Decisão Arbitral (consultar versão completa no PDF)
I – Relatório
1. No dia 26.03.2018, a Requerente, A..., S.A., pessoa coletiva nº..., com sede na Rua..., nº..., Porto requereu ao CAAD a constituição de tribunal arbitral, nos termos do art. 10º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, com vista à declaração de ilegalidade da Liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), n.º 2016... e Demonstração de Acerto de Contas n.º 2016..., relativo ao exercício fiscal de 2012, bem como do Despacho de Indeferimento da Reclamação Graciosa deduzida pela Requerente, datado de 12.12.2017, proferido pela Chefe de Finanças, por delegação de competências do Diretor de Finanças do Porto através do Despacho n.º .../2017, de 28.03.2017.
2. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira.
Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1, do art. 6.º, do RJAT, por decisão do Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicada às partes, nos prazos legalmente aplicáveis, foi designado árbitro o signatário, que comunicou ao Conselho Deontológico e ao Centro de Arbitragem Administrativa a aceitação do encargo no prazo regularmente aplicável.
O Tribunal Arbitral foi constituído em 7.06.2018.
3. Os fundamentos apresentados pela Requerente, em apoio da sua pretensão, foram, em síntese, os seguintes:
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A Requerente é uma Empresa de Trabalho Temporário, a operar ao abrigo do regime estatuído pelo Decreto-Lei 260/2009, de 25 de Setembro, que se dedica à atividade de cedência temporária de trabalhadores para utilização de terceiros utilizadores.
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Ao abrigo do supra referido regime, a relação laboral strictu sensu é mantida entre o Trabalhador e a Empresa de Trabalho Temporário. Por sua vez, o Contrato de Utilização de Trabalho Temporário é o contrato de prestação de serviços celebrado entre um Utilizador e uma empresa de Trabalho Temporário pelo qual esta se obriga, mediante retribuição, a colocar à disposição daquele um ou mais trabalhadores temporários que ficam sujeitos aos poderes de direção e organização do Utilizador.
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De acordo com o referido regime, no âmbito da sua atividade, a Requerente celebra com os seus Clientes (legalmente denominados “Utilizadores”, conforme definição vertida no artigo 2.º/h) do Decreto-Lei 260/2009, de 25 de Setembro) Contratos de Utilização de Trabalho Temporário, adotando uma das seguintes modalidades:
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Contratos em que não se encontra incluído no montante faturado aos Utilizadores o pagamento de compensação por caducidade assumindo a Requerente a obrigação de pagar a respetiva compensação por caducidade do contrato de trabalho (doravante “CPE”), sendo tal pagamento posteriormente faturado aos Utilizadores.
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Contrato em que se encontra incluído no montante faturado aos Utilizadores o pagamento de compensação por caducidade
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Com base nas disposições legais e contratuais inerentes aos contratos de trabalho celebrados com os trabalhadores bem como com base no histórico de pagamento de CPE, a Requerente calcula mensalmente o montante a faturar aos seus Utilizadores, efetuando os ajustamentos (reforços ou diminuições) que se revelem devidos por referência à dotação do mês anterior.
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Para efeitos contabilísticos, a Requerente reconhece os montantes a receber dos Utilizadores como rendimento do período nas rubricas contabilísticas 72 - Prestações de serviço por contrapartida da conta 27 - Outras contas a receber e a pagar, sendo os respetivos ajustamentos, positivos ou negativos, reconhecidos nas mesmas contas.
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No período de tributação de 2012, os ajustamentos efetuados ao longo do ano consubstanciaram-se numa diminuição aos montantes anteriormente reconhecidos no montante total de € 249.552,61, encontrando-se tal ajustamento refletido na contabilidade através da variação a débito (crédito com valor negativo) na conta 72 (por contrapartida de movimento a crédito na conta 27).
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Durante o período de tributação em causa, impendia sobre a ora Requerente a obrigação de suportar o pagamento de encargos legais decorrentes da caducidade de diversos contratos de trabalho celebrados a termo resolutivo, certo ou incerto, celebrados com trabalhadores temporários, sendo possível calcular ao abrigo dessa mesma legislação a CPE devida a cada colaborador com assinalável precisão.
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Importa referir que, em decorrência da atividade desenvolvida pela ora Requerente, a rotatividade e o número dos seus colaboradores são bastante elevados, pelo que o pagamento das CPEs ora em questão é, atendendo ao conhecimento acumulado ao longo dos anos no desempenho da sua atividade, assumido como certo, pese embora existir uma ligeira incerteza quanto ao seu exato valor e data de pagamento.
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Em nenhuma das situações a ora Reclamante considerou que deveria ser reconhecida contabilisticamente uma provisão relativamente às CPE que por imposição legal terá que suportar, de acordo com o parágrafo 10 da norma contabilística NCRF21.
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Face à certeza da obrigação legal existente de pagamento da CPE já supra apresentada e repercussão de tais valores aos Utilizadores, por referência a estes últimos, a ora Reclamante reconheceu o rendimento associado aos montantes a faturar aos seus clientes.
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A AT efetuou uma correção aritmética ao lucro tributável da Requerente, por referência ao período de tributação de 2012, por ter considerado que a Requerente incorreu numa “errada contabilização da obrigação legal relacionado com a caducidade dos contratos de trabalho”.
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A ora Requerente discorda em absoluto com a teoria defendida pela AT de que o ajustamento a débito na conta n.º 72- Prestações de serviços- consista numa provisão, sendo claro para a Requerente que é extremamente reduzido o grau de incerteza que reveste a tempestividade e o montante das CPEs a pagar aos trabalhadores por si contratados (e a receber dos Utilizadores nos casos em que o CPE é faturado a estes).
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Todavia, o pagamento dos referidos montantes encontra-se temporalmente balizado e o respetivo montante é, nos termos da lei, determinável com base em critérios objetivamente previstos no CT sendo que, aquando da assinatura do contrato, a Requerente consegue estimar com fiabilidade o términus do contrato de trabalho temporário, com base no estipulado no próprio contrato e nas normas legais que limitam a duração deste – normas estas que são imperativas ao abrigo do disposto no artigo 339.º do CT.
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Sem prejuízo das considerações apresentadas supra que demonstram claramente a falta de pertinência da requalificação dos ajustamentos em causa como provisões, sucede que, após análise com detalhe dos movimentos subjacentes ao ajustamento em apreço, a Requerente acaba por concluir que, em bom rigor, o registo contabilístico efetuado a débito na conta 72 – Prestação de serviço mais não é do que a mera diminuição de um montante, em excesso (por referência à data dos factos), registado a crédito naquela mesma conta em anos anteriores.
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Dito de outro modo, este registo contabilístico mais não é do que, devido às circunstâncias da Requerente no ano de 2012, a anulação de um rendimento integralmente tributado em sede de IRC em períodos de tributação anteriores.
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De forma a compreender o racional contabilístico que conduziu a Requerente a registar em 2012 ajustamentos no montante total de € 249.552,61 com sinal negativo a crédito na conta 72 (o que corresponde a uma diminuição de rendimento), importa esclarecer o seguinte:
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Num determinado exercício fiscal, a Requerente calcula o valor que irá faturar aos seus Utilizadores em cumprimento dos contratos de tipo A).
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A Requerente efetua, a cada mês, uma análise da necessidade de reforçar ou diminuir o montante registado como rendimento na conta 72 para o período em apreço, efetuando os respetivos ajustamentos, sempre que os mesmos se revelem devidos de acordo com os critérios objetivos definidos.
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Em face desses ajustamentos - e de forma atípica tendo em conta o histórico de ajustamentos efetuados nos últimos anos pela Requerente -, o ajustamento global no ano de 2012 consistiu na diminuição do montante a receber dos Utilizadores no montante global de € 249.552,61.
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Tal ajustamento diz respeito à diferença entre a dotação considerada a 31 de Dezembro de 2011, no total de € 388.606,32, e o montante de rendimentos a auferir calculado por referência a 31 de Dezembro de 2012, no total de € 139.053,65.
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Este ajustamento contabilístico a débito na conta 72 foi registado por contrapartida de um movimento a crédito de uma conta de outros devedores (conta 272111 - Faturação CPE), onde se encontra registado o montante de CPE a faturar a clientes.
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Na medida em que a movimentação na conta 272111 tem como contrapartida a conta 72, resulta claro que a dotação considerada em Dezembro de 2011 no montante de € 388.606,79 foi integralmente sujeita a tributação em sede de IRC nos exercícios em que foi registada.
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Como tal, a Requerente efetua um ajuste a um rendimento efetivamente registado e integralmente tributado em sede de IRC no passado.
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Os movimentos contabilísticos operados pela Requerente encontram-se registados de acordo com os normativos contabilísticos aplicáveis, refletindo todas as operações realizadas, e estão organizados informaticamente.
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Atendendo a tudo quanto ficou exposto, dúvidas não restam que a correção proposta pela AT não é devida e encontra-se em clara violação de vários princípios conformadores do ordenamento jurídico-tributário, como sejam o princípio da legalidade, o princípio da tributação pelo lucro real e o princípio da capacidade contributiva, enfermando por isso de vício de violação de lei, devendo em consequência ser anulada a liquidação adicional de IRC decorrente da correção efetuada pela AT ao exercício de 2012.
Por outro lado,
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Sendo o ato tributário em apreço ostensivamente lesivo dos interesses e direitos do sujeito passivo, impendia sobre a AT um especial dever de fundamentação, por imposição legal.
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É pacífico, que a AT, deve enunciar as premissas de facto e de direito sobre as quais assenta a decisão que a mesma vier a proferir, e como se diz claramente no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 09-09- 2015, proferido no âmbito do processo n.º 01173/14, “A AT tem o dever legal de fundamentar os atos de liquidação (cfr. o art. 268º da CRP, bem como os arts. 21º do CPT, 125º do CPA e 77º da LGT).
A fundamentação, ainda que feita por remissão ou de forma sucinta, não pode deixar de ser clara, congruente e de contemplar os aspetos, de facto e de direito, que permitam conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo prosseguido pela Administração para a determinação do acto.”
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O iter cognoscitivo percorrido pela AT não é, todavia, percetível pois um declaratário normal, posto perante a justificação apresentada pela AT, teria sérias dúvidas quanto ao conteúdo e alcance do labor mental operado pela AT, mormente no que respeita à classificação da natureza como “provisão” do ajustamento de € 249.552,61 relevado a débito na conta 72 – Prestação de serviço.
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Deve ser declarada a ilegalidade do ato de indeferimento da Reclamação Graciosa e, por consequência, da Liquidação Adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), n.º 2016... e Demonstração de Acerto de Contas n.º 2016..., relativo ao exercício fiscal de 2012.
4. A ATA – Administração Tributária e Aduaneira, chamada a pronunciar-se, contestou a pretensão da Requerente, defendendo-se por impugnação, em síntese, com os fundamentos seguintes:
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No âmbito dos contratos de trabalho temporário que celebra com os seus clientes os mesmos podem assumir duas configurações, no que respeita à compensação por caducidade dos mesmos:
A) Contrato com o cliente que não abranja a referida caducidade, sendo o CPE pago pela Requerente posteriormente faturado aos Utilizadores.
B) Contrato em que se encontra incluído no montante faturado aos Utilizadores o
pagamento de compensação por caducidade.
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No primeiro caso (contratos em que a caducidade não é abrangida pelo mesmo), constata-se que a Requerente assume a obrigação de ressarcir o trabalhador da compensação de precariedade de emprego (doravante CPE) correspondendo à caducidade conforme determina o Código de Trabalho, sendo o CPE pago pela ora Requerente posteriormente faturado aos Utilizadores.
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Aquando da assinatura do contrato com o cliente, relativamente a esta obrigatoriedade assumida pela Requerente não é, de todo, conhecido nem quando irá ocorrer nem de quanto será a referida compensação;
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Assim, e considerando o conhecimento que detém da atividade que exerce, entendeu a empresa Requerente apurar uma estimativa, por prudência, para que contabilisticamente, esteja relevado um passivo de tempestividade e quantificação incerta;
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Perante esta factualidade, constatou-se que no final do exercício de 2012 o total dos rendimentos apurados se encontrava diminuído no montante de €249.552,61, decorrente destes ajustamentos;
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Atenta a análise da natureza das operações efetuadas, concluíram os Serviços Inspetivos que se afigura estar-se perante provisões que não foram reconhecidas como tal em termos contabilísticos;
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Mais tendo concluído que a errada contabilização da obrigação legal relacionada com a caducidade dos contratos de trabalho determinou um errado apuramento do lucro tributável do período;
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Assim, atendendo às características dos ajustamentos efetuados pela Requerente no montante de €249.552,61, para assegurar estas compensações, importou avaliar o reconhecimento contabilístico que esta efetuou para verificar se os mesmos poderiam ou não ser aceites como custos do exercício.
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Ora de acordo com o § 8 da norma NCRF 21 – Provisões, Passivos Contingentes e Ativos Contingentes, “uma provisão é um passivo de tempestividade ou quantia incerta” ou seja, trata-se de um passivo que se caracteriza pela incerteza acerca do momento concreto da sua ocorrência ou da quantia necessária à sua liquidação.
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Tratando-se de uma obrigação decorrente do próprio Código do Trabalho seria previsível, à data do balanço, que viesse a ser imputável ao exercício um encargo para a obtenção dos benefícios, tanto mais que atendendo ao conhecimento da atividade, a Requerente propôs contabilisticamente uma estimativa que considerava fiável para a constituição do referido ajustamento.
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Aliás, esse mesmo entendimento parece perfilhar a Requerente, quando entende apurar uma estimativa, por prudência, para que contabilisticamente esteja revelado um passivo de tempestividade e quantificação incerta, e que se encontra espelhado nos documentos contabilísticos, por exemplo: “acerto estimativa”.
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Assim, omitindo a contabilidade da empresa o passivo associado a uma obrigação legal, as suas demonstrações financeiras não contêm alguns dos atributos que se configuram como características qualitativas exigíveis pelo SNC, nomeadamente a fiabilidade e uma representação fidedigna, nomeadamente porque, desde logo, o balanço não reflete de forma verdadeira e apropriada a situação patrimonial da Requerente.
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Atente-se que, ao invés de ter reduzido o rédito (pelo lançamento de um valor negativo a crédito da conta 72) a Requerente deveria ter contabilizado um gasto na conta 67 – Provisões do período, sendo certo que, em termos aritméticos o valor do resultado líquido é o mesmo, também é certo que algumas das suas diferentes componentes não apresentam os valores que deveriam, o saldo credor da conta 72 está diminuído do seu valor real e foi omitido o valor de uma parte dos gastos do período, no que concerne às provisões.
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A errada contabilização da obrigação legal relacionada com a caducidade dos contratos de trabalho, determinou um errado apuramento do lucro tributável do período, as “estimativas” deveriam ter sido registadas contabilisticamente como provisões, uma vez que se destinavam a fazer face a um encargo imputável ao exercício, mas de comprovação futura, ou já comprovado mas de montante incerto, o que é manifestamente assumido pela Requerente quando diz que “consegue estimar com fiabilidade o términus no próprio contrato e nas normas legais que limitam a duração deste”.
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A Requerente, para além de não ter cumprido com as exigências formais do SNC em termos contabilísticos, não cumpriu com o disposto na lei fiscal, pois quer tenha registado na conta 72 a crédito com sinal negativo, como fez, quer tivesse procedido corretamente registando a débito na conta 67, sempre teria que acrescer esse montante no quadro 7 da declaração modelo 22, pelo facto de tais provisões não se enquadrarem em nenhuma da alíneas do art.º 39.º do CIRC.
5. Verificando-se a inexistência de qualquer situação prevista no art. 18º, nº 1, do RJAT, que tornasse necessária a reunião arbitral aí prevista, foi dispensada a realização da mesma, com fundamento na proibição da prática de atos inúteis.
Foi ainda dispensada a realização de alegações, nos termos do art. 18º, nº 2, do RJAT, “a contrario”.
6. O tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído nos termos do RJAT.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas.
O processo não padece de vícios que o invalidem.
7. Cumpre solucionar as seguintes questões:
a) Ilegalidade da liquidação por vício de violação de lei.
b) Ilegalidade da liquidação por vício de fundamentação.
II – A matéria de facto relevante
1.A Requerente é uma Empresa de Trabalho Temporário, a operar ao abrigo do regime estatuído pelo Decreto-Lei 260/2009, de 25 de Setembro, que se dedica à atividade de cedência temporária de trabalhadores para utilização de terceiros utilizadores.
2.De acordo com o referido regime, no âmbito da sua atividade, a Requerente celebra com os seus clientes contratos de utilização de trabalho temporário, adotando uma das seguintes modalidades:
A) Contratos em que não se encontra incluído no montante faturado aos Utilizadores como preço da prestação dos serviços o pagamento de compensação por caducidade.
Nestes contratos, a Requerente assume a obrigação de pagar a respetiva compensação por caducidade do contrato de trabalho, sendo tal pagamento posteriormente faturado aos Utilizadores.
B) Contrato em que se encontra incluído no montante faturado aos Utilizadores como preço da prestação dos serviços o pagamento de compensação por caducidade.
3.Nos casos mencionados em A) do número antecedente, a ora Requerente suporta o encargo da CPE, não sendo faturado qualquer montante aos Utilizadores a este título sendo o CPE pago pela ora Requerente posteriormente faturado aos Utilizadores:
4.Com base nas disposições legais e contratuais inerentes aos contratos de trabalho celebrados com os trabalhadores bem como com base no histórico de pagamento de CPE, a Requerente calcula mensalmente o montante a faturar aos seus Utilizadores, efetuando os ajustamentos (reforços ou diminuições) que se revelem devidos por referência à dotação do mês anterior.
5.Para efeitos contabilísticos, a Requerente reconhece os montantes a receber dos Utilizadores como rendimento do período nas rubricas contabilísticas 72 - Prestações de serviço por contrapartida da (sub)conta 2721 – Devedores por acréscimos de rendimentos, sendo os respetivos ajustamentos, positivos ou negativos, reconhecidos nas mesmas contas.
6.No período de tributação de 2012, os ajustamentos efetuados ao longo do ano consubstanciaram-se, globalmente, em termos contabilísticos, numa diminuição aos rendimentos anteriormente reconhecidos no montante total de € 249.552,61, encontrando-se tal ajustamento refletido na contabilidade através da variação a débito (crédito com valor negativo) na conta 72 (por contrapartida de movimento a crédito na conta 2721).
7.Em 2016 a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) efetuou um procedimento de Inspeção Tributária à Requerente, referente ao exercício fiscal de 2012, de carácter geral, constando do respetivo relatório final, designadamente, o seguinte:
9.
8.Na sequência do relatório a Requerida emitiu a liquidação sub judice da qual resulta que o montante de prejuízo fiscal apurado durante o período de tributação de 2012 não seria de € 483.512,07 (quatrocentos e oitenta e três mil, quinhentos e doze euros e sete cêntimos), conforme autoliquidado pela ora Requerente, mas de € 233.959,46 (duzentos e trinta e três mil, novecentos e cinquenta e nove euros e quarenta e seis cêntimos).
9.Em 30.03.2017, a Requerente apresentou reclamação graciosa contra este ato tributário, cujo teor, constante do processo administrativo, se dá por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.
10.A reclamação graciosa foi indeferida por despacho emitido em 12.12.2017 pela Chefe do Serviço de Finanças do Porto..., por delegação de competências do Diretor de Finanças do Porto cujo teor, bem como da informação e parecer que os acompanham, se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.
Com interesse para a decisão da causa inexistem factos não provados
9. A convicção do Tribunal quanto à decisão da matéria de facto alicerçou-se nos documentos constantes do processo, bem como dos articulados apresentados, inexistindo desacordo das partes relativamente a esta matéria.
-III- O Direito aplicável
10. Tendo a impugnante invocado a ilegalidade dos atos de liquidação por violação de lei, mas também por insuficiência de fundamentação, legalmente equiparada a falta de fundamentação, há que determinar a ordem do conhecimento dos vícios, devendo ser observada, como é pacífico, a prevista no art. 124º do CPPT, aplicável por força do art. 29º, nº 1, al. a) do RJAT (Cfr. Jorge Lopes de Sousa, Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, in GUIA DA ARBITRAGEM TRIBUTÁRIA, Coord. Nuno Villa-Lobos e Mónica Brito Vieira, 2017, Almedina, pag. 205).
O vício de violação de lei é aquele que conduzirá à “mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos” na medida em que a sua eventual procedência impedirá a renovação do ato, o que não sucede com uma hipotética anulação decorrente do vício de falta de fundamentação.
Em conformidade, o Tribunal irá apreciar em primeiro lugar do vício de violação de lei imputado à liquidação.
11. Na origem do dissidio que nos ocupa estão lançamentos contabilísticos da Requerente na conta 72 11[1], a crédito, na sua grande maioria com sinal negativo, sendo o saldo entre lançamentos de sinal positivo e de sinal negativo, favorável a estes no valor de 249.552,61 €, por contrapartida de lançamentos, de igual valor, a crédito, na conta 2721.
A classe 7 do Código de Contas do SNC “Inclui os rendimentos e os ganhos respeitantes ao período”[2]. Especificamente, a conta 72 “respeita aos trabalhos e serviços prestados que sejam próprios dos objetivos ou finalidades principais da entidade.(…)A contabilização a efetuar deve basear-se em faturação emitida ou em documentação externa (…) não deixando de registar os réditos relativamente aos quais não se tenham ainda recebido os correspondentes comprovantes externos”.[3]
As contas 272 “(…) registam a contrapartida dos rendimentos e dos gastos que devam ser reconhecidos no próprio período , ainda que não tenham documentação vinculativa, cuja receita ou despesa só venha a ocorrer em período ou períodos posteriores.”[4] Esta conta contém as sub-contas 2721 e 2722, consoante se trate de devedores por acréscimo de rendimentos ou de credores por acréscimo de gastos.
Na conta 2721 “regista-se, a débito, por contrapartida da respectiva conta de rendimentos, o montante de rendimentos atribuíveis ao período em curso, mas cujo rendimento efectivo ou recebimento ocorram em períodos subsequentes” [5]
Os lançamentos contabilísticos consistentes em variação crédito com valor negativo na conta 72 11 por contrapartida de movimento a crédito na conta 2721 traduzem-se na eliminação contabilística e fiscal de rendimentos que a Requerente antes havia reconhecido (por estimativa). Substancialmente, equivalem a movimentos a débito numa conta de rendimentos, e em movimentos a crédito numa conta de terceiros que, no caso, significam a diminuição contabilística de débitos de terceiros para com a Requerente.
É manifesto que a Requerida, na fundamentação do ato tributário que nos ocupa, assenta toda a sua linha argumentativa na não relevância para efeitos fiscais de hipotéticos acréscimos de gastos alegadamente representados por aqueles movimentos contabilísticos.
Diga-se, desde já, que este pressuposto não ocorre. Verificar-se-ia se estivesse em causa a movimentação da sub-conta 2722 onde se regista “a crédito por contrapartida da respectiva conta de gastos, o montante de gastos ou perdas atribuíveis ao período em curso mas cujo vencimento efectivo ou pagamento ocorram em períodos subsequentes.”[6] Todavia, não é isso que acontece. Não foi esta a conta que a Requerente movimentou nem qualquer conta de gastos, mas sim a conta 2721.
Trata-se dum manifesto erro do discurso justificativo do Relatório de Inspeção tributária, que estrutura toda a sua argumentação em supostos gastos com compensações a trabalhadores por precariedade do emprego (“CPE”) que segundo a Requerida, não relevariam para efeitos fiscais por alegadamente constituírem provisões não dedutíveis quando, na realidade, os lançamentos em causa respeitam a factos patrimoniais também relacionados com as mesmas compensações, mas de sinal contrário: valores a receber (rendimentos) de clientes da Requerente em função das compensações a pagar por esta aos trabalhadores que -bem ou mal- foram contabilisticamente “anulados” pela Requerente, com os lançamentos em causa.
A Requerente, na fase administrativa, contestou a posição da Requerida com o fundamento de se tratar de acréscimos de gastos e não de provisões, aparentemente aceitando o erróneo pressuposto de que a correção respeitava a desconsideração de gastos.
No pedido de pronúncia arbitral apesar de manter esta linha argumentativa na primeira parte do pedido de pronúncia arbitral, vem ainda alegar:
“Ora, sucede que, após análise com detalhe dos movimentos subjacentes ao ajustamento em
apreço, a Requerente acaba por concluir que, em bom rigor, o registo contabilístico efetuado a débito na conta 72 – Prestação de serviço mais não é do que a mera diminuição de um
montante em excesso (por referência à data dos factos), registado a crédito naquela mesma
conta em anos anteriores.
Dito de outro modo, este registo contabilístico mais não é do que, devido às circunstâncias da Requerente no ano de 2012, a anulação de um rendimento considerado em anos anteriores.
Rendimento este que, para efeitos fiscais, foi integralmente tributado em sede de IRC em
períodos de tributação anteriores (i.e., nos períodos de tributação em que tais rendimentos
foram considerados para efeitos contabilísticos).
(…)
Tal ajustamento diz respeito à diferença entre a dotação considerada a 31 de Dezembro de 2011, no total de € 388.606,32, e o montante de rendimentos a auferir calculado por referência a 31 de Dezembro de 2012, no total de € 139.053,65.
(…)
Na medida em que a movimentação na conta 272111 tem como contrapartida a conta 72, resulta claro que a dotação considerada em Dezembro de 2011 no montante de € 388.606,79 foi integralmente sujeita a tributação em sede de IRC nos exercícios em que foi registada.”
Ora, independentemente, da compatibilização destas duas linhas argumentativas, tem razão a Requerente quando conclui que os registos efetuados na conta 72 são diminuições do montante registado a crédito naquela conta (diminuição de rendimentos).
Esta diminuição, como resulta das alegações da própria Requerente está ligada a uma não concretização dos cálculos por ela efetuados relativamente ao valor que iria faturar aos seus Utilizadores em cumprimento dos contratos de tipo A).
Segundo a Requerente estes rendimentos, agora “anulados”, foram objeto de relevação contabilística e tributados em anos anteriores.
Depreende-se das alegações da Requerente que, uma vez que tais rendimentos foram considerados e tributados em excesso em anos anteriores, em função de estimativas que não se concretizaram, seria ajustada a eliminação de igual valor no exercício de 2012.[7]
A Requerida sustenta no RIT que “ao invés de ter reduzido o rédito (pelo lançamento de um valor negativo da conta 72) a empresa deveria ter contabilizado um gasto na conta 67 – provisões do período” e que “o montante contabilizado com sinal negativo a crédito na conta 72, mais não é do que uma provisão para outros encargos”.
Esta tese da Requerida só poderia, em tese, e à luz da sua linha argumentativa, ser defensável se os registos em causas dissessem respeito a acréscimos de gastos, o que não é o caso. Como é apodítico, a redução de réditos, pelo lançamento de valores negativos da conta 72 (independentemente do acerto de tal registo), não tem a natureza de gasto, traduzindo-se, diferentemente, na desconsideração de rendimento.
A tese da Requerida é desconforme com os normativos contabilísticos assinalados violando, consequentemente, o art. 17º, nº 1, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas.
O ato tributário, tendo em conta a sua fundamentação, não pode manter-se na ordem jurídica por manifesto erro sobre os pressupostos de direito, pelo que os atos tributários sub judice não podem deixar de ser anulados ficando, em consequência, prejudicado o conhecimento do vício de forma referente à fundamentação da liquidação.
-IV- Decisão
Assim, decide o Tribunal arbitral julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e decretar a anulação da liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), n.º 2016 ... e Demonstração de Acerto de Contas n.º 2016..., relativo ao exercício fiscal de 2012, bem como do Despacho de Indeferimento da Reclamação Graciosa deduzida pela Requerente.
Valor da ação: € 48.161,99 (quarenta e oito mil, cento e sessenta e um euros e noventa e nove cêntimos).
nos termos do disposto no art. 306º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.
Custas pela Requerida, no valor de 2 142.00 (dois mil cento e quarenta e dois euros) nos termos do nº 4 do art. 22º do RJAT.
Notifique-se.
Lisboa, CAAD, 26.11.2018
O Árbitro
Marcolino Pisão Pedreiro
[1] Cfr. Código de Contas do SISTEMA DE NORMALIZAÇÃO CONTABILISTICA (“SNC”) (Portaria nº 1011/2009, D.R. nº 175, Série I, de 2009-09-09.
[2] Cfr. Notas de enquadramento ao Código de Contas do SNC.
[5] António Borges, Azevedo Rodrigues e Rogério Rodrigues, ELEMENTO DE CONTABILIDADE GERAL, 26ª Edição, 2014, Áreas Editora, pag. 595.
[6] António Borges, Azevedo Rodrigues e Rogério Rodrigues, ob. cit. pag. 596.
[7] Não consta do relatório de inspeção tributária o que que terá ocorrido com os correspetivos acréscimos de gastos com os CPE que, em princípio, logicamente, poderão também ter sido registados por excesso pela Requerente, em função das estimativas que não se vieram a concretizar.