Decisão Arbitral (consultar versão completa no PDF)
I – RELATÓRIO
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A..., contribuinte nº..., residente na Rua ..., ...– ... ..., doravante designado por “Requerente”, apresentou pedido de constituição de Tribunal Arbitral, ao abrigo do disposto no artigo 2.º, n.º 1, a alínea a), do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (RJAT) e da Portaria n.º 112 – A/2011, de 22 de março, para impugnação e declaração de ilegalidade da “decisão de deferimento parcial da Reclamação Graciosa nº ...2017...” e consequente anulação da demonstração da liquidação de IRS nº 2017..., relativa ao ano de 2014, e liquidação de juros nº 2017... que correu, bem assim como da liquidação de IRS com o nº 2018... e liquidação de juros nº 2018... e demonstração de acerto de contas nº 2018..., relativas ao ano de 2014.
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A decisão de deferimento parcial, proferida e notificada por Ofício de 29-01-2018, consta do documento nº 1 junto em anexo ao pedido arbitral, que se dá por reproduzida.
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O pedido de constituição do Tribunal Arbitral, foi apresentado pela Requerente em 03-05-2018, foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e notificado à AT em 04-05-2018, nos termos e para os efeitos legalmente previstos. A Requerente optou por não indicar árbitro pelo que, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou, em 26-06-2018, a aqui signatária como árbitro do tribunal arbitral a constituir, que comunicou a sua aceitação dentro do prazo aplicável. O tribunal arbitral singular ficou constituído em 16-07-2018.
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Em 17-07-2018 foi proferido despacho arbitral para a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) apresentar resposta no prazo legal, nos termos e para os efeitos do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 17.º do RJAT. A Requerida veio juntar aos autos a sua resposta e o respetivo Processo Administrativo (PA), em 28-09-2018, cujo teor se dá por integralmente reproduzida.
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Em 23-10-2018, face à posição das partes evidenciadas nos articulados, considerando que as questões suscitadas se restringem a matéria de direito e que a reunião prevista no artigo 18º do RJAT se revelaria inútil, como bem alegou a AT no artigo 52º da Resposta, o tribunal arbitral proferiu, em 23-10-2018, despacho arbitral que dispensou a realização da reunião prevista no artigo 18º do RJAT, por desnecessária. Foi fixado prazo de 15 dias (igual e sucessivo) para as partes apresentarem alegações e foi indicada a data de 21-12-2018 como data provável para prolação da decisão final, a qual veio a ser prorrogado, por despacho arbitral de 21-12-2018, para 28-12-2018.
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O Requerente veio juntar as suas alegações em 08-11-2018 e a AT em 23-11-2018. Em 30-11-2018 o Requerente juntou aos autos comprovativo de pagamento da taxa arbitral subsequente.
B) DO PEDIDO FORMULADO e da posição da Requerente:
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Em síntese, o Requerente, fundamenta o seu pedido arbitral em erro na qualificação do regime de tributação aplicável e consequente excesso de quantificação das liquidações impugnadas. No essencial, alega o Requerente que a AT cometeu um erro de qualificação no que toca ao regime de tributação aplicável, já que ao caso concreto deve ser aplicável o regime da contabilidade organizada e não o regime simplificado, como decidiu a Requerida. Alega, ainda que a aplicação do regime simplificado não foi devidamente fundamentado pela AT, sendo certo que o Requerente se encontrava por opção no regime da contabilidade organizada e não procedeu a qualquer declaração de alterações, pelo que não se percebe a aplicação do regime simplificado de tributação, o que impõe a anulação dos atos tributários impugnados.
Quanto ao direito aplicável, o Requerente alega que do disposto nos nºs 1 a 6 do artigo 28º do CIRS, à data dos factos (ano de 2014), concretamente do disposto no seu nº5, resultava que o período de permanência em cada regime é de três anos, prorrogável por iguais períodos, exceto se houver uma comunicação da alteração do regime por parte do sujeito passivo. Sucede que o Requerente optou, quando do início da sua atividade, pelo regime da contabilidade organizada e não fez qualquer comunicação posterior a alterar o regime pelo qual tinha optado. Pelo que, a aplicação do regime simplificado ao caso do Requerente, que deu origem às liquidações impugnadas, consubstancia a prática de atos ilegais e impõe a anulação da decisão da Reclamação Graciosa e das liquidações subjacentes. Alega, ainda, violação dos princípios da boa fé, segurança jurídica e do princípio constitucional de tributação, preferencialmente, pelo rendimento real.
Assim, em síntese, do ponto de vista da Requerente foi pago imposto em excesso, no valor de 20.187,80€, reclamando a anulação das liquidações mencionadas e o reembolso do valor do excesso, que alega ter sido pago indevidamente.
C – DA RESPOSTA DA REQUERIDA
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Na sua resposta, junta aos autos em 28-09-2018, veio a Requerida arguir as exceções de litispendência e de incompetência material deste Tribunal. Caso assim não se entenda, a Requerida pugna pela legalidade dos atos impugnados, nos termos e fundamentos que constam da resposta que aqui se dá por integralmente reproduzida. Conclui pedindo que seja julgada procedente a exceção de litispendência ou a exceção de incompetência absoluta do Tribunal arbitral e a AT absolvida da instância, com as demais consequências legais. Caso assim não se entenda, alega a AT que deve ser julgado improcedente o pedido arbitral, mantendo-se na ordem jurídica os atos impugnados, improcedendo o pedido arbitral e absolvendo-se, em conformidade, a entidade requerida do pedido.
II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
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O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído. As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se legalmente representadas (cfr. artigos 4.º e 10.º n.º2 do RJAT e art.º 1.º da Portaria n.º 112/2011, de 22 de março).
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O processo não padece de vícios que o invalidem.
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Cumpre decidir, a título prévio, sobre as exceções invocadas.
A) Da litispendência:
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Alega a AT que, o Requerente, nos pontos 17 e 18 do seu pedido arbitral, admite que por não concordar com a decisão da AT de enquadramento no regime simplificado para o triénio 2014/2016, interpôs uma ação administrativa especial para impugnação de ato administrativo, a correr termos com o nº de processo .../15......, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de ..., que ainda não foi objeto de sentença. Sendo assim, alega a AT que estamos perante um caso de litispendência, uma vez que a causa se repete estando a anterior ainda em curso e em que se verifica identidade de sujeitos, do pedido e da causa de pedir.
Assim, considera a AT existir litispendência entre estas duas causas, o que constitui exceção dilatória que conduz à absolvição da instância, com a consequente absolvição da AT, nos termos do disposto no artigo 29.º do RJAT. conjugado com o disposto no artigo 577.º, al. i), 580.º e seguintes do Código de Processo Civil.
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Para aferir sobre a questão importa ter em conta o disposto nos artigos 580º e 581º do Código do Processo Civil (CPC), dispondo este último o seguinte:
“Artigo 581.º
Requisitos da litispendência e do caso julgado
1 - Repete-se a causa quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.
2 - Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.
3 - Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico.
4 - Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas ações procede do mesmo facto jurídico. Nas ações reais a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real; nas ações constitutivas e de anulação é o facto concreto ou a nulidade específica que se invoca para obter o efeito pretendido.”
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Assim, há litispendência quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, pedido e causa de pedir. É pressuposto fundamental para a litispendência a verificação desta tríplice igualdade. Ora, no caso em apreço, não há dúvida que os sujeitos são os mesmos, mas a causa de pedir e o pedido são distintos, pelo que não assiste razão à AT, senão vejamos:
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não há identidade de pedido, porque não se pretende obter o mesmo efeito jurídico, já que na ação interposta no Tribunal Administrativo e Fiscal de ... se pretende anular um ato administrativo e não as liquidações de imposto que deram origem à reclamação graciosa e ao presente pedido arbitral, para além do que, a decisão que venha a ser proferida no âmbito desse processo terá um efeito necessariamente diverso do que aqui se pretende quanto aos concretos atos de liquidação impugnados;
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por outro lado, também não se verifica identidade da causa de pedir, já que a pretensão deduzida nas duas ações não procede do mesmo facto jurídico, porquanto na ação em curso no Tribunal Administrativo e fiscal de ... o facto jurídico que está na sua origem é uma decisão administrativa com impacto na vida do sujeito passivo para um conjunto de períodos (anos) de tributação e, diversamente, nos presentes autos o facto jurídico que está na sua origem é a tributação concreta, de um período determinado, com expressão nos atos de liquidação de imposto e juros, reclamados e impugnados no presente pedido arbitral.
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Posto isto, conclui-se que não se verificam todos os pressupostos legais da litispendência, o que determina a improcedência da alegada exceção.
B) Da incompetência
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Importa ainda apreciar a segunda exceção de incompetência do Tribunal Arbitral, invocada pela AT, nos termos do artigo 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aplicável aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT. A AT suscita a questão da incompetência em razão da matéria, por entender que o pedido em apreço se reconduz a um pedido de decisão arbitral que determine que o Requerente se encontrava enquadrada no regime de contabilidade organizada, ou seja, o que o Requerente pretende é a declaração de ilegalidade da decisão da Administração Tributária que o enquadrou no regime simplificado de tributação, sendo que tal decisão não constitui um ato enquadrável no artigo 2.º do RJAT.
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Também nesta matéria não assiste razão à AT, porquanto, como se disse quanto ao tratamento da questão da invocada litispendência, o Requerente formula um pedido muito concreto, no qual pede a declaração de ilegalidade e anulação de atos de liquidação, que identifica especificadamente. Não está, pois, em causa nos presentes autos conhecer de qualquer outra decisão, nomeadamente, de caráter administrativo, como alega a AT. Alega a AT que “o Requerente solicita a constituição do Tribunal Arbitral com vista à obtenção da declaração de ilegalidade do despacho que indeferiu a Reclamação Graciosa n.º ...2017... do seu enquadramento no regime da contabilidade organizada, pretendendo que a liquidação de IRS relativa a 2014 reflita a opção por esse regime efectuada por si. Da leitura do requerimento inicial e dos documentos a ele anexos, conclui-se que o pedido em apreço se reconduz a um pedido de decisão arbitral que determine que o Requerente se encontrava enquadrado no regime de contabilidade organizada, devendo ter o consequente tratamento fiscal.”
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Ora, os atos interlocutórios do procedimento de liquidação (por exemplo, os que decidiram a aplicação do regime simplificado) não são impugnáveis autonomamente, por não serem lesivos, podendo ser invocada na impugnação da decisão final qualquer ilegalidade anteriormente cometida, por força do disposto no artigo 54.º do CPPT aplicável aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT.
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Como bem se decidiu no Acórdão arbitral proferido no processo nº 262/2018-T, “é à face do pedido ou conjunto de pedidos que formulou o autor que se afere a adequação das formas de processo especiais, designadamente o processo arbitral. O artigo 2.º, n.º 1, alínea a), do RJAT inclui na competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD a declaração de ilegalidade de actos de liquidação. Por isso, sendo pedida a declaração de ilegalidade de actos de liquidação, tem de se concluir este Tribunal Arbitral é competente para apreciar a pretensão dos Requerentes.”
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Em suma, a questão deve ser decidida tendo como referência “o fim para que, em cada caso concreto, se faz uso do processo se conhece através da petição inicial, pois que nesta é que o autor formula o seu pedido e o pedido enunciado pelo autor é que designa o fim a que o processo se destina, chega-se à conclusão seguinte: a questão da propriedade ou impropriedade, do processo especial é uma questão, pura e simples, de ajustamento do pedido da acção à finalidade para a qual a lei criou o respectivo processo especial».[1]
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Por tudo o que vem exposto, considerando a formulação do presente pedido arbitral, tal qual vem exposta no pedido arbitral, o qual versa sobre a impugnação de atos de liquidação de imposto, expressamente prevista no artigo 2º, nº1, alínea a) do RJAT como matéria de competência dos tribunais arbitrais constituídos no âmbito do CAAD, conclui-se pela improcedência da exceção de incompetência material suscitada pela AT.
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Pelo que, verificam-se todos os pressupostos processuais para o tribunal arbitral conhecer do pedido, pelo que, tendo em conta a prova documental junta aos autos e o alegado pelas partes, cumpre fixar a matéria de facto relevante para a decisão.
III – Decisão da Matéria de facto
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Factos Provados
23. Como matéria de facto relevante, dá o presente tribunal por assente os seguintes factos:
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O Requerente apresentou declaração de início de atividade em 02-01-2001, descrita como atividade de café, CAE 56301);
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Na declaração de início de atividade, o Requerente optou pelo regime de contabilidade organizada. quanto à tributação dos rendimentos da categoria B, apesar do valor de rendimento declarado ser inferior ao previsto na lei para aplicação obrigatória do regime da contabilidade organizada;
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Desde então e até 2013 o Requerente foi tributado por aplicação das regras da contabilidade organizada;
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O Requerente submeteu a sua declaração de rendimentos (modelo 3) referente ao ano de 2014, no prazo legal, declarou os seus rendimentos de categoria B e juntou o anexo C, para tributação segundo o regime de contabilidade organizada.
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Em 23-06-2015 foi notificado da existência de erros centrais na declaração entregue, informando-o que existia incompatibilidade entre o anexo entregue e a opção em cadastro;
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Em 05-08-2015 foi notificado por carta registada com aviso de receção pelo Serviço de Finanças de ... ..., da decisão da Direção de Serviços de registo de contribuintes informando que tinha sido enquadrado no regime simplificado de tributação para o triénio 2014-2016;
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Contra esta decisão o Requerente interpôs uma ação administrativa especial no Tribunal Administrativo e Fiscal de ... para impugnação de ato administrativo, que corre termos com o nº .../15......, a qual ainda não obteve decisão;
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Em 06-04-2017, o Requerente foi notificado para submeter a declaração de rendimentos modelo 3 de 2014, no prazo de 30 dias, sob cominação que, findo aquele prazo sem apresentação de declaração nos termos pretendidos pela AT, seria esta a promover a emissão da liquidação de IRS com base nos elementos ao seu dispor;
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Em 19-06-2017 o Requerente foi notificado da liquidação oficiosa de IRs nº 2017 ... e da demonstração de liquidação de juros nº 2017 ... do ano de 2014;
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Esta liquidação foi emitida tendo como base o valor de rendimento global de €145.083,03;
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O Requerente apresentou Reclamação Graciosa contra as liquidações referidas por não concordar com a sua inclusão no regime simplificado de tributação e por discordar da aplicação efetuada, sem considerar os diferentes índices aplicáveis a cada tipo de rendimentos da categoria B;
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A reclamação graciosa foi parcialmente deferida, porquanto a AT manteve o seu entendimento quanto à aplicação do regime simplificado de tributação, mas corrigiu os índices aplicáveis a cada tipo de rendimento, corrigindo a liquidação na parte em que aplicara apenas um índice de 0,75 a todo o rendimento da categoria B;
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Em consequência foi emitida nova demonstração de liquidação nº 2018..., demonstração de liquidação de juros nº 2018... e demonstração de acerto de contas nº 2018..., do ano de 2014, com valor a pagar de 20.187,80€.
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Em 03-05-2018, o Requerente apresentou pedido arbitral para impugnação da decisão de indeferimento parcial da reclamação graciosa, que processou a liquidação de IRS de 2014 com base na aplicação do regime simplificado;
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FACTOS NÃO PROVADOS
24. Não existem outros factos relevantes para a decisão que devam considerar-se como não provados.
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FUNDAMENTAÇÃO DOS FACTOS PROVADOS
25. O tribunal não tem que se pronunciar sobre todos os detalhes da matéria de facto que foi alegada pelas partes, cabendo-lhe o dever de selecionar os factos que interessam à decisão e discriminar a matéria que julga provada e declarar a que considera não provada (cfr. artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT). Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são selecionados e conformados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções para o objeto do litígio no direito aplicável (artigo 596.º, n. 1 do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
Tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º, n.º 7 do CPPT, à prova documental junta aos autos pelo Requerente e a que consta do próprio processo administrativo, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.
IV – Decisão da Matéria de Direito
26. Está em causa nos presentes autos aferir da legalidade do ato de deferimento parcial da reclamação graciosa e das liquidações de imposto e juros emitidas em conformidade com aquela decisão, impugnadas no presente pedido arbitral.
Com relevância para a decisão do caso, destaca-se que o Requerente optou pela aplicação do regime de contabilidade organizada em 2001, quando iniciou a sua atividade, com rendimentos por si declarados, inferiores ao limite estabelecido na lei a partir do qual aquele regime se assume como obrigatório. Ou seja. Não há dúvida que essa foi a sua opção, não por prever rendimentos superiores ao limite legal mas por desejar, qualquer que fosse o rendimento real obtido, ser tributado de acordo com as regras da contabilidade organizada.
Desde então e até 2013, foi sempre tributado de acordo com as regras da contabilidade organizada.
No ano de 2014, apresentou a sua declaração de rendimentos da categoria B, mais uma vez de acordo comas regras da contabilidade organizada, tendo entregue o anexo C. No ano em causa (2014) o Requerente teve rendimentos da categoria B inferiores ao valor legalmente previsto para aplicação automática do regime da contabilidade organizada.
Já em 2015-08-05, o Requerente foi notificado que tinha sido enquadrado para o triénio
2014/2016 no regime simplificado, uma vez que, conforme fl.4 do processo administrativo 2ª parte:
27. Na sua resposta a AT alegou que, “de 2002 até 2013, o Requerente ficou integrado no regime da contabilidade organizada por imposição legal, uma vez que o montante anual ilíquido de rendimentos da categoria B ultrapassava o limite legal previsto no n.º 2 do art. 28.º do CIRS.”
Entende a AT que, nos termos do n.º 6 do artigo 28.º do CIRS, o Requerente ao ultrapassar os montantes indicados no n.º 2 do mesmo artigo, ficou enquadrado no regime regra de contabilidade organizada, por imposição legal, mantendo-se no mesmo até 2013. No ano de 2013 com efeito a partir de 2014, porque obteve rendimentos inferiores ao limite legal e não optou pelo regime da contabilidade organizada, ficou a partir de então no regime simplificado de tributação. Fundamenta este seu entendimento no disposto no n.º 2 do art. 28º do CIRS dispõe que: “Ficam abrangidos pelo regime simplificado os sujeitos passivos que, no exercício da sua actividade, não tenham ultrapassado no período de tributação imediatamente anterior um montante anual ilíquido de rendimentos desta categoria de € 200.000,00.”
Assim, segundo a AT em 2013, o Requerente declarou, referente aos rendimentos da categoria B, um rendimento de € 9.526,88 de vendas e € 176.266,51 de prestações de serviços, montante este inferior ao limite do n.º 2 do art. 28.º CIRS, pelo que reuniu os pressupostos de enquadramento no regime simplificado, o qual teve efeitos no período de tributação de 2014. Reconhece que em 2001, o Requerente OPTOU pelo regime da contabilidade organizada quanto à tributação dos rendimentos da categoria B, mas como ultrapassou os montantes previstos no n.º 2 e n.º 6 do art. 28.º do CIRS, ficou enquadrado por imposição legal, no regime da contabilidade organizada relativo à tributação dos rendimentos da categoria B.
28. Resulta do que vem exposto que a questão essencial a decidir é saber se a interpretação da AT quanto ao disposto no artigo 28º do CIRS.
Com a redação da Lei n.º 83-C/2013, o n.º 2 do artigo28.º do CIRS passou a estabelecer o seguinte:
“ 2 - Ficam abrangidos pelo regime simplificado os sujeitos passivos que, no exercício da sua atividade, não tenham ultrapassado no período de tributação imediatamente anterior um montante anual ilíquido de rendimentos desta categoria de (euro) 200 000.”
A Autoridade Tributária e Aduaneira interpretou esta norma como determinando a aplicação do regime simplificado a todos os contribuintes que até aí estavam sujeitos ao regime de contabilidade organizada por imposição legal e, entendendo que era a esta a situação do Requerente, impôs-lhe a aplicação do regime simplificado, por não ter manifestado até ao fim do mês de março de 2014 a opção pelo regime de contabilidade organizada.
29. Os contribuintes da categoria B de IRS podem ficar sujeitos ao regime de contabilidade por opção ou por imposição legal. O Requerente ficou sujeita ao regime de contabilidade organizada por opção manifestada em 2001 e, posteriormente, também por imposição legal, por os rendimentos da categoria B que veio a auferir serem sempre superiores ao limite legal previsto no artigo 28.º, n.º 2, do CIRS, nas redações anteriores à Lei n.º 83-C/2013.
A este propósito passamos a citar a jurisprudência vertida no Acórdão arbitral proferido no processo 262/2018-T, à qual se adere integralmente., que passamos a citar:
“Há, assim, dois fundamentos jurídicos para ser aplicável ao Requerente o regime de contabilidade organizada, cada um deles para, por si só, determinar a aplicação desse regime.
E, obviamente, quando uma situação jurídica tem dois fundamentos autónomos, cada um deles suficiente para, por si só, lhe dar suporte jurídico, o facto de deixar de subsistir um deles não obsta à manutenção da situação com base no outro.”
30. Assim, o essencial da questão é saber se a opção inicial do Requerente pela aplicação do regime de contabilidade organizada, expressa na sua declaração de início de atividade, deixa de ter relevância pelo facto de, posteriormente, ser obrigatória a aplicação desse regime, por os rendimentos auferidos não serem compatíveis com a aplicação do regime simplificado.
No n.º 2 do artigo 28.º do CIRC, vigente em 2001, quando o Requerente iniciou a sua atividade, indicava-se que ficavam abrangidos pelo regime simplificado os sujeitos passivos que, não tendo optado pelo regime de contabilidade organizada, não tenham ultrapassado na sua atividade, no período de tributação imediatamente anterior qualquer dos limites de os limites de volume de vendas ou valor ilíquido dos restantes rendimentos da categoria B. (sublinhado nosso)
31. Pelo que, no caso do Requerente, resulta provado que ele optou pelo regime de contabilidade organizada, pelo que ficou afastada a aplicação do regime simplificado.
Acresce que, nos restantes números deste artigo 28.º (versão em vigor em 2001) não se previa qualquer cessação de aplicação do regime de contabilidade organizada por opção do sujeito passivo, mas antes as situações em que cessava o regime simplificado.
Com a redação que a Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro deu ao n.º 5 do artigo 28.º, que ainda se encontra em vigor, passou a existir um período mínimo de permanência no de três anos em qualquer dos regimes, “prorrogável por iguais períodos, excepto se o sujeito passivo comunicar, nos termos da alínea b) do número anterior, a alteração do regime pelo qual se encontra abrangido”.
32. Ora, ficou provado que o Requerente não comunicou qualquer alteração do regime pelo qual se encontrava abrangido. Assim, tendo sido efetuada a opção pelo regime de contabilidade organizadas e não tendo a Requerente comunicado a alteração do regime, a aplicação do regime de contabilidade organizada foi-se prorrogando, por períodos de três anos, sucessivamente, o que inclui o ano de 2014 aqui em causa.
Neste sentido se tem pronunciado a jurisprudência arbitral, nomeadamente nos processos nºs 262/2018-T; 300/2018-T, 295/2017-T, 114/2017-T, entre outros. Acresce que, também a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo no acórdão de 11 de maio de 2016, proferido no processo n.º 01536/15, decidiu que “tendo os contribuintes optado por serem tributados com base na sua contabilidade não pode a Administração Tributária vir a enquadrá-los no regime simplificado de tributação». Como se refere no mesmo acórdão, «a Administração Tributária não podia ter-se substituído aos contribuintes nessa opção, porque não foi ultrapassado o período mínimo de permanência no regime escolhido, mas, sobretudo, porque apenas os sujeitos passivos podem optar por diverso regime, excepto quando estando enquadrados no regime simplificado excederem o montante de rendimentos antes indicado por dois períodos sucessivos – art.º 28.º, n.º 6 do CIRS”.
Como se refere no acórdão arbitral proferido no proc. 262/2018-T, “A Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, não alterou este regime, limitando-se, no que aqui interessa, a aumentar o valor de rendimentos a partir do qual é obrigatória a aplicação do regime de contabilidade organizada, não impondo a sua cessação.
Como se refere naquele acórdão STA, «se a permanência no regime simplificado implica que os sujeitos passivos, no exercício da sua atividade, não tenham ultrapassado no período de tributação imediatamente anterior um montante anual ilíquido de rendimentos desta categoria de (euro) 200 000, não há qualquer requisito específico quanto ao valor dos rendimentos auferidos para que os mesmos possam optar pela determinação dos rendimentos com base na contabilidade».
33. Em síntese, não existe qualquer disposição legal que permita concluir que a opção pelo regime de contabilidade organizada deixe de ter qualquer relevância, pelo facto de passar a ser obrigatória a aplicação desse regime face aos rendimentos anuais obtidos, desconsiderando-a quando estes voltem a ser inferiores ao limite de valor legal. Tal interpretação não tem cabimento legal.
34. Pelo exposto, a decisão que versou sobre a Reclamação Graciosa e as liquidações subjacentes, todas impugnadas nos autos, assentam no pressuposto errado de que ao Requerente seria aplicável o regime simplificado, e nessa medida enfermam de vício de violação de lei, que impõe a sua anulação.
V. Decisão
Em conformidade com o exposto, decide este Tribunal Arbitral:
a) Julgar improcedentes as exceções de litispendência e de incompetência material invocadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira;
b) Julgar totalmente procedente o pedido de pronúncia arbitral;
c) Declarar a ilegalidade e anular todos os atos tributários impugnados, com todas as consequências legais.
VALOR DO PROCESSO
Fixa-se o valor do processo em 20.187,80 nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do CPPT, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
CUSTAS
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em €1.224,00, nos termos da Tabela II do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 5º do citado Regulamento, a pagar pela parte vencida,
Notifique.
Lisboa, 28-12-2018
O Tribunal Arbitral Singular,
(Maria do Rosário Anjos)
[1] Cfr. neste sentido, ALBERTO DOS REIS, in Código de Processo Civil Anotado, volume II, páginas 288-289,