Acordam os Árbitros José Pedro Carvalho (Árbitro Presidente), Adelaide Moura e Catarina Gonçalves, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem Tribunal Arbitral, na seguinte:
DECISÃO ARBITRAL (consultar versão completa no PDF)
I – RELATÓRIO
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No dia 28 de novembro de 2017, A..., NIPC..., com escritórios em ..., Grécia, apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade dos actos de retenção na fonte de IRC, no valor de 232.963,38 EUR.
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Para fundamentar o seu pedido alega a Requerente, em síntese:
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A questão fundamental suscitada no âmbito dos presentes Autos prende-se com a questão de saber se os serviços prestados pela Requerente à B... são ou não considerados geradores de rendimentos em território português para efeitos do artigo 4.º do Código do IRC e, nessa medida, sujeitos a retenção na fonte a título definitivo.
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Não são controvertidos os factos de a Requerente ser, por um lado, uma entidade não residente em Portugal de, por outro, os serviços prestados à B... serem integralmente efectuados fora do país e de, por fim, terem sido efectuadas retenções na fonte de IRC à Requerente, entre Abril de 2014 e Outubro de 2016, por parte da B... no âmbito do “contrato de prestação de serviços de marketing” celebrado entre ambas.
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A AT apenas questiona a qualificação do contrato celebrado entre as partes, entendendo tratar-se de um contrato de agência e não, como afirmado pelos signatários, um contrato de prestação de serviços de marketing.
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A ora Requerente ficou de divulgar no mercado grego, cirurgicamente e junto das pessoas ‘certas’ – i.e. aquelas que, dentro das empresas conhecem as necessidades de reparação dos navios da sua frota e/ou têm o poder de decidir quanto à aquisição dos serviços disponibilizados pela B... .
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Materialmente a actividade da Requerente é uma actividade de marketing.
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Nos termos do n.º 4 do mesmo artigo 4.º do Código do IRC não se consideram obtidos em território português, para efeitos da respectiva tributação, os rendimentos derivados de outras prestações de serviços realizados ou utilizados em território português (não relativos a transportes, comunicações e actividades financeiras) «quando os serviços de que derivam, sendo realizados integralmente fora do território português, não respeitem a bens situados nesse território, nem estejam relacionados com estudos, projectos apoio técnico ou à gestão, serviços de contabilidade ou auditoria e serviços de consultoria, organização, investigação e desenvolvimento em qualquer domínio».
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Sendo este, conforme se comprovou, o caso dos serviços prestados pela ora Requerente, andou mal a AT ao considerar que os rendimentos derivados desses mesmos serviços estão sujeitos a imposto em Portugal, indeferindo a pretensão da Requerente no sentido de obter a devolução dos montantes retidos indevidamente.
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No dia 29 de novembro de 2017, o pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à AT.
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A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do tribunal arbitral colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
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Em 19 de janeiro de 2018, as partes foram notificadas dessas designações, não tendo manifestado vontade de recusar qualquer delas.
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Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral colectivo foi constituído em 8 de fevereiro de 2018.
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No dia 14 de março de 2018, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua resposta defendendo-se por impugnação.
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No dia 17 de abril de 2018, realizou-se a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, onde foram inquiridas as testemunhas, no acto, apresentadas pela Requerente.
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Tendo sido concedido prazo para a apresentação de alegações escritas, foram as mesmas apresentadas pelas partes, pronunciando-se sobre a prova produzida e reiterando e desenvolvendo as respectivas posições jurídicas.
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Foi fixado o prazo de 30 dias para a prolação de decisão final, após a apresentação de alegações da AT, e em 7 de agosto de 2018 foi notificado às partes Despacho arbitral de prorrogação por dois meses do prazo para emissão da decisão final do processo, bem como do prazo fixado no artigo 21.º/1 do RJAT.
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O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5º. e 6.º, n.º 1, do RJAT.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
O processo não enferma de nulidades.
Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.
Tudo visto, cumpre proferir
II. DECISÃO
A. MATÉRIA DE FACTO
A.1. Factos dados como provados
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A Requerente é uma sociedade não residente em Portugal.
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A Requerente tem como objecto social a prestação de serviços de marketing para divulgação dos serviços de estaleiros de reparação naval no mercado grego desempenhando funções de agência.
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Em 1 de Setembro de 2012, a ora Requerente celebrou com a B..., S.A., sociedade sediada em ..., ...-... ..., com o NIPC..., um contrato denominado “Marketing Agreement”.
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Do referido contrato constam, para além do mais, as seguintes cláusulas:
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A ora Requerente, no âmbito do referido contrato, não negociou, não preparou a celebração, nem celebrou contratos em nome da B... .
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Os serviços prestados pela ora Requerente à B..., no âmbito daquela relação contratual, incluíram a realização de actividades como a manutenção de registos internos relativos aos navios aportados em território grego e necessitados de manutenção ou reparação e a divulgação dos serviços prestados pela B... nesse âmbito, por e-mail ou telefonicamente, junto dos proprietários desses navios e em tempo útil, através da entrega de material publicitário providenciado pela própria B... e da referenciação de clientes que já utilizaram os serviços da B... .
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Nos casos em que a actividade desenvolvida pela Requerente foi bem sucedida, o potencial cliente foi colocado em contacto directo com a B..., com quem, regra geral, passou a desenvolver todos os aspectos do negócio.
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Pelos serviços prestados, a ora Requerente auferiu uma remuneração, nos termos da cláusula D do contrato.
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Ao longo de todo o tempo de execução do contrato, a B... efectuou o pagamento dos serviços prestados pela Requerente com regularidade trimestral e sempre com retenção na fonte de IRC sobre os montantes devidos, à taxa de 25%.
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As referidas retenções na fonte, referentes aos anos de 2014 a 2016, foram objeto de reclamação graciosa apresentada a 23-11-2016, à qual foi atribuída o n.º de processo ...2017... .
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Por informação datada de 05-04-2017, com despacho do Diretor de Finanças Adjunto, em regime de substituição, de 26-04-2017, a AT propôs o indeferimento da reclamação graciosa, referindo, para além do mais, o seguinte:
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A AT notificou a ora Requerente para, no prazo de 15 dias, exercer, querendo, o direito de participação na decisão, na modalidade de audição prévia através do ofício n.º ... de 27-04-2017.
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A 16-05-2017, a Requerente exerceu o seu direito de audição prévia.
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Por despacho do Diretor de Finanças Adjunto, em regime de substituição, de 26-05-2017, a AT indeferiu a reclamação graciosa, nos termos supra referidos, acrescentando a seguinte fundamentação, tendo em conta as alegações apresentadas pela reclamante, aqui Requerente, em sede de audição prévia:
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A 29-06-2017, a ora Requerente recorreu hierarquicamente do referido despacho de indeferimento.
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O referido recurso hierárquico não foi objecto de decisão no prazo de 60 dias, contados da respectiva apresentação.
A.2. Factos dados como não provados
1- Que com a actividade descrita no ponto 7 dos factos provados se desse por concluída a intervenção da Requerente.
A.3. Fundamentação da matéria de facto provada e não provada
Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).
Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º/7 do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, bem como a prova testemunhal produzida, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo em conta que, como se escreveu no Ac. do TCA-Sul de 26-06-2014, proferido no processo 07148/13[1], “o valor probatório do relatório da inspecção tributária (...) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas”.
O facto dado como não provado assenta da prova testemunhal produzida, de onde resultou que, após o primeiro contacto do cliente com a B..., no caso de se desenvolver uma relação contratual, a Requerente prestava serviços residuais de apoio durante e após a execução do contrato da B... com o cliente grego, como sejam a facilitação de contactos entre as partes (atento o desfasamento cultural e linguístico entre Portugal e a Grécia), ou a realização de inquéritos de satisfação.
Não se deram como provadas, nem não provadas, alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insusceptíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada.
B. DO DIREITO
Como bem refere a Requerente, a questão fundamental suscitada no âmbito deste processo prende-se com a questão de saber se os serviços prestados pela Requerente são ou não considerados rendimentos obtidos em território português para efeitos do art. 4.º do CIRC e, nessa medida, sujeitos a retenção na fonte em Portugal.
Importa, deste modo, ter em conta as disposições legais relevantes para a causa.
Assim, dispõe o art.4.º, nºs 3 e 4, do CIRC que:
“3 – Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se obtidos em território português os rendimentos imputáveis a estabelecimento estável aí situado e, bem assim, os que, não se encontrando nessas condições, a seguir se indicam:
c) rendimentos a seguir mencionados cujo devedor tenha residência, sede ou direção efetiva em território português ou cujo pagamento seja imputável a um estabelecimento estável nele situado:
6) os provenientes da intermediação na celebração de quaisquer contratos;
7) os derivados de outras prestações de serviços realizados ou utilizados em território português, com exceção dos relativos a transportes, comunicações e atividades financeiras;
4 – Não se consideram obtidos em território português os rendimentos enumerados na alínea c) do número anterior quando os mesmos constituam encargo de estabelecimento estável situado fora desse território relativo à atividade exercida por seu intermédio e, bem assim, quando não se verificarem essas condições, os rendimentos referidos no n.º 7 da mesma alínea, quando os serviços de que derivam, sendo realizados integralmente fora do território português, não respeitem a bens situados nesse território nem estejam relacionados com estudos, projetos, apoio técnico ou à gestão, serviços de contabilidade ou auditoria e serviços de consultoria, organização, investigação e desenvolvimento em qualquer domínio”.
Por sua vez, dispõe o art.94.º, nº1 do CIRC que
“O IRC é objeto de retenção na fonte relativamente aos seguintes rendimentos obtidos em território português:
g) rendimentos provenientes da intermediação na celebração de quaisquer contratos e rendimentos de outras prestações de serviços realizados ou utilizados em território português, com exceção dos relativos a transportes, comunicações e atividades financeiras”.
E, por seu turno, o n.º 2 do mesmo artigo acrescenta que
“Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se obtidos em território português os rendimentos mencionados no n.º 3 do artigo 4.º, excetuados os referidos no n.º 4 do mesmo artigo.”
A este respeito, importa atentar na decisão no processo 418/2014-T, na qual se explicita a interpretação a dar às disposições supra referidas:
“O conglomerado normativo em causa, carece, desde logo, de uma desconstrução no sentido de, na medida do possível, tornar minimamente compreensível o seu teor, na situação concreta a que se há-de aplicar.
Assim, e expurgando aquele dispositivo legal das passagens alheias ao caso concreto, chegar-se-á a um enunciado assente nos seguintes pontos:
- as pessoas colectivas e outras entidades que não tenham sede nem direcção efectiva em território português ficam sujeitas a IRC apenas quanto aos rendimentos nele obtidos;
- considerando-se como tal aqueles cujo devedor tenha residência, sede ou direcção efectiva em território português ou cujo pagamento seja imputável a um estabelecimento estável nele situado, derivados de outras prestações de serviços[1] realizados ou utilizados em território português, com excepção dos relativos a transportes, comunicações e atividades financeiras;
- excepto quando os mesmos:
o constituam encargo de estabelecimento estável situado fora do território português, relativo à actividade exercida por seu intermédio; e, bem assim
o quando os serviços de que derivam, sendo realizados integralmente fora do território português:
§ não respeitem a bens situados nesse território;
§ nem estejam relacionados com estudos, projectos, apoio técnico ou à gestão, serviços de contabilidade ou auditoria e serviços de consultoria, organização, investigação e desenvolvimento em qualquer domínio.
A operação que se vem de executar, evidencia desde logo, a operatividade normativa desta última referência, à ausência de relação dos serviços prestados com, designadamente, o apoio técnico.
Assim, a regra será, na matéria que nos ocupa, a resultante da conjugação do n.º 2, com o n.º 7, da al. c) do n.º 3, ambos do artigo 4.º do CIRC, ou seja, a de que se consideram obtidos em território português, os rendimentos cujo devedor tenha residência, sede ou direcção efectiva em território português ou cujo pagamento seja imputável a um estabelecimento estável nele situado, derivados de outras prestações de serviços[2] realizados ou utilizados em território português.
A excepção a esta regra, será a de que os rendimentos não se considerarão como obtidos em território português, quando os serviços de que derivam, apesar de utilizados em território português[3], sejam realizados integralmente fora dele desde que:
- não respeitem a bens situados em território português; ou
- os serviços não estejam relacionados, para o que nos interessa, com apoio técnico.
Deste modo, e em suma, à regra de que os rendimentos cujo devedor tenha residência, sede ou direcção efectiva em território português ou cujo pagamento seja imputável a um estabelecimento estável nele situado, derivados de outras prestações de serviços[4] realizados ou utilizados em território português, se consideram obtidos em território português, será oponível a excepção de que os mesmos foram integralmente realizados fora do território português. A esta excepção, todavia, será inoponível à AT quando, não obstante integralmente realizados fora do território português, os serviços estiverem relacionados, para o que nos interessa, com apoio técnico.”
Ou seja, e no que ao caso respeita, o rendimento obtido pela Requerente estará sujeito a retenção na fonte caso o rendimento que lhe foi pago pela B... (sua contraparte no contrato controvertido):
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Seja proveniente da intermediação na celebração de quaisquer contratos;
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Seja derivado de outras prestações de serviços realizados ou utilizados em território português, excepto se os serviços de que deriva, sendo realizados integralmente fora do território português,
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não respeitem a bens situados nesse território;
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nem estejam relacionados com estudos, projetos, apoio técnico ou à gestão, serviços de contabilidade ou auditoria e serviços de consultoria, organização, investigação e desenvolvimento em qualquer domínio.
Como se referiu no supra-citado processo arbitral 418/2014-T, a regra será a tributação em Portugal de rendimento pagos por entidades aqui residentes, e a excepção, a sua não tributação, verificadas que sejam determinadas circunstâncias.
Deste modo, e pretendendo a Requerente valer-se da excepção à regra, cumprir-lhe-á, nos termos das regras do ónus da prova aplicáveis, fazer prova dos pressupostos de tal exceção, o que no caso, e face às posições assumidas na matéria pela AT, se reconduz a fazer prova de que as remunerações que auferiu e que tiveram como fonte pagadora uma entidade residente em território nacional, não provêm da intermediação na celebração de quaisquer contratos.
É relativamente a esta matéria que as partes divergem, sendo que a Requerente entende que em causa está um contrato de marketing e a Requerida um contrato de agência, com as consequências jurídico-tributárias daí retiradas, ou seja, de acordo com a Requerente, os rendimentos dali decorrentes não estarão sujeitos a retenção na fonte em Portugal, ou, pelo contrário e de acordo com a Requerida, estarão.
Note-se, desde logo, que, nos termos do artigo 36.º, n.º4 da LGT, “A qualificação do negócio jurídico efetuada pelas partes, mesmo em documento autêntico, não vincula a administração tributária.”
Não obstante, julga-se que a qualificação do contrato, como um contrato de agência ou como um contrato de marketing, ponto de discórdia entre as partes, não será decisiva, ou fundamental, para resolver a questão que este tribunal foi chamado a dirimir, uma vez que, referindo-se a letra da lei a rendimentos derivados de “intermediação de contratos”, será esta a realidade a orientar, em função dos factos dados como provados, a solução a que se venha a chegar a final.
Deste modo, e antes de tudo o mais, cumpre densificar o que se possa entender por actividade de “intermediação de contratos”, sendo certo que inexiste, no ordenamento jurídico, uma definição transversal que possa servir de orientação ao aplicador de direito.
De um ponto de vista semântico-literal, a actividade de “intermediação de contratos” será aquela que tem em vista facilitar ou promover a celebração de contratos, entre terceiros (que não a entidade que enceta da referida actividade).
Esta primeira aproximação pode ser consolidada tendo em vista o teor de outras regulações que atribuem relevo a actividades de intermediação.
Assim, por exemplo, no que diz respeito à actividade de intermediação de contratos de praticantes desportivos por agentes desportivos, tem-se entendido que “enquanto intermediário, o agente de jogadores desenvolve uma actividade de mediação: ele procura pôr em contacto praticantes desportivos, clubes e sociedades desportivas com vista à celebração de contratos de formação ou de trabalho e de exploração da imagem desses praticantes. Para tanto, desenvolve contactos com os potenciais interessados, envolve-se nas negociações, analisa e discute os termos do novo vínculo, promove a aproximação das posições negociais das partes e procura alcançar um acordo entre elas.”[2].
No que diz respeito à actividade de intermediação financeira, o artigo 292.º do Código de Valores Mobiliários, dispunha, na sua redacção original, que “A publicidade, a promoção e a prospecção dirigidas à celebração de contratos de intermediação ou à recolha de elementos sobre clientes actuais ou potenciais integram a actividade de intermediação a que se referem, só podendo ser realizadas por intermediários financeiros autorizados a desenvolver essa actividade.”.
Com base no referido normativo, escreveu-se no Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 26-03-2008, proferido no processo 9092/2007-3, “que não são apenas os actos de promoção e de prospecção a poderem integrar a actividade de intermediação, mas também a própria publicidade.”.
Também o Decreto-Lei n.º 81-C/2017, de 07-07-2017, que aprova o regime jurídico que estabelece os requisitos de acesso e de exercício da actividade de intermediário de crédito e da prestação de serviços de consultoria, transpondo parcialmente a Diretiva 2014/17/UE, no seu artigo 4.º/1/a), integra no conteúdo essencial da actividade de intermediação regulada, a apresentação ou proposta de contratos.
Por fim, a AT portuguesa entendeu já[3], a propósito da intermediação de contratos de financiamento, que a intermediação abrange a “intervenção de terceiros visando a (...) concretização” de contratos”.
À luz dos subsídios recolhidos, poder-se-á então assentar que rendimentos provenientes da intermediação na celebração de quaisquer contratos, para efeitos do artigo 4.º/3/c)/6) do CIRC, serão rendimentos que tenham a sua causa – cujo sinalagma do rendimento consista – numa actividade que tenha essencialmente em vista (ou seja, cujo valor económico principal consista) na aproximação de partes tendo em vista a formação de contratos, incluindo-se na referida actividade outras que lhe sejam acessórias, como sejam a publicidade, prospecção de mercado e a negociação de contratos, desde que funcionalizadas àquele objectivo principal de que sejam celebrados contratos.
Este entendimento encontrará correspondência na ratio legis do regime jurídico em aplicação, que tem em vista definir os termos da localização dos rendimentos tributáveis em Portugal, fazendo-o, por regra, à luz do conceito de “fonte do rendimento” e, adicionalmente, do conceito de “fonte pagadora” e que, no fundo, e naquilo que para o caso releva, se traduz que sejam tributados em território nacional, os rendimentos que se considerem aí gerados, tendo-se como tal os rendimentos que derivem da celebração de contratos que venham a gerar rendimentos tributáveis em Portugal.
Posto isto, e tendo em conta a matéria de facto apurada, haverá que concluir que a Requerente não logrou demonstrar que o rendimento por si obtido não deriva da intermediação dos contratos celebrados pela B..., com operadores sedeados na Grécia, como alega.
Tendo em conta o substracto factual fixado, verifica-se que a atividade desenvolvida pela Requerente não se circunscreve à mera promoção e divulgação dos serviços da B..., e que não é, sequer, este, o fim principal da relação contratual com aquela, da qual derivam os rendimentos que a Requerente pretende eximir à tributação. De facto, a Requerente identifica listas de potenciais clientes, acompanha muitas vezes as visitas do seu cliente Português (B...) aos armadores e mantém visibilidade e informação sobre o pagamento dos serviços pelos clientes identificados, na medida em que a sua remuneração é definida como uma percentagem dos serviços prestados pela B... e apenas é recebida quando esta última recebe também do seu cliente.
Deste modo, forçoso é concluir que o interesse principal e imediato da entidade contratante dos serviços da Requerente geradores dos rendimentos cuja tributação se discute é a concreta celebração de contratos com operadores gregos, e que, correspectivamente, o fim principal e imediato da actividade desenvolvida pela Requerente, geradora daqueles rendimentos, é a celebração de contratos entre a B... e operadores gregos.
Por conseguinte, não se pode concluir de outra forma que não a de que os rendimentos cuja tributação a Requerente contesta, estão indissociavelmente ligados à celebração de contratos com operadores gregos pela B..., ao ponto de a Requerente apenas ser paga na medida em que a B... o seja, sendo, assim, a efectivação de tais contratos a causa jurídica dos rendimentos pagos por esta àquela.
Face ao exposto, dever-se-ão qualificar os rendimentos em questão como “provenientes da intermediação na celebração de quaisquer contratos”, e, como tal, sujeitos a tributação em território português, não se verificando, por isso, o erro de direito assacado pela Requerente às liquidações de retenções na fonte objecto da presente acção arbitral, que deve, desse modo, improceder.
Por tudo o que acima se expõe, julga-se improcedente o pedido.
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C. DECISÃO
Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral julgar integralmente improcedente o pedido arbitral formulado e, em consequência:
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Absolver a Requerida do pedido, mantendo na ordem jurídica os actos tributários objecto da presente acção arbitral; e
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Condenar a Requerente nas custas do processo, no montante abaixo fixado, tendo-se em conta o já pago.
D. Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em € 232.963,38, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
E. Custas
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 4.284,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerente, uma vez que o pedido foi totalmente improcedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.
Notifique-se.
Lisboa 8 de Outubro de 2018
O Árbitro Presidente
(José Pedro Carvalho)
O Árbitro Vogal
(Adelaide Moura)
O Árbitro Vogal
(Catarina Gonçalves)
[1] Disponível em www.dgsi.pt, tal como a restante jurisprudência citada sem menção de proveniência.