previsão normativa. É que, ao não alargar a base de tributação, pelo menos, ao conjunto do património imobiliário de cada contribuinte, não personalizando suficientemente o imposto, aquela verba não se revelou adequada a prosseguir "o princípio da equidade social na austeridade, garantindo uma efetiva             repartição de sacrifícios necessários ao cumprimento do programa de ajustamento", como o legislador se propôs na exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 96/XII/2.ª, que esteve na origem da Lei n.º 55-A/2012".

q) E mais adiante no dito acórdão recorrido n.º 250/2017, é também referido que:

"De facto, ao reunir na mesma verba a tributação de casa de luxo e de terrenos para construção, no pressuposto de que ambos se subsumem genericamente à categoria de bens imóveis de elevado valor patrimonial tributário, a norma cuja validade se discute confundiu manifestações de riqueza com fatores de produção dessa mesma riqueza.

Tem sido salientado pela doutrina fiscal que, enquanto critério de igualdade tributária,             o princípio da capacidade contributiva "exige, antes de mais, a personalização do imposto, que quando se tributa uma qualquer manifestação de riqueza se pergunte pela pessoa que está por trás dela e pelas condições em que se encontra".       (cfr. Sérgio Vasquez, Capacidade contributiva, rendimento e património, in Fiscalidade - Revista de Direito Fiscal, n.º 23, Coimbra Editora, Coimbra, 2005, p. 19).

r) E ainda no mesmo acórdão, é afirmado que:

"Ora, se por trás do tributo imposto ao proprietário de uma casa de habitação de valor patrimonial superior a um milhão de euros poderá estar um contribuinte com força económica suficiente para suportar a respetiva carga fiscal, por trás do tributo imposto ao proprietário de um terreno para construção estará normalmente um empreendedor, em regra sob a forma de uma sociedade comercial dedicada à promoção imobiliária, sobre cuja forma económica nada sabemos. Na verdade, não podemos presumir que aquele contribuinte tem uma força económica proporcional ao valor do terreno, que é meramente instrumental em relação à sua atividade económica. Desconhecemos qual a margem de lucro que retirará do seu exercício, se é que está em condições jurídicas e económicas  de a desenvolver, ou se não terá mesmo uma situação líquida negativa.

O que nos leva a uma segunda perversão do princípio da capacidade contributiva, que exige que se tribute o rendimento líquido do contribuinte, depois de deduzidas as despesas necessárias à sua própria obtenção".

            […]

s) Voltando agora ao Acórdão do Plenário do TC n.º 378/2018, que revogou o Acórdão 250/2017 que vimos citando, é referido no seu ponto 9. o seguinte:

"Entende-se não ser de acolher um tal entendimento.

Estando em causa a aferição do cumprimento, pelo legislador, do princípio constitucional da igualdade - que não sofre modificação de sentido quando aplicado ao domínio tributário - não é aceitável que a comparação que se faça à luz de outro critério que não o eleito pelo legislador para fundamentar a diferença de regimes jurídico-          tributários introduzida pela norma sindicada…".

t) E no ponto 13. do mesmo Acórdão do TC n.º 378/2018, é afirmado, partindo da análise ao Acórdão n.º 590/2015, que:

" De todo o modo, mesmo que estivesse em causa - e não está - hipótese normativa circunscrita a sociedades comerciais com tal objeto social (…pessoas coletivas e, dentro destas categoria, a associações, fundações e sociedades comerciais, independentemente do ramo económico em que estas últimas operem e dos específicos riscos comerciaisexistentes nos respectivos sectores de actividade, aliás próprios de toda e qualquer actividade comercial)- hipótese normativa circunscrita a sociedades comerciais com tal objeto social, não decorre do programa constitucional da igualdade tributária, por via dos impostos sobre o património, qualquer exigência de discriminação positiva das empresas, face aos restantes contribuintes sujeitos a esse tipo de impostos. Não há, por isso, qualquer motivo para censurar, no plano constitucional, a opção legal de também as sujeitar ao pagamento do imposto com base na titularidade de terrenos para construção de valor patrimonial igual ou superior a €1.000.000,00, cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação[26]

DONDE, por todo o exposto que antecede, quer com a profusa fundamentação por parte da Requerida, com a qual se concorda e se dá por reproduzida, quer pela Jurisprudência recente do Tribunal Constitucional, que vimos citando, não pode este Tribunal Arbitral deixar de CONCLUIR pela constitucionalidade da norma do atual n.º 1 do artigo 135.º-B do CIMI.

 

            2. A da inaplicabilidade desta norma pela AT;

u) Esta questão já foi esclarecida e decidida no ponto III.1, em que, fundamentadamente se decidiu que:

O Tribunal entende que a Administração Tributária não tem, em princípio, competência para aferir da constitucionalidade ou não de qualquer norma fiscal,  e muito em particular no caso em apreço, por se tratar de matéria            exclusiva dos Tribunais, como Órgão de um Estado de Direito, a quem compete dirimir os conflitos de interesses públicos e privados e, portanto, fazer Justiça, no âmbito do seu poder jurisdicional.

Donde, ainda que possam eventualmente - o que não é o caso - oferecer-se-lhe dúvidas de constitucionalidade, não pode a Autoridade Tributária recusar a sua aplicação, porquanto está sujeita ao princípio da legalidade, conforme disposto nos artigos 266.º, n.º 2 da CRP,  3 n.º 1 do CPA e 55.º da LGT, não sendo, por isso, legalmente possível CONCLUIR-SE que a liquidação do AIMI em causa se mostra ferida de legalidade - pelo que se DECIDE pela sua manutenção na ordem jurídica.

 

3. A da exclusão da tributação dos terrenos para construção propriedade de empresas, como é o caso da Requerente, que desenvolvam uma atividade comercial, industrial ou de prestação de serviços.

 

Sobre esta terceira questão, o Tribunal, para além do que antecede, tem a referir o seguinte:

v) Um dos Acórdãos citados pela Requerente foi proferido pelo Tribunal Arbitral, no processo n.º 668/2017-T,  cujo Requerente no mesmo é um Fundo de Investimento Imobiliário Fechado, e em que se decide (também) não pela inconstitucionalidade da norma do n.º 2 do artigo 135.º-B do CIMI, mas em que se considerar, no entanto, que "numa perspetiva que tenha em mente a unidade do sistema jurídico (artigo 9.º, n.º 1. do Código Civil), que tem valor interpretativo decisivo, imposto pela coerência valorativa ou axiológica da ordem jurídica[27], deverá interpretar-se extensivamente a exclusão prevista no n.º 2 do artigo 135.º-B do CIMI relativa aos prédios urbanos classificados como "para serviços[28]" como expressando uma intenção legislativa de excluir também os terrenos destinados à construção desses prédios".

Daí que esta Douta Decisão tenha considerado ilegal a liquidação de AIMI, "na parte em que inclui no valor tributável o valor correspondente ao de um terreno para construção destinado a serviços".

x) Dos Acórdãos citados por ambas as partes, não se encontra em nenhum deles, no âmbito do AIMI, esta interpretação extensiva, que é feita tendo em conta a unidade do sistema fiscal.

Fê-lo também no âmbito de "uma perspetiva que tenha em mente a referida unidade do sistema jurídico (artigo 9.º, n.º 1, do Código Civil) que tem um valor interpretativo decisivo, imposto pela coerência valorativa ou axiológica da ordem jurídica (…)…".

y) No entanto, do Acórdão n.º 378/2018, processo, 156/2016, de 4/7, que analisa uma questão ainda do Imposto do Selo - que para este último caso é irrelevante - e mais voltada para a constitucionalidade das normas de então, e sobre a possibilidade de "tributação anual sobre a propriedade de prédio habitacional ou de terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a € 1.000.000,00".

z) É certo que se tratava no dito Acórdão Constitucional, para além da constitucionalidade das normas de então, da tributação das realidades patrimoniais antes referidas e ainda no âmbito do Imposto do Selo. E mais adiante é referido no Douto Acórdão o seguinte, entre outras partes relevantes:

            […]

"13. De todo o modo, mesmo que estivesse em causa - e não está - hipótese normativa circunscrita a sociedades comerciais com tal objeto social, não decorre do programa constitucional da igualdade tributária, por via dos impostos sobre o património, qualquer exigência de discriminação positiva das empresas, face aos restantes contribuintes sujeitos a esse tipo de imposto. Não há, por isso, qualquer motivo para censurar, no plano constitucional, a opção legal de também as sujeitar ao pagamento do imposto com base na titularidade de terrenos para construção de valor patrimonial tributário igual ou superior a € 1.0000.000,00, cuja edificação. autorizada ou prevista, seja para habitação".

z1 - Face a este entendimento do TC, no âmbito do Imposto do Selo, será lícito, extrair-se a conclusão de que, tratando-se de terrenos para construção, comprovadamente para fins comerciais, industrias ou de serviços, (como é o caso em análise no presente processo, relativamente ao terreno para construção licenciado para indústria), serão de excluir da tributação, tais terrenos para construção, quando previstamente se destinam a fins comerciais, industriais ou para serviços?

Z2 - Entendemos que não, pelos seguintes fundamentos:

 

Z2.1 - Primeiramente, porque se se tratasse de uma realidade estática ou até imutável ou irrevogável, este Tribunal até concordaria com a interpretação extensiva do n.º 2 do artigo 135.º-B, por força do artigo 9.º do CC, que é feita no dito Acórdão Arbitral 668/2017-T. Porém, a verdade é que nem o facto de o terreno para construção em causa, se encontrar, segundo a caderneta fiscal, licenciado para indústria, essa situação não é imutável, nem o facto tributário em causa, terreno para construção destinado a indústria, por ausência do eventual futuro edifício é a realidade objetiva existente no momento do facto gerador.

 

Z2.2Para além de que, tal como o simples facto de um jurista se encontrar inscrito na respetiva Ordem dos Advogados para estagiar o torna desde logo um causídico, também o terreno para construção licenciado para indústria lhe retira a natureza de terreno para construção, com um VPT que não pode deixar de ser sujeito a tributação em AIMI como património objetivo e autónomo, no momento do facto gerador, não sendo legalmente possível, no dizer do TC, fazer actuar retroactivamente, mesmo que para efeitos de mera análise ou construção jurídica, critérios tributários que apenas se aplicam depois da construção do edifício, não antes dela.

É o que se extrai do conteúdo citado do Acórdão do Plenário do Tribunal Constitucional n.º 378/2018, quando refere que "Considerando uma tal homogenia de conceitos jurídico-tributários, é claro que, para o efeito da aplicação do Código do Imposto do Selo, tal como para efeito da aplicação do CIMI, um terreno para construção não é igual a um prédio a um prédio urbano, seja ele para habitação ou para outros fins, tal como se afirma da decisão recorrida. Mas, precisamente porque assim é, não é possível fazer actuar retroactivamente, mesmo que para efeitos de mera análise ou construção jurídica, critérios tributários que apenas se aplicam depois da construção do edifício, não antes dela.[29]

z3 - Parece, pois, evidente que o juridicamente relevante para a tributação em AIMI, relativamente a terrenos para construção, independentemente da entendida que seja seu titular, é a realidade objetiva no momento do facto tributário e da exigibilidade do imposto em causa, até porque não é difícil alterar o destino previsto para a utilização do mesmo terreno para construção, o que a acontecer, constituiria uma forma de evasão, eventualmente planeada, para além de que não é possível proceder à tributação ou não tributação de meras abstrações virtuais de situações não constituídas no momento do facto gerador do imposto.

z4 - Por outro lado, face também ao que foi decidido no Acórdão do STA, de 29/10/2014, no processo n.º 505/14-30, no sentido de que:

"Não tendo o legislador definido o conceito de prédio urbano com afectação habitacional mas resultando do artigo 6.º do CIMI uma clara distinção entre prédios urbanos habitacionais e terrenos para construção, não podem estes ser considerados para efeitos de incidência do Imposto de Selo como prédios urbanos com afectação habitacional.

E concluiu que:

"Assim, atendendo a que um terreno para construção - qualquer que seja o tipo e a finalidade da edificação que nele será, ou poderá ser, erigida - não satisfaz, só por si, qualquer condição para como tal ser licenciado ou para se poder definir como sendo a habitação o seu destino normal, e referindo-se a norma de incidência do imposto do selo a prédios urbanos com "afectação habitacional", sem que seja estabelecido qualquer conceito específico para o efeito, não pode dela extrair-se que na mesma se contenha uma potencialidade futura, inerente a um distinto prédio que porventura venha a ser edificado no terreno.

 

z5 - Não é, pois, legalmente possível proceder a outra interpretação das normas aplicáveis, em sentido diverso daquele que objetivamente constam das mesmas, designadamente dos artigos 6.º e 135.º-B do Código do CIMI.

 

Nestes termos, CONCLUI este Tribunal, face aos fundamentos antes profusamente expressos,

1. Pela constitucionalidade da norma do atual n.º 1 do artigo 135.º-B do CIMI.

2. Pela obrigatoriedade da aplicação da norma supra pela ATA - Autoridade Tributária e Aduaneira;

3. Pela não exclusão da tributação em AIMI, ao abrigo do n.º 2 do artigo 135.º-B do CIMI, de qualquer terreno para construção propriedade da empresa Requerente, por desenvolver uma atividade comercial, industrial ou de prestação de serviços, quaisquer que sejam os fins a que possam ser destinados, mesmo face a um licenciamento autorizado.

 

Termos em que este Tribunal profere a seguinte:

V – DECISÃO

  1. Julgar totalmente improcedente a ação de impugnação arbitral
  2. Manter integralmente a liquidação de AIMI em causa;
  3. Julgar improcedente a invocada inconstitucionalidade da norma do n.º 1 do artigo 135.º-B do CIMI; e
  4. Julgar improcedente o pedido de inaplicabilidade pela AT, da norma legal antes referida.
  5. Julgar correto o indeferimento total a reclamação graciosa da liquidação.

VI – VALOR DO PROCESSO

Em conformidade com o disposto nos artigos 305.º, n.º 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, é fixado ao processo o valor de € 1.803,58.

 

VII – CUSTAS

Nos termos do art.º 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 306,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamentos de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerente.

 

Lisboa, 22 de janeiro de 2019.

 

                                               O Árbitro Singular,

                                  

                                                       (José Rodrigo de Castro)          

 



[1] Sublinhado do tribunal, por ser esta a expressão constante da sua PI (art.º n.º 1).

[2] Sublinhado do Tribunal.

[3] Conforme consta da respetiva Caderneta Predial junta à PI.

[4] Sublinhado do Tribunal.

[5] Destaque do Requerente.

[6] Destaque da Requerente

[7] Cfr. Ac. do TC de 03.02.2010, proc. n.º 47/2010.

[8] O Tribunal cita aqui o que dispõe o referido n.º 2 do artigo 135.º-B: -São excluídos do adicional ao imposto municipal sobre imóveis os prédios urbanos classificados como "comerciais, industriais ou para serviços" e "outros" nos termos das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 6.º deste Código.

E o que este artigo 6.º refere é o seguinte:

1 - Os prédios urbanos dividem-se em:

a) Habitacionais

b) Comerciais, industriais ou para serviços;

c) Terrenos para construção;

d) Outros

 

[9] O artigo 135.º-B do CIMI, aditado pela Lei n.º 42/2016, de 28/12, com entrada em vigor em 1/01/2017.

[10] E o que este artigo 6.º refere é o seguinte:

1 - Os prédios urbanos dividem-se em:

a) Habitacionais;

b) Comerciais, industriais ou para serviços;

c) Terrenos para construção;

d) Outros;

 

 

[11] Itálico e sublinhado do Tribunal.

[12] Ressalvando algumas situações marginais referentes a prédios afectos a serviços públicos, ou actividade não empresariais abrangidas pela espécie "outros. Cf. acórdão.

[13] Exceptuando-se, a partir de 2018, as empresas municipais; cfr. n.º 4 do artigo 135.º-A do CIMI.

[14] Itálico e sublinhado pelo Tribunal Arbitral.

[15] Idem

[16] Itálico e sublinhado do Tribunal Arbitral.

[17] Sublinhado do Tribunal, que remete para o conceito de prédio urbano constante do artigo 6.º do CIMI.

[18] Sublinhado do Tribunal.

[19] Na redação dada pela Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro, tendo natureza interpretativa.

[20] Idem

[21] Idem

[22] Secção e Artigo, aditados pela Lei n.º 42/2016, de 28/12.

[23] A bold pelo Tribunal

[24] Recurso da Fazenda Pública

[25] Acórdão n.º 250/2017

[26] Lembra-se que se estava a tratar ainda de tributação em Imposto do Selo - Verba 28.1 da TCIS, mas que para o efeito é irrelevante.

[27] "Estava em causa, naquele processo, a questão relativa a um terreno para construção de edifício ou edifícios destinados a serviço".

[28] Entenda-se não destinado à habitação.

[29] Itálico e sublinhado pelo Tribunal Arbitral.