Decisão Arbitral (consultar versão completa no PDF)
Os árbitros Cons. Jorge Manuel Lopes de Sousa (árbitro-presidente, designado pelos outros Árbitros), Dr. Pedro Manuel Paes de Vasconcellos e Silva e Dr. Emanuel Augusto Vidal Lima, designados pela Requerente e pela Requerida, respectivamente, para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 30-01-2018, acordam no seguinte:
1. Relatório
A…, S.A., portadora do número de identificação de pessoa colectiva …, com sede na Avenida …, n.º …, em …, sociedade anteriormente designada por B..., S.A., apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (doravante, abreviadamente designado “RJAT”), visando, a título principal, a anulação da decisão de indeferimento do recurso hierárquico, proferida pelo Subdiretor-geral da AT, em 14-08-2017, bem como das liquidações de IVA e juros compensatórios respeitantes ao período de 2013 com os n.ºs 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ... e 2015 ..., no montante global de € 7.434.640,98.
A título subsidiário, a Requerente pede a anulação da decisão de indeferimento do recurso hierárquico e das liquidações de IVA e juros compensatórios, respeitantes ao período de 2013 melhor identificadas supra, na parte correspondente ao montante das indemnizações que foram faturadas pela Requerente e que nunca chegaram a ser efetivamente pagas pelos seus (antigos) clientes ou, em alternativa, assegurar-se à Requerente o recurso eficaz ao mecanismo da regularização do imposto que se considere incidir sobre as indemnizações faturadas e não pagas.
A Requerente pede ainda que seja fixada indemnização por garantia indevidamente prestada.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 14-11-2017.
Em 08-08-2018 o Senhor Presidente do CAAD informou as Partes da designação dos Árbitros, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 7 do artigo 11.º do RJAT.
Assim, em conformidade com o preceituado no n.º 7 do artigo 11.º do RJAT, decorrido o prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do RJAT sem que as Partes nada viessem dizer, o Tribunal Arbitral Colectivo ficou constituído em 30-01-2018.
A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta em que defendeu a suspensão da instância até decisão do processo C-295/17, do TJUE e que seja julgado improcedente o pedido de pronúncia arbitral.
Por despacho de 07-03-2018 foi decidido suspender a instância até que fosse proferida decisão pelo TJUE no processo n.º C- 295/17.
Tendo sido proferido pelo TJUE decisão naquele processo, foi, por despacho de 23-11-2018, dispensada a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas simultâneas por um período de 10 dias.
As Partes apresentaram alegações.
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é competente. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas.
Não há obstáculos à apreciação do mérito da causa.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos:
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A A... é uma sociedade anónima, cujo objecto social consiste no estabelecimento, concepção, construção, gestão e exploração de redes e infra-estruturas de comunicações electrónicas, bem como na prestação de serviços de comunicações electrónicas e de transporte e difusão de sinal de telecomunicações (documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
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Em sede de IVA, a Requerente está enquadrada no regime normal de periodicidade mensal e é sujeito passivo que realiza operações sujeitas a IVA;
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Foi realizada uma acção inspectiva à Requerente relativa ao exercício de 2013 em que, depois do exercício do direito de audição, foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária que consta do documento apresentado pela Requerente em 06-12-2018, cujo teor se dá como reproduzido em que se refere, além do mais o seguinte:
III.2. IVA
III.2.1. Imposto não liquidado - Indemnizações por incumprimento do período de fidelização contratual - €6.882.275,09
A B..., no âmbito da contratação com os seus clientes, firmou contratos de prestações de serviços, mais precisamente, contratos de prestação de serviços de acesso à internet em banda larga, e contratos de prestação de serviços de televisão e multimédia 38 [Serviço de distribuição de televisão e, quando aplicável, a colocação à disposição de conteúdos áudio e vídeo e disponibilização de serviços interativos e outros relacionados (“serviço”)], no âmbito dos quais foram estabelecidos períodos
mínimos de vigência contratual bem como as indemnizações a pagar pelo cliente no caso de desativação de produtos e serviços, por sua iniciativa, antes de decorrido o período acordado.
Relativamente a estes contratos celebrados foi solicitada, à semelhança do ocorrido na auditoria ao período de 2012, a explicação da composição e forma de cálculo do montante faturado aos clientes, decorrente da rescisão, bem como a posição financeira das faturas emitidas em 2013 para esta situação.
Na resposta fornecida a B... não acrescentou quaisquer outros elementos adicionais aos previamente fornecidos no procedimento inspetivo ao período de 2012, conforme se detalha de seguida:
Serviços de acesso à internet em banda larga
Relativamente ao serviço de acesso à Internet em Banda Larga, o qual inclui, nomeadamente, a disponibilização de serviços de correio eletrónico e páginas pessoais (adiante “serviço”), estabelece-se o infra transcrito:
“10.1. As presentes Condições Específicas entram em vigor na data de adesão e vigoram pelo período mínimo inicial que, naquela data, estiver definido nas condições de oferta do serviço, devidamente publicitadas pela B…; se nada estiver definido nas condições de oferta do serviço, considera-se que tal período é de 12 (doze) meses.(…)”
10.5. Em caso de rescisão das presentes Condições Específicas, pelo CLIENTE ou por motivo ao mesmo imputável, antes de decorrido o período mínimo de vigência, a B… terá direito a receber uma indemnização calculada da seguinte forma: (período mínimo de vigência – nº de meses em que os serviços estiveram ativos) x (valor da mensalidade).
10.6. Para efeitos do disposto na Condição anterior, o valor a tomar em consideração será o valor da mensalidade de tarifário pós-pago mais baixa que esteja em vigor à data de rescisão.”
Prestação do serviço de televisão e multimédia
No que concerne à Prestação do serviço de televisão e multimédia, determina-se o seguinte:
“12.1. As presentes Condições Específicas entram em vigor na data de adesão e vigoram pelo período mínimo inicial de 24 (vinte e quatro) meses, salvo nos casos em que o CLIENTE opte por contratar o serviço pelo período mínimo inicial de 12 (doze) meses, de acordo com o tarifário em cada momento em vigor.
12.4. Em caso de rescisão das presentes Condições Específicas, pelo CLIENTE ou por motivo ao mesmo imputável, antes de decorrido o período mínimo de vigência, a B… terá direito a receber uma indemnização calculada da seguinte forma: (período mínimo de vigência - nº de meses em que os serviços estiveram ativos) x (valor da mensalidade).”
Em função do exposto a montante, infere-se que, caso não seja cumprido o período contratual mínimo estabelecido, a B... tem direito a receber uma indemnização dos seus clientes calculada tendo em conta o número de meses que faltavam para completar o período acordado multiplicado pelo valor da mensalidade acordada.
Da contabilização
Em matéria de contabilização, de acordo com a NCRF 20 – Rédito39 [Prescreve o tratamento contabilístico do rédito, entendidos como os rendimentos que surjam no decurso de actividades ordinárias de uma entidade, como por exemplo, vendas, honorários, juros, dividendos e royalties.] ponto 22 “O rédito somente é reconhecido quando for provável que os benefícios económicos associados à transacção fluam para a entidade. Porém, quando surja uma incerteza acerca da cobrabilidade de uma quantia já incluída no rédito, a quantia incobrável, ou a quantia com respeito à qual a recuperação tenha cessado de ser provável é reconhecida como um gasto (…)”.
Nesta sequência, considerando a incerteza que subjaz ao recebimento destes valores, o sujeito passivo, no momento da emissão da fatura, reconhece o valor na conta snc 282 - Rendimentos a Reconhecer (conta PIC 2171220000 – Proveitos Diferidos - Fact Antecip-CP-Fact. Indemnização), apenas reconhecendo em resultados quando existe certeza de que irá receber do seu cliente.
Do Enquadramento Fiscal
No que respeita ao enquadramento em sede do imposto sobre o valor acrescentado, constatou-se que o sujeito passivo não liquidou IVA sobre as indemnizações faturadas aos seus clientes em 2013, por entender que as referidas indemnizações se encontram fora do campo do referido imposto.
Sobre este entendimento já a B... se havia pronunciado, no âmbito do procedimento inspetivo ao período de 2012, através de e-mail, datado de 19 de novembro de 2012, afirmando que: “No âmbito da sua atividade, a B..., S.A., doravante sob a forma abreviada “B...”, celebra contratos de prestação de serviços de comunicações de voz fixa, banda larga fixa e televisão, nos quais é usual o estabelecimento de condições promocionais vantajosas, sendo que estas condições estão, em regra, associadas a uma contrapartida: o compromisso assumido pelo cliente de permanecer vinculado ao contrato por um determinado período mínimo de vigência deste.
O incumprimento, por parte do cliente, das obrigações contratuais a que se encontra adstrito, designadamente a falta de pagamento pontual, implica o pagamento de uma indemnização à B....
Na situação em apreço não se verifica uma relação entre os montantes devidos à B... a título de indemnização e a realização de prestações de serviços correlativas pois que a obrigação de indemnização deriva do incumprimento contratual dos clientes, cujo efeito imediato é a suspensão do serviço de comunicações por parte da B... e a rescisão do contrato. Assim, é a não prestação dos serviços pelo período mínimo acordado que fundam o direito à indemnização na esfera da B.... Por um lado, a indemnização deriva do prejuízo inegável que é causado à B... pela não prossecução da prestação de serviços de comunicações por determinado período de tempo, que seria geradora de volume de negócios e de lucro para a empresa. Por outro lado, o montante indemnizatório a receber pela B... não dá à “contraparte” o direito a uma prestação de qualquer natureza. Efetivamente o pagamento da indemnização pelos clientes não gera qualquer obrigação recíproca a cargo da B..., destinando-se os montantes que lhe são entregues à compensação, acima assinalada, dos danos sofridos em consequência do incumprimento contratual, designadamente os relativos ao investimento inicial implícito na oferta de condições promocionais vantajosas, subjacente aos contratos de fidelização. Por conseguinte, a indemnização em apreço não é objeto de tributação em IVA.
No decorrer do presente procedimento inspetivo foi novamente solicitado ao sujeito passivo para confirmar se foi liquidado IVA nestas operações e em caso negativo justificar a sua não liquidação, tendo sido fornecida uma justificação idêntica à acima descrita.
Neste contexto, e para melhor descortinar a moldura jurídico-fiscal na qual deverá inserir-se a questão de facto, chama-se à colação o artigo 562.º do Código Civil (CC), no qual se encontra o princípio geral relativo à obrigação de indemnização. Ali pode ler-se o seguinte:
“Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação.”. Chama-se a atenção para o facto de este princípio geral fazer expressa menção do termo “dano”, circunstância a que voltaremos em momento mais adiantado.
Importa agora, com vista a um esclarecimento mais cabal da problemática em análise, lançar mão da doutrina relativa a esta matéria pelo que, uma vez que se mostra pertinente para a apreciação em causa, atentamos, de seguida, no explanado por Mário Júlio de Almeida Costa (Direito das Obrigações, 6.ª edição) a propósito da cláusula penal.
“Define-se a cláusula penal como a estipulação em que num negócio jurídico, designadamente num contrato, as partes fixam o montante da indemnização para o caso do seu incumprimento (art. 810.º, n.º 1). À indemnização estabelecida corresponde o nome de pena convencional, embora se exclua tratar-se de autêntica pena num sentido técnico-jurídico, a que se liga ideia repressiva ou preventiva e não a da própria reparação de danos.
Pode acordar-se a cláusula penal tendo em vista a completa e definitiva inexecução do contrato, nomeadamente da obrigação principal, ou tão-só a infracção de uma das suas cláusulas, a simples mora ou atraso no cumprimento e ainda o cumprimento defeituoso (art.º 811.º, n.º 1). Em qualquer dos casos, a cláusula penal, no sistema da nossa lei, avulta como fixação antecipada da indemnização – compensatória ou apenas moratória –, isto é, dirige-se à reparação de danos.
(…) a cláusula tem valor fixo – nem mais nem menos – quer os prejuízos se apresentem na realidade inferiores ou superiores ao seu quantitativo. A lei perspectiva-a como liquidação antecipada («à forfait») dos danos, que as partes acordam livremente, apenas com ressalva dos preceitos imperativos.(…) A proibição do recurso à indemnização nos termos gerais e o carácter supletivo dessa proibição decorrem do n.º 2 do art.º 811.º do Cód. Civ.. Nele se declara que «o estabelecimento da cláusula penal obsta a que o credor exija indemnização pelo dano excedente, salvo se for outra a convenção das partes».(…)
As mais das vezes, a cláusula penal representa unicamente uma liquidação antecipada da reparação, sem que se modifiquem os princípios gerais de que depende a responsabilidade do devedor. Quer dizer, via de regra, todo o alcance da cláusula penal consiste em fixar um quantitativo indemnizatório que substitui o que o juiz arbitraria se aquela não existisse.” – sublinhados nossos.
Como deriva do supra transcrito, a cláusula penal configura uma estipulação através da qual as partes fixam o montante da indemnização em caso de incumprimento. Textualmente, estabelece o n.º 1 do art.º 810.º do CC que “As partes podem, porém, fixar por acordo o montante da indemnização exigível: é o que se chama cláusula penal”.
Trata-se, pois, de uma forma convencionada pelas partes para ressarcir, indemnizar, eventuais danos que venham a ocorrer na vigência do contrato.
Observamos agora o exposto pelo mesmo autor, ob. cit., relativamente ao dano e, de forma mais concreta, no que respeita à classificação que distingue o dano emergente e o lucro cessante.
“Na perspectiva da responsabilidade civil, cabe dizer-se, liminarmente, que dano ou prejuízo é toda a ofensa de bens ou interesses alheios protegidos pela ordem jurídica. Várias classificações procuram estabelecer as espécies e a natureza do dano. (…) Uma classificação muito divulgada consiste na que se faz a partir do dano emergente («damnum emergens») e do lucro cessante («lucro cessans»).
Atende-se à configuração do prejuízo realmente suportado. Deste modo: o dano emergente compreende a perda ou diminuição de valores já existentes no património do lesado; e o lucro cessante refere-se aos benefícios que ele deixou de obter em consequência da lesão, ou seja, ao acréscimo patrimonial frustrado (art. 564.º, n.º 1).”.
Resulta daqui que, quer o dano emergente, quer o lucro cessante são tipos de dano e, como se disse a montante, o princípio geral relativo à obrigação de indemnização refere-se a quem estiver obrigado a reparar um dano. Deste modo, a dicotomia entre dano emergente e lucro cessante não coloca em causa, no âmbito do direito obrigacional, o facto de a ambos corresponder uma indemnização como forma de reconstituir uma determinada situação.
A propósito destes dois conceitos, cita-se agora o Acórdão do Supremo Tribunal Justiça (STJ) nº 04B3907 de 16.12.2004:
“3ª O conceito de lucros cessantes tem sido, ao longo dos anos, de tal modo analisado, dissecado e elaborado, que a Jurisprudência e a Doutrina, construíram opinião pacífica no sentido de corresponderem à frustração de ganhos e benefícios, ou ao não aumento do património [Sublinhado nosso.] que, segundo o curso normal e provável da actividade, teriam sido obtidos, se não fosse o acto lesivo. No caso de comerciante ou industrial, a perda de ganhos corresponderia a receitas ou vendas que deixou de obter e à perda do "lucro líquido" que lhe proporcionaria tais receitas.
Conforme ensina o Prof. Galvão Teles, "Direito das Obrigações", 6ª ed., pág. 373, «Os danos emergentes traduzem-se numa desvalorização do património, os lucros cessantes numa sua não valorização. Se diminui o activo ou aumenta o passivo, há um dano emergente (damnum emergens); se deixa de aumentar o activo [Sublinhado nosso.] ou de diminuir o passivo, há um lucro cessante (lucrum cessans). Ali dá-se uma perda, aqui a frustração de um ganho.»
Não obstante, e recentrando agora a observação em curso a partir de um ponto de vista fundamentalmente fiscal, o cerne da presente questão estará em verificar se, subjacente à indemnização, se encontra, ou não, uma transmissão de bens ou prestação de serviços, ou seja, se lhe é inerente um caráter remuneratório.
O IVA, como imposto sobre o consumo e que corresponde, basicamente, ao disposto na Diretiva 2006/112/CE [anterior 6ª Diretiva] do Conselho (doravante Diretiva), visa tributar a contraprestação de operações tributáveis [Artº 1º da Diretiva 2006/12/CE – “1. A presente directiva estabelece o sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (IVA). // 2. O princípio do sistema comum do IVA consiste em aplicar aos bens e serviços um imposto geral sobre o consumo exactamente proporcional ao preço dos bens e serviços, seja qual for o número de operações ocorridas no processo de produção e de distribuição anterior ao estádio de tributação. Em cada operação, o IVA, calculado sobre o preço do bem ou serviço à taxa aplicável ao referido bem ou serviço, é exigível, com prévia dedução do montante do imposto que tenha incidido directamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço. O sistema comum do IVA é aplicável até ao estádio do comércio a retalho, inclusive”.] e não a indemnização de prejuízos que não tenham caráter remuneratório.
O conceito de prestação de serviços constante da Diretiva [art. 24º da Diretiva] é residual, na medida em que como prestação de serviços se entende qualquer prestação que não seja uma transmissão de bens.
Após esta formulação residual a Diretiva dá exemplos [art. 25º da Diretiva] de prestações de serviços, incluindo-se aqui “a obrigação de não fazer ou de tolerar um acto ou uma situação.”, obrigação de conteúdo negativo (não praticar determinado ato).
De acordo com o n° 1 do artigo 3° do CIVA, considera-se, em geral, transmissão de bens a transferência onerosa de bens corpóreos por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade, considerando-se, nos termos do n° 1 do artigo 4° do CIVA, como prestações de serviços as operações efetuadas a título oneroso que não constituam transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens.
Alinhado com a legislação comunitária, o conceito de prestação de serviços dado pelo artigo 4.º tem um carácter residual, sendo consideradas como prestações de serviços as prestações efetuadas a título oneroso que não constituam transmissões ou importações de bens.
O IVA incide sobre toda a atividade económica, que mais não é que um operador prestar serviços ou transmitir bens (à exceção de determinados casos particulares) ao beneficiário económico, o qual terá de ceder uma determinada contraprestação, existindo, neste sentido, um vínculo sinalagmático.
Deste modo, de acordo com o ante exposto, o critério a adotar para discernir se uma determinada indemnização está sujeita a tributação em sede de IVA estará relacionado com a existência de uma reposição de rendimento, que compense um acréscimo patrimonial não verificado na sequência da lesão, isto é, de um caráter remuneratório associado à indemnização. E assim sendo têm subjacente uma atividade económica, pressuposto da tributação em IVA.
Cumpre, portanto, aferir se a indemnização se destina a compensar os lucros cessantes, ou seja, a repor o nível de rendimento que, por força de um dano, o sujeito passivo deixou de obter.
Dito de outro modo, há que apurar se o pagamento visou repor o rendimento que seria obtido através da prestação de serviços, caso o cliente não tivesse quebrado a relação contratual.
Na situação em exame será aquela a realidade em causa uma vez que a indemnização controvertida teve essa finalidade, como pode constatar-se do próprio contrato, concretamente dos seus pontos 10.5 e 12.4. das condições específicas de prestação de serviços de acesso à internet em banda larga e de serviços de televisão e multimédia, respetivamente, nos quais pode ler-se o seguinte:
“Em caso de rescisão das presentes Condições Específicas, pelo CLIENTE ou por motivo ao mesmo imputável, antes de decorrido o período mínimo de vigência, a B… terá direito a receber uma indemnização calculada da seguinte forma: (período mínimo de vigência – nº de meses em que os serviços estiveram ativos) x (valor da mensalidade).”.
Assim, e na medida em que do próprio texto do contrato se retira o carácter remuneratório da indemnização, será de considerar que a mesma se encontra sujeita a IVA.
De facto, do modo de cálculo da própria indemnização se infere que esta visou compensar a B... de uma perda de receitas no pressuposto de que tinha “ (…), no momento da lesão, um direito ao ganho que se frustrou, ou melhor, a titularidade de uma situação jurídica que, mantendo-se, lhe daria direito a esse ganho.» - cfr. acórdão do S.T.J de 23/5/78., B.M.J. nº 277; pág. 258.” Cf, Acórdão (STJ) nº 04B3907 de 16.12.2004, anteriormente citado.
Também a razão pela qual a B... justifica a existência de um período mínimo de vigência contratual, concretamente “(…) pela existência de custos de investimento no equipamento indispensável à prestação do serviço, bem como pelos custos de activação do serviço e ainda de angariação“ [Pontos 10.7 e 12.6 dos contratos de serviço de acesso à Internet em banda larga e do serviço de televisão e multimédia, respetivamente.], reflectem que a recuperação do investimento será garantida, pelas receitas obtidas ao longo do período de fidelização ou caso aquele seja descontinuado (via desistência do cliente) o retorno mantém-se pela via da indemnização, visto que a mesma acomoda as receitas dos meses que faltam para o términus do contrato.
Fica assim garantido o mesmo nível de lucro. A B... não teve prejuízos na modalidade de lucros cessantes, porque contratualmente foi fixada a indemnização que incorpora esses lucros.
O que a B... visa refazer não é o investimento efetuado – esse permanece tal como foi feito – o que pretende, afinal, é conseguir receitas para recuperar esse investimento, numa ótica económica.
Este desiderato é alcançado através da existência do período de fidelização ou quando este não é cumprido pelo débito de uma indemnização.
Concluindo-se deste modo que esta indemnização integra o conceito de lucro cessante e como tal é sujeita a IVA.
A corroborar o antedito recupera-se o teor da informação fornecida pela B..., anteriormente mencionada, “Assim, é a não prestação dos serviços pelo período mínimo acordado que fundam o direito à indemnização na esfera da B.... Por um lado, a indemnização deriva do prejuízo inegável que é causado à B... pela não prossecução da prestação de serviços de comunicações por determinado período de tempo, que seria geradora de volume de negócios e de lucro para a empresa.(…)”.
Com a rescisão do contrato por iniciativa do cliente, antes de terminado o período contratualmente estabelecido, a B… viu diminuídos os seus lucros por perda de receita, a que corresponde um não aumento do seu património (por via do valor recebido dos seus clientes). Não se verificou uma diminuição do património existente (situação de dano emergente) mas sim um não aumento deste, pela via da perda da receita, conforme refere a citação do Prof. Galvão Teles, já mencionada.
Acresce ainda que, segundo alegações do próprio sujeito passivo, o facto de, emergindo estas indemnizações de relações contratuais que por parte da B... consubstanciam “ (…) estabelecimento de condições promocionais vantajosas “ e da parte do cliente “ o compromisso assumido (…) de permanecer vinculado ao contrato por um determinado período mínimo de vigência deste.”, que as mesmas surgem no âmbito do exercício de atividade económica e concomitantemente relacionadas com
a prestações de serviços de telecomunicações, que é a atividade da B....
De forma a corroborar a posição ora defendida, cita-se agora o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) nº 01158/11 de 31.10.2012, cuja posição sufraga de forma inequívoca o entendimento aqui propugnado:
“Em face de tudo o que vai exposto, somos de concluir, em conformidade com o consignado no douto Parecer do Ministério Público, segundo o qual é preciso distinguir:
a) A indemnização paga pela seguradora, “(…) destinada à compensação do dano causado pela perda do bem”, a mesma deve considerar-se excluída da incidência objectiva de IVA, “na medida em que não assume a natureza de contraprestação pela transmissão de um bem ou prestação de um serviço (arts. 1º n.º 1, 4º n.º 1 e 16 n.º 1 CIVA)”;
b) As quantias pagas pelo locatário à locadora, sendo pagas “complementarmente à locadora pelos locatários não revestem natureza ressarcitória (porque não se destinam à compensação de perdas e danos) antes radicam no cumprimento de obrigações contratualmente assumidas (em cada uma das categorias de contratos em causa). Tendo estes contratos a natureza de contratos de prestação de serviços, aquelas quantias representam, ainda, contraprestações de operações tributáveis em IVA”.
Conclui-se, assim, que as presentes indemnizações visam compensar rendimentos cessantes e decorrem do cumprimento de obrigações contratualmente assumidas no âmbito de contratos de prestações de serviços, pelo que representam uma contraprestação de operações tributáveis em IVA.
Em termos de enquadramento no Código do IVA as indeminizações em crise constituem uma contrapartida por uma prestação de serviços, sujeita e não isenta, nos termos do n.º 1 do artigo 4.º, ocorrendo o facto gerador e consequentemente sendo o imposto devido no momento da emissão da fatura, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 8.º, sendo o valor tributável o da indemnização, de acordo com o n.º 1 do artigo 16.º, sendo aplicável a taxa de 23%, prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 18.º, todos do Código do IVA.
Neste seguimento, importa proceder à quantificação da base tributável distribuída por meses, tendo, para o efeito, sido solicitada ao sujeito passivo, (mail de 23.04.2015) a listagem de todas as faturas emitidas a clientes durante o ano de 2013, com a indicação do seu valor e período de emissão e relativas a situações de rescisão de contrato antes de decorrido o período mínimo de vigência do mesmo (prazo de fidelização).
Na sequência do pedido foi fornecido um ficheiro excel com a informação requerida. Da análise e tratamento informático realizado aos dados fornecidos pela B..., foi possível obter um ficheiro com os seguintes elementos identificativos para cada registo/fatura: número e referência da fatura; data, período e valor da fatura; nome e número do cliente; descritivo do serviço e taxa de IVA. Deste universo de dados devidamente organizados, foram analisados os valores por tipo / motivo de indemnização de onde foram considerados como sujeitos a imposto, os constantes do Anexo VI (fls. 1) e que totalizam o valor de €6.882.275,09, relativo a faturas pagas e por pagar.
Posto isto, faz-se neste contexto notar que a metodologia utilizada tem presente o teor do artigo 75º da Lei Geral Tributária (LGT), com a epígrafe “Declaração e outros elementos dos contribuintes”, segundo o n.º 1 do qual “Presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal”, donde se origina
também uma especial vinculação entre os elementos disponibilizados e os resultados ora obtidos.
Assim, com base nos dados obtidos da verificação e validação efetuada aos elementos disponibilizados pelo sujeito passivo, foi possível apurar um montante total de €29.922.907,46, correspondente a indemnizações faturadas a clientes, em que não foi liquidado IVA, ao qual corresponde um valor total de IVA em falta, à taxa normal, de €6.882.275,09 (Anexo VII em CD).
Em síntese, à luz do anteriormente exposto, conclui-se que estas indemnizações estão sujeitas e não isentas de imposto. Por conseguinte, nos termos do n.º 1 do artigo 4.º, da alínea a) do n.º 1 do artigo 8.º, do n.º 1 do artigo 16.º e da alínea c) do n.º 1 do artigo 18.º, todos do Código do IVA, apurou-se imposto em falta, no montante total de €6.882.275,09.
O quadro seguinte apresenta o resumo das correções em sede de IVA, por período tributário:
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Na sequência da acção inspectiva, a Requerente foi notificada das liquidações de IVA respeitantes ao período de 2013 com os n.ºs 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., bem como as correspondentes liquidações de juros compensatórios com os n.ºs 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ... e 2015 ..., no montante global de € 7.434.640,98, como se resume no quadro que segue:
(documento n.º 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
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A Requerente não procedeu ao pagamento dos actos de liquidação referidos, dentro do período voluntário para o efeito, na sequência do que foram instaurados os respectivos processos de execução fiscal por parte da AT (documento n.º 14 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
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Em 30-12-2015, a Requerente apresentou junto da Autoridade Tributária e Aduaneira, para efeito de suspensão dos processos de execução fiscal, a garantia bancária n.º N…, emitida pelo Banco…, S.A., no montante de € 9.401.751,77 (documento n.º 15 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
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A Requerente apresentou reclamação graciosa das liquidações nos termos que constam do documento n.º 16 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
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Em 11-02-2016, a Requerente foi notificada do projecto de indeferimento da reclamação graciosa que consta do documento n.º 17 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, tendo exercido o direito de audição nos termos que constam documento n.º 18 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
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Em 20-04-2016, a Requerente foi notificada da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, nos termos que constam do documento n.º 19 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
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A 23-05-2016, a Requerente interpôs recurso hierárquico contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa (documento n.º 20 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
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Em 14-08-2017, a Requerente foi notificada da decisão de indeferimento do recurso hierárquico, nos termos que constam do documento n.º 21 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
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A Requerente efectuou investimentos para implementar o funcionamento de redes à procura de serviços que exigem maior largura de banda e virtualização (documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
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Para incrementar e/ou manter a sua quota de mercado no sector das comunicações
electrónicas, a Requerente desenvolve regularmente e publicita, junto dos seus actuais e potenciais clientes, campanhas ou ofertas promocionais atribuindo-lhes vantagens, com a condição de ser respeitado pelos clientes um determinado período de permanência (documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
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A Requerente realiza esses investimentos – seja em activos fixos tangíveis, seja em activos intangíveis, seja em recursos humanos e de outras estirpes – dentro de uma racionalidade económica complexa que pressupõe não apenas a recuperação dos encargos com o seu investimento, mas também a obtenção de uma determinada margem de lucro (facto afirmado pela Requerente no artigo 10.º do pedido de pronúncia arbitral e não questionado);
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A Requerente adequa o volume, o tipo, a intensidade, a localização e os momentos dos seus investimentos em função da angariação de um número mínimo de clientes com os quais irá estabelecer e manter uma determinada relação comercial (facto afirmado pela Requerente no artigo 11.º do pedido de pronúncia arbitral e não questionado);
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A Requerente não promove investimentos que sejam injustificados de um ponto de vista económico-financeiro, nomeadamente por não permitirem angariar um número mínimo de clientes, num dado momento ou local (facto afirmado pela Requerente no artigo 12.º do pedido de pronúncia arbitral e não questionado);
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Com vista à angariação de clientes, sejam eles pessoas singulares ou coletivas, a Requerente procedeu e procede à comercialização dos seus serviços, através do
recurso a diversas formas e canais, tais como:
(i) Realização de vendas “porta-a-porta”, nas quais os colaboradores de empresas parceiras contratadas por aquela promovem a comercialização dos serviços que a ora Requerente pode prestar;
(ii) Realização de vendas “em loja”, nas quais empresas parceiras contratadas por aquela asseguram, com o recurso aos seus próprios meios materiais e humanos, o funcionamento de lojas “A...”, nas quais são rececionadas e reencaminhada para a Requerente as propostas de adesão de clientes interessados;
(iii) Promoção de vendas através de “agentes angariadores”, isto é, a promoção de vendas através de lojas não associadas à marca “A...”, nas quais são rececionadas e reencaminhadas para a Requerente as propostas de adesão de clientes interessados;
(iv) Comercialização de kits de instalação, dentro dos quais segue uma proposta de adesão que os clientes podem preencher, assinar e devolver à Requerente;
(v) Promoção de vendas por telefone inbound (i.e., atendimento ao cliente) e outbound (i.e., telemarketing) ou via web, em que a Requerente promove a comercialização dos serviços que presta (factos afirmados pela Requerente no artigo 13.º do pedido de pronúncia arbitral e não questionados);
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A Requerente celebra com actuais e/ou novos clientes, contratos de prestação de serviços de comunicações electrónicas, de acesso à internet e multimédia (conforme minuta de contrato que consta do documento n.º 4, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
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Nos contratos em que a Requerente oferece aos clientes condições promocionais (atribuindo-lhes vantagens às quais, de outra forma, aqueles não teriam acesso), é estabelecida e prevista a obrigação de esses clientes permanecerem contratualmente vinculados à Requerente durante um período temporal mínimo (documentos n.ºs 3 e 4 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
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O período temporal mínimo, usualmente designado de “período de fidelização”, contratualmente estabelecido, numa base individual, entre a A... e um determinado cliente tem por finalidade permitir que aquela consiga, primordialmente, recuperar todos os custos por si suportados com os investimentos realizados:
(i) Na sua infra-estrutura global (e.g. redes, equipamentos, instalações, etc.);
(ii) No processo de aquisição do cliente (e.g. campanhas comerciais e de marketing, pagamento de comissões a entidades parceiras angariadoras de clientes);
(iii) Na activação do serviço contratado (e.g. instalação em residências e escritórios); e,
(iv) Na concessão de vantagens especiais atribuídas a esse mesmo cliente (e.g. atribuição de descontos e de serviços gratuitos); (artigo 22.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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Por actuar num sector fortemente concorrencial e ser prática comum do mercado a celebração, em massa, de contratos de prestação de serviços, torna-se fundamental, para a A..., a inclusão (ainda que restrita aos casos em que tal é exigível), de uma cláusula que preveja a fixação de um período mínimo de fidelização (artigos 35.º e 36.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionados);
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A Requerente tem a necessidade, para evitar incorrer em prejuízos, de assegurar que cada cliente angariado permanece vinculado ao contrato que celebrou durante o período temporal mínimo acordado (artigo 25.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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Interessa à Requerente manter os seus clientes num mercado em que há outras empresas concorrentes que pretendem incrementar a sua quota de mercado através desses seus clientes;
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Os consumidores dispõem da possibilidade de celebrar contratos de prestação de serviços com quaisquer operadores de comunicações electrónicas sem que esteja clausulada a obrigatoriedade de permanência por um período temporal mínimo (artigos 20.º e 21.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionados);
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Nos casos em que os consumidores optam por celebrar contratos de prestação de serviços com quaisquer operadores de comunicações electrónicas sem que esteja clausulada a obrigatoriedade de permanência por um período temporal mínimo, as condições aí previstas (e.g. custos das mensalidades) são distintas daquelas que se aplicam nos contratos em que o período mínimo de fidelização é convencionado (artigo 21.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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A Requerente recorre a empresas parceiras para angariar clientes e que, nesse contexto, está contratualmente obrigada a pagar a tais entidades uma determinada comissão, por cada cliente angariado (artigo 24.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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As comissões pagas pela Requerente a empresas parceiras responsáveis pela angariação de clientes podem ascender a um montante correspondente a diversas mensalidades-base que os clientes angariados se comprometeram a pagar à Requerente (artigo 25.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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A Requerente suporta, sempre que celebra um novo contrato de prestação de serviços com um determinado cliente, custos com a compra de equipamentos (e.g. set-top box) e com os custos da instalação e activação (normalmente, subcontratados a outras empresas parceiras) do serviço na residência desse cliente (artigo 26.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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A permanência efémera (por exemplo, 1 mês) de um cliente, no contexto da prestação de serviços contratualmente estabelecida, é geradora de prejuízos substanciais para a Requerente, porquanto os custos em que a mesma incorreu com a angariação, instalação e activação do serviço e a atribuição de condições comerciais mais vantajosas não são compensados pelo montante da(s) mensalidade(s) eventualmente recebidas pela Requerente (artigos 27.º e 28.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionados);
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Num primeiro momento, o estabelecimento de um período mínimo de permanência dos clientes tem como principal preocupação a recuperação do substancial investimento que realizou para estar no mercado a fornecer os seus serviços a um vasto conjunto de clientes e em segmentos muito exigentes e sofisticados (artigo 33.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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A Requerente, ao desenvolver esforços e suportar os inerentes custos de angariação de clientes, tem a expectativa que os mesmos se mantenham contratualmente ligados a si, durante um período temporal que extravasa, em muito, o período de fidelização contratualmente estabelecido (artigo 31.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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Ao celebrar um contrato com um determinado cliente no qual esse período de fidelização esteja previsto, tem a expectativa que isso seja apenas o início de uma relação comercial mais duradoura (idealmente, para sempre; mais realisticamente, que dure um período de cerca de 4 ou 5 anos, como é a prática do mercado), na qual aquela possa prestar, para além dos serviços inicialmente contratados, outros serviços adicionais (e.g. volumes de tráfego de internet superiores aos contratados, tráfego internacional, chamadas de valor acrescentado, tráfego nacional não incluído no pacote de serviços contratado, canais premium etc.), sujeitos a preços distintos (previamente comunicados ao cliente) e que extravasam o valor da mensalidade base previamente acordada (artigo 32.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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Nos contratos de prestação de serviços com condições promocionais, a Requerente incluiu as seguintes cláusulas:
“O período mínimo de vigência (…) justifica-se pela existência de custos de investimento no equipamento indispensável à prestação do serviço, bem como pelos custos de activação do serviço e ainda de angariação”
“Em caso de rescisão (…) pelo cliente ou por motivo ao mesmo imputável, antes de decorrido o período de vigência mínimo acordado, inicial ou subsequente, a (…) [Requerente] terá direito a receber uma indemnização calculada da seguinte forma: (período mínimo de vigência - n.º de meses em que os serviços estiveram activos) x (valor da mensalidade acordada)”.
(documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
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A referida cláusula sobre a manutenção do contrato por um período mínimo tem um efeito dissuasor do incumprimento do período de fidelização pelos clientes, porquanto a generalidade destes, atento o consequente débito da indemnização, prefere cumprir as condições contratadas (i.e. o período mínimo de fidelização), em vez de deixar de beneficiar de qualquer serviço prestado pela Requerente e, ainda assim, pagar a esta o valor previsto como indemnização;
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Através da previsão desta cláusula, a Requerente pretende, por um lado, promover o cumprimento dos contratos que celebra com os seus clientes e, por outro, em caso de incumprimento, recuperar os danos provocados na sua esfera, associados aos investimentos realizados para a prestação de serviços contratada (artigo 40.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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A cláusula referida afigura-se essencial enquanto elemento dissuasor do incumprimento do período de fidelização pelos clientes, porquanto a generalidade destes, atento o consequente débito da indemnização, prefere cumprir as condições contratadas (i.e. o período mínimo de fidelização), em vez de deixar de beneficiar de qualquer serviço prestado pela A... e, ainda assim, pagar a esta o valor devido a título de indemnização (artigo 41.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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Adicionalmente, nas situações em que ocorre o incumprimento, a activação da obrigação de indemnização prevista nesta cláusula pela Requerente afigura-se essencial, possibilitando-lhe o ressarcimento dos danos causados na sua esfera, sem necessidade de recorrer à via judicial (artigo 42.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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A Requerente tem sempre em mente a necessidade de – no contexto da manutenção de uma escorreita relação comercial com qualquer cliente, mesmo os que são ou pretendem ser incumpridores – evitar, a todo o custo, a activação do disposto em tal cláusula (artigo 43.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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Sempre que a Requerente percepciona que um determinado cliente está a (ou pretende) incumprir as suas obrigações de pagamento, durante o período de fidelização, a Requerente inicia um processo denominado de dunning (artigo 44.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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O processo de dunning tem por propósito alertar os clientes para a existência de valores por regularizar e cobrar as faturas que se encontram em mora e evitar que, entre a A... e um determinado cliente, se alcance uma situação que conduza, de forma inevitável e definitiva, à cessação antecipada (i.e. antes de completado o período de fidelização) do contrato de prestação de serviços celebrado entre ambas as partes (artigo 45.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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No contexto deste processo de dunning, partindo do exemplo do caso em que o cliente não paga as mensalidades acordadas, a Requerente começa por enviar sms ou cartas de alerta a recordar ao cliente faltoso que se encontra por pagar uma (ou mais) fatura(s) e que o mesmo deverá proceder ao respectivo pagamento, para evitar consequências mais gravosas (documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
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Se, após o envio desses sms, o cliente continuar a desrespeitar as suas obrigações de pagamento, a Requerente passa a alertar o cliente faltoso para a necessidade de pagar os montantes em dívida, através do envio de cartas para o endereço conhecido e/ou eventualmente através da realização de telefonemas para o número de telefone/telemóvel de contacto (documento n.º 7 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
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Caso os esforços desenvolvidos pela Requerente para que o cliente regularize a sua situação de incumprimento, dentro do período de fidelização, se revelem infrutíferos, então a Requerente vê-se na contingência de, num momento subsequente, proceder à suspensão dos serviços contratados (artigo 48.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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Apenas na eventualidade de, após a suspensão dos serviços contratados, o cliente em questão permanecer em situação de incumprimento, a Requerente adopta a medida mais drástica e gravosa, correspondente à resolução total e definitiva do contrato e subsequente activação da cláusula que prevê a obrigação deste pagar a indemnização, se se tratar de um cliente com contrato de fidelização e caso o período de fidelização ainda esteja a decorrer, e emitindo a factura relativa ao valor correspondente, após a cessação do contrato (documentos n.ºs 8 e 9 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
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Após a suspensão dos serviços contratados, se o cliente em questão permanecer reiteradamente em situação de incumprimento, a Requerente está legalmente obrigada a adoptar a medida mais drástica e gravosa correspondente à resolução total e definitiva do contrato de prestação de serviços que havia celebrado com o cliente em causa (documento n.º 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
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Só após a resolução antecipada do contrato de prestação de serviços por parte do cliente ou por motivo a este imputável, a Requerente cessa de prestar qualquer dos serviços inicialmente contratados com o antigo cliente (artigo 51.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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Nas facturas que a Requerente emitiu no ano de 2013 a estes seus antigos clientes com vista ao débito dos montantes devidos por força do incumprimento do período de fidelização, a Requerente incluiu a indicação “Indemnização Incumprimento Contratual” e não efectuou a liquidação de qualquer montante a título de IVA, fazendo expressa menção disso mesmo através da indicação “Valor em euros s/ IVA” (documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
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A Requerente não recebeu, até 27-11-2018, a totalidade do valor facturado de € 29.922.907,00, mas recebeu até essa data pelo menos o valor de € 2.318.918,39 relativamente às indemnizações facturadas aos seus antigos clientes no ano de 2013, a título de indemnizações debitadas nas situações de incumprimento contratual (documento n.º 1 junto com o requerimento de 04-12-2018);
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Do valor de € 2.318.918,39, o montante de € 2.088.639,78 corresponde a antigos clientes particulares e o montante de € 230.278,63 a antigos clientes sujeitos passivos de IVA) (documento n.º 1 junto com o requerimento de 04-12-2018, cuja correspondência a realidade não é questionada pela Autoridade Tributária e Aduaneira);
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A Requerente, conhecendo de antemão a incerteza sempre associada ao recebimento destas indemnizações, no momento da emissão das correspondentes faturas, regista estes valores apenas na rúbrica contabilística # 282 – Rendimentos a reconhecer, e apenas os reconhece como resultados no momento em que os (antigos) clientes efectuam o devido pagamento (facto alegado no artigo 56.º do pedido de pronúncia arbitral e pág. 34/68 do documento Relatório da Inspecção Tributária junto em 06-12-2018);
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A resolução antecipada do contrato por parte do cliente ou por motivo a este imputável altera a realidade económica da relação que havia sido estabelecida entre a Requerente e o seu (antigo) cliente;
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O montante devido pelo (antigo) cliente da Requerente em caso de incumprimento do período de fidelização não corresponde necessariamente ao montante que a Requerente teria recebido caso esse período de fidelização não fosse incumprido, nomeadamente por via da utilização de serviços não contemplados no valor da mensalidade-base contratada e/ou pela manutenção do contrato após o período de fidelização;
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A decisão do (antigo) cliente da Requerente de fazer ou não cessar o contrato é uma decisão substantivamente distinta da decisão de exercer ou de não exercer o direito de beneficiar dos serviços que o contrato celebrado com a Requerente proporciona, porque, em caso de cessação do contrato, extingue-se quer a obrigação da Requerente de prestar os serviços, quer o direito do próprio antigo cliente de beneficiar dessa prestação;
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Nos casos em que a cessação do contrato, em período prévio ao cumprimento do período de fidelização, ocorre por motivo imputável ao (antigo) cliente, não existiu necessariamente uma qualquer decisão por parte do (antigo) cliente em torno de exercer ou de não exercer o direito de beneficiar dos serviços que havia contratado e acordado com a Requerente;
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A Autoridade Tributária e Aduaneira aceitou, relativamente ao ano de 2015, que a Requerente efectuasse regularização voluntária, no montante de €931.687,00, em situação em que tinha sido proposta uma correcção no valor de € 8.588.243,00 relativa a falta de liquidação de IVA na facturação referente às quantias a pagar pelos clientes por incumprimento de períodos de fidelização (Relatório da Inspecção Tributária e Declaração Periódica de IVA juntos como documentos n.ºs 2 e 3 com o requerimento de 04-12-2018);
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Nesse Relatório da Inspecção Tributária relativo ao ano de 2015, refere-se que «Relativamente à divergência entre o valor de IVA proposto corrigir e a regularização voluntária efetuada pela A... foram tidos em consideração os efeitos da possibilidade de regularização a seu favor, do eventual IVA liquidado, através dos mecanismos de regularização de IVA previstos no artigo 78° do Código do IVA»;
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Em 03-11-2017, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.
2.2. Factos não provados
Não se provou que a Autoridade Tributária e Aduaneira tenha celebrado «acordos, liquidações de imposto e/ou quaisquer outros documentos resultantes das negociações havidas com os outros operadores de comunicações eletrónicas (...), dos quais terá resultado que o valor sobre o qual incidiu essas liquidações correspondeu ao montante das indemnizações por incumprimento do período de fidelização efetivamente recebidas e não à totalidade das indemnizações faturadas por esses operadores aos seus antigos clientes».
A Requerente disse que tem «conhecimento que outros operadores de comunicações eletrónicas terão negociado e alcançado acordos com a AT, para resolução rápida e antecipada de litígios sobre questões idênticas àquelas que constituem objeto do litígio em apreço, nos quais este ente público terá aceitado que apenas houvesse lugar à liquidação adicional de IVA sobre os montantes indemnizatórios associados à violação do período de fidelização que foram efetivamente recebidos por aqueles operadores» (artigo 385.º do pedido de pronúncia arbitral) e formulou pedido de que a Autoridade Tributária e Aduaneira fosse notificada para apresentar esses acordos, liquidações ou outros documentos relativos a outro operadores de comunicações (artigo 387.º do pedido de pronúncia arbitral e ponto 2 do requerimento de produção de prova), mas a Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu que impugna e repudia veementemente o que a Requerente afirma e que defende que há obstáculo legal a tal pretensão, derivado do sigilo fiscal (artigos 216.º a 219.º da Resposta).
Negando a Autoridade Tributária e Aduaneira a existência dessa actuação que a Requerente lhe imputa, que diz repudiar, está dada a resposta ao requerido pelo que não se justifica notificação para esse efeito.
Não havendo qualquer elemento que permita concluir que a afirmação da Autoridade Tributária e Aduaneira não corresponda à verdade, nem indicando a Requerente qual a hipotética razão de ciência do que refere, nem tendo apresentado prova documental da existência dos alegados acordo, liquidação ou documentos tem de considerar-se que não se provam os factos.
Não há outros factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.
2.3. Fundamentação da decisão da matéria de facto
Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos com pedido de pronúncia arbitral e com o requerimento de 04-12-2018 e no processo administrativo.
A Autoridade Tributária e Aduaneira, embora refira no artigo 56.º, que impugna «matéria de facto articulada no requerimento inicial como suporte da pretensão da Requerente, por não corresponder à verdade, ou por dela não poderem ser retirados os efeitos jurídicos pretendidos», apenas explicita discordância quanto a matéria de direito e sobre ilações a retirar da matéria de facto sobre a natureza das quantias facturas pela Requerente, não indicando nem provando qualquer realidade factual alternativa, designadamente sobre as alterações decorrentes da cessação antecipada dos contratos.
Quanto à quantificação do valor facturado que foi cobrado efectivamente, a Autoridade Tributária e Aduaneira aceita no Relatório da Inspecção Tributária a quantificação apresentada pela Requerente, que, aliás, se presume verdadeira por força do disposto no artigo 75.º, n.º 1, da LGT e não demonstra que seja outra a realidade actualizada que apresenta no documento n.º 1 junto com o requerimento de 04-12-2018.
Não fica excluída, naturalmente, a possibilidade de a Requerente ter efectuado ou vir a efectuar outras cobranças do valor facturado.
3. Matéria de direito
Com base em cláusulas contratuais, a Requerente facturou quantias aos seus clientes por incumprimento de períodos de fidelização, sendo os montantes correspondentes aos montantes que a Requerente teria recebido no resto do referido período mínimo de permanência se a resolução antecipada do contrato não se tivesse verificado: “(período mínimo de vigência - n.º de meses em que os serviços estiveram activos) x (valor da mensalidade acordada)” (artigo 38.º do pedido de pronúncia arbitral).
A Requerente não liquidou IVA nas facturas que emitiu.
Só parcialmente foram cobradas pela Requerente as quantias facturadas.
Está em causa no presente processo, em primeiro lugar, saber se essas quantias são de considerar a contrapartida da prestação de serviços, para efeitos da sujeição a IVA.
A Requerente, nas alegações que apresentou, formulou as seguintes conclusões:
A. Fazendo uma súmula de tudo o que foi exposto nestes autos, pode constatar-se que a obrigação de indemnização desempenha um papel central no âmbito da responsabilização jurídica dos cidadãos pelos seus atos, tenham eles reflexos de índole civil, comercial ou outra.
B. Tal responsabilização centra-se no dever que cabe a quem (a saber, os antigos clientes da Requerente) provocou (por incumprimento do período de fidelização contratualmente acordado) um determinado dano (pense-se nos encargos da Requerente com a angariação, instalação e ativação do serviço) de reconstituir a situação jurídica e patrimonial da pessoa lesada (no presente caso, a Requerente) como se não se tivesse verificado a lesão ou dano (i.e. colocando a Requerente na mesma situação que existiria caso esse incumprimento não existisse).
C. Mais, o pagamento de uma indemnização constitui um ato singular do qual não decorre qualquer ideia de interdependência ou comutatividade entre a prestação indemnizatória que o lesante (os antigos clientes) está compelido a satisfazer e uma qualquer outra prestação que caiba ao lesado (a Requerente), eventualmente, executar, dentro de uma lógica de reciprocidade.
D. Ou seja, quando surge o dever de pagamento de uma indemnização pela parte incumpridora do contrato (os antigos clientes), não existe qualquer relação de sinalagma, ou direito desta (lesante) a receber uma contrapartida da entidade lesada (a Requerente), como ocorre nos contratos de natureza bilateral.
E. Deste modo, por não haver esse nexo causal, não se poderá considerar que existe qualquer onerosidade associada ao pagamento de uma autêntica indemnização, a qual pode, nos termos da lei e da convenção entre as partes, ser antecipadamente fixada ao abrigo de cláusulas penais (algo, que, de resto, nem tampouco a Requerida pôs em causa ao longo do procedimento e processo tributário).
F. Aplicando-se este entendimento ao caso sub judice, logo se vê que, face aos princípios atinentes à incidência objetiva do IVA, este imposto não deve incidir sobre os quantitativos pagos a título de indemnização, por parte dos antigos clientes da Requerente, porquanto aqui inexiste qualquer “ato de consumo” que possa ser enquadrado no âmbito do conceito de “prestação de serviços” presente na Diretiva do IVA e no Código do IVA.
G. Mas se dúvidas ainda houvesse, sempre as mesmas ficariam desfeitas se se atender a que o valor recebido pela Requerente nunca pode corresponder à retribuição de qualquer “prestação de serviços” efetuada ao seu antigo cliente, pois a faturação e (quanto ocorre) pagamento do respetivo montante ocorre após a resolução ou, se se preferir, cessação do contrato e visa única e exclusivamente a cobertura de danos ou prejuízos causados em virtude do incumprimento do período de fidelização e cessação antecipada do contrato por parte desse antigo cliente!
H. Ou seja, ao contrário do que defende a Requerida, não estamos perante uma remuneração de uma qualquer atividade de prestação de serviços (que, de resto, nunca sequer foi concretizada ou individualizada pela Requerida, o que – aliás – bem se compreende porquanto inexiste qualquer prestação de serviços que a mesma pudesse realmente concretizar ou individualizar), uma vez que tal prestação cessou em momento anterior ao nascimento da obrigação de pagamento da indemnização e em nada este se relaciona, numa lógica de reciprocidade, com aquela!
I. Por outro lado, o facto de a indemnização ser calculada, com base nas prestações vincendas não pode ser invocado, ao contrário do que pretende a Requerida, para defender que estar-se-ia perante uma compensação por “lucros cessantes”, pois trata-se apenas, como vimos, de uma forma de cálculo da indemnização considerada pela Requerente – dentro do quadro legal e regulatório em vigor à data dos factos e em respeito do princípio da liberdade contratual – como adequada para efeitos de recuperação (sem necessidade de recorrer aos tribunais) dos custos (transformados em danos) incorridos com (e por causa de) estes contratos.
J. Com efeito, o pressuposto factual, que a Requerida ignorou, desde sempre, no seu raciocínio, é que a resolução antecipada do contrato implica para a Requerente um prejuízo decorrente da perda do investimento efetuado, sendo precisamente para compensar este dano que é contratualizado o pagamento da indemnização.
K. Considerando o acima exposto, e ao invés do defendido pela Requerida, é assim evidente que os montantes debitados a título de indemnização não são a contraprestação de qualquer prestação de serviço ou transmissão de bens realizada aos seus clientes, não existindo qualquer vínculo sinalagmático entre o pagamento desse montante e uma qualquer prestação de serviços (que, conforme reconheceu a Requerida, foram desativados pela Requerente com a resolução do contrato e antes da emissão da respetiva faturação).
L. Consequentemente, falecendo qualquer natureza onerosa que possa ser imputável às quantias debitadas pela Requerente aos seus antigos clientes a título de indemnização por incumprimento do período de fidelização, não podem as mesmas, sob pena de se estar perante uma evidente violação da Diretiva do IVA, do Código do IVA e, também, da CRP, estar sujeitas a IVA e, como tal, não poderão prevalecer no ordenamento jurídico quer a decisão de indeferimento do recurso hierárquico, quer as liquidações de IVA e juros compensatórios melhor identificadas acima, sendo todos estes atos da autoria da Requerida.
M. Termos em que se requer a este Tribunal que se digne julgar procedente por provado o presente pedido de pronúncia arbitral, com base nos fundamentos de facto e de direito acima, e melhor expostos no pedido de pronúncia arbitral, ordenando a anulação dos atos tributários ora sindicados por vício de violação de lei decorrente da violação direta dos artigos 4.º, 16.º e 18.º, do Código do IVA, bem como dos artigos 2.º, 9.º e 24.º, da Diretiva do IVA, e ainda dos artigos 8.º, 103.º e 104.º, da CRP, o que motivará a anulação da decisão de indeferimento do recurso hierárquico e as correspondentes liquidações de IVA e juros compensatórios que a antecederam!
N. Subsidiariamente, caso este Tribunal Arbitral venha a concluir (cenário que não se concebe e apenas se alude por exclusivos deveres de patrocínio), pela sujeição a IVA das indemnizações faturadas pela Requerente aos seus antigos clientes em resultado do incumprimento do período de fidelização por parte destes (ou por motivo a estes imputável), atendendo às regras consagradas na Diretiva do IVA e dos princípios gerais que formam o sistema comum deste imposto, conquanto se verifique uma comprovada incobrabilidade definitiva de qualquer crédito (como é manifestamente o caso), sempre assistirá aos sujeitos passivos o direito à regularização do correspondente IVA.
O. Com efeito, face àqueles normativos e princípios e à luz do acórdão do TJUE, de 22.11.2018, no processo C-295/17, e das conclusões da Advogada-Geral Juliane Kokott em igual processo, o valor constante dos atos de liquidação de IVA e juros ora contestados deverá ser ajustado em conformidade, expurgando-se para o efeito os valores das indemnizações que, apesar de faturadas, não foram objeto de cobrança por parte da Requerente.
P. Até porque, salvo melhor opinião, não tendo havido, no presente caso, qualquer liquidação de imposto nas faturas emitidas pela Requerente, não se justifica – por uma questão de Justiça – sujeitar a mesma aos formalismos inerentes à regularização de IVA nos créditos incobráveis (previstos no artigo 78.º e seguintes, do Código do IVA), desde logo porque, atenta a ausência da liquidação de imposto, não haverá o risco de qualquer cliente ou consumidor – seja ele particular, seja ele pessoa coletiva – ter procedido a qualquer dedução de IVA.
Q. Em todo o caso e face ao supra exposto, é a Requerente de opinião que, caso este Tribunal Arbitral venha a adotar a teoria defendida pela Requerida ao longo do procedimento tributário – o que, repita-se, não se aceita e que apenas se aqui alude por exclusivos deveres de patrocínio – ainda assim deveriam as liquidações de IVA e juros compensatórios melhor identificadas supra, bem como a decisão de indeferimento expresso do recurso hierárquico que lhes sucedeu, ser julgadas ilegais, por violação, nomeadamente, do artigo 90.º da Diretiva do IVA, devendo as mesmas ser anuladas na proporção correspondente ao montante das indemnizações que foram faturadas pela Requerente e que nunca chegaram a ser efetivamente pagas pelos seus (antigos) clientes ou assegurar à Requerente uma alternativa, em termos úteis e eficazes, que garanta que o imposto apenas possa incidir sobre as indemnizações recebidas.
R. A solução acima enunciada, a título subsidiário, estaria, de resto, em conformidade com o disposto no princípio fundamental da igualdade, no princípio da neutralidade do IVA e no princípio da tutela jurisdicional efetiva.
S. Finalmente, sem prejuízo de tudo o acima exposto, a título complementar e necessariamente subsidiário, julga-se aqui importante ter presente que o imposto (alegadamente) devido com referência às indemnizações aqui em causa, a debitar pela Requerente aos seus clientes, sempre teria que constituir uma componente do valor debitado e nunca um elemento a acrescer àquele.
T. Isso mesmo decorre das regras de repercussão económica e jurídica obrigatórias do IVA (enquanto imposto sobre o consumo), inerentes à mecânica que subjaz ao funcionamento deste imposto, as quais devem produzir os mesmos resultados fiscais que um imposto único aplicado no último estádio da cadeia de tributação, sendo certo que apenas com este mecanismo de repercussão e dedução se atinge a desejada neutralidade do IVA.
U. Neste sentido, um sujeito passivo não pode deixar de cobrar imposto nas respetivas faturas, mesmo que pretendesse suportá-lo economicamente.
V. Em face do exposto, caso este Tribunal Arbitral venha a considerar que as indemnizações objeto de análise nos presentes autos se encontram sujeitas a IVA (cenário esse que não se concede e apenas se admite por exclusivos deveres de patrocínio), o montante de imposto a entregar ao Estado, com referência ao ano de 2013, deveria considerar-se incluído no valor já debitado e cobrado aos seus clientes.
3.1. Jurisprudência do TJUE
Como já se referiu foi suspensa a instância para aguardar que fosse proferida pelo TJUE decisão no seu processo C-295/17, que tem por objecto matéria de facto essencialmente idêntica.
Na parte decisória do acórdão, proferido em 22-11-2018, refere-se o seguinte:
1) O artigo 2.º, n.º 1, alínea c), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, deve ser interpretado no sentido de que se deve considerar que o montante predeterminado, recebido por um operador económico em caso de resolução antecipada do contrato pelo seu cliente, ou por causa que lhe é imputável, de um contrato de prestação de serviços que prevê um período mínimo de vinculação ao contrato, montante esse que corresponde ao montante que esse operador teria recebido no resto do referido período se essa resolução do contrato não se tivesse verificado, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, é a remuneração de uma prestação de serviços efetuada a título oneroso e, como tal, sujeita a esse imposto.
2) Não são determinantes para a qualificação do montante predeterminado no contrato de prestação de serviços, de que o cliente é devedor em caso de resolução antecipada desse contrato, o facto de o montante fixo ter como finalidade dissuadir os clientes de incumprirem o período mínimo de vinculação ao contrato e ressarcir o prejuízo que o operador sofre com o incumprimento desse período, o facto de a remuneração recebida por um agente comercial pela celebração de contratos que estipulem um período mínimo de vinculação aos mesmos ser superior à prevista no âmbito dos contratos que não estipulam esse período e o facto de o referido montante ser qualificável, no direito nacional, como cláusula penal.
Como resulta da supremacia do Direito da União sobre o Direito Nacional, prevista no artigo 8.º, n.º 4, da CRP e é corolário da obrigatoriedade de reenvio prejudicial prevista no artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (que substituiu o artigo 234.º do Tratado de Roma, anterior artigo 177.º), a jurisprudência do TJUE tem carácter vinculativo para os Tribunais nacionais, quando tem por objecto questões de Direito da União Europeia. ( [1] )
No caso em apreço, a aplicação da jurisprudência do TJUE que consta do processo C-295/17, tem justificação reforçada, nos precisos termos em o TJUE decidiu, por ter sido produzida relativamente a «um objeto em tudo idêntico ao que se encontra aqui em discussão», como a própria Requerente afirmou no artigo 398.º do pedido de pronúncia arbitral, com a concordância expressa da Autoridade Tributária e Aduaneira (artigos 24.º e 25.º da Resposta).
Assim, por imperativo constitucional, tem de decidir-se em consonância com o que decidiu o TJUE a questão da qualificação dos montantes facturados aos clientes por incumprimento de períodos de fidelização como constituindo ou não remuneração de «prestação de serviços» para efeitos da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, sendo irrelevante a opinião deste Tribunal Arbitral sobre se o que foi decidido em reenvio prejudicial foi bem ou mal decidido pelo TJUE.
Designadamente quanto à apreciação da situação pelo TJUE, há que notar que a Requerente teve intervenção no processo de reenvio prejudicial em que requereu a reabertura da fase oral do processo, defendendo «que as conclusões da advogada‑geral, em especial os n.ºs 41, 44, 46 e 47 das mesmas, assentavam em factos errados, atendendo, nomeadamente, ao montante faturado pela A... aos seus clientes em caso de resolução antecipada do contrato de prestação de serviços» (n.º 24 do acórdão).
O TJUE, afirmando que a reabertura poderia ocorrer quando «uma parte invocar um facto novo que possa ter influência determinante na decisão do Tribunal, ou ainda quando o processo deva ser resolvido com base num argumento que não foi debatido entre as partes ou os interessados referidos no artigo 23.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia», indeferiu o pedido da Requerente considerando «que dispõe de todos os elementos necessários para responder às questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio e entende que, para efeitos do julgamento da causa no processo principal, foram debatidos no Tribunal de Justiça todos os argumentos, em especial os relativos à qualificação do referido montante».
Assim, na perspectiva do TJUE, que se impõe acatar, não há outros factos ou argumentos que possam considerar-se relevantes para a decisão da questão da qualificação do montante facturado, a não ser o que na parte decisória expressamente se remeteu para o Tribunal Arbitral que é verificar se o referido «montante predeterminado» recebido em caso de resolução antecipada do contrato pelo seu cliente «corresponde ao montante que esse operador teria recebido no resto do referido período se essa resolução do contrato não se tivesse verificado».
3.1.1. Irrelevância do Direito Nacional para a resolução da questão da qualificação dos montantes em causa como «prestação de serviços»
Resulta do texto do referido acórdão do TJUE resulta que deve entender-se que:
– «segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, os termos de uma disposição do direito da União que não comporte uma remissão expressa para o direito dos Estados-Membros devem normalmente ser objeto de interpretação autónoma e uniforme (v., neste sentido, Acórdão de 16 de novembro de 2017, Kozuba Premium Selection, C‑308/16, EU:C:2017:869, n.° 38 e jurisprudência referida)» (parágrafo 67);
– «é indiferente, para efeitos da interpretação das disposições da Diretiva IVA, que esse montante constitua, no direito nacional, uma indemnização por responsabilidade civil extracontratual ou uma penalidade contratual, ou ainda que seja qualificado de reparação, indemnização ou remuneração» (parágrafo 68);
– «saber se o pagamento de uma remuneração tem lugar como contraprestação de uma prestação de serviços é uma questão de direito da União que deve ser decidida independentemente da apreciação efetuada no direito nacional» (parágrafo 69);
– não é determinante «para a qualificação do montante predeterminado no contrato de prestação de serviços (...) o facto de o referido montante ser qualificável, no direito nacional, como cláusula penal» (parágrafo 70).
Assim, é irrelevante para a decisão da questão em apreço o tratamento que lhe tem sido dado pela jurisprudência e doutrina nacional à face da lei portuguesa, designadamente se lhe atribui a natureza de indemnização ou considera estar-se perante uma cláusula penal.
3.1.2. Irrelevância da finalidade visada com a previsão de um montante a pagar nos casos de resolução antecipada do contrato
O acórdão referido é também explícito no sentido da irrelevância da finalidade visada para a resolução da questão da qualificação, designadamente a dissuasão de clientes e ressarcimento do prejuízo que o operador suporte com a resolução antecipada:
– «não são determinantes para a qualificação do montante predeterminado no contrato de prestação de serviços, de que o cliente é devedor em caso de resolução antecipada desse contrato, o facto de o montante fixo ter como finalidade dissuadir os clientes de incumprirem o período mínimo de vinculação ao contrato e ressarcir o prejuízo que o operador sofre com o incumprimento desse período (...)» (parágrafo 70).
Por isso, não tem relevo para a decisão da causa saber qual é a finalidade ou natureza das quantias pagas por incumprimento de fidelização, designadamente o facto alegado pela Requerente de que «a resolução antecipada do contrato implica para a Requerente um prejuízo decorrente da perda do investimento efetuado, sendo precisamente para compensar este dano que é contratualizado o pagamento da indemnização».
3.1.3. Questão da qualificação do montante predeterminado recebido em caso de incumprimento como contrapartida de «prestação de serviços» para efeitos da Directiva n.º 2006/112/CE
Recorde-se o decidido pelo TJUE:
O artigo 2.º, n.º 1, alínea c), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, deve ser interpretado no sentido de que se deve considerar que o montante predeterminado, recebido por um operador económico em caso de resolução antecipada do contrato pelo seu cliente, ou por causa que lhe é imputável, de um contrato de prestação de serviços que prevê um período mínimo de vinculação ao contrato, montante esse que corresponde ao montante que esse operador teria recebido no resto do referido período se essa resolução do contrato não se tivesse verificado, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, é a remuneração de uma prestação de serviços efetuada a título oneroso e, como tal, sujeita a esse imposto.
À luz do que decidiu o TJUE, cabe ao Tribunal Nacional («órgão jurisdicional de reenvio») verificar se mas, saber se o montante «predeterminado no contrato de prestação de serviços de que o cliente é devedor em caso de resolução antecipada» «corresponde ao montante que esse operador teria recebido no resto do referido período se essa resolução do contrato não se tivesse verificado».
Se se verificar esta correspondência, tal montante deve ser considerado, para efeito do artigo 2.º, n.º 1, alínea c), da Diretiva 2006/112/CE, como «remuneração de uma prestação de serviços efetuada a título oneroso e, como tal, sujeita a esse imposto».
Como decorre do texto do acórdão, é apenas aquele «montante predeterminado» previsto para as situações de resolução antecipada (que é o que foi facturado e em relação ao qual se equaciona a necessidade de liquidação de IVA no momento da emissão da factura), que releva para a qualificação em causa e é quanto a esse montante predeterminado que foi facturado que «a resolução antecipada não altera a realidade económica da relação entre a MEIO e o seu cliente» (ponto 51 do acórdão).
Por isso, não relevam para a questão de saber se deve ser liquidado IVA no momento da facturação quanto a esse «montante predeterminado», a alteração da realidade económica decorrente da resolução do contrato a nível da possibilidade de obtenção de outros hipotéticos montantes a que alude o Sujeito Passivo, que seriam contrapartida de outros serviços que, eventualmente, fossem contratados na vigência do contrato, montantes esses não predeterminados, que poderiam ou não vir a ser recebidos se tal resolução não ocorresse e fossem ou não utilizados serviços não contemplados no valor da mensalidade-base ou montantes que a Requerente poderia vir a receber se os contratos se prolongassem para além do período de fidelização.
Como resulta da matéria de facto fixada, designadamente do alegado pela Requerente no artigo 38.º do pedido de pronúncia arbitral, os montantes facturados a título de «Indemnização Incumprimento Contratual», relativa aos contratos em que os clientes da Requerente não cumpriram o período mínimo de permanência a que se tinham vinculado, foi predeterminado e calculado com base numa cláusula contratual, correspondendo ao montante que a Requerente teria recebido no resto do referido período mínimo de permanência se a resolução antecipada do contrato não se tivesse verificado: “(período mínimo de vigência - n.º de meses em que os serviços estiveram activos) x (valor da mensalidade acordada)”.
Sendo assim, quanto aos montantes recebidos pela Requerente tem plena aplicação ao caso em apreço o decidido pelo TJUE no ponto 1) do acórdão proferido no processo n.º C-295/17, pois verifica-se o seguinte:
– os montantes facturados foram predeterminados nos contratos de prestação de serviços;
– os montantes foram recebidos pela Requerente em casos de resolução antecipada do contrato pelos seus clientes, ou por causas a estes imputáveis, de contratos de prestação de serviços que previam período mínimo de vinculação ao contrato;
– os montantes recebidos corresponde aos montantes que a Requerente teria recebido no resto dos referidos períodos mínimos de vinculação se a resolução do contrato não se tivesse verificado.
As objecções suscitadas pela Requerente, designadamente a nível da inexistência de uma concreta e individualizada prestação de serviços, são apreciadas e rejeitadas no referido acórdão do TJUE:
– «uma prestação de serviços só é efetuada «a título oneroso», na aceção da referida disposição, se existir entre o prestador e o beneficiário uma relação jurídica durante a qual são transacionadas prestações recíprocas, constituindo a retribuição recebida pelo prestador a contraprestação efetiva de um serviço individualizável prestado ao beneficiário» e «tal verifica-se caso exista um nexo direto entre o serviço prestado e a contraprestação recebida» (parágrafo 39);
– «a contraprestação do preço pago na assinatura de um contrato de prestação de serviços é constituída pelo direito que o cliente dele extrai de beneficiar do cumprimento das obrigações decorrentes do contrato, independentemente de o cliente exercer esse direito» (parágrafo 40);
– «Assim, o prestador de serviços efetua essa prestação quando coloca o cliente em condições de beneficiar da mesma, pelo que a existência do supramencionado nexo direto não é afetada pelo facto de o cliente não fazer uso do referido direito» (parágrafo 40);
– «o montante devido, por força dos referidos contratos, pelo incumprimento do período mínimo de vinculação ao contrato é constituído pelo montante da mensalidade da assinatura, multiplicado pela diferença entre a duração do período mínimo de vinculação ao contrato e o número de meses em que o serviço foi prestado. Assim, o pagamento do montante devido pelo incumprimento do período mínimo de vinculação ao contrato permite à A... obter, em princípio, os mesmos rendimentos que obteria se o cliente não tivesse resolvido o contrato prematuramente» (parágrafo 42);
– «uma vez que, por força dos contratos em causa no processo principal, a A... tem direito a que lhe seja pago, em caso de incumprimento do período mínimo de vinculação ao contrato, um montante idêntico ao que teria recebido a título de remuneração dos serviços que se comprometeu a prestar se o cliente não tivesse resolvido o seu contrato, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se for caso disso, a resolução antecipada do contrato pelo cliente ou por um motivo que lhe é imputável não altera a realidade económica da relação entre a A... e o seu cliente»;
– «a contraprestação do montante pago pelo cliente à A... é constituída pelo direito do cliente a beneficiar do cumprimento, por essa operadora, das obrigações decorrentes do contrato de prestação de serviços, ainda que o cliente não queira ou não possa exercer esse direito por um motivo que lhe é imputável. Com efeito, no caso vertente, a A... coloca o cliente em condições de beneficiar dessa prestação, na aceção da jurisprudência» (parágrafo 45);
– «Quanto à exigência de que os pagamentos constituam a contraprestação efetiva de um serviço individualizável, há que sublinhar que o serviço a prestar e o montante faturado ao cliente em caso de resolução do contrato durante o período mínimo de vinculação àquele são determinados logo na celebração do contrato» (parágrafo 49).
– «Assim, deve‑se considerar que o montante devido pelo incumprimento do período mínimo de vinculação ao contrato faz parte integrante do preço total pago pela prestação de serviços, dividido em mensalidades, preço esse que se torna imediatamente exigível em caso de incumprimento da obrigação de pagamento».
Há, assim, na perspectiva do TJUE, uma actividade concreta e individualizada consubstanciada no direito proporcionado ao cliente de beneficiar do serviço que é tem como contrapartida a globalidade das prestações de pagamento mensal a cargo do cliente que estão previstas no contrato, quer sejam pagas mês a mês ao longo do período de fidelização, quer devidas antecipadamente por resolução do contrato antes do final do período de fidelização.
Assim, não afasta a existência de uma actividade concreta e individualizada o facto alegado pela Requerente de a facturação e pagamento (quando é efectuado) ocorrerem «após a resolução ou, se se preferir, cessação do contrato» e visar «única e exclusivamente a cobertura de danos ou prejuízos causados em virtude do incumprimento do período de fidelização e cessação antecipada do contrato por parte desse antigo cliente».
Na verdade, na perspectiva do TJUE, é a actividade anterior à resolução do contrato que está a ser remunerada ao abrigo da cláusula que prevê o dever de pagamento no caso de incumprimento do período de fidelização.
Pelo exposto, em sintonia com o decidido pelo TJUE, deve considerar-se que os referidos montantes recebidos a título de indemnização por incumprimento dos contratos são contraprestação de uma prestação de serviços para efeitos de IVA: «é a remuneração de uma prestação de serviços efetuada a título oneroso e, como tal, sujeita a esse imposto» (parágrafo 57).
Sendo assim, como defende a Autoridade Tributária e Aduaneira nos artigos 201.º a 204.º da sua Resposta, o IVA era exigível à Requerente, se não antes, nos momentos em que foram emitidas as facturas relativas aos montantes designados como «Indemnização Incumprimento Contratual», nos termos dos artigos 8.º, n.º 1, do CIVA, sendo o valor tributável o da contraprestação obtida ou a obter do destinatário, como resulta do artigo 16.º, n.º 1, do CIVA.
Na verdade, por força do disposto no artigo 37.º, n.º 1, do CIVA, «a importância do imposto liquidado deve ser adicionada ao valor da fatura, para efeitos da sua exigência aos adquirentes dos bens ou destinatários dos serviços».
A possibilidade de regularização, que se coloca após a emissão das facturas, não tem qualquer relevância para efeitos desta obrigação de liquidação de IVA nas facturas emitidas.
Improcede, assim o pedido principal formulado pela Requerente, de anulação da decisão do recurso hierárquico e das liquidações impugnadas.
Em face do decidido pelo TJUE e do dever de acatamento da sua jurisprudência, fica prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas pela Requerente sobre a qualificação como «remuneração de prestação de serviços» dos montantes facturados por incumprimento de períodos de fidelização, que estão subjacentes às liquidações impugnadas.
3.2. Pedidos subsidiários
A Requerente pede «a título subsidiário, caso não seja dado provimento ao pedido anteriormente apresentado, deverá ainda assim, haver lugar à anulação da decisão de indeferimento do recurso hierárquico e das liquidações de IVA e juros compensatórios, respeitantes ao período de 2013 melhor identificadas supra, na parte correspondente ao montante das indemnizações que foram faturadas pela Requerente e que nunca chegaram a ser efetivamente pagas pelos seus (antigos) clientes ou, em alternativa, assegurar-se à Requerente o recurso eficaz ao mecanismo da regularização do imposto que se considere incidir sobre as indemnizações faturadas e não pagas».
O facto de parte dos montantes que foram facturados não serem pagos não constitui ilegalidade das liquidações, pois é uma eventualidade posterior ao momento em que devia ter sido liquidado o imposto, que deve ser incluído nas facturas (artigo 37.º, n.º 1, do CIVA) e é exigível a partir desse momento (artigo 8.º, n.º 1, do mesmo Código).
Por isso, o não pagamento não é fundamento de anulação parcial das liquidações, mas apenas pode viabilizar a regularização, nos termos do artigo 78.º ou dos artigos 78.º-A a 78.º-D do CIVA ( [2] ) e do artigo 90.º da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006.
No entanto, é um facto que o TJUE entendeu, no parágrafo 56 do acórdão referido «acrescentar, para todos os efeitos úteis e como a advogada‑geral salientou no n.º 55 das suas conclusões, que, se for necessário, caberá às autoridades nacionais competentes proceder, nas condições fixadas pelo direito nacional, à correção do IVA em conformidade, tal como previsto no artigo 90.º da Diretiva IVA, para que o IVA seja deduzido do montante que o prestador de serviços efetivamente recebeu do seu cliente».
No referido n.º 55 das conclusões da Advogada-Geral, para que remete o acórdão do TJUE, refere-se que «a dívida tributária da empresa deve necessariamente ser corrigida, nos termos do disposto no artigo 90.° da Diretiva IVA, se se apurar, com segurança suficiente, que o seu cocontratante já não efetuará qualquer pagamento».
Assim, no entendimento do TJUE, a não anulação parcial pretendida pela Requerente relativamente aos montantes facturados, mas não pagos pelos clientes, tem de ser entendida como não prejudicando o dever de as autoridades nacionais competentes procederem «nas condições fixadas pelo direito nacional, à correção do IVA em conformidade, tal como previsto no artigo 90.º da Diretiva IVA, para que o IVA seja deduzido do montante que o prestador de serviços efetivamente recebeu do seu cliente».
É de notar, porém, que ao referir-se às «autoridades nacionais competentes», o TJUE não está a aludir ao Tribunal Arbitral (que na terminologia do acórdão é designado como «órgão jurisdicional de reenvio»), mas sim às autoridades tributárias competentes para a regularização do IVA prevista no artigo 90.º da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006. ( [3] )
Por outro lado, à face da regulamentação prevista nos referidos artigos 78.º e 78.º-A a 78.º-D do CIVA, a regularização depende do preenchimento de pressupostos que cabe ao sujeito passivo demonstrar, pelo que também por este motivo está afastada a possibilidade de este Tribunal Arbitral restringir a anulação aos montantes facturados que foram pagos.
No entanto, no entendimento do TJUE, o afastamento da anulação quanto ao IVA correspondente aos montantes facturados não pagos é indissociável de caber «às autoridades nacionais competentes proceder, nas condições fixadas pelo direito nacional, à correção do IVA em conformidade, tal como previsto no artigo 90.º da Diretiva IVA, para que o IVA seja deduzido do montante que o prestador de serviços efetivamente recebeu do seu cliente», pelo que a decisão de não anulação das liquidações terá de ser acompanhada da mesma estatuição.
Neste contexto, é de notar que, embora o direito nacional preveja limitações aos poderes de cognição dos tribunais num meio contencioso de anulação (como é o processo arbitral, meio alternativo ao processo de impugnação judicial), em face da supremacia do Direito da União e da jurisdição do TJUE na sua interpretação, que resulta dos citados artigo 8.º n.º 4, da CRP e do artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, a decisão de improcedência do pedido de anulação parcial terá de ficar sujeita à mesma estatuição, nos precisos termos em que ela foi definida.
Os princípios da neutralidade do IVA e da tutela judicial efectiva (artigos 20.º, n.º 1, e 268.º, n.º 4, da CRP), que a Requerente invoca neste contexto, ficam satisfeitos com a garantia da possibilidade de regularização, que o acórdão do TJUE impõe que seja assegurada, com a consequente possibilidade de a Requerente pedir ao tribunal competente as providências que entender adequadas, no caso de ela não lhe ser assegurada. ( [4] )
Neste termos, em sintonia com o que decidiu o TJUE sobre os montantes facturados que não foram pagos, improcede o pedido subsidiário, «cabendo às autoridades nacionais competentes proceder, nas condições fixadas pelo direito nacional, à correção do IVA em conformidade, tal como previsto no artigo 90.º da Diretiva IVA, para que o IVA seja deduzido do montante que o prestador de serviços efetivamente recebeu do seu cliente».
No que concerne ao pedido alternativo do pedido subsidiário, de que seja assegurado à Requerente «recurso eficaz ao mecanismo da regularização do imposto que se considere incidir sobre as indemnizações faturadas e não pagas», é manifesto que não se insere nas competências deste Tribunal Arbitral definidas no RJAT decidir mais do que o que decidiu o TJUE sobre a possibilidade de regularização.
3.3. Questão da violação do princípio da igualdade
A Requerente invocou que Autoridade Tributária e Aduaneira aceitou que apenas houvesse lugar à liquidação adicional de IVA sobre os montantes indemnizatórios associados à violação do período de fidelização que foram efetivamente recebidos de (antigos) clientes particulares pelos operadores.
Está-se perante matéria que tem natureza vinculada, pois os artigos 8.º do e 37.º do CIVA (com cobertura na possibilidade prevista no artigo 66.º da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006,) impunham que a liquidação de IVA fosse efectuada nas facturas, sem prejuízo da eventual regularização, nos casos de incobrabilidade das quantias facturadas.
Por isso, estando-se perante matéria subordinada ao princípio da legalidade, não tem eficácia invalidante o eventual tratamento ilegal que a Autoridade Tributária e Aduaneira tenha dado a outras situações. ( [5] )
Por outro lado, só poderia se poderia equacionar a violação do princípio da igualdade afectando as liquidações impugnadas se existissem de tratamentos discriminatórios anteriores às liquidações.
Improcede assim, o pedido de pronúncia arbitral, quanto a este vício que a Requerente imputa às liquidações impugnadas.
3.4. Questão subsidiária relativa à quantificação do IVA
A Requerente coloca esta questão, nos artigos 225 a 232 das suas alegações, relativamente ao «IVA relativamente a faturas cobradas», defendendo que «o montante do IVA calculado ascenderia a € 433.618,89, dos quais € 390.558,66 dizem respeito a indemnizações cobradas a particulares e € 43.060,23 dizem respeito a valores cobrados a sujeitos passivos».
Defende a Requerente que «caso este Tribunal Arbitral venha a considerar que as indemnizações objeto de análise nos presentes autos se encontram sujeitas a IVA (cenário esse que não se concede e apenas se admite por exclusivos deveres de patrocínio), o montante de imposto a entregar ao Estado, com referência ao ano de 2013, deveria considerar-se incluído no valor já debitado e cobrado aos seus clientes».
Invoca a Requerente em abono da sua posição o acórdão do TJUE “Corina Hrisi Tulica”, de 7 de Novembro de 2013, proferido nos processos apensos C-249/10 e C-250/12, em que se entendeu que «a Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, nomeadamente os seus artigos 73.o e 78.o, deve ser interpretada no sentido de que, quando o preço de um bem tenha sido determinado pelas partes sem menção do imposto sobre o valor acrescentado e o fornecedor do referido bem seja o devedor do imposto sobre o valor acrescentado devido sobre a operação tributada, e caso o fornecedor não tenha a possibilidade de recuperar junto do adquirente o imposto sobre o valor acrescentado reclamado pela administração fiscal, se deve considerar que o preço convencionado já inclui o imposto sobre o valor acrescentado».
Como resulta dos termos em que a Requerente coloca a questão ela reporta-se às quantias cobradas (portanto, a momento posterior à liquidação, que deveria ser efectuada no momento da emissão das facturas) e do próprio teor deste acórdão do TJUE, a quantificação em causa tem como pressuposto que «o fornecedor não tenha a possibilidade de recuperar junto do adquirente o imposto sobre o valor acrescentado reclamado pela administração fiscal».
Não se tratando de vício referente às liquidações impugnadas, por o seu fundamento ser posterior à emissão, e não se tendo demonstrado que a Requerente não tenha a possibilidade de recuperar o imposto reclamado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, não se justifica a anulação parcial das liquidações com este fundamento, sem prejuízo de, na sequência de eventual demonstração da impossibilidade de recuperação a questão poder ser colocada, matéria que não cabe a este Tribunal Arbitral apreciar no presente processo.
3.5. Questões de inconstitucionalidade suscitadas pela Requerente
3.5.1. Questão da violação do Direito da União e do princípio da legalidade tributária
A Requerente imputa à posição da Autoridade Tributária e Aduaneira violação do artigo 8.º, n.º 4, da CRP, que estabelece a supremacia do Direito da União.
No entanto, como resulta do acórdão do TJUE, a posição da Autoridade Tributária e Aduaneira consubstancia correcta aplicação do Direito da União.
Pela mesma razão de se estar perante correcta aplicação do Direito da União, não se pode detectar violação do princípio da legalidade tributária, que resulta do artigo 103.º da CRP.
3.5.2. Questão da violação do artigo 104.º, n.º 4, da CRP
A Requerente invoca ainda violação do artigo 104.º, n.º 4, da CRP, que estabelece que «a tributação do consumo visa adaptar a estrutura do consumo à evolução das necessidades do desenvolvimento económico e da justiça social, devendo onerar os consumos de luxo», por não existir «acto de consumo».
No entanto, para além de esta norma não restringir a tributação do consumo aos casos em que há um «acto de consumo», expressão que não consta do seu texto, ela não afasta a aplicabilidade da tributação do consumo nos termos em que está prevista no Direito da União, cujas normas a própria Constituição reconhece no artigo 8.º, n.º 4, «aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático».
Sendo manifesto que este n.º 4 do artigo 104.º da CRP não consubstancia qualquer dos «princípios fundamentais» que são enunciados nos artigos 1.º a 11.º da CRP, não se ocorre também esta alegada inconstitucionalidade.
3.5.3. Questão da violação do princípio da justiça
Não se divisa, nem é explicitada pela Requerente, a invocada violação do princípio da justiça na imposição da liquidação de IVA aos agentes económicos que são considerados sujeitos passivos, acompanhada das possibilidades de regularização.
Em última análise, a Requerente é responsabilizada tributariamente pela omissão de deveres tributários que a lei lhe impõe, o que, em vez de se reconduzir a violação do princípio da justiça, é uma sua concretização.
Pelo exposto, não enferma de vício violação do princípio da justiça a posição adoptada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
4. Indemnização por garantia indevida
A Requerente formulou pedido de indemnização por garantia indevida, para a «eventualidade de se considerar que assiste razão ao Requerente neste processo».
Como é de entender que não assiste razão a Requerente, improcede este pedido de indemnização.
5. Decisão
Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:
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Julgar improcedente o pedido principal de anulação total das liquidações e da decisão do recurso hierárquico que as manteve;
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Julgar improcedente o pedido subsidiário de anulação das liquidações e da decisão do recurso hierárquico «na parte correspondente ao montante das indemnizações que foram faturadas pela Requerente e que nunca chegaram a ser efetivamente pagas pelos seus (antigos) clientes», mas declarar, em consonância com o decidido pelo TJUE, que cabe à Autoridade Tributária e Aduaneira «proceder, nas condições fixadas pelo direito nacional, à correção do IVA em conformidade, tal como previsto no artigo 90.º da Diretiva IVA, para que o IVA seja deduzido do montante que o prestador de serviços efetivamente recebeu do seu cliente»;
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Julgar improcedente o pedido indemnização por garantia indevida.
6. Valor do processo
De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º -A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 7.434.640,98.
Lisboa, 08-01-2019
Os Árbitros
(Jorge Lopes de Sousa)
(Pedro Manuel Paes de Vasconcellos e Silva)
(Emanuel Augusto Vidal Lima)
[1] Neste sentido tem vindo a pronunciar-se pacificamente o Supremo Tribunal Administrativo, como pode ver-se pelos seguintes acórdãos: de 25-10-2000, processo n.º 025128, publicado em Apêndice ao Diário da República de 31-1-2003, página 3757; de 7-11-2001, processo n.º 026432, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, página 2602; de 7-11-2001, processo n.º 026404, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, página 2593.
[2] Nos termos do artigo 198.º, n.º 7, da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, «o disposto nos artigos 78.º-A a 78.º -D do Código do IVA aplica-se aos créditos vencidos após a entrada em vigor da presente lei».
[3] Perante esta expressa referência do TJUE «às autoridades nacionais competentes», tem de se concluir que, ao contrário do que defende a Requerente no artigo 221 das suas alegações, aquele Tribunal não entendeu que compita «ao tribunal nacional resolver» essa questão da possibilidade de regularização.
[4] Quanto ao princípio da igualdade, que a Requerente também invoca, será questão abordada no ponto 3.3.
[5] Não existe «um direito à igualdade na ilegalidade» (Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 14-7-1993, processo n.º 14218, publicado no Apêndice ao Diário da República de 31-10-95, página 214).
No mesmo sentido, podem ver-se os acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 17-04-2013, processo n.º 01023/12; de 17-04-2013, processo n.º 01070/12; de 13-11-2013, proferido no processo n.º 0881/13.
No mesmo sentido tem sido a jurisprudência uniforme da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, como se regista no recente acórdão de 03-05-2018, proferido no processo n.º 0404/18.
Entre vários, podem ver-se os acórdãos de 21-05-2002, proferido no processo n.º 045686, de 30-01-2003, proferido no recurso 01106/02; de 31-10-2013, proferido no processo n.º 0255/10; de 04-09-2014, proferido no processo 0117/13; de 13-12-2017, proferido no processo n.º 01379/17.