Os árbitros José Poças Falcão (presidente), Francisco Nicolau Domingos e A. Sérgio de Matos (vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formarem o presente tribunal arbitral, acordam no seguinte:
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A..., S.A., pessoa coletiva n.º..., com sede na Rua..., n.º..., ... - ... - Porto, doravante designada por Requerente, apresentou em 05/03/2018 pedido de constituição de tribunal e de pronúncia arbitral respeitante ao ato de indeferimento expresso do recurso hierárquico n.º ...2015... que manteve o indeferimento da reclamação graciosa e, mediatamente sobre a legalidade da liquidação oficiosa de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) e de juros compensatórios (121 673,14 € de IMT e 4 733,59 € de juros compensatórios) por, no seu juízo, padecer do vício de violação de lei.
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O Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo legal.
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No dia 17/05/2018 ficou constituído o tribunal arbitral.
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Cumprindo a estatuição do art. 17.º, n.º 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (RJAT) foi a Requerida, em 24/05/2018 notificada para, querendo, apresentar resposta, solicitar a produção de prova adicional e remeter o processo administrativo (PA).
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Em 27/06/2018 a Requerida apresentou a sua resposta, na qual defende a improcedência integral do pedido de pronúncia arbitral, atenta a legalidade da liquidação de imposto e de juros compensatórios.
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O tribunal em 02/07/2018 decidiu indeferir a requerida prova testemunhal com a fundamentação descrita no despacho datado de tal dia, dispensar a realização da reunião a que o art. 18.º, n.º 1 do RJAT se refere, com base na inexistência de exceções a conhecer e na desnecessidade de convidar as partes a corrigir as peças processuais, concedeu vinte dias para que estas, querendo, apresentassem as alegações finais escritas e designou data limite para proferir a decisão arbitral.
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As partes apresentaram as suas alegações finais escritas no dia 14/09/2018 e 13/09/2018, respetivamente, mantendo a sua posição inicial.
A Requerente começa por alegar que a questão a dirimir consiste em saber se uma entidade que, a título profissional, se dedica à atividade de compra e venda de imóveis e, nesse âmbito, adquire um prédio para revenda e que perante as dificuldades financeiras recorre a um Processo Especial de Revitalização (PER) no qual é ajustada a transferência do direito de propriedade sobre prédios, sob a forma de dação em cumprimento, deve ver precludida a possibilidade de beneficiar da isenção prevista no art. 7.º do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT).
Na sua posição, apesar do referido preceito consagrar um benefício fiscal e, por isso, dever ser objeto de interpretação estrita, dever-se-á concluir que o contrato celebrado cumpriu todos os requisitos exigidos pelo CIMT para a aplicação da isenção e, como tal, a liquidação é ilegal, por padecer do vício de violação de lei.
No seu juízo, o problema coloca-se na questão de saber se a dação em cumprimento pode considerar-se abrangida, para efeitos do CIMT, no conceito de revenda, bem como na resposta: se o destino dado a um imóvel que é objeto de dação difere daquele dado a um imóvel que seja objeto de revenda?
Na sua opinião, a dação em cumprimento cabe no conceito de revenda, como também deve ser dada resposta negativa à segunda questão.
Subsidiariamente, defende que a eventual limitação (à compra e venda) do art. 7.º, n.º 1 do CIMT e art. 11.º do CIMT padecem de inconstitucionalidade, por violação dos princípios da capacidade contributiva e da igualdade. Em bom rigor, a aplicação dos referidos normativos, de forma a excluir a dação, viola os aludidos princípios constitucionais, na medida em que consubstancia um injustificado tratamento diferenciado entre a revenda e a dação em cumprimento, quando a doutrina e a jurisprudência defendem que ambas as hipóteses apresentam a mesma realidade económica.
Em terceira linha peticiona a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) no pagamento de juros indemnizatórios visto existir erro imputável aos serviços, contados desde a data do pagamento indevido até efetivo e integral cumprimento.
A Requerida na sua resposta defende-se da seguinte forma:
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Caducidade da isenção
A isenção prevista no art. 7.º, n.º 1 do CIMT pretende beneficiar as empresas que tenham por objeto comercial a compra e venda de imóveis, revendam esses imóveis sem terem de suportar o IMT da primeira compra, isto é, tratando-os como mercadoria no âmbito da atividade empresarial.
Sucede que, no seu juízo, a Requerente não revendeu os imóveis no âmbito da sua atividade comercial, mas sim, deu-os em pagamento de dívidas e obrigações que tinha para com o Banco B..., S. A., através da celebração de um contrato de dação em cumprimento. Assim, os imóveis não podem ser considerados mercadoria que é transacionada no âmbito comercial, como acontece na compra e venda.
Por isso, não concorda com a posição da Requerente quando defende que os destinos da revenda e da dação em cumprimento coincidem inteiramente.
Em segunda linha, defende que se o legislador não previu isenções de IMT nessas situações especiais de PER, nem a norma de isenção prevê outros contratos, referindo-se somente à compra e venda, a pretensão anulatória da Requerente não tem fundamento legal.
Em resumo, a liquidação de IMT e de juros compensatórios deve ser mantida na ordem jurídica.
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Da violação do princípio da capacidade contributiva e da igualdade
A interpretação efetuada pela AT não é inconstitucional, pois apenas permite que a isenção seja concedida quando os imóveis são adquiridos para revenda e não perante qualquer outra interpretação, o texto legal é perfeitamente claro e os contratos em causa não são idênticos.
Não se concebe que a AT tenha efetuado uma interpretação violadora do princípio da igualdade, pelo contrário, se não tivesse liquidado o IMT, aí sim, teria violado o princípio da igualdade fiscal, na medida em que estaria a beneficiar a Requerente em prejuízo de outros sujeitos passivos.
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Do direito juros a indemnizatórios
Não existindo «erro imputável aos serviços» na emissão da liquidação em causa, não pode ser reconhecido o direito a juros indemnizatórios.
Nesta sequência, são as seguintes questões que o tribunal deve apreciar:
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Se o indeferimento expresso do recurso hierárquico padece de erro sobre os pressupostos de direito;
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Se a AT deve ser condenada a reembolsar a Requerente do valor pago de IMT e de juros compensatórios;
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Se a AT deve ser condenada no pagamento de juros indemnizatórios.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído com base nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1 do RJAT, sendo competente para apreciar e decidir o pedido de pronúncia arbitral.
As partes, que estão devidamente representadas, gozam de personalidade e de capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
O processo não enferma de nulidades.
4. MATÉRIA DE FACTO
4.1. Factos que se consideram provados
4.1.1. A Requerente é uma sociedade comercial que tem por objeto a «indústria de construção civil, compra, venda, revenda e arrendamento de bens imobiliários».
4.1.2. A Requerente sujeitou-se a PER que correu os seus termos no Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia sob o n.º .../12...TYVNG.
4.1.3. No teor do referido PER consta que a Requerente aceitou efetuar a dação em cumprimento das frações AI, AJ, AZ e BG do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ... e ... sob o art. ... (anterior art. ... da freguesia de ...), por 2 109 267,92 € ao Banco B..., S.A. (atual C...).
4.1.4. A Requerente adquiriu à D..., S. A. em 07/08/2013 as frações AI, AJ, AZ e BG do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia do ... e ... sob o art. ..., por 2 109 267,92 €, constando na escritura que foi arquivado o documento que titula a isenção de IMT, ao abrigo do art. 7.º, n.º 1 do CIMT.
4.1.5. No PER constava que as aludidas frações seriam objeto de dação em pagamento pela D..., S. A. à Requerente para extinguir um crédito desta, com fonte em contrato de empreitada de construção civil.
4.1.6. No dia 07/08/2013 a Requerente celebrou uma escritura de dação em cumprimento das frações previamente adquiridas para extinção de responsabilidades bancárias junto do Banco B..., S. A. (atual D...) no montante de 2 109 267,92 €.
4.1.7. O Serviço de Inspeção Tributária da Direção de Finanças do Porto enviou a OI n.º 2014... para o Serviço de Finanças do Porto -..., por ter apurado que houve caducidade da isenção de IMT.
4.1.8. O Serviço de Finanças do Porto - ... elaborou uma proposta de correção da liquidação (121 673,14 € de IMT e 4 733,59 € de juros compensatórios), por caducidade da isenção de IMT, prevista no art. 7.º do CIMT.
4.1.9. No dia 10/10/2014 foi a Requerente notificada da liquidação de IMT e de juros compensatórios, no montante total de 126 406,73 €.
4.1.10. A Requerente em 02/02/2015 apresentou reclamação graciosa da referida liquidação.
4.1.11. Por despacho do Sr. Chefe do Serviço de Finanças do Porto –... de 23/06/2015 (enviado a 30/06/2015) a reclamação graciosa foi expressamente indeferida.
4.1.12. A Requerente apresentou recurso hierárquico no dia 31/07/2015.
4.1.13. Por ofício datado de 05/12/2017 foi o recurso hierárquico expressamente indeferido.
4.1.14. A Requerente procedeu ao pagamento voluntário da liquidação de IMT e de juros compensatórios no dia 23/10/2015.
4.1.15. O pedido de pronúncia arbitral foi apresentado em 05/03/2018.
4.2. Factos que não se consideram provados
Não existem quaisquer factos com relevância para a decisão arbitral que não tenham sido dados como provados.
4.3. Fundamentação da matéria de facto que se considera provada
A matéria de facto dada como provada tem génese nos documentos utilizados para cada um dos factos alegados e cuja autenticidade não foi colocada em causa.
5. MATÉRIA DE DIREITO
5.1 Questão da equiparação da dação em cumprimento à revenda das frações
A Requerente entende que a dação em cumprimento deve ser equiparada à revenda, já a Requerida sustenta que a dação não se subsume ao conceito de revenda e que assim deve improceder a pretensão anulatória daquela.
A primeira questão que o tribunal deve conhecer é a seguinte: o conceito de revenda, previsto no art. 7.º do CIMT integra a dação em cumprimento?
Para responder à questão importa, não só descrever o teor das normas aplicáveis, como também proceder à sua interpretação.
Assim, o art. 7.º do CIMT dispõe que: «1 - São isentas do IMT as aquisições de prédios para revenda, nos termos do número seguinte, desde que se verifique ter sido apresentada antes da aquisição a declaração prevista no artigo 112.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) ou na alínea a) do n.º 1 do artigo 109.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), consoante o caso, relativa ao exercício da atividade de comprador de prédios para revenda.
2 - A isenção prevista no número anterior não prejudica a liquidação e pagamento do imposto, nos termos gerais, salvo se se reconhecer que o adquirente exerce normal e habitualmente a atividade de comprador de prédios para revenda.
3 - Para efeitos do disposto na parte final do número anterior, considera-se que o sujeito passivo exerce normal e habitualmente a atividade quando comprove o seu exercício no ano anterior mediante certidão passada pelo serviço de finanças competente, devendo constar sempre daquela certidão se, no ano anterior, foi adquirido para revenda ou revendido algum prédio antes adquirido para esse fim.
4 - Quando o prédio tenha sido revendido sem ser novamente para revenda, no prazo de três anos, e haja sido pago imposto, este será anulado pelo chefe de finanças, a requerimento do interessado, acompanhado de documento comprovativo da transação».
Importa ainda citar o conteúdo do art. 11.º, n.º 5 do CIMT que dispõe o seguinte: «A aquisição a que se refere o artigo 7.º deixará de beneficiar de isenção logo que se verifique que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda».
Antes de mais, vejamos sumariamente o conceito de dação em cumprimento. O instituto em estudo configura uma modalidade de extinção das obrigações pela: «…realização de uma prestação diferente da que é devida, com o fim de, mediante acordo do credor, extinguir imediatamente a obrigação»[1]. Mas qual a sua natureza jurídica? Para a doutrina civilista, a tese que a equipara a uma compra e venda não tem validade. Argumenta-se que não há nas espécies de facto que integram a dação: «…a intenção, por parte dos contraentes, de criarem ou constituírem uma nova obrigação, mas apenas de extinguirem a obrigação com uma prestação diferente da devida[2]». Bem como, essa tese não explica, nomeadamente, «…a possibilidade de renascimento da obrigação primitiva, nos termos em que a admite o art. 838.º, in fine[3]».
A dação pode ter por objeto a transmissão do direito de propriedade sobre uma coisa, como também outro direito distinto, por exemplo, o usufruto e o direito de crédito sobre um terceiro.
Mas, para além do teor literal da isenção, importa igualmente analisar sobre a finalidade legislativa associada à sua previsão, visto que só assim é possível apurar se a dação em cumprimento deve, para efeitos de IMT, ser equiparada à revenda.
A ratio da isenção encontra-se na sujeição a Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) e a Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) dos ganhos obtidos com a revenda do bem, tributação que reveste maior perfeição, pois toma em consideração os proveitos e os custos respetivos, permitindo a tributação pelo rendimento real e dando concretização ao princípio da capacidade contributiva[4]. Para além do mais, os prédios adquiridos com a finalidade de revenda constituem mercadorias e não capital, circunstância que indica a sua tributação como rendimento. Ou, dito de outro modo, o art. 7.º do CIMT consagra uma isenção pela aquisição de prédios para revenda, quando a aquisição de bens tenha lugar no âmbito da atividade de compra de imóveis para tal fim, por pessoas singulares ou coletivas, e, no âmbito de tal atividade destinarem-se a venda no estado em que foram adquiridos.
Em resumo, o IMT pretende incidir sobre o adquirente final, deixando de lado as aquisições intermédias. Bem como, a revenda a que alude o art. 7.º do CIMT exige a celebração de um contrato de compra e venda.
A questão central destes autos – apurar se a dação em cumprimento preenche o conceito de revenda – há muito tem sido objeto de análise por parte da jurisprudência estadual e arbitral.
Ainda no domínio da SISA, a jurisprudência[5] sustentava que: «
A dação em cumprimento de um imóvel adquirido com isenção de sisa, efetuada dentro do prazo da isenção por contribuinte que se dedica à atividade de compra de prédios para revenda, faz caducar a isenção em virtude do prédio ter sido destinado a fim diferente do da revenda, nos termos do n.º 1 do art.º 16° do CIMSISSD». A jurisprudência[6] continua a adotar essa posição quando observa: «… igualmente não procede a alegação de que também a dação em cumprimento de imóveis não pode deixar de merecer, para efeitos de aplicação da isenção prevista nos arts. 7º e 11º do CIMT, o mesmo tratamento fiscal que a compra e venda (revenda)»
Adianta-se, desde já, que se concorda com a referida posição jurisprudencial. De um lado, se é inquestionável que um dos efeitos da dação consiste na transmissão do direito de propriedade sobre um imóvel, o legislador refere-se a «revenda» e não a «transmissão». Por outro, se é verdade que a dação envolve a transmissão do direito de propriedade, para efeitos fiscais, não estamos perante uma verdadeira revenda, visto que aquela a que o art. 7.º do CIMT alude exige que a «revenda» tenha subjacente a procura do lucro; a nova alienação do bem, por um determinado preço em resultado da atividade comercial da alienante. Ora, a dação em cumprimento é uma fonte de extinção de obrigações, pelo que, para efeitos do art. 7.º do CIMT é irrelevante a dação em cumprimento.
Em conclusão, se foi outorgada uma dação em cumprimento, não se preencheram os requisitos necessários para que a Requerente beneficiasse da isenção, visto que o negócio jurídico foi nomeadamente celebrado sem qualquer intenção na obtenção do lucro, pelo que improcede a pretensão anulatória da Requerente.
5.2. Questão da inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade e da capacidade contributiva
A Requerente defende que a interpretação do art. 7.º e 11.º do CIMT efetuada pela AT em que se exclui a dação em cumprimento da isenção, padece de inconstitucionalidade, na medida em que consubstancia um injustificado tratamento diferenciado entre a revenda e a dação em cumprimento, quando a doutrina e a jurisprudência sustentam que ambas as hipóteses apresentam a mesma realidade económica.
Terá a Requerente razão? O princípio constitucional da igualdade compreende uma dimensão de proibição do arbítrio, esse limite impõe o tratamento igual das situações de facto iguais e o tratamento distinto das hipóteses diversas[7].
O art. 7.º do CIMT configura uma norma de isenção, contrária ao princípio da generalidade e da igualdade da tributação, por isso insuscetível de aplicação a hipóteses não expressamente previstas no benefício, devendo de tal forma ser objeto de interpretação estrita[8].
Se assim o é, a interpretação efetuada não padece de qualquer inconstitucionalidade, visto que a dação em cumprimento não se subsume ao conceito de «revenda», aquele que o legislador positivou como digno de isenção de IMT, na condição de se observarem os requisitos previstos no art. 7.º, n.º 1 do CIMT.
Em resumo, a interpretação efetuada pela AT não padece de qualquer inconstitucionalidade.
5.3. Questão do reembolso do montante da liquidação de IMT e de juros compensatórios e da condenação no pagamento de juros indemnizatórios
Perante o supra exposto, esta questão é de conhecimento prejudicado.
6. DECISÃO
Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em julgar totalmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral, com todas as consequências legais.
7. VALOR DO PROCESSO
De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC) e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT) fixa-se ao processo o valor de 126 406,73 €.
8. CUSTAS
Conforme disposto nos artigos 22.º, n.º 4 do RJAT e 4.º, n.º 4 do RCPAT e na Tabela I anexa ao mesmo, fixa-se o montante das custas em 3060,00 €, a cargo da Requerente, atento o seu decaimento.
Notifique-se.
Lisboa, 17 de setembro de 2018
José Poças Falcão
(Presidente)
Francisco Nicolau Domingos
(Vogal)
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Sérgio de Matos
(Vogal)
[1] JOÃO DE MATOS ANTUNES VARELA, Das obrigações em geral, vol. II, 7.ª edição, Almedina, 1999, p. 171.
[2] JOÃO DE MATOS ANTUNES VARELA, Das obrigações em geral, vol. II, 7.ª edição, Almedina, 1999, p. 183.
[3] JOÃO DE MATOS ANTUNES VARELA, Das obrigações em geral, vol. II, 7.ª edição, Almedina, 1999, p. 184.
[4] V. neste sentido F. PINTO FERNANDES/NUNO PINTO FERNANDES, Código do Imposto Municipal da SISA e do Imposto sobre as Sucessões e Doações. Anotado e Comentado., 3.ª edição, Rei dos Livros, 1993, p. 186 e 187.
[5] Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 04/10/2000, proferido no âmbito do processo n.º 24923, em que foi relator o Conselheiro BENJAMIM RODRIGUES.
[6] Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 08/11/2017, proferido no âmbito do recurso n.º 0174/17 em que foi relator o Conselheiro CASIMIRO GONÇALVES.
[7]J.J. GOMES CANOTILHO, Constituição da República Portuguesa. Anotada., volume I, Coimbra Editora, 2007, p. 339.
[8] Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 08/11/2017, proferido no âmbito do recurso n.º 0174/17 em que foi relator o Conselheiro CASIMIRO GONÇALVES.
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Os árbitros José Poças Falcão (presidente), Francisco Nicolau Domingos e A. Sérgio de Matos (vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formarem o presente tribunal arbitral, acordam, na sequência e em consequência do acórdão do TCAS proferido no processo nº 97/18.7BCLSB, que decidiu anular a decisão arbitral anterior proferida em 18 de setembro de 2018:
1. RELATÓRIO
1.1. A… – S.A., pessoa coletiva n.º ………, com sede na Rua ………..- Porto, doravante designada por Requerente, apresentou em 05/03/2018 pedido de constituição de tribunal e de pronúncia arbitral respeitante ao ato de indeferimento expresso do recurso hierárquico n.º …………….. que manteve o indeferimento da reclamação graciosa e, mediatamente sobre a legalidade da liquidação oficiosa de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) e de juros compensatórios (121 673,14 € de IMT e 4 733,59 € de juros compensatórios) por, no seu juízo, padecer do vício de violação de lei.
1.2. O Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo legal.
1.3. No dia 17/05/2018 ficou constituído o tribunal arbitral.
1.4. Cumprindo a estatuição do artigo 17.º, n.º 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (RJAT) foi a Requerida, em 24/05/2018 notificada para, querendo, apresentar resposta, solicitar a produção de prova adicional e remeter o processo administrativo (PA).
1.5. Em 27/06/2018 a Requerida apresentou a sua resposta, na qual defende a improcedência integral do pedido de pronúncia arbitral, atenta a legalidade da liquidação de imposto e de juros compensatórios.
1.6. O tribunal em 02/07/2018 decidiu indeferir a requerida prova testemunhal com a fundamentação descrita no despacho datado de tal dia, dispensar a realização da reunião a que o artigo 18.º, n.º 1 do RJAT se refere, com base na inexistência de exceções a conhecer e na desnecessidade de convidar as partes a corrigir as peças processuais, concedeu vinte dias para que estas, querendo, apresentassem as alegações finais escritas e designou data limite para proferir a decisão arbitral.
1.7. As partes apresentaram as suas alegações finais escritas no dia 14/09/2018 e 13/09/2018, respetivamente, mantendo a sua posição inicial.
2. POSIÇÃO DAS PARTES
A Requerente começa por alegar que a questão a dirimir consiste em saber se uma entidade que, a título profissional, se dedica à atividade de compra e venda de imóveis e, nesse âmbito, adquire um prédio para revenda e que perante as dificuldades financeiras recorre a um Processo Especial de Revitalização (PER) no qual é ajustada a transferência do direito de propriedade sobre prédios, sob a forma de dação em cumprimento, deve ver precludida a possibilidade de beneficiar da isenção prevista no artigo 7.º do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT).
Na sua posição, apesar do referido preceito consagrar um benefício fiscal e, por isso, dever ser objeto de interpretação estrita, dever-se-á concluir que o contrato celebrado cumpriu todos os requisitos exigidos pelo CIMT para a aplicação da isenção e, como tal, a liquidação é ilegal, por padecer do vício de violação de lei.
No seu juízo, o problema coloca-se na questão de saber se a dação em cumprimento pode considerar-se abrangida, para efeitos do CIMT, no conceito de revenda, bem como na resposta: se o destino dado a um imóvel que é objeto de dação difere daquele dado a um imóvel que seja objeto de revenda?
Na sua opinião, a dação em cumprimento cabe no conceito de revenda, como também deve ser dada resposta negativa à segunda questão.
Por outro lado, alega ainda a Requerente que “(...) atendendo ao circunstancialismo próprio que rodeou a celebração do negócio em apreço, o qual é subsumível ao conceito de JUSTO IMPEDIMENTO: não foi por sua vontade, mas porque assim lhe foi imposto pelo PER, que a Requerente transmitiu o imóvel ao abrigo de uma dação, e não de um contrato de compra e venda. (...) Ora, em decisão de 6 de Março de 2013, o STA admitiu expressamente a possibilidade de a caducidade prevista no artigo 11º do CIMT não operar quando estejamos perante um justo impedimento de, no prazo de três anos, retransmitir o imóvel ao abrigo de um contrato de compra e venda (vide acórdão proferido nos autos do processo 0104/13), tendo então considerado que só se poderia concluir pela existência de um justo impedimento em face de “uma verdadeira impossibilidade de realizar a venda, ainda que com perdas, não sendo suficiente a dificuldade ou, eventualmente, a impossibilidade de a efectuar nos termos desejados em virtude das circunstâncias não imputáveis ao vendedor”. (...) No caso em apreço, não restam dúvidas de que esta verdadeira impossibilidade, não imputável à Requerente, se verificou: ainda que esta pretendesse transmitir o imóvel ao abrigo de um contrato de compra e venda, essa possibilidade estava-lhe vedada pelo PER. Ou a Requerente o transmitia ao abrigo de uma dação em cumprimento, ou incumpria o PER, violava as condições impostas pelos seus credores, e – certamente – se veria confrontada com um pedido de decretamento da sua insolvência, que a impediria, ao fim e ao cabo, de transmitir o imóvel (...)”
Subsidiariamente, defende que a eventual limitação (à compra e venda) do artigo 7.º, n.º 1 do CIMT e artigo 11.º do CIMT padecem de inconstitucionalidade, por violação dos princípios da capacidade contributiva e da igualdade. Em bom rigor, a aplicação dos referidos normativos, de forma a excluir a dação, viola os aludidos princípios constitucionais, na medida em que consubstancia um injustificado tratamento diferenciado entre a revenda e a dação em cumprimento, quando a doutrina e a jurisprudência defendem que ambas as hipóteses apresentam a mesma realidade económica.
Em terceira linha peticiona a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) no pagamento de juros indemnizatórios visto existir erro imputável aos serviços, contados desde a data do pagamento indevido até efetivo e integral cumprimento.
A Requerida na sua resposta defende-se da seguinte forma:
i) Caducidade da isenção
A isenção prevista no artigo 7.º, n.º 1 do CIMT pretende beneficiar as empresas que tenham por objeto comercial a compra e venda de imóveis, revendam esses imóveis sem terem de suportar o IMT da primeira compra, isto é, tratando-os como mercadoria no âmbito da atividade empresarial.
Sucede que, no seu juízo, a Requerente não revendeu os imóveis no âmbito da sua atividade comercial, mas sim, deu-os em pagamento de dívidas e obrigações que tinha para com o Banco ……….., S. A., através da celebração de um contrato de dação em cumprimento. Assim, os imóveis não podem ser considerados mercadoria que é transacionada no âmbito comercial, como acontece na compra e venda.
Por isso, não concorda com a posição da Requerente quando defende que os destinos da revenda e da dação em cumprimento coincidem inteiramente.
Em segunda linha, defende que se o legislador não previu isenções de IMT nessas situações especiais de PER, nem a norma de isenção prevê outros contratos, referindo-se somente à compra e venda, a pretensão anulatória da Requerente não tem fundamento legal.
Em resumo, a liquidação de IMT e de juros compensatórios deve ser mantida na ordem jurídica.
ii) Da violação do princípio da capacidade contributiva e da igualdade
A interpretação efetuada pela AT não é inconstitucional, pois apenas permite que a isenção seja concedida quando os imóveis são adquiridos para revenda e não perante qualquer outra interpretação, o texto legal é perfeitamente claro e os contratos em causa não são idênticos.
Não se concebe que a AT tenha efetuado uma interpretação violadora do princípio da igualdade, pelo contrário, se não tivesse liquidado o IMT, aí sim, teria violado o princípio da igualdade fiscal, na medida em que estaria a beneficiar a Requerente em prejuízo de outros sujeitos passivos.
iii) Do direito a juros a indemnizatórios
Não existindo «erro imputável aos serviços» na emissão da liquidação em causa, não pode ser reconhecido o direito a juros indemnizatórios.
Nesta sequência, são as seguintes questões que o tribunal deve apreciar:
a) Se o indeferimento expresso do recurso hierárquico padece de erro sobre os pressupostos de direito;
b) Se se verifica a não caducidade prevista no artigo 11º, do CIMT por impossibilidade de realização das vendas no prazo de 3 anos;
c) Se a AT deve ser condenada a reembolsar a Requerente do valor pago de IMT e de juros compensatórios;
d) Se a AT deve ser condenada no pagamento de juros indemnizatórios.
3. SANEAMENTO
O tribunal arbitral foi regularmente constituído com base nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1 do RJAT, sendo competente para apreciar e decidir o pedido de pronúncia arbitral.
As partes, que estão devidamente representadas, gozam de personalidade e de capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
O processo não enferma de nulidades.
4. MATÉRIA DE FACTO
4.1. Factos que se consideram provados
4.1.1. A Requerente é uma sociedade comercial que tem por objeto a «indústria de construção civil, compra, venda, revenda e arrendamento de bens imobiliários».
4.1.2. A Requerente sujeitou-se a PER que correu os seus termos no Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia sob o n.º …./12….TYVNG.
4.1.3. No teor do referido PER consta que a Requerente aceitou efetuar a dação em cumprimento das frações AI, AJ, AZ e BG do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Lordelo do Ouro e Massarelos sob o art. 9.º (anterior art. 4467 da freguesia de Lordelo do Ouro), por 2 109 267,92 € ao Banco ……….., S.A. (atual …. …….).
4.1.4. A Requerente adquiriu à B… –, S. A. em 07/08/2013 as frações AI, AJ, AZ e BG do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia do Lordelo do Ouro e Massarelos sob o artº. …., por 2 109 267,92 €, constando na escritura que foi arquivado o documento que titula a isenção de IMT, ao abrigo do artigo 7.º, n.º 1 do CIMT.
4.1.5. No PER constava que as aludidas frações seriam objeto de dação em pagamento pela B… –, S. A. à Requerente para extinguir um crédito desta, com fonte em contrato de empreitada de construção civil.
4.1.6. No dia 07/08/2013 a Requerente celebrou uma escritura de dação em cumprimento das frações previamente adquiridas para extinção de responsabilidades bancárias junto do Banco ……….., S.A. (atual …. …….) no montante de 2 109 267,92 €.
4.1.7. O Serviço de Inspeção Tributária da Direção de Finanças do Porto enviou a OI n.º 2014….. para o Serviço de Finanças do Porto - .., por ter apurado que houve caducidade da isenção de IMT.
4.1.8. O Serviço de Finanças do Porto - .. elaborou uma proposta de correção da liquidação (121 673,14 € de IMT e 4 733,59 € de juros compensatórios), por caducidade da isenção de IMT, prevista no artigo 7.º do CIMT.
4.1.9. No dia 10/10/2014 foi a Requerente notificada da liquidação de IMT e de juros compensatórios, no montante total de 126 406,73 €.
4.1.10. A Requerente em 02/02/2015 apresentou reclamação graciosa da referida liquidação.
4.1.11. Por despacho do Sr. Chefe do Serviço de Finanças do Porto – … de 23/06/2015 (enviado a 30/06/2015) a reclamação graciosa foi expressamente indeferida.
4.1.12. A Requerente apresentou recurso hierárquico no dia 31/07/2015.
4.1.13. Por ofício datado de 05/12/2017 foi o recurso hierárquico expressamente indeferido.
4.1.14. A Requerente procedeu ao pagamento voluntário da liquidação de IMT e de juros compensatórios no dia 23/10/2015.
4.1.15. O pedido de pronúncia arbitral foi apresentado em 05/03/2018.
4.2. Factos que não se consideram provados
- Que a Requerente tivesse ficado impossibilitada de realizar a revenda das frações mencionadas supra em 4.1.3 por qualquer razão ou circunstância que lhe fosse imposta, designadamente pelo PER a que alude o ponto 4.1.2, dos factos provados.
4.3. Fundamentação da matéria de facto
A matéria de facto dada como provada e não provada tem a sua génese nos documentos incorporados nos autos, incluindo a cópia do processo administrativo instrutor, documentação que reciprocamente não foi impugnada.
Assinale-se ainda, sem prejuízo de melhor desenvolvimento infra, na decisão de direito, que a Requerente não provou e até verdadeiramente não alegou factos concretos que pudessem sustentar a conclusão de justo impedimento para a revenda das frações no prazo de 3 anos, imposto pelo artigo 11.º, n.º 5, do CIMT, designadamente quem, como e em que circunstâncias ocorreu ou lhe foi imposto o pretenso impedimento de revenda.
5. MATÉRIA DE DIREITO
5.1 Questão da equiparação da dação em cumprimento à revenda das frações
A Requerente entende que a dação em cumprimento deve ser equiparada à revenda; já a Requerida sustenta que a dação não se subsume ao conceito de revenda e que assim deve improceder a pretensão anulatória daquela.
A primeira questão que o tribunal deve conhecer é a seguinte: o conceito de revenda, previsto no artigo 7.º do CIMT, integra ou é equivalente ao de dação em cumprimento?
Para responder à questão importa, não só descrever o teor das normas aplicáveis, como também proceder à sua interpretação.
Assim, o artigo 7.º do CIMT dispõe que: «1 - São isentas do IMT as aquisições de prédios para revenda, nos termos do número seguinte, desde que se verifique ter sido apresentada antes da aquisição a declaração prevista no artigo 112.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) ou na alínea a) do n.º 1 do artigo 109.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), consoante o caso, relativa ao exercício da atividade de comprador de prédios para revenda.
2 - A isenção prevista no número anterior não prejudica a liquidação e pagamento do imposto, nos termos gerais, salvo se se reconhecer que o adquirente exerce normal e habitualmente a atividade de comprador de prédios para revenda.
3 - Para efeitos do disposto na parte final do número anterior, considera-se que o sujeito passivo exerce normal e habitualmente a atividade quando comprove o seu exercício no ano anterior mediante certidão passada pelo serviço de finanças competente, devendo constar sempre daquela certidão se, no ano anterior, foi adquirido para revenda ou revendido algum prédio antes adquirido para esse fim.
4 - Quando o prédio tenha sido revendido sem ser novamente para revenda, no prazo de três anos, e haja sido pago imposto, este será anulado pelo chefe de finanças, a requerimento do interessado, acompanhado de documento comprovativo da transação».
Importa ainda citar o conteúdo do artigo 11.º, n.º 5 do CIMT que dispõe o seguinte: «A aquisição a que se refere o artigo 7.º deixará de beneficiar de isenção logo que se verifique que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda».
Antes de mais, vejamos sumariamente o conceito de dação em cumprimento. O instituto em estudo configura uma modalidade de extinção das obrigações pela: «…realização de uma prestação diferente da que é devida, com o fim de, mediante acordo do credor, extinguir imediatamente a obrigação» . Mas qual a sua natureza jurídica? Para a doutrina civilista, a tese que a equipara a uma compra e venda não tem validade. Argumenta-se que não há nas espécies de facto que integram a dação: «…a intenção, por parte dos contraentes, de criarem ou constituírem uma nova obrigação, mas apenas de extinguirem a obrigação com uma prestação diferente da devida ». Bem como, essa tese não explica, nomeadamente, «…a possibilidade de renascimento da obrigação primitiva, nos termos em que a admite o art. 838.º, in fine ».
A dação pode ter por objeto a transmissão do direito de propriedade sobre uma coisa, como também outro direito distinto, por exemplo, o usufruto e o direito de crédito sobre um terceiro.
Mas, para além do teor literal da isenção, importa igualmente analisar a finalidade legislativa associada à sua previsão, visto que só assim é possível apurar se a dação em cumprimento deve, para efeitos de IMT, ser equiparada à revenda.
A ratio da isenção encontra-se na sujeição a Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) e a Imposto sobre o Rendimento das Pessoas CoIetivas (IRC) os ganhos obtidos com a revenda do bem, tributação que reveste maior perfeição, pois toma em consideração os proveitos e os custos respetivos, permitindo a tributação pelo rendimento real e dando concretização ao princípio da capacidade contributiva . Para além do mais, os prédios adquiridos com a finalidade de revenda constituem mercadorias e não capital, circunstância que indica a sua tributação como rendimento. Ou, dito de outro modo, o artigo 7.º do CIMT consagra uma isenção pela aquisição de prédios para revenda, quando a aquisição de bens tenha lugar no âmbito da atividade de compra de imóveis para tal fim, por pessoas singulares ou coletivas, e, no âmbito de tal atividade se destinem a venda no estado em que foram adquiridos.
Em resumo, o IMT pretende incidir sobre o adquirente final, deixando de lado as aquisições intermédias. Bem como, a revenda a que alude o artigo 7.º do CIMT exige a celebração de um contrato de compra e venda.
A questão central destes autos – apurar se a dação em cumprimento preenche o conceito de revenda – há muito tem sido objeto de análise por parte da jurisprudência estadual e arbitral.
Ainda no domínio da SISA, a jurisprudência sustentava que: «
A dação em cumprimento de um imóvel adquirido com isenção de sisa, efetuada dentro do prazo da isenção por contribuinte que se dedica à atividade de compra de prédios para revenda, faz caducar a isenção em virtude do prédio ter sido destinado a fim diferente do da revenda, nos termos do n.º 1 do art.º 16° do CIMSISSD». A jurisprudência continua a adotar essa posição quando observa: «… igualmente não procede a alegação de que também a dação em cumprimento de imóveis não pode deixar de merecer, para efeitos de aplicação da isenção prevista nos arts. 7º e 11º do CIMT, o mesmo tratamento fiscal que a compra e venda (revenda)»
Adianta-se, desde já, que se concorda com a referida posição jurisprudencial. De um lado, se é inquestionável que um dos efeitos da dação consiste na transmissão do direito de propriedade sobre um imóvel, o legislador refere-se a «revenda» e não a «transmissão». Por outro, se é verdade que a dação envolve a transmissão do direito de propriedade, para efeitos fiscais, não estamos perante uma verdadeira revenda, visto que aquela, a que o artigo 7.º do CIMT alude, exige que a «revenda» tenha subjacente a procura do lucro; a nova alienação do bem, por um determinado preço em resultado da atividade comercial da alienante. Ora, a dação em cumprimento é uma fonte de extinção de obrigações, pelo que, para efeitos do artigo 7.º do CIMT é irrelevante a dação em cumprimento.
Em conclusão, se foi outorgada uma dação em cumprimento, não se preencheram os requisitos necessários para que a Requerente beneficiasse da isenção, visto que o negócio jurídico foi nomeadamente celebrado sem qualquer intenção na obtenção do lucro, pelo que improcede a pretensão anulatória da Requerente.
5.2. A caducidade da isenção prevista no artigo 7.º, do CIMT. O justo impedimento.
Esta questão reconduz-se a apurar se, quadro factual descrito supra, será de aceitar ou de ponderar a existência de situação que possa configurar um justo impedimento idóneo à suspensão ou desconsideração de forma contínua, do prazo de caducidade da isenção, conforme previsão dos artigos 7.º e 11.º, n.º 5 do CIMT
Pois bem, está demonstrado que a AT procedeu, pelo ato sob impugnação, à correção da liquidação (121 673,14 € de IMT e 4 733,59 € de juros compensatórios), por caducidade da isenção de IMT, previsto no citado artigo 11.º, n.º 5 do CIMT e de harmonia com as interpretações jurisprudenciais e decisões que foram invocadas (Ac. do STA de 6-3-2013, no processo nº 0104/13 e Acs do TCAS nos processos números 07063/13 e 33/19.3BCLSB) - a demandante alega ou deixa subentendido no requerimento para pronúncia arbitral que foi a ocorrência duma circunstância, que não lhe pode ser imputável, que a venda não ocorreu no sobredito prazo de 3 anos. Mais concretamente: que tal venda não ocorreu porquanto, “(...)ainda que esta pretendesse transmitir o imóvel ao abrigo de um contrato de compra e venda, essa possibilidade estava-lhe vedada pelo PER (...)”, de tal modo que “(...) ou o transmitia (o imóvel) ao abrigo de uma dação em cumprimento, ou incumpria o PER, violava as condições impostas pelos seus credores, e - certamente - se veria confrontada com um pedido de decretamento da sua insolvência, que a impedia, ao fim e ao cabo, de transmitir o imóvel (...)” [cfr. 191.º a 193.º, do pedido de pronúncia arbitral].
Ora importa desde logo considerar que, com interesse para abordagem de tal questão, está, no caso sub juditio, o seguinte quadro factual (cfr. supra, 4.1.2 a 4.1.6 e 4.2):
(i)Do PER consta que a Requerente aceitou efetuar a dação em cumprimento das frações AI, AJ, AZ e BG do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Lordelo do Ouro e Massarelos sob o artº…. (anterior art. …. da freguesia de Lordelo do Ouro), por 2 109 267,92 € ao Banco ……, S.A. (atual …….); (ii) A Requerente adquiriu à B…–, S. A. em 07/08/2013 as frações AI, AJ, AZ e BG do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia do Lordelo do Ouro e Massarelos sob o artº……, por 2 109 267,92 €, constando na escritura que foi arquivado o documento que titula a isenção de IMT, ao abrigo do art. 7.º, n.º 1 do CIMT; (iii) No PER constava que as aludidas frações seriam objeto de dação em pagamento pela B…. –, S. A. à Requerente para extinguir um crédito desta, com fonte em contrato de empreitada de construção civil. (iii) No dia 07/08/2013 a Requerente celebrou uma escritura de dação em cumprimento das frações previamente adquiridas para extinção de responsabilidades bancárias junto do Banco ……., S. A. (atual ……..) no montante de 2 109 267,92 €. -
Acresce, por outro lado, não ter ficado provado “(...) que a Requerente tivesse ficado impossibilitada de realizar a revenda das frações mencionadas supra em 4.1.3 por qualquer razão ou circunstância que lhe fosse imposta, designadamente pelo PER a que alude o ponto 4.1.2, dos factos provados (...)” - cfr. supra, 4.2, factos não provados.
Este quadro factual, sem alegação e prova de quaisquer outros factos passíveis de poder integrar o conceito de justo impedimento para o cumprimento estrito, pela Requerente, do prazo de 3 anos, para revenda das frações em causa, leva à inevitável conclusão do incumprimento desse prazo e, consequente e necessariamente, à caducidade da isenção concedida à Requerente na qualidade de adquirente, para revenda, das sobreditas frações objeto de dação em pagamento.
Ou dito doutro modo: não existe qualquer prova de que tivesse sido “imposta” à Requerente a transmissão das frações como dação em pagamento e não por via de um contrato de compra e venda (cfr artigo 189.º, do PPA); daí a consequência natural e inelutável de que a Requerente considerou (erradamente, embora como se viu), a existência de equivalência entre as figuras da “dação em pagamento” e da “revenda”, designadamente para efeitos dos artigos 7.º, n.º 1 e 11.º, n.º 5, do CIMT e, por isso, é que aceitou os termos do PER.
Ou seja, em sintética ou singela conclusão, não se descortina qualquer real ou válida impossibilidade da revenda dos imóveis, ainda que com perdas, que pudesse, designadamente, justificar o não cumprimento do prazo de 3 anos previsto no artigo 11.º, n.º 5, do CIMT por razões não imputáveis à requerente.
5.3. Questão da inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade e da capacidade contributiva
A Requerente defende que a interpretação do artigo 7.º e 11.º do CIMT efetuada pela AT em que se exclui a dação em cumprimento da isenção, padece de inconstitucionalidade, na medida em que consubstancia um injustificado tratamento diferenciado entre a revenda e a dação em cumprimento, quando a doutrina e a jurisprudência sustentam que ambas as hipóteses apresentam a mesma realidade económica.
Terá a Requerente razão? O princípio constitucional da igualdade compreende uma dimensão de proibição do arbítrio, esse limite impõe o tratamento igual das situações de facto iguais e o tratamento distinto das hipóteses diversas .
O artigo 7.º do CIMT configura uma norma de isenção, contrária ao princípio da generalidade e da igualdade da tributação, por isso insuscetível de aplicação a hipóteses não expressamente previstas no benefício, devendo de tal forma ser objeto de interpretação estrita .
Se assim o é, a interpretação efetuada não padece de qualquer inconstitucionalidade, visto que a dação em cumprimento não se subsume ao conceito de «revenda», aquele que o legislador positivou como digno de isenção de IMT, na condição de se observarem os requisitos previstos no artigo 7.º, n.º 1 do CIMT.
Em resumo, a interpretação efetuada pela AT não padece de qualquer inconstitucionalidade.
5.4. Questão do reembolso do montante da liquidação de IMT e de juros compensatórios e da condenação no pagamento de juros indemnizatórios
Perante o supra exposto, e porque o pedido irá necessariamente improceder totalmente, fica obviamente prejudicada a apreciação desta questão
6. DECISÃO
Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em julgar totalmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral, com todas as consequências legais.
7. VALOR DO PROCESSO
De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC) e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT) fixa-se ao processo o valor de 126 406,73 €.
8. CUSTAS
Conforme disposto nos artigos 22.º, n.º 4 do RJAT e 4.º, n.º 4 do RCPAT e na Tabela I anexa ao mesmo, fixa-se o montante das custas em 3.060,00 €, totalmente a cargo da Requerente, atento o seu decaimento.
• Notifique-se.
Lisboa, 16 de julho de 2021
O Tribunal Arbitral Coletivo,
José Poças Falcão (Presidente)
Francisco Nicolau Domingos (vogal)
A. Sérgio de Matos (Vogal)