CAAD: Arbitragem Tributária
Processo n.º: 252/2013-T
Tema: IRS – Alteração da forma de determinação dos rendimentos empresariais e profissionais – Art.º 28.º do CIRS
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Decisão Arbitral
I. Relatório
1. No dia 08-11-2013, A…, contribuinte n.º …, e mulher B…, contribuinte n.º …, apresentaram um pedido de constituição do tribunal arbitral singular, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), tendo por objecto a legalidade da liquidação de IRS n.º 2013 …, de 23/6/2013, relativa ao exercício de 2012, no valor global a pagar de 23.870,51 €, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.
2. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular o ora signatário, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
3. Em 16 de Dezembro de 2013 foram as partes notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do Áiao de cesse do nege m cessionnássiuonginºariu constitudessa decisçaipelo adquirente q uer peliao de cesse do nege m cessionnássiuonginºariu constitudessa decisçaipelo adquirente q uer pelÁAÁrbitro, considerando-se por isso o Tribunal Arbitral constituído em 15 de Janeiro de 2014, nos termos da alínea c) do nº1 do art. 11º do RJAT. Nestes termos, o tribunal encontra-se regularmente constituído para apreciar e decidir o objecto do processo.
4. As alegações que sustentam o pedido de pronúncia arbitral dos Requerentes são em súmula, as seguintes:
4.1. Em 30/6/2008, a Requerente B… apresentou declaração de reinício de actividade, de profissional liberal – categoria B, no Serviço de Finanças da Loja do Cidadão de ….
4.2. Na referida declaração a Requerente declarou que, para efeitos de Imposto sobre o Rendimento – categoria B, optava por ficar enquadrada no regime da contabilidade organizada.
4.3. Assim, com base na declaração de Início/Reinício de Actividade o Enquadramento definido pelo Serviço de Finanças para a Requerente em sede de IRS foi o seguinte: “Enquadramento: Regime de Contabilidade Organizada por Opção. A vigorar a partir de 2008-01-01 até 2010-12-31”.
4.4. Em 2010, a Requerente obteve rendimentos da categoria B, superiores a 150.000,00 €, ou seja, de 190.649,13 €.
4.5. Em 2011, a Requerente obteve rendimentos da categoria B, inferiores a 150.000,00 €.
4.6. Em 12/3/2012, a Requerente encontrava-se enquadrada pela AT, em sede de IRS, no regime da Contabilidade Organizada, desde 1/1/2011.
4.7. A AT enquadrou inicialmente a Requerente em sede de IRS no regime de contabilidade organizada, por opção, de 2011-01-01 a 2013-12-31, posteriormente enquadrou-a no regime da contabilidade organizada apenas em 2011-01-01 e mais tarde enquadrou a Requerente no regime simplificado de 2012-01-01 a 2014-12-31.
4.8. Tais alterações nunca foram comunicadas à Requerente.
4.9. Em 21/3/2013, por consulta ao portal das finanças o TOC da Requerente foi confrontado com o facto de a Requerente estar a ser enquadrada em sede de IRS no regime simplificado.
4.10. A Requerente deslocou-se então ao respectivo Serviço de Finanças onde foi informada de que como em 2011, obteve rendimentos da categoria B inferiores a 150.000,00 €, em 2012, deveria, até ao final de Março do respectivo exercício ter optado por esse regime de tributação, nos termos do n.º 3 e da al. b) do n.º 4 do art. 28.º do CIRS.
4.11. Os Requerentes procuraram submeter a respectiva declaração modelo 3 de IRS de 2012, com a declaração dos rendimentos da categoria B da Requerente apurados com base na contabilidade, mas o sistema informático da AT não o permitiu.
4.12. Pelo que os Requerentes foram forçados a apresentar a declaração de IRS de 2012, com a declaração dos rendimentos da categoria B da Requerente apurados com base no regime simplificado de tributação.
4.13. A liquidação sub judice foi determinada com o apuramento do rendimento tributável da categoria B da Requerente segundo as regras do regime simplificado de tributação, influenciando o rendimento tributável de ambos os Requerentes.
4.14. Embora considerassem ocorrer a ilegalidade da mencionada liquidação, por forma a evitar um processo de execução fiscal os Requerentes procederam ao respectivo pagamento.
4.15. No caso vertente a Requerente iniciou actividade em 2008 e declarou imediatamente que pretendia ficar abrangida pelo regime geral de tributação com base na contabilidade organizada, logo em 2008, ficou abrangida por este regime de tributação, nos termos do disposto nos n.ºs 1, 2, 10, 3, e al. a) do n.º 4 do art. 28.º do CIRS.
4.16. O período de enquadramento da Requerente no regime da contabilidade organizada vigorou, entre 2008 e 31/12/2010, nos termos do n.º 5 do art. 28.º do CIRS.
4.17. Em 2010, a Requerente obteve rendimentos superiores a 150.000,00 €, logo a partir de 1/1/2011, a Requerente ficou enquadrada no regime da contabilidade organizada, nos termos do n.º 2 do art. 28.º do CIRS.
4.18. O enquadramento realizado com base nos valores declarados em 2010, vale por um período de 3 anos, nos termos do n.º 5 do art. 28.º do CIRS.
4.19. Logo, no triénio 2011 – 2013 a Requerente deveria ter sido enquadrada no regime geral da contabilidade organizada por efeito do disposto no n.º 5 do art. 28.º do CIRS.
4.20. Como assim não sucedeu, e a Requerente foi enquadrada no regime simplificado de tributação, no apuramento e realização da liquidação de IRS de 2012, dos Requerentes, foi feito um apuramento incorrecto dos rendimentos tributáveis, com violação dos disposto nos n.ºs 2 e n.º 5 do art. 28.º do CIRS, o que deveria conduzir à anulação da mencionada liquidação.
4.21. E contra o exposto, de nada valeria argumentar que o período de permanência de 3 anos, apenas vale para os casos em que o contribuinte exerce a opção pelo regime geral.
4.22. O período mínimo de enquadramento – 3 anos - vale tanto para o regime simplificado, como para o regime da contabilidade organizada.
4.23. A lei não distingue, para efeitos do período mínimo de permanência se o enquadramento resulta de opção ou de imposição legal.
4.24. Aliás, o n.º 5 do art. 28.º na redacção anterior à Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro dispunha que o período mínimo de permanência no regime simplificado é de três anos, prorrogável automaticamente por iguais períodos, excepto se o sujeito passivo comunicar, nos termos da alínea b) do número anterior, a opção pela aplicação do regime de contabilidade organizada.
4.25. É jurisprudência pacífica e unânime do STA que quando tal redacção estava em vigor, no caso de haver a opção pelo regime da contabilidade na declaração de início de actividade “não havia como aplicar-lhe o regime simplificado, pois que o preceito não previa a caducidade dessa opção nem fixava qualquer período mínimo de permanência no regime geral” (nesse sentido veja-se, entre outros, Acórdão do STA, proferido em 27/01/2010, no âmbito do Rec. nº 0906/09).
4.26. Assim, se a lei não impunha limite de permanência no regime geral da contabilidade organizada, uma vez feita a opção, o contribuinte ficaria ad eternum no regime geral.
4.27. Não se pode por isso sustentar agora (que a lei passou a estabelecer um período mínimo de permanência de 3 anos, também no regime geral) que, quando tal enquadramento não resulta de opção o período mínimo de permanência é só de um ano.
4.28. Tal tese não só violaria frontalmente o disposto no n.º 5 do art. 28.º do CIRS, como não tem qualquer suporte legal.
4.29. Situação semelhante à dos autos foi já analisada no âmbito do Processo Arbitral n.º 97/2012-T CAAD, que considerou ilegal a não aplicação do prazo de permanência de 3 anos no regime geral dos contribuintes que no último ano do triénio anterior tivesse obtido rendimentos superiores ao limite previsto no n.º 2 do art. 28.º do CIRS, como sucede in casu.
4.30. Pelo que, a liquidação contestada deverá ser totalmente anulada, com todas as consequências legais, incluindo a restituiçequerentestias pagasamentoespectivos juros indemnizatão da quantia paga com os respectivos juros indemnizatórios a contar do pagamento e até integral restituição das quantias pagas.
5. Por seu turno, a Requerida Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta, na qual se defendeu nos seguintes termos:
5.1. Visa o presente pedido a anulação da liquidação de IRS referente ao ano de 2012, bem como o pagamento dos juros indemnizatórios até integral restituição das quantias pagas.
5.2. Em causa está o enquadramento dos Requerentes, para efeitos de determinação dos rendimentos empresariais e profissionais, num dos regimes previstos no art 28° do CIRS, ou seja, nas regras decorrentes do regime simplificado ou com base na contabilidade organizada.
5.3. Entendem os Requerentes que a liquidação do IRS relativa ao exercício de 2012, nº 2013...., de 23/06/2013, deve ser anulada porquanto, e em síntese, a administração tributária não fez o correcto enquadramento cadastral da respectiva situação tributária no regime de contabilidade organizada, antes lhes aplicando as regras do regime simplificado.
5.4. Não assiste, contudo, qualquer razão aos Requerentes como de seguida se demonstrará.
5.5. A Requerente B… deu reinício à actividade "Notários" (CIRS 9011) em 01/02/2008 e ficou enquadrada, por opção, em sede de IRS, para o triénio 2008-2010, no regime de contabilidade organizada.
5.6. Em 2010, os Requerentes declararam rendimentos da categoria B de 190.649,13€.
5.7. Em 2011, os rendimentos declarados da categoria B foram de 120.631,32€
5.8. No exercício de 2012, os Requerentes foram enquadrados no regime simplificado.
5.9. Pese embora os Requerentes aleguem que os presentes autos têm por objecto a liquidação de IRS resultante da declaração de rendimentos, que apresentaram referente ao ano de 2012, os presentes autos têm por objecto o regime de tributação dos rendimentos da categoria B, em sede de IRS.
5.10. Com efeito, os Requerentes não imputam ao acto de liquidação qualquer ilegalidade, passível de impugnação.
5.11. Quer a declaração que apresentaram, quer a liquidação dela resultante, não padecem de qualquer erro, tanto assim que os Requerentes se abstêm de invocar o suposto erro constante da liquidação.
5.12. O que os Requerentes invocam é a violação do art. 28° do CIRS. Ora, este artigo não versa sobre as regras da liquidação.
5.13. Nos presentes autos não está em causa a ilegalidade da liquidação, mas tão só uma decisão a montante do acto de liquidação - o enquadramento cadastral dos Requerentes, para efeitos de determinação dos rendimentos da categoria B - cuja discordância não pode ser dirimida junto dos tribunais arbitrais, porquanto não se mostra abrangida pela alínea a) do art 2° do RJAT.
5.14. Portanto, seria contra a inclusão no regime de tributação que os Autores se deveriam insurgir - por outra via e noutra sede.
5.15. Verificam-se consequentemente a excepção de incompetência material do tribunal arbitral para se pronunciar sobre a matéria em apreço e a excepção de impropriedade do meio processual.
5.16. A determinação dos rendimentos empresariais e profissionais faz-se através da aplicação das regras decorrentes do regime simplificado ou com base na contabilidade, ficando os sujeitos passivos abrangidos pelo regime simplificado, quando no período de tributação imediatamente anterior, não tenha ultrapassado um montante ilíquido de rendimentos desta categoria de 150 000,00€ (cfr. art. 28°, nºs 1 e 2);
5.17. Porém, na declaração de início/reinício de actividade, os sujeitos passivos podem optar pelo regime de contabilidade organizada, opção que podem igualmente fazer até ao fim do mês de Março do ano em que pretendem alterar a forma de determinação do rendimento, mediante a apresentação da declaração de alterações (cfr. art. 28°, nº 4 do CIRS).
5.18. O período mínimo de permanência em qualquer dos regimes é de três anos (cfr. art. 28°, nº 5);
5.19. A aplicação do regime simplificado cessa quando o montante de 150.000,00€ for ultrapassado em dois períodos de tributação consecutivos, ou, quando o seja num único exercício, em montante superior a 25%, caso em que a tributação pelo regime de contabilidade organizada se faz a partir do período de tributação seguinte ao da verificação de qualquer desses factos (cfr art. 28°, nº 6 do CIRS).
5.20. Decorre, desde logo, do regime estabelecido no art. 28° do CIRS que o legislador apenas previu expressamente a cessação do regime simplificado, nada dizendo quanto ao regime de cessação do regime de contabilidade organizada.
5.21. Atento, contudo, que o regime simplificado abrange automaticamente os sujeitos passivos cujo volume de negócios é inferior a 150.000,00€, podemos concluir que o regime da contabilidade organizada também cessa quando esse limite não é atingido.
5.22. E se quanto à cessação da modalidade da contabilidade organizada, nada é dito, não pode o intérprete entender que a mesma só pode ocorrer no final de cada triénio.
5.23. Aliás, não é assim no caso da cessação do regime simplificado onde, preenchidas certas condições, prevenidas no nº 6 do art. 28°, ocorre uma alteração obrigatória do regime, ao fim de um ou dois exercícios nos quais foi aplicado regime simplificado.
5.24. Condições essas cuja verificação não ocorre sobre o último ano do triénio, podendo até verificar-se logo no primeiro ano do mesmo.
5.25. Só numa interpretação excessiva, é que, face ao legislado, se poderia entender que a cessação do regime de contabilidade organizada está dependente da conclusão de um triénio.
5.26. Até porque, se assim fosse, o sujeito passivo também não podia mudar para o regime da contabilidade organizada, a não ser no final do triénio.
5.27. Nada dispondo a lei quanto à cessação do regime da contabilidade organizada, forçoso é concluir que esta ocorre sempre que não estejam preenchidas as condições para a sua manutenção e isso acontece quando o sujeito passivo não atingiu o limite mínimo de volume de negócios estabelecido no n° 2 do art. 28° do CIRS, independentemente de estar, ou não, em curso um triénio.
5.28. É que o período mínimo de permanência de três anos, em qualquer dos regimes, a que alude o n° 3 do art. 28°, é uma imposição legal que apenas respeita às situações de opção do sujeito passivo.
5.29. Ora, analisados os factos que respeitam ao presente processo, verifica-se que no exercício de 2011, os Requerentes, após terem concluído o período mínimo de permanência no regime da contabilidade organizada, pelo qual optaram, declararam rendimentos de 120.649,13€, portanto inferiores ao limite imposto pelo nº 2 do art. 28° do CIRS, para efeitos de enquadramento obrigatório no regime simplificado.
5.30. Por essa razão, e porque não fizeram até ao final do mês de Março de 2012, a opção pela contabilidade organizada, os Requerentes foram enquadrados, para efeitos de tributação dos rendimentos da categoria B, no regime simplificado.
5.31. Sendo que, apenas após o período mínimo de 3 anos de permanência neste regime simplificado, podem os Requerentes optar pelo regime da contabilidade organizada, desde que, naturalmente, o façam nos termos previstos no n° 4 do art. 28° do CIRS e a menos que no decurso do triénio ultrapassem 150.000,00€ de rendimentos em dois anos seguintes ou 25% num só ano, de acordo com o nº 6 do mesmo art 28°.
5.32. Pelo exposto, não pode colher a pretensão dos Requerentes, sendo válido e legal o enquadramento cadastral efectuado.
5.33. Para além disso, nunca o pedido poderia ser deferido nos termos em que é formulado pelos Requerentes.
5.34. Com efeito, os Requerentes pedem ao tribunal que determine a anulação total da liquidação, porém, o argumento que invocam prende-se apenas com parte da liquidação - a que respeita aos rendimentos de um dos sujeitos passivos e, quanto a este, apenas quanto à determinação dos rendimentos da categoria B, no regime de contabilidade organizada.
5.35. O pedido dos Requerentes, a ser deferido, o que não se tem por admissível, implicaria a violação do princípio da capacidade contributiva previsto no nº 1 do art. 104° da Constituição da República Portuguesa.
5.36. Para além disso, o que os Requerentes pretendem é a alteração do regime de tributação, com efeitos naquela declaração e em todas as futuras declarações. Portanto, é contra a inclusão no regime simplificado de tributação que se devem insurgir, em sede própria, que não esta.
6. No dia 10-03-2014, realizou-se reunião do tribunal arbitral, nos termos do art. 18º do RJAT, onde se deu a palavra aos representantes da Requerida e do Requerente para se pronunciarem sobre as excepções invocadas pela Requerida em sede de resposta.
6.1. No uso da palavra, a representante da Requerida declarou manter o alegado na resposta.
6.2. Igualmente no uso da palavra, o mandatário dos Requerentes pronunciou-se sobre as excepções, concluindo pela competência deste Tribunal para apreciar o mérito da causa.
6.3. O Tribunal considerou-se competente para apreciar o fundo da causa, determinando o prosseguimento dos autos.
6.4. De seguida, nos termos e para os efeitos do artigo 18º do RJAT, o árbitro ora signatário deu a palavra aos representantes dos Requerentes e da Requerida para, por esta ordem, se pronunciarem sobre a necessidade da realização de alegações de direito.
6.5. No uso da palavra, o representante dos Requerentes declarou prescindir das alegações de direito.
6.6. Igualmente no uso da palavra, o representante da Requerida declarou prescindir das alegações de direito.
II. Factos provados:
7. Com base nas declarações das partes não impugnadas e nos documentos juntos aos autos o Tribunal considera provados os seguintes factos:
7.1. Em 30/6/2008, a Requerente apresentou declaração de reinício de actividade, de profissional liberal – categoria B, no Serviço de Finanças da Loja do Cidadão de ….
7.2. Na referida declaração a Requerente declarou que, para efeitos de Imposto sobre o Rendimento – categoria B, optava por ficar enquadrada no regime da contabilidade organizada.
7.3. Assim, com base na declaração de Início/Reinício de Actividade o Enquadramento definido pelo Serviço de Finanças para a Requerente em sede de IRS foi o seguinte: “Enquadramento: Regime de Contabilidade Organizada por Opção. A vigorar a partir de 2008-01-01 até 2010-12-31”.
7.4. Em 2010, a Requerente obteve rendimentos da categoria B, superiores a 150.000,00€, ou seja, de 190.649,13€.
7.5. Em 2011, a Requerente obteve rendimentos da categoria B, inferiores a 150.000,00€, ou seja 120.649,13€.
7.6. Em 12/3/2012, a Requerente encontrava-se enquadrada pela AT, em sede de IRS, no regime da Contabilidade Organizada, desde 1/1/2011.
7.7. Em 21/3/2013, foi descoberto que a Requerente estava a ser enquadrada em sede de IRS no regime simplificado.
7.8. A AT enquadrou inicialmente a Requerente em sede de IRS no regime de contabilidade organizada, por opção, de 2011-01-01 a 2013-12-31, e mais tarde enquadrou a Requerente no regime simplificado de 2012-01-01 a 2014-12-31.
7.9. Foi consequentemente com base neste regime que foi emitida a liquidação nº 2013...., de 23/06/2013, relativa ao exercício de 2012, no valor global a pagar de € 23.870,51, tendo os Requerentes procedido ao pagamento do respectivo imposto.
7.10. Não há factos não provados, com relevo para a decisão da causa.
III. Fundamentação de Direito.
1. Da competência do Tribunal Arbitral.
8. Nos termos do art. 2º, nº1, a) do RJAT, os tribunais arbitrais são competentes para apreciar as pretensões de declaração de ilegalidade dos actos de liquidação e de autoliquidação de tributos, de retenção na fonte e de pagamentos por conta. Por sua vez, o nº1 do art. 4º do mesmo diploma determina que a vinculação da administração tributária à jurisdição dos tribunais arbitrais depende de portaria conjunta dos Ministros das Finanças e da Justiça. Foi assim publicada a Portaria 112-A/2011, de 22 de Março, resultando dos seus arts. 1º e 2º que a Direcção-Geral dos Impostos e a Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo ficaram vinculadas à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objecto a apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida, com algumas excepções. Um destes é o IRS pelo que o presente Tribunal Arbitral tem competência para dirimir esta questão.
9. É verdade, no entanto, que a AT sustentou nestes autos que não se estaria neste caso perante uma verdadeira impugnação da legalidade da liquidação, mas sim a invocação de um erro de enquadramento do regime cadastral aplicável, cuja apreciação estaria fora da competência dos tribunais arbitrais. A verdade, no entanto, é que os Requerentes procederam expressamente à impugnação da liquidaç
. ﷽﷽﷽﷽﷽﷽﷽iaççao.tral proceder ªque improcede a alegaçcadastral aplicão de IRS relativa ao exercício de 2012, invocando a violação nessa liquidação das regras estabelecidas no art. 28º do CIRS, especialmente dos seus nºs 2 e 5. Ora, é manifesto que a existência de alguma ilegalidade na liquidação constitui questão que cabe na competência do Tribunal Arbitral, pelo que deverá o Tribunal Arbitral proceder à sua apreciação.
2. Da excepção da impropriedade do meio processual utilizado.
10. Invoca ainda a AT que existe impropriedade do meio processual utilizado, uma vez que os recorrentes deveriam ter contestado pelos meios adequados o enquadramento cadastral e não proceder à impugnação da liquidação da IRS. Na perspectiva da AT, o acto de enquadramento no regime simplificado seria um acto destacável e por isso imediatamente lesivo dos direitos do contribuinte, o qual deveria ter sido autonomamente impugnado.
11. Não parece, porém, que assista razão à AT. Conforme bem se salientou no Acórdão 97/2012, deste Centro de Arbitragem, "a lesão imediata, objetiva, direta dos interesses dos Requerentes verifica-se através de um ato administrativo final por parte da AT sob a forma de uma operação de liquidação tributária precedida de um ato interlocutório — enquadramento no regime de tributação. O que lesa a esfera patrimonial do contribuinte é o que resulta de um ato final — liquidação — e não de um ato interlocutório". Ora, como a situação fiscal dos Requerentes relativa ao exercício de 2012 só ficou definida com o acto de liquidação tem que se considerar correcto o meio processual empregue, que foi a impugnação desse acto.
Improcede assim também esta excepção.
3. Da legalidade da liquidação de IRS
12. Os Requerentes contestam a legalidade da declaração de IRS n.º 2013 ..., de 23/6/2013, relativa ao exercício de 2012, no valor global a pagar de 23.870,51 €, com fundamento em incorrecto enquadramento do contribuinte no âmbito do regime simplificado de tributação, conforme referido supra.
Nos termos do art. 28º, nº1, do CIRS, a determinação dos rendimentos empresariais e profissionais, salvo no caso da imputação prevista no art. 20º pode fazer-se, quer com base no regime simplificado, quer com base na contabilidade organizada. Ficam abrangidos pelo regime simplificado os sujeitos passivos que, no exercício da sua actividade, não tenham ultrapassado no período de tributação imediatamente anterior um montante anual ilíquido de rendimentos desta categoria de € 150 000 (art. 28º, nº2, CIRS). Os sujeitos passivos abrangidos pelo regime simplificado podem optar pela determinação dos rendimentos com base na contabilidade (art. 28º, nº3, CIRS). Essa opção deve ser formalizada pelos sujeitos passivos na declaração de início da actividade ou até ao fim do mês de Março do ano em que pretendem alterar a forma de determinação do rendimento, mediante a apresentação de declaração de alterações (art. 28º, nº4, CIRS). Nos termos do art. 28º, nº5, CIRS o prazo mínimo de permanência em qualquer dos regimes é de três anos.
13. A solução que se harmoniza com o princípio da capacidade contributiva é a tributação com base na contabilidade. Daí que a lei procure assegurar aos contribuintes a opção por esse regime mesmo nos casos em que poderiam ser tributados de acordo com o regime simplificado. Efectivamente, conforme escreve SALDANHA SANCHES:
"O regime simplificado tem sempre como pressuposto uma opção do contribuinte que renuncia ao seu direito subjectivo de ser tributado com base na contabilidade. E que, procedendo a uma estimativa dos custos que vai suportar e declarar, opta pela dedução estandardizada.
Temos deste modo uma daquelas situações em que a lei atribui relevância à sua vontade e em que ele pode optar pelo regime que considera mais favorável.
Um regime de «escolha fiscal» que, precisamente por permitir a opção do contribuinte pelo regime que lhe é mais favorável poderá conduzir a situações de tributação contrárias ao regime de tributação segundo a capacidade contributiva"[1].
Concordando com esta posição, sustenta o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 27-01-2010, Processo 0906/09, que “o regime simplificado, criado com a reforma fiscal de 2000, constitui um regime não vinculativo, válido somente para quem não tenha optado pelo regime de contabilidade organizada”. Esta posição tem sido seguida sistematicamente por outros Acórdãos desse Supremo Tribunal como o Acórdão de 17/3/2011, Processo 56/10, e o Acórdão de 28/11/2012, Processo 0709/12.
14. A opção efectuada pelo contribuinte vale por um período de 3 anos, nos termos do n.º 5 do art. 28.º do CIRS, não tendo o mesmo que renovar essa opção todos anos. Tal já foi decidido, ainda que com base na anterior redacção da lei, no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 14/3/2007, Processo 01154/06, onde se escreveu que:
"Desde logo, a interpretação que o Recorrente faz da alínea b) do n.º 4 do referido art. 31.º (28.º, na redacção do Decreto-Lei n.º 198/2001), no sentido de as declarações de opção pelo regime de contabilidade organizada terem de ser renovadas todos os anos, carece de suporte legal,
Com efeito, naquela alínea b), em que se refere que as declarações devem ser apresentadas «até ao fim do mês de Março do ano em que pretende utilizar a contabilidade organizada como forma de determinação do rendimento», não se fixa qualquer termo inicial do prazo de apresentação, mas apenas um termo final: para ser relevante a opção, ela tem de ser apresentada até 31 de Março do ano em que se pretende ser tributado pelo regime de contabilidade organizada.
Mas, não se refere nessa norma que essas declarações tenham se ser apresentadas no próprio mês de Março de cada ano, nem sequer no próprio ano em que se pretende ser tributado pelo regime de contabilidade organizada.
Por outro lado, constata-se que o CIRS, noutras disposições, fixa termos iniciais e finais para a prática de actos (como sucede no art. 60.º, na redacção vigente) pelo que o facto de naquele art. 31.º se estabelecer apenas um termo final tem o significado objecto de expressar que o interessado pode fazer a declaração com a antecipação que entender.
Sendo assim, nada na letra daquela alínea b) impede que a opção pelo regime de contabilidade organizada seja efectuada no ano anterior ou anos anteriores àquele em que se pretende tal regime de tributação.
Por isso, tendo os Autores formulado, no ano de 2001 a opção pelo regime de tributação de contabilidade organizada durante cinco anos, como resulta da matéria de facto fixada, não há qualquer obstáculo legal à relevância dessa opção para os anos de 2002 e 2003, pois, como é óbvio, tendo a opção, relativamente ao ano de 2002, sido formulada antes de 31-3-2002 e, relativamente ao ano de 2003, sido apresentada antes de 31-3-2003, é evidente a sua tempestividade".
Esta é a posição que foi igualmente seguida por este Centro de Arbitragem no n.º: 97/2012-T, onde se escreveu:
“O legislador do OE/2007, ao criar um período mínimo de três anos de permanência em qualquer dos regimes – simplificado ou da contabilidade – teve por intenção, em nosso entender, criar um período mínimo de estabilidade na sua forma de tributação durante, pelo menos durante 3 anos, no regime da contabilidade, avaliando, certamente, que uma vez adotada a contabilidade, isso implica determinados custos que não são irrelevantes e, portanto, não terá criado um regime de cessação da tributação pelo regime da contabilidade idêntico ao da cessação quando tributado pelo regime simplificado.
E tal como o contribuinte só pode alterar o seu regime no início do período seguinte no início do período seguinte e até 31 de março, se os seus proveitos do último ano do período ficarem aquém do desejado, também a Administração Tributária ss anos﷽﷽﷽﷽o pero in seus proveitos do Centro de Arbitragem154/06,, dos custos que vai suportar e declarar, opta pela deduçó o poderá reenquadrar, no início do novo período de três anos, face aos proveitos do último exercício desse período, que é o exercício imediatamente anterior ao novo ciclo que se vai iniciar.
E também não se poderá esquecer que o regime geral de tributação é o da contabilidade e que o regime de tributação simplificado é supletivo, sempre que não haja opção ou condições obrigatórias de enquadramento no regime da contabilidade.”
15. Podemos, portanto, verificar que não há qualquer fundamento legal que justifique, de alguma forma, que a Requerente tivesse sido enquadrada no regime simplificado, pelo que a mesma deveria continuar enquadrada no regime de contabilidade organizada em 2012.
Não tendo sido efectuado pela Autoridade Tributária o enquadramento jurídico correcto do facto tributário, naturalmente que não pode manter-se a liquidação objecto de impugnação, verificando-se o vício de errónea quantificação de rendimentos (art. 99º a) CPPT). Ao contrário do que sustenta a AT, não pode por isso este Tribunal senão anular essa liquidação. Dado que estamos perante um contencioso de anulação, nunca poderia naturalmente o Tribunal efectuar nova liquidação, agora com base na contabilidade organizada.
16. Cabe ainda averiguar se procede igualmente o pedido de condenação em juros indemnizatórios.
Resulta do disposto nos arts. 43º, nº1, da LGT e 61º do CPPT, que são devidos juros indemnizatórios quando se determine em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
Considera-se erro imputável sofrido.﷽ do preju de qualquer alegaç indemnizaçimonial que teve que entregar ao Estado em virtude de uma liquidaç apreciaçà administração quando o erro não for imputável ao contribuinte e assentar em errados pressupostos de facto que não sejam da responsabilidade do contribuinte.
Resultou do acto tributário impugnado a obrigação de pagamento de imposto superior ao que seria devido, pelo são devidos juros indemnizatórios nos termos legalmente previstos. Nestes casos, uma vez que se verifica a anulação da liquidação, o legislador presume que ocorreu na esfera do contribuinte um prejuízo em virtude de ter sido privado da quantia patrimonial que teve que entregar ao Estado em virtude de uma liquidação ilegal. Em consequência o contribuinte tem direito a essa indemnizaç sofrido.﷽ do preju de qualquer alegaç indemnizaçimonial que teve que entregar ao Estado em virtude de uma liquidaç apreciação, independentemente de qualquer alegação ou prova do prejuízo sofrido.
No caso presente, como os Requerentes pagaram os montantes fixados na liquidação impugnada e anulada pela presente decisão arbitral, encontram-se preenchida a previsão do nº1 do art. 43dito..﷽﷽﷽﷽ nota de cr´e ceruidaç pagamento de juros indemnizate estee liquidaç ao Estado em virtude de uma liquidaç apreciaçº da LGT. Em consequência, os Requerentes têm direito a juros indemnizatórios contados desde a data do pagamento da liquidação de imposto anulada até à data da emissão da respectiva nota de crédito, contando-se o prazo para esse pagamento do início do prazo para a execução espontânea da presente decisão (art. 61º CPPT), à taxa apurada de harmonia com o disposto no nº 4 do art. 43º da LGT. dito..﷽﷽﷽﷽ nota de cr´e ceruidaç pagamento de juros indemnizate estee liquidaç ao Estado em virtude de uma liquidaç apreciaçência
IV. Decisão:
Pelos fundamentos, de facto e de direito, acima expostos decide este Tribunal Arbitral:
a) Julgar procedente o pedido de anulação da liquidação de IRS n.º 2013 ..., de 23/6/2013, relativa ao exercício de 2012, no valor global a pagar de 23.870,51€, anulando-se consequentemente tal liquidação.
b) Julgar procedente o pedido de pagamento de juros indemnizatórios, calculados desde a data de pagamento da liquidação agora anulada, até à data da emissão da respectiva nota de crédito.
Fixa-se o valor do processo em € 23.870,51 nos termos do art. 97ºA, nº 1, a), CPPT, aplicável por força das alíneas a) e b) do nº1 do artigo 29º do RJAT e do nº2 do artigo 3º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
Fixa-se o valor das custas do processo em € 1.224, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar integralmente pela Requerida, uma vez que os Requerentes obtiveram deferimento integral do pedido, nos termos nº 2 do art. 12º e do nº 4 do art. 22º do RJAT e do nº3 do art. 4º do citado Regulamento.
Registe e notifique.
Lisboa, 7 de Abril de 2014
(Luís Menezes Leitão)
[1] Cfr. SALDANHA SANCHES, "Conceito de rendimento do IRS", em Fiscalidade, nºs 7/8, Julho/Outubro 2001, pp. 33-61 (48).